Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/11911
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

PIS, COFINS e permuta de participações societárias

PIS, COFINS e permuta de participações societárias

Publicado em . Elaborado em .

Recentemente analisamos a questão da incidência ou não do imposto de renda sobre a permuta de participações societárias [01]. Naquela oportunidade, concluímos que a mera troca de um bem pelo outro, independentemente da equivalência de valor entre estes, não é suficiente para o lançamento do IRPF e do IRPJ, pois traz apenas um potencial acréscimo patrimonial, o que poderá ocorrer somente quando o contribuinte vender o bem recebido em permuta.

Diferente não o entendimento em relação à impossibilidade de tributação, pelo PIS e COFINS, da permuta de participações societárias, conforme demonstraremos no presente estudo.

Cabe lembrar, inicialmente, que a Solução de Consulta nº 6/03, da Superintendência Regional da Receita Federal da 1ª Região Fiscal, entendeu que a permuta equipara-se a uma operação de compra e venda, estando a receita advinda da operação sujeita ao PIS e COFINS, senão vejamos:

"Processo de Consulta nº 6/03

Superintendência Regional da Receita Federal - SRRF / 1ª Região Fiscal

Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep

Ementa: PERMUTA. INCIDÊNCIA. A permuta equipara-se a uma operação de compra e venda, estando a receita decorrente de tal operação sujeita à incidência do PIS, uma vez que a base de cálculo dessa contribuição é o faturamento, entendido como a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica.

DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 9.718, de 1998, arts. 2º e 3º; Lei 5.172 (CTN), de 1966, art. 109; Lei nº 556 (Código Comercial), de 1950, art. 221; Código Civil, Lei nº 10.406 (Código Civil), de 2002, art. 533.

Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins PERMUTA. INCIDÊNCIA. A permuta equipara-se a uma operação de compra e venda, estando a receita decorrente de tal operação sujeita à incidência da COFINS, uma vez que a base de cálculo dessa contribuição é o faturamento, entendido como a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica.

DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 9.718, de 1998, arts. 2º e 3º; Lei 5.172 (CTN), de 1966, art. 109; Lei nº 556 (Código Comercial), de 1950, art. 221; Código Civil, Lei nº 10.406 (Código Civil), de 2002, art. 533." (Data da Decisão: 27.2.2003, DOU 17.04.2003).

Vê-se que, segundo o entendimento das autoridades federais, a permuta equipar-se à compra e venda. Em sendo esta assertiva realmente verdadeira [02], a isenção de PIS e COFINS na venda de bens do ativo permanente [03] seria também aplicável à permuta desses bens, motivo pelo qual a Solução de Consulta nº 6/03 simplesmente não se sustentaria, pois as participações permanentes em outras sociedades são classificadas no subgrupo de "Investimentos" que faz parte do grupo "Ativo Permanente" [04].

Admitindo-se, no entanto, que a permuta de participações societárias não se equipara à compra e venda, ainda assim não haveria a sua tributação pela inexistência de receita a ser tributada, já que as partes envolvidas simplesmente substituiriam em seus ativos permanentes as participações societárias, mantendo o valor originalmente contabilizado, sem o trânsito de qualquer quantia pelas contas de resultado. Havendo torna, todavia, reconhecemos existir a incidência de PIS e COFINS sobre referido montante.

Visando solidificar o entendimento acima esposado, é mister analisarmos o conceito de receita para se determinar a incidência ou não de PIS e COFINS sobre a permuta de participações societárias.

Solon Sehn [05], após transcorrer a respeito de várias definições de receita elaboradas por diversos juristas [06], concluiu que a receita pressupõe a ocorrência de um ato ou fato jurídico de alteração do patrimônio líquido ou uma entrada que se incorpora ao patrimônio daquele que a aufere, como elemento novo, diferentemente do mero ingresso que reflete apenas um fluxo neutro de recursos financeiros.

O IBRACON, em antigo procedimento, também afirmou que:

"Receita corresponde a acréscimos nos ativos e decréscimos nos passivos, reconhecidos e medidos em conformidade com princípios de contabilidade geralmente aceitos, resultantes dos diversos tipos de atividades e que possam alterar o patrimônio líquido.

Acréscimos nos ativos e decréscimos nos passivos, designados como receita, são relativos e eventos que alteram bens, direitos e obrigações. Receita, entretanto, não inclui todos os acréscimos nos ativos ou decréscimos nos passivos. Recebimento de numerários por venda a dinheiro é receita, porque o resultado líquido da venda implica em alteração do patrimônio líquido. Por outro lado, o recebimento de numerário por empréstimo tomado ou o valor de um ativo comprado a dinheiro não são receita, porque não alteram o patrimônio líquido." [07]

José Antonio Minatel é categórico ao afirmar que:

"... não pode ser qualificado como receita o ingresso que não revela qualquer contraprestação por exercício de atividade, nem mesmo remuneração em negócio jurídico que possa indicar cessão temporária e onerosa de direitos, além de faltar o ânimus para obtenção de disponibilidade de nova riqueza." [08]

Para o desembargador federal Leandro Paulsen, "... nem tudo o que contabilmente é considerado receita pode sê-lo para fins de tributação. Isso porque a receita, na norma concessiva de competência tributária, denota uma revelação de riqueza..." [09]

Marcelo Knopfelmacher, ao estudar o conceito de receita na Constituição, diz claramente que "... da análise do conteúdo semântico mínimo do termo ‘receita’, pressuposto pela Constituição Federal, lançamos novamente o conceito que conseguimos extrair do texto constitucional: ingresso (novo) de valores que se incorporam positivamente ao patrimônio." [10]

O art. 279 do RIR/99, por sua vez, define que "a receita bruta das vendas e serviços compreende o produto da venda de bens nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado auferido nas operações de conta alheia".

No Dicionário de Termos Contábeis (São Paulo: Ed. Atlas, 1999), de autoria dos Professores Sérgio de Iudicíbus, José Carlos Marion e Elias Pereira, "RECEITA" tem a seguinte definição: "(1) representa a entrada de ativos, sob forma de dinheiro ou direitos a receber, correspondentes, normalmente, à venda de mercadorias, de produtos ou à prestação de serviços... (2) receita de uma empresa durante um período de tempo representa uma mensuração do valor de troca dos produtos (bens e serviços) de uma empresa durante aquele período. (3)... (4) expressão monetária conferida pelo mercado à produção de bens e serviços da entidade, em sentido amplo, em determinado período.... "

Em ambas os conceitos, portanto, a definição de receita está intrinsecamente relacionada à venda de bens e serviços que, via de regra, constitui-se no objeto da maioria das empresas contribuintes. Obviamente, não podemos esquecer que existem outras receitas, sejam operacionais ou não, que não estão diretamente ligadas à atividade da empresa, o que não é o caso em exame, por exemplo: das receitas financeiras, das variações cambiais, dos ganhos de capital, etc.

Na permuta de participações societárias, no entanto, onde existe uma simples substituição de um ativo permanente por outro, sem qualquer ocorrência de "incremento no patrimônio" ou de "alteração do patrimônio líquido" da empresa, mas revelando apenas um "fluxo neutro de recurso financeiros", as partes envolvidas não auferem receita na melhor acepção da palavra.

Observa-se, portanto, que existem sólidos argumentos para sustentar a inexistência de receita na permuta de participações societárias, não havendo que se falar na incidência de PIS e COFINS sobre ditas operações.


Notas

  1. IRPF, IRPJ e Permuta de Participações Societárias. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/11863> e <http://www.apet.org.br/artigos/ver.asp?art_id=678>.
  2. Não analisaremos a questão da equiparação da permuta à compra e venda neste trabalho, malgrado existirem opiniões em sentido contrário [cf. Solon Sehn. "O Conceito de Receita no Direito Privado e suas Implicações no Direito Tributário (PIS-Cofins, IRPJ, Simples)". Revista Dialética de Direito Tributário nº 127, p. 105].
  3. Lei nº 9.718/98, artigo 3º, § 2º, IV; e Lei nº 10.833/03, artigo 1º, § 3º, II, e artigo 15, II.
  4. Cf. Sérgio de Iudícibus, Eliseu Martins e Ernesto Rubens Gelbcke. Manual de contabilidade das sociedades por ações (aplicável às demais sociedades)/FIPECAFI. 5ª Ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 130.
  5. Op. cit., p. 99.
  6. "Nessa mesma linha, aliás, tem se colocado praticamente toda a doutrina dedicada ao estudo do tema, considerando receita apenas ‘(...) a entrada que, sem quaisquer reservas, condições ou correspondência no passivo, se integra ao patrimônio da empresa, acrescendo-o, incrementando-o’ (Aires F. Barreto); ‘um ‘plus jurídico’ (acréscimo de direito), de qualquer natureza e de qualquer origem, que se agrega ao patrimônio como um elemento positivo, e que não acarreta para o seu adquirente qualquer nova obrigação’ (Ricardo Mariz de Oliveira); o ‘incremento do patrimônio’ (Aliomar Baleeiro); o ‘elemento positivo do acréscimo patrimonial’ (Gisele Lemke); ‘a entrada de riqueza nova no patrimônio da pessoa jurídica’ (Hugo de Brito Machado e Hugo de Brito Machado Segundo); as ‘quantias que a empresa recebe não para si’ (Hamilton Dias de Souza, Luiz Mélega e Ruy Barbosa Nogueira), que ‘possam alterar o patrimônio líquido’ (José Eduardo Soares de Melo); a entrada ‘de cunho patrimonial’ (Marco Aurélio Greco), que ‘têm o condão de incrementar o patrimônio’ (Alexandre Barros Castro)." (Op. cit. p. 98-99).
  7. Princípios contábeis: normas e procedimentos de auditoria. São Paulo: Atlas, 1988, p. 122.
  8. Conceito de Receita e Regimes de Apuração da COFINS. Porto Alegre: TRF – 4ª Região, 2006 – Currículo Permanente. Caderno de Direito Tributário: módulo 1, p. 19 – grifos do autor.
  9. Agravo de Instrumento nº 2006.04.00.014611-2/RS – grifamos.
  10. O conceito de receita na Constituição: método para sai tributação sistêmica. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 102.

Autor

  • Gilberto de Castro Moreira Junior

    Gilberto de Castro Moreira Junior

    Doutor em Direito Tributário pela USP. Professor de Direito Tributário. Advogado em São Paulo (SP). Autor do livro "Bitributação Internacional e Elementos de Conexão" (Aduaneiras, 2003). Coordenador do livro "Direito Tributário Internacional" (MP Editora, 2006). Co-autor de livros e autor de artigos em revistas especializadas e periódicos. Membro do Comitê Científico da Associação Paulista de Estudos Tributários - APET. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário - IBDT. Membro do Instituto de Direito do Comércio Internacional e Desenvolvimento - IDCID. Membro Examinador do Exame de Ordem e do Tribunal de Ética (OAB-SP). Diretor da Ernst & Young.

    Textos publicados pelo autor

    Fale com o autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOREIRA JUNIOR, Gilberto de Castro. PIS, COFINS e permuta de participações societárias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1948, 31 out. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11911. Acesso em: 26 abr. 2024.