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Direito constitucional ao ódio (?).

Uma breve análise acerca das possibilidades jurídicas e dos limites normativos das liberdades de expressão, sob as luzes da tolerância democrática

Direito constitucional ao ódio (?). Uma breve análise acerca das possibilidades jurídicas e dos limites normativos das liberdades de expressão, sob as luzes da tolerância democrática

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O ódio pode ser regulado pelo Direito? Qual ódio: o sentimento ou a conduta?

Resumo: O presente artigo visita o tema do “ódio” e a sua eventual regulação constitucional, a partir das possibilidades jurídicas e dos limites normativos das liberdades de expressão, sob as luzes da tolerância democrática. As citadas liberdades estão contempladas na Constituição, nos tratados e nas leis, e são objeto de acendradas disputas políticas e jurídicas. O “ódio” pode ser regulado pelo ordenamento jurídico (Direito)? Qual “ódio”: o sentimento ou a conduta? Toda conduta (ou fala) “odiosa” deve ser proibida? Nenhum tipo de “ódio” deve ser tolerado? A partir da leitura dos textos normativos e da análise de decisões judiciais, veremos como a questão da “liberdade de expressar o ódio” tem sido enfrentada e aplicada na prática. Eis a nossa premissa inegociável: a regra é a liberdade de expressar quaisquer sentimentos, pensamentos ou opiniões, por mais abjetos, repulsivos, ofensivos, execráveis e abomináveis que sejam; excepcionalmente, se houver um justo motivo e se houver o exercício ilegal ou abusivo desse direito, com riscos potenciais e reais para as pessoas, mediante a concreta e plausível prática de crimes ou sua apologética incitação, essa liberdade de “odiar” deve ser tolhida e sancionada.

Palavras-chave: Direito Constitucional. Direitos Fundamentais. Liberdades de Expressão. Ódio. Tolerância Democrática.

Sumário: 1. Introdução; 2. As liberdades de expressão no ordenamento jurídico; 3. As liberdades de expressão na jurisprudência; 4. Conclusões; 5. Referências.


1. INTRODUÇÃO

O amor está fora do âmbito do Direito

(Hans Kelsen)

O presente texto tem como objeto analisar os limites normativos e as possibilidades jurídicas das liberdades de expressão, especialmente no tocante ao “ódio”. Há um direito ao “ódio”? Se sim, quais são os “ódios” tolerados? E quais os “ódios” proibidos? Se não, qual a razão de ser da proteção jurídica às liberdades de expressão? Alguém que dissesse que “odeia” estupradores, assassinos, traficantes, terroristas, racistas, sexistas, machistas, feministas, nazistas, fascistas, liberais, comunistas, socialistas, genocidas etc. deve ser sancionado? E se dissesse que “odeia” pretos, brancos, amarelos, pardos, homens, mulheres, crentes, ateus, judeus, muçulmanos, cristãos, feios, bonitos, ricos, pobres etc. também deveria ser sancionado? Quais as opiniões autorizadas? E quais as opiniões proibidas?

Não se cogita, em hipótese alguma, da permissão e tolerância com as práticas do mal, com a ação ou omissão intencional que efetivamente prejudique terceiro, com injustas ameaças ou com a incitação à prática de crimes ou com falas apologéticas efetivamente provocadoras de condutas criminosas. Todavia, indaga-se: a proteção constitucional1 das liberdades de expressão é para viabilizar a externalização de opiniões “boas”, “toleráveis”, “inofensivas”, “corretas”, “decentes” etc.? Ou seria justamente para proteger opiniões “ruins”, “imorais”, “abomináveis”, “ofensivas”, “repulsivas”, etc.?

Continuamos. Há a necessidade de proteger o “direito de amar e de ser bom”? Há necessidade de proteger o “direito de expressar pensamentos corretos”? Ou de proteger elogios em favor de pessoas ou de instituições poderosas e influentes? A proteção é para assegurar o direito de agradar e causar bem-estar? Se não, qual deve ser o limite de uma manifestação de “ódio ou odiosa”? Que opinião o indivíduo não deve manifestar?

Esse é um tema recorrente nos regimes democráticos, nos quais as liberdades de expressão revelam uma sociedade livre, plural e com indivíduos sem medos de emitir suas “opiniões”, seus “pensamentos”, seus “sentimentos” etc., por mais reprocháveis que sejam, em relação a quaisquer temas, ou em relação a quaisquer pessoas (cidadãos comuns ou autoridades públicas) ou instituições. 3 É fora de toda a dúvida que cada País, na construção de suas normas e instituições jurídicas e políticas, tem uma motivação histórica, cultural e circunstancial própria. Com efeito, as preocupações antinazistas são muito fortes na Alemanha. Assim como as antifascistas na Itália. Ou as anticomunistas na Polônia etc. Preconceitos e discriminações injustos (ou prejudiciais) devem ser sancionados. Mas quais preconceitos e discriminações devem ser tornados ilícitos?

No Brasil, preconceitos e discriminações não podem ser desprezados, reiteramos. Temos, infelizmente, longa tradição de práticas prejudiciais, disfuncionais e parasitárias em relação a determinadas categorias de indivíduos. Eis, por sinal, uma das razões pela qual o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a publicação de livros entendidos como antissemitas atrai a incidência do crime de racismo.4 Oportunamente, visitaremos o julgado que criminalizou a publicação de livros vislumbrados como racistas ou preconceituosos.

E nessa linha de combater os preconceitos e as discriminações, sejam raciais ou não, a Corte decidiu que o crime de injúria racial se equipara ao crime de racismo. 5 Neste caso, posteriormente ao julgamento, adveio mudança legislativa chancelando essa equiparação penal judicial.6 E nessa mesma toada judicial, o STF7 equiparou, por analogia, os preconceitos e as discriminações contra homossexuais ao crime de racismo, mesmo à míngua de preceito legal específico tipificando tal hedionda conduta. 8

A Corte, sob a louvável justificativa de proteger minorias e sancionar condutas repulsivas, ignorou prerrogativa do Parlamento e legislou, positivamente, sobre o tema que é de índole penal, inovando o ordenamento jurídico, quebrando uma tradição ocidental quase milenar. 9 O Tribunal, em nome da dignidade desses grupos historicamente vitimizados, decidiu pela punição e pelo constrangimento às liberdades de expressão, como assinalado no julgamento que criminalizou a edição e publicação de livros antissemitas. No entanto, em outras ocasiões 10, a Corte sufragou que as liberdades de expressão são pilares da Democracia11 e de nossa República12.

O fato é que há decisões que ora prestigiam as liberdades de expressão (manifestação, pensamento, opinião, jornalística, científica, artística etc.), ora há aquelas que lhes restringem. Em algumas, o Tribunal entende que não houve abuso desse direito, noutras entende como abusivas o exercício dessa prerrogativa constitucional. Na medida do possível, analisaremos a consistência dos fundamentos normativos e dos argumentos jurídicos contidos nessas decisões, e, por consequência, o seu eventual acerto ou desacerto.13

Cuide-se que em face das novas mídias de comunicação social tem crescido uma preocupação com as denominadas “fake news” (notícias falsas) e com o “combate à disseminação de desinformação”, de tal sorte que há investigações visando punir (e decisões judiciais punindo) os autores de supostas “fake news” que estariam desestabilizando a sociedade e as instituições. 14 A Lei brasileira não tipificou como ilícitos penais a referidas condutas. 15

E sob a justificativa de combater supostos “atos terroristas”, “manifestações antidemocráticas” ou “tentativas golpistas” toda a sorte de punições e de criminalização tem sido aplicada e defendida por substantiva parcela de políticos poderosos, por respeitáveis autoridades públicas, por ilustres juristas e por outras figuras influentes na sociedade brasileira. Trata-se de mais uma novidade para ordenamento jurídico nacional. A realidade objetiva dos fatos não deveria ceder às narrativas ideológicas subjetivas. Há “juristas” que, para concretizar o seu ideal de Justiça e viabilizar o seu postulado da Paz, não se acanham diante das supostas omissões legislativas nem mesmo diante dos textos normativos.16 O texto normativo deveria ser o limite da liberdade interpretativa subjetiva do “jurista”. A realidade é o limite fático do Direito e do Poder. O texto deveria ser o limite ético do intérprete.17

Com efeito, nas sociedades civilizadas, livres e democráticas, a “verdade”, a “beleza” e a “moral” não têm donos nem senhores. Todavia, assistimos a uma tendência totalitária e tirana para impor novos e válidos padrões éticos e estéticos. 18 19 O “ódio” é mal, mas proibir o “ódio” inofensivo (sic) é pior ainda. Por “ódio inofensivo” entendemos manifestações infelizes, de extremo mau gosto, repulsivas e abjetas até, mas que não causam situação concreta de risco e perigo do seu destinatário.

Já o “ódio” efetivamente capaz de prejudicar injustamente deve ser combatido e sancionado, seja pelo Direito, seja pela educação moral, religiosa, social e familiar. É preciso estacar bem o nosso entendimento: o “ódio” efetivamente estimulador de violência, incitador da prática de crimes e apologético da concreta maldade deve ser juridicamente proibido e sancionado.

Para esta análise, iremos utilizar como “farol” o princípio da tolerância democrática, sintetizado na seguinte máxima atribuída a Voltaire: “posso não concordar com o que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo”.

Além dessa máxima, não podemos nos esquecer das lições de John Stuart Mill e o seu magistério contra a ilegitimidade de quaisquer tipos de cerceios contra a liberdade de expressar as opiniões, ainda que tais opiniões sejam incorretas e inconvenientes:

Se todos os homens, exceto um, tivessem a mesma opinião, e apenas um fosse de opinião contrária, a humanidade não teria maior justificativa para silenciar esse homem do que ele teria, se tivesse o poder para silenciar a humanidade.20

Eis a nossa premissa inegociável: a regra é a liberdade de expressar quaisquer opiniões, por mais abjetas, repulsivas, erradas, inconvenientes, abomináveis e execráveis que sejam; excepcionalmente, se houver um justo motivo e se houver o exercício ilegal ou abusivo desse direito, com potenciais riscos reais para as pessoas, mediante a concreta e plausível incitação apologética da prática de crimes (ou de ações prejudiciais) que coloquem em perigo a vida, a integridade, a dignidade, a liberdade, o patrimônio, a honra, a imagem e outros preciosos valores fundamentais da pessoa humana, essa liberdade de expressar o “ódio” deve ser tolhida e sancionada.


2. AS LIBERDADES DE EXPRESSÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO

O ordenamento jurídico (Direito objetivo) é o conjunto de autorizações válidas para o exercício regular de possibilidades fáticas. E o direito subjetivo é o exercício regular e validamente autorizado de uma possibilidade fática. Toda e qualquer possibilidade fática pode ser regulada e validamente autorizada pelo ordenamento jurídico. Toda e qualquer possibilidade fática validamente autorizada pode ser regularmente exercida por um indivíduo. O ordenamento é “oco”: as necessidades ou as conveniências preencherão o seu conteúdo.

Tenha-se que um adequado entendimento do ordenamento jurídico requer quatro dimensões: a) o conhecimento dos contextos fáticos; b) o conhecimento dos textos normativos; c) a compreensão dos “paradigmas coletivos” 21; e d) a aceitação dos “prismas individuais” 22. O Direito (o ordenamento jurídico) não é tridimensional, mas tetradimensional. 23 Principiemos pelos textos normativos.

Estão enunciados no art. 5º, incisos IV, V, IX, X, XLI, XLII e LII, Constituição:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

...

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

...

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

...

XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;

XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;

...

LII - não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião;

Além dos aludidos preceitos, na Constituição há outros enunciados sintonizados com esses direitos (e deveres) e que protegem determinadas atividades ou veículos de manifestação dos pensamentos, das opiniões, das ideologias e das criações culturais e artísticas:

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

...

Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.

§ 1º O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.

...

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:

I - as formas de expressão;

...

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

§ 3º Compete à lei federal:

I - regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada;

II - estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente.

§ 4º A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso.

§ 5º Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio.

§ 6º A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade.

Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:

I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;

II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação;

III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;

IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

Tenha-se que a Constituição concede aos parlamentares a inviolabilidade, civil e penal, para quaisquer de suas opiniões, palavras e votos (art. 53, caput). No entanto, dispõe a Constituição que dentre as hipóteses de perda do mandato parlamentar está o procedimento que for declarado incompatível com o decoro, e essa incompatibilidade será definida regimentalmente e, em essência, consiste no abuso das prerrogativas parlamentares ou na percepção de vantagens indevidas (art. 55, II, § 1º).

No plano regimental (ou interna corporis), a Câmara dos Deputados instituiu o seu “Código de Ética e Decoro Parlamentar”24. No ponto que interessa à questão da “liberdade de expressão e discurso de ódio” está enunciado que dentre os deveres fundamentais do deputado está o de “tratar com respeito e independência os colegas, as autoridades, os servidores da Casa e os cidadãos com os quais mantenha contato no exercício da atividade parlamentar, não prescindindo de igual tratamento” (art. 3º, VII) e dentre as condutas atentatórias contra o decoro, passíveis de punição, estão (art. 5º):

I – perturbar a ordem das sessões da Câmara dos Deputados ou das reuniões da Comissão;

II – praticar atos que infrinjam as regras de boa conduta nas dependências da Casa;

III – praticar ofensas físicas ou morais nas dependências da Câmara dos Deputados ou desacatar, por atos ou palavras, outro parlamentar, a Mesa ou Comissão ou os respectivos Presidentes.

No Senado Federal, o respectivo “Código de Ética e Decoro Parlamentar”25 enuncia mandamentos similares para os senadores da República. O parlamentar não é tirano absoluto de seu mandato popular. O parlamentar recebe um mandato para representar o povo e não deve exercer esse múnus ilegal e abusivamente. A ninguém é dado o direito de agir de modo ilegal ou abusivo, seja poderosa autoridade pública, seja cidadão comum.

A Constituição imuniza outras atividades. Com efeito, nela está prescrito que o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei (art. 133). O “Estatuto da Advocacia” 26 e o “Código de Ética e Disciplina da OAB” 27 prescrevem as hipóteses limitadoras do exercício da profissão, dentre elas o dever do advogado de a todos tratar com respeito e consideração e o de empregar uma linguagem escorreita e polida, bem como a proibição de escandalosa incontinência pública.

Não deve o “jurista” (advogado, magistrado, promotor, procurador, consultor, defensor etc.) deturpar e abusar de seu direito de interpretar a lei. A interpretação normativa não deve ser espúria nem deve adulterar o sentido razoável e possível do texto normativo, muito menos desprezar a realidade objetiva das coisas: uma criança não é um adulto; um jovem não é um idoso; uma mulher não é um homem; uma coisa não é uma pessoa; uma pedra não é um pau; um revólver não é uma faca etc.

Ante esses entendimentos e em face da leitura dos ventilados preceitos normativos, alcançamos as seguintes diretivas que nos são induvidosas:

a) a Constituição concede especial destaque a liberdade de expressar os pensamentos, as opiniões, as artes, as ciências e os saberes etc.;

b) essas liberdades, nada obstante generosas, não devem ser exercidas de modo ilegal ou abusivo (desarrazoado e desproporcional); e

c) todo direito, inclusive os mais altaneiros ou mesmo os absolutos, pode ser sacrificado ou restringido, se houver um justo e convincente motivo.

No plano da normatividade internacional, recordemos o “Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos” 28 especialmente os seus Artigos 19 e 20:

ARTIGO 19

1. Ninguém poderá ser molestado por suas opiniões.

2. Toda pessoa terá direito à liberdade de expressão; esse direito incluirá a liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza, independentemente de considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro meio de sua escolha.

3. O exercício do direito previsto no parágrafo 2 do presente artigo implicará deveres e responsabilidades especiais. Consequentemente, poderá estar sujeito a certas restrições, que devem, entretanto, ser expressamente previstas em lei e que se façam necessárias para:

a) assegurar o respeito dos direitos e da reputação das demais pessoas;

b) proteger a segurança nacional, a ordem, a saúde ou a moral públicas.

ARTIGO 20

1. Será proibida por lei qualquer propaganda em favor da guerra.

2. Será proibida por lei qualquer apologia do ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade ou à violência.

Em toada similar, a “Convenção Americana sobre Direitos Humanos” 29 o seu Artigo 13 (Liberdade de Pensamento e de Expressão):

1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem consideração de fronteiras verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito a censurar prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei a ser necessária para assegurar:

a) o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas; ou

b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral públicas.

3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequência radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e opiniões.

4. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2.

5. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência.

Os preceitos dos diplomas internacionais são categóricos: determinam a proibição à “apologia” ao “ódio” que constitua “incitação” à discriminação, à hostilidade, ao crime e à violência. Não é qualquer “ódio” que deve ser proibido, mas tão somente aquele “apologético” e “incitador” de práticas ilícitas hediondas: discriminação, hostilidade, crime e violência. O “ódio” sem essas motivações e que não seja capaz de provocar essas consequências não deve ser proibido ou juridicamente sancionado.

Para finalizarmos nos domínios da normatividade internacional, recordemos a “Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância” 30 que preceitua, no seu Artigo 4, que os Estados devem sancionar publicação, circulação ou difusão, por qualquer forma e/ou meio de comunicação, inclusive a internet, de qualquer material racista ou racialmente discriminatório que defenda, promova ou incite o ódio, a discriminação e a intolerância. Valiosas as definições estabelecidas por essa aludida Convenção:

Artigo 1

Para os efeitos desta Convenção:

1. Discriminação racial é qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência, em qualquer área da vida pública ou privada, cujo propósito ou efeito seja anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em condições de igualdade, de um ou mais direitos humanos e liberdades fundamentais consagrados nos instrumentos internacionais aplicáveis aos Estados Partes. A discriminação racial pode basear-se em raça, cor, ascendência ou origem nacional ou étnica.

2. Discriminação racial indireta é aquela que ocorre, em qualquer esfera da vida pública ou privada, quando um dispositivo, prática ou critério aparentemente neutro tem a capacidade de acarretar uma desvantagem particular para pessoas pertencentes a um grupo específico, com base nas razões estabelecidas no Artigo 1.1, ou as coloca em desvantagem, a menos que esse dispositivo, prática ou critério tenha um objetivo ou justificativa razoável e legítima à luz do Direito Internacional dos Direitos Humanos.

3. Discriminação múltipla ou agravada é qualquer preferência, distinção, exclusão ou restrição baseada, de modo concomitante, em dois ou mais critérios dispostos no Artigo 1.1, ou outros reconhecidos em instrumentos internacionais, cujo objetivo ou resultado seja anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em condições de igualdade, de um ou mais direitos humanos e liberdades fundamentais consagrados nos instrumentos internacionais aplicáveis aos Estados Partes, em qualquer área da vida pública ou privada.

4. Racismo consiste em qualquer teoria, doutrina, ideologia ou conjunto de ideias que enunciam um vínculo causal entre as características fenotípicas ou genotípicas de indivíduos ou grupos e seus traços intelectuais, culturais e de personalidade, inclusive o falso conceito de superioridade racial. O racismo ocasiona desigualdades raciais e a noção de que as relações discriminatórias entre grupos são moral e cientificamente justificadas. Toda teoria, doutrina, ideologia e conjunto de ideias racistas descritas neste Artigo são cientificamente falsas, moralmente censuráveis, socialmente injustas e contrárias aos princípios fundamentais do Direito Internacional e, portanto, perturbam gravemente a paz e a segurança internacional, sendo, dessa maneira, condenadas pelos Estados Partes.

5. As medidas especiais ou de ação afirmativa adotadas com a finalidade de assegurar o gozo ou exercício, em condições de igualdade, de um ou mais direitos humanos e liberdades fundamentais de grupos que requeiram essa proteção não constituirão discriminação racial, desde que essas medidas não levem à manutenção de direitos separados para grupos diferentes e não se perpetuem uma vez alcançados seus objetivos.

6. Intolerância é um ato ou conjunto de atos ou manifestações que denotam desrespeito, rejeição ou desprezo à dignidade, características, convicções ou opiniões de pessoas por serem diferentes ou contrárias. Pode manifestar-se como a marginalização e a exclusão de grupos em condições de vulnerabilidade da participação em qualquer esfera da vida pública ou privada ou como violência contra esses grupos.

Segundo esse diploma internacional, a defesa, incitação e promoção do ódio racial ou discriminatório devem ser sancionadas. Os citados preceitos vão além da mera regulação jurídico-normativa das condutas: chega ao ponto de avançar nos domínios das “verdades/falsidades” da ciência.

Recordemos que o Direito deve regular condutas atribuindo sentido e valor a fatos, eventos e comportamentos. Avançar nos domínios da ciência, por melhores que sejam as intenções e por mais verdadeira que seja a asserção normativa, não é o melhor caminho para alcançar a finalidade colimada. A ciência, assim como a arte, é livre, inclusive para errar estupidamente, como sucede com a falsa crença da superioridade racial, assim como tantas outras falsas crenças ou “falsas verdades científicas”. A ciência não é dona da verdade. Ela busca a verdade científica, que é uma das verdades possíveis, mas não é a única nem é a absoluta.

No plano da normatividade interna, o Código Penal31 regula os crimes contra a honra em capítulo específico (CP, arts. 138 a 145). Segundo esse Código três são os tipos penais específicos: a calúnia, a difamação e a injúria. O crime de calúnia consiste em imputar, falsamente, a alguém, fato definido como crime. A difamação consiste na imputação, a alguém, de fato ofensivo à sua reputação. E a injúria consiste na ofensa à dignidade ou ao decoro de alguém.

Tenha-se que nesse aludido Código há a exclusão da punibilidade nos crimes difamação e injúria nas seguintes hipóteses (art. 142):

I - a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador;

II - a opinião desfavorável da crítica literária, artística ou científica, salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar;

III - o conceito desfavorável emitido por funcionário público, em apreciação ou informação que preste no cumprimento de dever do ofício.

O Código regula, nos vários dispositivos desse específico capítulo dos “crimes contra a honra”, algumas hipóteses de minoração da punibilidade, até mesmo sua isenção, de potencialização dessa punição e procedimentos necessários para a submissão da conduta ao juízo. Em relação ao crime de calúnia (imputar falsamente a prática de um crime) não há maiores dúvidas que as “liberdades de expressão” não servem de escudo protetor. Dúvidas surgem, no entanto, nos crimes de difamação e de injúria, haja vista a possibilidade de a “ofensa” estar albergada pelas “liberdades de expressão”.

Toda e qualquer ofensa implicaria na prática do crime de difamação ou de injúria?

Entendemos que os crimes de difamação ou de injúria decorreriam da ofensa injusta ou abusiva. Tenha-se, a bem da verdade, que a legislação não qualifica de injusta ou abusiva a ofensa apta a incidir as hipóteses penais. No entanto, a fim de compatibilizar a proteção normativa à honra (dignidade, decoro, imagem etc.) com as “liberdades de expressão”, a melhor interpretação é aquela que torna ilícita a “injusta ou abusiva odiosa ofensa”. No Código Penal há a criminalização de atos contra o sentimento religioso e contra o respeito aos mortos (arts. 208 a 212). Na hipótese, escarnecer, publicamente, alguém por motivo de crença ou função religiosa seria a conduta ilegal ou abusiva que não estaria protegida pelas “liberdades de expressão”. A incitação e a apologia ao crime também não estariam albergadas por essa garantia fundamental (CP, arts. 286 e 287). Também a nudez ou a intimidade/privacidade sexual estão fora do amparo dessa garantia fundamental, se ausente autorização da pessoa exposta (CP, art. 216-B). Ou seja, viola abusivamente a “liberdade de expressão” aquele que expõe o recato sexual de outrem.

Fora do Código Penal, temos legislação que protege os naturalmente vulneráveis: menores32, idosos33 e pessoas com deficiência34. À luz dessa legislação, podemos enunciar que são vedadas, por ilegais e abusivas, as manifestações que atentem contra a inviolabilidade da integridade psíquica e moral desses vulneráveis, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças.

Não devem ser admitidos os tratamentos cruéis e degradantes que humilhem ou ridicularizem as pessoas vulneráveis, haja vista a peculiar situação delas, tanto no aspecto físico quanto no psíquico ou emocional. Em nossa avaliação, uma coisa é a manifestação de “ódio” em relação a pessoas adultas ou pessoas que não sejam naturalmente vulneráveis ou que possam “defender-se” desse “ódio destilado”. Outra coisa consiste no “ódio” destilado contra naturalmente vulneráveis, sobretudo no aspecto físico quanto no psíquico-emocional. Nessas hipóteses, parece-nos que essas manifestações seriam ilegais e abusivas, e não protegidas pelas “liberdades de expressão”.35

Se crianças, idosos e deficientes não devem ser objeto de “ódios”, pelas razões suscitadas (fragilidade física e psíquico-emocional), magistrados não devem manifestar suas opiniões sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou emitir juízo depreciativo sobre outras manifestações judiciais, ressalvada a crítica acadêmica.36

Ora, se a mera “opinião” é vedada ao magistrado, com muito maior razão a proibição de expressar o “ódio” em relação não apenas às outras decisões judiciais, mas em relação a quaisquer atores processuais ou a quaisquer partes ou cidadãos ou autoridades. As falas e condutas dos magistrados devem ser irrepreensíveis. E não devem os magistrados esconderem-se covardemente por trás do anonimato para repassar informações ou opiniões sobre quaisquer temas. É um dos “ônus” pelo “bônus” de exercer a magistratura. 37

A questão dos “ódios raciais” é objeto da Lei n. 7.716/198938, que regula a punição dos crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Nessa Lei está criminalizada a injúria que ofenda a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional (art. 2º-A). Essa Lei dispõe que praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito fundados nessas aludidas razões enseja a pena de reclusão e multa.

Também prescreve essa Lei que fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo é crime punível com a pena de reclusão. Preceitua que tais crimes podem ser cometidos por intermédio dos meios de comunicação social, de publicação em redes sociais, da rede mundial de computadores ou de publicação de qualquer natureza.

Isso significa, portanto, que manifestações de “ódio discriminatório ou preconceituoso” motivado pela raça, cor, religião, etnia ou procedência nacional ensejam a persecução criminal. E manifestações de apreço (ou de amor) ao nazismo também são vedadas e criminalizadas. A criminalização do nazismo autoriza a criminalização de quaisquer ideologias políticas vocacionadas à tirania e ao desprezo dos direitos fundamentais da pessoa humana. A Constituição torna ilícitas todas essas ideologias totalitárias (CF, art. 17).39

O fato inquestionável de que as ideologias totalitárias merecerem a repulsa de todos autoriza a criminalização das opiniões que lhes sejam favoráveis ou que lhes defendam? No Brasil, a resposta tem sido positiva. É democrática e tolerante uma sociedade que não tolera opiniões intolerantes e totalitárias? Parece-nos que não.

Saindo, vez mais, da legislação penal, temos a “Lei da Ação Civil Pública” 40. Essa Lei regula as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor estético, histórico, turístico e paisagístico, a qualquer outro interesse difuso e coletivo, por infração da ordem econômica, à ordem urbanística, ao patrimônio público e social e à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos (art. 1º).

Forte nessa Lei, sentença judicial, em ação manifestamente incabível, condenou o réu ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, a serem destinados a fundos destinados à promoção da igualdade racial e contra a discriminação da comunidade LGBTQIA+ (homossexuais), por suas falas direcionadas a cidadão estrangeiro, que foi entendida como prática velada de ato racista e homofóbico, que teria afetado a toda a sociedade de não se ver afrontada por ações dessa natureza, o que extrapolaria os limites da liberdade de expressão.41

A mencionada Lei prescreve que a ilegalidade ocorre se houver agressão à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos. Uma coletividade deve ser o objeto da proteção. Todavia, a vítima individual das falas preconceituosas e discriminatórias não ajuizou qualquer demanda judicial. A vítima (a pessoa ofendida) aparentemente não se sentiu ofendida ou violada. Em verdade, foram entidades que militam no ativismo identitário que se sentiram agredidas, e ao final foram premiadas com substantiva quantidade de dinheiro para as causas que patrocinam.42

Temos que nem sempre seja fácil determinar a prática ilegal ou abusiva do “discurso de ódio” violadora da liberdade de expressão. Mas se houver dúvida, as decisões judiciais deveriam prestigiar as liberdades, em vez de cerceá-las sob a justificativa de proibir o “ódio”, porquanto em nome dessa proibição ou do suposto “combate à desinformação” estão sendo gestadas medidas que nada mais são do que censura disfarçada, o que tem sido acusado de “império do bem” 43 ou “império do oprimido” 44, que acredita em um falso “virtuosismo moral” 45 das minorias identitárias e impõe uma “espiral do silêncio” 46 a quaisquer vozes discordantes, em um verdadeiro “totalitarismo ideológico” 47 uma das consequências de um “sentimentalismo tóxico” 48.

Cuide-se que há um elemento sensível nessa questão. Há quem enxergue nos “discursos de ódio” verdadeiros “gatilhos” provocadores de ações violentas e criminosas, especialmente contra determinados grupos vulneráveis. 49 Essa é uma questão extremamente delicada e reclama uma análise acurada e multidisciplinar. No entanto, à luz dos textos normativos referidos, especialmente os internacionais, veremos que o “discurso de ódio” proibido é aquele que efetivamente seja capaz de provocar essas injustas ações violentas, sobretudo contra pessoas vulneráveis.

Com efeito, “palavras” não machucam nem ferem, mas ofendem e incomodam, a depender de “quem fale” e para “quem se fale”, e “como se fale”. Assim, pessoas naturalmente vulneráveis e com maior grau de sensibilidade (crianças, deficientes, idosos etc.) necessitam de uma maior proteção e uma maior “intolerância” com os “discursos de ódio”. Isso significa que não são quaisquer “palavras ofensivas ou machucadoras (sic)” que devem ser sancionadas ou vislumbradas como “discursos de ódio”, ou que firam as suscetibilidades ou as hipersensibilidades de determinadas pessoas, mas tão somente aquelas que efetivamente coloquem em perigo real os destinatários de manifestações “odiosas”.

Não é qualquer “fala” abjeta ou repulsiva que deve ser sancionada, mas tão somente aquela com real potencialidade de provocar efetivas ações violentas e criminosas. E essa potencialidade depende, necessariamente, de quem emita, como a emita e para quem ou sobre quem se emita o indigitado “discurso de ódio”, que, reiteramos, pode ser “ofensivo (ilegal e abusivo)” ou “inofensivo (abjeto e repulsivo)”.

Em síntese, esse é o quadro legislativo-normativo no tocante às liberdades de expressão e às restrições dos “discursos de ódio”.

Passemos a verificar como as hipóteses normativas estão sendo aplicadas pelos magistrados, especialmente os do Supremo Tribunal Federal. Como é de sobejo conhecimento, há o Direito (ordenamento jurídico) em sua estática normativa, e há o Direito em sua dinâmica ou prática normativa. Visitemos a dinâmica.


3 AS LIBERDADES DE EXPRESSÃO NA JURISPRUDÊNCIA

Se compararmos o Direito com a Música, perceberemos que o Direito não é apenas o quanto escrito e prescrito nos textos normativos, mas sobretudo a sua aplicação na realidade concreta. Algo similar sucede com a Música. Uma coisa é a letra ou as notas contidas nas partituras musicais, e outra coisa é o que escutamos pela execução cometida pelos intérpretes (músicos, cantores, bandas, orquestras etc.). As pessoas não ouvimos a “partitura musical”, mas escutamos a sua execução pelos intérpretes. Com o Direito é similar. Como aludido, o Direito não se esgota no texto normativo hipotético e abstrato das “Leis” (a “partitura jurídica”), ele consiste na execução (interpretação/aplicação) concreta na realidade, e nem sempre o contido no texto da “Lei” está em plena sintonia com o texto da “Sentença”.

Ante essa realidade objetiva incoercível, além da leitura das “Leis”, a leitura das “Sentenças” é indispensável para uma adequada compreensão do “Direito” com a finalidade de saber o que tem validade, vigência, eficiência e eficácia normativa na vida das pessoas. Eis a principal razão que justifica a análise de julgados e decisões, tanto judiciais, quanto administrativas, bem como das práticas públicas, sociais e privadas.

Nessa linha, principiaremos pelo julgamento mais relevante do tema: o já referido Habeas Corpus 82.424, conhecido como o “caso Ellwanger”, verdadeiro paradigma sobre o tema na jurisprudência do STF. 50 Nesse julgado o Tribunal entendeu que a liberdade de expressão não blindaria autor e editor de livros compreendidos como racistas, na modalidade de antissemitismo e divulgador de possível ódio contra os judeus. Da ementa do acórdão do citado julgado colhemos:

....

13. Liberdade de expressão. Garantia constitucional que não se tem como absoluta. Limites morais e jurídicos. O direito à livre expressão não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam ilicitude penal.

14. As liberdades públicas não são incondicionais, por isso devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria Constituição Federal (CF, artigo 5º, § 2º, primeira parte). O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o "direito à incitação ao racismo", dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica.

....

Esse entendimento relativo à liberdade de expressão não contou com o placet dos ministros Marco Aurélio e Ayres Britto. Segundo esses citados ministros, as obras escritas e editadas, conquanto fossem de má qualidade, não configurariam prática de crime, visto que albergadas pela liberdade de expressão, e que esses livros, de per si, não seriam capazes de instilar o ódio contra os judeus, daí que não seria qualquer “discurso de ódio” que deveria ser sancionado, mas tão somente o “discurso de ódio” capaz de incentivar a prática do ódio, no seu concreto agir. Nada obstante o acerto do entendimento dos citados ministros, a maioria optou por criminalizar a publicação e edição de livros pela hipotética potencialidade de provocar ações de ódio contra os judeus.

De posse desse entendimento, o STF, nos autos dos já citados MI 4.733 e ADO 26, equiparou eventuais preconceitos e discriminações contra homossexuais ao crime de racismo regulado pela Lei n. 7.716/1989. Sem embargo das boas intenções da maioria dos ministros da Corte, nos parece que essa solução não é a constitucionalmente mais adequada, porquanto violadora dos princípios da separação dos Poderes e, vez mais, da estrita legalidade. Inovar positivamente o ordenamento jurídico, sobretudo em matéria penal, é atribuição exclusiva e indelegável do Parlamento, nunca do Judiciário.51

Recorde-se que assim como os “discursos de ódio” não são tolerados em face de “judeus” ou se considerados como “racistas”, também estão sendo considerados como criminosos se dirigidos a homossexuais, ainda que não consistam em ameaças concretas à integridade física ou moral dessas pessoas. Nada obstante a hediondez dessas falas e condutas discriminatórias e preconceituosas, o órgão constitucionalmente competente para inovar positivamente o ordenamento jurídico é o Parlamento, reiteramos. Assim, as decisões judiciais que usurpam prerrogativas legislativas ou parlamentares são ilícitas e ilegítimas, conquanto tenham boas e louváveis intenções.

No entanto, como ventilamos, há vários outros julgados nos quais a Corte optou pela “liberdade de expressão”. 52 Visitaremos alguns deles.

No RE 685.49353 o Tribunal fixou a tese segundo a qual “ante o conflito entre a liberdade de expressão de agente político, na defesa da coisa pública, e honra de terceiro, há de prevalecer o interesse coletivo”. Na ADI 2.56654, decretou-se a inconstitucionalidade de preceito que embaraçava o “proselitismo religioso” em rádios comunitárias, forte no fundamento de que o art. 220, CF, expressamente consagra a “liberdade de expressão” sob qualquer forma, processo ou veículo, hipótese que inclui o serviço de radiodifusão. Esses julgados são recordados porque não raras vezes tanto falas “injuriosas ou difamatórias” como falas “religiosas” são inquinadas de “odiosas”.

Trilhando a senda aberta por Stuart Mill, o STF, na ADI 4.45155, assentou que “o direito fundamental à liberdade de expressão não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também aquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias; ressalte-se que, mesmo as declarações errôneas, estão sob a guarda dessa garantia constitucional”.

Essa acertada decisão da Corte indica que a “verdade ou a mentira” não tem “dono”, e que cabe ao público joeirar e formar o seu próprio descortino, sem tutores iluminados ou privilegiados, ainda que sejam pessoas de ilibada reputação e de notável saber. Na mesa toada a ADPF 54856, julgado no qual o Tribunal assentou que “pluralismo não é unanimidade, impedir a manifestação do diferente e à livre manifestação de todas as formas de apreender e manifestar a sua compreensão de mundo é algemar as liberdades, destruir o direito e exterminar a democracia”.

Outra paradigmática decisão da Corte se deu na ADPF 18757, no caso conhecido como “marcha da maconha”. Nesse julgado, entendeu-se que o debate sobre a descriminalização da maconha não se tratava de apologia ou incitação, mas tão somente de exercício regular da liberdade de expressão (ou do “livre mercado de ideias”). Desse julgamento é possível concluir que qualquer “ideia” ou “opinião”, ainda que equivocada ou contrária às leis ou às visões dominantes ou tidas como corretas, podem ser expostas e submetidas ao público. E este faz o seu juízo de valor.

Essa aludida decisão foi no rastro do quanto decidido na ADPF 13058, feito no qual a Corte decidiu pela incompatibilidade da “Lei de Imprensa” 59 com a Constituição Federal, cujo fundamento pode ser sintetizado na seguinte asserção: “respeitada sempre a ideia força de que quem quer que seja tem o direito de dizer o que quer que seja”. Isso, segundo o contido nesse julgamento, não impede o direito de resposta nem a responsabilização penal ordinária.

Todavia, na PET 10.39160 o Tribunal enfrentou a questão da utilização de perfis nas redes sociais para a propagação de “discursos de ódio” com a subversão da ordem e incentivo à quebra da normalidade institucional e democrática, o que configuraria abuso do direito de liberdade de expressão. Segundo a Corte, “a liberdade de expressão é consagrada constitucionalmente e balizada pelo binômio liberdade e responsabilidade, ou seja, o exercício desse direito não pode ser utilizado como verdadeiro escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas; não se confunde liberdade de expressão com impunidade para agressão; dessa maneira, uma vez desvirtuado criminosamente o exercício da liberdade de expressão, a Constituição Federal e a legislação autorizam medidas repressivas civis e penais, tanto de natureza cautelar quanto definitivas”.

De efeito, a Corte tem afastado a proteção da liberdade de expressão nas hipóteses de “discurso de ódio”. Sucede, no entanto, que a substância desse tipo de discurso é fluída ou demasiadamente casuística ao sabor da interpretação subjetiva do magistrado, de sorte que não um conceito preciso e objetivo de “discurso de ódio”.

Tome-se, por exemplo, a RCL 38.78261, na qual o Tribunal decidiu que “a liberdade de expressão artística deve ser afastada somente em casos excepcionalíssimos, como na hipótese de configurar ocorrência de prática ilícita, de incitação à violência ou à discriminação, bem como de propagação de discurso de ódio”. E nesse julgado entendeu que a crítica ou sátira religiosa não configura “discurso de ódio”.

Cuide-se que na AP 1.04462, o Tribunal condenou parlamentar, afastando a imunidade contida no art. 53, CF, sob o entendimento de que “liberdade de expressão não permite a propagação de discursos de ódio e ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado de Direito; e que a garantia constitucional da imunidade parlamentar material somente incide no caso de as manifestações guardarem conexão com o desempenho da função legislativa ou que sejam proferidas em razão desta, não sendo possível utilizá-la como verdadeiro escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas”. Esse entendimento prevaleceu na PET 10.00163.

Nesses aludidos feitos, a Corte ignorou solenemente a imunidade parlamentar. E ainda que essa imunidade tivesse sido abusivamente utilizada, a competência para sancionar o parlamentar deveria ser do próprio Parlamento. Mas se o próprio Legislativo não tem velado pelas prerrogativas de seus membros, não serão os outros Poderes ou instituições que o farão.

Recorde-se que essa atual linha interpretativa do Tribunal colide com o estabelecido no INQ 4.69464, julgado no qual decidiu-se que as “declarações proferidas em razão do cargo de deputado federal encontram-se cobertas pela imunidade material; e não são alcançadas pela persecução penal criminalizadora do racismo”.

Para finalizar, temos recentes decisões da Corte relativas aos atos de vandalismo que foram compreendidos como manifestações antidemocráticas e ações terroristas (ADPF 51965 e INQ 4.87966). Há alguns aspectos que devem ser considerados. Os atos de vandalismo e depredação do patrimônio público devem ser investigados e os autores materiais e intelectuais dessas ações devem ser exemplarmente responsabilizados e punidos. Seriam esses atos de vandalismo verdadeiras e consistentes ações de terrorismo?

Segundo a “Lei do Terrorismo” 67 a resposta à essa indagação deve ser negativa pelas seguintes razões legais e factuais:

Art. 2º O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública.

§ 1º São atos de terrorismo:

I - usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa;

IV - sabotar o funcionamento ou apoderar-se, com violência, grave ameaça a pessoa ou servindo-se de mecanismos cibernéticos, do controle total ou parcial, ainda que de modo temporário, de meio de comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia, instalações militares, instalações de exploração, refino e processamento de petróleo e gás e instituições bancárias e sua rede de atendimento;

V - atentar contra a vida ou a integridade física de pessoa:

Pena - reclusão, de doze a trinta anos, além das sanções correspondentes à ameaça ou à violência.

§ 2º O disposto neste artigo não se aplica à conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar, com o objetivo de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais, sem prejuízo da tipificação penal contida em lei.

O ato terrorista requer razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião. E as manifestações políticas, ainda que violentas, foram excluídas desse regramento. Todavia, estariam tais atos de vandalismos enquadrados como crime contra o Estado Democrático de Direito?

Essa aludida indagação, segundo a “Lei do Estado Democrático de Direito” 68, também merece resposta negativa, sob as luzes dos arts. 359-L e 359-M do Código Penal:

DOS CRIMES CONTRA AS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS

Abolição violenta do Estado Democrático de Direito

Art. 359-L. Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais:

Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência.

Golpe de Estado

Art. 359-M. Tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído:

Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos, além da pena correspondente à violência.

Os atos de vandalismo e depredação ocorridos em um fatídico domingo, 8 de janeiro de 2023, encontraram os prédios públicos vazios, sem a presença de nenhuma autoridade legitimamente constituída, de sorte que, felizmente, nenhuma pessoa física (autoridade pública) destinatária da proteção constitucional e penal foi objeto de ação violenta. Quem são essas autoridades constitucionais?

A resposta não suscita maiores dificuldades: são o presidente ou o vice-presidente da República, os ministros de Estado, os parlamentares, os magistrados e demais agentes políticos equivalentes. Isso, por si só, afasta a incidência das citadas hipóteses penais por atipicidade das condutas e sua real impossibilidade fática e física.

E os pedidos de “intervenção militar” com lastro no art. 142, CF, não seriam violações abusivas da “liberdade de expressão” e exemplos de “discurso de ódio”?

Também nessas hipóteses não se pode cogitar de crime ou de abuso, seja porque o pedido de aplicação de preceito constitucional não pode ser entendido como crime. E porque ainda que seja uma equivocada interpretação da Constituição, isso não é suficiente para configurar conduta penalmente punível, especialmente porque, vez mais, ausentes os pressupostos fáticos de incidência do aludido dispositivo constitucional: a defesa da Pátria e a garantia dos poderes constitucionais e da lei e da ordem, por iniciativa por qualquer desses poderes constitucionais.

Somente as autoridades constitucionais podem reivindicar a incidência do art. 142, CF. A ilegitimidade ativa dos reivindicantes não pode ser vislumbrada como crime, e sem embargo da necessidade de punição exemplar pelos atos de vandalismo e de depredação do patrimônio público, não se pode vislumbrar que as pessoas envolvidas nas ações tresloucadas tenham condições de subverter a ordem democrática e inviabilizar o exercício dos poderes constitucionais. 69

A leitura dos julgados revela a dificuldade em demarcar com objetiva precisão os limites entre as “liberdades de expressão” e os “discursos de ódio”. Todavia, em nossa avaliação, as manifestações de ódio destiladas contra crianças, deficientes e idosos devem ser fortemente sancionadas e tratadas com acurado rigor.

E as manifestações de ódio motivadas por características raciais, sexuais, religiosas? Também são repulsivas e se forem capazes de incitar a prática de crimes ou atos de violência devem ser fortemente sancionadas. Mas se essas manifestações forem “apenas” (sic) ofensivas, mas sem capacidade alguma de incitar a prática de crimes ou de ações violentas, tais manifestações, nada obstante abomináveis, devem ser solenemente ignoradas, porque os emissores desses discursos hediondos devem ser esquecidos na “lata de lixo da história”.

Impor o silêncio a essas figuras repulsivas e abomináveis é a melhor alternativa jurídica? Em nossa avaliação não. Isso seria tornar-lhes mártires ou heróis, honraria imerecida. Idiotas devem ser ignorados. Criminosos, não; esses devem ser exemplarmente punidos. Punição é para criminoso; para idiotas, a indiferença e o esquecimento.


4. CONCLUSÕES

O mal não deve ser banalizado em hipótese alguma e sob nenhuma condição. 70 O mal deve ser levado a sério e com ele não devemos brincar. E nenhum tipo de totalitarismo deve ser tolerado e incentivado. 71 E todo cuidado com manifestações de ódio deve ser tomado. Todavia, em nome do “amor” ou da “felicidade” ou da “paz”, não devemos admitir a censura ou a imposição do silêncio sobre os “discursos” inquinados de “odiosos” por supostos ofendidos.

Em uma sociedade civilizada, decente, livre e plural, quaisquer opiniões devem ser permitidas. Se houver manifestações apologéticas e incitadoras de ações criminosas e violentas, essas manifestações devem ser severamente reprimidas. Nem toda “ofensa”, por mais repulsiva, execrável, abominável que seja é necessariamente “odiosa”, no sentido de ser apta a reclamar a incidência punitiva penal.

O conjunto normativo nacional e internacional, assim como a prática jurisprudencial brasileira, é proibitivo do “discurso de ódio”. No entanto, nem toda fala tida como “ofensiva” deve ser tachada como “odiosa”, mas tão somente aquela com efetivo potencial de causar injusto e indevido prejuízo aos indivíduos, ou se incentivadores de ações violentas e criminosas.

As “liberdades de expressão” não devem ser exercidas de modo ilegal e abusivo. Nenhum direito deve ser exercido de modo ilegal ou abusivo. Mas as sanções e restrições as “liberdades de expressão” não devem abusar ilegalmente do denominado “discurso de ódio” para justificar os cerceios e as censuras, bem como as ações persecutórias e punitivas, seja no campo penal, seja no campo cível.

A quadra atual brasileira reclama especial atenção. Sob a justificativa de combater “desinformação” e “ódio”, medidas políticas e ações judiciais estão sendo praticadas indiscriminadamente, sem se demonstrar de modo concreto e específico, os riscos e perigos reais das apontadas atividades compreendidas como ilegais ou abusivas.

Dos juristas nacionais, sobretudo dos ministros do STF, espera-se um compromisso sincero com a verdade, com a justiça e com a paz, mediante a correta aplicação do Direito, sem se deixarem contaminar pelos mesquinhos interesses políticos nem pelas corruptíveis narrativas ideológicas. O apego aos fatos e à Constituição deve ser o farol a iluminar as visões dos nossos juristas.

O “ódio” é mal, mas a sua injusta e indevida proibição é pior ainda. Se faz necessário calibrar adequadamente o direito que todo indivíduo deve ter de formular juízos, ainda que errados e depreciativos, sobre todas as pessoas, instituições e coisas, com o dever que todos devemos ter de tolerância, respeito e consideração em relação a quaisquer pessoas, ainda que não gostemos ou repudiemos essas pessoas. Esse é o grande desafio civilizatório que temos: conviver dignamente com todos, inclusive com aqueles que eventualmente nos odeiam e a quem eventualmente odiamos.


5. REFERÊNCIAS

Doutrinárias

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ALVES JR., Luís Carlos Martins. Lições de direito constitucional – a Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Amazon, 2021.

ALVES JR., Luís Carlos Martins. Mau gosto não é crime: elogio crítico ao Ministro Ayres Britto no julgamento do Habeas Corpus n. 82.424. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5800, 19 mai. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/74003.

ALVES JR., Luís Carlos Martins. Texto normativo: parâmetro de decidibilidade ou pretexto justificador? Revista Jus Navigandi. ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4338, 18 mai. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/39234.

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BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 519 – segundo referendo. Pleno. Relator ministro Alexandre de Moraes. Julgamento em 12.1º.2023. Acórdão publicado em 10.4.2023. Brasília, 2023 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 154.248. Plenário. Relator ministro Edson Fachin. Julgamento em 28.10.2021. Acórdão publicado em 23.2.2022. Brasília, 2022 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 4.781. Plenário. Relator ministro Edmundo Lins. Julgamento em 5.4.1919 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 82.424. Plenário. Redator ministro Maurício Corrêa. Julgamento em 17.9.2003. Acórdão publicado em 19.3.2004. Brasília, 2004 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Inquérito 4.781. Plenário. Relator ministro Alexandre de Moraes. Brasília, 2019 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Inquérito n. 4.694. Primeira Turma. Relator ministro Marco Aurélio. Julgamento em 11.9.2018. Acórdão publicado em 1º.8.2019. Brasília, 2019 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Inquérito n. 4.879. Pleno. Relator ministro Alexandre de Moraes. Brasília, 2023 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção n. 4.733. Plenário. Relator ministro Edson Fachin. Julgamento em 13.6.2019. Acórdão publicado em 29.9.2020. Brasília, 2020 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Petição n. 10.001 – agravo regimental. Plenário. Relator ministro Dias Toffoli. Redator ministro Alexandre de Moraes. Julgamento em 6.3.2023. Acórdão publicado em 22.3.2023. Brasília, 2023 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Petição n. 10.391 – agravo regimental. Plenário. Relator ministro Alexandre de Moraes. Julgamento em 14.11.2022. Acórdão publicado em 14.2.2023. Brasília, 2023 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação n. 38.782. Segunda Turma. Relator ministro Gilmar Mendes. Julgamento em 3.11.2020. Acórdão publicado em 24.2.2021. Brasília, 2021 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 1.037.396 (Tema 987 de repercussão geral). Plenário. Relator ministro Dias Toffoli. Brasília, 2017 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 1.057.258 (Tema 533 de repercussão geral). Plenário. Relator ministro Luiz Fux. Brasília, 2017 (www.stf.jus.br).

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 685.493. Plenário. Relator ministro Marco Aurélio. Julgamento em 22.5.2020. Acórdão publicado em 17.8.2020. Brasília, 2020 (www.stf.jus.br).


Notas

1 Em uma perspectiva realista e pragmática, temos de reconhecer que o texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988 não tem uma boa qualidade redacional e regula muitas inutilidades, assim como temas irrelevantes ou inconvenientes (quiçá excrescências). Todavia, a Constituição foi parida após uma problemática gestação social e política, fruto da construção de um grande consenso entre as forças predominantes da época e dos esforços de muitos indivíduos em busca da estabilidade institucional e da melhoria das nossas condições civilizatórias. Era o texto possível para aqueles tempos. É o texto que temos, ainda que cheio de imperfeiçoes normativas. Mas esse texto tem um mérito inquestionável: não tolera nenhum tipo de totalitarismo, nem mesmo o democrático.

3 Uma singela busca nos sites lançando os temas “liberdade de expressão” e “discurso de ódio” remete a uma gigantesca quantidade de decisões judiciais, peças processuais e textos doutrinários sobre esse tema.

4 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 82.424. Plenário. Redator ministro Maurício Corrêa. Julgamento em 17.9.2003. Acórdão publicado em 19.3.2004. Brasília, 2004 (www.stf.jus.br).

5 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 154.248. Plenário. Relator ministro Edson Fachin. Julgamento em 28.10.2021. Acórdão publicado em 23.2.2022. Brasília, 2022 (www.stf.jus.br).

6 A Lei n. 14.532/2023 alterou a Lei n. 7.716/1989 e acrescentou que aquele que “injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional” será punido como racista. Ofender alguém injustamente, por qualquer motivação, é torpe. Mas cabe ao legislador legislar, nunca a magistrados.

7 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão n. 26. Plenário. Relator ministro Celso de Mello. Julgamento em 13.6.2019. Acórdão publicado em 6.10.2020. Brasília, 2020 (www.stf.jus.br).

8 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção n. 4.733. Plenário. Relator ministro Edson Fachin. Julgamento em 13.6.2019. Acórdão publicado em 29.9.2020. Brasília, 2020 (www.stf.jus.br).

9 No Brasil, em face do HC 82.424, da ADO 26 e do MI 4.733, a partir de seus fundamentos normativos e dos argumentos jurídicos deduzidos, todo e qualquer “ismo” ou “fobia”, entendido como discriminatório ou preconceituoso, poderá ser equiparado ao crime de racismo. O racismo é coisa séria. Não deve ser banalizado. E infelizmente, neste País, está sendo vulgarizado. E para demonstrar o equívoco dessas decisões do STF, tenha-se que a própria Constituição preceitua que “a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais” (art. 5º, inciso XLI). Sendo assim, as equiparações judiciais são inconstitucionais, conquanto bem-intencionadas, porque exercidas à míngua de amparo legal.

10 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 187. Plenário. Relator ministro Celso de Mello. Julgamento em 15.6.2011. Acórdão publicado em 29.5.2014. Brasília, 2014 (www.stf.jus.br).

11 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.967. Plenário. Relator ministro Ricardo Lewandowski. Julgamento em 28.6.2007. Acórdão publicado em 31.8.2007. Brasília, 2007 (www.stf.jus.br).

12 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 4.781. Plenário. Relator ministro Edmundo Lins. Julgamento em 5.4.1919 (www.stf.jus.br).

13 A crítica às decisões judiciais, especialmente as do Supremo, deve levar em consideração o seguinte: os ministros devem ser magistrados de insuspeita e ilibada reputação e devem ter notável e inquestionável saber jurídico (CF, art. 101), e devem ser dignos de merecer nossa reverência e admiração. Temos de acreditar que os ministros são “guardiães” ao invés de “carcereiros” da Constituição. Assim, os seus juízos devem ser levados a sério e devem ser analisados com rigor e prudência.

14 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Inquérito 4.781. Plenário. Relator ministro Alexandre de Moraes. Brasília, 2019 (www.stf.jus.br).

15 Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei n. 2.630/2020, de autoria do senador Alessandro Vieira, que institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet (www.senado.leg.br). Isso significa que as decisões judiciais ou administrativas punitivas das “fake news” ou das “disseminação de desinformações” estão violando o devido processo legal e a estrita legalidade sancionatória.

16 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 132. Plenário. Relator ministro Ayres Britto. Julgamento em 5.5.2011. Acórdão publicado em 14.10.2011. Brasília, 2011 (www.stf.jus.br).

17 ALVES JR., Luís Carlos Martins. Texto normativo: parâmetro de decidibilidade ou pretexto justificador? Revista Jus Navigandi. ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4338, 18 mai. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/39234.

18 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 1.037.396 (Tema 987 de repercussão geral). Plenário. Relator ministro Dias Toffoli. Brasília, 2017 (www.stf.jus.br).

19 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 1.057.258 (Tema 533 de repercussão geral). Plenário. Relator ministro Luiz Fux. Brasília, 2017 (www.stf.jus.br).

20 STUART MILL, John. Da liberdade individual e econômica – princípios e aplicações do pensamento liberal. Tradução de Carlos Szlak. São Paulo: Faro Editora, 2019.

21 Os “paradigmas coletivos” são os valores e as verdades intersubjetivamente compartilhados de determinada comunidade, em determinado espaço geográfico e em determinado período histórico; esses “paradigmas” viajam (mudam) no tempo e no espaço.

22 Os “prismas individuais” são os valores e as verdades subjetivos do indivíduo, em determinados contextos e circunstâncias; são a ciência, a consciência e a experiência da pessoa; e esses “prismas” influenciam o modo de “compreender” e de “agir” do indivíduo diante dos temas normativos, afetando ora a sua “vontade” ora o seu “entendimento”.

23 ALVES JR., Luís Carlos Martins. Lições de direito constitucional – a Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Amazon, 2021.

24 BRASIL. Câmara dos Deputados. Resolução n. 25, de 2001. Brasília, 2001 (www.camara.leg.br).

25 BRASIL. Senado Federal. Resolução n. 20, de 1993. Brasília, 1993 (www.senado.leg.br).

26 BRASIL. Congresso Nacional. Lei n. 8.906, de 4 de julho de 1994. Brasília, 1994 (www.planalto.gov.br).

27 BRASIL. Ordem dos Advogados do Brasil – OAB. Conselho Federal. Resolução n. 2, de 19 de outubro de 2015. Brasília, 2015 (www.oab.org.br).

28 BRASIL. Presidência da República. Decreto n. 592, de 6 de julho de 1992 (promulga o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, adotado pela XXI Sessão da Assembleia-Geral das Nações Unidas, em 16 de dezembro de 1966). Brasília, 1992 (www.planalto.gov.br).

29 BRASIL. Presidência da República. Decreto n. 678, de 6 de novembro de 1992 (promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de São José da Costa Rica, de 22 de novembro de 1969. Brasília, 1992 (www.planalto.gov.br).

30 BRASIL. Presidência da República. Decreto n. 10.932, de 10 de janeiro de 2022 (promulga a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância, firmada na Guatemala, em 5 de junho de 2013). Brasília, 2022 (www.planalto.gov.br).

31 BRASIL. Presidência da República. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (www.planalto.gov.br).

32 BRASIL. Presidência da República. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990 (www.planalto.gov.br).

33 BRASIL. Presidência da República. Lei n. 10.741, de 1º de outubro de 2003 (www.planalto.gov.br).

34 BRASIL. Presidência da República. Lei n. 13.146, de 6 de julho de 2015 (www.planalto.gov.br).

35 Manifestações de desapreço e ridicularizadoras são abjetas e repulsivas, induvidosamente. Mas nem toda discriminação ou preconceito, nada obstante execráveis, devem ser juridicamente sancionáveis ou proibidas. Temos assistido a uma “hipersensibilidade” de determinados grupos de indivíduos, e sob a inquestionável necessidade de “igualdade, inclusão e diversidade” que a tudo e a todos patrulham, visando reescrever o passado, modificar a linguagem, com as suas ressignificações de sentido, e influenciar os pensamentos, deturpando a natureza biológica, as tradições culturais e os valores sociais, com a intenção de normalizar e padronizar o que não é o “normal” nem o “padrão”.

36 BRASIL. Presidência da República. Lei Complementar n. 35, de 14 de março de 1979, que dispõe sobre a Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN (www.planalto.gov.br).

37 Infelizmente o noticiário nos revela a ausência de comportamento e decoro litúrgico e cerimonioso de não poucos magistrados brasileiros, inclusive das “Altas Cortes” lamentavelmente. Magistrado deve ter um comportamento exemplar, admirável e deve ser uma referência moral e intelectual da sociedade. Magistrado que se rebaixa não é digno da toga que ostenta e não merece respeito nem consideração dos seus jurisdicionados.

38 BRASIL. Presidência da República. Lei n. 7.716, de 5 de janeiro de 1989 (www.planalto.gov.br).

39 Tramitam no Congresso Nacional projetos de lei visando criminalizar o “comunismo” e o “socialismo” (Projetos de Lei ns. 5.358/2016 e 446/2023 (www.camara.leg.br).

40 BRASIL. Presidência da República. Lei n. 7.3.47, de 24 de julho de 1985 (www.planalto.gov.br).

41 BRASIL. Distrito Federal. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Ação Civil Pública n. 0724479-75.2022.8.07.0001. 20ª Vara Cível de Brasília. Juiz Pedro Matos de Arruda. Brasília, 2023 (www.tjdft.jus.br).

42 Atribui-se a Millôr Fernandes a seguinte frase: “Eu desconfio de todo idealista que lucra com o seu ideal”. De fato, há muitos “justiceiros sociais” (“ativistas identitários” ou “militantes ambientais”) que lucram sobremaneira com os seus “ideais”. E quase sempre só os “justiceiros” se beneficiam, raramente os verdadeiros necessitados são alcançados pelas “conquistas”. Nesse “pantanoso labirinto”, as narrativas ideológicas subjetivas desprezam a realidade objetiva dos fatos.

43 MURAY, Philippe. O império do bem – a ditatura do politicamente correto. Tradução de William Alves Biserra. São Paulo: Faro Editorial, 2022.

44 FIUZA, Guilherme. O império do oprimido. São Paulo: Planeta, 2016.

45 TOSI, Justin; e WARMKE, Brandon. Virtuosismo moral (grandstanding) – as ideias por trás dos cancelamentos, boicotes e difamações nas redes sociais. Tradução de Fábio Alberti. São Paulo: Faro Editora, 2021.

46 NOELLE-NEUMANN, Elisabeth. A espiral do silêncio – opinião pública: nosso tecido social. Tradução de Cristian Derosa. Florianópolis: Estudos Nacionais, 2017.

47 SCRUTON, Roger. Tolos, fraudes e militantes – pensadores da nova esquerda. Tradução de Alessandra Bonrruquer. Rio de Janeiro: Record, 2019.

48 DALRYMPLE, Theodore. Podres de mimados – as consequências do sentimentalismo tóxico. Tradução de Pedro Sette-Câmara. São Paulo: É Realizações, 2015.

49 BUTLER, Judith. Discurso de ódio: uma política do performativo. Tradução de Roberta Fabbri Viscardi. São Paulo: Unesp, 2021.

50 ALVES JR., Luís Carlos Martins. Mau gosto não é crime: elogio crítico ao Ministro Ayres Britto no julgamento do Habeas Corpus n. 82.424. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5800, 19 mai. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/74003.

51 ALVES JR., Luís Carlos Martins. A legalidade e o imposto sobre grandes fortunas: uma breve análise acerca das ações diretas de inconstitucionalidade por omissão ns. 26 e 31 e do mandado de injunção n. 4.733. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6115, 29 mar. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/80576.

52 Se se lançar os termos “liberdade de expressão” e “discurso de ódio” como argumentos de busca na jurisprudência do STF, surgirá uma enorme quantidade de julgados (www.stf.jus.br).

53 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 685.493. Plenário. Relator ministro Marco Aurélio. Julgamento em 22.5.2020. Acórdão publicado em 17.8.2020. Brasília, 2020 (www.stf.jus.br).

54 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.566. Plenário. Relator ministro Alexandre de Moraes. Redator ministro Edson Fachin. Julgamento em 16.5.2018. Acórdão publicado em 23.10.2018. Brasília, 2018 (www.stf.jus.br).

55 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.451. Plenário. Relator ministro Alexandre de Moraes. Julgamento em 21.6.2018. Acórdão publicado em 6.3.2019. Brasília, 2019 (www.stf.jus.br).

56 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 187. Plenário. Relator ministro Celso de Mello. Julgamento em 15.6.2011. Acórdão publicado em 29.5.2014. Brasília, 2014 (www.stf.jus.br).

57 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 548 – referendo medida cautelar. Plenário. Relatora ministra Cármen Lúcia. Julgamento em 31.10.2018. Acórdão publicado em 6.10.2020. Brasília, 2020 (www.stf.jus.br).

58 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 130. Plenário. Relator ministro Ayres Britto. Julgamento em 30.4.2009. Acórdão publicado em 6.11.2009. Brasília, 2009 (www.stf.jus.br).

59 BRASIL. Presidência da República. Lei n. 5.250, de 9 de fevereiro de 1967, que regula a liberdade de manifestação do pensamento e de informação. Brasília, 1967 (www.planalto.gov.br).

60 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Petição n. 10.391 – agravo regimental. Plenário. Relator ministro Alexandre de Moraes. Julgamento em 14.11.2022. Acórdão publicado em 14.2.2023. Brasília, 2023 (www.stf.jus.br).

61 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação n. 38.782. Segunda Turma. Relator ministro Gilmar Mendes. Julgamento em 3.11.2020. Acórdão publicado em 24.2.2021. Brasília, 2021 (www.stf.jus.br).

62 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Penal n. 1.044. Plenário. Relator ministro Alexandre de Moraes. Relator ministro Alexandre de Moraes. Julgamento em 20.4.2022. Acórdão publicado em 23.6.2022. Brasília, 2022 (www.stf.jus.br).

63 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Petição n. 10.001 – agravo regimental. Plenário. Relator ministro Dias Toffoli. Redator ministro Alexandre de Moraes. Julgamento em 6.3.2023. Acórdão publicado em 22.3.2023. Brasília, 2023 (www.stf.jus.br).

64 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Inquérito n. 4.694. Primeira Turma. Relator ministro Marco Aurélio. Julgamento em 11.9.2018. Acórdão publicado em 1º.8.2019. Brasília, 2019 (www.stf.jus.br).

65 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 519 – segundo referendo. Pleno. Relator ministro Alexandre de Moraes. Julgamento em 12.1º.2023. Acórdão publicado em 10.4.2023. Brasília, 2023 (www.stf.jus.br).

66 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Inquérito n. 4.879. Pleno. Relator ministro Alexandre de Moraes. Brasília, 2023 (www.stf.jus.br).

67 BRASIL. Presidência da República. Lei n. 13.260, de 16 de março de 2016, que disciplina o terrorismo. Brasília, 2016 (www.planalto.gov.br).

68 BRASIL. Presidência da República. Lei n. 14.197, de 1º de setembro de 2021, que disciplina os crimes contra o Estado Democrático de Direito. Brasília, 2021 (www.planalto.gov.br).

69 MARTINS, Ives Gandra Silva. Serenidade no exame dos fatos – gente desarmada é incapaz de dar um golpe; trata-se de um exagero ideológico. Artigo de opinião. Jornal Folha de São Paulo. Edição de 9 de fevereiro de 2023. São Paulo, 2023 (www.folha.uol.com.br).

70 ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém – um relato sobre a banalidade do mal. Tradução de José Rubens Siqueira. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

71 ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo – antissemitismo, imperialismo, totalitarismo. Tradução de Roberto Raposo. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.


Autor

  • Luís Carlos Martins Alves Jr.

    Luís Carlos Martins Alves Jr.

    Piauiense de Campo Maior; bacharel em Direito, Universidade Federal do Piauí - UFPI; doutor em Direito Constitucional, Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; professor de Direito Constitucional, Centro Universitário do Distrito Federal - UDF; procurador da Fazenda Nacional; e procurador-geral da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA. Exerceu as seguintes funções públicas: assessor-técnico da procuradora-geral do Estado de Minas Gerais; advogado-geral da União adjunto; assessor especial da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Presidência da República; chefe-de-gabinete do ministro de Estado dos Direitos Humanos; secretário nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente; e subchefe-adjunto de Assuntos Parlamentares da Presidência da República. Na iniciativa privada foi advogado-chefe do escritório de Brasília da firma Gaia, Silva, Rolim & Associados – Advocacia e Consultoria Jurídica e consultor jurídico da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB. No plano acadêmico, foi professor de direito constitucional do curso de Administração Pública da Escola de Governo do Estado de Minas Gerais na Fundação João Pinheiro e dos cursos de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, da Universidade Católica de Brasília - UCB do Instituto de Ensino Superior de Brasília - IESB, do Centro Universitário de Anápolis - UNIEVANGÉLICA e do Centro Universitário de Brasília - CEUB. É autor dos livros "O Supremo Tribunal Federal nas Constituições Brasileiras", "Memória Jurisprudencial - Ministro Evandro Lins", "Direitos Constitucionais Fundamentais", "Direito Constitucional Fazendário", "Constituição, Política & Retórica"; "Tributo, Direito & Retórica"; "Lições de Direito Constitucional - Lição 1 A Constituição da República Federativa do Brasil" e "Lições de Direito Constitucional - Lição 2 os princípios fundamentais e os direitos fundamentais" .

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ALVES JR., Luís Carlos Martins. Direito constitucional ao ódio (?). Uma breve análise acerca das possibilidades jurídicas e dos limites normativos das liberdades de expressão, sob as luzes da tolerância democrática. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7239, 27 abr. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/103854. Acesso em: 10 maio 2024.