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A nova redação do art. 2º da Lei nº 8.072/90 e o sofisma da "novatio legis in pejus"

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23/05/2007 às 00:00
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CONCLUSÃO:

Conclui-se, pois, pela aplicação imediata do art. 2º da Lei 8.072/90, com a nova redação que lhe deu a Lei 11.464 de 28/03/07, a todos os crimes hediondos ou equiparados ocorridos antes de sua vigência, por se tratar de novatio legis in mellius, restando excepcionados apenas aqueles cuja progressão ao cabo do período de 1/6 da pena tenha sido já autorizado em sentença condenatória ou decisão vertida no processo de execução penal, antes do advento da nova legislação, bem como a hipótese de delitos de tortura, em relação aos quais já era legalmente prevista a possibilidade de progressão, de sorte que os novos parâmetros só serão aplicáveis aos casos de tortura ocorridos a contar de 28/03/07.

No tocante, aos reincidentes, o art. 2º, § 2º, da Lei 8.072/90 deve ser interpretado como relativo a reincidente específico, por analogia in bonam partem com a hipótese de livramento condicional para crimes hediondos e equiparados que somente é vedada no caso de reincidente específico em qualquer crime hediondo ou equiparado.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BASTOS, Marcelo Lessa. Crimes hediondos, regime prisional e questões de direito intertemporal. In www.jusnavigandi.com.br.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal – Vol I. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 454.

FACCINI NETO, Orlando, publicada no site www,tj.rs.gov.br.

GOMES, Luiz Flávio. Lei 11.464/07: Liberdade provisória e progressão de regime nos crimes hediondos. Disponível em: http://www.lfg.blog.br.

HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. São Paulo: Forense. Volume I. 1980.

JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal – Vol I. São Paulo: Saraiva, 28ª Ed, 2005, p. 626.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo; Malheiros Editores;

TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional; 14ª Edição. São Paulo: Malheiros, 1998.


Notas

01in Elementos de Direito Constitucional; 14ª Edição; São Paulo: Malheiros, 1998; pág. 43.

02in Curso de Direito Constitucional Positivo; Malheiros Editores; págs. 53/54

03 Vide: GOMES, Luiz Flávio. Lei 11.464/07: Liberdade provisória e progressão de regime nos crimes hediondos. Disponível em: http://www.lfg.blog.br. Em tal artigo enfatiza o articulista que: (...) seria aconselhável a edição de uma eventual súmula vinculante sobre a matéria. O STF, de alguma maneira, tem que deixar claro que seu posicionamento (adotado no HC 82.959) tinha (e tem) eficácia erga omnes. Isso significa respeitar o princípio da igualdade (tratar todos os iguais igualmente) assim como banir (do mundo jurídico) todas as polêmicas sobre o cabimento de progressão em relação aos crimes ocorridos antes de 29.3.07. Para nós, como já afirmado, não só é cabível a progressão de regime nesses crimes (nos termos do HC 82.959, que possui efeito erga omnes), como eles são regidos pelo art. 112 da LEP (um sexto da pena). A tempo (diferenciado) exigido pela nova lei só vale para crimes ocorridos de 29.3.07 para frente.

04Crimes hediondos, regime prisional e questões de direito intertemporal. In www.jusnavigandi.com.br.

05 Cita-se, como exemplo, apenas em nosso Estado os nomes de Lenio Luiz Streck, Ingo Sarlet e Luciano Feldens.

06 Brilhante magistrado gaúcho, o Dr. Orlando Faccini Neto, em sentença já publicada no sítio virtual do Colendo Tribunal de Justiça do RS, colacionando lições dos Drs. Lenio Luiz Streck e Ingo Sarlet, assim fundamenta parte de seu precursor decisum:

Quanto à proibição de proteção deficiente, a doutrina vem apontando para uma espécie de garantismo positivo, ao contrário do garantismo negativo (que se consubstancia na proteção contra os excessos do Estado) já consagrado pelo princípio da proporcionalidade. A proibição de proteção deficiente adquire importância na aplicação dos direitos fundamentais de proteção, ou seja, na perspectiva do dever de proteção, que se consubstancia naqueles casos em que o Estado não pode abrir mão da proteção do direito penal para garantir a proteção de um direito fundamental. Nesse sentido, ensina o Professor Lênio Streck:

Trata-se de entender, assim, que a proporcionalidade possui uma dupla face: de proteção positiva e de proteção de omissões estatais. Ou seja, a inconstitucionalidade pode ser decorrente de excesso do Estado, caso em que determinado ato é desarrazoado, resultando desproporcional o resultado do sopesamento (Abwägung) entre fins e meios; de outro, a inconstitucionalidade pode advir de proteção insuficiente de um direito fundamental-social, como ocorre quando o Estado abre mão do uso de determinadas sanções penais ou administrativas para proteger determinados bens jurídicos. Este duplo viés do princípio da proporcionalidade decorre da necessária vinculação de todos os atos estatais à materialidade da Constituição, e que tem como conseqüência a sensível diminuição da discricionariedade (liberdade de conformação) do legislador."(Streck, Lênio Luiz. A dupla face do princípio da proporcionalidade: da proibição de excesso (Übermassverbot) à proibição de proteção deficiente (Untermassverbot) ou de como não há blindagem contra normas penais inconstitucionais. Revista da Ajuris, Ano XXXII, nº 97, marco/2005, p.180)

No mesmo sentido, o Professor Ingo Sarlet:

A noção de proporcionalidade não se esgota na categoria da proibição de excesso, já que abrange, (...), um dever de proteção por parte do Estado, inclusive quanto a agressões contra direitos fundamentais provenientes de terceiros, de tal sorte que se está diante de dimensões que reclamam maior densificação, notadamente no que diz com os desdobramentos da assim chamada proibição de insuficiência no campo jurídico-penal e, por conseguinte, na esfera da política criminal, onde encontramos um elenco significativo de exemplos a serem explorados."(Sarlet, Ingo Wolfgang. Constituição e proporcionalidade: o direito penal e os direitos fundamentais entre a proibição de excesso e de insuficiência. Revista da Ajuris, ano XXXII, nº 98, junho/2005, p. 107.)

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E continua o Professor Ingo Sarlet:

A violação da proibição de insuficiência, portanto, encontra-se habitualmente representada por uma omissão (ainda que parcial) do poder público, no que diz com o cumprimento de um imperativo constitucional, no caso, um imperativo de tutela ou dever de proteção, mas não se esgota nesta dimensão (o que bem demonstra o exemplo da descriminalização de condutas já tipificadas pela legislação penal e onde não se trata, propriamente, duma omissão no sentido pelo menos habitual do termo)."(Sarlet, Ingo Wolfgang. Constituição e proporcionalidade: o direito penal e os direitos fundamentais entre a proibição de excesso e de insuficiência. Revista da Ajuris, ano XXXII, nº 98, junho/2005, p. 132.)

Dessa forma, para além da costumeira compreensão do princípio da proporcionalidade como proibição de excesso (já fartamente explorada pela doutrina e jurisprudência pátrias), há uma outra faceta desse princípio, a qual abrange uma série de situações, dentre as quais é possível destacar a dos presentes autos.

07 Nesse sentido, ver decisão sobre o tema do Juiz Orlando Faccini Neto, publicada no site www,tj.rs.gov.br.

08 HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. Volume I. 1980. Pág. 113.

09 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal – Vol I. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 454. Em igual sentido JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal – Vol I. São Paulo: Saraiva, 28ª Ed, 2005, p. 626.

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Sobre o autor
Pedro Rui da Fontoura Porto

promotor de Justiça em Lajeado (RS), mestre em Direito - Unisinos, professor de Direito Penal - Univates, autor de obras jurídicas

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PORTO, Pedro Rui Fontoura. A nova redação do art. 2º da Lei nº 8.072/90 e o sofisma da "novatio legis in pejus". Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1421, 23 mai. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9914. Acesso em: 16 abr. 2024.

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