Artigo Destaque dos editores

Direito, silêncio e corrupção:

um diálogo com Niklas Luhmann e Jürgen Habermas

Exibindo página 3 de 3
Leia nesta página:

6 Considerações finais

A perspectiva luhmanniana de autodescrição da corrupção como comunicação permite observar o paradoxo que os intelectuais de esquerda estão obrigados a desenvolver criativamente e as condições sociológicas que o direito dispõe para corromper a corrupção. Observou-se também as possibilidades do sistema jurídico no sentido de potencializar uma auto-organização da política em termos de autocontrole da sua própria corrupção. Mas o paradoxo provocado pela experiência de corrupção (silêncio/fala política) requer uma assimetrização. Requer um terceiro valor criativo capaz de dar novo sentido ao silêncio e à fala política. O direito, sozinho, não pode realizar isso, porque esse terceiro valor desparadoxizante é sempre um ato criativo, vale dizer: é sempre um projeto ainda aberto de futuro, que não necessariamente, nem teleologicamente, mas apenas possivelmente, poderá ser a proposta da Teoria Deliberativa habermasiana.

Essa teoria oferece condições de possibilidade de se pensar na construção de uma nova cultura política que possibilite um envolvimento muito maior dos cidadãos na organização e na tomada de decisões da sociedade. A decisão, bem como o reflexo dessas recaem, portanto, sobre os cidadãos que compõem a sociedade e que participam do processo de tais decisões. A questão da legitimidade remete à asserção de que a relação interna entre a autonomia privada e a autonomia pública pressupõe um conjunto ou sistema de direitos, cuja configuração concreta depende do regime democrático em questão e que tem como função definir as condições gerais necessárias à institucionalização de processos discursivos democráticos, no âmbito do direito e da política. Há, portanto, uma condição de possibilidade, ainda que limitadamente, de interferência da sociedade organizada numa esfera pública racional, capaz de fazer o uso público da razão, através da tomada de decisão pelo procedimento dialógico, diminuindo a complexidade desses problemas. Ao diminuir-lhes a complexidade por uma tomada de decisão legitimada pela comunicação, esse procedimento pode influenciar o sistema jurídico e político, modificando a estrutura desses sistemas e tornando-os mais abertos e transparentes. E o que mais importa agora: tornando-os mais comprometidos com a sociedade e com a democracia do que o sistema vigente.


Referências

CHÂTELET, François. As Concepções Políticas do Século XX: história do pensamento político. Trad. Carlos Nelson Coutinho e Leandro Konder. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1983.

HABERMAS, Jürgen. .Conciencia moral y acción comunicativa. Tradução de Ramón García Cotarelo. Barcelona: Península, 1996.

______. Direito e Democracia I: entre facticidade e validade. Trad. Flávio Bueno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997.

_______. Teoría de La Acción Comunicativa: Crítica de la razón funcionalista. Trad. Manuel Jiménez Redondo. Madri: Taurus, 2001.

______. A Inclusão do Outro: estudos de teoria política. Trad. George Sperber São Paulo: Loyola, 2002.

HEIDENHEIMER, Arnold J. Perspectives in the perception of corruption. In: HEIDENHEIMER, Arnold J. (org.) Political Corruption: readings in comparative analysis. New York: Hold, Rinehart and Wilston, 1970.

LEFORT, Claude. A Invenção Democrática: os limites do totalitarismo. São Paulo: Brasiliense, 1983.

LEVY, Pierre. A Máquina Universo. Criação, cognição e cultura informática. Trad. Bruno Charles Magne. Porto Alegre: Artmed, 1998.

LUHMANN, Niklas. La Ciencia de la Sociedad. Trad. Silvia Pappe, Brunhile Erder e Luis Felipe Segura, sob a coordenação de Javier Torres Nafarrate. Guadalajara: ITESO e Universidad Iberoamericana; Barcelona: Anthropos, 1996.

__________. Comunicazione Ecologica. Può la società moderna adattarsi alle minacce ecologiche? Trad. Raffaella Sutter. 3ª ed. Milano: Franco Angeli, 1992.

__________. El Derecho de la Sociedad. Trad. Silvia Pappe, Brunhilde Erker, Luis Felipe Segura, sob a coordenação de Javier Torres Nafarrate. Guadalajara: Universidad Iberoamericana; Barcelona: Anthropos, 2002.

__________. Legitimação pelo Procedimento. Trad. Maria da Conceição Corte-Real. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1980.

__________. Sistemas Sociales. Lineamientos para una teoría general. Trad. Silvia Pappe y Brunhilde Erker; coord. Javier Torres Nafarrate. Barcelona: Anthropos; México: Universidad Iberoamericana, 1998.

__________. Sociologia do Direito I. Trad. Gustavo Bayer. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1983.

__________; DE GIORGI, Raffaele. Teoria della società. 11ª ed. Milano: Franco Angeli, 2003.

__________. Teoría Política en el Estado de Bienestar. Trad. Fernando Vallespín. Madrid: Alianza Editoral, 1994.

MACPHERSON, C. B. A Democracia Liberal: Origens e Evolução. Trad. Nathanael C. Caixeiro. Rio de janeiro: Jorge Zahar, 1978.

MERLEAU-PONTY, Maurice. O Visível e o Invisível. Trad. José Artur Gianotti e Armando Mora d’Oliveira. 4ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2003.

NIETZSCHE, Wilhelm Friedrich. Vontade de Potência. Porto Alegre: Edições de Ouro, 1966.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

PETERS, John; WELCH, Susan. Policial Corruption. American Political Science Review. Washington: APSA, v. 72, n. 3, 1978, p. 974-984.

ROCHA, Leonel Severo. Epistemologia Jurídica e Democracia. São Leopoldo: Unisinos, 1998.

__________. O Direito na Forma de Sociedade Globalizada. In: UNISINOS. Anuário do Programa de Pós-Graduação em Direito. Mestrado e Doutorado 2001. São Leopoldo: Unisinos, 2001.

__________ (Org.). Paradoxos da Auto-Observação: Recursos da Teoria Jurídica Contemporânea. Curitiba: JM, 1997.

SIMIONI, Rafael Lazzarotto. Direito Ambiental e Sustentabilidade. Curitiba: Juruá, 2006.

SPECK, Bruno Wilhelm. Mensurando a Corrupção: uma revisão de dados provenientes de pesquisas empíricas. In: HOFMEISTER, Wilhelm (org.). Os Custos da Corrupção. São Paulo: Fundação Konrad Adenauer, 2000.

TEUBNER, Gunther. As Múltiplas Alienações do Direito: sobre a mais-valia social do décimo segundo camelo. In: ARNAUD, André-Jean; LOPES JR, Dalmir (org). Niklas Luhmann: Do Sistema Social à Sociologia Jurídica. Trad. Dalmir Lopes Jr., Daniele Andréa da Silva Manão e Flávio Elias Riche. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004.

TOURAINE, Alain. Crítica da Modernidade. Trad. Eliana Ferreira Edel. Petrópolis: Vozes, 2000.

WALDO, Fazzio Júnior. Corrupção no Poder Público: peculato, concussão, corrupção passiva e prevaricação. São Paulo: Atlas, 2002.

WEBER, Max. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. Trad. Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2001.

WORLD BANK. Helping Countries Combat Corruption: Progress at the World Bank Since 1997. Washington: World Bank, 2000.

Assuntos relacionados
Sobre os autores
Daniela Miranda

mestre em Direito pela Unisinos, professora do Departamento de Direito Público da Universidade de Caxias do Sul (RS)

Rafael Lazzarotto Simioni

Doutor em Direito (Unisinos), Mestre em Direito (UCS), professor e pesquisador da FDSM.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MIRANDA, Daniela ; SIMIONI, Rafael Lazzarotto. Direito, silêncio e corrupção:: um diálogo com Niklas Luhmann e Jürgen Habermas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1396, 28 abr. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9797. Acesso em: 19 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos