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A concepção constitucional do consumidor e sua relevância

A concepção constitucional do consumidor e sua relevância

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A inclusão da matéria consumerista, ou melhor, a promoção constitucional da pessoa e da coletividade consumidora, na Constituição da República de 1988, é plenamente justificável e pode ser associada a um certo número de causas.

1. A Constituição de 1988 e a defesa do consumidor

Dentro da plêiade de matérias que, pela via formal, acabaram por adquirir a qualidade de norma ou preceito constitucional, muito se destaca a defesa e a proteção do consumidor, que acabou sendo incorporado ao texto de algumas das constituições modernas, tais como a Constituição de Portugal, a Constituição de Espanha, e, posteriormente, pela própria Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 [01].

Garantir a defesa e a proteção do consumidor, implicando no amparo, em sentido lato, à sua pessoa, patrimônio e pretensões, de forma individual e coletiva, não pode ser considerada a matéria base de uma Carta Constitucional [02].

Entretanto, a inclusão da matéria consumerista, ou melhor, a promoção constitucional da pessoa e da coletividade consumidora, na Constituição da República de 1988, é plenamente justificável e pode ser associada, em maior ou menor grau, a um certo número de causas.

No Brasil, que mal acabava de sair de um regime político autoritário e repressivo, de natureza ditatorial-militar, a inclusão pode ser considerada o resultado histórico, em seu campo específico, de uma contraposição e de uma ruptura muito maior, ocorrida nas esferas política, cultural, social e econômica [03]. Em verdade, o que se apresenta é uma substancial rejeição à ordem recém superada, no sentido de se restaurar ou de se restabelecer o Estado Democrático de Direito, as liberdades públicas, as garantias individuais, o exercício efetivo da cidadania e o respeito à dignidade da pessoa humana.

Sem esquecer momentos normativos específicos, que serão tratados nos itens posteriores, a citada ruptura pode ser identificada logo no primeiro artigo da Constituição de 1988. Tal qual uma ouverture, no qual se definem os temas que serão, no decorrer da obra, individualmente desenvolvidos, tal dispositivo já dispõe, de forma absolutamente expressa, que a República Federativa do Brasil tem como fundamentos à soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho, da livre iniciativa e do pluralismo político [04].

Diante dessa afirmativa categórica, tudo indica que o temor do recente passado, de mais de vinte anos de marginalização social, aliado às incertezas do futuro, ainda de difícil vislumbre, conduziram o Poder Constituinte, nos anos de 1987 e 1988, ao fito de produzir segurança jurídica indispensável à busca do bem comum [05], à normatização de linhas mestras, de conteúdo dirigente e compromissário [06], como se fossem objetivos ou metas que ao Estado compete concretizar [07].

Tendo em vista os alicerces explicitados pela Carta Política, não é de se estranhar, e é até compreensível, a inclusão da defesa do consumidor entre os preceitos constitucionais, sobretudo levando em consideração a enorme implicação que a matéria tem na efetiva concretização daqueles mesmos fundamentos. Basta lembrar o custo social altíssimo que subsidiou o grande desenvolvimento da produção e da economia brasileira após o golpe militar de 1964 [08], e em praticamente em todo o decorrer das décadas de 70 e 80, período denominado milagre brasileiro, que ocasionou conseqüências tão funestas, mas tão funestas, em todos os setores, que seus efeitos são experimentados até o presente.

Não obstante, parece haver uma certa tendência, em países que passaram por situações políticas, sociais e econômicas análogas às do Brasil, guardadas, por óbvio, as devidas proporções, em se incluir a defesa e a proteção do consumidor entre os temas constitucionais, na qualidade de incumbências prioritárias do Estado. É o caso, por exemplo, de Portugal e Espanha, que após as respectivas aberturas democráticas, ocorridas na década de 70 [09], promoveram a defesa e a proteção do consumidor ao patamar constitucional, na qualidade de princípio vetor da política social e econômica, o que muito coincide com o sistema adotado pela Constituição de 1988 [10] [11].

Sem descuidar da importância desse dado histórico particular, é de se acrescentar que a questão da defesa e da proteção do consumidor assume um aspecto muito maior, de caráter mundial. Destarte, apesar da fixação constitucional da matéria não poder ser considerada uma regra geral, muito pelo contrário, no mais das vezes é exceção [12], o tema foi de absorção quase que obrigatória pela maioria dos grandes sistemas jurídicos, vez que os problemas sociais, econômicos e jurídicos, ocasionados pelo surgimento da produção em massa, e do consumo em larga escala, podem ser considerados de abrangência global.

Ao que tudo indica, a inclusão é o resultado identificável de uma nova ideologia [13], que ambiciona uma maior participação do Estado nas relações privadas, visto que esse não pode assistir impassível, como o neutro espectador de outrora, a existência de uma irreal e superada igualdade formal, que, em verdade, mais desiguala, acabando por laborar em favor dos detentores do poder, em todas as suas manifestações.

Com o surgimento da ideologia e da doutrina liberalista, e a posterior construção do Estado Liberal, no final século XVIII e começo do século XIX, paulatinamente adotado por diversos países de cultura ocidental, inclusive nominalmente pelo Brasil [14], há uma clara modificação de padrões.

Nesse passo, embora o liberalismo tenha aparecido inicialmente como uma doutrina política, que buscava a liberdade do indivíduo em face do Estado, de modo que esse absorvesse o policiamento social como única tarefa, sua influência se irradiou para diversas áreas.

Desta forma, além do surgimento do liberalismo econômico, que buscava, através de leis econômicas, a condução do equilíbrio, surge também, e indispensavelmente, o liberalismo jurídico, pelo qual passa o direito a normatizar essa realidade econômica e política, de forma a lhe dar uma estrutura de sustentação.

Dessas mudanças pode-se sublinhar: a) na área política, a limitação do poder estatal; b) na área econômica, a defesa da livre iniciativa, da livre concorrência e da auto-regulamentação do mercado; c) na área jurídica, a valorização da propriedade privada, a autonomia da vontade, o consensualismo, a igualdade formal e a absoluta obrigatoriedade contratual [15].

No entanto, com o advento da Revolução Industrial, e das enormes modificações sociais, culturais, econômicas e políticas que se desenvolveram durante os dois séculos seguintes, restou claro que o velho ideal liberalista, que pode ser sintetizado pela expressão laissez-faire, acabou fracassando.

Para que se tenha uma idéia do desenvolvimento que se seguiu a esse movimento, vale destacar as seguintes mudanças que surgiram e se desenvolveram desde então: a) a criação de produtos em série; b) o trabalho assalariado em larga escala; c) a formação de grandes centro urbanos; d) a constituição de grandes grupos econômicos; e) o nascimento da publicidade e da propaganda; f) o impensável crescimento e aperfeiçoamento da tecnologia; g) o aparecimento da sociedade de consumo [16].

Tal fato obrigou uma crescente intervenção do Estado em todos os setores, principalmente na economia e no direito, a fim de equilibrar relações entre consumidores e fornecedores, que já não poderiam ser corretamente regulamentadas pelo sistema anterior [17].

Assim, a realidade dos fatos deixou claro que o consumidor, individual ou coletivamente considerado, na qualidade de real participante do processo produtivo [18], não poderia ficar à mercê dos grupos fornecedores de bens e de serviços, cada vez mais fortalecidos e agressivos, dentro da atual estágio de desenvolvimento da economia capitalista.

A inclusão desta matéria no plano constitucional, conforme afirma Reich, coaduna-se com a função do Estado em intervir em situações de desigualdade e desequilíbrio social, que não poderiam ser satisfatoriamente tratadas ou corrigidas com o uso de instrumentos meramente políticos ou econômicos [19]. Segundo esse autor, poder-se-ia afirmar, avançando na proposição, que o tratamento constitucional dos direitos dos consumidores, seria mesmo uma conseqüência do próprio Estado de Direito, revelando incessante reivindicação do reconhecimento da existência de uma real igualdade e participação social equivalente para todos os cidadãos [20].

Nesse sentido, é patente a intenção constitucional de defender e proteger a pessoa na área consumerista, e isso através de uma adequação dos interesses de crescimento do capital, mormente o industrial e o empresarial, com a necessidade de se proporcionar formas dignas e condignas de sobrevivência para os indivíduos.


2. A defesa do consumidor na Constituição Federal

Como se pôde averiguar, a inserção da matéria consumerista, em sede constitucional, é inteiramente compreensível, principalmente em face das grandes mudanças sociais e econômicas havidas no decorrer dos séculos XIX e XX, que então clamavam, e ainda clamam, em pleno curso da transmodernidade [21], por uma maior proteção e defesa do consumidor.

Ultrapassado este ponto, necessário realizar uma análise dos principais momentos normativos de regulamentação constitucional da matéria consumerista.

a) Garantia individual e coletiva

A Constituição Federal de 1988 realizou a inserção constitucional da defesa do consumidor no Capítulo I, Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, do Título II, dos Direitos e Garantias Fundamentais, inc. XXXII, art. 5º [22].

Diante da proposição normativa, é justo afirmar que a Constituição da República de 1988, ao promover a matéria consumerista, institui uma verdadeira garantia individual e coletiva [23], na medida em que defere ao consumidor, aqui entendido em sentido lato, os meios pelos quais poderá fazer efetivos os seus direitos subjetivos, que deverão ser devidamente tutelados pelo Estado [24].

Nesse passo, tratando-se de novidade constitucional, a Constituição Federal demonstra a preocupação do legislador constituinte com as relações de consumo, e com a necessidade de proteção do ente vulnerável dessa relação. Como se denota, a inexistência de instrumentos eficazes de proteção ao consumidor, para fazer valer seus direitos mais básicos, obrigou a inserção de sua defesa como um garantia individual e coletiva, de modo a determinar-se a edição de norma ordinária regulamentando não só as relações de consumo, mas também os mecanismos de proteção aos seus interesses e direitos [25].

Nesse sentido, a Constituição demonstra adotar alguns dos elementos característicos do Estado do Bem-Estar Social (Welfare State), na razão em que não só institui garantias, individuais e coletivas, mas também imputa ao Estado o dever de estabelecer políticas públicas, com o objetivo de alcançar condições sociais mínimas [26]. Em apoio a essa afirmativa, basta observar que ao estabelecer o dever do Estado de promover a defesa do consumidor, na forma da lei, a Constituição está instituindo, em regra, um princípio-programa ou uma norma-programa (Zweckprogramm ou Finalprogramm) [27], que possui, como conseqüências lógicas, a instituição de duas ordens de obrigações, as de cunho positivo, e as de caráter negativo.

Sob o ponto de vista da obrigação positiva, pode-se dizer que compete ao Estado promover, em benefício do consumidor, individual e coletivamente, uma ampla política pública, a ser construída e implementada, de todas as formas possíveis, a fim de que seja alcançado o objetivo protetivo perseguido pela Constituição [28].

Exemplificativamente, pode-se relacionar algumas atividades que poderão ser alvo da promoção estatal: a produção de normas jurídicas; a edição de atos administrativos, a regulamentação administrativa das atividades de produção, comercialização ou criação de produtos ou serviços; a regulamentação de normas específicas sobre propaganda e publicidade; a elaboração de campanhas de esclarecimento sobre determinados produtos ou serviços; a efetivação de programas de educação para o consumo.

De outro lado, quanto ao surgimento de uma obrigação negativa pelo inc. XXXII, do art. 5º, necessário transcrever excerto de Fábio Konder Comparato:

"Característica essencial dos princípios constitucionais de caráter programático, como acima se salientou, é o fato de imporem a realização de uma política pública e, por conseguinte, de gerarem novas normas jurídicas em aplicação desse programa de ação. [29]

Surgidas essas obrigações, positivas e negativas, é de constatar que a norma, implicitamente, impede o Estado não só de editar normas jurídicas, e atos administrativos, que estejam em conflito com o preceito constitucional defensivo, mas também de não desrespeitá-la, nos casos em que seja partícipe do mercado de consumo, no exercício de suas possíveis atividades econômicas [30] [31].

Como se observa, o legislador constitucional, ao determinar que o Estado promoverá a defesa do consumidor, está não só instituindo uma verdadeira política pública [32] e uma garantia individual e coletiva (visto que passa a ser direito da pessoa e dever do Estado [33]), mas também reconhecendo uma condição que é própria do consumidor, ou seja, a sua vulnerabilidade dentro do mercado. O que se busca, obviamente, através dessa inserção constitucional, é alcançar equilíbrio entre protagonistas naturalmente desiguais, em virtude de suas atuações muito particulares no mercado, e da importância dessa atuação capital para o meio social, econômico, político etc.

A comprovação dessa assertiva resta mais contundente, ao se observar que a matéria não foi inserida em qualquer momento normativo constitucional, mas em um de seus instantes mais importantes, o Capítulo I, Título II, dos Direitos e Garantias Fundamentais, e com a qualidade de cláusula pétrea [34], fato que impede que a defesa do consumidor seja objeto das suscetibilidades políticas, à força das imposições dos grandes grupos econômicos [35].

Como se percebe, a Constituição declara a existência de uma desigualdade, informando e determinando que competirá ao Estado a defesa do sujeito que se encontra nessa situação, e tudo sem mencionar a origem dessa desigualdade, limitando-se o legislador a presumi-la, de forma geral, em todos os seus múltiplos aspectos [36].

b) Princípio da ordem econômica

Sem olvidar da grande importância da defesa do consumidor entre os direitos e garantias individuais e coletivas, é preciso dizer que o legislador constitucional não reduziu seu trabalho apenas à consecução do inc. XXXII, art. 5º, uma vez que, com o objetivo de firmar sua importância dentro do ordenamento jurídico, a defesa do consumidor também foi inserida dentre os princípios da ordem econômica, no art. 170, inc. V [37].

Em uma concepção tradicional, segundo Pasini, a ordem econômica é a distribuição de poder de disposição efetiva sobre bens e serviços econômicos, que se produz consensualmente, segundo o modo de equilíbrio dos interesses, e à maneira como esses bens e serviços se empregam segundo o sentido desse poder fático de disposição, que repousa sobre o consenso [38].

Como informa Zapater, a expressão ordem econômica pode ser averiguada em três acepções [39]. Em um primeiro sentido, "ordem econômica" é o modo de ser empírico de uma determinada economia concreta (é conceito do mundo do ser, portanto), ou seja, a relação entre fenômenos econômicos concretos, exprimindo a realidade de uma inerente articulação entre o econômico como fato. Em segundo, é a expressão que designa o conjunto de todas as normas (ou regras de conduta), qualquer que seja a sua natureza (jurídica, religiosa, moral etc), que respeitam à regulação do comportamento dos sujeitos econômicos, é o sentido sociológico da ação econômica. E em terceiro, o sentido que parece ser o recepcionado pela Constituição Federal, no qual "ordem econômica" significa a ordem jurídica da economia, que tem por objetivo impor à economia uma regulação de obediência obrigatória, a ser observada por todo aquele que participe do mercado.

Nesses termos, o legislador constituinte, no caput do art. 170, ao declarar que a ordem econômica é fundada na valorização do trabalho e na iniciativa privada, a fim de assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social, faz uma escolha ou uma opção sobre o fundamento e o fim da ordem econômica brasileira.

Quanto ao fundamento, dúvidas não restam no sentido de haver uma opção constitucional expressa sobre o acolhimento de um modelo capitalista de produção, ou por uma economia de mercado capitalista, visto que iniciativa privada e livre concorrência são alguns dos princípios basilares da ordem capitalista [40].

No entanto, com relação à finalidade, percebe-se um abrandamento desse modelo, pois há uma priorização dos valores sociais e econômicos do trabalho humano, a fim de que sejam conciliados os desejos de crescimento e expansão, desse mesmo capital, mas com características sociais e econômicas distributivas, dentro dos ditames da justiça social [41].

A opção capitalista, ainda que abrandada pela finalidade declinada, resta bem delineada, ao se observar que o art. 174, em seu caput, declara que o Estado exercerá, na qualidade de agente normativo e regulador da atividade econômica, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público, e indicativo para o setor privado.

Nesse passo, a inserção é louvável, uma vez que nada adiantaria a elevação da defesa do consumidor à categoria de garantia individual e coletiva, caso não se fizesse a sua conciliação ou compatibilização com outros princípios de observação obrigatória, principalmente os de ordem econômica [42].

Observa o constitucionalista Alexandre de Moraes, que essa nova visão constitucional, em termos de inovação no rol dos direitos humanos fundamentais, de proteção ao consumidor, deve ser compatibilizada com os preceitos de presença tradicional nas constituições brasileiras, como a livre iniciativa e a livre concorrência [43].

Não obstante, resta claro que a Constituição de 1988 instituiu um dever obrigatório ao Estado, através da intervenção no domínio econômico, de trabalhar com o especial objetivo de alcançar seus fins, ou seja, construir uma sociedade livre, justa e solidária, nos exatos termos propostos pelo art. 3º [44].

Assim, quando a Constituição de 1988, no art. 170, inc. V, eleva a defesa do consumidor ao status de princípio essencial da ordem econômica, no mesmo plano dos princípios da soberania, da função social da propriedade, da livre concorrência, do meio ambiente [45], está estabelecendo uma série de obrigações por parte do Estado.

A mais importante, caminha no sentido de que o Judiciário, o Legislativo e o Executivo, dentro de suas respectivas competências, não poderão privilegiar, por exemplo, a propriedade privada, ou a livre concorrência, em detrimento dos direitos do consumidor [46], eis que estão em ordem de paridade principiológica [47], não se podendo reverenciar a um deles, sem que sejam observadas possíveis ofensas aos demais [48].

Destarte, não é demais lembrar que a livre iniciativa também é fundamento da República (art. 1º, inc. IV, CF), fato que talvez poderia embasar uma falsa interpretação, no sentido de valorizá-la em demasia, e, em caso de conflitos com outros princípios da ordem econômica, deixá-la prevalecer na solução dos conflitos de interesses. Tal atitude seria inadmissível, porque se estaria tomando a livre iniciativa como o único fundamento da República, o que não é o caso, pois a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho, todos fundamentos republicanos, encontram suas exatas emanações econômicas nos princípios do art. 170, inclusive na defesa do consumidor [49].

Nesse sentido, Walter Ceneviva afirma que "com referência ao direito do consumidor o conteúdo material da normatividade inserida na Carta Magna é interpretado sistematicamente, no seu conjunto, evitada a leitura de norma isolada que privilegie a livre empresa ou ponha toda força no termo defesa em relação ao destinatário final do consumo." [50].

Não obstante isso, é necessário ressaltar que a concepção da defesa do consumidor como princípio constitucional da ordem econômica (que poderia fundamentar interpretações apenas com fundamento no fato econômico), não indica que a matéria consumerista possui origem e repercussões apenas nessa área.

Muito ao contrário, o que demonstra o legislador constitucional é o interesse de defender o consumidor em uma área de grande importância, mas sem esquecer que a defesa do consumidor exprime um conteúdo multifacetado e amplo, que apesar de ter grandes implicações econômicas, também possui conseqüências sociais, políticas e culturais que não podem ser excluídas de seu conteúdo [51].

De outro lado, caso se afirme que a matéria consumerista possui raiz e implicações apenas nessa área, pois foi inserida entre os princípios da ordem econômica, ter-se-ia de admitir que econômicos também o são, exclusivamente, a soberania nacional e a propriedade privada, proposição que possui inúmeras impossibilidades de verificação.

c) Dispositivos afins

Além dos dispositivos supra comentados, que constituem a verdadeira gênese constitucional da matéria consumerista, a Constituição Federal de 1988, em outros momentos normativos, busca privilegiar a situação jurídica do consumidor, quer de forma direta, quer de forma indireta ou por meio de generalizações.

São exemplos da forma direta, tanto os arts. 24, inc. V [52], e 150, §5º, que tratam, respectivamente, da competência legislativa e da informação tributária ao consumidor [53], como o art. 175, parágrafo único, inc. II, quando o legislador constitucional utiliza a expressão "os direitos dos usuários" [54].

A forma indireta é obtida através do art. 221, inc. IV, ao dispor que a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão deverão obedecer "o princípio do respeito aos valores éticos da pessoa e da família" [55], parecendo haver uma implícita promoção da defesa do consumidor nesse tipo específico de fornecimento.

Embora não se perceba uma absoluta promoção da defesa do consumidor, os mencionados dispositivos não podem ser excluídos de uma análise do sentido constitucional de consumidor, a influenciar todas as normas infraconstitucionais. Nesse passo, é interessante verificar que tais dispositivos fornecem pelo menos um dado que deve ser sopesado pelo intérprete: o respeito à pessoa, seja no fornecimento de informação, seja por meio do respeito a seus valores éticos e familiares.


3. Conclusão

Por todas essas razões, entende-se plenamente justificável a referida inclusão constitucional, sobretudo em face da profunda relevância social, econômica e jurídica que a matéria comporta.

Em verdade, essa inclusão formal parece apontar o próprio elemento valorativo acolhido pela Constituição, isto é: a realização da pessoa em todos os seus aspectos, inclusive quanto ao consumo, através da harmonização de interesses em situações onde há preponderante desigualdade.

Assim, há uma verdadeira ascensão jurídica do consumidor, individual ou coletivamente, do grupo dos jurídica e intelectualmente excluídos, dos socialmente arruinados e dos economicamente humilhados, para o grupo dos novos sujeitos de direito, que por não reunirem condições que proporcionem igualdade real, são juridicamente protegidos de forma especial.

Efetivamente, a inserção alicerçada na Constituição Federal evidencia que há uma busca de equilíbrio, até então inexistente, deferindo poder jurídico a quem não possui poder de fato (social, econômico, intelectual etc), e isso, é indispensável perceber, com a nota tônica da perpetuidade.


Notas

  1. COMPARATO, F. K. A proteção ao Consumidor na Constituição Brasileira de 1988. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo, v. 80, 1990, p. 66.
  2. "Em decorrência do que acaba de ser dito, as constituições contemporâneas apresentam-se recheadas de normas que incidem sobre matérias de natureza e finalidades as mais diversas, sistematizadas num todo unitário e organizadas coerentemente pela ação do poder constituinte que as teve como fundamento para a coletividade estatal. Essas normas, geralmente agrupadas em títulos, capítulos e seções, em função da conexão do conteúdo específico que as vincula, dão caráter polifacético às constituições, de que se originou o tema denominado elementos das constituições. A doutrina diverge quanto ao número e à caracterização desses elementos. De nossa parte, entendemos que a generalidade das constituições revela, em sua estrutura normativa, cinco categorias de elementos, que assim se definem: (1) elementos orgânicos...; (2) elementos limitativos...; (3) elementos sócio-ideológicos...; (4) elementos de estabilização social...; (5) elementos formais de aplicabilidade." AFONSO DA SILVA, J. Curso de Direito Constitucional Positivo. 15ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 46.
  3. "Com efeito, foi ela a primeira Constituinte brasileira que não se originou de uma ruptura anterior das instituições; esta, portanto, a primeira constatação que a mais superficial análise histórica de nosso passado prontamente descobre. Mas é constatação, sem dúvida, apenas aparente, porquanto, se a Carta Magna não foi precedida de um ato da independência, como a Carta Política do Império, de 1824, ou da queda de um império, como a de 1891, ou do fim de uma república oligárquica – a chamada Pátria Velha carcomida, posta abaixo pelas armas liberais da Revolução de 1930 – como a Constituição de 1934, ou da ruína de uma ditadura e dissolução do Estado Novo, como a de 1946, ou até mesmo de um golpe de Estado que aniquilou com um violento ato institucional uma república legitima, qual o fez a de 1967, nem por isso a ruptura deixa de ser a nota precedente do quadro constituinte instalado em 1987, visto que ela se operou na alma da Nação, profundamente rebelada contra o mais longo eclipse das liberdades públicas: aquela noite de 20 anos sem parlamento livre e soberano, debaixo da tutela e violência dos atos institucionais, indubitavelmente um sistema de exceção, autoritarismo e ditadura cuja remoção a Constituinte se propunha fazê-lo. Como em rigor o fez, promulgando a Constituição ora vigente. Durante dez anos a consciência democrática da Nação – por todos os instrumentos possíveis de livre expressão de vontade, sem embargo dos atos repressivos do poder, já dissimulados, já ostensivos – combateu denodadamente em favor da normalidade das instituições." BONAVIDES, P. et al. História Constitucional do Brasil. 4ª ed. Brasília: OAB, 2002, p. 455.
  4. "Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político; Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos, ou diretamente, nos termos desta Constituição.".
  5. Adotamos a significado de bem comum como sendo o conjunto de todas as condições de vida social que consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana (JOÃO XXIII, P. Pacem in Terris. 4ª ed. São Paulo: Paulinas, 2000, p. 33).
  6. É de se ressaltar que a Carta brasileira de 1988 é dirigente, termo trazido do constitucionalismo português, identificando uma opção pela inclusão no texto constitucional de grandes linhas programáticas, que procuram sinalizar caminhos a serem percorridos pelo legislador e pela Administração Pública (BARROSO, L. R. Dez Anos da Constituição de 1988 (Foi bom pra você também?). Revista Trimestral de Direito Público. São Paulo: Malheiros, nº 20, 1997, p. 33-4).
  7. "Na Constituição da República, espontam, aqui e ali – em tom declamatório predominante, mas não sempre (nem, consoante alguns, presente no cerne do texto) – espontam na Constituição em vigor, como se dizia, certos perfis característicos ao Estado-Promotor ou Estado-Providência. Para efeitos de comunicação rápida, pode ser definido o Estado-Promotor ou Estado-Providência como a modalidade de organização estatal que se constitui e se revela, no plano jurídico, mediante a atribuição de direitos (em sentido subjetivo) sociais e econômicos múltiplos ("direitos positivos a prestações ou ações"), que têm por sujeito passivo o próprio Estado (lembre-se o art. 5º da Constituição de 1988)." TOMASETTI JR., A. A configuração constitucional e o modelo normativo do CDC. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, v. 14, p. 29.
  8. "O golpe de 1964 foi o recurso destinado a impedir que o Brasil constituísse a estrutura econômica nacional indispensável ao avanço, escapando ao controle do imperialismo. A ditadura foi o expediente utilizado pelo imperialismo e pela reação interna para alcançar o controle econômico e para institucionalizá-lo." SODRÉ, N. W. Vida e Morte da Ditadura – 20 anos de autoritarismo no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1984, p. 99-100.
  9. ENCICLOPÉDIA MUNDO CONTEMPORÂNEO. São Paulo: Terceiro Milênio, 1999, p. 262 e 481.
  10. A Constituição da República de Portugal, sancionada em 02 de abril de 1976, assim dispõe sobre a matéria: "Art. 81º. Incumbências prioritárias do Estado. Incumbe prioritariamente ao Estado no âmbito económico e social: h) Garantir a defesa dos interesses e os direitos dos consumidores;".
  11. Sancionada em 27 de dezembro de 1978, e modificada em 27 de agosto de 1992, a Constitución Española assim regula a matéria: "Artículo 51. 1. Los poderes públicos garantizarán la defensa de los consumidores y usuarios, protegiendo, mediante procedimientos eficaces, la seguridad, la salud y los legítimos intereses económicos de los mismos. 2. Los poderes públicos promoverán la información y la educación de los consumidores y usuarios, fomentarán sus organizaciones y oirán a éstas en las cuestiones que puedan afectar a aquéllos, en los términos que la ley establezca.".
  12. NISHIYAMA, A. M. A Proteção Constitucional do Consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 69/70.
  13. GIORGIANNI, M. O Direito Privado e suas Atuais Fronteiras. Trad. Maria Cristina de Cicco. Separata da Revista dos Tribunais. Porto Alegre, v. 787, 1998, p. 54-5.
  14. "O fato deita raízes na forma mesma através da qual se deu a formação do Brasil como sociedade nacional. Ela conteve em si uma inevitável conciliação sóciocultural, resultante da necessidade de adotar os padrões ideológicos europeus (em especial os demarcados pelo liberalismo) e ao mesmo tempo de adaptá-las a uma realidade que escapava à racionalidade formal daqueles padrões e que era, ela própria, matriz de outros padrões (indígenas, afro-brasileiros, propriamente nacionais). Nesse contexto, os valores europeus – dominantes por força da correlação entre os países e dos quais não se podia fugir – firmavam-se muitas vezes apenas no plano retórico: ganhavam vida tão-somente como valores ideais, eram "proclamados", mas não efetivamente encarnados, tinham vigência, mas nem sempre eficácia. Isso explica em boa medida a ambigüidade que sempre cercou o liberalismo entre nós. Ambigüidade que se mostrava na retórica inflamada e radicalizada, mas descolada da política real e incapaz de mobilizar segmentos da população; na tendência a driblar o tema da democracia e da cidadania ampliada; no fascínio pelos temas do pensamento conservador, aos quais regra geral esteve subordinado – afinal, eram todos liberais, embora poucos o fossem realmente." NOGUEIRA, M. A. As Desventuras do Liberalismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984, p. 66.
  15. JACYNTHO, P. H. de A. et al. Proteção Contratual ao Consumidor no Mercosul. São Paulo: Interlex, 2001, p. 15-6.
  16. "Sob o prisma negocial e impulsionada pela concentração de vultosos capitais em empreendimentos industriais, comerciais ou de prestação de serviços, essa escalada tem feito com se estenda, por países e continentes diversos a influência de grandes empresas produtoras e distribuidoras de bens os mais variados, que, alcançando públicos infinitos como consumidores, têm-nos sob sua esfera de ação, para a satisfação de necessidades próprias ou familiares, sejam vitais, pessoais ou sociais." BITTAR, C. A. Direitos do Consumidor. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991, p. 01.
  17. "Essa desigualdade não encontra, nos sistemas jurídicos oriundos do liberalismo, resposta eficiente para solução de problemas que decorrem das crises de relacionamento e de lesionamentos vários que sofrem os consumidores, pois os Códigos se estruturaram com base em uma noção de paridade entre as partes, de cunho abstrato. Teceram-se, sob prisma patrimonial, com fulcro nos princípios do respeito à propriedade privada e de identificação da figura do contrato como instrumento para a circulação jurídica de bens e de serviços, com os limites postos em seu regramento, e sob a égide da iniciativa privada como fator de propulsão da economia. Assim, em uma posição de horizontalidade, mantiveram sob sua textura todas as relações negociais privadas, não levando em conta as desigualdades que, na vida real, separam as pessoas na economia, dentro das funções de produção e de consumo." idem. Ibidem., p. 02-03.
  18. "Sem dúvida o consumo é componente essencial do mercado, na medida em que representa o estágio final da cadeia produtiva. Porém, se, no mercado, a produção faz parte de um ciclo que somente se fecha com o consumo do que foi produzido, este deveria ser considerado como sendo o motor fundamental do estágio produtivo e, como tal, ser objeto de distinções e análises determinativas da produção." FORTUNY, M. A. Os Novos Direitos no Brasil. O direito do Consumidor: A emergência de um novo paradigma no direito moderno. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 154.
  19. MARINS, J. Responsabilidade da Empresa pelo Fato do Produto. São Paulo: RT, 1993, p. 26.
  20. Idem, ibidem, p. 26.
  21. "A transmodernidade é um termo novo com o qual se faz referência à época atual; é igualmente uma nova categoria apta a catalizar a crítica à pós-modernidade, utilizada por Warat para enfatizar o caráter de transição da pós-modernidade, isto é, de passagem para novo ciclo histórico cujos contornos ainda não são bem nítidos, mas que tende a afirmar-se como tendo sua identidade própria." COELHO, L. F. Saudade do Futuro. Florianópolis: Boiteux, 2001, p. 41.
  22. "Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:...XXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;"
  23. "Aunque están sometidas a uma interpretación variable debido a la diferencia del ambiente donde estén en vigor, estas garantías fundamentais son el núcleo inviolable del sistema político de la democracia constitucional, regiendo como principios superiores al orden jurídico positivo, aun cuando no estén formulados em normas constitucionales expressas. Em su totalidad, estas libertades fundamentales encarnan la dignidad del hombre.". LOWENSTEIN, K. Teoria de la Constitución. Trad. Alfredo Gallego Anabitarte. 2ª ed. Barcelona: Ariel, 1970, p. 390.
  24. "Os direitos representam só por si certos bens, as garantias destinam-se a assegurar a fruição desses bens; os direitos são principais, as garantias são acessórias e, muitas delas, adjetivas (ainda que possam ser objeto de um regime constitucional substantivo); os direitos permitem a realização das pessoas e inserem-se direta e imediatamente, por isso, nas respectivas esferas jurídicas, as garantias só nelas se projetam pelo nexo que possuem com os direitos; na acepção jusracionalista inicial, os direitos declaram-se, as garantias estabelecem-se." MIRANDA, J. Manual de Direito Constitucional. 2ª ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1988. p. 88.
  25. MORAES, A. Constituição do Brasil Interpretada. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 285.
  26. "Após a Primeira Guerra Mundial, a crítica keynesiana se manifestou em dois distintos momentos históricos: 1. o período do chamado capitalismo dirigista, que se firma mais acentuadamente a partir da depressão dos anos 30 até a Segunda Guerra Mundial; e 2. o período do capitalismo contemporâneo, identificado com o "Estado do bem-estar social". O primeiro momento histórico é assinalado por uma crescente intervenção estatal na economia, com vistas a recuperar o nível dos negócios. É deste período a elaboração da concepção econômica desenvolvimentista e das políticas sociais do pleno emprego. O segundo momento histórico consiste em um capitalismo de mercado regulado pelo Estado, o chamado "Welfare State", no qual, inicialmente, se busca assegurar a todos os indivíduos rendimentos mínimos, e, em seguida, empenha-se na igualização de oportunidades (educação, saúde, moradia, segurança no emprego), de modo a proporcionar-lhes o efetivo exercício das liberdades liberais." PEREIRA E SILVA, R. A Reforma do Estado no Brasil. Revista da Faculdade de Direito da UFSC, v. 1, 1998, p. 167.
  27. COMPARATO, F. K. op. cit. p. 70.
  28. "Os direitos implicados nessa regra são ‘direitos positivos a prestação ou ações" do Estado (e.g. direito à formação ou à proteção da saúde) e dos próprios fornecedores (e.g. prestação em nível adequado de informações). Evidentemente são também – antes de mais nada – posições jurídicas subjetivas equivalentes aos tradicionais "direitos e garantias individuais." TOMASETTI JR., A. op. cit., p. 30.
  29. "...Há sempre, pois, em relação a princípios dessa espécie, uma dupla eficácia: negativa e positiva. De um lado, não pode o legislador, ou a administração pública, editar norma conflitante com o objetivo do programa constitucional. De outro lado, os Poderes Públicos têm o dever de desenvolver o programa através de uma ação ordenada. Em suma, o desrespeito a essas normas pode gerar uma inconstitucionalidade omissiva ou comissiva." COMPARATO, F. K. op. cit. p. 72.
  30. "Existe também a geração de uma obrigação negativa do Estado , sobretudo quando conjugamos o princípio da defesa do consumidor com outros dispositivos do art. 5.º. A proteção da imagem (art. 5.º, X); de dados (XLL); segurança (caput); a liberdade de associação (XVII, XVIII, XIX, XX E XXI) e muitos outros, como já vimos, cria um campo de aplicação para esses direitos nas relações de consumo." ZAPATER, T. C. A interpretação constitucional do CDC e a pessoa jurídica como consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, v. 40, 2001, p. 186.
  31. A título de exemplo, vale mencionar que o art. 177, da Constituição de 1988, decreta que são monopólios da União:I - a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarburetos fluidos; II - a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro; III - a importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das atividades previstas nos incisos anteriores; IV - o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem; V - a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados.
  32. COMPARATO, F. K. op. cit., p. 66.
  33. ALMEIDA, J. B. A proteção jurídica do consumidor. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 71.
  34. "Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: § 4º. Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: IV - os direitos e garantias individuais."
  35. "Não resta dúvida que o tratamento constitucional e a exigência de emenda para alterar a defesa do consumidor em nível de Carta Magna traduzem uma garantia de maior durabilidade da tutela. Não se exclui, por óbvio, a possibilidade de alterações, mas tal não ocorrerá somente se essa for vontade da sociedade brasileira, expressa por seus representantes no Congresso Nacional." ALMEIDA, J. B. op. cit., p. 71.
  36. "A identificação desse novo sujeito de direitos, deste grupo de não-iguais, de vulneráveis pode ter conotações pós-modernas fortes. No caso brasileiro, trata-se da realização de um direito fundamental (positivo) de proteção do Estado para o consumidor (art. 5º, XXXII, da CF/88). O consumidor foi identificado constitucionalmente (art. 28 do ADCT) como agente a ser protegido de forma especial." MARQUES, C. L. Direitos básicos do consumidor na sociedade pós-moderna de serviços: o aparecimento de um sujeito novo e a realização de seus direitos. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, v. 35, 2000, p. 67.
  37. "Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País."
  38. FONSECA, J. L. Direito Econômico. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p.45.
  39. ZAPATER, T. C. A interpretação constitucional do CDC e a pessoa jurídica como consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, v. 40, 2001, p. 186.
  40. "Não há negar-se que o sistema capitalista é hoje temperado por graus diversos de intervenção do Estado na seara econômica, o que tem levado alguns autores a falarem na existência de uma forma de economia mista. No entanto, quer em termos econômicos, quer em termos jurídicos, a ordem econômica é ainda tributária de um desses dois modelos cardeais: capitalismo ou socialismo." BASTOS, C. R. Curso de Direito Econômico. São Paulo: Celso Bastos, 2003, p. 111.
  41. AFONSO DA SILVA, J. op. cit., p. 754.
  42. Eros Roberto Grau afirma que o conceito de ordem econômica muito se assemelha ao de constituição econômica, no que afirma: "Compreendo, a Constituição Econômica, conjunto de preceitos que institui determinada ordem econômica (mundo do ser) ou conjunto de princípios e regras essenciais ordenadoras da economia, é de se esperar que, como tal, opere a consagração de um determinado sistema econômico." (GRAU, E. R. Ordem econômica na Constituição de 1988. 8ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 70).
  43. MORAES, A. op. cit., p. 285.
  44. "Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação."
  45. Com entendimento em contrário, está Manoel Gonçalves Ferreira Filho, que enxerga na norma apenas uma enfatização da proteção do consumidor contra abusos praticados pelos fornecedores, e não um verdadeiro princípio da ordem econômica (op. cit., p. 354).
  46. "Alguns desses princípios se revelam mais tipicamente como objetivos da ordem econômica, como, por exemplo, o da redução das desigualdades regionais e sociais e a busca do pleno emprego. Mas todos podem ser considerados princípio, na medida em que constituem preceitos condicionadores da atividade econômica." AFONSO DA SILVA, J. op. cit., p. 758.
  47. COMPARATO, F. K. op. cit., p. 70-71.
  48. BARROS, S. T. O princípio da Proporcionalidade e o Controle de Constitucionalidade das Leis Restritivas de Direitos Fundamentais. Brasília: Brasília Jurídica, 1996, p. 153-179.
  49. "AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 8.039, DE 30 DE MAIO DE 1990. CRITÉRIOS DE REAJUSTE DAS MENSALIDADES ESCOLARES. - Em face da atual Constituição, para conciliar o fundamento da livre iniciativa e do princípio da livre concorrência com os da defesa do consumidor e da redução das desigualdades sociais, em conformidade com os ditames da justiça social, pode o Estado, por via legislativa, regular a política de preços de bens e serviços, abusivo que é o poder econômico que visa o aumento abstrato de lucros. - ..." (STF - Pleno, Questão de Ordem, Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 319/DF, Rel. Min. Moreira Alves, j. 03/04/93, p. DJU de 30/04/93, p. 7563, inteiro teor disponível em http/:www.stf.gov.br).
  50. CENEVIVA, W. Publicidade e Direito do Consumidor. São Paulo: RT, 1991, p. 81.
  51. "Com efeito, tanto num quanto noutro, o que se discute e o que ocorre é a aplicação de recursos escassos em dadas finalidades. E, assim, o campo social integra o campo econômico. O vezo popular chama de econômica a construção de uma fábrica ou de uma estrada e considera social a construção de uma escola ou de um asilo. E, neste último caso, a escola ou o asilo serão ainda mais sociais se implantados por uma entidade beneficente ou mesmo por um ente público, como o município. É fácil verificar ter havido em ambos os casos uma decisão essencialmente econômica, desviando-se material de construção tanto da fábrica quanto da escola. A natureza do processo decisório é rigorosamente a mesma, pouco importando no caso a sua motivação." NUSDEO, F. Curso de Economia. São Paulo: RT, 1997, p. 109.
  52. "Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: V - produção e consumo;"
  53. "Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: § 5º. A lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços.".
  54. "Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre:
  55. II - os direitos dos usuários;".

  56. "Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios: IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.".

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SILVA, Rodrigo Brum. A concepção constitucional do consumidor e sua relevância. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2158, 29 maio 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12792. Acesso em: 18 abr. 2024.