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Trabalho na atividade pesqueira à luz do Direito do Trabalho

Trabalho na atividade pesqueira à luz do Direito do Trabalho

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1-INTRODUÇÃO

O Brasil tem uma faixa costeira contínua de mais de oito mil quilômetros de extensão e águas continentais que comportam baías, lagos, rios, açudes etc. Nesse contexto, as relações de trabalho existentes são diversificadas, onde há grande número de pessoas que, como meio de subsistência e de forma rudimentar, exploram a pesca individualmente ou com o auxílio de membros da família ou de terceiros, sem relação de emprego. Há, também, as que exploram a pesca com a utilização da força de trabalho de outrem, mediante uma relação que a realidade fática demonstra que é de emprego.

O objeto do presente estudo centra-se nos aspectos legais, doutrinários e jurisprudenciais que norteiam a atividade pesqueira no Brasil, especificamente, no que diz respeito às relações de emprego sob o prisma das normas de proteção ao trabalho. Nesse sentido é feita análise crítica do contrato de parceria hodiernamente utilizado.

Com o advento da Lei nº 11.959, de 29 de junho de 2009, oriunda de um projeto de lei do ano de 1995, surge novo ordenamento para atividade pesqueira que, certamente, trará mudanças significativas e novas concepções que proporcionarão melhorias para o setor pesqueiro nacional.

Inicialmente, para melhor compreensão do tema, é imperioso conhecer como se desenvolve a atividade pesqueira e alguns conceitos legais que lhe são inerentes. Em seguida, adentrar-se-á no cerne do estudo que está dividido nos seguintes tópicos: Pesca e pescador. Definição legal. Pescador profissional e pescador artesanal. Diferenciação e relação de emprego; A parceria como forma de contratação de pescadores. Titularidade do contrato de trabalho de acordo como o tipo de contrato de arrendamento da embarcação; Aspectos legais relativos à operação de embarcações de pesca de bandeira estrangeira e contratação de trabalhadores brasileiros; Fatores impeditivos para efetivação de direitos sociais dos pescadores; Condições de vida e de trabalho a bordo de embarcações de pesca e Considerações finais.


2-PESCA E PESCADOR. DEFINIÇÃO LEGAL. PESCADOR PROFISSIONAL E PESCADOR ARTESANAL. DIFERENCIAÇÃO E RELAÇÃO DE EMPREGO.

Na acepção da Lei nº 11.959, de 29 de junho de 2009 [01], toda operação, ação ou ato tendente a extrair, colher, apanhar, apreender ou capturar recursos pesqueiros são definidos como pesca, que se classifica em comercial e não comercial. A pesca comercial poderá ser explorada de forma artesanal ou industrialmente. A não comercial poderá ser praticada com fins científico, amador ou de subsistência.

O novel ordenamento instituído pela supracitada lei prevê que a pesca artesanal poderá ser praticada por pescadores profissionais, de forma autônoma ou em regime de economia familiar, com meios de produção próprios ou mediante contrato de parceria, podendo utilizar embarcações de pequeno porte. Já a pesca industrial poderá ser praticada por pessoa física ou jurídica e envolver pescadores profissionais nas embarcações de pequeno, médio ou grande porte [02].

Pescador profissional, no dizer do artigo 2º, XXII, da Lei nº 11.959/09, é a pessoa física, brasileira ou estrangeira residente no país que, licenciada pelo órgão público competente, exerce a pesca com fins comerciais, atendidos os critérios estabelecidos em legislação específica.

São condições essenciais para o exercício da pesca, o registro geral da atividade pesqueira - RGP, bem como o Cadastro Técnico Federal - CTF e, quando embarcado, a devida habilitação em cursos certificados pela Diretoria de Portos e Costa da Marinha do Brasil, haja vista que ao regulamentar a Lei nº 9.537/97 (Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário – LESTA), o Decreto nº 2.596/98 dita que os pescadores são aquaviários [03] tripulantes que exercem atividade a bordo de embarcação de pesca.

Diversamente do pescador profissional, o pescador artesanal [04] explora a pesca de forma autônoma ou em regime de economia familiar [05], com ou sem o uso de embarcação. Se utilizar embarcação, de acordo as recentes disposições da Lei nº 11.959/09, ela deverá ter até 20 AB [06]. O contexto ambiental em que a pesca artesanal se realiza é diversificado, pode ser no mar, rios, açudes, lagos, estuários ou em mangues para a captura de peixes, mariscos, crustáceos etc. Os petrechos utilizados variam em função desses elementos, são rudimentares e tradicionais, como anzol, espinhel, rede, tarrafa, manzuá, currais [07] etc. Dessa forma, os pescadores de estuário capturam caranguejos e mariscos. Os de águas interiores fazem suas capturas em açudes, barragens e rios. Os da pesca comercial oceânica fazem suas capturas em águas marítimas profundas e os extrativistas em viveiros.

À luz do Direito do Trabalho, a relação dos pescadores profissionais não artesanais com o armador [08] da embarcação é de emprego [09], por subsunção ao preconizado pelo artigo 3º da Consolidação das Leis Trabalho, ou seja, ele põe sua força de trabalho à disposição, de forma não-eventual, mediante remuneração e subordinação jurídica. Tal relação é reforçada pelo artigo 7º, parágrafo único, da Lei 9.537/97, o qual prescreve que o embarque e o desembarque do tripulante submetem-se às regras do seu contrato de trabalho e, também, no Decreto nº 64.618/69 que dita no artigo 3º que o armador da embarcação de pesca, seja ou não proprietário dela, é empregador.

Reveste-se de fundamental importância a constatação, in loco, de como o trabalho é realizado e o porte da embarcação para se distinguir o autêntico pescador artesanal do verdadeiro pescador profissional, para fins de caracterização da relação de emprego, posto que os próprios pescadores e até alguns armadores de pesca se consideram artesanais, quando na realidade, o trabalho que desenvolvem não se enquadra nos pressupostos legais de pescador artesanal, mas de pescador profissional.

In casu, iniciada a prestação de serviço do pescador profissional não artesanal ou a de qualquer outro empregado, a Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) deverá ser assinada no prazo de 48 horas, previsão contida no artigo 29 da CLT. A data da assinatura do contrato de trabalho na CTPS poderá ou não coincidir com a data de embarque constante na Carteira de Inscrição e Registro [10] (CIR), já que o pescador, em alguns casos, poderá ser contratado em cidade diversa, antes de embarcar, tendo que se deslocar para o porto de estadia da embarcação, o que se configura como tempo à disposição do empregador, a contar como efetivo tempo de serviço (artigo 4º da CLT). As anotações de embarque e desembarque feitas na CIR, que é documento de habilitação profissional expedido pela autoridade marítima, não garantem direitos trabalhistas [11], mas constituem importante meio de prova da relação de emprego. O documento hábil é a Carteira de Trabalho e Previdência Social. Além da assinatura da CTPS, em face das condições especiais em que o trabalho é desenvolvido, pode-se firmar contrato de trabalho escrito à parte para reger a relação empregatícia. Especificamente para embarcações de pesca, o Decreto nº 64.618/69 disciplina o regime de trabalho a bordo. A Consolidação das Leis do Trabalho, nos artigos 248 a 252 traz, também, algumas disposições sobre o trabalho a bordo de embarcações.

Quanto à duração, o contrato de trabalho poderá ser por prazo determinado ou indeterminado. Mas, em face do princípio da continuidade da relação de emprego adotado pela doutrina laboral, presume-se que todo empregado é contratado sem fixação de tempo, salvo nas restritas hipóteses de contratação por prazo determinado respaldadas pelo artigo 443, parágrafo 2º da CLT, quais sejam: a) serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a predeterminação do prazo; b) de atividades empresariais de caráter transitório; c) de contrato de experiência.

É comum a contratação de pescadores profissionais para fazerem apenas uma viagem (viagem redonda, do porto de origem ao porto de origem) ou uma viagem para buscar ou entregar uma embarcação em determinado porto. Situações que, salvo melhor juízo, justificam e se enquadram na supracitada alínea "a" do parágrafo 2º do artigo 443 da CLT.

Relativamente ao contrato de trabalho por experiência, é digno de registro que o pescador profissional poderá ser admitido pelo prazo máximo de até 90 (noventa) dias e deverá ter sua carteira de trabalho assinada. Essa forma de contratação não decorre exclusivamente da profissão do empregado, mas do caráter personalíssimo da relação de emprego, no sentido do empregado se adaptar ao trabalho e ao ambiente em que se realiza, principalmente embarcado. Isso quer dizer que, mesmo que um pescador tenha vários anos de experiência ele poderá ser contratado dessa forma. Todavia, se ele já trabalhou para o mesmo armador, em período anterior, não é cabível contratá-lo outra vez por experiência.


3- A PARCERIA COMO FORMA DE CONTRATAÇÃO DE PESCADORES. TITULARIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO EM DECORRÊNCIA DO ARRENDAMENTO DA EMBARCAÇÃO.

Aspecto merecedor de destaque, em face de sua larga utilização na atividade pesqueira, é a parceria como meio de contratação de pescadores profissionais, que se constitui, no entender deles e de muitos armadores de pesca como única forma de contraprestação pelo penoso trabalho executado a bordo das embarcações. Ou seja, substitui-se por meio dela direitos sociais, como se fosse salário complessivo [12], pelo qual se remunera todos direitos trabalhistas [13], tais como a assinatura da carteira de trabalho, gratificação de natal, férias, descanso semanal, entre outros. Mas, o que ocorre de fato é uma relação de emprego, independentemente da rotulação que as partes derem ao avençado [14]. Nesse sentido, Altamir Pettersenm e Nilson Marques prelecionam "O que distingue a parceria da falsa parceria não é o fato do trabalhador receber sua remuneração parte em dinheiro e parte em frutos. A falsa parceria é a clara intenção de ocultar por trás de um suporto contrato de parceria o que em realidade é um contrato de trabalho. Na falsa parceria existe subordinação jurídica e econômica do falso parceiro". (in Uso e Posse Temporária da Terra – Arrendamento e Parceria. Editora Pró-Livro. 1980. pag. 35).

O que se chama de parceria na pesca nada mais é do que o pagamento feito aos pescadores pelo armador de pesca após converter em dinheiro o pescado capturado numa ou mais viagens, normalmente, na proporção de 80% para ele e o restante (20%) que é repartido entre os pescadores em cotas, por exemplo, o patrão de pesca (comandante ou mestre da embarcação) fica com 10% e a sobra é dividida entre os demais de acordo com a função desempenhada a bordo. Às vezes, a cota individual de cada pescador, em determinado mês, não corresponde ao salário mínimo. Há flagrantes desequilíbrios em desfavor do pescador nessa forma de parceria. Aliás, é de se registrar que não há um contrato de parceria exclusivo para a pesca. O modelo atualmente utilizado é uma versão distorcida do contrato de parceria rural. Na autêntica parceria não há relação de emprego, em face da ausência de um dos seus elementos caracterizadores, que é a subordinação, nesse sentido, a jurisprudência tem se manifestado, são exemplos, os acórdãos abaixo transcritos.

Parceria Rural. Critério Distintivo da Relação de Emprego. O principal critério utilizado para distinguir a parceria do contrato de trabalho é a subordinação jurídica, existente neste último, como decorrência do poder diretivo do empregador. Caracterizada a autonomia na exploração do prédio pelo parceiro cessionário, bem assim a divisão dos lucros, não há como reconhecer a relação de emprego. (TRT 13ª Reg. – Ac. 30977/96 – Rel. Juiz Tarcísio de Miranda Monte – DJ 07/12/96).

Contrato de parceria. Caracterização. Ausência de Subordinação Jurídica. Diferenciação da Relação de Emprego. O contrato de parceria não se confunde com a relação de emprego, visto que o parceiro-cessionário explora a atividade econômica sem que o cedente intervenha inexistindo, portanto, a subordinação jurídica, elemento caracterizador, por excelência, do contrato de trabalho. (TRT 20ª Reg. Ac. 2591/98 – Relª Juíza Ismênia Ferreira Quadros – DJ 28/10/98).

Falsa parceria. Vínculo empregatício. Caracterização. Evidenciado nos autos que o contrato de parceria firmado entre as partes foi celebrado com vistas a lesar o empregado, impedindo e fraudando a aplicação dos preceitos consolidados, há de ser mantida a decisão que declarou nulo aquele contrato, havendo o período de seu cumprimento como sendo de trabalho subordinado. Recurso a que se nega provimento." (TRT 23ª Região, RO-1262/99, Ac. T.P. 2543/99, Rel. Juiz Roberto Benatar, DJMT 13/10/99).

Agravo de Instrumento. Vínculo empregatício. Contrato de parceria. Com relação ao tema, o entendimento do Regional, baseado no conjunto fático-probatório, foi no sentido de que o contrato de parceria é inválido e que ficou caracterizada a prestação de trabalho, uma vez que ficou provada a subordinação e o recebimento de salário, que são incompatíveis com o contrato de parceria. Assim, diante da natureza fática da matéria em análise, inviável o revolvimento de fatos e provas para se chegar a entendimento diverso, ante a incidência da Súmula 126 deste Tribunal. Nego provimento. PROC. TST-AIRR - 18977/2002-900-04-00.5. Acórdão. 2ª Turma. Pub. 22/06/2005.

Marcos Jatobá Lôbo [15], em brilhante estudo intitulado "Do contrato de parceria. Conceito, espécies e análise do art. 96 e incisos da lei nº 4.504/66 – Estatuto da Terra" faz a seguinte abordagem acerca da configuração da relação de emprego nos contratos de parceria:

Da configuração de relação empregatícia no contrato de parceria:

O parágrafo único do art. 96 do E.T. traz importante disposição acerca da possibilidade de o contrato de parceria ser desconfigurado para uma relação de cunho empregatício, se restarem caracterizados os requisitos essenciais do contrato laboral.

Assim dispõe o citado dispositivo legal:

"Parágrafo único - Os contratos que prevejam o pagamento do trabalhador, parte em dinheiro e parte percentual na lavoura cultivada, ou gado tratado, são considerados simples locação de serviço, regulada pela legislação trabalhista, sempre que a direção dos trabalhos seja de inteira e exclusiva responsabilidade do proprietário, locatário do serviço a quem cabe todo o risco, assegurando-se ao locador, pelo menos, a percepção do salário-mínimo no cômputo das duas parcelas". (grifos nossos)

Portanto, observamos que o primeiro fator que colabora para a desconfiguração do contrato de parceria vem a ser o pagamento parcial em dinheiro ao parceiro-outorgado.

Ora, é sabido que o contrato de parceria só admite o pagamento do parceiro-outorgado em percentual da produção. Desta forma, a percepção em dinheiro, fornecido pelo parceiro-outorgante, já delineia um dos requisitos do contrato de trabalho, qual seja, a remuneração de salário pelo trabalho desempenhado.

A direção dos trabalhos, mediante inteira e exclusiva responsabilidade do parceiro-outorgante traz consigo outros requisitos da relação empregatícia, a saber: a) subordinação, caracterizada pela direção e inteira responsabilidade dos trabalhos pelo parceiro-outorgante, e b) pessoalidade, que é a estrita relação do parceiro-outorgado com o parceiro-outrogante, caracterizada pela exclusividade que este tem na direção dos trabalhos.

Ocorrendo, concomitantemente, estas hipóteses, a relação de parceria cederá lugar à relação empregatícia, razão pela qual as regras aplicáveis serão as constantes na legislação trabalhista.

O Projeto de Lei nº 687/95, que originou a Lei nº 11.959/09, ao dispor sobre pescadores trazia no artigo 14 a possibilidade de contratá-los sob o regime da legislação trabalhista, comercial ou sob contrato de parceria. No artigo 15 havia a previsão de que na pesca industrial, o armador de pesca poderia celebrar com pescadores profissionais contrato de parceria por cotas partes, previsto em convenção coletiva de trabalho, com cláusulas dispondo sobre as condições relativas à responsabilidade pela embarcação, na forma da legislação específica. O parágrafo 3º desse artigo aventava a possibilidade dos parceiros contribuírem para o empreendimento, com a embarcação apta a operar, com equipamentos, materiais e com o trabalho, ou só com este, conforme se ajustar no contrato, repartindo os ganhos ou perdas ao término de cada viagem. Mais adiante, o artigo 17 condicionava a validade do contrato de parceria à homologação do sindicato das categorias envolvidas. Tais artigos (14 a 17) foram vetados.

A redação desses dispositivos é preocupante, haja vista a possibilidade do congresso nacional rejeitá-los. Eis os motivos:

1) Quanto a possibilidade de contratação de pescadores sob o regime da legislação comercial, um verdadeiro absurdo. Nada a comentar.

2) Na hipótese de haver um contrato de parceria revestido das formalidades legais, aplicável na atividade pesqueira, a relação entre parceiros não é de emprego. Então, como seria possível disciplinar uma relação que não é de emprego por meio de convenção coletiva de trabalho [16], já que esse instrumento destina-se a regular condições de trabalho aplicáveis às relações individuais de trabalho, ou seja, a relação entre empregado e empregador?

3) A realidade dos fatos demonstra que a parceria já é utilizada na atividade pesqueira, mas de forma distorcida, em desfavor do pescador. Então, que tipo de parceria o projeto de lei se reportava e porque o legislador não a disciplinou diante da realidade fática existente, de maneira a proporcionar segurança jurídica para os armadores de pesca e garantia de efetiva participação dos pescadores nos resultados da pesca?

4) A embarcação é o meio que dispõe o armador para explorar a pesca com fins comerciais. Há todo um ordenamento legal a discipliná-la que vai desde sua construção, inscrição, operação e tráfego. Dispor em convenção coletiva de trabalho sobre condições relativas à responsabilidade pela embarcação seria o mesmo que transferir para o pescador o risco da atividade econômica;

5) Condicionar a validade da parceria à homologação do sindicato é contra senso. A relação entre autênticos parceiros é autônoma e independe de filiação sindical. Nesse sentido, em recente decisão o STF fulminou o item IV do artigo 2º da Lei nº 10.779/03 que trata do seguro desemprego do pescador artesanal por ferir o preceito constitucional que ninguém é obrigado a filiar-se ou manter-se filiado a sindicato;

6) Por fim, nenhum pescador quer repartir perdas com ninguém. Tampouco nenhum armador de pesca quer repartir ganhos seja lá com quem for. Ademais, fico a imaginar como seria a repartição das perdas numa embarcação de pesca oceânica com tripulação de 12 homens e despesas de armação, por exemplo, de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) e que após 25 dias de pesca em alto mar, o pescado capturado rendesse somente R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais). In casu, os pescadores ficariam endividados por um bom tempo. Em sentido contrário, se a quantidade de pescado capturado fosse de 50 toneladas de atuns, por exemplo, ao custo de R$ 7.000,00 (sete mil reais) por tonelada, perfazendo o montante de R$ 350.000,00 (trezentos e cinqüenta mil reais), a repartição dos ganhos deixaria os pescadores muito bem de vida por um bom tempo.

Ao se compulsar o inteiro teor do PL nº 687/95 vê-se que o legislador, nos aspectos atinentes às atuais relações de trabalho desenvolvidas na atividade pesqueira, notadamente no que diz respeito à parceria, perdeu ótima oportunidade para discipliná-la e adequá-la à realidade existente. Relativamente às condições de vida e de trabalho a bordo foi omisso, sequer fez menção a alguma melhoria nesse aspecto, em face das precaríssimas condições de das embarcações de pesca e do alto risco a que estão expostos os pescadores. Tais omissões não se coadunam com o desenvolvimento sócio-econômico, cultural e profissional dos que labutam na pesca, como prevê o artigo 1º, IV da Lei nº 11.959/09.

No entanto, em leitura mais acurada no texto legal, vê-se que a parceria originariamente prevista no PL 687/95 foi mantida na exploração da pesca comercial artesanal (o que é admissível) e na industrial (o que à luz do Direito do Trabalho não é admissível). Todavia, há curiosidades, posto que ao classificar a pesca artesanal o legislador utilizou a expressão "mediante contrato de parceria" e na industrial, "em regime de parceria por cotas-partes". É o que se depreende da literalidade do artigo 8º, I, "a" e "b" da citada Lei, in verbis:

Art. 8º Pesca, para os efeitos desta Lei, classifica-se como:

I – comercial:

a) artesanal: quando praticada diretamente por pescador profissional, de forma autônoma ou em regime de economia familiar, com meios de produção próprios ou mediante contrato de parceria, desembarcado, podendo utilizar embarcações de pequeno porte;

b) industrial: quando praticada por pessoa física ou jurídica e envolver pescadores profissionais, empregados ou em regime de parceria por cotas-partes, utilizando embarcações de pequeno, médio ou grande porte, com finalidade comercial; (sublinhamentos não constantes no texto original)

Diante do permissivo legal acima mencionado poderá ocorrer um retrocesso nas relações de emprego desenvolvidas na pesca comercial industrial, com a reversão dos atuais contratos de trabalho em contratos de parceria. A realidade dos fatos demonstra que a parceria, da forma como foi e como é hoje, não trouxe e não trará participação nos resultados da pesca ou melhorias para os sacrificados pescadores.

Portanto, em respeito às normas de proteção ao trabalho, é admissível a parceria na atividade pesqueira concomitantemente com um contrato de trabalho, mas apenas como forma de remuneração pelo trabalho, desde que seja respeitado o piso salarial da categoria, quando existente, ou o salário mínimo vigente, nunca como substituidora de direitos sociais constitucionalmente garantidos.

Parceria concomitante com contrato de emprego. Nada impede que as partes mantenham, concomitantemente, contratos de trabalho e de parceria agrícola, considerando-se, principalmente, que o tempo despendido pelo reclamante nos trabalhos desenvolvidos na pequena lavoura, objeto do contrato de parceria, não o impede de cumprir as suas obrigações na fazenda." (TRT 23ª Região, RO nº 2852/94, Ac TP nº 365/95, Relator Juiz Diogo Silva, DJMT 04.05.95, página 08).

A caracterização da relação de emprego do pescador profissional é de fácil identificação, em face da natureza do trabalho e, também, da subordinação legal ao patrão de pesca [17] que, por sua vez, é subordinado ao armador ou ao proprietário da embarcação. Ou seja, o patrão de pesca e demais pescadores são, necessariamente, empregados. Entretanto, nas embarcações arrendadas eles serão empregados de quem? A resposta dependerá do tipo de contrato de arrendamento (a casco nu, por tempo ou por viagem). No arrendamento a casco nu, a embarcação é cedida, por tempo determinado, ao arrendatário, pessoa física ou jurídica que fica com sua posse e controle nos aspectos de gestão náutica e de pessoal, mas desprovida de tripulação. O arrendatário a casco nu tem o direito de designar o patrão de pesca e a tripulação, atraindo para si a responsabilidade pela contratação deles nos moldes da Consolidação das Leis do Trabalho.

Os contratos de arrendamento por tempo e por viagem são poucos usuais na atividade pesqueira. O arrendamento por tempo é caracterizado pela entrega do todo ou parte da embarcação completamente armada, tripulada, equipada e em condição de navegabilidade à disposição do arrendatário, por tempo determinado, que assume a posse e o controle da mesma. Já o contrato de arrendamento por viagem caracteriza-se pela obrigação do arrendador em colocar parte ou o todo da embarcação, com tripulação, à disposição do arrendatário para realização de uma ou mais viagens. Ambos são contratos de utilização dos serviços da embarcação. Assim, a tripulação é empregada do arrendador ou proprietário, diferentemente do contrato a casco nu. Essa abordagem refere-se às embarcações de pesca de bandeira brasileira, haja vista que nas estrangeiras, notadamente na pesca oceânica comercial, há particularidades adiante abordadas.


4- ASPECTOS LEGAIS RELATIVOS À OPERAÇÃO DE EMBARCAÇÕES DE PESCA DE BANDEIRA ESTRANGEIRA E CONTRATAÇÃO DE TRABALHADORES BRASILEIROS.

Em decorrência da superexploração de seus recursos pesqueiros, países que tradicionalmente exploram a pesca oceânica viram-se na contingência de buscarem outras paragens. Então, perceberam que a captura de peixes de águas marítimas profundas na costa brasileira não estava sendo explorada, principalmente de atuns e impuseram por meio da Comissão Internacional para a Conservação do Atum Atlântico- ICCAT- cotas mínimas a serem atingidas, do contrário, perderíamos para eles a exclusividade nas áreas situadas na Zona Econômica Exclusiva (ZEE) [18]. Diante desse quadro, houve o governo brasileiro por incentivar o arrendamento de embarcações de pesca de bandeira estrangeira, haja vista não existir frota pesqueira no país detentora de tecnologia para explorar a pesca oceânica, tampouco mão-de-obra com o nível de especialização para esse tipo de pesca que se realiza em águas marítimas profundas e requer vultosos recursos financeiros. Inicialmente, para ocupar e explorar a ZEE foi editado o Decreto nº 2.840/98.

A operação de embarcações estrangeiras de pesca nas zonas brasileiras de pesca, alto mar e por meio de acordos internacionais passou a ser disciplinada pelo Decreto nº 4.810, de 19 de agosto de 2003, que revogou o Decreto nº 2.840/98. Tais embarcações estão, também, sujeitas ao controle e à fiscalização de vários órgãos federais, entre eles, a Diretoria de Portos e Costa da Marinha do Brasil; Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Departamento de Polícia Federal e Ministério do Trabalho e Emprego. As embarcações estrangeiras de pesca arrendadas às empresas brasileiras continuam a arvorar a bandeira do país de origem e não perdem sua condição de estrangeiras, mas, por força do decreto acima mencionado e da Lei nº 11.959/09 equiparam-se às embarcações brasileiras de pesca.

A embarcação de pesca de bandeira estrangeira que vier operar em águas jurisdicionais brasileiras (AJB) deverá ser prévia e formalmente autorizada pelo Ministério da Pesca e Aquicultura e pela Autoridade Marítima. Dessume-se que, assim como as que arvoram o pavilhão nacional, estão sujeitas ao ordenamento jurídico pátrio, notadamente, às Convenções Internacionais ratificadas pelo Brasil, à legislação nacional aplicável à embarcação brasileira e aos ditames da Consolidação das Leis do Trabalho. É de bom alvitre destacar que há defensores nas hostes empresariais de que os tripulantes dessas embarcações devem continuar a ter sua relação de emprego regida pelas normas do país da bandeira, contrariando o já pacificado entendimento da jurisprudência trabalhista consolidado por meio da Súmula do TST n° 207, verbis:

Súmula 207. Conflitos de leis trabalhistas no espaço – Princípio da lex loci executionis. A relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviços e não por aquelas do local da contratação.

O estrangeiro tripulante de embarcação de pesca de bandeira estrangeira que vier operar em águas jurisdicionais brasileiras em virtude de contrato de arrendamento celebrado com pessoa jurídica sediada no Brasil [19] deverá atender as disposições da Resolução Normativa nº 81/08, do Conselho Nacional de Imigração [20], como pré-requisito para obtenção da autorização para o trabalho que, por sua vez, é pré-condição para obtenção do visto temporário previsto na Lei 6.815/80.

No resguardo dos interesses nacionais na defesa do trabalhador brasileiro, a empresa arrendatária deverá admitir, obrigatoriamente, tripulantes brasileiros para as embarcações arrendadas, na proporção de 2/3 da tripulação, na forma do artigo 352 da CLT. A autorização para o trabalho dos estrangeiros será pelo prazo máximo de até dois anos, na forma da resolução supracitada.

As embarcações estrangeiras que forem arrendadas por empresas armadoras de pesca ou cooperativas de pesca brasileiras com suspensão provisória de bandeira [21] no país de origem estão sujeitas ao disciplinamento contido na Lei nº 11.380, de 1º de dezembro de 2006, que instituiu o Registro Temporário Brasileiro (RTB) para embarcações de pesca, as quais devem ter, obrigatoriamente, 2/3 da tripulação composta por brasileiros, inclusive, o comandante e o chefe de máquinas.


5-IMPEDITIVOS PARA EFETIVAÇÃO DE DIREITOS SOCIAIS DOS PESCADORES.

Falsos conceitos foram incutidos nos pescadores profissionais e até nos armadores de pesca, em decorrência, há fortes impedimentos de ordem sócio-cultural para efetivação de direitos sociais em benefício do próprio pescador. A ação do Estado por meio de seus órgãos competentes tem sido rechaçada por eles e por aqueles que estão a se locupletar desse quadro, mas quem está a perder é o pescador. A fotografia do cenário em que vivem é incontestável. A primazia da realidade fala mais alto.

Exemplo de falso conceito incutido nos pescadores profissionais é que eles são artesanais e como tal gozam de proteção especial. Ora, como dito em linhas anteriores, o autêntico (no sentido de enquadramento legal) artesanal não é empregado de ninguém, já o pescador profissional e o pseudo (no sentido de não atender aos requisitos legais) artesanal serão sempre empregados, quando colocarem sua força de trabalho à disposição de terceiros mediante os requisitos contidos no artigo 3º da CLT. Dessa forma, serão segurados obrigatórios da Previdência Social com empregado, diversamente do autêntico artesanal que é segurado obrigatório como segurado especial (art. 11, I e VII, da Lei nº 8.213/91), portanto, sujeitos a tratamento diferenciado relativamente aos benefícios previdenciários, como a aposentadoria por idade, que foi garantida ao pescador artesanal independentemente de ter contribuído para a Previdência Social, de acordo com recente entendimento da Turma Nacional de Uniformização da Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais no processo nº 2006.85.00.504951-4. Outra falácia é que o pescador artesanal tem direito à aposentadoria especial, o que não é verdade, à luz da literalidade do artigo 64 do regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/99).

Outro grande entrave para efetivação de direitos sociais dos pescadores é o seguro desemprego [22], que se constitui em justa retribuição pecuniária dada aos autênticos pescadores artesanais que ficam impedidos legalmente de obterem seus sustentos no período de defeso, que é definido pelo IBAMA para reprodução de algumas espécies. Os pescadores chamam esse período de paradeiro. A quantidade de parcelas é determinada pelo tempo de suspensão da pesca, como o ocorrido com o defeso da lagosta iniciado em 01/12/08 e findado em 31/05/09, portanto, durante seis meses. Até aí tudo bem. No entanto, espertalhões que estão a explorar a mão-de-obra se utilizam do argumento de que o pescador está recebendo seguro desemprego como justificativa para não assinar suas carteiras de trabalho.

Nesse contexto, há os que verdadeiramente pescam a espécie proibida e fazem jus ao seguro-desemprego e há, também, até pseudopescadores que buscam artifícios para fraudarem a documentação para obter o seguro desemprego. Importante destacar que a Lei nº 10.779/03 ao dispor sobre a concessão do benefício de seguro desemprego ao pescador profissional que exerce a atividade pesqueira de forma artesanal, enumera no artigo 2º quais documentos são necessários ao recebimento do benefício e no artigo 4º traz as hipóteses de cancelamento do mesmo. Atendidas as exigências do artigo 2º da citada lei, resta ao servidor público ou quem recebeu delegação recepcionar tais documentos e ao se deparar com indícios de fraude, deverá comunicar tal fato a quem de direito, sob pena das sanções previstas no artigo 3º da mesma lei.

De fato, são poucos os pescadores que ficam sem exercer atividade remunerada durante o defeso. Muitos continuam a trabalhar na pesca ou em outra atividade. Quando são flagrados pela Fiscalização do Trabalho, seja a bordo ou em terra, se recusam a assinar a carteira de trabalho para não perderem o seguro-desemprego. Mais uma vez, é de se registrar que o benefício do seguro desemprego é concedido, exclusivamente, para o pescador profissional que exerça sua atividade de forma artesanal e que a espécie por ele capturada esteja proibida pelo IBAMA.

O recebimento do seguro desemprego impede o pescador artesanal de exercer atividade remunerada, desde que o faça dentro do período destinado ao defeso, é o que se depreende das hipóteses elencadas no artigo 4º da Lei nº 10.779/03. De outra forma, é possível o pescador trabalhar com carteira assinada e receber o seguro-desemprego, quando a atividade laboral estiver sendo realizada fora do período destinado ao defeso, pois o fato gerador da aquisição do benefício ocorreu em período anterior. 


6- CONDIÇÕES DE VIDA E DE TRABALHO A BORDO DE EMBARCAÇÕES DE PESCA.

Muito se tem falado em trabalho realizado em condições impostas aos trabalhadores que são degradantes e análogas às de escravo. São flagrantes constatados pela Fiscalização do Trabalho por meio de fotos e filmagens feitas nos mais remotos rincões. Assim como em terra, também há trabalho degradante e análogo ao de escravo no mar. E como há, principalmente na pesca, onde as condições de vida e de trabalho a bordo são precaríssimas, como o agravante do trabalho ser de alto risco [23] e da impossibilidade de documentá-lo em alto mar. A título de informação, em grande parte das embarcações de pesca do Norte e Nordeste brasileiro não há sequer banheiros a bordo para atender às necessidades fisiológicas e higiênicas da tripulação que, de acordo com seus portes, comportam de 4 a 8 homens que passam dias e dias ao singrar os mares em busca de pescado. Nelas, os pescadores dispõem de reduzido espaço que abriga simultaneamente cabine de comando, alojamento e cozinha. Sob tal espaço fica um motor diesel barulhento a emanar fumaça e a exalar odores. EPI (Equipamento de Proteção Individual) é coisa rara de se ver. Os beliches são dispostos de modo que o espaço entre eles serve de área de vivência, cabine de comando e cozinha, às vezes, são três camas de madeira em forma de beliche com colchões que são apenas esponjas fétidas. Como não há beliches para todos, alguém tem que dormir no chão. A água potável é racionada e acondicionada em tambores de plástico que ao passar dos dias fica com o gosto alterado e serve, também, para lavar partes do corpo para não serem corroídas pelo sal, já que o banho é feito com água salgada. A cozinha resume-se a pequeno espaço destinado a um fogão de duas bocas para preparar a comida, quando as condições do mar permitem. Diante desse quadro, por não conhecerem melhores condições de vida e de trabalho, os pescadores já se acostumaram. Sequer reclamam. As doenças proliferam.

Relativamente às embarcações de bandeira estrangeira e algumas nacionais que exploram a pesca oceânica, o contexto é completamente diferente. Oferecem boas condições de trabalho, têm cozinha, refeitório, alojamento e banheiros que atendem às necessidades da tripulação.

Por meio do Decreto nº 2.420, de 16 de dezembro de 1997, o Brasil adotou [24] a Convenção nº 126 da Organização Internacional do Trabalho sobre alojamento a bordo de embarcações de pesca marítima, desde que tenham mais de 75 AB ou 80 pés de comprimento. Tais parâmetros excluem grande parte das embarcações de pesca existentes no Brasil.

A Portaria SIT nº 36, de 29/01/08 aprovou o anexo I da Norma Regulamentadora nº 30 (NR 30) que estabelece condições mínimas de segurança e saúde no trabalho a bordo de embarcações de pesca comercial e industrial, desde que tenham 12 ou mais metros de comprimento ou 10 ou mais AB. São disposições de ordem pública e de cunho imperativo de mérito indiscutível que visam à segurança e à saúde do ser humano a bordo, mas, de pouca eficácia, pelo fato de que grande parte das atuais embarcações de pesca existentes no Brasil serem de madeira, cuja estrutura não comporta modificações para se enquadrarem minimamente a tal norma. Até naquelas que não dependem de modificações estruturais, mas somente da instalação de alguns equipamentos para atendimento da norma supracitada, há milhas e milhas a serem navegadas.


7-CONSIDERAÇÕES FINAIS.

Em que pese todo o ordenamento legal que rege o setor pesqueiro no Brasil e das inúmeras instituições que têm competências na área, longo caminho há de ser percorrido para proteção das espécies, principalmente, a humana. Relativamente às relações de trabalho, mais precisamente naquelas em que a relação entre armador de pesca e pescador é claramente de emprego, a Administração Pública poderia agir sinergeticamente com o objetivo de fazer valer os direitos sociais constitucionalmente garantidos aos sacrificados pescadores. A título de sugestão, grande passo seria dado nesse sentido se no Decreto nº 4.969/04 que regulamenta a Lei nº 9.445/97, que instituiu a subvenção econômica ao preço do óleo diesel, houvesse dispositivo condicionando-a à comprovação atestada pela Fiscalização do Trabalho que os pescadores da embarcação beneficiária estivessem em pleno gozo de seus direitos trabalhistas, pelo simples fato de seu armador explorar uma atividade econômica com fins lucrativos e receber recursos públicos para isso [25]. A Diretoria de Portos e Costa da Marinha do Brasil, instituição responsável pelo disciplinamento do setor aquaviário brasileiro poderia, também, dar grande contribuição nesse sentido, exigindo por ocasião dos despachos das embarcações, a efetiva apresentação dos contratos de trabalho dos tripulantes constantes na lista de pessoal embarcado e, na ausência deles, não liberar a embarcação até que fosse vistoriada pela Fiscalização do Trabalho. O mesmo poderia ser feito como pré-condição para o permissionamento de embarcações pesqueiras que exploram a pesca comercial industrial.

Por fim, para bem exercer seu mister na garantia dos direitos trabalhistas dos sacrificados pescadores brasileiros, a Fiscalização do Trabalho teria que dispor de profissionais especializados em trabalho aquaviário e em número suficiente. Aí, é outra história.


8-FONTES CONSULTADAS.

CARVALHO, Francisco Edivar. Trabalho Portuário Avulso. Antes e depois da Lei de Modernização dos Portos. 1ª ed. São Paulo: Ltr, 2005.

CARVALHO, Francisco Edivar. Trabalhadores do mar. Só carteira de trabalho garante direitos de marítimos. Revista Consultor Jurídico, São Paulo, 7 jul. 2008. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2008-jul-17/carteira_trabalho_garante_direitos_maritimos. Acesso em: 06 jul. 2009.

COSTA, Orlando Teixeira da. O Direito do Trabalho na Sociedade Moderna. São Paulo: LTr, 1999.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 7ª Ed. São Paulo. LTr, 2004.

LÔBO, Marcos Jatobá. Do contrato de parceria. Conceito, espécies e análise do art. 96 e incisos da Lei 4.504/66 – Estatuto da Terra. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 55, mar. 2002. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/2768>. Acesso em: 16 mai. 2009.

PRADO JUNIOR, Caio. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1979.

RODRIGUÊS, Américo Plá. Princípios de direito do trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTr, 1993.

Endereços eletrônicos

www.lexml.gov.br

www.presidência.gov.br

www.opovo.com.br

www.tribunadonorte.com.br


Notas

Região Norte. A maior contribuição para a produção total da região é aportada pela pesca artesanal ou de pequena escala.

Região Nordeste. De maneira similar à Região Norte, a produção de pescado estuarino/marinho no nordeste brasileiro é majoritariamente oriunda da pesca artesanal (cerca de 75% das capturas regionais).

Região Sudeste.A produção de pescado estuarino/marinho na região é predominantemente industrial (70% das capturas regionais).

Região Sul. Tal qual na Região Sudeste, domina na Região Sul a pesca industrial, com 80% da captura regional.

Disponível em http://www.presidencia.gov.br/estrutura_presidencia/seap/pesca. Acesso em 13 jun 09.

  1. Dispõe sobre a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Aquicultura e da Pesca e regula as atividades pesqueiras. De acordo com seu artigo 37 entrará em vigor após decorridos 60 (sessenta) dias de sua publicação oficial.
  2. Embarcação de pequeno porte é aquele de até 20 AB (toneladas de arqueação bruta). De médio porte, mais de 20 AB até 100 AB. De grande porte, acima de 100 AB (Art. 10, § 1º, I, II e III, da Lei nº 11.959/09).
  3. Aquaviário é todo aquele com habilitação certificada pela autoridade marítima para operar embarcações em caráter profissional (art. 2º, II da Lei nº 9.537/97). Os marítimos, os fluviários, os mergulhadores, os práticos, os pescadores e os agentes de manobra e docagem são considerados aquaviários (art. 1º do Decreto nº 2.596/98)
  4. Duas de cada cinco pessoas que sobrevivem da pesca artesanal no Brasil moram na região Nordeste: são 164.854 pescadores, ou 42,19% do total. O dado é do Recadastramento Nacional dos Pescadores do Brasil, divulgado na quinta-feira (28) pela Seap - Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca. Em seguida, vêm as regiões Norte (117.223 pescadores), Sudeste (48.913) e Sul (48.743). No Centro-Oeste, região com menor quantidade de pescadores, são 11.028 trabalhadores, ou 2,82% do total.O balanço mostra que o Pará é o estado com a maior número de pescadores: 77.133, quase um quinto do total. O estado seguinte é da região Nordeste: Maranhão, com 45.726 trabalhadores. Disponível em http://noticias.ambientebrasil.com.br/noticia/?id=28688. Acesso em 20 jun 09.
  5. Regime de economia familiar é o trabalho realizado pelos membros da mesma família, indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados (Art. 1º, § 1º da Lei nº 10.779/2003).
  6. A arqueação bruta corresponde à medida da capacidade dos espaços fechados da embarcação (exceto espaços para tripulação e instalação propulsora).
  7. De acordo com o diagnóstico da pesca extrativa no Brasil feito pela SEAP, o cenário da pesca no Brasil por Região é o seguinte:
  8. Armação é o ato de responsabilidade do armador em equipar a embarcação, provendo-lhe os meios necessários para empreender uma viagem de pesca, tais como abastecimento de combustível, aguada, víveres, petrechos e material de salvatagem para a tripulação, entre outros. O armador pode ser uma pessoa física ou jurídica e tem como preposto, a bordo, o comandante da embarcação, que é chamado de patrão de pesca.
  9. A relação de emprego é o nascedouro dos direitos trabalhistas. Entretanto, nem todo trabalho gera vínculo de emprego. Há trabalhadores que prestam serviço sem serem empregados. Nesse caso há uma relação de trabalho que, na lição de DELGADO (2004, p 285), tem caráter genérico, engloba toda a modalidade de contratação de trabalho humano modernamente admissível. Ainda, de acordo com o autor supracitado, a relação de emprego moldada pela CLT é espécie do gênero relação de trabalho, bem como as formas de prestação laboral do trabalhador autônomo, do trabalhador eventual e do trabalhador avulso.
  10. É mais conhecida como carteira marítima. É o documento que habilita o pescador a execer atividade como aquaviário após ser qualificado em cursos do ensino profissional marítimo promovido pela Diretoria de Portos e Costas –DPC- ou em entidade reconhecida por ela.
  11. A carteira de inscrição e registro é o documento que habilita o trabalhador aquaviário a exercer funções a bordo de embarcações, sejam elas de pesca ou não. Ainda impera entre alguns trabalhadores aquaviários, principalmente pescadores, que as anotações na carteira marítima dispensam as anotações na CTPS.
  12. Essa forma de remuneração é largamente combatida pela doutrina e jurisprudência trabalhistas. Vallentin Carrion o define da seguinte maneira: "Importância estipulada como contraprestação dos serviços que engloba vários institutos, impossibilitando verificar se se trate de horas extras, trabalho noturno, descanso remunerado etc". O TST já pacificou tal entendimento por meio da Súmula 91, nos seguintes termos: Nula é a cláusula contratual que fixa determinada importância para atender englobadamente vários direitos legais ou contratuais do trabalhador.
  13. Os trabalhadores da pesca, especialmente da lagosta, desenvolvem suas atividades sem nenhuma proteção trabalhista e previdenciária. Cerca de 95% dos pescadores cearenses que fazem essa pescaria trabalham sem carteira assinada. A situação é semelhante em toda região Nordeste e Norte. O diagnóstico é de auditores do trabalho, que participaram de reunião técnica em Fortaleza nos últimos dias 17 e 18 deste mês. Fonte: Jornal O POVO, de 24/12/07, caderno de Economia. Disponível em http://www.opovo.com.br/opovo/economia/754497.html. Acesso em 01 jul 2009.
  14. Um dos Princípios do Direito do Trabalho é o da primazia da realidade, que é definido por Américo Plá Rodriguês da seguinte forma: "Em caso de discordância entre o que ocorre na prática e o que emerge de documentos ou acordos, deve-se dar preferência ao primeiro, isto é, ao que sucede no terreno dos fatos (Princípios de Direito do Trabalho, Américo Plá Rodrigues, LTr, Ed. USP, 1978, p. 217).
  15. LÔBO, Marcos Jatobá. Do contrato de parceria. Conceito, espécies e análise do art. 96 e incisos da Lei 4.504/66 – Estatuto da Terra. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 55, mar. 2002. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/2768>. Acesso em: 16 mai. 2009.
  16. A Consolidação das Leis do Trabalho disciplina nos artigos 611 a 625 as convenções coletivas de trabalho. O artigo 611 define convenções coletivas de trabalho com o acordo de caráter normativo, pelo qual dois ou mais sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais do trabalho.
  17. Patrão de pesca é a denominação legal (Decreto nº 2.596/98) dada ao comandante de uma embarcação de pesca, na qual são desempenhadas diversas funções, como a de guincheiro, cozinheiro, motorista de pesca, gelador etc. Essas dominações variam de acordo com a região do país.
  18. A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, assinada Montego Bay por 150 países em 1982, estabeleceu a chamada Zona Econômica Exclusiva – ZEE, a qual se constitui numa faixa que se estende além do mar territorial de 12 milhas até o limite das 200 milhas marítimas. Nessa área o Estado costeiro detém uma série de prerrogativas. Em decorrência, foi editada a Lei nº 8.617/1993 que dispõe sobre o mar territorial, a zona contígua, a ZEE e a plataforma continental brasileiros.
  19. Exclusivamente para o trabalho de espanhóis no Brasil foi firmado convênio de seguridade social entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo do Reino da Espanha, promulgado pelo Decreto nº 1.689, de 07 de novembro de 1995, cujas disposições amparam trabalhadores de ambos os países, exclusivamente, em aspectos previdenciários, como assistência médica, incapacidade temporária para o trabalho, invalidez, tempo de serviço, morte, acidente de trabalho e doença profissional, entre outros, amparados pelo Regime Geral da Seguridade Social, é o que prevê o artigo 2º, item 01, alínea "a" do aludido decreto.
  20. O Conselho Nacional de Imigração (CniG), órgão colegiado, com representação tripartite (governo, empregados e empregadores) integra a estrutura administrativa do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e é o responsável pela formulação da política de imigração, cujas deliberações externam-se por meio de resoluções de três espécies, quais sejam, as normativas, as recomendadas e as administrativas, segundo a Portaria MTE nº 634/96. Por ter composição tripartite, nem sempre suas deliberações são técnicas, como o ocorrido com a revogação da RN 59/04 pela RN 81/08.
  21. Suspensão provisória de bandeira, de acordo com o Artigo 2º, II, da Lei nº 11.380/06, é ato pelo qual o proprietário da embarcação estrangeira, arrendada ou afretada, suspende, temporariamente, o uso da bandeira do país de origem, a fim de que a embarcação seja inscrita em registro de outro país.
  22. A Lei nº 10.779/03 disciplina a concessão do benefício de seguro desemprego, durante o período de defeso, ao pescador profissional que exerce a atividade pesqueira de forma artesanal.
  23. Uma embarcação pesqueira naufragou na noite da última sexta-feira a 540 quilômetros de Natal. O Comando do 3º Distrito Naval foi acionado pelo gerente de frota da empresa "Pesc Mar" e por volta das 21h a Marinha do Brasil acionou outro barco pesqueiro, o "Natal Pesca VII", que estava a 50 quilômetros do local do acidente. O "Inpromar II" estava com dez tripulantes, incluindo o comandante. Todos foram salvos e levados ao Arquipélago de Fernando de Noronha, a 180 quilômetros do naufrágio. Fonte: Jornal a Tribuna do Norte, de 14/09/08. Disponível em http://tribunadonorte.com.br/noticias/87183.html. Acesso em 03 jul 09.
  24. O Brasil é um dos países do mundo que mais adotam convenções da OIT. À título de exemplo, relativamente à pesca, há as seguintes: Convenção nº 133 ( Exames Médicos de Pescadores); Convenção 114 (Contrato de engajamento de pescadores); Convenção nº 125 (Certificado de competência de pescadores); Convenção nº 126 (Alojamento de tripulação). Encontra-se em andamento na OIT, a Convenção 188 com o objetivo de substituí-las por uma coisa mais moderna.
  25. Somente no Estado do Rio Grande do Norte, segundo o Prof. Antônio Alberto Cortez, Subcretário de Pesca e Aquicultura do RN, nos anos de 2003 a 2009 a isenção de ICMS para embarcações de pesca foi no montante de R$ 17 milhões. Fonte: A Tribuna do Norte. Caderno de Economia. 05 de julho de 2009. Disponível em: http://tribunadonorte.com.br/noticias/114770.html Acesso em 05 jul 2009.

Autor

  • Francisco Edivar Carvalho

    Professor universitário, graduado e pós-graduado em Administração de Empresas. Especialista em Direito do Trabalho. Auditor Fiscal do Trabalho. Autor dos livros Empregado Doméstico (LTr 2001) e Trabalho Portuário Avulso (LTr 2005).<br>.

    Textos publicados pelo autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Francisco Edivar. Trabalho na atividade pesqueira à luz do Direito do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2198, 8 jul. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13113. Acesso em: 16 abr. 2024.