Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/11066
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

O novo perfil da greve de servidores públicos.

Análise da Lei nº 7.783/89 à luz dos acórdãos proferidos pelo STF no julgamento dos Mandados de Injunção nº 670/ES, 708/DF e 712/PA

O novo perfil da greve de servidores públicos. Análise da Lei nº 7.783/89 à luz dos acórdãos proferidos pelo STF no julgamento dos Mandados de Injunção nº 670/ES, 708/DF e 712/PA

Publicado em . Elaborado em .

O STF adotou solução que eliminou a ausência de regulamentação para a greve de servidores públicos, como também dotou o mandado de injunção de eficácia para coibir omissões.

INTRODUÇÃO

Dentre os dispositivos voltados para a organização da Administração Pública insculpidos na Constituição Federal de 1988 nenhum foi capaz de gerar tantas controvérsias interpretativas quanto o art. 37, VII, a assegurar o direito de greve aos servidores públicos.

Toda a polêmica a circundar o dispositivo em apreço se justifica na medida em que a garantia ali insculpida não só flexibiliza, de certo modo, o postulado da continuidade do serviço público, como também rompe com a crença histórica de que o desempenho de tais misteres pelos servidores estaria a exigir destes últimos a abdicação total de seus interesses econômicos em prol da manutenção incondicional das atividades desempenhadas pelo Estado, como decorrência dos propalados "desígnios da coletividade". [01]

Com toda esta bagagem cultural e histórica a gerar uma visão depreciativa do direito de greve dos servidores públicos, não era difícil antever que a concretização da garantia assegurada pelo art. 37, VII, da Constituição Federal enfrentaria, ao longo de sua vigência, inúmeros obstáculos, como de fato ocorreu.

Dentre tais percalços, ganharam notoriedade a mora do Poder Legislativo na regulamentação da matéria, a edição de decretos pelos Poderes Executivos da União, de alguns Estados e Municípios adotando a simplória solução de configurar a paralisação dos servidores públicos como "faltas ao serviço", e a interpretação restritiva em torno do art. 37, VII, da Constituição Federal levada a cabo pelo Poder Judiciário nos anos subseqüentes à promulgação da Carta Magna de 1988, a negar auto-aplicabilidade àquele dispositivo constitucional.

Em que pesem, contudo, os obstáculos impostos pelos Poderes Públicos no mundo abstrato dos enunciados jurídicos, na realidade, as greves de servidores públicos continuavam surgindo como a resposta natural às resistências encontradas pela referida categoria ao buscar melhores condições de vida e de trabalho junto à Administração Pública. [02]

Sendo, portanto, a paralisação dos estatutários um fato social, não cabia ao Estado outra saída senão negociar com seus respectivos sindicatos o fim daqueles movimentos, ainda que o exercício da parede estivesse pendente de regulamentação pelo Congresso Nacional, tal como concluíra o Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do Mandado de Injunção nº 20/DF.

Diante dessa situação - aliada à persistente mora do Poder Legislativo em conferir eficácia ao art. 37, VII, da Constituição Federal - o Supremo Tribunal Federal, ao julgar os Mandados de Injunção nº 670/ES, 708/PB e 712/DF, houve por bem adotar solução que não só procurou eliminar a ausência de regulamentação legal para a greve de servidores públicos, como também acabou por dotar o instituto do Mandado de Injunção de maior eficácia enquanto ação voltada para coibir omissões dos Poderes Públicos.

Firmou-se, nos sobreditos julgados, o entendimento de que a Lei nº 7.783/89, a regulamentar o direito de greve para os trabalhadores comuns, seria aplicada aos movimentos paredistas titularizados por servidores naquilo que não fosse colidente com a natureza estatutária do vínculo estabelecido pelos funcionários do Estado e a Administração Pública, enquanto o Poder Legislativo não promulgasse diploma legal específico.

Com a superveniência de tal entendimento, não há como negar que foi instituído um novo perfil para o direito de greve dos servidores públicos, a demandar uma releitura da Lei nº 7.783/89, no sentido de perquirir o grau de aplicabilidade de seus dispositivos no que concerne à regulamentação das paredes estatutárias.

Antes disto, contudo, faz-se mister tecer algumas considerações em torno do delineamento histórico conferido à matéria pelo ordenamento jurídico nacional, a se justificar na medida em que tal análise permitirá constatar, em um primeiro momento, a visão depreciativa em torno do direito à greve titularizado pelos servidores públicos que subjaz à cultura política pátria e, em um segundo momento, a necessidade de ruptura com tal compreensão imposta pela Constituição Federal de 1988, cuja constatação é de inegável importância para a interpretação escorreita do instituto ora analisado.


HISTÓRICO DO INSTITUTO DA GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO.

Desde os primórdios de nossa vida como nação independente, incutiu-se a crença de que a investidura do cidadão no serviço público pressupunha, necessariamente, o desapego a todo e qualquer interesse individual de ordem econômica em prol do atendimento pleno às necessidades da coletividade.

Já dizia José Antonio Pimenta Bueno, ao comentar a Constituição Imperial de 1824, que "é um princípio fundamental, que os empregados públicos são estabelecidos no interêsse do serviço social, e não no seu interêsse individual, para manter os direitos dos cidadãos, fazer-lhes justiça, promover os interêsses e o bem-ser da associação." [03]

Nessa toada, o serviço público passou a ser compreendido como um vínculo institucional travado entre o funcionário e o Estado, em que a fixação das bases normativas caberia unilateralmente a este último justamente em função dos interesses coletivos por ele tutelados cujo atendimento não comportava interrupções de qualquer ordem.

Fundando-se em tais premissas, Carlos Maximiliano assentou em seus comentários à Constituição Republicana de 1891 que " cabe ao poder publico a faculdade de augmentar ou restringir as obrigações dos funcionários bem como as condições de aposentadoria, reforma e jubilação, diminuir os vencimentos, emolumentos e custas (...), instituir novas penas para o não cumprimento dos deveres e, na maioria dos casos, remover o empregado ou supprimir o cargo." [04]

Nesse contexto histórico, em que a preponderância do Estado na relação com seus servidores sempre foi tida por natural, não era difícil antever que instituto da greve de funcionários públicos encontraria forte resistência não só para ser reconhecido pelo ordenamento jurídico, como também para ser efetivamente exercido.

Com efeito, por lapso considerável de tempo, as greves de servidores públicos configuraram situação de incidência de tipos penais como sedição, conspiração e abandono de cargo, previstos no Código Criminal do Império, de 1830, bem como no Código Penal Republicano (Decreto n. 847, de 11.10.1890) e na Consolidação das Leis Penais (Decreto nº 22.213, de 14.12.1932). [05]

Apenas em 1939 - no ápice da vigência do ideario corporativista subjacente à Constituição outorgada de 1937 - a greve de servidores foi expressamente proibida, por ocasião do advento do primeiro Estatuto dos Funcionários Públicos (Decreto-Lei n. 1.713, de 28.10.1939), cujo art. 226, VII possuía a seguinte redação:

"Art. 226. É ainda proibido ao funcionário:

(...)

VII - Incitar greves ou a elas aderir, ou praticar atos de sabotagem contra o regime ou o serviço público."

No bojo da Assembléia Constituinte de 1946, instituída após a derrocada da ditadura varguista, muito se discutiu a respeito da inclusão de dispositivo na Carta Magna assegurando o direito de greve aos trabalhadores privados e proibindo-o, ao mesmo tempo, para os servidores do Estado. Os defensores de tal proposta valeram-se dos vetustos argumentos em torno do caráter institucional do vínculo entre o funcionário e a Administração, bem como da natureza supostamente essencial de todo e qualquer serviço público. [06]

Ao cabo dos trabalhos da Assembléia Nacional Constituinte, a redação final do dispositivo em apreço (art. 158) limitou-se a propalar que "é reconhecido o direito de greve, cujo exercício a lei regulará". Outrossim, o novo Estatuto dos Funcionários Públicos (Lei n. 1.711, de 28.10.1952), promulgado alguns anos mais tarde, não incluiu a realização de movimentos paredistas dentre as proibições aos servidores.

Não obstante, pouco depois da edição do sobredito diploma, a Lei de Segurança Nacional (Lei n. 1.802, de 5.1.1953) criminalizou em seu art. 18 a paralisação coletiva dos servidores por motivos politicos e sociais, nos seguintes termos:

"Art. 18. Cessarem, coletivamente, os funcionários públicos os serviços a seu cargo, por motivos políticos ou sociais."

Curioso notar, todavia, que o dispositivo legal em apreço era omisso quanto à proibição de greves por motivos econômicos, justamente a principal causa histórica das paredes estatutárias. Em razão disso, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, capitaneado pelo entendimento do Ministro Nelson Hungria em um caso concreto (Apelação Criminal n. 1.537-SP), chegou a afastar do âmbito de incidência daquela proibição legal a participação de servidor do Município de Santos-SP em paralisação deflagrada com vistas à obtenção de melhores salários:

" EMENTA – Apelação criminal, quando é de ser confirmada a decisão absolutória.

(…)

VOTO

O SENHOR MINISTRO NELSON HUNGRIA (RELATOR).

(…)

" O denunciado tomou parte efetiva na greve? Realmente, deixou de trabalhar como participante da greve? A prova não autorizaria uma afirmativa categórica.

(…)

Mas, admitindo-se que êle participou da greve, como inúmeros seus companheiros, não processados, o texto legal só pune a cessação dos serviços públicos `por motivos politicos ou sociais`e não por motivos `econômicos`, isto é, aumento de salários.

Em face desta fundamentação, não há outra alternativa senão a confirmação da sentença apelada.

Assim, nego provimento à apelação." [07]

Talvez em decorrência da imprecisão subjacente à redação do art. 18 da Lei de Segurança Nacional, o legislador ordinário, ao elaborar a Lei n. 4.330, de 1. 6.1964, teve o cuidado de proibir expressamente o exercício de greve por parte dos servidores estatutários, independentemente do motivo e do ente federativo, ressalvando-o apenas para os empregados públicos exercentes de atividades industriais e regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho, nos seguintes termos:

"Art. 4º A greve não pode ser exercida pelos funcionários e servidores da união, Estados, Territórios, Municípios e autarquias, salvo se se tratar de serviço industrial e o pessoal não receber remuneração fixada por lei ou estiver amparado pela legislação do trabalho."

Com o advento do regime militar, a proibição do exercício de greve por parte de servidores públicos não só foi mantida, como também alçada ao nível constitucional, ganhando expressa previsão no art. 157, § 7, da Carta de 1967, bem como no art. 162 da Emenda n. 1 de 1969:

"Art 157 - A ordem econômica tem por fim realizar a justiça social, com base nos seguintes princípios:

(...)

7º - Não será permitida greve nos serviços públicos e atividades essenciais, definidas em lei." (Na EC 1/69, este parágrafo passou a vigorar como o art. 162).

E, como se já não bastasse a proibição constitucional, o Decreto-Lei nº 1.632, de 4.8.1978 reforçou tal vedação, estabelecendo, outrossim, que as funções exercidas por servidores da Administração Pública configuravam, sem exceção, atividades essenciais e que a participação dos funcionários em greve seria punível com demissão ou suspensão, nos seguintes termos:

"Art 1º - São de interesse da segurança nacional, dentre as atividades essenciais em que a greve é proibida pela Constituição, as relativas a serviços de água e esgoto, energia elétrica, petróleo, gás e outros combustíveis, bancos, transportes, comunicações, carga e descarga, hospitais, ambulatórios, maternidades, farmácias e drogarias, bem assim as de indústrias definidas por decreto do Presidente da República.

(...)

§ 2º Consideram-se igualmente essenciais e de interesse da segurança nacional os serviços públicos federais, estaduais e municipais, de execução direta, indireta, delegada ou concedida, inclusive os do Distrito Federal."

(...)

"Art 6º - Incorre em falta grave, punível com demissão ou suspensão, o funcionário público que participar de greve ou para ela concorrer."

Entretanto, paralelamente à vigência do regime jurídico-constitucional da greve dos servidores públicos previsto nas Cartas de 1967 e 1969, bem como no Decreto-Lei nº 1.632/78, o País passou por profunda crise econômica, marcada, em grande medida, pela alta depreciação do valor real da moeda em decorrência dos altíssimos indices de inflação atingidos nas décadas de 1970 e 1980, cujo aspecto mais sentido pela generalidade dos trabalhadores, fez-se representado pela perda gradual do poder aquisitivo dos salários.

Tal realidade econômica, por evidente, não era alheia aos servidores públicos, que encontravam-se, como os demais trabalhadores, sujeitos às vicissitudes experimentadas pela instável economia nacional. Nesse cenário, a deflagração de movimentos paredistas por parte dos funcionários do Estado, a despeito da proibição constitucional, tendia a ser uma constante.

Ao comentar tal situação, Eduardo Gabriel Saad assinalou que " na prática, bem sabemos que as greves de funcionários públicos – tanto na administração direta como na indireta – se sucedem umas após as outras e o Poder Público tem se revelado impotente para reprimi-las", ressaltando, outrossim, que "essa conduta à margem da lei do funcionalismo público será uma realidade pelo menos enquanto toda a população estiver sofrendo as aflições provocadas por uma inflação que avilta os salários e enlouquece os preços." [08]

Ciente da realidade econômica então vigente, aliada aos princípios democráticos que lhe serviam de norte, a Assembléia Constituinte de 1987/88 houve por bem reconhecer na nova Carta Magna o direito de greve dos servidores públicos, condicionando-o, contudo, à edição de lei complementar a traçar-lhe os requisitos e os limites para seu exercício. [09]

Em que pese, todavia, o significativo avanço logrado no texto da Constituição Federal de 1988, a interpretação de seu art, 37, VII pelos Poderes Públicos - em especial pelo Judiciário e pelo Executivo – ao longo de sua vigência, foi paudada por posições decorrentes do ranço ideológico que fundamentou historicamente a proibição do direito de greve por parte dos servidores estatutários nas legislações anteriores, a vislumbrar o serviço público como uma série de atividades necessariamente ininterruptas e o vínculo entre o Estado e seus funcionários como uma relação ditada unilateralmente por aquele, segundo os pretensos desígnios da coletividade.


O ARTIGO 7º, VII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E SUA REGULAMENTAÇÃO.

Conforme visto alhures, a Constituição Federal de 1988 consistiu no primeiro diploma normativo em toda a história pátria a legitimar o exercício do direito de greve por pate dos servidores públicos, condicionando-o, contudo, à superveniência de lei complementar a traçar-lhe os limites e condições.

Passados os primeiros anos de vigência da Carta de 1988, a lei complementar mencionada no art. 37, VII, da Constituição Federal ainda não havia sido editada e as greves protagonizadas por servidores continuavam a ocorrer constantemente nas esferas federal, estadual e municipal.

Paralelamente a isto, os poderes públicos reagiam aos movimentos paredistas deflagrados por seus servidores aplicando aos seus partícipes as sanções atribuídas usualmente às faltas funcionais injustificadas e cortando-lhes o ponto, valendo-se do entendimento constantemente propalado à ocasião de que enquanto o sobredito dispositivo constitucional não fosse regulamentado pela lei complementar por ele requerida, não haveria de se falar de direito de greve por parte do funcionalismo estatal. [10]

Diante de tais circunstâncias, as entidades representativas dos diversos segmentos de servidores públicos buscaram o Poder Judiciário - em grande medida mediante a utilização do novo instrumento do Mandado de Injunção previsto no art. 5º, LXXI, da Constituição Federal [11] - com vistas à obtenção de provimento voltado para assegurar às categorias substituídas o pleno exercício do direito de greve previsto no art. 7º, VII, da Carta Magna.

O leading case referente à matéria consistiu no famoso Mandado de Injunção nº 20/DF, impetrado pela Confederação dos Servidores Públicos do Brasil – CSPB em face da mora do Congresso Nacional no que concerne à edição da lei complementar prevista no sobredito dispositivo constitucional e julgado pelo Supremo Tribunal Federal em meados de 1994.

No precedente em referência, o Pretório Excelso confirmou a eficácia limitada do art. 37, VII, da Constituição Federal, declarando expressamente que enquanto não editada a lei complementar ali prevista, não teriam os servidores públicos direito ao exercício de greve. Não obstante, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a mora do Congresso Nacional em regulamentar aquele dispositivo constitucional, limitando-se, contudo, a notificar a casa legislativa a respeito de tal omissão:

"EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO - DIREITO DE GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO CIVIL - EVOLUÇÃO DESSE DIREITO NO CONSTITUCIONALISMO BRASILEIRO - MODELOS NORMATIVOS NO DIREITO COMPARADO - PRERROGATIVA JURÍDICA ASSEGURADA PELA CONSTITUIÇÃO (ART. 37, VII) - IMPOSSIBILIDADE DE SEU EXERCÍCIO ANTES DA EDIÇÃO DE LEI COMPLEMENTAR - OMISSÃO LEGISLATIVA - HIPÓTESE DE SUA CONFIGURAÇÃO - RECONHECIMENTO DO ESTADO DE MORA DO CONGRESSO NACIONAL - IMPETRAÇÃO POR ENTIDADE DE CLASSE - ADMISSIBILIDADE - WRIT CONCEDIDO. DIREITO DE GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO: O preceito constitucional que reconheceu o direito de greve ao servidor público civil constitui norma de eficácia meramente limitada, desprovida, em conseqüência, de auto-aplicabilidade, razão pela qual, para atuar plenamente, depende da edição da lei complementar exigida pelo próprio texto da Constituição. A mera outorga constitucional do direito de greve ao servidor público civil não basta - ante a ausência de auto- aplicabilidade da norma constante do art. 37, VII, da Constituição - para justificar o seu imediato exercício. O exercício do direito público subjetivo de greve outorgado aos servidores civis só se revelará possível depois da edição da lei complementar reclamada pela Carta Política. A lei complementar referida - que vai definir os termos e os limites do exercício do direito de greve no serviço público - constitui requisito de aplicabilidade e de operatividade da norma inscrita no art. 37, VII, do texto constitucional. Essa situação de lacuna técnica, precisamente por inviabilizar o exercício do direito de greve, justifica a utilização e o deferimento do mandado de injunção. A inércia estatal configura-se, objetivamente, quando o excessivo e irrazoável retardamento na efetivação da prestação legislativa - não obstante a ausência, na Constituição, de prazo pré-fixado para a edição da necessária norma regulamentadora - vem a comprometer e a nulificar a situação subjetiva de vantagem criada pelo texto constitucional em favor dos seus beneficiários. MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO: A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de admitir a utilização, pelos organismos sindicais e pelas entidades de classe, do mandado de injunção coletivo, com a finalidade de viabilizar, em favor dos membros ou associados dessas instituições, o exercício de direitos assegurados pela Constituição. Precedentes e doutrina." [12]

Note-se, por oportuno, que a idéia em torno da essencialidade do serviço público e de sua prestação continua e ininterrupta foi fortemente ressaltada nos votos proferidos durante o julgamento do precedente em apreço, justamente com vistas a reforçar o entendimento a propalar a impossibilidade de fruição do direito ao exercício de greve enquanto não regulamentado o art. 37, VII, da Constituição Federal, com destaque para as manifestações dos Ministros Celso de Mello (relator) e Paulo Brossard:

" O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO:

(…)

A importância do direito de greve, contudo, não pode prescindir da necessária observância aos princípios de supremacia do interesse público e da continuidade dos serviços desenvolvidos pela administração estatal, especialmente daquelas atividades que, qualificadas pela nota de essencialidade, não podem sofrer, em hipótese alguma, qualquer tipo de interrupção.

(…)

"O SENHOR MINISTRO PAULO BROSSARD:

A administração Pública, pode-se dizer, é um arquipélago de serviços públicos. Que vem a ser um serviço público? Serviço público é aquele que é necessário à sociedade, existencial em relaçao à sociedade. Ora, se o serviço é necessario, ele não pode ser interrompido, indiscriminadamente e incondicionalmente.

O serviço público, exatamente por ser público, é necessário e sendo necessário não pode deixar de funcionar sob pena de deixar de ser necessário. Por isso se diz que é existencial em relação à sociedade. Daí o motivo pelo qual a Constituição proclama que o direito de greve sera exercido, tratando-se de servidor público, nos termos e nos limites da lei."

Valendo-se do entendimento consagrado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no Mandado de Injunção n. 20/DF - a declarar inexeqüível o direito de greve dos servidores enquanto não promulgada a lei complementar requerida pela redação originária do art. 37, VII, da Constituição Federal - os governos federal, estadual e municipal passaram a editar decretos de questionável validade que, a pretexto de regulamentar o regime disciplinar de faltas dos funcionários estatais, conceituaram a participação destes ultimos em movimentos paredistas como faltas injustificadas, puníveis com o corte do ponto. [13]

Diante de tal conduta perpetrada pela Administração Pública, algumas entidades representativas dos servidores e partidos então integrantes da oposição na esfera federal ingressaram com Ações Diretas de Inconstitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal com vistas ao afastamento de tais decretos do ordenamento jurídico.

No entanto, o Pretório Excelso acabou por consagrar a validade dos referidos diplomas, sob o entendimento de que a regulamentação das conseqüências administrativas e disciplinares da participação dos servidores em greves, por intermédio de decreto, não tinha o condão de malferir a competência privativa do Congresso Nacional para editar a lei complementar requerida pelo art. 37, VII, da Constituição Federal, conforme consagrado nas ADIs n. 1.696/SE e 1.306/BA:

"EMENTA: Greve de servidor público: não ofende a competência privativa da União para disciplinar-lhe, por lei complementar, os termos e limites - e o que o STF reputa indispensável à licitude do exercício do direito (MI 20 e MI 438; ressalva do relator) - o decreto do Governador que - a partir da premissa de ilegalidade da paralisação, à falta da lei complementar federal - discipline suas conseqüências administrativas, disciplinares ou não (precedente: ADInMC 1306, 30.6.95)." [14]

(…)

"EMENTA: - Insuficiência de relevo de fundamentação jurídica em exame cautelar, da argüição de inconstitucionalidade de decreto estadual que não esta a regular (como propoem os requerentes) o exercício do direito de greve pelos servidores publicos; mas a disciplinar uma conduta julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal, até que venha a ser editada a lei complementar prevista no art. 37, II, da Carta de 1988 (M.I. n. 20, sessão de 19-5-94)." [15]

Passados dez anos da promulgação da Constituição de 1988 e quatro da publicação da decisão proferida no Mandado de Injunção n. 20/DF, a Emenda Constitucional nº 19, de 5.5.1998 promoveu singela, porém significativa alteração no art. 37, VII, da Carta Magna, excluindo de seu texto o adjetivo "complementar". Em outras palavras, pela nova redação, a greve dos servidores públicos poderia ser regulamentada, a partir de então, por lei ordinária, não mais havendo a necessidade de quórum qualificado para tanto.

Ainda assim, a mora do Congresso Nacional em regulamentar a materia persistiu e, em que pese a apresentação de diversos projetos de lei nesse sentido, nenhum deles logrou aprovação. Diante desse quadro, as entidades representativas dos servidores públicos tornaram a ingressar com Mandados de Injunção junto ao Supremo Tribunal Federal pleiteando, desta feita, a aplicação subsidiária da Lei nº 7.783, de 28.6.1989 às greves deflagradas pela categoria enquanto subsistisse a referida omissão legislativa.

Tal pretensão, contudo, foi rechaçada pelo Plenário do Pretório Excelso, que, em distintas ocasiões, deixou assente a impossibilidade de se valer da aplicação analógica da Lei Geral de Greve (Lei n. 7.783/89) com vistas a suplantar a omissão legislativa constatada na espécie.

Ainda segundo a posição consolidada à ocasião, a aplicação subsidiária do referido diploma seria pertinente apenas se houvesse regulamentação em torno da parede estatutária e esta última fosse lacunosa em algum ponto, não cabendo tal solução ante a ausência de lei, tal como ocorria na espécie:

"EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. DIREITO DE GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO. ARTIGO 37, VII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NECESSIDADE DE INTEGRAÇÃO LEGISLATIVA. OMISSÃO DO CONGRESSO NACIONAL.

1. Servidor público. Exercício do direito público subjetivo de greve. Necessidade de integralização da norma prevista no artigo 37, VII, da Constituição Federal, mediante edição de lei complementar, para definir os termos e os limites do exercício do direito de greve no serviço público. Precedentes. 2. Observância às disposições da Lei 7.783/89, ante a ausência de lei complementar, para regular o exercício do direito de greve dos serviços públicos. Aplicação dos métodos de integração da norma, em face da lacuna legislativa. Impossibilidade. A hipótese não é de existência de lei omissa, mas de ausência de norma reguladora específica. Mandado de injunção conhecido em parte e, nessa parte, deferido, para declarar a omissão legislativa." [16]

(…)

"EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. CONCESSÃO DE EFETIVIDADE À NORMA INSCRITA NO ARTIGO 37, INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. APLICAÇÃO DA LEI FEDERAL N. 7.783/89, QUE REGE O DIREITO DE GREVE NA INICIATIVA PRIVADA, ATÉ QUE SOBREVENHA LEI REGULAMENTADORA. LEGITIMIDADE ATIVA DE ENTIDADE SINDICAL. MANDADO DE INJUNÇÃO UTILIZADO COMO SUCEDÂNEO DO MANDADO DE SEGURANÇÃO. NÃO-CONHECIMENTO. 1. O acesso de entidades de classe à via do mandado de injunção coletivo é processualmente admissível, desde que legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano. 2. Este Tribunal entende que a utilização do mandado de injunção como sucedâneo do mandado de segurança é inviável. Precedentes." [17]

Pouco tempo depois da prolação dos supratranscritos julgados, o Supremo Tribunal Federal, surpreendentemente, alterou seu posicionamento originário não só no que concerne às medidas passíveis de serem utilizadas pelo Poder Judiciário no fito de suplantar a mora legislativa subjacente à regulamentação do art. 37, VII, da Constituição Federal, como também no que tange à aplicação subsidiária da Lei nº 7.783/89 às greves protagonizadas por servidores públicos.

Tal mudança de entendimento ocorreu quando do recente julgamento dos Mandados de Injunção n. 670/ES, 708/PB e 712/DF, em que o Pretório Excelso, capitaneado pelos votos proferidos pelo Ministro Gilmar Mendes, posicionou-se, majoritariamente, pela viabilidade quanto à utilização suplementar da Lei n. 7.783/89 como meio de mitigar os efeitos nefastos da mora do Congresso Nacional em proceder à regulamentação do art. 37, VII, da Constituição Federal, conforme noticiado no Informativo STF n. 485:

"No MI 670/ES e no MI 708/DF prevaleceu o voto do Min. Gilmar Mendes. Nele, inicialmente, teceram-se considerações a respeito da questão da conformação constitucional do mandado de injunção no Direito Brasileiro e da evolução da interpretação que o Supremo lhe tem conferido. Ressaltou-se que a Corte, afastando-se da orientação inicialmente perfilhada no sentido de estar limitada à declaração da existência da mora legislativa para a edição de norma regulamentadora específica, passou, sem assumir compromisso com o exercício de uma típica função legislativa, a aceitar a possibilidade de uma regulação provisória pelo próprio Judiciário. Registrou-se, ademais, o quadro de omissão que se desenhou, não obstante as sucessivas decisões proferidas nos mandados de injunção. Entendeu-se que, diante disso, talvez se devesse refletir sobre a adoção, como alternativa provisória, para esse impasse, de uma moderada sentença de perfil aditivo. Aduziu-se, no ponto, no que concerne à aceitação das sentenças aditivas ou modificativas, que elas são em geral aceitas quando integram ou completam um regime previamente adotado pelo legislador ou, ainda, quando a solução adotada pelo Tribunal incorpora "solução constitucionalmente obrigatória". Salientou-se que a disciplina do direito de greve para os trabalhadores em geral, no que tange às denominadas atividades essenciais, é especificamente delineada nos artigos 9 a 11 da Lei 7.783/89 e que, no caso de aplicação dessa legislação à hipótese do direito de greve dos servidores públicos, afigurar-se-ia inegável o conflito existente entre as necessidades mínimas de legislação para o exercício do direito de greve dos servidores públicos, de um lado, com o direito a serviços públicos adequados e prestados de forma contínua, de outro. Assim, tendo em conta que ao legislador não seria dado escolher se concede ou não o direito de greve, podendo tão-somente dispor sobre a adequada configuração da sua disciplina, reconheceu-se a necessidade de uma solução obrigatória da perspectiva constitucional. MI 712/PA, rel. Min. Eros Grau, 25.10.2007. (MI-712)."

Note-se que o voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes nos três precedentes em referência, a consagrar a tese em torno da aplicação subsidiária da Lei nº 7.783/89, teve como uma de suas justificativas, o fato de que, nos ultimos anos, a realização de greves por parte dos funcionários estatais vinha ocorrendo sem limites e condições preestabelecidas, a despeito do entendimento firmado no Mandado de Injunção n. 20/DF, acabando por comprometer, na visão do referido julgador, a regular prestação dos serviços públicos:

"O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES:

(…)

A representação dos servidores não vê com bons olhos a regulamentação do tema, porque visa a disciplinar uma seara que hoje está submetida a um tipo de lei da selva. Os representantes governamentais entendem que a regulamentação acabaria por criar o direito de greve dos servidores públicos. Essas visões parcialmente coincidentes tiem contribuído para que as greves no âmbito do serviço público se realizem sem qualquer controle jurídico, dando ensejo a negociações heterodoxas, ou a ausências que comprometem a própria prestação do serviço público, sem qualquer base legal.

Mencionem-se, a propósito, episódios mais recentes relativos à paralisação dos controladores de vôo do país; ou ainda, no caso da greve dos servidores do Judiciário do Estado de São Paulo, ou dos peritos do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), que trouxeram prejuízos irreparáveis a parcela significativa da polulação dependente desses serviços públicos.

A não-regulação do direito de greve acabou por propiciar um quadro de selvageria com sérias conseqüências para o Estado de Direito. Estou a relembrar que Estado de Direito é aquele no qual não existem soberanos.

Nesse quadro, não vejo mais como justificar a inércia legislativa e a inoperância das decisões desta Corte."

Indubitavelmente, a aplicação subsidiária da Lei n. 7.783/89 ao direito de greve dos servidores públicos importará no advento de um novo perfil para o instituto em referência. Com efeito, se antes os movimentos paredistas deflagrados pelos funcionários do Estado encontravam-se destituídos de um marco legal, há, agora, um parâmetro regulamentador que, embora não voltado especificamente para a hipótese em apreço, terá aplicação naquilo que couber.

Cumpre, portanto, perquirir em que medida os dispositivos da Lei n. 7.783/89 se aplicam aos movimentos paredistas deflagrados no âmbito do serviço público, a fim de se vislumbrar, em última medida, um esboço do novo perfil do direito de greve titularizado pelos funcionários do Estado.


OS MANDADOS DE INJUNÇÃO Nº 670/ES, 708/PB E 712/DF. POSSÍVEIS CONSEQÜÊNCIAS DA APLICAÇÃO ANALÓGICA DA LEI Nº 7.783/89.

Anteriormente à análise individual dos dispositivos da Lei n. 7.783/89 e das possíveis conseqüências de sua aplicação nas greves deflagradas por servidores públicos, cumpre indagar acerca do substrato principiológico que subjaz ao referido diploma legal e cujos matizes influenciarão, por evidente, a integração normativa imposta pelo Supremo Tribunal Federal nos Mandados de Injunção n, 670/ES, 708/PB e 712/DF.

Com efeito, a Lei n. 7.783/89, editada um ano após a promulgação da Constituição Federal de 1988, teve por escopo, justamente, adequar o instituto da greve ao novel art. 9º da Carta Magna, cuja redação suplantou os estritos limites estabelecidos nos artigos 157, § 7º e 162 da Constituição de 1967/69, bem como na Lei n. 4.330/64 e no Decreto-Lei nº 1.632/78, adequando o direito em apreço aos ideais democráticos e pluralistas subjacentes à nova ordem contitucional. [18]

Sendo este, portanto, o substrato principiológico a servir de arrimo para a Lei n. 7.783/89, tem-se, por via de conseqüência, que a aplicação do referido diploma legal aos movimentos paredistas titularizados pelos servidores públicos deverá ser norteada por este mesmo espírito. [19]

Quer isto dizer, em português claro, que a decisão lavrada pelo Supremo Tribunal Federal nos Mandados de Injunção n. 670/ES, 708/PB e 712/DF não poderá ser utilizada como pretexto para dificultar o exercício do direito de greve assegurado expressamente pelo art. 37, VII para além do estritamente necessário, seja pela ampliação desmesurada do conceito de "serviços essenciais", ou pela extensão indevida de requisitos previstos na Lei n. 7.783/89 que se afiguram inaplicáveis aos funcionários do Estado ante as características peculiares do serviço público.

Diante disso, faz-se necessário intentar estabelecer em que medida os dispositivos da Lei n. 7.783/89 se aplicam aos servidores públicos, tendo-se sempre em mente que o escopo do diploma legal em referência, bem como do art, 37, VII, da Constituição Federal, aponta para a efetiva materialização da garantia do direito de greve, cuja limitação afigurar-se-á razoável tão-somente quando o real interesse público assim determinar.

Destaque-se, por oportuno, que o verdadeiro interesse coletivo aqui mencionado diz respeito às demandas inadiáveis da população em relação aos serviços públicos, não se confundindo, pois, com as necessidades funcionais do Estado.

Tendo por norte tais premissas, as próximas linhas se ocuparão da análise individual dos dispositivos da Lei n. 7.783/89, intentando-se estabelecer a justa medida de aplicação de cada um deles aos movimentos paredistas deflagrados por servidores públicos, tal como determinado pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento dos Mandados de Injunção n. 670/ES, 708/PB e 712/DF.

LEI N. 7.783, DE 28 DE JUNHO DE 1989.

(...)

Art. 1º E assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.

Parágrafo único. O direito de greve será exercido na forma estabelecida nesta Lei.

Art. 2º Para os fins desta Lei, considera-se legítimo exercício do direito de greve a suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação de serviços a empregador.

O art. 1º da Lei n. 7.783/89 assegura à generalidade dos trabalhadores o direito de greve, definindo que os motivos do movimento são de escolha exclusiva dos obreiros. Em seguida, o art. 2º aplica ao instituto em apreço o conceito clássico atinente à paralisação temporária e pacífica do labor, com vistas à consecução de alguma finalidade em face dos empregadores.

Da leitura dos dispositivos em estudo, não subsistem dúvidas de que o conceito geral de greve, a compreender, nas palavras de Mario de La Cueva " la suspensión concertada del trabajo, llevada a cabo para imponer y hacer cumplir condiciones de trabajo, que respondan a la idea de justicia social" [20] alcança os movimentos paredistas titularizados pelos servidores públicos.

Ora, ao cessarem a prestação de seu labor mediante a deflagração de movimentos organizados, os servidores públicos não perseguem, em regra, outro fim senão a melhoria de suas condições de trabalho. A diferença entre os funcionários estatais e os trabalhadores privados, nesse tocante, cinge-se exclusivamente ao ente tomador dos serviços.

Não por outra razão, Ronald Amorim e Souza acentua que "a noção de Poder Público, de serviço público, concerne ao Direito Administrativo, mas a presença do trabalhador aqui qualificado como servidor ou funcionário, em nada difere daquela do empregado na iniciativa privada: efetividade de um labor." [21]

Havendo, portanto, identidade entre os conceitos e as finalidades concernentes às greves deflagradas por trabalhadores privados e por servidores públicos, tem-se que as definições inseridas nos artigos 1º e 2º da Lei nº 7.783/89 aplicam-se plenamente aos movimentos titularizados por estes últimos.

Art. 3º Frustrada a negociação ou verificada a impossibilidade de recursos via arbitral, é facultada a cessação coletiva do trabalho.

Parágrafo único. A entidade patronal correspondente ou os empregadores diretamente interessados serão notificados, com antecedência mínima de 48 (quarenta e oito) horas, da paralisação.

No art. 3ºda Lei no 7.783/89 exige-se como instância prévia à deflagração da greve no âmbito privado, a realização de negociação coletiva entre trabalhadores e empregadores ou o recurso ao arbitramento das condições laborais por um terceiro desinteressado. Somente após frustrados tais intentos, poderão os movimentos paredistas ser implementados.

Cumpre-nos indagar, portanto, se a tentativa prévia de negociação coletiva ou de arbitramento das condições laborais configuram condições imprescindíveis para a deflagração de movimentos grevistas por parte dos servidores públicos, tal como ocorre com os trabalhadores do setor privado.

Antes disto, todavia, importa recordar que o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 492/DF, em meados de 1993, posicionou-se pela impossibilidade quanto à realização de negociação coletiva no serviço público, sob o entendimento de que esta última afigurar-se-ia incompatível com o regime estatutário consagrado nos artigos 37 e 39 da Constituição Federal, a compreender a fixação unilateral, por parte do Estado, das condições de trabalho. Prevaleceu, nesse tocante, o entendimento consagrado no voto proferido à ocasião pelo Ministro Carlos Velloso:

"A negociação coletiva tem por escopo, basicamente, a alteração da remuneração. Ora, a remuneração dos servidores públicos decorre de lei e a sua revisão geral, sem distinção de índices entre servidores públicos civis e militares, far-se-á sempre na mesma data. (...) Toda a sistemática de vencimentos e vantagens dos servidores públicos assenta-se na lei, estabelecendo a Constituição Federal isonomia salarial entre os servidores dos três poderes (...), a proibição de vinculação e equiparação de vencimentos e que a lei assegurará, aos servidores da administração direta, isonomia de vencimentos para cargos de atribuções iguais ou assemelhadas.

Quer dizer, a sistemática dos servidores públicos, regime jurídico, vencimentos e remuneração, assentam-se na lei, mesmo porque legalidade constitui princípio a que a Administração Pública deve obediência rigorosa.

(...)

Não sendo Possível, portanto, à Administração Pública transigir no que diz respeito à matéria reservada à lei, segue-se a impossibilidade de a lei assegurar ao servidor público o direito à negociação coletiva, que compreende acordo entre sindicatos e empregadores e de empregados, ou entre sindicatos de empregados e empresas e, malogrado o acordo, o direito de ajuizar o dissídio coletivo."

De fato, não pode a Administração Pública transigir a respeito das matérias já previstas em lei. Nesse sentido, se a Constituição Federal estabelece que cabe ao legislador ordinário definir as condições de trabalho dos servidores públicos, não se faculta à Administração Pública e as entidades de servidores estabelecerem acordos em sentido contrario às determinações legais.

No entanto, isto não quer dizer que as entidades representativas dos servidores públicos e a Administração encontram-se impossibilitadas de transigir a respeito das matérias que constarão dos projetos de lei a serem submetidos à análise do Poder Legislativo. Nisso consiste, exatamente, a negociação coletiva no setor estatal!

Em outras palavras, no âmbito do serviço público, a negociação coletiva não tem o condão de revogar as disposições legais. Todavia, seria materialmente possível assegurar aos servidores e a Administração Pública o direito à transação prévia a respeito do conteúdo dos projetos de lei a serem enviados ao Congresso Nacional com vistas à determinação das condições de trabalho na esfera do funcionalismo, em estrita obediência aos dispositivos constitucionais a versarem sobre o processo legislativo e à elaboração orçamentária.

A propósito, o Ministro Marco Aurélio, no julgamento da ADI nº 492/DF, chegou a admitir, em voto divergente, que "ainda que se diga que nem mesmo no campo coletivo (...) o Estado não pode transigir objetivando modificar as condições reinantes, tornando-se titular de direitos e obrigações, isto em face às peias do art. 169, impossível é deixar de admitir que a negociação coletiva pode visar ao afastamento do impasse, do conflito seguido de greve, mediante a iniciativa, exclusiva do Executivo, de encaminhar projeto objetivando a transformação em lei do que acordado na mesa de negociações."

Nesse mesmo sentido, Pedro Gomez Caballero, ao comentar a Lei n. 9/1987, da Espanha (Lei de Órgãos de Representação), assinala que "el ordenamiento jurídico reconoce facultades para negociar a órganos de las Administraciones Públicas, que pueden hacerlo dentro del ambito de sus competencias". E complementa o referido autor ibérico salientando que "por ello, el juego del principio de reserva de ley hay que contemplarlo desde una doble vertiente: de un lado, la (...) de que solo por ley se pueden regular las matérias a ella reservadas; y de otro, que en las matérias afectadas por la reserva de ley, la negociación solo vincula, a quien adquiere compromisos acerca de las matérias reservadas, a la presentación de un proyecto de ley." [22]

Uma vez constatada a possibilidade material quanto à negociação coletiva no serviço público, ao contrario do entendimento consagrado na ADI nº 492/DF, cumpre perquirir se o ordenamento jurídico brasileiro consagra o referido instrumento, a fim de vislumbrar, ao cabo, a aplicabilidade ou não do art. 3º da Lei no 7.783/89 ao funcionalismo estatal.

Pois bem, a análise do arcabouço legislativo pátrio denota a inexistência de dispositivos de lei em sentido estrito a preverem expressamente a negociação coletiva no âmbito do setor público. [23] Recorde-se, a propósito, que a redação original do art. 240, "d", da Lei nº 8.112/90 assegurava aos funcionários estatais tal mecanismo, tendo sido, contudo, declarada inconstitucional e, portanto, afastada do ordenamento jurídico quando do julgamento da ADI nº 492/DF pelo Supremo Tribunal Federal.

Desse modo, não havendo previsão legal em torno dos mecanismos e formas de negociação coletiva no setor público, não se pode estender aos servidores a exigência constante do art. 3º da Lei nº 7.783/89, por força do princípio da legalidade insculpido no art. 37, caput, da Constituição Federal. O mesmo pode-se dizer a respeito da arbitragem por terceiros desinteressados, cuja implementação igualmente não encontra autorização em lei.

Nunca é demais recordar, nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello, que "ao contrario dos particulares, os quais podem fazer tudo o que a lei não proíbe, a Administração só pode fazer o que a lei antecipadamente autorize", pois "administrar é prover aos interesses públicos, assim caracterizados em lei, fazendo-o na conformidade dos meios e formas nela estabelecidos ou particularizados segundo suas disposições." [24]

Nesse diapasão, se a lei não autoriza expressamente a Administração Pública a realizar procedimentos de negociação coletiva ou de arbitragem com seus servidores, por força do princípio da legalidade, não podem estes últimos serem obrigados a implementar tais mecanismos anteriormente à deflagração de suas greves.

Nem se diga, outrossim, que a instituição da chamada "Mesa Nacional de Negociação Permanente" no âmbito do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão teria o condão de tornar aplicável o artigo da Lei no 7.783/89 ora em comento aos servidores federais.

Tal assertiva se constata na medida em que a sobredita instância foi instituída, originariamente, por ato regulamentar editado pelo Ministro do Planejamento Orçamento e Gestão, intitulado "Regulamento Institucional da Mesa Nacional de Negociação Permanente", sem que houvesse, para tanto, previsão ou autorização legal anterior e, portanto, em frontal violação às competências ministeriais insculpidas no art. 87, Parágrafo único, II, da Constituição Federal. [25]

Outrossim, ainda que se cogitasse na constitucionalidade da chamada "Mesa Nacional de Negociação Permanente" - o que se admite a titulo meramente argumentativo - o referido foro não se revestiria de instância obrigatória para a discussão de todos litígios coletivos titularizados pela Administração Pública Federal e seus funcionários.

Pelo contrário, o Regulamento Institucional da instância em referência deixa claro em sua cláusula segunda que a adesão à estrutura da Mesa e a submissão de suas demandas a esta última por parte das entidades sindicais representativas dos servidores públicos federais são facultativas:

"Cláusula Segunda. A Mesa Nacional de Negociação Permanente –

MNNP é constituída por duas bancadas, designadas Bancada

Governamental e Bancada Sindical.

Parágrafo Primeiro. Integram a Bancada Governamental no

órgão central da MNNP um representante de cada um dos

seguintes órgãos:

1) Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão;

2) Casa Civil da Presidência da República;

3) Ministério da Fazenda;

4) Ministério da Previdência Social;

5) Ministério do Trabalho e Emprego;

6) Secretaria Geral da Presidência da República;

Parágrafo Segundo. A Bancada Sindical é constituída por um número máximo de 18 entidades de classe de âmbito nacional do funcionalismo público federal, indicadas por seus pares, na base de um representante e um observador para cada entidade, assegurada a participação das entidades já subscritoras do "Protocolo para instituição formal da MNNP", listadas a seguir:

1) ANDES/SN – Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições

de Ensino Superior;

2) ASSIBGE – Sindicato Nacional dos Trabalhadores em

Fundações Públicas Federais de Geografia e Estatística;

3) CNTSS – Confederação Nacional dos Trabalhadores em

Seguridade Social;

4) CONDSEF – Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público

Federal;

5) CUT – Central Única dos Trabalhadores;

6) FASUBRA SINDICAL – Federação de Sindicatos de Trabalhadores das Universidades Brasileiras;

7) FENAFISP – Federação Nacional dos Auditores Fiscais da Previdência Social;

8) FENAJUFE – Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e Ministério Público da União;

9) FENASPS – Federação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social;

10)SINASEFE – Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica e Profissional;

11)SINDILEGIS – Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo Federal e do TCU;

12)UNAFISCO SINDICAL – Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal.

Parágrafo Terceiro. Demais entidades sindicais, de âmbito nacional, do funcionalismo público federal que venham a subscrever o Protocolo poderão integrar a MNNP.

Parágrafo Quarto. A qualquer tempo, qualquer entidade de âmbito nacional do funcionalismo público federal poderá pleitear a subscrição ao Protocolo e a sua participação nas Mesas Setoriais ou Comissões Temáticas, competindo à MNNP decidir sobre o pleito.

Parágrafo Quinto. De comum acordo, as partes poderão permitir a participação de representantes de outros órgãos do governo federal e/ou de outras entidades sindicais como observadores.

Parágrafo Sexto. Decorrido o período de 6 (seis) meses da publicação do presente Regimento, os critérios de representação estabelecidos na presente cláusula serão avaliados e, se for o caso, revistos pela MNNP." (Destacou-se)

Portanto, acaso a chamada "Mesa Nacional de Negociação Permanente" fosse revestida de constitucionalidade, ainda assim a provocação do referido foro em momento anterior à deflagração da greve por parte das entidades representativas de servidores públicos não se revestiria de imprescindibilidade, pois não se-lhes poderia tornar obrigatório aquilo que o próprio Regimento Institucional reputa como facultativo.

Ainda num cenário de hipotética validade da "Mesa Nacional de Negociação Permanente", poder-se-ia cogitar da aludida obrigatoriedade apenas para as entidades que aderiram à referida instância e se comprometeram a cumprir o Regimento Institucional, como decorrência do princípio geral de boa-fé.

Em que pese tal possibilidade formulada no campo hipotético, a flagrante inconstitucionalidade subjacente à criação da "Mesa Nacional de Negociação Permanente" nos permite concluir que a existência desta última no plano material não tem o condão de tornar aplicável às greves deflagradas por servidores públicos federais a exigência constante do art. 3º da Lei nº 7.783/89.

Tem-se, portanto, que muito embora a negociação coletiva e a arbitragem protagonizadas pelos servidores públicos e pela Administração se afigurem materialmente possíveis, não há como submeter a deflagração de movimentos paredistas no âmbito do funcionalismo estatal à prévia passagem por aquelas instâncias, haja vista a ausência de dispositivos de lei em sentido estrito que as preveja. Do contrário, estar-se-ia a exigir dos grevistas algo que sequer existe.

No que tange, contudo, ao parágrafo único do art. 3º, da Lei nº 7.783/89, a exigência de comunicação prévia a respeito da deflagração da greve, com 48 (quarenta e oito) horas de antecedência, afigura-se, a nosso ver, plenamente aplicável.

Assim, uma vez aprovada na assembléia-geral do sindicato a deliberação em torno da deflagração de greve, a entidade terá o prazo de 48 (quarenta e oito) horas para notificar o respectivo ente da Administração Pública a respeito da paralisação iminente, salvo em se tratando de atividades essenciais, quando o lapso temporal ora mencionado será de 72 (setenta e duas) horas, conforme se verá mais adiante.

Art. 4º Caberá à entidade sindical correspondente convocar, na forma do seu estatuto, assembléia geral que definirá as reivindicações da categoria e deliberará sobre a paralisação coletiva da prestação de serviços.

§ 1º O estatuto da entidade sindical deverá prever as formalidades de convocação e o quorum para a deliberação, tanto da deflagração

quanto da cessação da greve.

§ 2º Na falta de entidade sindical, a assembléia geral dos trabalhadores interessados deliberará para os fins previstos no "caput", constituindo comissão de negociação.

Tal como as entidades representativas dos trabalhadores comuns, os sindicatos de servidores públicos constituem-se sob a forma de pessoas jurídicas de direito privado e, como tal, são titulares dos direitos à liberdade e à autonomia sindical, com a conseqüente faculdade de se organizarem internamente da maneira que melhor lhes convém para consecução de suas finalidades.

Não por outra razão, Robertônio Santos Pessoa assinala que "os sindicatos de servidores públicos civis, tanto os estatutários quanto os empregados públicos das agências econômicas, possuem autonomia para se organizarem ao seu alvedrio, de forma espontânea, fixando as regras internas, formais e de fundo, para regular a vida sindical, tendo em vista a defesa e promoção dos interesses coletivos da categoria que representam." [26]

Sendo assim, a aplicabilidade do dispositivo em comento às greves deflagradas por servidores públicos se constata sem maiores dificuldades. Assegurando o ordenamento constitucional o direito à sindicalização por parte da referida categoria e, por conseguinte, as garantias da liberdade e da autonomia sindical, tem-se que as respectivas entidades dispõem de amplo espaço para estabelecerem em seus estatutos as formas de convocação das instâncias deliberativas e o quórum de aprovação para o início e cessação do movimento paredista que melhor lhes convém.

Há de se ressaltar, contudo, que existem no âmbito da ampla categoria dos servidores públicos, entidades sindicais de primeiro grau organizadas em bases interestaduais e mesmo nacionais, cujas estruturas internas têm por instância deliberativa máxima Congressos ou Conselhos de Representantes, em lugar da assembléia-geral explicitada no caput do art. 4º da Lei nº 7.783/89.

Em tais casos, parece-nos recomendável que a interpretação do dispositivo em apreço possibilite a deliberação em torno do início e da cessação das greves por parte dos Congressos e Conselhos, desde que estes últimos se organizem democraticamente, ao invés de se exigir, de forma abstrata, geral e irrestrita, a convocação de assembléia-geral, independentemente da forma de organização da entidade. [27]

A solução ora aventada logra conciliar plenamente o espírito subjacente ao art. 4º, caput, da Lei nº 7.783/89 e o princípio da autonomia sindical, pois, ao mesmo tempo em que se aloca a deliberação em torno da deflagração e do término da greve para a instância máxima da entidade sindical, resguarda-se a esta última o direito de se organizar internamente da forma que melhor convém aos seus interesses.

Quanto à convocação da assembléia geral dos trabalhadores e da formação de comissão de negociação, no caso de inexistência de sindicato organizado, afigura-nos plenamente possível a aplicação do § 2º do artigo em comento, porquanto a o direito à greve é assegurado pelo art. 37, VII, da Constituição Federal aos servidores públicos, e não às entidades sindicais da referida categoria. [28]

Não há, portanto, obstáculos no ordenamento jurídico pátrio que impeçam a deflagração de greve pela assembléia-geral dos servidores destituídos de sindicato representativo, bem como a constituição da respectiva comissão de negociação, que servirá de interlocutor da categoria junto à Administração Pública.

Art. 5º A entidade sindical ou comissão especialmente eleita representará os interesses dos trabalhadores nas negociações ou na Justiça do Trabalho.

O art. 37, VI, da Constituição Federal assegurou expressamente o direito à sindicalização dos servidores públicos, a compreender a faculdade conferida aos referidos funcionários de se organizarem e constituírem entidades voltadas para a defesa de seus interesses corporativos.

Desse modo, a sindicalização dos servidores públicos compreende, por evidente, o direito de seus sindicatos os representarem em juízo ou fora dele nas demandas coletivas em que se discutem os interesses da categoria, cuja defesa, aliás, é o objetivo precípuo a que se dedicam as entidades.

Nesse tocante, o artigo em apreço afigura-se plenamente aplicável aos servidores públicos, pois o direito de substituição processual assegurado às entidades sindicais no art. 8º, III, da Constituição Federal [29] abarca os organismos criados para a defesa dos interesses da referida categoria.

Evidentemente, o órgão judicial competente para processar e julgar as demandas em apreço não será a Justiça do Trabalho, tal como estabelece a parte final do art. 5º da Lei nº 7.783/89, pois a referida instância não possui em seu cabedal de competências o julgamento de questões a envolverem os entes públicos, mesmo quando se trata de matérias atinentes ao pessoal destes últimos, tal como decidiu o Supremo Tribunal Federal na ADI nº 492/DF e, mais recentemente, na ADIMC nº 3.395/DF. [30]

Havendo, portanto, demandas judiciais a versarem sobre a legalidade dos movimentos paredistas deflagrados por servidores públicos, as entidades sindicais da referida categoria a substituirão perante o Superior Tribunal de Justiça, a Justiça Federal ou a Justiça Estadual, conforme o caso. Mais adiante, nos comentários apostos ao art. 8º da Lei nº 7.783/89, ver-se-á como o Supremo Tribunal Federal se posicionou a respeito da matéria quando do julgamento dos Mandados de Injunção nº 670/ES, 708/PB e 712/DF.

No que concerne à atuação da comissão de negociação como representante dos servidores públicos não organizados em sindicato, cumpre ressaltar, mais uma vez, que a titularidade do direito de greve pertence aos integrantes da referida categoria e não à entidade. [31] Sendo assim, na ausência desta última, a coalizão instituída pelos funcionários estatais diretamente envolvidos poderá representar o grupo em juízo ou fora dele, tal como o faria o ente representativo, acaso existente.

Se assim não fosse, estar-se-ia mitigando consideravelmente o poder de ação dos servidores públicos não organizados em sindicato, que se veriam, portanto, impossibilitados de defenderem coletivamente em juízo o movimento deflagrado. Tal vicissitude acabaria por prejudicar a plena fruição do direito de greve assegurado expressamente no art. 37, VII, da Constituição Federal.

Tem-se, portanto, que o art. 5º da Lei nº 7.783/89 aplica-se aos movimentos paredistas deflagrados pelos servidores públicos, exceto quanto ao foro competente para o julgamento dos eventuais dissídios, que, nesse caso, será o Superior Tribunal de Justiça, a Justiça Federal ou a Justiça Estadual, a depender do território afetado pela greve.

Art. 6º São assegurados aos grevistas, dentre outros direitos:

I - o emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderirem à greve;

II - a arrecadação de fundos e a livre divulgação do movimento.

§ 1º Em nenhuma hipótese, os meios adotados por empregados e empregadores poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem.

§ 2º É vedado às empresas adotar meios para constranger o empregado ao comparecimento ao trabalho, bem como capazes de frustrar a divulgação do movimento.

§ 3º As manifestações e atos de persuasão utilizados pelos grevistas não poderão impedir o acesso ao trabalho nem causar ameaça ou dano à propriedade ou pessoa.

As garantias enumeradas nos incisos I e II do artigo em análise constituem mecanismos essenciais para a realização de qualquer greve. Com efeito, sem a possibilidade de persuardir os colegas de trabalho, de angariar fundos para a sustentação da causa e de divulgá-la, inviabilizar-se-ia por completo as chances de sucesso do movimento.

Acaso se negasse os três direitos ora mencionados aos servidores públicos, estar-se-ia, em verdade, impossibilitando o pleno exercício da garantia insculpida no art. 37, VII, da Constituição Federal. Não restam dúvidas, portanto, que os incisos em apreço aplicam-se integralmente às greves deflagradas no âmbito do funcionalismo estatal.

O direito de greve e seus consectários ora analisados não são, contudo, absolutos. A aliciação dos colegas de trabalho, bem como a divulgação do movimento perante a categoria não pode malferir garantias basilares conferidas aos cidadãos pela Constituição Federal, tais como a integridade física, a liberdade de consciência, a propriedade privada, o direito de ir e vir, entre outros.

Assim, a concordância prática entre os sobreditos direitos fundamentais e o direito à greve – ambos de patamar constitucional – somente ocorrerá conquanto a divulgação do movimento e a persuasão dos demais integrantes da categoria sejam operados por meios pacíficos que logrem, ao mesmo tempo, chamar a atenção para a causa defendida e preservar os bens jurídicos titularizados pelos indivíduos potencialmente afetados. [32]

Por tais razões, aplicam-se plenamente às greves deflagradas pelos servidores públicos os direitos e as limitações elencados no art. 6º da Lei nº 7.783/89.

Art. 7º Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em greve suspende o contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho.

Ao ser investido em cargo público, o servidor não discute com a Administração as condições em que será prestado o labor, não estabelecendo com aquela, portanto, contrato de trabalho. Ao se habilitar para o ingresso nas carreiras de Estado, o agente adere ao estatuto que rege o funcionalismo, submetendo-se integralmente às suas diretrizes. [33]

Sendo assim, as situações funcionais passíveis de serem experimentadas pelos servidores públicos são aquelas que constam expressamente da legislação que rege suas relações laborais com a Administração. Portanto, se um determinado instituto não integra o regime jurídico dos funcionários estatais, não há como aplicá-lo a estes últimos. [34]

É exatamente isto o que ocorre com a figura da "suspensão do contrato de trabalho " mencionada no art. 7º, caput, da Lei nº 7.783/89. O conjunto das normas que regem os servidores públicos não prevê a extensão de tal instituto para a referida categoria e nem tampouco estabelece figura análoga hábil a possibilitar a "suspensão" do vínculo estatutário, não havendo, portanto, como aplicar o dispositivo em referência aos movimentos paredistas deflagrados com arrimo no art. 7º, VII, da Constituição Federal.

Nesse mesmo sentido, Juan José Diéz Sanches, ao estudar a questão formulada já há algum tempo no âmbito do direito espanhol, concluiu que "si no existe cobertura o soporte legal alguno que permita a la Administración formalizar la suspensión de la relación, por cuanto esta potestad no se encaja en ninguna de las situaciones legales previstas, esta consecuencia del ejercício del derecho de huelga no és de aplicación en este caso." [35]

Quanto à regulamentação das relações obrigacionais por intermédio de convenção, acordo, laudo arbitral ou decisão judicial durante a vigência do movimento, importa reiterar que o ordenamento jurídico pátrio desconhece as figuras da negociação coletiva e da arbitragem a serem entabuladas entre os servidores públicos e a Administração com vistas ao estabelecimento de condições de trabalho, conforme exaustivamente visto nos comentários ao art. 3º da Lei nº 7.783/89. Por tal razão, o dispositivo em comento afigura-se inaplicável às greves deflagradas pelos funcionários estatais também nesse tocante.

Tal como a figura da "suspensão" do vínculo estatutário, o regime jurídico dos servidores públicos não prevê os descontos remuneratórios referentes aos dias não trabalhados como conseqüência automática e imediata da deflagração do movimento grevista.

Os descontos em apreço configuram decorrência natural da suspensão dos contratos laborais firmados entre os trabalhadores privados e seus respectivos empregadores, [36] de modo que todo arcabouço deontológico a servir-lhes de suporte tem por fundamento as teorias desenvolvidas no campo do direito individual do trabalho. Não havendo, portanto, no regime jurídico dos funcionários estatais a referida figura, descabe falar em sua aplicação no âmbito do funcionalismo estatal.

Nesse particular, cumpre fazer menção à interessante decisão proferida pelo Tribunal Constitucional da Espanha em sua Sentença nº 90/1984, anteriormente à edição da lei permissiva dos descontos remuneratórios em decorrência da participação do servidor em movimentos paredistas (Lei nº 30/1984) [37].

No referido julgado, a Corte máxima daquele país ibérico reconheceu que o direito de greve, assegurado de maneira genérica pelo art. 28.2 da Constituição de 1978 [38], não tinha como consectário lógico o direito subjetivo da Administração Pública de proceder ao desconto dos dias parados em caso de greves protagonizadas por seus servidores. O Tribunal asseverou, outrossim, que o princípio da isonomia, de hierarquia igualmente constitucional, não conferia respaldo à tese de que trabalhadores do setor privado e os funcionários do Estado envolvidos em movimentos paredistas deveriam ter o mesmo tratamento no tocante à retenção dos salários:

"Aunque la huelga pueda conllevar la pérdida de la retribución correspondiente al período de su duración, ello no supone que exista un derecho constitucional del sujeto pasivo a deducir o impagar tal retribución, haciendo descender a ese aspecto el art, 28.2 de la Constitución, ya que, en uno u otro caso -con deducción o sin ella-, lo verdaderamente trascendente es la garantía del ejercicio del derecho, y éste queda siempre asegurado.

El ente local es algo bien distinto a aquellos otros elementos subjetivos que se ponen en parangón para colegir que se ha dispensado un tratamiento diverso a algo que es similar o equivalente, esto es, trabajadores y funcionarios, de lo que se infiere que carece de la necesaria titularidad permisiva de una eficaz invocación del derecho a la igualdad, de cuyo contenido esencial no puede -a lo menos en el estado actual de toda la normativa rectora en la materia construirse un derecho constitucional del Ayuntamiento a tratar a sus funcionarios en forma igual a como los empresarios tratan a sus trabajadores." [39]

A nosso ver, a situação dos descontos remuneratórios no Brasil se assemelha ao cenário vigente na Espanha anteriormente à edição da retromencionada Lei nº 30/1984. Ou seja, a Constituição Federal de 1988 assegura o direito à greve por parte dos servidores públicos sem que o ordenamento jurídico estabeleça qualquer vinculação entre o exercício do direito em referência e a glosa dos salários correspondentes ao período de duração do movimento.

Poder-se-ia, contudo, rebater a conclusão ora engendrada mediante a assertiva de que os artigos 44 e 117, I, da Lei nº 8.112, de 11.12.1990 [40], referentes às faltas funcionais, aplicar-se-ia aos servidores envolvidos em movimentos grevistas, enquanto não promulgada lei a versar sobre a matéria, tal como pretendeu o Decreto nº 1.480, de 3.5.1995 no âmbito federal.

Contudo, a solução simplória encontrada pelo sobredito decreto ignora o fato incontestável de que as ausências ao serviço decorrentes da participação do funcionário público em greves têm natureza totalmente distinta das faltas funcionais. Com efeito, enquanto aquelas têm por causa a adesão do agente a um movimento reivindicatório de caráter coletivo, cujo exercício é assegurado expressamente pela Constituição Federal, estas últimas se materializam, em geral, quando o servidor deixa de cumprir sua jornada regular para atender a interesses particulares não respaldados no respectivo estatuto.

Em síntese, a única semelhança entre os institutos da "falta funcional" e da "greve" reside no efeito material comum a ambos: a ausência ao serviço. As causas subjacentes às duas figuras, contudo, são completamente distintas, não havendo, portanto, como equipará-las para efeito de perda da remuneração, aplicando-se aos servidores em greve o disposto no art. 44 da Lei nº 8.112/90, com arrimo em uma pretensa "interpretação analógica".

Neste ponto, calha a lição de Carlos Maximiliano, a preconizar que "funda-se a analogia (...) no princípio de verdadeira justiça, de igualdade jurídica, o qual exige que as espécies semelhantes sejam reguladas por normas semelhantes". Ainda segundo o referido autor, tal identidade consiste "no fato de se encontrar, num e noutro caso, o mesmo princípio básico e de ser uma só a idéia geradora, tanto da regra existente como da que se busca." [41]

Tem-se, portanto, que o art. 7º, caput, da Lei nº 7.783/89 não se afigura aplicável às greves deflagradas pelos servidores públicos, seja porque a figura da "suspensão do contrato de trabalho" e seus consectários, tais como o corte do ponto e a retenção da remuneração, não encontram guarida no regime estatutário, ou porque a negociação coletiva e o arbitramento com vistas à regulação das obrigações laborais pertinentes ao período de duração do movimento igualmente não possuem previsão legal.

Parágrafo único. É vedada a rescisão de contrato de trabalho durante a greve, bem como a contratação de trabalhadores substitutos, exceto na ocorrência das hipóteses previstas nos arts. 9º e 14.

Conforme visto alhures, os servidores públicos não se vinculam à Administração por intermédio de contrato de trabalho, mas sim pela adesão ao estatuto regente do funcionalismo. Justamente por isso, a "rescisão" mencionada no parágrafo único do art. 7º da Lei nº 7.783/89, cuja definição tem pertinência com o direito individual do trabalho, não serve para expressar a ruptura do liame jurídico existente entre o Estado e seus funcionários.

A desvinculação do servidor público com a Administração durante o exercício do cargo tem por denominação o termo "demissão", que, no caso do funcionalismo estatal, configura pena pela prática das irregularidades previstas no estatuto da categoria - mais especificamente, nos art. 132 da Lei n. 8.112/90 -, cuja aplicação não prescinde da observância aos procedimentos traçados no referido diploma legal.

Tal circunstância, contudo, não afasta a possibilidade de que se materializem, no âmbito do serviço público, demissões tendo por causa a participação de servidores em movimentos grevistas. Nesse sentido, poder-se-ia imaginar, sem maiores dificuldades de abstração, hipóteses em que se imputem aos funcionários a prática de determinadas infrações, em sede de processo administrativo disciplinar, com vistas a mascarar eventuais represálias. [42]

É justamente com vistas a resguardar o pleno exercício do direito constitucional à greve, que o dispositivo ora apreciado tem aplicação no âmbito do funcionalismo estatal, combatendo-se, nesse particular, as demissões motivadas pela participação dos servidores públicos em movimentos paredistas, que configuram, ao fim e ao cabo, atos anti-sindicais. [43]

Verificando-se, portanto, nos casos concretos, que as eventuais demissões aplicadas pelas autoridades administrativas, ainda que formalmente válidas em face dos procedimentos legais pertinentes, tiveram por real motivo a participação dos servidores em greve, deve-se afastar as respectivas penalidades do mundo jurídico, seja porque a aplicação destas últimas terá por efeito o tolhimento em absoluto do direito assegurado expressamente no art. 37, VII, da Constituição Federal, ou porque a deflagração e a adesão a movimento paredista não configura tipo disciplinar punível nos termos da Lei nº 8.112/90. [44]

No que concerne às possibilidades legais de contratação temporária de trabalhadores para assegurar a prestação de serviços públicos, tratar-se-á da questão nos comentários apostos ao art. 9º da Lei nº 7.783/89.

"Art. 8º. A Justiça do Trabalho, por iniciativa de qualquer das partes ou do Ministério Público do Trabalho, decidirá sobre a procedência, total ou parcial, ou improcedência das reivindicações, cumprindo ao Tribunal publicar, de imediato, o competente acórdão."

O dispositivo em apreço trata do julgamento das demandas coletivas subjacentes à deflagração da greve que, nos movimentos protagonizados por trabalhadores privados, podem ter por objeto a própria fixação das condições de trabalho (dissídios de natureza econômica), a interpretação de dispositivos legais/cláusulas convencionais ou a indeclaração de abusividade/ilegalidade da parede (dissídios de natureza jurídica).

Viu-se ao longo dos comentários apostos nos artigos anteriores, que as condições de trabalho dos servidores públicos são fixadas, exclusivamente, por lei aprovada pelo Poder Legislativo, cuja proposição cabe à autoridade máxima do Poder Executivo federal, estadual ou municipal, conforme o caso. Justamente por tal razão, não há como submeter ao Poder Judiciário dissídio coletivo de natureza econômica com vistas ao estabelecimento de cláusulas voltadas para a regência das relações entre Administração e funcionários, tal como ocorre com os trabalhadores privados. [45]

Em outras palavras, se as relações entre a Administração Pública e seus servidores têm por parâmetro legal exclusivo o estatuto do funcionalismo, não há como impor àquela a observância de alterações nas condições de trabalho fixadas em sentença normativa, cuja lavratura é absolutamente estranha ao processo legislativo imposto pelo art. 61, § 1º, "c" c/c os artigos 64 a 66 da Constituição Federal para tal fim.

Em que pese, contudo, tal impossibilidade, há uma espécie de dissídio coletivo cujo conhecimento por parte do Poder Judiciário afigura-se viável, por não versar sobre a fixação de condições sociais e econômicas de trabalho. Trata-se dos dissídios de natureza jurídica, ou seja, aqueles ajuizados com vistas à interpretação de determinados dispositivos legais ou com vistas à declaração de abusividade ou ilegalidade da greve. [46]

Nestas hipóteses, o acórdão a ser lavrado pelo Poder Judiciário não tem natureza constitutiva, tal como ocorre nos dissídios de natureza econômica, senão meramente declaratória, limitando-se a fixar qual a interpretação correta a ser dada a determinado(s) dispositivo(s) das leis que regem o funcionalismo público ou a se manifestar a respeito da ilegalidade/abusividade da greve deflagrada por uma determinada parcela da categoria.

Uma vez verificada a possibilidade quanto ao ajuízamento de dissídios de natureza jurídica no curso de movimentos reivindicatórios protagonizados por servidores públicos, indaga-se: quais seriam os órgãos judiciais competentes para o processamento e o julgamento de tais demandas?

Viu-se no curso dos comentários apostos ao art. 5º da Lei nº 7.783/89 que a Justiça do Trabalho não detém competência para conhecer das causas protagonizadas pela Administração Pública e por seus servidores e que tal entendimento foi expressamente acolhido pelo Supremo Tribunal Federal em duas ocasiões distintas, quando do julgamento da ADI nº 492/DF e, mais recentemente, da ADIMC nº 3.395/DF.

A resposta à sobredita indagação, portanto, aponta para a seguinte conclusão: os dissídios de natureza jurídica ajuizados pelos sindicatos de servidores públicos, pela Administração Pública ou pelo Ministério Público Federal no curso da greve serão processados e julgados pela Justiça Comum.

Resta, contudo, em aberto a questão a respeito de quais órgãos do Poder Judiciário deterão a competência interna para conhecer dos dissídios de natureza jurídica ajuizados ao longo das greves de servidores públicos. Sobre tal problemática, o Ministro Gilmar Mendes manifestou-se expressamente na conclusão de seus votos proferidos quando do julgamento dos Mandados de Injunção nº 670/ES, 708/PB e 712/DF, sendo acompanhado pela maioria dos integrantes do Pretório Excelso nesse tocante.

Com efeito, ao abordar a problemática em apreço, o Ministro Gilmar Mendes vislumbrou a possibilidade de aplicação subsidiária da Lei nº 7.701, de 21.12.1988, a dispor sobre a "especialização de Turmas dos Tribunais do Trabalho em processos coletivos." Desse modo, reconheu-se ao Superior Tribunal de Justiça, aos Tribunais Regionais Federais e aos Tribunais de Justiça dos Estados (órgãos de segunda instância) a "competência implícita complementar" para processar e julgar os sobreditos dissídios coletivos de greve. Transcreve-se, por oportuno, os trechos pertinentes do voto em comento:

"Sob pena de injustificada e inadmissível negativa de prestação jurisdicional nos âmbitos federal, estadual e municipal, é necessário que, na decisão deste MI, fixemos os parâmetros institucionais e constitucionais de definição da competência, provisória e ampliativa, para a apreciação de dissídios de greve entre o Poder Público e os servidores com vínculo estatutário.

(...)

A esse respeito, no plano procedimental, vislumbro a possibilidade de aplicação da Lei nº 7.701/1988 (que cuida da especialização das turmas dos Tribunais do Trabalho em processos coletivos), no que tange à competência para apreciar e julgar eventuais conflitos judiciais referentes à greve de servidores públicos que sejam suscitados até o momento de colmatação legislativa da lacuna ora declarada.

Ao desenvolver mecanismos para a apreciação dessa proposta constitucional para a omissão legislativa, creio não ser possível argumentar pela impossibilidade de se proceder a uma interpretação ampliativa do texto constitucional nesta seara, pois é certo que, antes de se cogitar de uma interpretação restritiva ou ampliativa da Constituição, é dever do intérprete verificar se, mediante fórmulas pretensamente alternativas, não se está a violar a própria decisão fundamental do constituinte. No caso em questão, estou convencido de que não se está a afrontar qualquer opção constituinte, mas, muito pelo contrário, se está a engendrar esforços em busca de uma maior efetividade da Constituição como um todo.

(...)

Vê-se, pois, que o sistema constitucional não repudia a idéia de competências implícitas complementares, desde que necessárias para colmatar lacunas constitucionais evidentes. Por isso, considero viável a possibilidade de aplicação das regras de competência insculpidas na Lei nº 7.701/88 para garantir efetividade a uma prestação jurisdicional efetiva na área de conflitos paredistas instaurados entre o Poder Público e os servidores públicos estatutários (CF, art. 5º, XXXV e 93, IX).

Nesse contexto, é imprescindível que este Plenário densifique as situações provisórias de competência constitucional para a apreciação desses dissídios no contexto nacional, regional, estadual e municipal.

Assim, nas condições acima especificadas, se a paralisação for de âmbito nacional, ou abranger mais de uma Região da Justiça Federal, ou ainda, abranger mais de uma unidade da federação, entendo que a competência para o dissídio de greve será do Superior Tribunal de Justiça (por aplicação analógica do art. 2º, I, ´a´, da Lei nº 7.701/1988).

Ainda no âmbito federal, se a controvérsia estiver adstrita a uma única Região da Justiça Federal, a competência será dos Tribunais Regionais Federais (aplicação analógica do art. 6º, da Lei nº 7.701/1988).

Para o caso da jurisdição no contexto estadual ou municipal, se a controvpersia estiver adstrita a uma Unidade da Federação, a competência será do respectivo Tribunal de Justiça (também, por aplicação analógica, do art. 6º, da Lei nº 7.701/1988)." [47]

No entanto, a aplicação subsidiária dos artigos 2º, I, "a" e 6º da Lei nº 7.701/88 aos dissídios coletivos de natureza jurídica ajuizados no curso de greves de servidores públicos suscita indagações acerca de sua aplicabilidade imediata, mormente porque os dispositivos ora mencioonados pressupõem, em suas respectivas redações, a existência de órgãos especializados nos Tribunais para a apreciação daquelas demandas, senão veja-se:

"Art. 2º – Compete à seção especializada em dissídios coletivos, ou seção normativa:    

I – originariamente:

a) conciliar e julgar os dissídios coletivos que excedam a jurisdição dos Tribunais Regionais do Trabalho e estender ou rever suas próprias sentenças normativas, nos casos previstos em lei."

(...)

"Art. 6º – Os Tribunais Regionais do Trabalho que funcionarem divididos em Grupos de Turmas promoverão a especialização de um deles com a competência exclusiva para a conciliação e julgamento de dissídios coletivos, na forma prevista no ´caput´do Art. 1º desta Lei."

Pelo menos até o presente momento, nem o Superior Tribunal de Justiça, nem os Tribunais Regionais Federais e tampouco os Tribunais de Justiça dos Estados promoveram alterações em seus respectivos regimentos internos com vistas à criação ou à definição das Seções ou Grupos de Turmas competentes para o processamento dos dissídios de natureza jurídica decorrentes de greves deflagradas por servidores públicos.

Sem tal definição, a depender dos sobreditos Regimentos Internos, não há como proceder à aplicação subsidiária da Lei nº 7.701/88, na forma estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento dos Mandados de Injunção nº 670/ES, 708/PB e 712/DF. Nesse particular, o comando das referidas decisões equivale, em termos práticos, às chamadas "disposições constitucionais de eficácia limitada", pois sua aplicabilidade dependerá de atos ulteriores emanados dos Tribunais a definirem ou criarem os órgãos fracionários competentes para o julgamento daqueles dissídios. [48]

Enquanto o Superior Tribunal de Justiça, os Tribunais Regionais Federais e os Tribunais de Justiça dos Estados não procederem às alterações regimentais exigidas para a aplicação plena das decisões proferidas nos Mandados de Injunção nº 670/ES, 708/PB e 712/DF, caberá às Varas Federais e às Varas Estaduais de Fazenda Pública, conforme o caso, conhecerem das ações declaratórias voltadas para a abusividade/ilegalidade das greves de servidores públicos ou para a interpretação de dispositivo da legislação regente do funcionalismo estatal.

Do exposto nas presentes linhas, observa-se que a aplicação do art. 8º da Lei nº 7.783/89 às greves deflagradas por servidores públicos afigura-se parcial, haja vista a impossibilidade de ajuizamento de dissídios coletivos de natureza econômica em se tratando de funcionários estatutários, bem como condicionada a determinadas providências regulamentares incumbidas ao Superior Tribunal de Justiça, aos Tribunais Regionais Federais e aos Tribunais de Justiça Estaduais.

"Art. 9º Durante a greve, o sindicato ou a comissão de negociação, mediante acordo com a entidade patronal ou diretamente com o empregador, manterá em atividade equipes de empregados com o propósito de assegurar os serviços cuja paralisação resultem em prejuízo irreparável, pela deterioração irreversível de bens, máquinas e equipamentos, bem como a manutenção daqueles essenciais à retomada das atividades da empresa quando da cessação do movimento."

Anteriormente à análise em torno da aplicabilidade ou não do dispositivo em apreço, cumpre ressaltar que o "acordo" mencionado em sua redação não se confunde com os acordos (ou convenções) resultantes de negociação coletiva. Com efeito, aquele tem por objeto a manutenção dos serviços cuja prestação constante afigura-se essencial para a integridade dos bens de produção da empresa, bem como de suas atividades, enquanto estes últimos versam sobre as condições de trabalho que as partes deverão observar em um período de tempo determinado.

Conforme viu-se exaustivamente ao longo dos comentários anteriores, não há espaço para a negociação coletiva no serviço público, pelo menos até o presente momento, haja vista a inexistência de dispositovos legais que estabeleçam a forma, os procedimentos e o conteúdo te tal instituto.

Já o "acordo" mencionado no art. 6º, caput, da Lei nº 7.789/89, por ter seu objeto e suas hipóteses de estabelecimento definidas no próprio corpo do dispositivo em apreço e, principalmente, por não se confundir com as avenças coletivas decorrentes da negociação coletiva, pode ser firmado entre a Administração Pública e os sindicatos representativos dos servidores enquanto não dissolvido o movimento paredista.

Resta saber, contudo, quais serão os serviços públicos cuja paralisação terá o condão de prejudicar as estruturas físicas imprescindíveis para sua regular prestação e colocará em risco a retomada ulterior de seu oferecimento à coletividade. Ressalte-se, desde já, que apenas em tais situações o art. 9º da Lei nº 7.783/89 permite o estabelecimento do aludido "acordo", não podendo ele ser travado indiscriminadamente nas hipóteses em que as autoridades evoquem vagas e imprecisas ameaças de "dano ao interesse público" ou mesmo "à continuidade na prestação do serviço".

Tal assertiva se justifica na medida em que os dispositivos limitadores do exercício do direito à greve, especialmente aqueles voltados para a manutenção de serviços mínimos, devem ser interpretados restritivamente, no fito de evitar-se a ampliação desmesurada de tais restrições e, por conseguinte, o comprometimento daquela garantia tão cara aos trabalhadores, conforme estabelece o Verbete nº 611 do Comitê de Liberdade Sindical da OIT:

"611. El Comité há insistido en la importancia de que las disposiciones relativas a los servicios mínimos a aplicar en caso de huelga em un servicio esencial se determinen em forma clara, se apliquen estrictamente y sean conocidas a su debido tiempo por los interesados" [49]

Ainda assim, a definição das hipóteses em que o acordo previsto no artigo ora estudado terá ou não aplicação dependerá da análise dos casos concretos, não se podendo afirmar, em abstrato, quais os serviços públicos que necessitam de um contingente mínimo de funcionários para assegurar os elementos materiais necessários à sua prestação, bem como o seu regular oferecimento ao cabo da greve.

Feitas tais ressalvas, conclui-se que o art. 9º, caput, da Lei nº 7.883/89 aplica-se às greves deflagradas por servidores públicos, observando-se, nesse sentido, as estritas condições necessárias para a formulação do acordo ali previsto, sob pena de se entabularem restrições indevidas ao exercício do direito à greve.

"Parágrafo único. Não havendo acordo, é assegurado ao empregador, enquanto perdurar a greve, o direito de contratar diretamente os serviços necessários a que se refere este artigo."

As hipóteses mencionadas no caput do artigo em referência remetem a situações em que a continuidade quanto ao oferecimento do serviço público encontra-se em risco. Com efeito, comprometidos os meios materiais de prestação de tais atividades e impossibilitada sua retomada em razão da greve, os prejuízos à coletividade serão irreversíveis.

Recorde-se, por oportuno, que o direito à greve não se reveste de caráter absoluto. Em situações como aquelas elencadas no caput do art. 9o da Lei no 7.783/89, não só o princípio da continuidade na prestação dos serviços públicos será comprometida, como também haverá prejuízos a direitos fundamentais assegurados aos cidadãos pela Constituição Federal. [50]

A titulo exemplificativo, poder-se-ia imaginar a paralisação de servidores responsáveis pela reposição dos estoques e da conservação de medicamentos e sangue nos postos de saúde e hospitais da rede pública. A depender da duração do movimento, operar-se-á o perecimento dos referidos gêneros, de modo a causar prejuízos severíssimos à população e a causar danos evidentes às garantias da integridade física e da própria vida.

Em tais condições, a concordância prática entre os dispositivos constitucionais assecuratórios das garantias de greve dos servidores públicos e dos bens jurídicos titularizados pela população impõe como solução o reconhecimento do direito à paralisação concertada dos funcionários responsáveis por aqueles serviços e, paralelamente a isto, a existência de pessoal apto a zelar pela manutenção dos meios materiais necessários ao atendimento da coletividade. [51]

Justamente por tal razão, a interpretação ora formulada, escoimada no princípio hermenêutico da concordância prática, impõe a aplicação do dispositivo em comento em se constatando as situações elencadas no caput do art. 9° da Lei n° 7.783/89.

Contudo, em se materializando tais hipóteses, a Administração Pública, ao proceder à arregimentação de mão-de-obra substituta, deverá observar as diretrizes constantes das leis editadas nas esferas federal, estadual e municipal a versarem sobre a contratação de trabalhadores temporários. No caso dos entes vinculados à União, tal diploma consiste na Lei no 8.745, de 9.12.1993.

"Art. 10 São considerados serviços ou atividades essenciais:

I - tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;

II - assistência médica e hospitalar;

III - distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;

IV - funerários;

V - transporte coletivo;

VI - captação e tratamento de esgoto e lixo;

VII - telecomunicações;

VIII - guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares;

IX - processamento de dados ligados a serviços essenciais;

X - controle de tráfego aéreo;

XI compensação bancária."

"Art. 11. Nos serviços ou atividades essenciais, os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores ficam obrigados, de comum acordo, a garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.

Parágrafo único. São necessidades inadiáveis, da comunidade aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população."

"Art. 12. No caso de inobservância do disposto no artigo anterior, o Poder Público assegurará a prestação dos serviços indispensáveis."

A listagem estabelecida no artigo 10, da Lei nº 7.783/89, muito embora contenha alguns serviços públicos ora prestados por concessionários (tratamento/distribuição de água, energia elétrica e gás, transporte coletivo rodoviário/ferroviário, coleta de esgoto e lixo, telecomunicações), ora diretamente pelo Poder Público (controle de tráfego aéreo), foi elaborada com vistas à regulamentação da greve no setor privado, mesmo porque este é o escopo da Lei nº 7.783/89. [52]

Dentre os serviços públicos típicos de carreiras de Estado prestados por funcionários estatutários existem atividades cuja paralisação total compromete significativamente a coletividade em níveis iguais ou maiores do que a cessação das atividades arroladas nos dispositivos em apreço, e cuja menção em uma lei voltada para a regulamentação da greve no setor privado afigurava-se inoportuna.

Justamente por tal razão, a aplicação dos dispositivos em apreço às greves deflagradas pelos sobreditos servidores deve ser condicionada ao esclarecimento de dois pontos importantes: 1) quais os serviços prestados diretamente pelo Poder Público, mediante o emprego de funcionários estatutários, que se revestem de essencialidade e 2) quais os critérios a serem utilizados para se classificar uma determinada atividade como tal.

Já de antemão é imprescindível deixar assente que nem todo serviço público afigura-se essencial a ponto de impor a manutenção de um contingente mínimo de servidores nos respectivos órgãos. As duas noções (serviço público e serviço essencial) não se confundem, de modo que apenas nesse último caso as restrições ao direito de greve ora mencionadas terão lugar, conforme bem assinalam Juan José Díez Sanchez e Salvador Del Rey Guanter:

"La continuidad y La regularidad es el elemento o nota conceptual de esa categoria jurídica (servicio público), que ha permanecido siempre y la ha caracterizado, ya implícita, ya explícitamente, provocando históricamente el rechazo de La huelga de los funcionarios públicos.

Sin embargo, no es esa exatamente la categoria jurídica que constitucionalmente limita el derecho a la huelga, sino la de servicio esencial. Obviamente, ambas expresiones no son sinonimas ni equivalentes.

(...)

Cremos posible, pues, mantener que los servicios públicos no son per se esenciales. Y que, en consecuencia, solo aquellos servicios públicos que posean esa característica han de ser garantizados en base a la limitación constitucional." [53]

(...)

"Se ha considerado que un importante numero de funcionarios públicos realiza un trabajo que afecta de una forma más o menos acentuada al interes de un mayor número de miembros de la comunidad, todo ello en relación a los trabajadores del sectos laboral. Por supuesto, es totalmente correcto que (...) seria ilógico calificar a todos los trabajos desarrollados por los funcionarios públicos como esenciales, y que, de igual forma, hay que estimar que existen grupos de trabajadores en el sector laboral que ejercen trabajos mucho más esenciales que aquellos desarrollados por muchos funcionarios públicos. De esta forma, no sería acertado defender que la transcendencia del servicio prestado por los funcionarios públicos es argumento suficiente para la supresión total de su derecho a la huelga" [54]

Acaso a aplicação dos dispositivos em comento partisse da premissa de que todo serviço público é essencial, estar-se-ia restringindo demasiadamente o exercício do direito à greve assegurado aos servidores públicos pelo art. 37, VII, da Constituição Federal, em franca afronta ao princípio da proporcionalidade, a exigir que as limitações legais em abstrato aos direitos fundamentais sejam adequadas, necessárias e não impliquem no sacrifício desmesurado de um bem jurídico em nome de outro(s). [55]

Nesse sentido, a limitação indiscriminada do direito à greve por parte dos servidores públicos não só seria inadequada à finalidade vislumbrada pela imposição de serviços mínimos (assegurar a prestação das atividades realmente essenciais para a comunidade), como também desnecessária – já que atividades não essenciais acabariam sendo restringidas – e desproporcional, pois a garantia insculpida no art. 37, VII, da Constituição Federal estaria sendo esvaziada para além do razoável em nome da pretensa tutela de direitos fundamentais dos cidadãos.

A fim de evitar tal resultado, faz-se necessário estabelecer critérios em abstrato com vistas à classificação dos serviços públicos essenciais. Já se adianta, contudo, que a conceituação a ser obtida, embora auxilie na visualização daquelas funções imprescindíveis para a coletividade, não resolverá em definitivo a questão, pois apenas da análise concreta das situações poder-se-á antever a essencialidade ou não de uma determinada atividade. [56]

Pois bem, como critérios voltados para a definição das atividades essenciais presentes no serviço público, poder-se-ia utilizar as definições traçadas pelo Comitê de Liberdade Sindical da OIT ao apreciar casos concretos levados a seu conhecimento por entidades sindicais dos mais diversos países.

Da análise dos verbetes lavrados pela sobredita instância internacional, observa-se que a classificação de um serviço público como essencial depende de duas condições alternativas, quais sejam, seu exercício por funcionários investidos do poder de exercer autoridade em nome do Estado ou a potencial lesão à vida, à saúde e à segurança da população em decorrência de sua interrupção:

"573. El Comité admitió que el derecho de huelga puede ser objeto de restricciones, incluso de prohibiciones, cuando se trate de La función pública o de servicios esenciales, en La medida que La huelga pudiere causar graves perjuicios a La colectividad nacional y a condición de que estas restricciones vayan acompañadas de ciertas garantías compensatórias." [57]

"574. El derecho de huelga puede limitarse o prohibirse en La función pública solo en caso de los funcionarios que ejercen funciones de autoridade en nombre del Estado. [58]

(...)

"576. El derecho de huelga puede limitarse o prohibirse: 1) en La función pública solo en caso de funcionários que ejercen funciones de autoridade en nombre del Estado, o 2) en los servicios esenciales en el sentido estricto del termino (ES decir, aquellos servicios cuya interrupción podría poner en peligro La vida, La seguridad o La salud de la persona en toda o parte de la población)." [59]

No entanto, em que pese a definição constante dos verbetes em apreço, faz-se necessário perquirir quais seriam os servidores " exercentes de autoridade em nome do Estado" cujo direito de greve estaria sujeito a limitações, haja vista a notória vagueza da expressão talhada pelo Comitê de Liberdade Sindical.

Nesse sentido, poder-se-ia iniciar a busca em torno de tal definição a partir do conceito de "autoridade" formulado por De Plácido e Silva, a compreender " o poder de comando de uma pessoa, o poder de jurisdição ou o direito que se assegura a outrem para praticar determinados atos relativos a pessoas, coisas ou atos." [60]

Assim, quando a pessoa em referência é um servidor investido da potestade para praticar determinados atos em nome do Estado, diz-se que aquele titulariza autoridade pública. Indaga-se, contudo: quais seriam tais poderes cuja detenção por certos funcionários dá ensejo à limitação do direito à greve?

Independentemente das tarefas arrogadas pelo Estado e de seu tamanho, a razão histórica e prática para a existência do referido ente consiste em velar pela observância do direito, através do manejo de seus poderes, impondo certos limites à liberdade dos cidadãos necessários à vida em coletividade.

Nesse sentido, Karl Loewenstein assinala que "dentro del marco de la sociedad, el Estado se presenta como la forma exclusiva o preponderante (...) de la organización sociopolítica", de modo que "en la sociedad estatal, el poder político aparece como el ejercício de un efectivo control social de los detentadores del poder sobre los destinatários del poder." [61]

E, ainda segundo Loewenstein, o controle social exercido pelos detentores do poder emanado do Estado tem por conceito, justamente, "la función de tomar o determinar una decisión, así como la capacidad de los detentadores del poder de obligar a los destinatários del poder a obedecer dicha decisión." [62]

Para lograr tal finalidade, o Estado dispõe de um corpo amplo de servidores treinados e habilitados para atuarem junto aos cidadãos, impondo-lhes diretamente a observância às normas jurídicas ou exercendo atividades de fiscalização.

Tendo em vista tais noções, a resposta à indagação formulada alhures pode ser formulada do seguinte modo: as funções de autoridade pública exercidas pelos servidores em nome do Estado e mencionadas nos verbetes do Comitê de Liberdade Sindical da OIT são aquelas que exigem legalmente dos funcionários o contato direto com os cidadãos, impondo-lhes diretamente a prática de determinadas condutas em consonância com o direito ou a fiscalizando suas atividades privadas.

As espécies mais comuns de atribuições enquadráveis nesse gênero são aquelas que envolvem, em um rol não exaustivo, o poder de policia (fiscalização tributária, sanitária, veterinária, aduaneira, etc.) [63], a prevenção e repressão de delitos (polícias civis, federal e rodoviária federal), bem como a atividade judicial.

Por outro lado, as atividades que não envolvem o exercício de autoridade em nome do Estado englobam aquelas voltadas, precipuamente, para dar suporte às sobreditas funções (vg. técnicos e analistas judiciais/tributários), bem como aquelas em que há a prestação de um serviço público sem que haja o exercício de poder de polícia ou a imposição de obrigações aos cidadãos (vg. docentes).

Importa ressaltar, nesse diapasão, que o Comitê de Liberdade Sindical da OIT, em oportunidades concretas, manifestou-se expressamente a respeito da essencialidade ou não de determinadas atividades exercidas por servidores públicos seja por conta da presença de exercício de autoridade em nome do Estado ou em razão da eminente ameaça de danos à vida, à saúde e à segurança da população.

Foram configuradas como atividades essenciais para fins de exigência de serviços mínimos a fiscalização aduaneira [64], a fiscalização veterinária no curso de epidemias [65], os correios [66], os transportes metroviário e ferroviário [67], os serviços hospitalares, a polícia, as forças armadas, os bombeiros, a vigilância penitenciária, o fornecimento de merenda escolar e material de limpeza para os estabelecimentos educacionais, o controle de tráfego aéreo [68], bem como a direção e a coordenação das escolas. [69]

De outro turno, o Comitê de Liberdade Sindical da OIT declarou expressamente que, dentre os serviços prestados por funcionários do Estado, não se revestem de essencialidade, para fins de limitação do direito à greve, as atividades pertinentes às emissoras de rádio e televisão, ao suporte de informática para a arrecadação de taxas e impostos, à confecção de moedas, à imprensa oficial [70], bem como ao ministério de aulas em escolas públicas. [71]

Importa ressaltar, por oportuno, que a manutenção de um contingente mínimo de servidores nas funções públicas essenciais, em caso de greve, somente se afigurará lícita conquanto sejam adotadas medidas compensatórias, tais como a instituição de instâncias idôneas de arbitragem ou mediação, a fim de se evitar o esvaziamento da parede, conforme assevera o Comitê de Liberdade Sindical da OIT em seu verbete nº 596:

"596. En cuanto a la índole de las <<garantías apropiadas>> em caso de restricción del derecho de huelga em los servicios esenciales y em la función pública, la limitación de la huelga debe ir acompañada por procedimientos de conciliación y arbitraje adecuados, imparciales y rápidos em que los interesados puedan participar em todas las etapas, y em que los laudos dictados deberían ser aplicados por completo y rapidamente." [72]

Em que pese, todavia, os intentos ora formulados em torno da fixação do conceito de "funções de autoridade em nome do Estado", bem como a expressa manifestação por parte do Comitê de Liberdade Sindical da OIT a respeito de algumas situações específicas a envolverem potenciais ameaças à vida, à saúde ou à segurança da população, a definição em torno do caráter essencial ou não das inúmeras atividades exercidas por servidores públicos não prescindirá da análise individual dos casos concretos e das circunstâncias subjacentes a estes últimos. [73]

Nesse sentido, o próprio Ministro Gilmar Mendes, quando do julgamento do Mandado de Injunção nº 708/PB deixou assente na conclusão de seu voto condutor que "em razão dos imperativos da continuidade dos serviços públicos, não estou a afastar que, de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto e mediante a solicitação de órgão competente, seja facultado ao juízo competente impor a observância a regime de greve mais severo em razão de se tratarem de ´serviços ou atividades essenciais´, nos termos dos já mencionados arts. 9º e 11 da Lei nº 7.783/1989."

Tal análise a ser efetivada pelo Poder Judiciário deve procurar buscar, em cada situação específica, o conteúdo do direito à greve dos servidores públicos (art. 37, VII, da Constituição Federal), bem como dos direitos fundamentais dos cidadãos eventualmente afetados, a fim de delimitar a justa medida de cada um na hipótese concreta posta à sua apreciação, conforme bem assinala Gustavo Zagrebelsky em sua célebre compreensão do direito por princípios:

"Las reglas nos proporcionan el criterio de nuestras acciones, nos dicen cómo debemos, no debemos, podemos actuar em determinadas situaciones específicas previstas por las reglas mismas; los principios, directamente, no nos dicen nada a este respecto, pero nos proporcionan criterios para tomar posición ante situaciones concretas pero que ´a priori´ aparecen indeterminadas. Los principios generan actitudes favorables o contrarias, de adhesión y apoyo o de disenso y repulsa hacia todo lo que puede estar implicado em su salvaguarda en cada caso concreto. Puesto que carecen de <<supuesto de hecho>>, a los principios, a diferencia de lo que sucede com las reglas, sólo se les puede dar algún significado operativo haciéndoles <<reaccionar>> a algun caso concreto. Su significado no puede determinarse en abstracto, sino sólo en los casos concretos, y sólo en los casos concretos se puede entender su alcance.

(...)

La importancia de esta temática resulta evidente em todos los problemas relativos a la validez de las normas jurídicas. Si el derecho debe volver a la realidad, es decir, si debe operar en cada caso concreto conforme al valor que los principios asignan a la realidad, no se puede controlar la validez teniendo en cuenta exclusivamente lo que ésta dice. No basta considerar el <<derecho de los libros>>, es preciso tener en cuenta <<el derecho em acción>>;no basta una validez lógica, es necesaria una <<validez práctica>> ¿Cuántas veces el significado en abstracto de una norma es diferente de su significado en el caso concreto?, ¿cuántas veces las condiciones reales de funcionamiento de una norma tuercen su sentido, en ocasiones invertiendo la intención del legislador? Siempre que se produce esta desviación, el <<derecho viviente>>, o sea, el derecho que efectivamente rige, no es el que está escrito en los textos, sino el que resulta del impacto de la norma en abstracto y sus condiciones reales de funcionamiento." [74]

Do exposto nos comentários ora formulados, tem-se que a limitação ao direito de greve por intermédio da manutenção de contingentes mínimos em determinadas atividades tidas por essenciais, a constar dos artigos 10, 11 e 12 da Lei nº 7.783/89, aplica-se aos movimentos deflagrados por servidores públicos, observadas as peculiaridades inerentes à função estatal.

E o atendimento a tais peculiaridades não prescinde da análise em torno das circunstâncias subjacentes ao caso concreto, mais especificamente no que concerne à natureza das atividades cumpridas pelos servidores em greve, a medida de autoridade exercida por estes últimos em nome do Estado, a relevância da função para a segurança, a saúde e a vida dos cidadãos, bem como os potenciais impactos das eventuais limitações no exercício do direito de greve por parte daqueles funcionários.

Somente assim, será possível lograr a concordância prática entre o direito de greve assegurado expressamente no art. 37, VII, da Constituição Federal e as demais garantias fundamentais dos cidadãos, sem que haja a prevalência desmesurada de um bem jurídico em relação a outro.

"Art. 13. Na greve, em serviços ou atividades essenciais, ficam as entidades sindicais ou os trabalhadores, conforme o caso, obrigados a comunicar a decisão aos empregadores e aos usuários com antecedência mínima de 72 (setenta e duas) horas da paralisação."

A compreensão do dispositivo em apreço no que concerne às greves deflagradas pelos trabalhadores privados não apresenta maiores dificuldades. Estando a atividade elencada no rol do art. 10 da Lei nº 7.783/89, as entidades sindicais ou a comissão de trabalhadores deverá comunicar a decisão tomada em assembléia-geral aos empregadores e aos usuários dos serviços com 3 (três) dias de antecedência.

O mesmo não se pode dizer, contudo, com relação aos movimentos paredistas protagonizados por servidores públicos, pois, conforme visto alhures, as atividades constantes do art. 10 da Lei nº 7.783/89 foram ali inseridas tendo em vista a regulamentação da greve no setor privado, de modo que a aplicação subsidiária do referido diploma legal não permite vislumbrar, de antemão, os misteres essenciais exercidos pelos funcionários estatutários.

Diante disso, a aplicação do dispositivo em apreço às greves de servidores públicos, a nosso ver, encontra-se condicionada à definição em concreto das atividades essenciais desempenhadas no âmbito do serviço público, a ser formulada pelo Poder Judiciário quando da análise dos casos particulares postos à sua apreciação.

Existem, contudo, no amplo universo das tarefas assumidas pelo Estado, atividades prestadas por servidores públicos cuja relevância social é manifesta, haja vista sua imprescindibilidade para a manutenção da vida, da integridade física e da segurança da população, tais como aquelas desempenhadas pelos médicos e profissionais da área de saúde, bem como pelos policiais e agentes da Defesa Civil. Em tais casos, parece-nos que a regra constante do art. 13 da Lei nº 7.784/89 é aplicável de imediato, sem que haja a necessidade de prévia manifestação do Poder Judiciário em torno do caráter essencial ou não das referidas funções.

Nos demais casos, havendo incerteza quanto à essencialidade ou não do serviço público a ser paralisado, a prudência recomenda que o prazo de 72 (setenta e duas) horas estabelecido no dispositivo em comento seja observado pelas entidades sindicais, com vistas a se evitarem eventuais declarações de abusividade do movimento por parte dos Tribunais competentes para o julgamento dos dissídios de greve.

Art. 14 Constitui abuso do direito de greve a inobservância das normas contidas na presente Lei, bem como a manutenção da paralisação após a celebração de acordo, convenção ou decisão da Justiça do Trabalho.

Parágrafo único. Na vigência de acordo, convenção ou sentença normativa não constitui abuso do exercício do direito de greve a paralisação que:

I - tenha por objetivo exigir o cumprimento de cláusula ou condição;

II - seja motivada pela superveniência de fatos novo ou acontecimento imprevisto que modifique substancialmente a relação de trabalho.

Acaso algum dos procedimentos estabelecidos na Lei nº 7.783/89 seja inobservado pelo sindicato de servidores no que concerne às formalidades de convocação (art. 4º), ao resguardo dos direitos de terceiros (art. 6º), ou à manutenção de atividades mínimas nas hipóteses legais (artigos 9º a 12), a greve será abusiva, cabendo tal declaração ao Superior Tribunal de Justiça, aos Tribunais Regionais Federais e aos Tribunais de Justiça do Estado, a depender da abrangência territorial do movimento, conforme visto nos comentários ao art. 8º.

Observa-se, diante disso, que a primeira frase a constar do caput do artigo em comento tem plena aplicabilidade às greves deflagradas por servidores públicos. O mesmo não se pode dizer a respeito do abuso decorrente da manutenção do movimento após a celebração de acordo ou convenção coletiva, pela simples razão de que tais figuras inexistem no âmbito da Administração Pública, conforme já visto alhures.

Em que pese, contudo, a inexistência de negociação coletiva no setor público, constata-se com razoável freqüência o estabelecimetno de compromissos entre a Administração e determinadas categorias de servidores, pelos quais aquela se propõe a tomar as medidas cabíveis para atender às reivindicações de seus funcionários, enquanto estes últimos se comprometem a permanecer em atividade.

Nessas hipóteses, a nosso ver, o inciso I do parágrafo único do dispositivo reforça a legalidade dos movimentos deflagrados por servidores em se constatando o descumprimento daqueles compromissos por parte da Administração Pública.

Tal assertiva decorre logicamente do postulado da proteção à confiança, subjacente ao princípio da moralidade (art. 37, caput, da Constituição Federal), a preconizar que as manifestações propaladas pelos entes estatais, por incutirem em seus destinatários expectativas razoáveis em torno de sua concreção, vinculam o órgão emissor e conferem aos administrados o direito subjetivo à observância dos compromissos firmados. [75]

Afigura-se oportuno recordar, neste momento, que, o art. 7º, parágrafo único, da Lei nº 7.783/89 autoriza a contratação temporária de trabalhadores nas hipóteses de continuidade da paralisação após a declaração de abusividade da greve. Poder-se-ia indagar a respeito da aplicação de tal dispositivo aos movimentos deflagrados por servidores públicos.

A nosso ver, a possibilidade de contratação temporária de servidores públicos em decorrência da abusividade dos movimentos paredistas declarada pelo Poder Judiciário encontra-se autorizada pelo sobredito dispositivo. Com efeito, uma vez constatada a ilegalidade da greve, o direito ao exercício desta última torna-se insubsistente, não havendo mais como contrapô-lo às garantias fundamentais titularizadas pelos cidadãos passíveis de serem afetadas pela paralisação de uma determinada atividade.

Aplicam-se, portanto, as mesmas razões aduzidas nos comentários ao parágrafo único do art. 9º para autorizar a contratação temporária de servidores públicos após a declaração de abusividade da greve. Ressalte-se, mais uma vez, que a arregimentação de trabalhadores a ser efetivada pela Administração Pública deverá obedecer os procedimentos constantes da Lei nº 8.475/93, na seara federal, e das legislações congêneres nos Estados, Municípios e no Distrito Federal.

Tem-se, portanto, que o dispositivo em apreço é plenamente aplicável aos servidores públicos quando reputa ilícita a greve iniciada e conduzida em inobservância às formalidades constantes da Lei nº 7.783/89, não se podendo dizer o mesmo quanto à abusividade decorrente de movimento deflagrado no curso de negociação ou acordo coletivo, haja vista a inexistência de tais figuras no setor público.

Não obstante, o teor do art. 14, parágrafo único, I, da Lei nº 7.783/89 tem o condão de reforçar a licitude das greves deflagradas por servidores públicos em razão da inobservância, por parte da Administração Pública, de compromissos firmados anteriormente com a categoria.

Art. 15 A responsabilidade pelos atos praticados, ilícitos ou crimes cometidos, no curso da greve, será apurada, conforme o caso, segundo a legislação trabalhista, civil ou penal.

Parágrafo único. Deverá o Ministério Público, de ofício, requisitar a abertura do competente inquérito e oferecer denúncia quando houver indício da prática de delito.

Se, eventualmente, no curso da greve, integrantes do movimento causarem danos à propriedade pública ou privada, à integridade física de terceiros, à vida ou outros bens jurídicos tutelados pelo direito criminal, caberá às autoridades policiais e do Ministério Público procederem à apuração do ocorrido e promoverem, conforme suas competências, as medidas adequadas para o ajuizamento da correspondente ação penal.

Paralelamente a isto, os eventuais prejudicados poderão ingressar com ações cíveis com vistas à reparação dos danos morais e/ou materiais decorrentes das condutas ilícitas perpetradas pelos servidores no curso da greve.

É, portanto, a legislação cível e penal plenamente aplicável aos servidores públicos que, durante as atividades ligadas ao movimento paredista, vierem a danificar bens jurídicos por elas tutelados. Nesse tocante, o artigo em comento incide em sua plenitude sobre as greves deflagradas por funcionários estatutários.

Ocorre, todavia, que determinadas condutas perpetradas por servidores no curso da greve podem vir a caracterizar faltas funcionais previstas em lei. Nesse caso, caberá à Administração Pública instaurar sindicância, ou processo disciplinar, conforme o caso, com vistas à apurar a punibilidade do funcionário, observando-se, para tanto, os procedimentos constantes do Título V da Lei nº 8.112/90.

Art. 16. Para os fins previstos no art. 37, inciso VII, da Constituição, lei complementar definirá os termos e os limites em que o direito de greve poderá ser exercido.

Conforme visto alhures, a Emenda Constitucional nº 19/98 alterou a redação originária do art. 37, VII, da Carta Magna, ponto termo à exigência de lei complementar a ser editada pelo Congresso Nacional com vistas à regulamentação das greves deflagradas por servidores públicos.

Tal alteração, a permitir que a sobredita garantia fundamental pudesse vir a ser regulamentada em lei ordinária, possibilitou ao Supremo Tribunal Federal elocubrar as conclusões traçadas quando do julgamento dos Mandados de Injunção nº 670/ES, 708/PB e 712/DF, no sentido de impor a aplicação subsidiária da Lei nº 7.783/89 às greves de servidores públicos, enquanto não editado diploma legal específico.

Desse modo, com o advento da Emenda Constitucional nº 19/98, bem como dos acórdãos em referência lavrados pelo Supremo Tribunal Federal, o dispositivo em comento tornou-se caduco.

Art. 17. Fica vedada a paralisação das atividades, por iniciativa do empregador, com o objetivo de frustrar negociação ou dificultar o atendimento de reivindicações dos respectivos empregados (lockout).

Parágrafo único. A prática referida no caput assegura aos trabalhadores o direito à percepção dos salários durante o período de paralisação.

A figura do lockout mencionada no artigo em estudo, configura uma espécie da abuso do direito de propriedade e do poder diretivo titularizados pelos empregadores que tem como ambiente típico as relações de trabalho no setor privado. O referido termo caracteriza a paralisação patronal das atividades, acompanhada da cessação do pagamento de salários, no fito de dificultar ou mesmo impedir o prosseguimento de negociação coletiva em curso ou criar empecilhos à formulçação de reivindicações por parte dos trabalhadores. [76]

Justamente em razão da natureza eminentemente laboral e privada do lockout, o referido instituto não encontra conceituação no âmbito da Administração Pública, não existindo nessa seara nem sequer situação equivalente ou semelhante, de modo que sua visualização em tais hipóteses, mesmo em abstrato, beira o surrealismo.

Ainda assim, poder-se-ia imaginar situação hipotética em que o diretor de um órgão público da Administração direta, ou o presidente de uma autarquia, por exemplo, invoque falsos motivos para reduzir ou suspender o serviço público prestado, bem como para retardar a elaboração e o envio da folha de pagamento aos órgãos processantes, mascarando, com isto, a real intenção de a prejudicar a mobilização de seus subordinados.

Nessas hipóteses, o administrador não só estará praticando ato manifestamente atentatório ao princípio da legalidade (art. 37, caput, da Constituição Federal), como também incidirá em desvio de finalidade e improbidade administrativa, podendo até, conforme o caso, ser enquadrado no crime de prevaricação, nos termos do art. 2º, "e" e parágrafo único, "e", da Lei nº 4.717, de 29.6.1965 (Lei da Ação Popular), do art. 11, I e II, da Lei nº 8.429, de 2.6.1992, bem como do art. 319 do Código Penal:

"Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de:

(...)

e) desvio de finalidade.

Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas:

(...)

e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência."

(...)

"Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da Administração Pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdadeàs instituições, e notadamente:

I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

II – retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício."

(...)

"Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa."

Se a autoridade que determinou a paralisação dos serviços públicos ora cogitada for o Presidente da República, Ministro de Estado, Governador ou Secretário Estadual a conduta pode vir a configurar crime de responsabilidade punível nos termos dos artigos 2º, 7º, V e 9º, IV, da Lei nº 1.079, de 10.4.1950 [77].

Tem-se, diante disso, que a figura do lockout prevista e punida no dispositivo em comento não serve para caracterizar eventuais condutas análogas perpetradas no âmbito da Administração Pública, haja vista que sua definição jurídica tem por pano de fundo as relações laborais vislumbradas exclusivamente no setor privado.

Em se materializando as hipóteses delineadas nas linhas acima, os abusos cometidos pelos administradores serão punidos na forma dos artigos 12, III, da Lei nº 8.429/92 e 369 do Código Penal, bem como das Leis nº 4.717/65 e 1.079/50, e não pelo artigo em referência, que, por isso mesmo, afigura-se inaplicável ao serviço público.

Art. 18. Ficam revogados a Lei nº 4.330, de 1º de junho de 1964, o Decreto-Lei nº 1.632, de 4 de agosto de 1978, e demais disposições em contrário.

Art. 19 Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 28 de junho de 1989; 168º da Independência e 101º da República.


CONCLUSÃO.

Ao assegurar aos servidores públicos o direito de greve, apesar notória resistência histórica em torno da aplicação de tal instituto ao funcionalismo estatal, a Constituição Federal de 1988 avançou significativamente em relação à regulamentação da matéria nos diplomas anteriores à sua promulgação.

Nesse mesmo sentido, os acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento dos Mandados de Injunção n° 678/, 708/ e 712/DF, romperam com a interpretação restrita que se vinha conferindo ao art. 37, VII, da Constituição Federal, reconhecendo, finalmente, a este último, alguma força normativa.

Diante desse novo entendimento, a propalar a aplicação da Lei nº 7.783/89 às greves deflagradas por servidores públicos naquilo que couber, impõe-se aos intérpretes que se propõem a esboçar o novo perfil do direito em referência, fazê-lo com arrimo nos princípios democráticos e pluralistas que, ao lado do art. 37, VII, da Carta Magna, compõem o atual ordenamento constitucional pátrio e que inspiraram, igualmente, a edição daquele diploma legal.

Justamente por tal razão, os comentários elaborados nas linhas anteriores procuraram não só vislumbrar os limites e condições decorrentes da aplicação subsidiária da Lei nº 7.783/89 aos servidores públicos, como também destacar os mecanismos previstos no referido diploma legal que possibilitam e respaldam o eficaz exercício do direito de greve por parte daquela categoria.

Em outras palavras, buscou-se obter, na melhor medida possível, uma interpretação apta a assegurar, ao mesmo tempo, a fruição eficaz do direito de greve por parte dos servidores públicos e o atendimento às garantias titularizadas pela clientela das atividades vitais prestadas pelo Estado, afastando-se da crença histórica em torno da suposta essencialidade de todo e qualquer labor prestado por funcionários estatutários e da preponderância da Administração nas relações travadas com estes últimos como fator hipoteticamente impeditivo da deflagração de movimentos paredistas nessa seara.

Acreditamos, portanto, que tais diretrizes interpretativas a pautarem os presentes comentários, podem e devem servir de norte para a tarefa confiada aos intérpretes da Lei nº 7.783/89 nos inúmeros casos concretos que surgirão enquanto a lei específica a regulamentar o exercício da greve no serviço público não vier a ser editada.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

Doutrina:

AMORIM E SOUZA. Ronald. Greve e Locaute. Aspectos Jurídicos e Económicos. Coimbra: Almedina, 2004.

BETTI. Emilio. Trad: JANNINI. Karina; CRIFO. Giuliano. Interpretação da Lei e dos Atos Jurídicos. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

BRASIL: Assembléia Nacional Constituinte – Anais. Vol. IV. Brasília: Senado Federal, 1994.

BRITO FILHO. José Claudio Monteiro de. Direito Sindical. São Paulo: Ltr, 2000.

BUENO. José Antonio Pimenta. Direito Público Brasileiro e Análise da Constituição do Império. Rio de Janeiro: Ministério da Justiça e Negócios Interiores – Serviço de Documentação, 1958.

CABALLERO. Pedro Gómez. Los Derechos Colectivos de los Funcionários. Madrid: Consejo Economico y Social, 1994.

CANOTILHO. José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª Edição. Coimbra: Almedina, 2003.

COELHO. Inocêncio Mártires. Interpretação Constitucional. 2ª Edição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003.

COUTURE. Eduardo; PLA RODRIGUEZ. Américo. La Huelga en el Derecho Uruguayo. Montevideo: Editorial M.B.A, 1951.

DE LA CUEVA. Mario. El Nuevo Derecho Mexicano del Trabajo,Vol.II. 14ª Edición. México: 2006.

DE PLACIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico, Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 1963.

GHEZZI. Giorgio; ROMAGNOLI. Umberto. Il Diritto Sindacale. Quarta edizione. Bologna: Zanichelli, 1997.

GUANTER. Salvador del Rey. Estado, Sindicatos y Relaciones Colectivas en La Función Pública. Madrid: Instituto Nacional de Administración Publica, 1986.

LIMA. Ruy Cirne. Princípios de Direito Administrativo. 7a Edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2007.

LOEWENSTEIN. Karl. Trad: ANABITARTE. Alfredo Gallego. Teoria de la Constitución. 2ª Edición. Barcelona: Ariel, 1976.

MARTINS FILHO. Ives Gandra. Processo Coletivo do Trabalho. 3ª Edição. São Paulo: Ltr, 2003.

MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 13ª Edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2001,

MELLO. Oswaldo Aranha Bandeira de. Princípios Gerais de Direito Administrativo, Volume II. Rio de Janeiro: Forense, 1974.

MIRANDA. Francisco Cavalcante Pontes de. Comentários à Constituição de 1946. Vol. IV. Rio de Janeiro: Henrique Cahen Editor, 1947.

MIRANDA. Jorge. Manual de Direito Constitucional. Tomo V. Actividade Constitucional do Estado. 3ª Edição. Coimbra: Coimbra Editora, 2004.

NASCIMENTO. Amauri Mascaro. Direito do Trabalho na Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva, 1989.

NOGUEIRA. Octaciano. Doutrina Constitucional Brasileira (Constituição de 1946). Tomo I. Brasília: Senado Federal, 2006.

OFICINA INTERNACIONAL DEL TRABAJO. La Libertad Sindical. Recompilación de Decisiones y Princípios del Comité de Libertad Sindical del Consejo de Administración de la OIT. 5ª Edición. Ginebra: OIT, 2006.

PÉREZ. Jésus González. El Principio General de la Buena Fe en el Derecho Administrativo. 4ª Edición. Madrid: Thomson-Civitas, 2004.

PESSOA. Robertônio dos Santos. Sindicalismo no Setor Público. São Paulo: Ltr, 1995.

RIGOLIN. Ivan Barbosa. Comentários ao Regime Único dos Servidores Públicos Civis. 5ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2007.

SAAD. Eduardo Gabriel. Constituição e Direito do Trabalho. 2ª. Edição. São Paulo: LTr, 1989.

SÁNCHEZ. Juan José Díez. El Derecho de Huelga de los Funcionarios Públicos. Madrid: Universidad de Alicante/Civitas, 1990.

SANTOS. Carlos Maximiliano Pereira dos. Comentários à Constituição Brasileira de 1891. Edição Fac-Similar. Brasília: Senado Federal, 2005.

- Hermenêutica e Aplicação do Direito. 8ª Edição. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1965.

SCARTEZZINI. Ana Maria Goffi Flaquer. O Princípio da Continuidade do Serviço Público. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

SILVA. José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 6ª Edição, 3ª Tiragem. São Paulo: Malheiros Editores, 2004.

- Curso de Direito Constitucional Positivo. 6ª Edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990.

SIQUEIRA NETO. José Francisco. Liberdade Sindical e Representação dos Trabalhadores nos Locais de Trabalho. São Paulo: Ltr, 2000.

SÜSSEKIND. Arnaldo et alii. Instituições de Direito do Trabalho, Vol. I. 21ª Edição. São Paulo: Ltr, 2003.

ZAGREBELSKY. Gustavo. Trad: GASCÓN. Marina. El Derecho Dúctil. Ley, Derechos, Justicia. Sexta Edición. Madrid: Editorial Trotta, 2005.

Jurisprudência:

BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 492/DF. RELATOR: Ministro Carlos Velloso. Plenário. DJ: 12.3.1993.

BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE No 1.306/BA. RELATOR: Min. Octavio Gallotti. Plenário. DJ: 27.10.1995, p. 36.311.

BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE No 1.696/SE. RELATOR: Min. Sepúlveda Pertence. Plenário. DJ: 14.6.2002, p. 126.

BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. APELAÇÃO CRIMINAL Nº 1.557-SP. RELATOR: Min. Nelson Hungria. PLENARIO. DATA DE JULGAMENTO: 18.12.1957. FONTE: Ementário STF, Vol. 343-01, p. 58.

BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MANDADO DE INJUNÇÃO Nº 20/DF. RELATOR: Min. Celso de Mello. Plenário. DJ: 22.11.1996, p. 45.690.

BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MANDADO DE INJUNÇÃO N. 485/MT. RELATOR: Min. Mauricio Corrêa. Plenário. DJ: 23.8.2002, p. 71.

BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MANDADO DE INJUNÇÃO N. 689/PB. RELATOR: Min. Eros Roberto Grau. Plenário. DJ: 18.8.2006, p. 139-146.

BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MANDADO DE INJUNÇÃO Nº 708/DF. RELATOR: Min. Gilmar Mendes. Plenário. Acórdão Pendente de Publicação.

BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 3.395/DF. RELATOR: Min. Cezar Peluso. Plenário. DJ: 10.11.2006.

ESPAÑA: TRIBUNAL CONSTITUCIONAL. SENTENCIA Nº 27/1989. PONENTE: D. Angel Latorre Segura. Boletín Oficial del Estado nº 50, de 3.2.1989.

ESPAÑA. TRIBUNAL CONSTITUCIONAL. SENTENCIA Nº 90/1984. PONENTE: D. Francisco Pera Verdaguer. Boletín Oficial del Estado nº 261, de 3.11.1984.


Notas

01 Veja-se, a propósito, o comentário de Oswaldo Aranha Bandeira de Mello a respeito do instituto da greve de servidores públicos:

" O funcionário está obrigado a prestar os seus serviços em forma continua, porque as atividades públicas não toleram interrupções. Portanto, a ausência sem a competente autorização ou justificação constitui falta, sujeita a penalidade administrativa.

Conseqüentemente, o abandono coletivo, e por deliberação conjunta, do trabalho, por um grupo de funcionários, como atitude de rebeldia a comportamento do superior, com o objetivo de forçá-lo à prática de ato ou modificar o anterior, ou seja, a greve, constitui atitude ainda mais grave, suscetível de penalidades administrativa e penal." MELLO. Oswaldo Aranha Bandeira de. Princípios Gerais de Direito Administrativo, Volume II. Rio de Janeiro: Forense, 1974. p. 461-462.

02 Nesse sentido, Ronald Amorim e Souza assinala que "a paralisação concertada busca, a um só tempo, evidenciar a força de coesão, o peso da coação e a capacidade de convergência em derredor de um objetivo. A greve é, aí, um fato social. A sociedade, como a ordem jurídica, depara-se com o fenômeno da omissão ou redução orientada e deliberada do trabalho, por um dado número de trabalhadores, de um grupo de segmentos diversos ou de todos eles, e se encontra na contingência de buscar ou oferecer solução para o impasse." AMORIM E SOUZA. Ronald. Greve e Locaute. Aspectos Jurídicos e Económicos. Coimbra: Almedina, 2004. p. 59.

Nessa mesma linha de raciocínio, Américo Pla Rodriguez e Eduardo Couture classificam a greve como " un fenómeno de autotutela (...) por el cuál una parte, por acto propio, provoca un estado de condiciones destinado, directa o indirectamente, a la protección de su derecho, prescindiendo de los órganos de tutela del Estado." Ainda segundo os referidos autores orientais, " para que exista huelga, a nuestro entender, se requieren estos tres elementos:

a) La omisión de prestar el trabajo.

b) La voluntad de dar, a esa omisión, significado de reclamación o protesta.

c) Carácter colectivo del hecho." COUTURE. Eduardo; PLA RODRIGUEZ. Américo. La Huelga en el Derecho Uruguayo. Montevideo: Editorial M.B.A, 1951. P. 9-81.

03 BUENO. José Antonio Pimenta. Direito Público Brasileiro e Análise da Constituição do Império. Rio de Janeiro: Ministério da Justiça e Negócios Interiores – Serviço de Documentação, 1958. p. 428.

04 SANTOS. Carlos Maximiliano Pereira dos. Comentários à Constituição Brasileira de 1891. Edição Fac-Similar. Brasília: Senado Federal, 2005. P. 234.

05CODIGO CRIMINAL DO IMPERIO (1830) - "Art. 97. Usar de violência, ou ameaças contra agentes do Poder Executivo para forçal-os a fazer de maneira illegal um acto official, ou a deixar de fazer legalmente um ato official; ou a fazer, como Official, um acto para que não estejam autorizados.

(...)

Penas – de prisão com trabalho por seis mezes a quatro annos, além da mais em que incorrer pela violência, ou ameaças."

(...)

Art. 157. Largar, ainda que temporariamente, o exercício do emprego sem previa licença do legítimo superior; ou exceder o tempo de licença concedida, sem motivo urgente, e participado.

Penas – de suspensão do emprego por um a tres annos, e de multa correspondente a metade do tempo."

CODIGO PENAL (1890) - "Art. 118. Constitue crime de sedição a reunião de mais de 20 pessoas, que, embora nem todas se apresentem armadas, se ajuntarem para, com arruido, violencia ou ameaças: 1º, obstar a posse de algum funccionario publico nomeado competentemente e munido de titulo legal, ou prival-o do exercicio de suas funcções; 2º, exercer algum acto de odio, ou vingança, contra algum funccionario publico, ou contra os membros das camaras do Congresso, das assembléas legislativas dos Estados ou das intendencias ou camaras municipaes; 3º, impedir a execução de alguma lei, decreto, regulamento, sentença do poder judiciario, ou ordem de autoridade legitima; 4º, embaraçar a percepção de alguma taxa, contribuição, ou tributo legitimamente imposto; 5º constranger, ou perturbar, qualquer corporação politica ou administrativa no exercicio de suas funcções:

Pena - aos cabeças, de prisão cellular por tres mezes a um anno.

Paragrapho unico. Si o fim sedicioso for conseguido:

Pena - de prisão cellular por um a quatro annos.

(…)

CONSOLIDAÇAO DAS LEIS PENAIS (1932) – "Art. 115. É crime de conspiração concertarem-se vinte ou mais pessoas para:

(...)

§ 4º. Oppôr-se, directamente e por factos, ao livre exercício das attribuições constitucionaes dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário Federal, ou dos Estados.

Pena – de reclusão por um a seis annos.

(…)

"Art. 118. Constitue crime de sedição a reunião de mais de vinte pessoas que, embora nem todas se apresentem armadas, se ajuntarem para, com arruído, violência ou ameaças:

§ 1º – obstar a posse de algum funccionário publico nomeado competentemente e munido de título legal, ou prival-o do exercício de suas funccões.

(...)

§ 5º – constranger ou perturbar qualquer corporação política ou administrativa no exercício de

suas funcções.

Pena – aos cabeças – de prisão cellular por tres mezes a um anno."

06 Veja-se, a propósito, o caloroso debate travado entre os constituintes Romeu Lourenção (UDN-SP), Osvaldo de Brito e Nestor Duarte (UDN-BA)

"O SR. ROMEU LOURENÇÃO - (...) Nosso projeto se apresenta salteado de verdadeiros "Cavalos de Tróia", que ora se denominam ´interesse público´, ora ´bem público´, ora ´bem-estar social´.

Assim é o texto do artigo 164, § 26 em que se concedeu ao povo brasileiro o direito de greve, mas, logo a seguir, se lhe apôs um apêndice, em que esse direito sofre, por lei ordinária, as limitações impostas pelo ´bem público´.

(...)

Entendo que se passou de um pólo ao oposto, pois, se não se podia restringir o direito de greve por meio de limitação deixada a cargo e a critério do legislador comum, de mister é, por outro lado, que desta Assembléia saia esse direito já com as restrições que deve ter. Entre elas, considero a impossibilidade de assegurar-se o direito de greve aos empregados em serviços públicos e em serviços de utilidade pública. Parece-me que é bem razoável a exclusão dos serviços públicos em que o direito de greve não pode ser aceito.

(...)

O SR. OSVALDO PACHECO – V. Exª sabe quão doloroso é ao trabalhador entrar em greve. É difícil a vida dos grevistas, e os trabalhadores somente recorrem a esse meio quando já esgotaram todos os recursos suasórios. Só lhes resta, então, a grande arma que é a greve. Portanto, não é admissível que que se excluam desse dispositivo as empresas de serviços públicos, porque podem sofrer seus empregados as conseqüências da má administração.

O SR. ROMEU LOURENÇÃO – É admissível, porque a greve se justifica como direito de luta entre empregado e patrão, e nos serviços de utilidade pública, ela se volta não mais contra o patrão, mas contra a própria coletividade social. (...) A greve nos serviços públicos equivale a uma verdadeira rebelião; equivale à revolução.

(...)

O SR. NESTOR DUARTE – Se bem ouvi as palavras do orador, S. Exª restringe o direito de greve somente aos funcionários públicos.

O SR. ROMEU LOURENÇÃO – Serviços públicos e serviços de utilidade pública.

O SR. NESTOR DUARTE – Minha restrição é quanto aos funcionários públicos, porque aí não há relação entre patrão e empregado; onde houver essa relação é justo reconhecer-se ao empregado o direito de greve.

(...)

O SR. ROMEU LOURENÇÃO – A hipótese não equivale à relação ordinária entre patrão e empregado, porque quem estabelece o serviço público é a autoridade.

O SR. NESTOR DUARTE – Aí é a subversão dos próprios termos do problema justificando a greve.

(...)

O SR. ROMEU LOURENÇÃO – A greve reflete o conflito entre a luta do patrão pelo lucro e a luta do empregado pela vida, de que o Estado não participa porque não visa vantagens materiais no estabelecimento de seus serviços." NOGUEIRA. Octaciano. Doutrina Constitucional Brasileira (Constituição de 1946). Tomo I. Brasília: Senado Federal, 2006. p. 325-328.

07 BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. APELAÇAO CRIMINAL N. 1.557-SP. RELATOR: Min. Nelson Hungria. PLENARIO. DATA DE JULGAMENTO: 18.12.1957. FONTE: Ementário STF, Vol. 343-01, p.58.

08 SAAD. Eduardo Gabriel. Constituição e Direito do Trabalho. 2ª. Edição. São Paulo: LTr, 1989. P. 226.

09 Nesse sentido, a manifestação do Deputado Octávio Elísio na Sessão de 9.5.1987 bem demonstra o espírito subjacente à inserção do direito de greve dos servidores públicos na novel Carta Magna:

"Todos sabemos das dificuldades dos Estados. Os Governadores não saem de Brasília, buscando recursos para atender às despesas correntes inadiáveis, como pagamento de pessoal, além dos compromissos assumidos pela Administração passada.

(...)

Sabemos também que o trabalhador é a maior vítima da crise econômica que vivemos, onde a inflação corrói os salários e o intranqüiliza com o desemprego e a recessão.

O Ministério da Fazenda, Srs. Constituintes, enviou telex aos Estados dizendo que o ´gatilho´ não se aplica aos funcionários públicos. Ora, estes não estão imunes ao desgaste inflacionário de seus salários e têm direito ao reajuste que todo trabalhador conquistou.(...) Em Minas Gerais, os funcionários públicos e os professores estão em greve, como de resto vem acontecendo em quase todo o País. As reivindicações são justas. Reconhecemos as dificuldades financeiras de meu Estado, que não são diferentes das que vivem todos os Estados brasileiros.

(...)

Srs. Constituintes, é fundamental que essa greve, assim como a greve dos funcionários públicos e professores de todos os Estados já referidas aqui hoje pela manhã, encontrem uma solução. (...) É interesse de todos que se discuta e se encontre democraticamente uma solução para a greve." BRASIL: Assembléia Nacional Constituinte – Anais. Vol. IV. Brasília: Senado Federal, 1994. p. 1.791-1.792.

10 Em comentário contemporâneo aos primeiros anos de vigência da Constituição de 1988, José Afonso da Silva ressaltava tal posição, asseverando que " o texto constitucional não avançou senão timidamente, estabelecendo que o direito de greve será exercido nos termos e limites definidos em lei complementar, o que, na prática, é quase o mesmo que recusar o direito prometido; primeiro porque, se a lei não vier, o direito inexistirá; segundo porque, vindo, não há pariametro para o seu conteúdo, tanto pode ser mais aberta quanto mais restritiva." SILVA. José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 6ª Edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990. p. 583.

11 "Art. 5º. (...omissis...)

(...)

LXXI – conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania."

12 BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MANDADO DE INJUNÇAO No. 20/DF. RELATOR: Min. Celso de Mello. Plenário. DJ: 22.11.1996, p. 45.690.

13 Na seara federal, foi editado o Decreto nº 1.480, de 3.5.1995, cujos artigos 1º e 2º assim versam:

"Art. 1º Até que seja editada a lei complementar a que alude o art. 37, inciso VII, da Constituição, as faltas decorrentes de participação de servidor público federal, regido pela Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, em movimento de paralisação de serviços públicos não poderão, em nenhuma hipótese, ser objeto de:

I - abono;

II - compensação; ou

III - cômputo, para fins e contagem de tempo de serviço ou de qualquer vantagem que o tenha por base.

(...)

Art. 2º Serão imediatamente exonerados ou dispensados os ocupantes de cargos em comissão ou de funções gratificadas constantes da relação a que alude o artigo precedente."

14 BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AÇAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 1.696/SE. RELATOR: Min. Sepúlveda Pertence. Plenário. DJ: 14.6.2002, p. 126.

15 BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AÇAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE No 1.306/BA. RELATOR: Min. Octavio Gallotti. Plenário. DJ: 27.10.1995, p. 36.311.

16 BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MANDADO DE INJUNÇAO N. 485/MT. RELATOR: Min. Mauricio Corrêa. Plenário. DJ: 23.8.2002, p. 71.

17 BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MANDADO DE INJUNÇAO N. 689/PB. RELATOR: Min. Eros Roberto Grau. Plenário. DJ: 18.8.2006, p. 139-146.

18 Nesse diapasão, Amauri Mascaro Nascimento salienta que "a Constituição Federal de 1988 refletiu muito mais a aspiração dos sindicatos e menos as do empresariado e do governo, na medida em que (...) assimilou a idéia da greve como direito, cuja oportunidade e interesses a serem defendidos são definidos pelos próprios trabalhadores, e (...) incorporou a autorização da greve nas atividades essenciais, estabelecidas garantias destinadas a assegurar a manutenção dos serviços mínimos necessários para a comunidade. (...) Desse modo, o direito de greve ficaria assegurado de forma muito mais ampla, como regra geral. Avançaria no sentido do setor público, com exclusão dos militares." NASCIMENTO. Amauri Mascaro. Direito do Trabalho na Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 307.

19 A respeito da integração de normas lacunosas, Emilio Betti indaga se tal atividade "tem caráter de criação originária e independente, ou derivada, secundária e complementar, se ela é uma criação (nomogênese) livre e espontânea e, nesse sentido, arbitrária, ou se, ao contrario, é subordinada e vinculada à totalidade do sistema jurídico, enquanto concatenação orgânica de normas, bem como às exigências do ambiente social e das relações em questão." Em seguida, o autor italiano assinala que " elaborada desse modo, a questão deve ser resolvida no segundo sentido da alternativa: pois, mesmo onde serve para preencher deficiências de normas e esclarecer a máxima da decisão, a interpretação permanece sempre sujeita às avaliações imanentes e latentes na ordem jurídica, que se encontra enquadrada no ambiente histórico e sociológico em que vive."

Ainda nesse sentido, salienta Betti que " se, como atividade espiritual, ela tem caráter criativo, ou seja, inventivo, a sua natureza recognitiva logo permite compreender que não se trata de criação autônoma, originária e livre, mas de uma recriação subordinada, derivada, vinculada a uma objetividade (alteridade) irredutível: aquela do preceito a ser interpretado, enquadrado na ordem jurídica de que faz parte." BETTI. Emilio. Trad: JANNINI. Karina; CRIFO. Giuliano. Interpretação da Lei e dos Atos Jurídicos. São Paulo: Martins Fontes, 2007. P. 63-66.

20 DE LA CUEVA. Mario. El Nuevo Derecho Mexicano del Trabajo,Vol.II. 14ª Edición. México: 2006, p. 588.

21 AMORIM E SOUZA. Ronald. Greve & Locaute. Aspectos Jurídicos e Económicos. Coimbra: Almedina, 2004. P. 172.

22 CABALLERO. Pedro Gómez. Los Derechos Colectivos de los Funcionários. Madrid: Consejo Economico y Social, 1994. P. 309.

23 A nosso ver, a inexistência de previsão constitucional ou legal quanto à negociação coletiva não inviabiliza o exercício do direito à greve e à associação sindical no setor público, pois os movimentos deflagrados pelos funcionários estatais bem podem lograr suas finalidades por meios alheios àquela instância, conquanto lícitos e destituídos de abusividade.

Não podemos deixar de reconhecer, contudo, que a regulamentação da negociação coletiva no setor público conferiria, indubitavelmente, maior eficácia aos direitos assegurados nos incisos VI e VII, do art. 37 da Constituição Federal.

24MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 13ª Edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 76.

25Com efeito, reza o dispositivo em comento que compete aos Ministros de Estado, dentre outras atribuições, "expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos."

Em lição cristalina acerca do tema, Jorge Miranda pontifica que "o princípio da fixação da competência legislativa pela Constituição, conexo com o princípio da separação de órgãos constitucionais (...) significa (...) que as faculdades legislativas que cada órgão pode exercer são apenas as que constam de normas constitucionais e que, assim, faculdades não atribuídas a certo órgão não podem por este ser arrogadas em caso algum" e que " apenas pode haver autorizações ou delegações legislativas no âmbito das relações interorgânicas e nos termos expressamente previstos na Constituição."

Em razão disso, ainda segundo o referido autor lusitano, "não pode haver (...) regulamentos que assumiriam função de lei – que em vez de se dirigirem à <<boa execução das leis>> (...) fariam o mesmo que uma lei", pois, " é à lei – formal e material – que cabe, por exemplo, regular uma liberdade (...), ou considerar ilicito um comportamento das pessoas, ou cominar uma pena, ou criar um imposto, ou determinar uma forma de intervenção económica do Estado, ou estabelecer uma incompatibilidade dos titulares de cargos públicos. E perante a lei quaisquer intervenções – tenham conteúdo normativo ou não normativo – de órgãos administrativos ou jurisdicionais só podem dar-se a titulo seciundário, derivado ou executivo, nunca com critérios próprios ou autónomos de decisão." MIRANDA. Jorge. Manual de Direito Constitucional. Tomo V. Actividade Constitucional do Estado. 3ª Edição. Coimbra: Coimbra Editora, 2004. P. 203-221.

26 PESSOA. Robertônio dos Santos. Sindicalismo no Setor Público. São Paulo: Ltr, 1995. p. 46.

27 Mesmo porque o princípio da autonomia sindical assegurado no art. 8º, I, da Constituição Federal compreende, nas palavras de José Francisco Siqueira Nato, dentre outros aspectos, "a faculdade das organizações de determinar os seus órgãos e suas respectivas funções", cabendo, pois, ao Estado "a defesa das regras do jogo, e não do conteúdo das regras." SIQUEIRA NETO. José Francisco. Liberdade Sindical e Representação dos Trabalhadores nos Locais de Trabalho. São Paulo: Ltr, 2000. p.92.

28 A propósito, José Claudio de Brito Monteiro Filho assinala que a greve "poderia ser direito potestativo, se seu exercício se fizesse sem qualquer possibilidade de ação da outra parte ou de terceiros. Poderia ser um direito absoluto, se admitido como direito, mas, ao mesmo tempo, se pudesse ser exercitado sem limites ou condições. Em termos práticos, não é uma coisa nem outra, pois não pode ser admitido como tal em qualquer sistema jurídico, pela dimensão que se daria à greve, tornando-a um direito acima dos demais." Por tal razão, "a greve deve ser consideerada, dentro desta última hipótese que estamos analisando, como direito subjetivo, pertencente aos trabalhadores, individualmente, sendo exercitável de forma positiva (coletivamente) ou negativa. Isto porque, independentemente de aceitar ou não a greve e seus efeitos sobre o empregador e sobre terceiros (...) é forçoso reconhecer que, se o Direito a admite e a regula, condicionando-a, ela tem natureza de direito e de direito subjetivo, exercitável pelos seus titulares, dentro dos limites traçados." BRITO FILHO. José Claudio Monteiro de. Direito Sindical. São Paulo: Ltr, 2000. p. 309.

29 "Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:

(...)

III – ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas."

30 "CONSTITUCIONAL. TRABALHO. JUSTIÇA DO TRABALHO. COMPETÊNCIA. AÇÕES DOS SERVIDORES PUBLICOS ESTATUTARIOS. C.F., ARTS. 37, 39, 40, 41, 42 E 114. LEI N. 8.112, DE 1990, ART. 240, ALINEAS "D" E "E". I - SERVIDORES PUBLICOS ESTATUTARIOS: DIREITO A NEGOCIAÇÃO COLETIVA E A AÇÃO COLETIVA FRENTE A JUSTIÇA DO TRABALHO: INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 8.112/90, ART. 240, ALINEAS "D" E "E". II - SERVIDORES PUBLICOS ESTATUTARIOS: INCOMPETENCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA O JULGAMENTO DOS SEUS DISSIDIOS INDIVIDUAIS. INCONSTITUCIONALIDADE DA ALINEA "e" DO ART. 240 DA LEI 8.112/90. III - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE." BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 492/DF. RELATOR: Ministro Carlos Velloso. Plenário. DJ: 12.3.1993.

"Competência. Justiça do Trabalho. Incompetência reconhecida. Causas entre o Poder Público e seus servidores estatutários. Ações que não se reputam oriundas de relação de trabalho. Conceito estrito desta relação. Feitos da competência da Justiça Comum. Interpretação do art. 114, inc. I, da CF, introduzido pela EC 45/2004. Precedentes. Liminar deferida para excluir outra interpretação. (...)O disposto no art. 114, I, da Constituição da República, não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária." BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 3.395/DF. RELATOR: Min. Cezar Peluso. Plenário. DJ: 10.11.2006.

31 A propósito, Ghiorgio Ghezzi e Umberto Romagnoli assinalam que "a titularidade do direito de greve cabe, pelo menos em linha de princípio, ao trabalhador individualmente condiderado", ainda que "indubitavelmente e necessariamente, o exercício do direito em apreço seja coletivo, implicando a convergência de uma pluralidade de consensos tanto na deliberação quanto (ao menos potencialmente) na abstenção de prestrar trabalho em nome de um interesse comum." No original: "La titolarità del diritto di sciopero spetta, almeno in linea di principio, ai singoli lavoratori. Certo, di necesità, l´esercizio del diritto stesso è collettivo, implicando la confluenza di uma pluralità di sonsensi tanto nella deliberazione quanto (almeno potenzialmente) nell´astenzione dal lavoro per la tutela di un interesse comune." GHEZZI. Giorgio; ROMAGNOLI. Umberto. Il Diritto Sindacale. Quarta edizione. Bologna: Zanichelli, 1997. p. 200.

32 Nesse sentido, Canotilho assinala que "a especificidade (conteúdo, extensão e alcance) própria de cada princípio não exige o sacrifício unilateral de um princípio em relação aos outros, antes aponta para uma tarefa de harmonização, de forma a obter-se a máxima efectividade de todos eles." CANOTILHO. José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª Edição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 1.187.

33 Nesse particular, Cármen Lúcia Antunes Rocha reconhece a prevalência das seguintes noções em torno do regime jurídico dos servidores públicos:

"[a] de que o contrato reclama a manifestação de vontade sobre as condições básicas da obrigação nele contida, o que não se dá na espécie; [a] de que a relação entre a pessoa pública e o servidor é modificável em suas cláusulas legais pela exclusiva atuação estatal, o que distancia a figura contratual, [a] de que o regime jurídico que submete a relação é posta objetiva, genérica e abstratamente e o servidor subsume-se a ela e passa a vestir-se com o estatuto que precede e procede à sua presença nos quadros da Administração Pública." ROCHA. Cármen Lúcia Antunes. Princípios Constitucionais dos Servidores Públicos. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 119.

34 Pontes de Miranda assinala, a propósito, que "o elemento institucional é predominante, quase exclusivo, na relação entre o funcionário público e o Estado, e êsse elemento institucional afasta, por incompossibilidade de definição, qualquer assimilação de tal relação jurídica a quaisquer categorias de direito privado, como o mandato, a locação de serviços ou qualquer subsunção no que se chama contrato." MIRANDA. Francisco Cavalcante Pontes de. Comentários à Constituição de 1946. Vol. IV. Rio de Janeiro: Henrique Cahen Editor, 1947. p. 144.

35 SÁNCHEZ. Juan José Díez. El Derecho de Huelga de los Funcionarios Públicos. Madrid: Universidad de Alicante/Civitas, 1990. p. 142.

36 Com efeito, Arnaldo Süssekind assinala que "na suspensão do contrato de trabalho não ocorre a extinção contratual, mas (...) durante o respectivo período, nem o empregado presta serviços, nem o empregador lhe paga salários." SÜSSEKIND. Arnaldo et alii. Instituições de Direito do Trabalho, Vol. I. 21ª Edição. São Paulo: Ltr, 2003. p. 493.

37 "Lei num. 30/1984. Art. 12. Los funcionarios que ejerciten el derecho de huelga no detendrán ni perceberán las retribuciones correspondientes al tiempo en que se hayan permanecido en esa situación, sin que la dedución de haberes que se efectúe tenga, en ningún caso, caráter de sanción disciplinaria ni afecte al régimen respectivo de sus prestaciones sociales."

38 "Artículo 28.

(...)

2. Se reconoce el derecho a la huelga de los trabajadores para la defensa de sus intereses. La ley que regule el ejercicio de este derecho establecerá las garantías precisas para asegurar el mantenimiento de los servicios esenciales de la comunidad."

39 ESPAÑA. TRIBUNAL CONSTITUCIONAL. SENTENCIA Nº 90/1984. PONENTE: D. Francisco Pera Verdaguer. Boletín Oficial del Estado nº 261.

40 "Art. 44. O servidor perderá:

I – a remuneração dos dias em que faltar ao serviço, sem motivo justificado;

II – a parcela da remuneração diária, proporcional aos atrasos, ausências justificadas, ressalvadas as concessões de que trata o art. 97, e as saídas antecipadas, salvo na hipótese de compensação de horário, até o mês subseqüente ao da ocorrência, a ser estabelecida pela chefia imediata."

(...)

"Art. 117. Ao servidor é proibido:

I – ausentar-se do serviço durante o expediente, sem prévia autorização do chefe imediato."

41 SANTOS. Carlos Maximiliano Pereira dos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 8ª Edição. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1965. p. 222-224.

42 Note-se, a propósito, que a Convenção nº 151 da OIT, cuja ratificação entre nós encontra-se em vias de discussão, assevera em seu artigo 4º que "os empregados públicos gozarão de proteção adequada contra todo ato de discriminação sindical em relação com o seu emprego" e que "a referida proteção será exercida especialmente contra todo ato que tenha por objetivo (...) despedir um empregado público, ou prejudicá-lo de qualquer outra forma, devido à sua filiação a uma organização de empregados públicos ou de sua participação nas atividades normais de tal organização."

43 José Francisco Siqueira Neto conceitua os atos anti-sindicais como sendo aqueles que "prejudiquem indevidamente um titular de direitos sindicais no exercício da atividade sindical ou a causa desta, ou aqueles mediante os quais se lhes neguem, injustificadamente, as facilidades ou prerrogativas necessárias para o normal desempenho da ação coletiva." SIQUEIRA NETO. José Francisco. Liberdade Sindical e Representação dos Trabalhadores nos Locais de Trabalho. São Paulo: Ltr, 2000. p. 117-118.

44 Nesse sentido, Ivan Barbosa Rigolin, ao comentar as infrações previstas na Lei nº 8.112, deixa assente que "sendo dispositivos que restringem direitos, somente restritivamente podem ser lidos e aplicados, nos exatos termos da lei, sem a menor possibilidade de se sujeitar a interpretações ampliativas, analógicas, sistemáticas, teleológicas ou finalísticas, históricas, generalizantes ou difusas." RIGOLIN. Ivan Barbosa. Comentários ao Regime Único dos Servidores Públicos Civis. 5ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 270.

45 Tal possibilidade conferida à Justiça do Trabalho configura o Poder Normativo, conceituado por Ives Gandra Martins Filho como "o poder constitucionalmente conferido aos Tribunais Trabalhistas de dirimirem os conflitos coletivos de trabalho mediante o estabelecimento de novas e mais benéficas condições de trabalho, respeitadas as garantias mínimas já previstas em lei." Ainda segundo o referido autor, "as sentenças normativas prolatadas nos dissídios coletivos têm o caráter próprio de uma lei particular, aplicável a determinada categoria profissional numa dada base territorial [e] são fruto de juízo de eqüidade, onde o julgador (...) aplicará a norma que estabeleceria se fosse o legislador." MARTINS FILHO. Ives Gandra. Processo Coletivo do Trabalho. 3ª Edição. São Paulo: Ltr, 2003. p. 13-14.

46 Ives Gandra Martins Filho assinala, a propósito, que "a doutrina e a jurisprudência são unânimes em reconhecer a possibilidade do siddídio coletivo visando não à fixação de normas e condições de trabalho, mas à delimitação exata das já existentes, no sentido de interpretar as leis, acordos coletivos, convenções coletivas e sentenças normativas incidentes sobre as relações de trabalho de uma dada categoria." No que tange ao chamado "dissídio de greve", o autor em apreço salienta que em tais hipóteses "a empresa pede a declaração da abusividade da greve", tratando-se, "pois, de um dissídio de natureza jurídica, em que o tribunal, para declarar abusiva ou não a greve, apreciará os fatos à luz da lei de greve, verificando se os dispositivos legais foram devidamente observados para o exercício legítimo do direito de greve." Idem, p. 77-84.

47 BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MANDADO DE INJUNÇÃO Nº 708/DF. RELATOR: Min. Gilmar Mendes. Plenário. Acórdão Pendente de Publicação.

48 A respeito das normas de eficácia limitada, José Afonso da Silva as conceitua como sendo "aquelas que dependem de outras providências para que possam surtir os efeitos essenciais colimados pelo legislador constituinte" e as divide em dois tipos: as programáticas, que "envolvem um conteúdo social e objetivam a interferência do Estado na ordem econômico-social, mediante prestações positivas, a fim de propiciar a realização do bem comum, através da democracia social" e as de princípio institutivo, que configuram a hipótese ora estudada e que "têm conteúdo organizativo e regulativo de órgãos e entidades, respectivas atribuições e relações (...) [cuja] função primordial é a de esquematizar a organização, criação ou instituição dessas entidades ou órgãos." SILVA. José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 6ª Edição, 3ª Tiragem. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 118-125.

49 OFICINA INTERNACIONAL DEL TRABAJO. La Libertad Sindical. Recompilación de Decisiones y Princípios del Comité de Libertad Sindical del Consejo de Administración de la OIT. 5ª Edición. Ginebra: OIT, 2006. p. 132.

50 Nesse particular, Ana Maria Goffi Flaquer Scartezzini assinala que "a continuidade da prestação do serviço é um dever para o prestador do serviço e para os seus agentes" de modo que "se o serviço é essencial, necessário para a satisfação da dignidade humana, o trabalhador por ele responsável sofre limitações no exercício de seus direitos, pois a ele incumbe a satisfação e direitos próprios da coletividade e que devem ser resguardados." SCARTEZZINI. Ana Maria Goffi Flaquer. O Princípio da Continuidade do Serviço Público. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. P. 108-109.

51 Pois, afinal, conforme assevera Inocêncio Mártires Coelho, "as normas constitucionais devem ser vistas não como normas isoladas, mas como preceitos integrados num sistema unitário de regras e princípios, que é instituído na e pela própria constituição" de modo que "o aplicador das normas constitucionais, em se deparando com situações de concorrência entre bens constitucionalmente protegidos, [deve adotar] a solução que otimize a realização de todos eles, mas ao mesmo tempo não acarrete a negação de nenhum." COELHO. Inocêncio Mártires. Interpretação Constitucional. 2ª Edição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003. p. 130-131.

52 A redação casuística do art. 10 da Lei nº 7.783/89 é criticada veementemente por Ronald Amorim e Souza, ao afirmar que "o zelo do legislador, para prevenir os prejuízos que os usuários possam sofrer, como visto, ao estabelecer um elenco de serviços ou atividades, excedeu-se, injustificada e canhestramente", pois, "a fixação, pelo caminho da lei, das limitações resulta em que se vejam rapidamente ultrapassados os conceitos e permitem que surja, à margem do comando legal, outras que bem poderiam estar tratadas e não o são." AMORIM E SOUZA. Ronald. Greve & Locaute. Aspectos Jurídicos e Económicos. Coimbra: Almedina, 2004. p. 184.

53 SANCHEZ. Juan José Díez. El Derecho de Huelga de los Funcionarios Públicos. Madrid: Universidade de Alicante/Civitas, 1990. P. 109-111.

54 GUANTER. Salvador del Rey. Estado, Sindicatos y Relaciones Colectivas en La Función Pública. Madrid: Instituto Nacional de Administración Publica, 1986. p. 217.

55 O princípio da proporcionalidade divide-se em três subprincípios, a saber: princípio da conformidade ou adequação, a impor, nas palavras de Canotilho, que "a medida adoptada para a realização do interesse público deve ser apropriada à prossecução do fim ou dos fins a ele subjacentes"; princípio da necessidade, a propalar, segundo o referido jurista lusitano, "a idéia de que o cidadão tem direito à menor desvantagem possível", exigindo-se, pois, "sempre a prova de que, para a obtenção de determinados fins, não era possível adoptar outro meio menos oneroso para o cidadão." e princípio da proporcionalidade em sentido estrito, a verificar se "o meio utilizado é ou não desproporcionado em relação ao fim" perseguido por uma determinada norma ou ato restritivos. CANOTILHO. José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª Edição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 269-270.

56 Não por outra razão, Juan José Díez Sánchez afirma: "Qué servicios deben considerarse mínimos y con que critérios han de determinarse, no puede decirse aprioristicamente y menos con carácter general. No solo porque no existen normas que así lo dispongan sino porque esa circunstancia dependerá del servicio esencial de que se trate y de la función que el mismo ejerza respecto a los bienes constitucionales a los que puede afectar.

Su concreta determinación, pues, requerirá ponderar cuáles son los médios que se juzga necesarios e imprescindibles para, al próprio tiempo, respetar el derecho de huelga y garantizar los derechos y bienes constitucionales. Para realizar ese juicio de adecuación, habrá de partirse de la premisa de que la limitación del derecho de huelga debe ser la menos gravosa de las posibles al tratarse de un derecho fundamental." SANCHEZ. Juan José Díez. El Derecho de Huelga de los Funcionarios Públicos. Madrid: Universidade de Alicante/Civitas, 1990. p. 113.

57 OFICINA INTERNACIONAL DEL TRABAJO. La Libertad Sindical. Recompilación de Decisiones y Princípios del Comité de Libertad Sindical del Consejo de Administración de la OIT. 5ª Edición. Ginebra: OIT, 2006. p. 124.

58 Idem.

59 Idem.

60 DE PLACIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico, Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 1963. P. 199.

61 LOEWENSTEIN. Karl. Trad: ANABITARTE. Alfredo Gallego. Teoria de la Constitución. 2ª Edición. Barcelona: Ariel, 1976. P. 26-27.

62 Em complemento a esta passagem, Loewenstein esclarece que " en el Estado moderno, constitucional y democrático, la esencia del proceso de poder consiste en el intento de establecer un equilíbrio entre las diletas fuerzas pluralistas que se encuentran compitiendo dentro de la sociedad estatal, siendo garantizada la debida esfera para el libre desarrollo de la personalidad humana." Idem. p. 27.

63 A propósito, Ruy Cirne Lima classifica o poder de policia como a função titularizada pela Administração com vistas a "criar as condições gerais indispensáveis, para que os indivíduos, em ordem e harmonia, logrem conduzir, através do convívio quotidiano o desenvolvimento de suas relações sociais, independentemente de coação em cada caso concreto." LIMA. Ruy Cirne. Princípios de Direito Administrativo. 7a Edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2007. P. 304.

64 " 579. La prohibición de la huelga a los trabajadores en el servicio de aduanas, que pueden ser condiderados como funcionarios públicos que ejercen funciones de autoridad en nombre del Estado, no es contraria a los principios de la libertad sindical."

65 "626. La decisión adoptada por un Gobierno a los efectos de imponer un servicio mínimo em la División de Sanidad Animal ante el brote de una enfermidad altamente contagiosa, no viola los principios de la libertad sindical."

66 " 622. En los servicios de correos puede preverse el mantenimiento de un servicio mínimo."

67 "617. El respecto de la obligación de mantener un servicio mínimo de las actividades del metro para satisfacer las necesidades mínimas de la colectividad local no es contrario a los principios de la libertad sindical."

"618. Es legítimo el establecimiento de un servicio mínimo emncaso de huelga en el sector de transporte ferroviario."

68 "585. Pueden ser considerados como servicios esenciales:

- el sector hospitalario;

(...)

- la policia y las fuerzas armadas;

- los servicios de bomberos;

- los servicios penitenciarios públicos o privados;

- el suminiestro de alimentos a los alumnos em edad escolar y la limpieza de los establecimientos escolares;

- el control de trafico aereo."

"586. El principio segun el cual el control del tráfico aereo puede considerarse como un servicio esencial se aplica a todas las huelgas, cualquiera que sea su forma (...) dado que éstas pueden ser tan peligrosas como uma huelga tradicional para la vida, la seguridad personal o la salud de la totalidad o parte de la población."

69 "589. Si bien el sector de la educación no constituye un servicio esencial el derecho de huelga de los directores y los subdirectores puede ser objecto de restricciones o incluso ser prohibido."

70 "587. No constituyen servicios esenciales em el sentido estricto del término:

- la radio-televisión;

(...)

- los servicios de informática para la recaudación de aranceles e impuestos;

(...)

- la Casa de la Moneda;

- la Agencia Gráfica del Estado y los monopolios estatales del alcohol, de la sal y del tabaco."

71 "589. Los argumentos que se han esgrimido de que tradicionalmente los funcionarios públicos no gozan del derecho de huelga porque el Estado, em su calidad de empleador, tiene mayores obligaciones respecto de su protección, no han convencido al Comité de que debe cambiar de actitud com respecto al derecho de huelga del personal docente."

"590. Las posibles consecuencias a largo plazo de las huelgas em el sector de la enseñanza no justifican su prohibición."

72 OFICINA INTERNACIONAL DEL TRABAJO. La Libertad Sindical. Recompilación de Decisiones y Princípios del Comité de Libertad Sindical del Consejo de Administración de la OIT. 5ª Edición. Ginebra: OIT, 2006. p. 129.

73 Veja-se, nesse sentido, o teor da Sentencia nº 27/1989, do Tribunal Constitucional da Espanha:

"La consideración de un servicio como esencial no puede suponer la supresión del derecho de huelga de los trabajadores que hubieran de prestarlo, sino la necesidad de disponer las medidas precisas para su mantenimiento, o dicho de otra forma, para asegurar la prestación de los trabajos que sean necesarios para la cobertura mínima de los derechos, libertades o bienes que satisface dicho servicio, sin que ello exija alcanzar el nivel de rendimiento habitual ni asegurar su funcionamiento normal, sin que la clase y numero de trabajos que hayan de realizarse para cubrir la exigencia y, en definitiva, el tipo de garantías que hayan de disponerse com esse fin puedan ser determinadas de manera apriorística, sino tras una ponderación y valoración de los bienes o derechos afectados, del ámbito personal, funcional o territorial de la huelga, de la duración y demás características de esa medida de presión y, en fin, de las restantes circunstancias que concurran en su ejercicio y que puedan ser de relevancia para alcanzar el equilíbrio más ponderado entre el derecho de huelga y aquellos otros bienes, sin olvidar la oferta de preservación o mantenimiento de servicios que realicen los sujetos convocantes o los trabajadores afectados." ESPAÑA: TRIBUNAL CONSTITUCIONAL. SENTENCIA Nº 27/1989. PONENTE: D. Angel Latorre Segura. Boletín Oficial del Estado de 3.2.1989.

74 ZAGREBELSKY. Gustavo. Trad: GASCÓN. Marina. El Derecho Dúctil. Ley, Derechos, Justicia. Sexta Edición. Madrid: Editorial Trotta, 2005. p. 110-122.

75 A propósito, Jesús Gonzáles Pérez assinala que "la buena fe incorpora el valor ético de la confianza. Confianza en la forma de actuación que cabe esperar de la persona com que nos relacionamos. En el ámbito de las relaciones jurídico-administrativas la actuación que cabe esperar de una Administración pública respecto de otra o respecto del administrado, o el administrado de la Administración Pública." Ainda nesse sentido, o referiodo autor espanhol salienta que "dicha confianza se basa em signos o hechos externos producidos por la Administración lo suficientemente concluyentes, para que induzcan racionalmente a aquél a confiar en la ´aparencia de legalidad´ de una actuación administrativa concreta." PÉREZ. Jésus Gonzáles. El Principio General de la Buena Fe em el Derecho Administrativo. 4ª Edición. Madrid: Thomson-Civitas, 2004. p. 67-71.

76 Nesse sentido, Ronald de Amorim e Souza conceitua o lockout como a "supressão do trabalho, por ato exclusivo da entidade patronal, com o objetivo de frustrar uma greve, quando esta se prenuncie ou instale, ou como retaliação à greve encerrada, sempre com o objetivo de exercer pressão sobre os trabalhadores para preservar ou melhorar o nível de comprometimento na execução das regras de convenção coletiva de trabalho." Ainda segundo o autor, "num exame a partir dos efeitos pretendidos, o locaute é, em verdade, um meio de pressão de que se vale o empresário para compelir os empregados à concordância com os termos e condições do contrato (via convenção coletiva), por ele ditadas." AMORIM E SOUZA. Ronald. Greve & Locaute. Aspectos Jurídicos e Económicos. Coimbra: Almedina, 2004. p. 227.

77 "Art. 2º Os crimes definidos nesta lei, ainda quando simplesmente tentados, são passíveis da pena de perda do cargo, com inabilitação, até cinco anos, para o exercício de qualquer função pública, imposta pelo Senado Federal nos processos contra o Presidente da República ou Ministros de Estado, contra os Ministros do Supremo Tribunal Federal ou contra o Procurador Geral da República."

(...)

"Art. 7º São crimes de responsabilidade contra o livre exercício dos direitos políticos, individuais e sociais

(...)

5 - servir-se das autoridades sob sua subordinação imediata para praticar abuso do poder, ou tolerar que essas autoridades o pratiquem sem repressão sua."

(...)

"Art. 9º São crimes de responsabilidade contra a probidade na administração:

(...)

4 - expedir ordens ou fazer requisição de forma contrária às disposições expressas da Constituição."


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

EBERT, Paulo Roberto Lemgruber. O novo perfil da greve de servidores públicos. Análise da Lei nº 7.783/89 à luz dos acórdãos proferidos pelo STF no julgamento dos Mandados de Injunção nº 670/ES, 708/DF e 712/PA. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1722, 19 mar. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11066. Acesso em: 25 abr. 2024.