"Confia ao Senhor todas as tuas obras e os teus planos serão bem-sucedidos." Provérbios 16.3
1 INTRODUÇÃO
No pós-guerra, no Brasil, assistiu-se ao recrudescimento da torrente demográfica oriunda do Nordeste rumo ao Rio, a São Paulo e a Brasília então em construção. Nesses centros seria formado um exército de serventes de pedreiro, caracterizado pelo trabalho precário e aleatório. Foram as mãos desses trabalhadores que procederam à verticalização de São Paulo e do Rio de Janeiro, especialmente nos anos em que se criou o epíteto paraíba de obra.
Nesse sentido, a elaboração de normas na área de segurança e saúde no trabalho é resultado de anos de experiência acumulados, durante os quais se assistiu a um grande número de vidas sendo ceifadas pelos acidentes de trabalho em canteiros de obras e nos demais setores produtivos.
Por sua vez, acidentes e doenças do trabalho associam-se em geral a práticas precárias de gestão empresarial.
Em virtude disso, a legislação nacional sobre segurança e saúde no trabalho, principalmente, a aplicada ao ramo da indústria da construção, tem sido revisada de tempos em tempos, a fim de alcançar a melhoria nas condições de trabalho, evitando-se acidentes e doenças ocupacionais.
O núcleo normativo em segurança e saúde na indústria da construção é a Norma Regulamentadora nº 18 do Ministério do Trabalho (NR-18), que, desde a sua publicação, em 1978, sofreu vinte e quatro alterações pontuais e duas grandes reformulações, estas em 1995 e em 2020.
Com o incremento efetivo de novas tecnologias nos processos construtivos, como alvenaria estrutural, paredes concretadas in loco, estruturas de formas metálicas, formas deslizantes, dentre outras, identificou-se que a cada dia aumentavam as lacunas no texto normativo da até então NR-18, o que dificultava a sua aplicação, uma vez que era detalhista em regramentos técnicos, mas carente no aspecto da gestão, pois se limitava à exigência da elaboração do Programa de Condições e Meio Ambiente de Trabalho na Industria da Construção Civil (PCMAT).
Sendo assim, o objetivo da última revisão da NR-18, realizada em 2020, foi construir uma norma mais enxuta e que não especificasse detalhamentos de sua aplicação, em um passo a passo, mas, sim, um texto com ênfase na gestão de segurança e saúde no trabalho e que permitisse mais liberdade aos profissionais legalmente habilitados e qualificados que atuam no seguimento.
Ademais, a atual NR-18 está em consonância com o novo texto da NR-01, que é uma norma geral e de gestão de segurança e saúde no trabalho, contemplando o gerenciamento de todos os riscos ocupacionais da organização, no caso em estudo, canteiros de obras e frentes de trabalho.
Feitas essas considerações, o objetivo do presente artigo é evidenciar a essência da NOVA NR-18, prospectar o cerne do seu texto atual, apresentando, para tanto, um panorama da indústria da construção no Brasil, a importância da administração para as organizações, a gestão de segurança e saúde no trabalho como manifestação do princípio do não improviso e o programa de gestão de riscos ocupacionais na indústria da construção civil como consagração do mencionado princípio neste ramo de atividade.
2 O PANORAMA DA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO NO BRASIL
São várias as classificações encontradas na literatura especializada para sistematizar a indústria da construção em subsetores. Uma das classificações mais comumente utilizadas compartimenta esse segmento em três campos de atuação: construção pesada, montagem industrial e edificações.
As atividades de construção pesada abrigam as obras de infraestrutura viárias, urbanas e industriais; obras estruturais, obras de arte e de saneamento; barragens hidroelétricas e usinas atômicas.
A montagem industrial compreende a montagem de estruturas para a instalação de indústrias, de sistemas de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica; de sistemas de telecomunicações e de sistemas de exploração de recursos naturais.
O subsetor de edificações, por sua vez, responde pela construção de edifícios residenciais, comerciais e industriais, a realização de segmentos de obras por especialização em uma fase do processo construtivo e, ainda, a execução de serviços complementares à edificação.
A indústria da construção é um segmento de grande importância para o desenvolvimento econômico e social do pais, visto que nesse setor se concentram atividades importantes para a economia do Brasil. No entanto, o número de acidentes de trabalho que ocorrem nesta indústria é expressivo.
Dessa forma, torna-se relevante apresentar o cenário da indústria da construção no Brasil, identificando as características deste setor que contribuem para o alto índice de acidentes e a necessidade de implementação de políticas constantes de proteção e saúde do trabalhador.
A indústria da construção apresenta características bem peculiares, as quais a diferencia de outros segmentos, dentre eles se destaca uma bem marcante, que é a informalidade dos vínculos de trabalho, uma vez que a grande maioria dos trabalhadores não são registrados, visto que muitos trabalham por conta própria.
No ano de 2020, a construção civil foi responsável por 7,31% das pessoas ocupadas no país, ou seja, 6,86 milhões de um total de 93,8 milhões de trabalhadores. A informalidade alcança 34,99 milhões de pessoas no Brasil, sendo que 4,33 milhões estão no setor da construção civil. [1]
Essa estatística é preocupante, uma vez que as condições de trabalho na informalidade são, geralmente, mais perigosas. Isto se deve, sobretudo, à ausência de proteção legal assegurada pela formalização do contrato de trabalho, que contribui para a negligência da segurança no trabalho e consequente aumento do número de acidentes. [2]
Além da informalidade dos vínculos, cujo contingente de trabalhadores independentes e de assalariados não-registrados é expressivo, há também a alta instabilidade no setor, causada pelo regime particular de emprego, que apresenta grande rotatividade, influenciando negativamente na segurança no trabalho.
Em um levantamento do Ministério da Economia, em uma escala de 0 a 10 (sendo 10 o maior nível da taxa de rotatividade), a construção civil possui um nível de 4,9, sendo a média geral nacional de 3,8. Nesse cenário, o setor da construção civil é o terceiro maior em rotatividade de colaboradores no país. Esse alto índice do chamado turnover fluxo de entradas e saídas de funcionários em uma empresa - pode contribuir também para uma baixa produtividade, falta de qualidade, atrasos e prejuízos em projetos de construção civil. [3]
A grande rotatividade nesse setor, o emprego excessivo da mão de obra terceirizada e a precarização existente no trabalho são fatores que dificultam a implantação de uma política de gestão de segurança e saúde no trabalho para esta atividade.
As construtoras, visando reduzir o custo do trabalho e maximizar a eficácia produtiva nos canteiros de obras, implantam medidas de descentralização de um número crescente de tarefas, em condições precárias e menos protegidas. Com isso, estabelece-se um segundo mercado de trabalho, sem direitos trabalhistas e previdenciários, em que os riscos de acidentes de trabalho e doenças profissionais são potencializados. [4]
A indústria da construção enfrenta as variações do mercado e as políticas econômicas do governo, caracterizadas por ciclos econômicos bem marcados por períodos de grandes demandas e por quedas na produção e na demanda repentinas, dificultando uma garantia de perenidade nas políticas estabelecidas pelas empresas.
Dentre as principais características da atividade, pode-se citar:
a) heterogeneidade do produto final;
b) temporariedade do estabelecimento;
c) alta rotatividade de mão de obra;
d) concorrência de atuação de várias empresas no mesmo estabelecimento;
e) provisoriedade das instalações e postos de trabalho;
f) falta de tradição de elaboração de projetos de segurança;
g) grande variabilidade das condições de trabalho;
h) baixo grau de industrialização;
i) reduzido nível de organização do trabalho e de produtividade;
j) alto índice de desperdício de materiais e horas trabalhadas;
k) forte incidência de doenças e acidentes relacionados ao trabalho.
Com relação a ocorrência de acidentes na indústria da construção o grau de incidência é bem alto, até por que é uma área que oferece muito risco para o trabalhador, demandando uma política de gestão constante na aplicação de medidas de segurança e proteção da saúde do trabalhador.
De acordo com dados do Observatório Digital de Segurança e Saúde do Trabalho, o setor da construção civil, mais especificamente a construção de edifícios, é o quinto setor com maior índice de acidentes do trabalho dentre os mais de 600 setores econômicos analisados, ficando atrás apenas dos setores de transporte rodoviário de cargas, administração pública em geral, comércio varejista e atividades de atendimento hospitalar. [5]
Estando entre os setores com maiores índices de acidentes no Brasil, fica evidente a negligência na segurança do trabalho nas construções. Cabe ainda ressaltar que, em muitos casos, não há a emissão da Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT). De acordo com dados do Observatório de Segurança e Saúde do Trabalho, no ano de 2018, aproximadamente 24,7% dos acidentes de trabalho de todos os setores econômicos do Brasil foram subnotificados, logo, o número real de acidentes ocorridos é maior do que o contabilizado nas pesquisas.
De acordo com dados coletados entre os anos de 2012 e 2020, pelo Observatório Digital de Saúde e Segurança do Trabalho, é possível observar que a construção de edifícios possui maior representatividade no que tange ao número de acidentes do trabalho. Por conseguinte, a incorporação imobiliária, a construção de rodovias e ferrovias, as obras de terraplenagem e as obras de urbanização.
Ao analisar os tipos de ocupação do setor da construção civil que mais têm acidentes notificados, verifica-se que a ocupação de servente de obras é responsável por cerca de 38% dos acidentes. Os serventes pertencem ao segmento que tem os menores salários entre todos os da indústria da construção civil, além do alto índice de rotatividade e realização de trabalho em hora extra. [6]
Não obstante os fatores relacionados aos acidentes de trabalho na indústria da construção no Brasil já apontados, três dos principais fatores de acidentes encontrados nestes ambientes de trabalho, nos canteiros de obras, são agora apresentados.
Neste sentido, os acidentes por queda de trabalhador, choque elétrico e soterramento, que grassam na construção civil, são apenas sintomatológicos, uma vez que suas reais causas podem ser creditadas, na maioria dos casos, à falta de planejamento na área de saúde e segurança do trabalho na obra. [7]
No Brasil muitos equipamentos sem manutenção adequada, velhos e obsoletos continuam em funcionamento por meio de gatilhos, gambiarras ou soluções improvisadas, que provocam o que os ergonomistas chamam de modo degradante de produção e afetam as condições de segurança.[8]
O autor deste estudo tem constatado, no exercício de suas funções institucionais como Auditor-Fiscal do Trabalho que, não raras vezes, na indústria da construção, o mesmo canteiro de obras que se preocupa em elaborar e implementar um projeto estrutural e arquitetônico, imprescindível ao planejamento da obra e ao atendimento das determinações da legislação federal, estadual e municipal, não tem tido igual empenho na elaboração dos projetos de segurança do trabalhador, em virtude do que as ações relativas à sua segurança são relegadas ao plano da improvisação.
Do panorama ora apresentado, verifica-se que o setor da construção civil é caracterizado por um alto índice de informalidade de seus trabalhadores, possui um alto nível de taxa de rotatividade em relação aos demais setores econômicos nacionais, e é o quinto setor com maior número de acidentes de trabalho no país, sendo que, dentre os fatores aqui apresentados e relacionados aos acidentes na indústria da construção, o principal e determinante fator de acidente é o improviso.
A indústria da construção é, desta forma, uma das atividades onde mais ocorrem acidentes fatais e não fatais, demandando ações que garantam locais de trabalho mais saudáveis e seguros. Para tanto, há necessidade de se combater as soluções improvisadas nesta atividade com ações preventivas de gestão de segurança e saúde no trabalho, focadas nos fatores de risco causadores de acidentes.
3 PRINCÍPIO DO NÃO IMPROVISO E GESTÃO DE SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO
As organizações têm enfrentado problemas quanto ao desempenho diante das constantes mudanças ocorridas no cenário competitivo. Cada vez mais os estudiosos e administradores estão em busca de modelos para melhorar o desempenho organizacional.
Atualmente, o mercado passou a exigir que as organizações agreguem a seus produtos e serviços o comprometimento no atendimento a padrões de normas internacionais de qualidade, sustentabilidade ambiental e proteção à integridade física e à saúde de seus trabalhadores. Assim, o gerenciamento das questões ambientais e de saúde e segurança no trabalho, com foco na prevenção de acidentes e no tratamento dos problemas potenciais, passaram a ser vitais para a sobrevivência do empreendimento.[9]
O Sistema de Gestão de Saúde e Segurança do Trabalho é parte integrante de um sistema de gestão de toda e qualquer organização, que proporciona um conjunto de ferramentas que potencializam a melhoria da eficiência da gestão dos riscos em saúde e segurança no trabalhado, relacionados com todas as atividades da organização.
Os sistemas de gestão de saúde e segurança no trabalho estão normalmente apoiados em políticas com uma visão mais generalista. Um exemplo de política generalista é apresentado pela OIT (ILO-OSH 2001), que possui um espectro amplo de aplicações em organizações de diferentes nacionalidades, porém não contempla, de forma detalhada, as orientações necessárias para o estabelecimento de um programa ou sistema voltado à gestão da saúde e segurança do trabalhado, cujo papel tem sido assumido por normas mais específicas em cada país, como, por exemplo, a OHSAS 18001 e a norma BS 8800.
Cada organização deve refletir, a partir de seu porte e da natureza de seus riscos, e adequar os aspectos referidos, em face de suas características e especificidades, com o propósito de definir, tornar efetiva, rever e manter a política de saúde e segurança do trabalhador da organização, com base que poderá definir e estabelecer: a estrutura operacional, as atividades de planejamento, as responsabilidades, as práticas, os procedimentos, os processos e os recursos.[10]
Definida a política da saúde e segurança do trabalhador, a organização deve desenhar um sistema de gestão que englobe desde a estrutura operacional até a disponibilização dos recursos, passando pelo planejamento, pela definição de responsabilidades, pelas práticas, pelos procedimentos e processos, aspectos decorrentes da gestão e que atravesse horizontalmente toda organização.
O sistema deve ser orientado para a gestão dos riscos, devendo assegurar a identificação de perigos, a avaliação e o controle dos riscos.
Durante a implantação de sistemas de gestão de saúde e segurança do trabalhador a organização deve atentar para quatro atividades básicas: o planejamento, a implementação e operação, a verificação e as ações corretivas. Esses quatro blocos de atividades são baseados na metodologia do ciclo PDCA, como transcrito a seguir: Plan (planejar) é estabelecer os objetivos e processos necessários para atingir os resultados de acordo com a política de saúde e segurança no trabalho; Do (fazer) é a atividade de implementar processos; Check (verificar) trata-se de monitorar e medir os processos em relação à política e aos objetivos de saúde e segurança no trabalho, aos requisitos legais e outros e relatar os resultados; e Act (agir) como a atividade de executar ações para melhorar continuamente o desempenho nesta área.[11]
A grande vantagem da utilização da metodologia PDCA está no sentido de promover a melhoria contínua da gestão em saúde e segurança no trabalho.
A alta direção da organização deve aprovar uma política de saúde e segurança no trabalho. A política deve incluir comprometimento com a prevenção de lesões e doenças, a melhoria contínua da gestão e desempenho nesta área, o atendimento aos requisitos legais aplicáveis e outros requisitos pela organização que se relacionem aos perigos para a saúde e segurança do trabalhador.
A política deve ser comunicada a todas as pessoas que trabalham na organização, com o intuito de que tenham ciência de suas obrigações individuais em relação às questões da saúde e segurança do trabalhador.
Os procedimentos para a identificação de perigos e para a avaliação de risco devem considerar uma série de fatores, quais sejam: as atividades de rotina e não rotineiras de todas as pessoas que tenham acesso aos locais de trabalho, a identificação de perigos originados fora dos locais de trabalho, as mudanças na organização, em suas atividades ou materiais, as modificações no sistema de gestão de saúde e segurança do trabalho, qualquer obrigação legal aplicável relacionada à avaliação de riscos e implementação dos controles necessários e a disposição das áreas de trabalho, processos, instalações, máquinas e equipamentos, procedimentos operacionais e organização do trabalho.
A metodologia da organização para a identificação de perigos e para a avaliação de risco deve fornecer subsídios para a identificação, priorização e documentação dos riscos, bem como para a aplicação dos controles.
A organização deve assegurar que os resultados dessas avaliações sejam levados em consideração quando da determinação dos controles e, ainda, documentar e manter atualizados os resultados da identificação dos perigos, da avaliação de riscos e dos controles determinados.
Deve-se considerar, também, que a organização deve implementar objetivos de saúde e segurança do trabalho documentados nas funções e níveis pertinentes. Os objetivos devem ser mensuráveis, sempre que possível, e consistentes com a política de saúde e segurança no trabalho.
Esses objetivos devem ser atingidos com a implementação de programas voltados para este fim. Os programas devem incluir a atribuição de responsabilidade, os meios e o prazo para os objetivos serem atingidos.
Outro item a ser atendido pela organização é a identificação dos requisitos legais aplicáveis e outros eventualmente subscritos, relacionados à saúde do trabalhador. Para sua efetivação, a organização deve comunicar as informações sobre estes requisitos legais às pessoas que trabalham sob seu controle e às outras partes interessadas.
Neste sentido, o Ministério do Trabalho exerce tanto a regulamentação de leis sobre a saúde do trabalhador, quanto o controle de sua aplicação, visando garantir sua efetivação.
O núcleo normativo em vigor no Brasil sobre a proteção jurídica à segurança e saúde do trabalhador está concentrado nas Normas Regulamentadoras, baixadas por intermédio de Portarias do Ministério do Trabalho, em decorrência de delegação normativa expressa na CLT e outras leis ordinárias e têm plena eficácia normativa, como aliás já decidiu diversas vezes o STF (ADI ns. 360-7, 996, 1.258, 1.347, 1.388, 1.670, 1.946, 2.398, dentre outras).
Desta forma, o Ministério do Trabalho, por meio da Secretaria de Inspeção do Trabalho, considerando o disposto no art. 200 da CLT, com redação dada pela Lei n. 6514, de 22.12.1977, instituiu a Portaria n. 3.214, de 8.6.1978, que aprova as Normas Regulamentadoras (NRs) do Capítulo V, Título II, da CLT, relativas à segurança e saúde do trabalhador.
As 37 (trinta e sete) Normas Regulamentadoras, relativas à segurança e à medicina do trabalho, são de observância obrigatória pelas empresas privadas e públicas e pelos órgãos públicos da Administração direta e indireta, bem como pelos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário, que possuam empregados regidos pela CLT.
Neste esteio, foi instituído em 1994, por exigência legal, o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) - NR-09, agora revogado, que deveria ser elaborado e implementado por todos os empregadores e instituições que admitissem trabalhadores como empregados.
O PPRA tinha por objetivo monitorar os agentes físicos (ruído, vibrações, umidade, calor, frio, radiações e pressões anormais), químicos (gases, vapores, fumos, poeiras, névoas, neblinas) e biológicos (vírus, bacilos, bactérias, protozoários, parasitas, fungos).
O PPRA possuía quatro pontos básicos: antecipação, reconhecimento, avaliação e controle dos riscos.
O PPRA deveria conter um planejamento (com metas, prioridades e cronogramas), avaliação ambiental geral, avaliações ambientais parciais, treinamentos, auditorias, análise crítica do programa e a forma do registro, manutenção e divulgação dos dados, cujas ações deveriam ser integradas ao Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) - NR-07.
O PCMSO, agora revisado e com nova redação, foi criado pela Portaria n. 24 de 29.12.1994. A portaria previa a obrigatoriedade da elaboração e implementação desse programa por parte dos empregadores e instituições, com o objetivo de promover e preservar a saúde do conjunto dos seus trabalhadores.
Existiam outros programas, de cumprimento obrigatório pelo empregador, relacionados à segurança e à saúde do trabalhador e os mais utilizados eram: PCMAT, o Programa de Conservação Auditiva (PCA) e o Programa de Proteção Respiratória (PPR).
Os programas de prevenção instituídos há época representavam e ainda representam avanço na relevante questão da saúde dos trabalhadores. A própria denominação utilizada (programa) indica sintonia com o que prevê o art. 4º da Convenção n. 155 da OIT, ratificada pelo Brasil, que preconiza que todo Estado-Membro signatário deverá formular, pôr em prática e reexaminar periodicamente uma política nacional coerente em matéria de segurança e saúde dos trabalhadores e o meio ambiente de trabalho.[12] Os programas indicam, portanto, um conjunto de objetivos que dão forma à ação governamental coordenada e coerente na busca da saúde dos trabalhadores.
Retomando, para se concluir, o ponto sobre o ciclo PDCA e os requisitos da OHSAS 18001:2007, é imprescindível se repisar que a alta administração deve rever o sistema de gestão em saúde e segurança do trabalho da organização, em intervalos planejados, para assegurar sua contínua adequação, pertinência e eficiência. Estas revisões devem incluir a avaliação de oportunidades de melhoria e a necessidade de alterações no sistema de gestão em saúde do trabalhador, incluindo uma política nesta área e os seus objetivos. Os registros das revisões pela alta administração devem ser mantidos na organização.
A análise crítica realizada pela direção deve ser coerente com o comportamento da organização com a melhoria contínua e deve incluir quaisquer decisões e ações relacionadas a possíveis mudanças no desempenho, nos recursos, nos objetivos e na política de saúde e segurança no trabalho.
Atualmente não se discute mais quanto à importância dos sistemas de gerenciamento da qualidade, meio ambiente e segurança e saúde do trabalho. Entretanto, o desafio é realizar a integração entre esses sistemas.
O Sistema Integrado de Gestão tem permitido integrar os processos de qualidade com os de saúde e segurança, gestão ambiental e responsabilidade social. Entretanto, a gestão se torna complexa à medida que a organização tem diversos processos.
Os processos produtivos geram produtos desejáveis pela organização e clientes e os produtos indesejáveis, como poluentes, resíduos e condições inseguras, que podem impactar negativamente o ambiente, a sociedade, a saúde e segurança dos empregados. O gerenciamento desses dois aspectos do processo produtivo será extremamente facilitado se o gestor dispuser de um sistema de gestão único, que trate de questões relativas à qualidade, ao meio ambiente, à segurança e à responsabilidade social do seu processo.[13]
A integração dos sistemas de gestão apresenta uma série de vantagens, das quais três devem ser aqui destacadas: abordagem holística para o gerenciamento dos riscos organizacionais ao assegurar que todas as consequências de uma determinada ação sejam consideradas, melhoria na comunicação ao utilizar um único conjunto de objetivos e uma abordagem integrada e, ainda, melhoria no desempenho organizacional ao estabelecer uma única estrutura para aperfeiçoar a qualidade, o meio ambiente, a responsabilidade social e a saúde e segurança do empregado, ligada aos objetivos corporativos.
4 A NOVA NR-01 SOBRE GERENCIAMENTO DE RISCOS OCUPACIONAIS E O PRINCÍPIO DO NÃO IMPROVISO
O novo texto da NR-01, contemplando o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO), materializado no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), consolidado por consenso entre as bancadas do Grupo Técnico de Trabalho (GTT), não só materializa um anseio que permeou os vinte e cinco anos de discussão tripartite, como possibilita um inegável avanço na segurança e saúde no trabalho, quando contempla o gerenciamento de todos os riscos ocupacionais da organização.[14]
Não só a abrangência, alcançando todos os perigos e riscos, mas a previsão de uma sistematização do processo de identificação de perigos, avaliação dos riscos e estabelecimento de medidas de controle, este articulado com ações de saúde, de análise de acidentes e de preparação para emergências representa uma abordagem integradora do processo alinhada às melhores práticas mundiais.
Destaca-se que, a NR-01 foi atualizada para que contemple todo amplo processo de gerenciamento de riscos ocupacionais num PGR, sendo que a estruturação normativa segue a abordagem adotada pelo PDCA (Plan, Do, Check and Act), largamente utilizada nos sistemas de gestão compulsórios ou voluntários.
Para a construção do GRO foram utilizadas diversas fontes e referências nacionais e internacionais, principalmente as normas de sistema de gestão em segurança e saúde do trabalho: BS 8800, OHSAS 18001 e ISO 45001.
A possibilidade de se estabelecer um padrão ou um sistema de gestão surgiu inicialmente com as normas da série ISO 9000 (normas de gestão da qualidade) e, posteriormente, com a série ISO 14000 (normas de gestão ambiental). Estas normas são passíveis de certificação de conformidade do sistema, por organismos acreditados.
Ao longo do tempo, a OHSAS 18001 será substituída pela ISO 45001, sendo que, as organizações que eram certificadas pela OHSAS 18001 deveriam migrar para a ISO 45001 até março de 2021, para manterem uma certificação reconhecida.
A ISO 45001 foi lançada com o objetivo de padronizar os conceitos estruturais da ISO 90011 e da ISO 14001. Em geral, a maioria dos requisitos estabelecidos pela OHSAS 18001 foram preservados na ISO 45001.
Apenas a título ilustrativo é importante se registrar que é a norma ISO 45001 que orienta, por meio de exemplos, os mecanismos para a adoção da hierarquia de controles e propõe ações para tratar os riscos:
a) eliminação dos riscos - adaptação do trabalho para evitar os riscos. Por exemplo, integrar saúde, segurança e ergonomia no planejamento de novos locais de trabalho e criar separação física do tráfego entre pedestres e veículos;
b) substituição - substituir o que é perigoso pelo que é isento de perigo ou menos perigoso. Por exemplo, substituir tinta à base de solvente por tinta à base de água;
c) controles de engenharia - implementação de medidas de proteções coletivas. Por exemplo, sistema de exaustão, isolamento de máquinas e equipamentos;
d) controles administrativos - fornecimento de procedimentos adequados, treinamentos, controle de acessos;
e) proteção individual - fornecimento, controle e gerenciamento de equipamento de proteção individual.
Feita esta breve digressão e fora desse processo de normas internacionais ISO, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) decide em nível internacional elaborar em 2001 um documento de diretrizes voluntárias sobre os Sistemas de Gestão da Segurança e Saúde do Trabalho (SST), documento que reflete os valores e instrumentos pertinentes da OIT para a proteção da segurança e a saúde dos trabalhadores.
Dentro de uma abordagem tripartite, a OIT elaborou um guia que proporciona uma visão em nível nacional, que deveria servir para criar uma estrutura nacional para o sistema de gestão da SST, que preferencialmente contivesse o apoio das leis nacionais e regulamentos vigentes no país. Portanto, trata-se de obter bases adequadas para o desenvolvimento de uma cultura nacional sustentável de segurança no país signatário.
Portanto, em ordem cronológica de divulgação, tem-se a BS 8800, a OHSAS 18001, o Guia da OIT e por fim a ISO 45001.
Em 2009, a então Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) constitui um Grupo de Estudos Tripartite para a elaboração de uma NR para a Gestão da Segurança e Saúde no Trabalho. O grupo desenvolve um texto técnico básico, que é apresentado em 24 de novembro de 2010 na Comissão Tripartite Paritária Permanente (CTPP).
Esse texto técnico básico da proposta de uma Norma Regulamentadora para a Gestão da Segurança e Saúde no Trabalho serviu como referência para a construção do Gerenciamento de Riscos Ocupacionais.
Para a implementação do PGR, a organização deve analisar as suas atividades laborais e aplicar os processos do GRO.
De acordo com a norma da ABNT NBR ISO/IEC 31010, todas as atividades de uma organização envolvem riscos que devem ser gerenciados. O processo de gestão de riscos auxilia a tomada de decisão, pois leva em consideração as incertezas e a possibilidade de circunstâncias ou eventos futuros, intencionais ou não. [15]
A gestão de riscos inclui a aplicação de métodos sistemáticos para:
a) comunicação e consulta ao longo de todo processo;
b) estabelecimento do contexto para identificar, analisar, avaliar e tratar o risco associado a qualquer atividade, processo, função ou produto;
c) monitoramento e análise crítica de riscos;
d) reporte e registro dos resultados de forma apropriada.
Os itens citados anteriormente fazem parte da estruturação de um sistema de gestão ocupacional e estão incluídos na OHSAS 18001 e ISO 45001.
A análise de riscos deve considerar as causas e fontes de ameaças, suas consequências (severidade) e a probabilidade de ocorrência.
Existem vários métodos de avaliação de risco e a organização é responsável por definir aquele que melhor se adequa às características de seus processos.
O sucesso de uma gestão de risco depende diretamente do processo de avaliação dos riscos. É nessa etapa que as organizações conseguem identificar a totalidade de seu cenário e tomar decisões para neutralização, eliminação ou controle de riscos. As medidas corretas a serem adotadas dependem de um bom diagnóstico.
Ressalta-se que os processos obrigatórios do GRO são materializados no documento denominado de PGR, que é composto pelo Inventário de Riscos Ocupacionais e pelo Plano de Ação.
A organização deve implementar a gestão dos riscos ocupacionais por estabelecimento e a seu critério o PGR pode ser implementado por unidade operacional, setor ou atividade.
Nesse sentido, a organização pode operacionalizar a implantação do PGR por unidades dentro do estabelecimento. Caso a organização possua diversas unidades dentro do estabelecimento, o PGR pode ser implementado separadamente. Além disso, o PGR pode ser ainda implementado por áreas mais restritas da organização: por unidade operacional, setor ou até mesmo por atividade.
O PGR deve fazer interfaces com outras Normas Regulamentadoras e contemplar ou estar integrado com planos, programas, projetos e outros documentos previstos na legislação de Segurança e Saúde no Trabalho.
Destaca-se que outras Normas Regulamentadoras estão sendo atualizadas e já contemplando a integração com o PGR, como é o caso da NR-07 e da NR-09, que, dentre outras congêneres, são Normas Regulamentadoras generalistas, que sustentam o sistema. São a base da implantação e definem quais são as necessidades iniciais do sistema. Em geral, estabelecem diretrizes de caráter geral que darão suporte às demais ações específicas, constantes, inclusive, de Normas Regulamentadoras específicas.
Cabe ao empregador analisar a operacionalização do GRO, avaliar se o mesmo está sendo plenamente implementado e se continua adequado e eficaz para atender à legislação.
Nesse sentido, de tempos em tempos, o empregador deve coletar todas as informações necessárias para permitir que a sua administração faça uma correta avaliação do GRO, não somente do Plano de Ação, mas de todos os elementos do GRO, determinando o compromisso com a sua melhoria contínua.
Para tanto, deve-se buscar com o empregador evidências de que ele têm informações detalhadas sobre o GRO, no mínimo dos seguintes tópicos: adequação dos processos de identificação de perigos, avaliação e controle dos riscos ocupacionais; atualização do Inventário de Riscos Ocupacionais; implementação e acompanhamento do Plano de Ação; acompanhamento da saúde ocupacional dos trabalhadores; estatísticas de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho; resultados de auditorias fiscais do trabalho já realizadas; ações corretivas realizadas no GRO; relatórios de emergências (reais ou simuladas), bem como o estado da preparação para situação de emergência; melhorias no sistema do GRO (por exemplo, novas iniciativas a serem introduzidas ou expansão das iniciativas existentes); definição das responsabilidades individuais de cada trabalhador com relação ao GRO; atualização dos níveis atuais de risco e a eficácia das medidas de controle existentes; a eficácia do processo de inspeção de segurança; e, resultados de investigações de acidentes ou doenças relacionadas ao trabalho.
A organização deve preparar um plano de ação de controle de risco para lidar com quaisquer assuntos encontrados pela avaliação, seja para introduzir, aprimorar ou manter os controles existentes eficazes.
Basicamente, dentro desse Plano de Ação, deve ser definido cronograma, formas de acompanhamento e aferição de resultados das medidas de prevenção.
Em primeiro lugar, o GRO contém as obrigações para os empregadores e empregados. No caso das organizações, os pontos mais importantes são os seguintes:
a) identificar e evitar riscos ocupacionais;
b) avaliar os riscos ocupacionais e indicar o nível de risco;
c) fazer a classificação desses riscos e verificar a necessidade de medidas preventivas;
d) implementar e acompanhar as medidas preventivas, de acordo com a legislação.
Logo após, a própria NR-01 regulamenta os componentes mais relevantes do GRO:
a) levantamento preliminar mapeamento dos riscos ocupacionais em ambientes, métodos de trabalho e técnicas antes do início das atividades;
b) identificação de perigos detalhamento dos riscos existentes, suas fontes e grupos de trabalhadores expostos a eles;
c) avaliação de riscos discriminação dos riscos em graus, de acordo com o potencial de cada perigo existente no ambiente de trabalho;
d) inventário de riscos documentação dos riscos ocupacionais, formando um catálogo;
e) controle dos riscos preparação para emergências, medidas preventivas, monitoramento, plano de ação, análise de ocorrências.
Durante a implementação, a empresa passará de um modelo reativo para atividades preventivas e proativas de redução dos riscos ocupacionais. Afinal, o objetivo é evitar que os acidentes e doenças aconteçam na organização.
E quem deve elaborar o PGR ou qual é o profissional responsável por elaborar o PGR?
A resposta é encontrada no item 1.5.7.2 que esclarece que: Os documentos integrantes do PGR devem ser elaborados sob a responsabilidade da organização, respeitado o disposto nas demais Normas Regulamentadoras, datados e assinados.
Conforme consta no item acima, a responsabilidade pela elaboração do PGR é da organização, que deve demonstrar liderança e comprometimento com a gestão dos riscos ocupacionais e assegurar que todos os processos e documentos sejam executados e que os recursos necessários para estabelecer, implementar, manter e melhorar continuamente o GRO estejam disponíveis.
A organização pode designar um ou mais representantes específicos da administração (por exemplo, em grandes organizações, um membro da diretoria ou do comitê executivo) com a responsabilidade específica de assegurar que o GRO seja adequadamente implementado, documentado e operacionalizado conforme os requisitos em todos os locais e áreas de operação da organização.
Deve-se registrar que, de acordo com o item 18.4 da NR-18, o PGR deve ser elaborado e implantado em todos os canteiros de obras por profissional legalmente habilitado.
Do exposto, infere-se que, a partir da criação do PGR, todos os segmentos da economia brasileira, inclusive a indústria da construção, farão seus planos de acordo com as diretrizes estabelecidas na NOVA NR-01, independentemente da área em que a organização atue. Isso acaba com a duplicação de planos de prevenção, contempla o gerenciamento de todos os riscos ocupacionais, diminui a burocracia e deixa mais claras as regras que devem ser seguidas pelas organizações.
5 A NOVA NR-18 E O PRINCÍPIO DO NÃO IMPROVISO
Os sistemas de gestão de segurança e saúde no trabalho apresentados sinalizam a necessidade e a obrigação que as organizações têm de zelar pela preservação da integridade física e psíquica do trabalhador como direito fundamental, respaldado na Constituição Federal, art. 6º e art. 7º, XXII, em normas internacionais, Convenções da OIT, na CLT, Capítulo V, Título II, em inúmeras instruções normativas, Normas Regulamentadoras e portarias expedidas pelo Ministério do Trabalho.
O princípio do não improviso tem status supralegal e foi extraído das principais convenções da OIT que tratam da saúde do trabalhador. A Convenção n. 148 da OIT, ratificada pelo Brasil, no seu art. 15 assim determina:
Segundo as modalidades e nas circunstâncias que a autoridade competente determinar, o empregador deverá designar uma pessoa competente ou recorrer a um serviço especializado, exterior ou comum a várias empresas, para que se encarregue das questões de prevenção e limitação da contaminação do ar, o ruído e as vibrações no lugar de trabalho. [16]
O art. 5º, alínea d, da Convenção n. 161 sobre Serviços de Saúde do Trabalho, ratificada pelo Brasil, preconiza que:
Sem prejuízo da responsabilidade de cada empregador a respeito da saúde e a segurança dos trabalhadores que emprega e considerando a necessidade de que os trabalhadores participem em matéria de saúde e segurança no trabalho, os serviços de saúde no trabalho deverão assegurar as funções seguintes que sejam adequadas e apropriadas aos riscos da empresa para a saúde no trabalho: [...]
d) participação no desenvolvimento de programas para o melhoramento das práticas de trabalho, bem como nos testes e a avaliação de novos equipamentos, em relação com a saúde [...] (Grifo nosso).[17]
A Convenção n. 155 da OIT, ratificada pelo Brasil, no seu art. 5º, a, art. 11, a, art. 16, item 2, e art. 18 assim determina:
Artigo 5
A política à qual se faz referência no artigo 4 da presente Convenção (política nacional coerente em matéria de segurança e saúde dos trabalhadores e o meio ambiente de trabalho) deverá levar em consideração as grandes esferas de ação que se seguem, na medida em que possam afetar a segurança e a saúde dos trabalhadores e o meio ambiente de trabalho:
a) projeto, teste, escolha, substituição, instalação, arranjo, utilização e manutenção dos componentes materiais do trabalho (locais de trabalho, meio ambiente de trabalho, ferramentas, maquinário e equipamento; substâncias e agentes químicos, biológicos e físicos; operações e processos);
Artigo 11
Com a finalidade de tornar efetiva a política referida no artigo 4 da presente Convenção, a autoridade ou as autoridades competentes deverão garantir a realização das seguintes tarefas:
a) a determinação, quando a natureza e o grau de risco assim o requererem, das condições que regem a concepção, a construção e o acondicionamento das empresas, sua colocação em funcionamento, as transformações mais importantes que forem necessárias e toda modificação dos seus fins iniciais, assim como a segurança do equipamento técnico utilizado no tratado e a aplicação de procedimentos definidos pelas autoridades competentes;
Artigo 16
2. Deverá ser exigido dos empregadores que, na medida que for razoável e possível, garantam que os agentes e as substâncias químicas, físicas e biológicas que estiverem sob seu controle não envolvem riscos para a saúde quando são tomadas medidas de proteção adequadas.
Artigo 18
Os empregadores deverão prever, quando for necessário, medidas para lidar com situações de urgência e com acidentes, incluindo meios adequados para a administração de primeiros socorros. (Grifo nosso).[18]
Infere-se dos vocábulos grifados nos artigos da convenção transcrita acima que o planejamento das atividades a serem desenvolvidas no local de trabalho, inclusive a própria concepção do local, deve ser um imperativo da atividade preventiva no plano internacional.
A Diretiva n. 89/391 da União Europeia, no art. 6º, item 2, alínea g estabelece, como princípio geral, que o planejamento da prevenção deve buscar um conjunto coerente, que integre a técnica, a organização do trabalho, as condições de trabalho, as relações sociais e a influência dos fatores ambientais do trabalho.[19]
Deve-se registrar, ainda, que se encontra plasmado no art. 17, item 1, alínea c, da Convenção n. 167 da OIT sobre Segurança e Saúde na Construção, ratificada pelo Brasil, o princípio do não improviso, com clareza solar, ao preconizar que as instalações, as máquinas e os equipamentos, inclusive as ferramentas manuais, sejam ou não acionadas por motor, deverão: [...] c) ser utilizados exclusivamente nos trabalhos para os quais foram concebidos [...].[20] No Brasil, entretanto, muitos equipamentos sem manutenção adequada, velhos e obsoletos continuam em funcionamento por meio de gatilhos, gambiarras ou soluções improvisadas, que provocam o que os ergonomistas chamam de modo degradante de produção e afetam as condições de segurança.[21]
Como já foi mencionado, o autor deste estudo tem constatado, no exercício de suas funções institucionais como Auditor-Fiscal do Trabalho que, não raras vezes, na indústria da construção, o mesmo canteiro de obras que se preocupa em elaborar e implementar um projeto estrutural e arquitetônico, imprescindível ao planejamento da obra e ao atendimento das determinações da legislação federal, estadual e municipal, não tem tido igual empenho na elaboração dos projetos de segurança do trabalhador, em virtude do que as ações relativas à sua segurança são relegadas ao plano da improvisação.
Neste sentido, os acidentes por queda de trabalhador, choque elétrico e soterramento, que grassam na construção civil, são apenas sintomatológicos, uma vez que suas reais causas podem ser creditadas, na maioria dos casos, à falta de planejamento na área de saúde e segurança do trabalho na obra.
Sabe-se que, na indústria da construção civil, os projetos de segurança, como o projeto das proteções coletivas com suas especificações técnicas e o projeto das instalações elétricas provisórias, são indispensáveis à garantia da integridade física e saúde do trabalhador, e a sua ausência caracteriza improviso e, portanto, condição de risco grave e iminente à vida e saúde do trabalhador, que impõe a imediata paralisação de suas atividades, com fundamento no princípio da indisponibilidade da saúde do trabalhador.
Um exemplo emblemático do princípio do não improviso e da retenção do risco na fonte é a obrigatoriedade da elaboração do projeto das instalações elétricas provisórias para os canteiros de obras, sem o qual não é realizada a ligação de energia da obra pela concessionária de serviços elétricos no Estado da Paraíba. Esta medida foi adotada em virtude de um programa elaborado e executado pelo Comitê Permanente Regional (CPR) na Paraíba e intitulado Programa de Redução de Acidentes Elétricos na Indústria da Construção, o PRAE. Após seis anos da adoção da referida medida, o número de mortes por choques elétricos nos canteiros de obras em João Pessoa (PB) foi reduzido de modo vertiginoso.[22]
O grande trunfo desse programa é a mudança de mentalidade dos empresários que perceberam a economia de custos quando trocaram a cultura do improviso pela cultura do projeto de engenharia de segurança do trabalho, passando a combater o risco de acidente em sua fonte.
Segundo a Auditora-Fiscal do Trabalho em João Pessoa, Soraia di Cavalcanti Pinheiro, uma das coordenadoras do PRAE, de 2005 a 2011 ocorreram dois óbitos por choque elétrico, um em 2008 e outro em 2010. Antes, a cada dez acidentes na cidade, seis tinham como motivo o choque elétrico.
Ela destaca, porém, que o programa obteve êxito porque soube conduzir as empresas a uma mudança de mentalidade quanto à segurança e saúde do trabalhador.
A Auditora-Fiscal do Trabalho em João Pessoa, Soraia di Cavalcanti Pinheiro, ainda enfatizou:
Os empresários passaram a se interessar pelo projeto. Eles ainda achavam na época que o custo era alto para se fazer o projeto de engenharia de segurança. Com o tempo, uma das empresas fez um modelo de projeto com quadros móveis. As construções vão aumentando, a energia vai subindo, eles fizeram um modelo e a empresa verificou que com as instalações projetadas eles as aproveitariam em outras obras, com custo diluído. Eles começaram a entender que aquilo não era só gasto. As antigas gambiarras eram jogadas fora após o término da obra e com os atuais projetos não, pois há o reaproveitamento de tudo. É algo que pode ocorrer no médio e longo prazo. É uma mudança de mentalidade, de cultura e isso demora. O importante é começar a fazer.
A medida ora relatada contempla tanto o princípio da retenção do risco na fonte quanto o princípio do não improviso, e é fruto da análise de vários acidentes de trabalho ao longo dos anos, envolvendo choque elétrico nos canteiros de obra da Paraíba e que terminaram por apontar como causa determinante a falta de projeto das instalações elétricas provisórias. Depreende-se daí que só se retém o risco na fonte se são investigadas as fontes do risco, a fim de combatê-las em sua raiz.
Ainda merece registro o fato de que, até antes de entrada em vigor da NOVA NR-18, toda atividade desenvolvida na indústria da construção deveria ser precedida do correspondente PCMAT.
A antiga Norma Regulamentadora n. 18 do Ministério do Trabalho (NR-18) estabelecia diretrizes de ordem administrativa, de planejamento e de organização, que objetivavam a implementação de medidas de controle e sistemas preventivos de segurança nos processos, nas condições e no meio ambiente de trabalho na indústria da construção.
O PCMAT era de elaboração e cumprimento obrigatório para os estabelecimentos com 20 (vinte) trabalhadores ou mais, contemplando os aspectos da NR-18 e outros dispositivos complementares de segurança. Este Programa deveria contemplar as exigências contidas na antiga NR-09 - Programa de Prevenção e Riscos Ambientais, e deveria ser elaborado e executado por profissional legalmente habilitado na área de segurança do trabalho.
Para que o PCMAT fosse instrumento apto para a gestão de segurança do trabalhador na obra, ele deveria ser integrado, conforme a antiga NR-18, pelos seguintes itens: memorial sobre condições e meio ambiente de trabalho nas atividades e operações, levando-se em consideração riscos de acidentes e de doenças do trabalho e suas respectivas medidas preventivas; projeto de execução das proteções coletivas em conformidade com as etapas de execução da obra; especificação técnica das proteções coletivas e individuais a serem utilizadas; cronograma de implantação das medidas preventivas definidas no PCMAT; layout inicial do canteiro de obras, contemplando, inclusive, previsão de dimensionamento das áreas de vivência; e programa educativo contemplando a temática de prevenção de acidentes e doenças do trabalho, com sua carga horária.
Desta forma, não se pode negar que o PCMAT, assim como outros programas de prevenção instituídos representavam avanço na relevante questão da saúde dos trabalhadores. A própria denominação utilizada (programa) indica sintonia com o que prevê o art. 4º da Convenção n. 155 da OIT, ratificada pelo Brasil, que preconiza que todo Estado-Membro signatário deverá formular, pôr em prática e reexaminar periodicamente uma política nacional coerente em matéria de segurança e saúde dos trabalhadores e o meio ambiente de trabalho.[23]
Os programas indicam, portanto, um conjunto de objetivos que dão forma à ação governamental coordenada e coerente na busca da saúde dos trabalhadores.
Todavia, apesar de suas virtudes, esses programas, inclusive, o PCMAT, apresentam algumas deficiências, principalmente, por serem limitados e não alcançarem todos os riscos ocupacionais existentes no ambiente de trabalho.
Sendo assim, como já foi abordado, o novo texto da NR-01, contemplando o GRO, materializado no PGR, e o novo texto da NR-18, em perfeita consonância com o espírito da nova NR-01, não só materializam um anseio que permeou muitos anos de discussão tripartite (representantes de empregado, empregador e governo), como possibilitam um inegável avanço na segurança e saúde no trabalho, quando contemplam o gerenciamento de todos os riscos ocupacionais da organização, no caso, nos canteiros de obras.
6 A ATUAL ARQUITETURA DA NR-18
A NOVA NR-18 é uma norma setorial, pois trata de uma atividade econômica específica, a indústria da construção. Sendo assim, aplicam-se à indústria da construção, nos casos omissos, as disposições constantes das demais Normas Regulamentadoras da Portaria 3.214/1978 e suas alterações posteriores.
A atividade da indústria da construção abrange os seguintes seguimentos:
a) construção de edificações, que inclui as obras habitacionais, comerciais, industriais, de serviços e incorporação de empreendimentos imobiliários;
b) obras de infraestrutura que alcançam grandes obras como construção de rodovias, ferrovias, usinas, geração e transmissão de energia, urbanização, saneamento, sistemas de comunicação, infraestrutura e as chamadas obras de arte especiais como pontes, viadutos, túneis e passarelas;
c) serviços especializados para construção que compreendem atividades como demolição e preparação de terrenos, fundações, perfurações, sondagens, terraplanagens, acabamento bem como instalações elétricas e hidráulicas;
d) e as atividades e serviços de reparo, pintura, limpeza e manutenção de edifícios em geral e de manutenção de obras de urbanização.
O brilhante estudioso e expositor da área de segurança e saúde no trabalho Carlos Pontes, Auditor-Fiscal do Trabalho da Superintendência Regional do Trabalho da Paraíba, sistematizou a NR-18 como uma obra, cuja arquitetura se encontra embasada em cinco pilares, que, embora com focos distintos, se articulam e intercomplementam, sendo elas: gestão, técnico/operacional, procedimentos, conforto laboral e transversal.
a) gestão - esse é o principal pilar da NOVA NR-18 e sob este título se alinham programas, projetos e ações voltados à gestão da prevenção. Nele se inserem tópicos como PGR, CIPA e Treinamento. No tocante aos treinamentos inicial, periódico e eventual, a NOVA NR-18 traz o Anexo 1, com a carga horária e a periodicidade necessária para a realização do treinamento de vários trabalhadores capacitados nas mais variadas funções, que exercem suas atividades na construção;
b) técnico/operacional - segmento em que se inserem medidas preventivas referentes a aspectos diversos presentes na construção (demolição; escavações; fundações; carpintaria; estruturas de concreto e metálicas; proteção contra quedas; movimentação e transporte de pessoas e materiais; andaimes; alvenaria, revestimentos e acabamentos; instalações elétricas; máquinas, equipamentos e ferramentas diversas; equipamentos de proteção individual; proteção contra incêndio; entre outros);
c) procedimentos - rubrica em que são definidas ações administrativas relativas à comunicação prévia de início de atividades e encaminhamento de medidas em caso de ocorrência de acidente fatal, entre outras;
d) conforto laboral - aqui são alocadas medidas referentes ao bem-estar e satisfação dos trabalhadores no ambiente de trabalho, tais como condições das áreas de vivência, suprimento de água de qualidade, entre outras;
e) transversal - traduzido pelos agentes dinâmicos que apresentam interfaces com todos os tópicos que permeiam e se perfazem em aspectos como a possibilidade da implementação de soluções alternativas às medidas normalizadas.
Sendo assim, apresentados os cinco pilares da atual NR-18, deve-se enfatizar, como dito na introdução deste artigo, que o objetivo da última revisão da NR-18, realizada em 2020, foi construir uma norma mais enxuta e que não especificasse detalhamentos de sua aplicação, em um passo a passo, mas, sim, um texto com ênfase na gestão de segurança e saúde no trabalho e que permitisse mais liberdade aos profissionais legalmente habilitados e qualificados que atuam no seguimento, porém, em contrapartida, atribuindo-lhes maiores responsabilidades.
Neste esteio, podem ser citados vários itens da norma, a título de exemplo, que associam a necessidade de programa, planos e projetos a serem elaborados por profissionais legalmente habilitados (trabalhadores previamente qualificados e com registro no competente conselho de classe):
18.4.2 O PGR deve ser elaborado por profissional legalmente habilitado em segurança do trabalho e implementado sob responsabilidade da organização.
18.4.3 O PGR, além de contemplar as exigências previstas na NR-01, deve conter os seguintes documentos: a) projeto da área de vivência do canteiro de obras e de eventual frente de trabalho, em conformidade com o item 18.5 desta NR, elaborado por profissional legalmente habilitado; b) projeto elétrico das instalações temporárias, elaborado por profissional legalmente habilitado; c) projetos dos sistemas de proteção coletiva elaborados por profissional legalmente habilitado; d) projetos dos Sistemas de Proteção Individual Contra Quedas (SPIQ), quando aplicável, elaborados por profissional legalmente habilitado;
18.6.2 As instalações elétricas temporárias devem ser executadas e mantidas conforme projeto elétrico elaborado por profissional legalmente habilitado.
18.7.1.1 Deve ser elaborado e implementado Plano de Demolição, sob responsabilidade de profissional legalmente habilitado [...].
18.7.2.1 O serviço de escavação, fundação e desmonte de rochas deve ser realizado e supervisionado conforme projeto elaborado por profissional legalmente habilitado.
18.7.5.1 Toda montagem, manutenção e desmontagem de estrutura metálica deve estar sob responsabilidade de profissional legalmente habilitado.
18.9.1 É obrigatória a instalação de proteção coletiva onde houver risco de queda de trabalhadores ou de projeção de materiais e objetos no entorno da obra, projetada por profissional legalmente habilitado.
18.9.4.3 Quando da utilização de plataformas de proteção primária, secundária ou terciária, essas devem ser projetadas por profissional legalmente habilitado [...].
18.10.1.5 A serra circular deve: a) ser projetada por profissional legalmente habilitado.
18.10.1.16 Os equipamentos de guindar devem ser utilizados de acordo com as recomendações do fabricante e com o plano de carga, elaborado por profissional legalmente habilitado e contemplado no PGR.
18.12.1 Os andaimes devem atender aos seguintes requisitos: a) ser projetados por profissionais legalmente habilitados, de acordo com as normas técnicas nacionais vigentes [...].
18.12.2 A montagem de andaimes deve ser executada conforme projeto elaborado por profissional legalmente habilitado.” [24]
O texto aprovado visa dar mais liberdade aos profissionais gestores de segurança e saúde no trabalho, que terão que se adequar aos novos processos construtivos, aos equipamentos mais modernos e aos avanços tecnológicos, e visa contribuir decisivamente para a melhoria das condições de segurança nos canteiros de obras. Além disso, buscou-se adequar a NR-18 às situações previstas nas normas técnicas nacionais vigentes. [25]
Uma das mudanças mais significativas da norma é a obrigatoriedade da elaboração do PGR, possibilitando uma efetiva gestão dos riscos existentes pelo responsável pela obra. A elaboração do PGR ficará a cargo de profissional legalmente habilitado em segurança do trabalho e sua implementação sob responsabilidade da organização. O novo texto prevê ainda que, em canteiros de obras com até 7 m (sete metros) de altura e com, no máximo, 10 (dez) trabalhadores, o PGR pode ser elaborado por profissional qualificado em segurança do trabalho e implementado também sob responsabilidade da organização.
Outro ponto importante é que a obrigação da gestão dos riscos nos canteiros será da organização e não de seus fornecedores contratados, que terão a obrigação de produzir um inventário de riscos de suas atividades, para que sejam incorporados e considerados no programa da organização.
As considerações ora formuladas permitem estabelecer um comparativo entre o enfoque da antiga e o da NOVA NR-18.
O enfoque da antiga NR-18 buscava responder o “como deve ser feito”. Relativamente, por exemplo, a medida de proteção coletiva, havia uma prescrição exaustiva neste aspecto em toda a extensão do texto da NR-18, havendo a previsão nas disposições finais da antiga NR-18, da possibilidade da apresentação e execução de soluções alternativas, após aprovação pela FUNDACENTRO, quando não prevista a medida na norma. Notava-se aí uma clara barreira burocrática à efetiva implementação das referidas soluções alternativas.
O enfoque da NOVA NR-18, por sua vez, interessa “o que deve ser feito” e a resposta a tal questão deve ser apresentada pela empresa. No tocante à mesma medida de proteção coletiva, a nova norma apresenta em seus primeiros itens a faculdade da empresa construtora, regularmente registrada no Sistema CONFEA/CREA, sob responsabilidade de profissional legalmente habilitado em segurança do trabalho, da adoção de soluções alternativas às medidas de proteção coletiva previstas na NOVA NR-18. Assim sedo, ainda que exista previsão da medida coletiva na nova norma, pode ser apresentada solução alternativa, nos termos por ela prescritos.
Neste sentido, assim prescreve a NOVA NR-18;
“ 18.4.6 São facultadas às empresas construtoras, regularmente registradas no Sistema CONFEA/CREA, sob responsabilidade de profissional legalmente habilitado em segurança do trabalho, mediante cumprimento dos requisitos previstos nos subitens seguintes, a adoção de soluções alternativas às medidas de proteção coletiva previstas nesta NR, a adoção de técnicas de trabalho e o uso de equipamentos, tecnologias e outros dispositivos que: a) propiciem avanço tecnológico em segurança, higiene e saúde dos trabalhadores; b) objetivem a implementação de medidas de controle e de sistemas preventivos de segurança nos processos, nas condições e no meio ambiente de trabalho na indústria da construção; c) garantam a realização das tarefas e atividades de modo seguro e saudável.
18.4.6.1 As tarefas a serem executadas mediante a adoção de soluções alternativas devem estar expressamente previstas em procedimentos de segurança do trabalho, nos quais devem constar: a) os riscos ocupacionais aos quais os trabalhadores estarão expostos; b) a descrição dos equipamentos e das medidas de proteção coletiva a serem implementadas; c) a identificação e a indicação dos EPI a serem utilizados; d) a descrição de uso e a indicação de procedimentos quanto aos Equipamentos de Proteção Coletiva (EPC) e EPI, conforme as etapas das tarefas a serem realizadas; e) a descrição das medidas de prevenção a serem observadas durante a execução dos serviços, dentre outras medidas a serem previstas e prescritas por profissional legalmente habilitado em segurança do trabalho.
18.4.6.2 As tarefas envolvendo soluções alternativas somente devem ser iniciadas com autorização especial, precedida de análise de risco e permissão de trabalho, que contemple os treinamentos, os procedimentos operacionais, os materiais, as ferramentas e outros dispositivos necessários à execução segura da tarefa.
18.4.6.3 A documentação relativa à adoção de soluções alternativas integra o PGR do canteiro de obras, devendo estar disponível no local de trabalho e acompanhada das respectivas memórias de cálculo, especificações técnicas e procedimentos de trabalho.” [26]
A mudança de norte entre a antiga e a norma é patente. Isso pode ser percebido se fazendo uma comparação entre a topografia das duas normas. Na antiga NR-18 as soluções alternativas eram previstas, de modo tímido, no final da norma, como uma espécie de solução excepcional. Na NOVA NR-18 as soluções alternativas são previstas em destaque nos primeiros itens da norma e podem ser adotadas, ainda que exista medida coletiva já contemplada pela norma.
Portanto, cabe à gestão do empreendimento elaborar e implementar o projeto e os procedimentos respectivos com a correspondente comprovação da responsabilidade técnica, aspectos esses que remetem diretamente à necessidade de planejamento da prevenção. Nesse contexto, em consonância com o conceito de gestão, compete ao profissional legalmente habilitado aferir a conformidade entre o planejado e o implementado.
Esse entendimento é o encontrado no objetivo da norma:
“ 18.1.1 Esta Norma Regulamentadora - NR tem o objetivo de estabelecer diretrizes de ordem administrativa, de planejamento e de organização, que visam à implementação de medidas de controle e sistemas preventivos de segurança nos processos, nas condições e no meio ambiente de trabalho na indústria da construção.”
No que diz respeito ao Programa de Gerenciamento de Risco, assim prescreve a norma:
“ 18.4.1 São obrigatórias a elaboração e a implementação do PGR nos canteiros de obras, contemplando os riscos ocupacionais e suas respectivas medidas de prevenção.
18.4.2 O PGR deve ser elaborado por profissional legalmente habilitado em segurança do trabalho e implementado sob responsabilidade da organização. 18.4.2.1 Em canteiros de obras com até 7 m (sete metros) de altura e com, no máximo, 10 (dez) trabalhadores, o PGR pode ser elaborado por profissional qualificado em segurança do trabalho e implementado sob responsabilidade da organização.
18.4.3 O PGR, além de contemplar as exigências previstas na NR-01, deve conter os seguintes documentos: a) projeto da área de vivência do canteiro de obras e de eventual frente de trabalho, em conformidade com o item 18.5 desta NR, elaborado por profissional legalmente habilitado; b) projeto elétrico das instalações temporárias, elaborado por profissional legalmente habilitado; c) projetos dos sistemas de proteção coletiva elaborados por profissional legalmente habilitado; d) projetos dos Sistemas de Proteção Individual Contra Quedas (SPIQ), quando aplicável, elaborados por profissional legalmente habilitado; e) relação dos Equipamentos de Proteção Individual (EPI) e suas respectivas especificações técnicas, de acordo com os riscos ocupacionais existentes.
18.4.3.1 O PGR deve estar atualizado de acordo com a etapa em que se encontra o canteiro de obras.
18.4.4 As empresas contratadas devem fornecer ao contratante o inventário de riscos ocupacionais específicos de suas atividades, o qual deve ser contemplado no PGR do canteiro de obras.
18.4.5 As frentes de trabalho devem ser consideradas na elaboração e implementação do PGR.” [27]
O PGR representa, desta forma, um conjunto de requisitos voltados para a saúde e segurança do trabalho que devem ser seguidos em um canteiro de obras, com o objetivo final de prever os riscos que estarão presentes durante a execução da obra e evitar que acidentes aconteçam. Além disso, visa estabelecer um conjunto de ações efetivas para controlar os riscos avaliados.
Alguns riscos são comumente encontrados na indústria da construção. Dentre eles, podem ser elencados:
a) riscos físicos - provenientes de agentes físicos, como as diversas formas de energia a que possam estar expostos os trabalhadores, tais como ruído, vibrações, temperaturas extremas e radiações;
b) riscos químicos - provenientes de agentes químicos, como as substâncias, compostos ou produtos que possam penetrar no organismo pela via respiratória, nas formas de poeira, fumos, névoas, neblinas, gases ou vapores, ou que, pela natureza da atividade de exposição, possam ter contato ou ser absorvidos pelo organismo através da pele ou por ingestão;
c) riscos biológicos - provenientes de agentes biológicos, como fungos, parasitas, protozoários, vírus, animais sinantrópicos, como ratos, cobras, entre outros;
d) fatores ergonômicos - referem-se à adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas do trabalhador e se relacionam à organização do trabalho, ao ambiente laboral e ao trabalhador;
e) fatores relacionados aos acidentes - relacionados à falta de proteção contra queda, arranjo físico inadequado, máquinas sem proteção, iluminação inadequada, gambiarras elétricas, ferramentas defeituosas, EPI inadequado, dentre outros;
f) fatores psicossociais - estão relacionados à qualidade de vida inadequada (baixos salários, alimentação, relações pessoais), tempo demandado no transporte de ida e volta ao domicílio, entre outros. Um exemplo hipotético que pode ser dado aqui é o de operários que estão trabalhando na construção de uma usina hidrelétrica na fronteira do país e reivindicam o benefício que permite a sua saída para visitar a família a cada três meses, pedem o aumento do vale alimentação, além de reajuste salarial. Em virtude da falta de diálogo entre as partes envolvidas e de não terem suas reivindicações atendidas e aumentando o nível de estresse e insatisfação entre os trabalhadores, eles resolvem atear fogo em várias máquinas e ônibus da empresa e destroem parte da área de vivência. Isso provoca a intervenção da segurança patrimonial da empresa e da polícia, que entra em confronto com os trabalhadores, ficando vários feridos entre eles.
Muitas atividades desempenhadas na construção civil demandam a realização de trabalho em altura e essa é uma das grandes causas de acidentes e mortes. Seja em um andaime, em outros equipamentos ou executando atividades nos pavimentos superiores das obras.
A maioria das obras envolve trabalhos com eletricidade. Os fios podem ficar expostos e causar choques, seja pelo contato direto com os trabalhadores, seja pelo contato com a água.
Existem diversas máquinas e ferramentas em obras, como serras circulares, britadeiras, furadeiras, martelos que, quando manuseadas de forma incorreta e sem treinamento, podem causar muitos acidentes e até fatalidades.
Em um canteiro de obras é comum ter gruas, elevadores de carga, guindastes, andaimes e outros equipamentos. Muitos desses, constantemente, estão carregados de materiais, ferramentas e acessórios, o que pode causar queda de materiais. Mesmo um material leve, quando cai de uma altura elevada e com alta velocidade, gera um alto impacto e pode causar sérios acidentes.
Outra atividade rotineira em obras é a preparação de argamassas e concreto, que é o componente principal do cimento. O cimento é um pó fino que é facilmente inalado e pode provocar graves problemas respiratórios.
Já o contato direto da pele com os diversos tipos de argamassas, tintas, solventes, ácidos e demais materiais utilizados em obras, muitas vezes provoca alergias, dermatites e até queimaduras.
São muitas as máquinas e equipamentos presentes em uma obra, que emitem elevado nível de pressão sonora. Muitas vezes, eles são usados intensamente por algum trabalhador, durante muitas horas seguidas. Em alguns casos, isso pode causar a perda de audição por ruído excessivo.
É comum encontrar aranhas, escorpiões, abelhas, vespas, formigas, cobras, entre outros animais que podem colocar os trabalhadores em risco.
Controlar as exposições aos riscos ocupacionais é o método mais eficiente de proteção dos trabalhadores. E, comumente, a hierarquia de controles mais usada para determinar as soluções viáveis e eficazes é proposta pela The National Institute for Occupational Safety and Health (NIOSH), onde a ideia é que se deve iniciar com ações que eliminem os riscos e só em situações em que realmente o risco não possa ser controlado, implantar os EPI’s, acompanhados de ações administrativas.
O envolvimento dos trabalhadores na elaboração do PGR reduz a resistência a sua implementação e ajuda a promover uma cultura de prevenção, estabelecer novos padrões de segurança e saúde e, consequentemente, minimiza os níveis de exposição aos riscos ocupacionais inerentes às atividades ou tarefas realizadas. [28]
A cultura de segurança depende de três aspectos: aspecto relativo ao indivíduo, que inclui crenças e valores do indivíduo; aspecto relativo ao trabalho, que inclui gestão de risco, e aspecto relativo à organização, que inclui suporte ao indivíduo e à gestão. Sendo assim, quanto maior o grau de maturidade da cultura de segurança de uma empresa, menor será o índice de acidentes. Por esse grau de maturidade também é possível identificar quais áreas da empresa necessitam de melhorias e de investimentos. [29]
Outro ponto a ser abordado é que a terceirização na indústria da construção é bastante presente e usada como alternativa para aumentar a produtividade e reduzir os custos nos canteiros de obras.
Especificamente, é uma estratégia que permite a contratação de prestação de serviços entre duas empresas, em que a primeira (construtora) remunera a terceirizada, que fornece a prestação de serviços com a mão de obra necessária para a realização das atividades no canteiro de obras.
O fato de não criar vínculo com o trabalhador da contratada não significa que uma construtora é eximida da responsabilidade sobre o cumprimento das normas de segurança, higiene e saúde dos trabalhadores terceirizados no canteiro de obras.
Neste caso, as empresas contratantes devem exigir das empresas contratadas o inventário de riscos ocupacionais específicos de suas atividades, o qual deve ser contemplado no PGR do canteiro de obras.
É fundamental que todos os trabalhadores que executam atividades no canteiro de obras tenham capacidade, conhecimento, recebam treinamentos adequados às atividades e riscos expostos, e, suas atividades estejam contempladas no PGR.
O PGR deve ser dinâmico, como um conjunto de ações de planejamento, execução e controle que devem abranger todas as fases da obra, desde a terraplanagem do terreno até o acabamento, como, por exemplo, a pintura externa ou instalação de revestimentos em alturas elevadas.
Tendo que abordar todas as fases, o PGR tem vigência do início ao fim da obra. Portanto, é muito importante atualizá-lo sempre que houver alguma mudança em relação aos planos iniciais.
Outro aspecto de extrema importância são as medidas de proteção coletiva. No PGR deve constar todos os desenhos com as unidades de medidas dos equipamentos de proteção coletiva a serem utilizados, bem como as suas memórias de cálculos, entre outras informações adotadas para prevenir acidentes de trabalho e reduzir os níveis de exposição aos riscos do trabalhador.
De tudo que foi exposto, depreende-se que o enfoque da NOVA NR-18 baseia-se no entendimento de que a prevenção ocupacional só pode ser entendida como tal se inserida e em simetria com o processo produtivo adotado no desenvolvimento do empreendimento. Esse status só é alcançado quando aquilo que se compreende por prevenção é planejado, programado, projetado, procedimentalizado, especificado, sistematizado e/ou concebido, enfim – numa tradução sintética do Princípio do Não Improviso – para o fim a que, objetivamente, se destina.
7 CONCLUSÕES
De tudo quanto se expôs ao longo deste artigo, apresenta-se uma síntese para se fixar suas ideias centrais, visando-se alcançar melhor compreensão:
A indústria da construção é uma das atividades econômicas que mais registra acidentes de trabalho, dos quais muitos geram afastamentos e mortes.
Dentre os fatores relacionados aos acidentes na indústria da construção, o principal e determinante fator de acidente é o improviso.
Para tanto, há necessidade de se combater as soluções improvisadas nesta atividade com ações preventivas de gestão de segurança e saúde no trabalho, focadas nos fatores de risco causadores de acidentes.
O princípio do não improviso estabelece que a conduta improvisada na área da saúde e segurança do trabalho deve ser terminantemente condenada, uma vez que coloca em risco a saúde, integridade física e, em alguns casos, até mesmo a vida do trabalhador.
O mencionado princípio alcançou um considerável avanço com o desenvolvimento dos sistemas de gestão de segurança e saúde do trabalho, inclusive os do tipo integrado, e com os programas de segurança do trabalhador institucionalizados no Brasil.
O novo texto da NR-01, contemplando o GRO, materializado no PGR, possibilita um inegável avanço na segurança e saúde no trabalho no Brasil, notadamente, na indústria da construção, que incorporou em sua Norma Regulamentadora, a NOVA NR-18, o mencionado programa.
O gerenciamento dos riscos ocupacionais no canteiro de obra deve ser uma efetiva realidade. Como preconiza o princípio da primazia da realidade, o que importa é o que, de fato, acontece e não apenas o que está escrito em documentos. Sendo assim, de nada vale escrever e fazer registros em um documento referente ao PGR se ele não reflete verdadeiramente o gerenciamento de riscos ocupacionais no canteiro de obras. A essência dessa ideia pode ser traduzida com precisão na máxima bíblica “a letra mata, mas o espírito vivifica!”. Na prática, a sabedoria milenar ensina que a ação vale mais que as palavras.
Dito de outro modo, é inócuo e completamente desprovido de valor um documento produzido artificialmente sob o título de “PGR”, se ele não reflete a prática efetiva da gestão de riscos ocupacionais no canteiro de obras.
A chegada do GRO representa uma mudança significativa no estabelecimento de sistemas para a efetiva gestão dos canteiros de obras e não apenas o atendimento de requisitos legislativos.
Esta mudança de postura na gestão de segurança e saúde no trabalho deve trazer efeitos bastante positivos para os ambientes de trabalho, no caso, canteiros de obras, focando em um modelo que promove a sua segurança e melhoria contínua, prestigiando a atuação dos profissionais de segurança e saúde no trabalho, dos profissionais legalmente habilitados e dos gestores, alinhado com a produtividade e qualidade do negócio também. [30]
O PGR definido na NOVA NR-18 certamente é uma iniciativa que incentivará nos canteiros de obras e frentes de trabalho a implantação de medidas efetivas para neles melhorar continuamente o desempenho da segurança e saúde no trabalho, evitando a ocorrência de acidentes de trabalho.
É importante que os trabalhadores gestores de recursos humanos, de segurança e saúde no trabalho, profissionais dessa área e administradores sejam capacitados por meio de treinamentos, cursos, videoconferências, assegurando uma transição eficiente entre o modelo existente de prevenção, que vigeu por todos estes anos, e, o atual modelo de gestão de riscos ocupacionais.
Por certo, a publicação da NR-18 com os requisitos para o desenvolvimento, implantação e execução efetiva do PGR consolida a prática da gestão de riscos ocupacionais nos canteiros de obras e frentes de trabalho e incentiva a cultura de segurança na indústria da construção.