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A reforma tributária

A reforma tributária

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A verdadeira reforma tributária seria aquela que implicasse redução da carga tributária. Melhorar a técnica de arrecadação sem reduzir a carga, não é suficiente. E a carga tributária só cairá, com a diminuição da carga burocrática que, infelizmente, no governo Lula, tem crescido, assustadoramente, sem contrapartida em serviços públicos correspondentes.

O governo, todavia, apresentou seu projeto de reforma tributária, em que se incluem a eliminação do salário-educação, redução da contribuição previdenciária, no tempo, sobre a mão de obra; inclusão, num único tributo (IVA), de PIS, COFINS e CIDES; partilha de quase todos os tributos federais, assim como a redução do número de alíquotas; e adoção do princípio de destino, para o ICMS.

A desoneração da folha salarial é uma boa sinalização, se não ocorrer a transferência da imposição para outros tributos de forma mais elevada. É que, sempre que o governo adota uma técnica de tributação nova, eleva as alíquotas acima do recomendável, para precaver-se contra possíveis e eventuais dificuldades, na implantação do novo sistema. É a denominada "calibragem de conforto", que elevou, por exemplo, a arrecadação do PIS e da COFINS em 50%, ao ser implantada a técnica não cumulativa. Infelizmente, a calibragem de conforto termina se perpetuando, ainda quando não se verificam as perdas previstas.

Por outro lado, a União detém, hoje, em torno de 60% do bolo tributário. Se tiver que partilhar quase todos os tributos com Estados e Municípios, não podendo abrir mão da receita atual, à evidência, os tributos federais embutirão um aumento da carga, compensatório do que irá perder. E, certamente, adotará –o que é uma tradição nas alterações tributárias- a "calibragem de conforto" na fixação das novas alíquotas.

O problema maior, todavia, reside no ICMS. A adoção do regime de destino, implicará perdas para os "Estados exportadores líquidos" e ganhos para os "Estados importadores líquidos", isto é, perda para os Estados que vendem mais do que compram de outros Estados e ganho para os Estados que compram mais do que vendem.

Certamente, os Estados que vão ganhar não reduzirão o peso dos tributos e os Estados que irão perder terão que aumentar o peso tributário, com o que, necessariamente, a mudança de critério implicará aumento de imposição. A criação de um "fundo de equalização", como pretendido pelo governo federal, para compensar os que vierem a sofrer perdas, demandará recursos, o que sinaliza, também, aumento da carga fiscal.

Para evitar 27 fiscalizações estaduais sobre as empresas "exportadoras", o governo propõe uma alíquota compensatória na origem de 2%. Na proposta anterior era de 4%. Creio que o justo seria elevar a alíquota para o Estado de origem.

A meu ver, uma sistemática razoável para o ICMS seria a seguinte: vedação a qualquer incentivo fiscal, no que concerne a este tributo, e adoção do sistema misto, que existe hoje, porém com um menor número de alíquotas, que seriam idênticas para todas as operações interestaduais. Eliminando o estímulo fiscal e as alíquotas diferenciadas, eliminar-se-ia a guerra fiscal. No modelo que proponho, até mesmo os estímulos de natureza financeira seriam proibidos, desde que os financiamentos concedidos pelos Estados aos contribuintes estivessem vinculados aos valores componentes do ICMS.

Tenho muito receio de que, apesar de serem boas algumas medidas constantes da reforma, tenhamos um considerável aumento da carga tributária e um acréscimo burocrático para as empresas, que hoje já dedicam aproximadamente 2.600 horas, em média, por ano, para atender compromissos fiscais. Na Alemanha, são necessárias apenas 105 e, na Irlanda, 76, segundo levantamento do Banco Mundial e da Price Coopers abrangendo 175 países.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINS, Ives Gandra da Silva. A reforma tributária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1725, 22 mar. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11075. Acesso em: 18 abr. 2024.