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Os contratos do SFH anteriores ao CDC sem cobertura pelo FCVS.

Saldo residual e a Lei nº 11.922/09

Os contratos do SFH anteriores ao CDC sem cobertura pelo FCVS. Saldo residual e a Lei nº 11.922/09

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SUMÁRIO: Introdução. 1. A Posição do STJ no sentido da inaplicabilidade do CDC aos contratos firmados antes da entrada em vigor daquela norma legal. 2 A eficácia mínima de que se devem revestir as normas constitucionais em geral. 3 O FCVS e a inaplicabilidade do código de defesa do consumidor aos contratos habitacionais que contêm previsão de cobertura por este fundo. 4 A lei 11.922/09 e a possibilidade de refinanciamento dos saldos devedores. 5 Trata-se de novação ope legis das dívidas oriundas de contratos anteriores a 05/09/2001? 6 O art. 5°, parágrafos 2º e 3º da lei 11.922/09 e a possibilidade de aplicação das normas constantes do CDC aos contratos renegociados. 7 Os princípios da boa-fé objetiva e da função social dos contratos. 8 Artigo 5º da LICC e o direito social de moradia. Conclusão. Bibliografia


INTRODUÇÃO

A lei 11.922/09, publicada no Diário Oficial da União em 14.04.09, possibilitou a renegociação de contratos de financiamento habitacional formalizados até 5 de setembro de 2001, no âmbito do SFH, sem a cobertura do FCVS – Fundo de Compensação de Variações Salariais, bem como os contratos de financiamento que originariamente contavam com esta cobertura, mas que a tenham perdido ou vierem a perdê-la, desde que apresentem desequilíbrio financeiro, definido este pela própria lei, em seu art. 4º.

O objeto do presente estudo não é minudenciar todas as particularidades do diploma legal em referência, mas somente analisar a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor aos contratos com saldo residual em desfavor dos mutuários; especialmente aos contratos celebrados anteriormente à vigência do código consumerista, tendo em vista a orientação restritiva que vem prevalecendo no âmbito do Superior Tribunal de Justiça sobre a questão.


1.A POSIÇÃO DO STJ NO SENTIDO DA INAPLICABILIDADE DO CDC AOS CONTRATOS FIRMADOS ANTES DA ENTRADA EM VIGOR DAQUELA NORMA LEGAL

O Superior Tribunal de Justiça, embora admita, como regra, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos habitacionais, vem tendendo a afastar sua incidência às contratações celebradas no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação em data anterior à de vigência daquela codificação, como indica o aresto abaixo transcrito.

"Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: AGRESP - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – 969040

Processo: 200701652902 UF: DF Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA
Data da decisão: 04/11/2008 Documento: STJ000345099

Direito civil e processual civil. Agravo no recurso especial. Ação revisional. SFH. CDC. Contrato firmado anteriormente a sua vigência.

Prévia atualização e posterior amortização do saldo devedor.

Possibilidade. Multa moratória. Ausência de limitação.

- O Código de Defesa do Consumidor é inaplicável aos contratos celebrados anteriormente a sua vigência.

- O critério de prévia atualização do saldo devedor e posterior amortização não fere a comutatividade das obrigações pactuadas no ajuste, uma vez que a primeira prestação é paga um mês após o empréstimo do capital, o qual corresponde ao saldo devedor.

- A redução da multa moratória de 10% para 2%, tal como definida na Lei nº 9.298/96, que modificou o CDC, aplica-se apenas aos contratos celebrados após a sua vigência.

Agravo não provido."


2.A EFICÁCIA MÍNIMA DE QUE SE DEVEM REVESTIR AS NORMAS CONSTITUCIONAIS EM GERAL

Em que pese o fato de o Código de Defesa do Consumidor somente ter vindo a lume no ano de 1990, é certo que a proteção à massa consumerista data da promulgação da atual Constituição Federal, em 1988, razão pela qual não merece encômios, data venia, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça acima transcrito.

Mesmo que se pondere tratar-se de norma contida no artigo 5º, XXXII da Constituição como sendo de eficácia limitada e a inscrita no 170, V, da mesma Carta como programática, é certo que um mínimo de eficácia havia, à época, e há, no presente, de ser deferida a ambos os dispositivos constitucionais, quando se tem em mira contratos habitacionais firmados em período anterior à edição do Código de Defesa do Consumidor.

Sim, porque embora a legislação regulamentadora da Constituição, no que condiz com a proteção e defesa do consumidor, ainda não estivesse posta no ordenamento jurídico até meados de 1990, é certo que as normas de eficácia limitada (artigo 5º, XXXII) e programática (artigo 170, V) constantes do texto constitucional já poderiam ser invocadas pelas partes e deveriam ser aplicadas pelo poder judiciário, no mínimo, para conter evidentes achaques aos direitos dos consumidores, praticados sob o manto do individualismo marcante do código civil de 1916 pelas instituições financeiras operadoras do Sistema Financeiro da Habitação.

No Informativo 414 do Supremo Tribunal Federal, consta notícia sobre o RE-39175, no qual o Eminente Ministro Celso de Mello proclama a importância das normas constitucionais programáticas no ordenamento constitucional (grifos nossos):

"A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado."

O mesmo raciocínio há de se aplicar à norma constitucional de eficácia limitada, visto que, embora dependa de regulamentação para produzir todos os efeitos que dela se esperam, possui o comando constitucional, desde a promulgação da Constituição, o poder de paralisar ações de entes públicos ou privados que se direcionem contra o bem jurídico ou ente jurídico protegido pela norma constitucional, no caso o Consumidor, enquanto sujeito de direitos na ordem jurídica nacional.

Deve, então, o Estado, que no momento da prestação jurisdicional é encarnado pelo poder judiciário, fazer cumprir a proteção constitucional deferida pelo Constituinte Originário ao consumidor, independentemente da existência de legislação infraconstitucional tratando sobre o tema à época da contratação.

Além disso, negar nos dias atuais, pura e simplesmente, a aplicação do Direito do Consumidor aos contratos habitacionais firmados antes da vigência do Código de Defesa do Consumidor representa olvidar que as relações firmadas no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação são de trato sucessivo e que a execução das prestações de muitos dos referidos contratos vêm se arrastando por décadas, com renegociações sucessivas.

Assim, em que pese o fato de alguns contratos terem sido firmados antes da vigência do Código de Defesa do Consumidor, é também fato que muitas das sucessivas parcelas acumuladas culminaram por serem objeto de renegociações realizadas após a vigência do código consumerista, atraindo, pois, a sua incidência, in totum.

Renova-se, pois, o inconformismo do autor destas linhas com a tendência jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de negar aplicação dos princípios e normas do Código de Defesa do Consumidor aos contratos habitacionais celebrados antes da vigência da referida norma jurídica.


3.O FCVS E A INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR AOS CONTRATOS HABITACIONAIS QUE CONTÊM PREVISÃO DE COBERTURA POR ESTE FUNDO

Por empréstimo do site do Tesouro Nacional, segue, com grifos e recortes nossos, breve histórico esclarecendo o que é o FCVS e para que finalidade foi instituído:

"O Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS foi criado por intermédio da Resolução no 25, de 16.6.67, do Conselho de Administração do extinto Banco Nacional da Habitação - BNH com o fim de garantir, a quitação, junto aos agentes financeiros dos saldos devedores remanescentes de contrato de financiamento habitacional, firmado com mutuários finais do Sistema Financeiro da Habitação, em relação aos quais tenha havido, quando devida, contribuição ao FCVS, mantendo o equilíbrio do Seguro Habitacional do SFH, em nível nacional, servindo, lado outro, para liquidar as obrigações remanescentes do extinto Seguro de Crédito do SFH.

Em decorrência da estagnação econômica, dos altos índices inflacionários e das elevadas taxas de juros verificados durante a década de 80, o Governo Federal concedeu sucessivos e cumulativos subsídios aos mutuários do SFH, ao permitir que as prestações previstas nos contratos habitacionais não fossem majoradas com base nas condições contratualmente pactuadas.

Merece destaque a edição do DL no 2.065, de 26.10.83, o qual produziu impacto direto nos saldos devedores dos financiamentos, na medida em que proporcionou a redução das obrigações dos adquirentes de moradia própria e, conseqüentemente, imputou ao FCVS a responsabilidade pelo pagamento desses benefícios. A assunção desses compromissos ocorreu ao longo do tempo sem a imprescindível cobertura de recursos orçamentários.

As sucessivas postergações do pagamento das obrigações do Fundo foram também decisivas ao atingimento do nível de desequilíbrio ora existente entre o ativo e o passivo do FCVS.

A administração do FCVS está a cargo da Caixa Econômica Federal."

Como dito alhures, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que os contratos firmados sob a égide da legislação pertinente ao Sistema Financeiro da Habitação estão sujeitos às disposições constantes do Código de Defesa do Consumidor.

Ressalva, entretanto, a jurisprudência daquela corte que os contratos com cobertura do FCVS, por sofrerem afetação pelo direito público, dada a natureza de fundo público deste último, estariam fora de alcance do Código de Defesa do Consumidor e de suas garantias contratuais.

"CONTRATO. SFH. FCVS. NÃO-APLICAÇÃO. CDC.

Nos contratos do Sistema Financeiro de Habitação com cláusula do Fundo de Compensação de Variação Salarial (FCVS), há a presença do Estado (CEF) que é o garante na quitação do saldo devedor. Assim, sua feição pública atrairá a incidência das normas contratadas pela natureza social da avença, sendo exceção as regras de direito contratual privado. Logo, nos contratos com a cobertura do FCVS, não deve ser aplicada a jurisprudência da Segunda Seção do STJ, que entende pertinente a aplicação do CDC aos contratos regidos pelo SFH. A Seção, ao prosseguir o julgamento, por maioria, afastou a aplicação do CDC nos contratos de financiamento da casa própria firmados sob as regras do SFH que possuam cobertura do FCVS. REsp 489.701-SP, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 28/2/2007 – 1ª Seção – Informativo 311-STJ.

Este é, atualmente, o entendimento consolidado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça.


4.A LEI 11.922/09 E A POSSIBILIDADE DE REFINANCIAMENTO DOS SALDOS DEVEDORES

De acordo com a Lei 11.922/09, para contratos de financiamento de imóveis, celebrados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, que não contam com a cobertura do FCVS ou que a perderam, o prazo para renegociação é de 12 meses a partir da publicação da lei. No caso dos que tinham a cobertura, mas que vierem a perdê-la depois da entrada em vigor da lei, o prazo é de 180 dias (art. 3º, incisos I e II).

A renegociação abrange mutuários que estejam inadimplentes ou não, o atual ocupante do imóvel, em caso de transferência do financiamento, e mutuários executados judicialmente, de forma a inviabilizar a transferência ou venda do imóvel (art. 3, parágrafo 1º, incisos I, II e III).

Para se beneficiar do disposto na lei em consideração, mutuários e agentes financeiros terão que desistir de medidas judiciais ou extrajudiciais que estejam promovendo e que tenham por objeto a contratação realizada, ou celebrar acordo nos respectivos autos (art. 3º, parágrafo 2º).

Considera-se em desequilíbrio financeiro o contrato cujo valor da prestação de amortização e juros, na data da renegociação, atualizada desde a data do último reajuste contratual, com base nos mesmos índices de correção dos saldos devedores, for insuficiente para quitar o saldo devedor do financiamento, também atualizado até a data da renegociação, considerando-se a taxa de juros, o prazo remanescente da operação e o sistema de amortização pactuados em contrato (art. 4º).

A renegociação será operacionalizada por um aditivo contratual, que obedecerá ao disposto nos incisos do art. 5º da lei, a saber:

-o saldo devedor constante do aditivo contratual, que constituirá o novo valor de financiamento do mutuário e servirá de base para a apuração da prestação de amortização e juros, será apurado mediante aplicação do percentual obtido entre o valor do financiamento e o valor de avaliação do imóvel, ambos na data da concessão original do empréstimo, sobre o valor de avaliação atual do imóvel, a ser apurado na forma desta Lei, desconsiderando-se, na apuração da avaliação atual, eventuais melhorias ou ampliação no respectivo imóvel posteriores à assinatura do contrato original, e deduzindo-se do novo saldo apurado as amortizações extraordinárias positivas; 

-a adoção de plano de reajustamento da prestação e de sistema de amortização do financiamento que assegure a quitação integral do saldo devedor constante do aditivo contratual, respeitado o novo prazo de amortização ajustado na renegociação e observados o limite máximo de 30% (trinta por cento) de comprometimento da renda familiar apurada na data da renegociação para definição do valor inicial do encargo mensal, a idade máxima para efeito de cobertura securitária e o prazo de validade da garantia hipotecária anteriormente constituída; 

-quando o prazo de validade da hipoteca relativa ao financiamento original não for suficiente para o cumprimento do novo prazo de amortização, nova contratação, a critério das partes, poderá ser efetuada, com a prorrogação do prazo da hipoteca ou sua substituição pela alienação fiduciária, cabendo ao mutuário os respectivos custos; -manutenção das coberturas securitárias do contrato original; 

-taxa de juros do financiamento renegociado limitada a do financiamento original, admitindo-se, a critério dos agentes financeiros, a sua redução; 

-manutenção dos critérios de atualização monetária do saldo devedor previstos no contrato original de financiamento.

- Na renegociação, a garantia da operação será a mesma adotada no contrato original do financiamento imobiliário, facultada a substituição por alienação fiduciária em garantia. 

-Ficarão mantidas as demais cláusulas do contrato original, exceto quanto à cobertura do FCVS.

- Cabe ao Conselho Monetário Nacional a regulamentação da lei, nos termos do art. 9º.

Eis, em linhas gerais, o que dispõe a novel legislação sobre a forma e as condições da renegociação proposta


5.TRATA-SE DE NOVAÇÃO OPE LEGIS DAS DÍVIDAS ORIUNDAS DE CONTRATOS ANTERIORES A 05/09/2001?

Poderia o intérprete vislumbrar que a renegociação contratual prevista no diploma legal sob análise representaria novação da obrigação inicialmente entabulada.

Novação objetiva, posto que a obrigação originária é substancialmente alterada pelo estabelecimento de novos parâmetros, tanto no que se refere ao saldo devedor, nos termos sobretudo dos incisos I, quanto no sistema de amortização do saldo devedor, inciso II do art. 5º da lei.

Ou novação subjetiva, posto possibilitar o art. 3º, parágrafo 1º, inciso II da lei, a renegociação diretamente com o atual ocupante do imóvel, que recebera este por transferência do contratante originário.

Os maiores óbices a tal entendimento, senão únicos, no sentir deste que escreve, é que o instituto da novação exige a certeza da vontade de novar que deve imbuir ambos os contratantes e implica na extinção da dívida anterior, subsistindo apenas a nova dívida, produto da novação.

Não é demais recordar que, em matéria de contratos relativos ao Sistema Financeiro da Habitação, quando se pretendeu instituir verdadeira novação obrigacional, a lei o fez expressamente, como ocorreu no caso da lei 10.150/00, que dispôs expressamente, em seu art. 2º, parágrafo 3º sobre a novação de dívidas e responsabilidades do Fundo de Compensação de Variações Salariais – FCVS.

A par disso, não está expresso na lei analisada que a dívida originalmente assumida pelo mutuário desapareça, cedendo lugar a um novo débito. O que parece de fato ocorrer é que se possibilita uma redução do saldo devedor (art. 5º, inciso I) e um redimensionamento das parcelas a pagar dentro de um prazo negociado, segundo um novo sistema de amortização do saldo devedor do contrato original (art. 5º, inciso II). O débito original, então, não se extingue, apenas é redimensionado, em seu montante e forma de pagamento.

Parece-nos, portanto, inexistir novação na hipótese presentemente tratada.


6.O ART. 5°, PARÁGRAFOS 2º E 3º DA LEI 11.922/09 E A POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DAS NORMAS CONSTANTES DO CDC AOS CONTRATOS RENEGOCIADOS

Embora concluindo pela inexistência de novação da obrigação originária, entendemos ser relevantíssima a renegociação preconizada pela lei sob análise, do ponto de vista de suas conseqüências jurídicas para o regime contratual a ser observado.

Logo no seu art. 3º, a lei dispõe que a renegociação somente se aplica aos contratos de financiamento habitacional formalizados, no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, até 5 de setembro de 2001.

É sabido que os contratos mais recentes, remontando à última década, apresentam menores dificuldades em sua execução, visto que as parcelas mensais efetivamente amortizam o saldo devedor, através da utilização de sistema de amortização mais eficiente do que os outrora utilizados.

Porém, no que se refere às inúmeras modalidades contratuais experimentadas ao longo das décadas anteriores, adotando as mais diversas formas de amortização do saldo devedor, muitos problemas surgiram, devido ao franco descompasso entre o saldo devedor, sempre crescente em razão do galope inflacionário, e as prestações mensais que, ao final do prazo contratual, não logravam amortizar o montante do débito consolidado.

Então, afinal de contas, o que se pode retirar de positivo, para os mutuários, da renegociação engendrada pela lei 11.922/09, além da "benesse" de ter o saldo devedor reduzido, na forma do art. 5º, inciso I e reprogramado o sistema de amortização, que certamente passará a seguir padrões mais modernos, possibilitando que ao final do prazo da renegociação seja finalmente extinta a dívida?

Independentemente de inexistir novação, como acima concluído, a partir do momento que se renegocia a dívida existente, obviamente que tal negócio jurídico está sendo entabulado já sob a égide do Código de Defesa do Consumidor, vigente desde 1990 e do código civil em vigor.

A lei prescreve fórmulas genéricas tanto para o cálculo do novo saldo devedor, quanto do reajustamento da prestação mensal e do sistema de amortização do débito assumido(art. 5º, parágrafos 2º e 3º).

A regulamentação da lei, nos termos do art. 9º, cabe ao Conselho Monetário Nacional, que deverá pormenorizar e elucidar os dispositivos legais sob comento.

Os princípios e as normas constantes do Código de Defesa do Consumidor, sobretudo no que se refere à vedação de práticas e de cláusulas abusivas, devem nortear a renegociação dos saldos devedores, evitando que o devedor seja novamente lesado pelas instituições financeiras caso queira aderir às disposições da lei 11.922/09.

Na fixação do novo saldo devedor, por exemplo, a lei parece muito objetiva, mas cada caso concreto deverá ser estudado para se concluir sobre estar, ou não, havendo excessiva onerosidade para devedor.

É preciso lembrar que o saldo devedor original não fora amortizado pelas parcelas pagas durante a contratualidade e todo o ônus pela insucesso da contratação já recaiu sobre o devedor que estará assumindo mais ônus financeiros para desvencilhar-se de sua obrigação original.


7.OS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ OBJETIVA E DA FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS

Como acima afirmado, os mutuários já foram suficientemente onerados do ponto de vista financeiro e jurídico.

Além de frustrados na execução contratual, porque esperavam sinceramente que ao final do pagamento de todas as prestações sua obrigação estivesse extinta, agora surge lei aparentemente benéfica que, entretanto, esconde em seu bojo mais um agravo aos princípios da boa-fé objetiva e da função social dos contratos, expressamente adotados pelo ordenamento jurídico pátrio.

A legislação vem em momento estratégico, em que o poder judiciário começa a rever as possibilidades de intervenção na contratualidade, declarando, em muitos casos, extinta a obrigação dos mutuários, como se pode ver dos excertos, que vale a pena transcrever, com alguns recortes feitos pelo autor do presente trabalho, de decisão liminar em ação civil pública, movida brilhantemente pelo núcleo da Defensoria Pública da União no Estado de Alagoas, processo n.º 2009.80.00.1675-2:

"Decisão

Trata-se de ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública da União em Alagoas contra a Caixa Econômica Federal, através da qual objetiva provimento jurisdicional, inclusive liminar, que obste a ré de proceder a cobrança do saldo residual dos contratos de financiamento habitacional, sem cobertura do fundo de compensação de variação salarial – FCVS -, após o pagamento das prestações devidas no período normal de amortização.

Esclarece a douta Defensoria que no início da década de 1990 a CEF celebrou numerosos contratos de adesão sem deles constar a cobertura do FCVS, mas sim a responsabilização do mutuário, após o pagamento das parcelas ajustadas, em adimplir eventual saldo residual.

A referenciada cláusula contratual, segundo a autora, colide com o princípio constitucional da proteção ao consumidor e com diversos preceitos da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código do Consumidor), eis que tem Ensejado a cobrança de prestações abusivas, colidentes com o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, conduzindo os mutuários a uma situação de insuportabilidade financeira, desaguando na perda do imóvel financiado e pago durante longos anos.

Postula, em suma, que seja liminarmente proclamada a nulidade da cobrança do "saldo residual" dos contratos sem cobertura do FCVS, após ultimado o pagamento das prestações, exonerando-os das cobranças abusivas que têm sido praticadas pela CEF.

Decido.

A legitimidade ativa da douta Defensoria Pública da União se me mostra reconhecida diante do art. 134 da Constituição Federal, regulamentado pela Lei Complementar nº 80/94, que estabelece como função institucional da mesma o patrocínio de direitos e interesses do consumidor lesado". Nesse diapasão, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em acórdão relatado pelo eminente Ministro José Delgado, dispôs que esta corte "vem se posicionando no sentido de que, nos termos do art. 5º, II, da Lei 7.347/85 (com a redação dada pela Lei nº 11.448/87), a Defensoria Pública tem legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar em ações civis públicas que buscam auferir responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (REsp 91 2849, 1ª Turma, julgado em 26/02/2008).

Analisando a questão sob o prisma do planejamento do sistema habitacional, e considerando as imperfeições com que os valores das prestações foram prognosticadas, o Desembargador Federal Francisco Cavalcanti, nos autos dos embargos infringentes na Apelação cível nº 177362- SE, assim se pronunciou:

"não é aceitável a imputação ao mutuário de todos os riscos que envolvem o negócio jurídico firmado, enquanto a instituição financeira fica salvaguardada de contínuas oscilações da economia e dos índices financeiros."

"A cláusula do resíduo, da forma como atualmente evolui o saldo devedor, transforma mesmo o contrato de mútuo/compra e venda em contrato de aluguel perpétuo, haja vista que, não tendo o mutuário como saldar o débito residual, perderá o imóvel que acreditava estar adquirindo a cada prestação adimplida (cf. fl. 21)."

Registrando idêntica sensibilidade jurídica à questão, o Des. Federal Paulo Gadelha, na AC 339465-CE, assentou que "seria iludir o mutuário manter um contrato de financiamento com prestações reajustadas pelo mesmo índice aplicada ao seu salário, possibilitando-lhe assim a satisfação dos encargos mensais por cerca de 20 anos ou mais para, ao final do prazo de amortização, findar este mutuário por perder o bem que tencionava adquirir, porque o saldo devedor foi reajustado por índice diverso, tornando a dívida incompossível de ser paga pelos recursos auferidos de seu labor".

Pronunciando-se enfaticamente acerca da nulidade da cláusula em epígrafe, a Des. Federal convocada Joana Carolina Lins Pereira assentou que "além da necessidade de exclusão da ‘série em gradiente’, também é de se incluir a cláusula de resíduo do contrato de mútuo. Tal mecanismo desvirtua não só a finalidade social do SFH, como inviabiliza a resolução do contrato, pela impossível solvabilidade que se instala com o resíduo devedor" (TRF – 5ª R, Pleno EIAC 180578-SE, DJ 30/05/06).

De igual modo entendo configurado o receio de dano irreparável, pois as cobranças unilaterais promovidas pela CEF passam inteiramente ao largo dos rendimentos atuais dos contratantes, desconsiderando-os totalmente, a ponto de as novas prestações assumirem valores altíssimos, comprometendo e até superando os rendimentos do

adquirente. Tal postura, além de ilegal, implica profundo desassossego e desorganização da economia doméstica de milhares de famílias, expondo-as inclusive aos danos de uma execução extrajudicial e a inclusão em cadastros de inadimplentes.

Entendo, em suma, que o pleito liminar procede parcialmente, haja vista que as providências de declaração de quitação e liberação de hipoteca, por seus efeitos exaurientes, descabem neste juízo perfunctório.

Por todo o exposto, defiro parcialmente o pleito liminar, determinando que a Caixa Econômica Federal em Alagoas se abstenha de proceder a cobrança de "saldo residual" dos mutuários na situação em epígrafe, residentes e domiciliados em Alagoas, que tenham adimplido todas as prestações de seus respectivos contratos, no período normal de amortização. Determino, ainda, que a CEF se abstenha de proceder à execução extrajudicial, bem como inscrever os mutuários em cadastros de inadimplentes, até ulterior deliberação.

Cite-se a CEF para o imediato cumprimento desta decisão e

para apresentar contestação, no prazo legal.

Maceió, 07 de abril de 2009.

Sérgio José Wanderley de Mendonça

Juiz Federal Titular da 2ª Vara"

É interessante a transcrição dos excertos da decisão judicial de Alagoas, porque parece que o legislador, antevendo a possibilidade de firmar-se posição jurisprudencial desfavorável aos interesses dos agentes financeiros operadores do SFH, buscou oferecer, maliciosamente, um acordo aos devedores que preencherem as condições do novo diploma legal, apresentando-lhes uma chance de liquidação da obrigação contratual pendente, praticamente produzindo uma cortina de fumaça para desviar a atenção do cidadão da via judicial, plenamente viável para livrá-lo da injusta situação gerada pela imprevidência do poder público, que eternizou o saldo devedor em alguns contratos habitacionais.

Não se está aqui a estimular a judicialização das controvérsias relativas aos contratos habitacionais, por espírito emulativo, obviamente.

O que se pretende esclarecer é que, em vez de aderir a outro plano de pagamento de obrigação que já deveria estar extinta, considerando-se a contratação inicial, pode o mutuário, seja individualmente, seja através das ações coletivas autorizadas pelo sistema processual integrado do Código de Defesa do Consumidor e da Lei 7.347/85, buscar a declaração judicial da extinção de sua obrigação original, sem necessitar submeter-se ainda outra vez ao arbítrio dos gestores do SFH, que transferem para a parte contratual mais fraca, hipossuficiente por excelência, todos os ônus e riscos da operação negocial realizada inicialmente.

Não se está aqui a discutir os motivos que conduziram ao desequilíbrio contratual observado em determinadas avenças realizadas no âmbito do SFH: inflação descontrolada, imprevidência do poder público relativamente à execução contratual sabidamente de longo prazo, distúrbios da macroeconomia mundial, dentre outros.

O que se questiona é que problemas ocorreram e os contratos não foram executados e as obrigações extintas a contento, através da liquidação do saldo devedor e, ao longo de décadas, senão toda a responsabilidade, mas a maior parte dela, vem sendo carreada aos mutuários, que são, como acima afirmado, a parte contratual hipossuficiente, vinculada a contratos de adesão, tendo confiado na política governamental de na área habitacional.

Os mutuários aderiram aos contratos tipo, padronizados, apresentados pelos operadores do SFH, crendo que ao final da execução contratual suas obrigações estariam extintas e se viram, depois de anos pagando as prestações avençadas, presos a saldos devedores que superavam em muito o valor de mercado dos imóveis financiados.

De pretensos proprietários da tão sonhada casa própria, passaram a eternos inquilinos do SFH.

Sem dúvida, estender ainda mais obrigações que já se arrastam por décadas, após o integral pagamento de todas as parcelas contratadas, viola tanto o princípio da função social do contrato, quanto o da boa-fé objetiva, inscritos expressamente no código civil, nos artigos 421 e 422.


8) ART. 5º DA LICC E O DIREITO SOCIAL DE MORADIA

O artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, exige que o juiz, no ato de julgar, atente para os fins sociais a que o direito visa atingir, evitando que o ato jurisdicional não se torne vazio de valor, mero ato mecânico de aplicação da lei.

O direito social de moradia encontra-se inscrito no art. 6º da Constituição da República, devendo servir como vetor inarredável para a correta interpretação das normas que estruturam o SFH e da novel legislação de que ora se trata.

Como acima afirmado, a Lei 11.922/09, no sentir do autor, foi cunhada com o objetivo de dar solução aos contratos habitacionais com desequilíbrio contratual, mas também sem perder de vista a tendência jurisprudencial de considerar quitado o saldo devedor de determinados contratos inadimplidos pelos mutuários.

Assim, há de se impor vertente hermenêutica que não inviabilize o manejo de ações judiciais individuais, ou coletivas, como a ação civil pública proposta pela Defensoria Pública da União do estado de Alagoas, acima referida, tendo como premissa a excessiva onerosidade e a transferência integral do risco contratual para o mutuário que é consumidor e, ipso facto, parte hipossuficiente na relação contratual.

O fato de existir lei possibilitando a renegociação por parte dos mutuários inadimplentes não significa que estes sejam obrigados a aderir aos ditames da lei e de sua regulamentação, que caberá ao Conselho Monetário Nacional, como acima narrado.

A renegociação é facultativa e não pode ter o condão prejudicar o conhecimento de ações judiciais que discutam a liceidade da manutenção de saldo devedor em contratos no âmbito do SFH, sem a cobertura do FCVS, bem como os contratos de financiamento que originariamente contavam com esta cobertura, mas que a tenham perdido ou vierem a perdê-la, desde que apresentem desequilíbrio financeiro, definido este pela própria lei, em seu art. 4º.

Poderia algum magistrado entender que a existência da lei 11.922/09, por si só, seria óbice ao ajuizamento de ação judicial visando a declaração da extinção da obrigação do mutuário que pagou todas as parcelas contratadas, por exemplo, por falta de interesse processual, já que o legislador ofereceu a renegociação como forma de solver o impasse contratual representado pelo saldo devedor em aberto.

Não nos parece a solução mais aconselhada, visto que a lei não é imperativa, porquanto não impõe, apenas faculta, a adesão do mutuário inadimplente ao procedimento de renegociação da dívida exposto no artigo 5º, seus incisos e parágrafos, da lei 11.922/09.

Tanto é assim, que o art. 3º da lei afirma que os contratos com desequilíbrio financeiro "poderão ser renegociados, de comum acordo entre as partes contratantes" nas condições da Lei, estas previstas no art. 5º do mesmo diploma legal.

Trata-se, a nosso ver, de mera faculdade legal posta à disposição do mutuário inadimplente naqueles contratos obviados pela lei.


CONCLUSÃO

Do que acima se aduziu, é possível a extração de algumas conclusões importantes abaixo transcritas, ressalvadas outras que o autor destas linhas não vislumbrou:

a)A renegociação idealizada na Lei 11.922/09 não é obrigatória, mas facultativa aos titulares dos contratos de financiamento habitacional formalizados até 5 de setembro de 2001, no âmbito do SFH, sem a cobertura do FCVS bem como os contratos de financiamento que originariamente contavam com esta cobertura mas que a tenham perdido ou vierem a perdê-la, que apresentem o desequilíbrio financeiro;

b)Eventuais ações judiciais já propostas pelos mutuários para discutir o saldo devedor subsistente nos contratos referidos na alínea anterior, bem como aquelas que venham a ser propostas após a vigência da lei e de sua regulamentação pelo Conselho Monetário Nacional, não podem ser prejudicadas, sob alegação de falta de interesse processual, vez que a adesão à renegociação estabelecida pela Lei 11.922/09 é mera faculdade do mutuário, podendo o mesmo optar por discutir judicialmente a legitimidade da cobrança de saldo devedor, após o adimplemento de todas as parcelas ajustadas no contrato original;

c)Aqueles mutuários que decidirem aderir à renegociação prevista na Lei 11.922/09 terão a seu favor todos os princípios e normas previstas no Código de Defesa do Consumidor e no Código Civil de 2002, ainda que os contratos originalmente tenham sido entabulados antes da vigência daqueles diplomas legais, pois a renegociação é negócio jurídico novo, viabilizado sob a vestimenta de aditivo contratual (art. 5º da lei), que se aperfeiçoará sob a vigência do ordenamento jurídico atualmente em vigor, não servindo a cautela legal representada pelos incisos II, III, IV, V, VI do art. 5º da lei e seus parágrafos 1º e 2º, ao remeter a renegociação a parâmetros adotados no contrato original, para afastar a incidência da principiologia contratual prevista no código civil de 2002 e no código consumerista;

d)Os mutuários que não aderirem à renegociação prevista na Lei 11.922/09 também estão amparados pelos princípios e pelas normas civis atuais que regem os contratos bem como pelo Código de Defesa do Consumidor, ainda que tenham contratado originalmente em período anterior à vigência dos códigos do consumidor e civil de 2002, não podendo mais prevalecer no atual ordenamento jurídico, inspirado pelos princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e da proteção do hipossuficiente, a cruel e míope parêmia pacta sunt servanda, vigente no ambiente jurídico pré Constituição Federal de 1988 e até o início da década de 90, que justificava a manutenção do saldo devedor do contrato habitacional, mesmo após o pagamento de todas as parcelas ajustadas, em franca desvantagem, unilateralmente imposta ao mutuário pelos agentes financeiros operadores do SFH, verdadeira apoteose do individualismo contratual do século XIX;

e)Trata-se de mais uma oportunidade para que a figura do juiz se afirme como agente político, exigindo a observância dos princípios constitucionais e a concretização dos direitos individuais e sociais garantidos pela Constituição quando o Administrador Público ou agentes delegados do poder público, ou ainda particulares com alto potencial de organização, como as grandes empresas, os frustre, ou seja, deve-se distribuir efetivamente Justiça, o que muito bem representa o brocardo latino suum cuique tribuere ou, na linguagem tupiniquim, "dar a cada um o que é seu".


Bibliografia

BRASIL. Presidência da República, legislação. Disponível em: < http://www.presidencia.gov.br/legislacao >. Acesso em: 27 de abril de 2009.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal, MS 27148 MC / DF. Disponível em: < http://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/documento/informativo414.htm>. Acesso em: 27 de abril de 2009.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, RESP 489701/SP. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200201597565&dt_publicacao=16/04/2007>. Acesso em 27 de abril de 2009.

BRASIL. Justiça Federal de Alagoas . Disponível em: <http://200.172.126.3/intranet/noticias/arquivos/69.pdf>. Acesso em 27.04.09

BRASIL. Tesouro Nacional. Disponível em:<http://www.tesouro.fazenda.gov.br/divida_publica/downloads/FCVS_historico.pdf>. Acesso em 27.04.09

Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil:Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. 5. ed. São Paulo: Atlas.2005


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TOLEDO, João Roberto de. Os contratos do SFH anteriores ao CDC sem cobertura pelo FCVS. Saldo residual e a Lei nº 11.922/09. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2148, 19 maio 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12889. Acesso em: 19 abr. 2024.