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Comentários à reforma do Judiciário (II).

Direitos processuais

21/04/2007 às 00:00
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O artigo 5º da Constituição Federal, que estabelece o princípio da igualdade de todos perante a lei, com a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, inserindo os termos em que se consubstancia, teve no rol de direitos acrescido mais um inciso pela EC 45/2004, conforme segue:

"Art.5º. (...)

(....)

LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

(...)"

Inicialmente, cabe notar que o constituinte derivado agiu com extremada timidez para a indicação de direitos de cunho processual que poderiam equacionar certos entraves existentes na legislação e mesmo assegurar maior eficácia a outros institutos, para uma melhor prestação jurisdicional tão esperada pela sociedade brasileira.

Com efeito, diversas propostas que permitiriam equacionar certos entraves processuais acabaram sendo descartadas, como aquelas advindas da AMB – Associação dos Magistrados Brasileiros, consubstanciadas na denominada Emenda Priante-Bonifácio, apresentada ainda na Câmara dos Deputados à então PEC 96-A/1992, que indicava a possibilidade de exigência de prévio depósito para garantia de cumprimento da decisão judicial e como condição para admissibilidade de recurso (seguindo modelo do Processo do Trabalho), a garantia de ciência das decisões finais àqueles beneficiados por assistência judiciária (permitindo maior controle da atividade das Defensorias Públicas ou correlatos), a maior eficácia do mandado de injunção pelo efeito da decisão como sentença normativa para o caso concreto (assim delimitando o alcance da regulamentação às partes requerentes), a exigência de limitação dos valores das taxas judiciárias e custas processuais e a obrigatoriedade da assistência judiciária pelo Estado, a quebra de privilégios processuais às pessoas jurídicas de direito público, e a vedação de lei ou ato normativo para impedir ou limitar os efeitos de decisões cautelares, liminares ou antecipatórias (assim impedindo a prática de edição de medidas provisórias no interesse do Estado, ou leis similares).

Das propostas, apenas vingou o agora inciso LXXVIII ao artigo 5º, que estabelece a garantia de razoável duração do processo e os meios para permitir a celeridade da tramitação processual. Logo, cabe notar, o mais programático dos dispositivos sugeridos, que exigirá toda a regulamentação para definir e tornar eficaz a garantia enunciada.

Afinal, qual é a razoável duração do processo? Quais são os meios para garantir a celeridade na tramitação processual?

Apenas a lei poderá dizer, e não haveria necessidade da norma constitucional para que o legislador enunciasse regras tendentes à celeridade processual.

Há que se ter em consideração que o próprio artigo 5º da Constituição já enuncia, no inciso LV, que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes".

Assim, qual o limite de regulamentação do novo inciso LXXVIII de modo a não colidir com a garantia do contraditório e da ampla defesa contida no inciso LV, todos do artigo 5º, da Constituição Federal?

Não há resposta razoável sem atingir um ou outro preceito na discussão. Por isso que a norma parece um tanto inócua.

Verdade seja dita, muito da paralisação judiciária advém da falta de juízes e servidores, com vagas sem preenchimento, a par dos constantes concursos realizados, e da falta de recursos materiais, mais que os entraves estabelecidos pelas normas processuais que, embora existentes, poderiam, utopicamente, ser ultrapassados se houvesse condições humanas de julgamento do volume apresentado cotidianamente aos Fóruns e Tribunais brasileiros.

São poucos os juízes, embora muitos os processos.

Como exemplo disso, cabe citar os Juizados Especiais que, embora dotados de legislação processual específica e eficiente, começam a sofrer as mazelas da falta de recursos humanos e materiais, resultando na indevida retenção de processos pela mera constatação de que não basta um procedimento célere se faltam juízes para aplicar a norma processual adequadamente.

Por isso, embora seja salutar o princípio aprovado, pouco resulta do dispositivo descrito para consubstanciar uma alteração do contexto judiciário, ensejando, assim, inequívoca frustração na Reforma que se esperava no plano constitucional.

A celeridade processual, no âmbito judicial, envolve a alteração da dinâmica dos julgamentos, com a alteração das leis processuais e, ainda, a ampliação dos quadros de magistrados e atualização dos quadros atuais, demonstrando a necessidade de alteração dos conceitos para alcançar-se a devida prestação jurisdicional a tempo razoável, caminho que também deve alcançar o âmbito administrativo, à qual a norma constitucional, embora programática apenas, também se dirige.

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Sobre o autor
Alexandre Nery de Oliveira

Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO). Pós-Graduado em Teoria da Constituição. Professor de Processo do Trabalho.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Alexandre Nery. Comentários à reforma do Judiciário (II).: Direitos processuais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1389, 21 abr. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9765. Acesso em: 19 abr. 2024.

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