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Democracia e a necessária neutralidade política das Forças Armadas no Brasil

04/09/2022 às 10:35
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Militares fiscalizando e auditando urnas eletrônicas não possui nenhum sentido democrático.

Hoje em dia, as democracias pós-modernas são marcadas pelo afastamento e neutralidade política das Forças Armadas, que são, segundo a própria Constituição Federal Brasileira, instituições nacionais, permanentes e regulares.

Após décadas de autoritarismo e ditaduras implantadas em grande parte do mundo, tal como na América do Sul (inclusive no Brasil) e em parte da Europa, esse distanciamento se deu em virtude de uma nova forma de pensar e em um norte jurídico que não era novo, mas precisou ser colocado em prática: O Constitucionalismo de busca incessante ao Estado Democrático de Direito.

Com a Constituição de 1988 as Forças Armadas foram colocadas em seu papel de defesa do Estado Brasileiro, sendo integradas ao Ministério da Defesa, porém, sob chefia de um cidadão civil, retratando o que diz o seu artigo 142.

Nesse sentido, a redemocratização foi importante para apaziguar os ânimos da sociedade brasileira fazendo com que os militares, que devem, constitucionalmente, cumprir seu papel de defesa do Estado, sejam comprometidos exclusivamente com a democracia representativa.

Acontece que temos visto, nos últimos anos, um nítido retrocesso político, social e democrático com a tentativa, ainda branda, mas que vêm causando medo e receio. O Ministério da Defesa voltou a ser comandado por um militar. O Vice-Presidente da República é um Militar. E o atual Presidente é admirador inconteste das Forças Armadas Brasileiras. Nesse novo cenário, os Militares voltaram a atuar de forma mais incisiva na política, tomando decisões que não são apenas relativas ao seu próprio eixo.

A consequência dessa nova roupagem após as eleições de 2018 foram crises institucionais mais graves e ríspidas entre os três poderes do Brasil, algo que não tínhamos notícias desde a redemocratização.

As Forças Armadas, como combatentes que são, pasmem, se colocam cada vez mais como uma espécie de quarto poder, se achando no direito de opinarem, de enfrentarem e de criarem traumas cada vez maiores no atual momento democrático, já fragilizado, brasileiro. Buscam, na verdade, ser o antigo e extinto Poder Moderador dos tempos de Império.

Por isso, as Forças Armadas integram o Estado Democrático de Direito, sendo, sem sombra de dúvidas, instituição essencial, mas com a necessária neutralidade política. O regime democrático vigente não autoriza o exercício de qualquer quarto poder ou poder moderador por parte de qualquer pessoa, órgão ou instituição, estando a atual ordem constitucional vigente cristalina no sentido de sabermos a posição Estatal das Forças Armadas.

Coadunando com tal raciocínio, o Senado, a Câmara e a Ordem dos Advogados do Brasil publicaram pareceres sobre o tema. Mais adiante, a necessária posição do Supremo Tribunal Federal foi no sentido de que as Forças Armadas atuam na defesa da Pátria, na garantia dos poderes constitucionais e na garantia da lei e da ordem não acomoda o exercício de poder moderador ou quarto poder. 

Infelizmente, cada vez mais comum são vozes de militares ecoando sobre a Democracia, o Estado de Direito, urnas eletrônicas e eleições. Opiniões pessoais todos temos o direito de tê-las, de expressá-las, mas não em nome de Instituições, não em nome de uma falsa roupagem de calmaria social, tão logo o fim de uma Ditadura Militar em nosso país.

Não podemos deixar de lembrar que a redemocratização brasileira é novíssima e ainda amadurece em passos lentos, mas não podemos retroceder o pouco que temos. Militares fiscalizando e auditando urnas eletrônicas não possui nenhum sentido democrático. Militares nas ruas em dia de eleições é forma arcaica de intimidação aos eleitores contrários ao candidato apoiado pelos próprios Militares. Não podemos ser hipócritas ao ponto de fingirmos não saber que a grande maioria dos militares são eleitores do atual mandatário.

Portanto, no estágio democrático que vivemos hodiernamente, a participação ativa das Forças Armadas no processo eleitoral brasileiro traz insegurança jurídica e democrática grave.

Com a aproximação de mais um 7 de setembro, dia histórico para o Brasil, de importância ímpar para a democracia, o atual Presidente da República se utiliza das Forças Armadas como se um braço seu, pessoal e de seu projeto político, fosse. As Forças Armadas não podem se render a qualquer projeto político, mas sim ao país, a nação brasileira.

Vemos hoje em dia a utilização das Forças Armadas como demonstração de força política INTERNA em países como Rússia e Coréia do Norte. É isso que estamos a buscar no Brasil? Já fora demonstrado por vários exemplos históricos, e hoje em dia nas principais democracias do mundo, que os Militares devem cumprir seu papel de defesa do Estado mantendo a neutralidade política. Que assim seja!

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Sobre o autor
Danilo Lopes de Mesquita

Mestrando em Direito Internacional. Especialista em Direito Constitucional. Especialista em Direito Administrativo. Especialista em Direito do Consumidor. Professor de Direito. Servidor Público Federal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MESQUITA, Danilo Lopes. Democracia e a necessária neutralidade política das Forças Armadas no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 7004, 4 set. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/99950. Acesso em: 27 abr. 2024.

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