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Aplicabilidade do § 1º do art. 65 da Lei nº 8.666/93 aos convênios da administração pública

Aplicabilidade do § 1º do art. 65 da Lei nº 8.666/93 aos convênios da administração pública

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Sumário: 1.Introdução – 2.Convênios: Balizamentos legais e diferenças em relação ao instituto do contrato administrativo – 3.Aplicabilidade do § 1º do art. 65 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos aos convênios - 4. Os limites de acréscimos e supressões aplicáveis aos convênios – 5. Formalidades necessárias para o ajuste – 6.Conclusão – 7.Bibliografia.


1 - INTRODUÇÃO

O convênio é, ao mesmo tempo, um dos institutos jurídicos mais utilizados no âmbito da Administração Pública e igualmente um dos menos compreendidos. Para muitos daqueles que não estão habituados com tal figura jurídica, ele não passa de um contrato administrativo, logo, passível de ser disciplinado em toda sua extensão pela Lei nº 8.666/93, popularmente conhecida como Lei das Licitações e Contratos Administrativos.

O equívoco é patente, pois além de não ser um contrato administrativo, pelo menos não de maneira estrita, o convênio também não é compatível com a Lei de Licitações em muitas das disposições ali firmadas. Tanto é verdade que o art. 116 do referido diploma legal dispõe que sua aplicabilidade se dará apenas no que couber.

Entre os pontos em que não há obstáculos para se aplicar regra prevista na Lei nº 8.666/93, encontram-se as hipóteses disciplinadas no art. 65, § 1º, isto é, acréscimos ou supressões do inicialmente estipulado.

O objetivo deste trabalho é demonstrar como isso é possível e quais os cuidados que deverão ser tomadas quando do uso de tais mecanismos.normativos, que sem dúvida trazem maior eficiência aos convênios ao evitar que estes sejam engessados em proposições apenas inicialmente acertadas.


2 – CONVÊNIOS: BALIZAMENTOS LEGAIS E DIFERENÇAS EM RELAÇÃO AO INSTITUTO DO CONTRATO ADMINISTRATIVO

Em primeiro lugar, é imprescindível se fixar os contornos jurídicos do instituto do convênio. O art. 48 do Decreto nº 93.872/86 dispõe que os serviços de interesses recíprocos, dos órgãos e entidades da Administração Federal, e de outras entidades públicas ou organizações particulares, poderão ser executados, sob o regime de mútua cooperação, mediante convênio. O referido diploma normativo, em seu art. 49 afirma, que os convênios poderão ser utilizados como forma de descentralização das atividades da administração federal, através da qual se delegará a execução de programas federais de caráter nitidamente local, no todo ou em parte, aos órgãos estaduais ou municipais incumbidos de serviços correspondentes, e quando estejam devidamente aparelhados

De maneira bem mais clara e precisa, a Instrução Normativa nº 01 da Secretaria do Tesouro Nacional, de 15 de janeiro de 1997, logo em seu art 1º afirma o seguinte, litteris:

Art. 1º A execução descentralizada de Programa de Trabalho a cargo de órgãos e entidades da Administração Pública Federal, Direta e Indireta, que envolva a transferência de recursos financeiros oriundos de dotações consignadas nos Orçamentos Fiscais e da Seguridade Social, objetivando a realização de programas de trabalho, projeto, atividade, ou de eventos com duração certa, será efetivada mediante a celebração de convênios ou destinação por Portaria Ministerial, nos termos desta Instrução Normativa, observada a legislação pertinente.

Os dois diplomas normativos efetivamente importantes para o administrador público, no que se refere aos convênios, são a Lei nº 8.666/93 e a IN/STN/01/97. Esta última, diga-se de passagem, apesar de ser mera norma infralegal, contém determinações próprias de leis de conteúdo material. No entanto, apesar desse e de outros obstáculos, no âmbito da Administração Pública Federal, a referida instrução normativa é utilizada de modo quase pacífico, tanto que é perfeitamente aceita pelo Tribunal de Contas da União.

Até mesmo pela falta de regramento mais preciso, acaba-se por englobar nos convênios situações completamente díspares. Por exemplo, é comum acordo de cooperação para simples troca de informações, onde não há qualquer repasse de valores, ser denominado convênio. A mesma denominação, verbi gratia, aplica-se aos ajustes onde a Administração Pública repassa para municípios valores para que tais entes desenvolvam cursos de qualificação. Efetivamente, o segundo exemplo enquadra-se na hipótese aqui discutida, logo, regido pela Lei de Licitações, no que couber, e pela IN/STN/01/97, o que não ocorre em relação ao primeiro exemplo. Percebe-se, então, que a distância entre os dois casos é enorme, por isso, o tratamento legal dado a cada um deles não pode ser o mesmo, ainda que a denominação venha a ser igual.

Equívoco comum, especialmente para aqueles que não trabalham ou não estão familiarizados com a figura do convênio, é vê-lo como uma espécie de contrato administrativo em sentido estrito. Num primeiro momento, isso é até aceitável; no entanto, deve ficar claro que na essência são muito diferentes. A principal diferença é que nos convênios não existem partes, vez que não há contraposição de interesses, elemento este essencial aos contratos. Os interesses dos concedentes e dos convenentes convergem para um objetivo comum, que ao ser atingido é usufruído por ambos. A comutatividade não se verifica em tal instituto, mas nos contratos, onde sempre haverá duas partes (podendo ter mais de dois signatários), uma que pretende o objeto do ajuste (a obra, o serviço, etc), outra que pretende a contraprestação correspondente (o preço, ou qualquer outra vantagem).

A bem da melhor compreensão sobre o tema, cabe comentar que Odete Medauar entende que o contrato e o convênio possuem a mesma natureza, pertencentes à mesma categoria, a contratual.

Em que pese o art. 116 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos estabelecer que este diploma legal é aplicável aos convênios, estes, entre outras coisas, face o caráter recíproco que apresentam, independem de licitação prévia para ser firmados (FURTADO, Lucas Rocha, Curso de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Atlas, p.216).

Um dos doutrinadores que melhor coloca a questão é José dos Santos Carvalho Filho, que sobre a matéria tem a seguinte opinião, ipsis litteris:

(...) no convênio, são paralelos e comuns (os interesses). Neste tipo de negócio jurídico, o elemento fundamental é a cooperação, e não o lucro procurado por celebrar contratos.

(...) Nos convênios, ao revés, podem ser vários os pólos, havendo um inter-relacionamento múltiplo, de modo que cada participante tem, na verdade, relação jurídica com cada um dos integrantes dos demais pólos.

A celebração de convênios, por sua natureza, independe de licitação prévia como regra. É verdade que a Lei 8.666/93 estabelece, no art. 116, que é ela aplicável a convênios e outros acordos congêneres. Faz, entretanto, a ressalva de que a aplicação ocorre no que couber. Como é lógico, raramente será possível a competitividade que marca o processo licitatório, porque os pactuantes já estão previamente ajustados para o fim comum a que se propõem. Por outro lado, no verdadeiro convênio inexiste perseguição de lucro, e os recursos financeiros empregados servem para cobertura dos custos necessários à operacionalização do acordo. Sendo assim, inviável e incoerente realizar licitação. (os destaques não constam do original)


3 - APLICABILIDADE DO § 1º DO ART. 65 DA LEI DE LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS AOS CONVÊNIOS

Fixados os elementos necessários para a melhor compreensão do assunto, face o conteúdo do art. 116 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, é chegado o momento de se adentrar à questão de fundo objeto da presente análise jurídica, ou seja, se é ou não aplicável aos convênios a previsão legal disposta no § 1º do art. 65 da Lei nº 8.666/93? Para subsidiar as respostas, é de grande importância a transcrição dos referidos comandos legais, in verbis:

Art. 65 Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados(...)

(...)

§1º O contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o limite de 50% (cinqüenta por cento) para os seus acréscimos.

(...)

Art. 116 - Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração.

§ 1º - A celebração de convênio, acordo ou ajuste pelos órgãos ou entidades da Administração Pública depende de prévia aprovação de competente plano de trabalho proposto pela organização interessada, o qual deverá conter, no mínimo, as seguintes informações:

I - identificação do objeto a ser executado;

II - metas a serem atingidas;

III - etapas ou fases de execução;

IV - plano de aplicação dos recursos financeiros;

V - cronograma de desembolso;

VI - previsão de início e fim da execução do objeto, bem assim da conclusão das etapas ou fases programadas;

VII - se o ajuste compreender obra ou serviço de engenharia, comprovação de que os recursos próprios para complementar a execução do objeto estão devidamente assegurados, salvo se o custo total do empreendimento recair sobre a entidade ou órgão descentralizador.

§ 2º - Assinado o convênio, a entidade ou órgão repassador dará ciência do mesmo à Assembléia Legislativa ou à Câmara Municipal respectiva.

§ 3º - As parcelas do convênio serão liberadas em estrita conformidade com o plano de aplicação aprovado, exceto nos casos a seguir, em que as mesmas ficarão retidas até o saneamento das impropriedades ocorrentes:

I - quando não tiver havido comprovação da boa e regular aplicação da parcela anteriormente recebida, na forma da legislação aplicável, inclusive mediante procedimentos de fiscalização local, realizados periodicamente pela entidade ou órgão descentralizador dos recursos ou pelo órgão competente do sistema de controle interno da Administração Pública;

II - quando verificado desvio de finalidade na aplicação dos recursos, atrasos não justificados no cumprimento das etapas ou fases programadas, práticas atentatórias aos princípios fundamentais de Administração Pública nas contratações e demais atos praticados na execução do convênio, ou o inadimplemento do executor com relação a outras cláusulas conveniais básicas;

III - quando o executor deixar de adotar as medidas saneadoras apontadas pelo partícipe repassador dos recursos, ou por integrantes do respectivo sistema de controle interno.

§ 4º - Os saldos de convênio, enquanto não utilizados, serão obrigatoriamente aplicados em cadernetas de poupança de instituição financeira oficial, se a previsão de seu uso for igual ou superior a um mês, ou em fundo de aplicação financeira de curto prazo ou operação de mercado aberto lastreada em títulos da dívida pública, quando a utilização dos mesmos verificar-se em prazos menores que um mês.

§ 5º - As receitas financeiras auferidas na forma do parágrafo anterior serão obrigatoriamente computadas a crédito do convênio e aplicadas, exclusivamente no objeto de sua finalidade, devendo constar de demonstrativo específico que integrará as prestações de contas do ajuste.

§ 6º - Quando da conclusão, denúncia, rescisão ou extinção do convênio, acordo ou ajuste, os saldos financeiros remanescentes, inclusive os provenientes das receitas obtidas das aplicações financeiras realizadas, serão devolvidos à entidade ou órgão repassador dos recursos, no prazo improrrogável de 30 (trinta) dias do evento, sob pena da imediata instauração de tomada de contas especial do responsável, providenciada pela autoridade competente do órgão ou entidade titular dos recursos.

Abstraídas as criticas, diga-se de passagem bastante consistentes, sobre a aplicabilidade da IN/STN/01/97 aos convênios como se lei formal fosse, verifica-se que a mencionada norma prevê em seu art. 15 a possibilidade de alterações no próprio instrumento do convênio, ou em seu plano de trabalho. A mesma instrução normativa, logo em seu art. 1º, § 1º, inciso X, prevê a possibilidade de aditivo ao convênio firmado, desde que a formalização se dê dentro do prazo de vigência e não haja alteração na natureza do objeto aprovado. No entanto, nada comenta sobre a possibilidade de se realizar ou não acréscimos ou supressões no mesmo. Assim, não havendo outro diploma normativo que trate a questão de maneira específica e não havendo obstáculos legais, em tese, problema alguma haverá em se utilizar institutos próprios da Lei de Licitações, vez que, no ponto em discussão, não há incompatibilidade jurídica ou material para isso. Ressalva-se que isso somente será verdadeiro para os convênios onde haja repasse de valores.

Em seminário sobre licitações e contratos realizado pela Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça, em 26 de outubro de 2006, o Ministro do Tribunal de Contas da União Benjamin Zymler, em resposta a alguns questionamentos formulados, assim tratou o tema, in verbis:

Questão 5

Convênio de cooperação técnica entre órgãos públicos, que não envolve repasse de recursos, pode ter vigência por prazo indeterminado, face ao contido nos artigos 57, § 3º, e 116, caput, da Lei nº 8.666/1993? Gentileza contemplar, na resposta, os convênios de cooperação técnica entre órgãos públicos celebrados antes da vigência da Lei nº 8.666/1993, mais precisamente, em 1990.

"São denominados convênios as avenças que são celebradas visando à consecução de objetivos comuns. Dentro desse gênero, há duas espécies principais: os convênios de cooperação técnica e aqueles celebrados visando à execução descentralizada de programas governamentais. No caso do convênio de cooperação técnica, não existem as transferências voluntárias de recursos financeiros que caracterizam a segunda espécie de convênios. Ressalto que as Instruções Normativas da STN fazem menção expressa apenas aos convênios vocacionados para a transferência de recursos financeiros. Os dispositivos da Lei nº 8.666/1993, em especial, seu art. 116, aplicam-se apenas aos convênios direcionados à transferência de recursos financeiros. Assim sendo, entendo que aos convênios de cooperação técnica não se aplicam os prazos de vigência contratual fixados no art. 57 da Lei de Licitações e Contratos. O art. 82 do Decreto-Lei nº 2.300/1986 estipulava que as disposições contidas nesse normativo aplicavam-se aos convênios. Esse normativo também não se aplica aos convênios de cooperação técnica. Afinal, a Lei de Licitações e o Decreto-Lei nº 2.300/1986 fixaram limites para a vigência dos convênios com fulcro no Direito Financeiro, especialmente no conceito de exercício orçamentário. Esses conceitos não se aplicam aos convênios em tela, que não se prestam a transferências financeiras"

O art. 116 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos dispõe que tal norma poderá ser aplicada aos convênios quando houver compatibilidade. Ora, os convênios são firmados para atender interesses comuns do convenente e do concedente, interesses esses que durante a execução do plano de trabalho poderão demandar ajustes, de forma que o objeto previsto seja cumprido da maneira mais eficiente possível. Assim como ocorre nos contratos administrativos, muitas vezes situações imponderáveis ou não previsíveis se apresentam nos convênios, que, se não forem ajustados, poderão comprometer própria execução do objeto. Para tanto, muitas vezes se faz necessário a realização de acréscimos ou supressões ao inicialmente firmado.

Ora, deve-se repetir, é de interesse de ambos os partícipes a busca pelo sucesso do convênio, o que muitas vezes somente é possível ao se aplicar uma das hipóteses previstas no § 1º do art. 65 da Lei nº 8.666/93. Por exemplo, em projeto para treinamento no uso da internet, poderá o convenente verificar que a demanda é muito maior do que o inicialmente previsto, fato que justificaria um acréscimo no número de equipamentos. Nesse caso, ainda que não haja risco para o atendimento do objeto, o interesse público certamente seria melhor atendido com a realização do acréscimo pretendido pelo convenente. Obviamente, em tal situação, o plano de trabalho também deverá ser ajustado de acordo com a modificação ocorrida.

No entanto, nem sempre é fácil para o administrador público chegar a uma conclusão sobre a necessidade de se realizar acréscimo/supressão ou não no convênio. Há situações onde a pertinência da alteração em discussão é de difícil verificação, configurando-se em verdadeira zona cinzenta. Tomando-se o mesmo exemplo acima, se o convenente, após a realização de todos os cursos programados, solicitasse o acréscimo do objeto para a realização de novos cursos, certamente se levantariam questionamentos sobre a possibilidade ou não de tal desiderato. Para alguns, o objeto já alcançou seu fim, não podendo ser modificado para o início de novas atividades, o que somente poderia ocorrer com novo convênio. Para outro, havendo compatibilidade entre os cursos realizados e os que se pretende realizar, nenhum problema haveria em se repassar novos valores. Portanto, qualquer conclusão somente será viável frente o caso concreto.

Caso o administrador público conclua que a alteração (acréscimos ou supressões) apenas ajustará o objeto para melhor cumprir o interesse público, não passando de mero aprimoramento ao inicialmente previsto, não há dúvida, é cabível a modificação pretendida. No entanto, aquele deverá verificar sempre se a alteração em comento não busca realizar em realidade um "convênio dentro de outro convênio", de maneira a fugir das exigências fixadas para a realização de um novo convênio. Ocorrendo isso, não resta outra solução que não o veto a tal pretensão.


4 - OS LIMITES DE ACRÉSCIMOS E SUPRESSÕES APLICÁVEIS AOS CONVÊNIOS.

Por fim, devem ser tecidos alguns comentários sobre os limites fixados para os acréscimos ou supressões feitos nos convênios firmados. Logicamente, ao administrador público somente compete fazer o que está previsto em lei. E, no tema em debate, como já afirmado aqui por diversas vezes, o regramento é dado pelo § 1º do art. 65 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, que baliza os acréscimos e supressões em 25 % (vinte e cinco por cento) ou 50% (cinqüenta por cento), a depender do caso.

É importante deixar claro que a obrigatoriedade em aceitar tais modificações não é exercida em relação ao convenente, vez que entre este e o concedente não existe relação fundada na comutatividade de obrigações, mas verdadeira parceria para alcançar um objetivo comum. Portanto, deverão ambos os partícipes acordar sobre a necessidade do ajuste.

Quando o convênio firmado demandar para a execução de seu objeto a realização de certame licitatório, isto é, quando houver necessidade do convenente realizar licitação para a contratação de alguém apto a cumprir algum aspecto disciplinado no plano de trabalho, diferentemente da colocação feita no último parágrafo, o contratado não terá opção senão a de aceitar a determinação do convenente e alterar o contrato, em conformidade com o § 1º do art. 65 da Lei nº 8.666/93.

Naquele primeiro caso, o acréscimo/supressão se dá no âmbito do convênio em si, onde a relação é de parceria, não há como um dos partícipes impor obrigações não desejada ao outro participante. No segundo caso, temos um contrato feito no âmbito do convênio, no qual o convenente assumirá o papel de parte frente ao licitante selecionado, logo, face à comutatividade própria aos contratos e a expressa previsão legal, não há como o contratado negar-se a alterar o pacto firmado.

Excepcionalmente, tais acréscimos ou supressões poderão ultrapassar os limites estabelecidos, como, aliás, prevê o § 2º do art. 65. Sobre a questão, ainda que não se tratasse de convênio, o Tribunal de Contas da União, por intermédio da Decisão nº 215/99 (DOU nº 96-E, de 21.05.1999), entendeu que, preenchidos determinados requisitos, não haveria empecilho a que a Administração Pública ultrapasse os limites fixados nos parágrafos do artigo acima citado. Aliás, sobre o tema, no mesmo evento supracitado, o Ministro Benjamin Zymler assim se posicionou, ipsis litteris:

Questão 11

(...)

Por meio da Decisão nº 215/1999 - Plenário, o TCU entendeu ser possível, em casos excepcionais, extrapolar os limites traçados pelos §§ 1º e 2º do art. 65 da Lei de Licitações, em alterações qualitativas do objeto.

Para tanto, devem ser cumpridos os seguintes requisitos:

- não acarretar para a Administração encargos contratuais superiores aos oriundos de uma eventual rescisão contratual por razões de interesse público, acrescidos aos custos da elaboração de um novo procedimento licitatório;

- não possibilitar a inexecução contratual, à vista do nível de capacidade técnica e econômico-financeira do contratado;

- decorrer de fatos supervenientes que impliquem em dificuldades não previstas ou imprevisíveis por ocasião da contratação inicial;

- não ocasionar a transfiguração do objeto originalmente contratado em outro de natureza e propósito diversos;

- ser necessária à completa execução do objeto original do contrato, à otimização do cronograma de execução e à antecipação dos benefícios sociais e econômicos decorrentes;

-demonstrar-se que as conseqüências da outra alternativa (a rescisão contratual, seguida de nova licitação e contratação) importam sacrifício insuportável ao interesse coletivo a ser atendido pela obra ou serviço.

Assim, desde que satisfeitos cumulativamente esses vários pressupostos, o TCU permitiu ao Administrador Público que rompesse os limites traçados pelos parágrafos 1º e 2º do art. 65 da Lei nº 8.666/1993, em alterações qualitativas do objeto. Pelos pressupostos estabelecidos, vê-se claramente que a extrapolação desses limites somente poderá ocorrer em caráter excepcionalíssimo. O TCU, ao firmar tal entendimento, teve em mira situações em que a observância estrita da lei colidisse com outros bens jurídicos, como os tutelados, por exemplo, pelo princípio da eficiência. Entendeu o TCU, então, que em determinadas situações, sempre excepcionais, poderia o princípio da legalidade curvar-se (sempre parcialmente) a outros princípios como os da finalidade e razoabilidade. A Decisão 215/1999 retratou, também, posicionamento do TCU no sentido de que os limites traçados pelo § 1º do art. 65 referem-se não só a alterações quantitativas, mas também a qualitativas


5- FORMALIDADES NECESSÁRIAS PARA O AJUSTE

Superada a dúvida sobre a aplicabilidade ou não do § 1º do art. 65 da Lei das Licitações e Contratos Administrativos aos convênios, logicamente com os devidos cuidados, cabe mencionar que a questão da contrapartida deve ser observada com atenção pelo concedente e pelo convenente. Ora, quando é firmado o convênio, exige-se do segundo a contrapartida aos valores repassados pelo primeiro.

A Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO fixa limites mínimos e máximos para as contrapartidas feitas pelos Municípios, Estados e Distrito Federal, que também deverão ser observados nas hipóteses de acréscimos ou supressões previstos no § 1º do art. 65 da Lei nº 8.666/93. Com isso, todos os requisitos previstos inicialmente para a formalização do convênio, no que diz respeito aos valores repassados, deverão ser novamente atendidos, de modo a manter a proporcionalidade original. Para tanto, o convenente, entre outras coisas, deverá demonstrar a existência de previsão em orçamento para o acréscimo a sua contrapartida inicial e a declaração de que dispõe de tal valor.

Quando o convenente for pessoa jurídica de direito privado – destarte, sem limites fixados em lei para a contrapartida –, deve-se buscar manter a proporcionalidade inicialmente fixada. Tal entendimento, indubitavelmente, atende ao interesse público com mais zelo. Afinal, se o convênio se funda em uma parceria para se alcançar um objetivo comum, não é aceitável que um dos parceiros veja suas obrigações aumentadas sem a equivalente contrapartida do outro.

Portanto, deve-se aplicar em tais situações o critério da proporcionalidade, de maneira que ao se firmar um convênio onde, verbi gratia, o convenente ofereceu como contrapartida 20% (vinte por cento) dos valores pactuados, havendo modificação no plano de trabalho fundada na previsão elencada no § 1º do art. 65 da Lei nº 8.666/93, aquele percentual deverá ser mantido após a formalização do aditivo.


6- CONCLUSÃO

Em linhas gerais, é factível se aplicar aos convênios as hipóteses de acréscimos ou supressões previstas no § 1º do art. 65 da Lei de Licitações e Contratos Administravos. Para isso, em conformidade com o expresso no art. 116 da citada lei, a utilização de tais mecanismos deverá se dar nos limites da compatibilidade, vez que convênios e contratos administrativos, destarte a proximidade jurídica existente, são institutos autônomos e com requisitos próprios.

Assim, caberá ao administrador público e ao convenente deixar claro que o interesse público será mais eficientemente atendido com a modificação em debate, não significando isso qualquer burlar aos requisitos legais, muito menos forma de se evitar os percalços necessários para se firmar um novo convênio.


7. BIBLIOGRAFIA

BARROS, Márcio dos Santos. 502 Comentários sobre Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: NDJ, p. 307

FILHO CARVALHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 11ª edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 196

FURTADO, Lucas Rocha, Curso de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Atlas, p.216.

MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno.. 2ªed: São Paulo: RT, p. 250

MEIRELLES, Helly Lopes, Direito Administrativo Brasileiro. 28ªed. São Paulo: Malheiros.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 5ª ed., São Paulo: Malheiros, 1994, p. 333.


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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Clayton Ribeiro de. Aplicabilidade do § 1º do art. 65 da Lei nº 8.666/93 aos convênios da administração pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1482, 23 jul. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10185. Acesso em: 23 abr. 2024.