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O novo tipo penal estupro de vulnerável e suas repercussões em nossa sistemática jurídica

O novo tipo penal estupro de vulnerável e suas repercussões em nossa sistemática jurídica

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RESUMO

Em decorrência de novas demandas da sociedade no sentido de adaptar nosso Código Penal às novas realidades sociais, e da iniciativa da CPMI da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, produziu-se o PLS nº. 253/04, que findou na promulgação da Lei 12.015/09, que trouxe variadas alterações ao Título VI do Código Penal. Por ocasião desta Lei, foi introduzida uma nova figura típica em nosso ordenamento jurídico: o art. 217-A do CP - o Estupro de Vulnerável, que será o objeto central de nosso estudo, cujo enfoque será no sujeito passivo menor de 14 anos. Diante da importância do estudo deste novo tipo penal, e da escassa literatura acerca do mesmo, realizamos uma pesquisa bibliográfica qualitativa, no sentido solver a seguinte problemática: a introdução do crime de Estupro de Vulnerável em nossa sistemática jurídica representou avanço ou retrocesso em relação às previsões legais anteriormente vigentes? Para tanto, teremos como objetivo geral a análise do novo tipo penal Estupro de Vulnerável, e especificamente: indicar as disposições doutrinárias acerca do mesmo; analisar a constitucionalidade do tipo e seus efeitos na Lei de Crimes Hediondos; e, por fim, estabelecer uma crítica comparativa acerca dos conceitos da anteriormente vigente Presunção de Violência, e a dita Objetividade Fática do tipo em apreço.

Palavras-chave: Estupro de Vulnerável. Menor de 14 anos. Avanço ou retrocesso. Disposições doutrinárias. Constitucionalidade. Lei de Crimes Hediondos. Presunção de Violência e Objetividade Fática.

ABSTRACT

As a result of new demands of society to adapt our Penal Code to new social realities, and of the initiative of JPCI on Sexual Exploitation of Children and Adolescents, was produced Senate Bill No. 253/04, which ended in the promulgation of Law 12.015/09, which brought various amendments to Title VI of Penal Code. At this Act, was introduced a new typical figure in our legal system: the art. 217-A of PC - the Rape of Vulnerable, which is the central object of our study, which focus is on the younger than 14 years passive subject. Due to the importance of studying this new criminal type, and to the limited literature about it, we conducted a qualitative literature research, in order to solve the following problem: the introduction of the crime of Rape of Vulnerable in our legal systematic represented advancement or retreat in relation to legal provisions previously in force? Therefore, we’ll have as general objective analyzing the new criminal type Rape of Vulnerable, and specifically: indicating the doctrinaire provisions about it; analyzing the constitutionality of the type and its effects on Heinous Crimes Law, and, finally, to establish a comparative critic about the concepts of the previously existing Violence Presumption, and the said Factual Objectivity of the type in analysis.

Key-words: Rape of Vulnerable. Younger than 14 years. Advancement or retreat. Doctrinaire provisions. Constitutionality. Heinous Crimes Law. Violence Presumption or Factual Objectivity.

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1. O ANTIGO TÍTULO VI DO CÓDIGO PENAL. 2. A NOVA LEI 12.015/09: 2.1 Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual: modificações trazidas pela nova Lei; 2.2 Exposição de Motivos do PLS nº 253/04 e a Nova Lei 12.015/09; 3. ART. 217-A: ESTUPRO DE VULNERÁVEL: 3.1 Conceito e Elementos do Tipo; 3.2 Elemento Subjetivo do Tipo; 3.3 Consumação e Tentativa; 3.4 Modalidades Típicas ; 3.5 Classificação Doutrinária; 3.6 Penas Cominadas; 4. LEI Nº. 12.015/2009 E A LEI DE CRIMES HEDIONDOS. 5. AÇÃO PENAL DIANTE DA LEI 12.015/09; 5.1 Quadro Sinótico da Ação Penal; 6 GARANTIAS CONSTITUCIONAIS CRIMINAIS; 6.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana; 6.2 Princípio da Adequação Social; 6.3 Princípio da Proporcionalidade; 6.4 Princípio da Culpabilidade; 6.5 Princípio da Individualização da Pena; 6.6 Princípio da Presunção de Inocência; 7. PRESUNÇÃO DE VIOLÊNCIA VERSUS OBJETIVIDADE FÁTICA; CONCLUSÃO.


INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, em especial a partir dos anos 80, vem-se constatando um novo clamor da sociedade no sentido de adaptar nosso ordenamento jurídico às novas realidades sociais e expressões culturais que vêm se estabelecendo em nosso país com a evolução do tempo. Este clamor é especialmente devotado ao âmbito penal, vez que nosso Código é uma Lei que, publicada em 1940, resta anciã nestes novos tempos.

Destarte, dezenas de transformações foram introduzidas no referido dispositivo, como por exemplo, a extinção do crime de Adultério, acompanhando as novas concepções sociais a respeito do casamento, e as próprias disposições constitucionais que apregoam princípios que consolidam um Direito Penal mínimo, a última medida de controle social aplicável.

Em decorrência destas novas preocupações e anseios, é que, de uma iniciativa da CPMI da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, que produziu o Projeto de Lei do Senado nº. 253 de 2004, foi promulgada, em 07 de agosto do deste ano, a Lei 12.015, trazendo consigo vultosas alterações, com especial destaque ao Título VI do Código Penal, anteriormente denominado "Dos Crimes Contra os Costumes", passando agora a chamar-se "Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual".

Por ocasião desta nova Lei, foi introduzido um novo tipo penal em nosso ordenamento jurídico, a figura típica do art. 217-A do Código Penal, o Estupro de Vulnerável, que será o objeto central de nosso estudo, com enfoque no sujeito passivo menor de 14 anos.

Diante da importância da introdução deste novo tipo penal em nosso ordenamento jurídico, e da escassa literatura acerca deste tema, em virtude de sua recente promulgação, entendemos de essencial relevância a reflexão acerca dos efeitos sociais e jurídicos provenientes desta alteração.

A problemática desta produção se constituirá no seguinte questionamento: a introdução do crime de Estupro de Vulnerável em nossa sistemática jurídica representou um avanço, ou um retrocesso em relação às previsões legais anteriormente vigentes?

Desta forma, teremos como objetivo geral a análise do novo tipo penal Estupro de Vulnerável, e especificamente: indicar o conceito, os elementos objetivo e subjetivos do tipo, consumação e tentativa, modalidades típicas, classificação doutrinária, penas cominadas e ação penal; analisar a constitucionalidade do tipo à luz dos Princípios Constitucionais, além de seus efeitos na Lei de Crimes Hediondos; e, por fim, estabelecer uma crítica acerca das implicações da figura típica do Estupro de Vulnerável em nossa sistemática jurídica, estabelecendo uma comparação entre os conceitos da pretérita Presunção de Violência, e a vigente Objetividade Fática do tipo.

Para tanto, teremos como método uma pesquisa bibliográfica qualitativa, na medida em que utilizaremos doutrina por nós elegida, para fundamentarmos nossas colocações e entendimentos, estabelecendo críticas durante o decorrer do trabalho.

Desta feita, sem a pretensão de esgotar a discussão acerca do assunto e a polêmica gerada por este, nos dedicaremos, ao longo deste artigo, a apontar sinteticamente as transformações inseridas em nosso ordenamento jurídico pela Lei 12.015/09, com enfoque específico na nova figura típica Estupro de Vulnerável, apontando as disposições doutrinárias referentes ao mesmo, além de nossas próprias considerações acerca de suas implicações no contexto social brasileiro.


1 O ANTIGO TÍTULO VI DO CÓDIGO PENAL

O objetivo principal do pretérito Título VI do Código Penal, que tratava "Dos Crimes Contra os Costumes", era tutelar a moralidade e a eticidade nos comportamentos sexuais, como bem aponta Hungria (1956; p. 103-104): "O que a lei penal se propõe a tutelar, in subjecta materia, é o interesse jurídico concernente à preservação do mínimo ético reclamado pela experiência social em torno dos fatos sexuais". Esta afirmação refletia o pensamento da época em que foi promulgado nosso Código Penal, em 1940.

O título em análise passou por algumas modificações em 2005, com a Lei nº. 11.106, na busca de acompanhar o desenvolvimento dos valores sociais e culturais que surgiam com a adoção de novos costumes. Tais transformações, no entanto, não foram suficientes, visto que, ainda assim, a proteção oferecida pelo título ainda se destinava a conceitos já ultrapassados acerca da sexualidade, e do controle estatal sobre a mesma.

Durante muito tempo se discutiu a necessidade de mudar, não só os tipos penais constituintes do Título em apreço, assim como sua própria denominação, vez que as expressões que introduzem os tipos penais delimitam o próprio objeto da lei, e o bem jurídico a ser protegido.

Assim surgiu o Projeto de Lei do Senado nº 253, em 2004, a partir de uma iniciativa da CPMI da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, que introduziu a nova Lei 12.015/09, cinco anos depois, incutindo novas percepções sociais acerca do papel estatal na defesa da liberdade e dignidade sexual, em uma busca de o foco de proteção do Estado a estes valores.

A grande questão a ser analisada no estudo desta nova norma é se esta realmente acompanhou o desenvolvimento dos valores sociais, cumprindo o objetivo que a própria sociedade já clamava, ou se esta, além de não acompanhá-los, fez retroceder o avanço alcançado ao longo de tantos anos de debates e luta pela evolução dos costumes, e mínima intervenção penal.

A nosso ver, o novo crime trazido pela nova norma, o Estupro de Vulnerável, é uma das grandes mostras das verdadeiras alterações trazidas pela mesma, de modo que, em virtude disto, após uma breve introdução acerca das novas disposições legais, passaremos a discorrer sobre o tipo Estupro de Vulnerável, estabelecendo comparações como a Lei antiga e, por fim, fornecendo nossas próprias conclusões acerca da introdução desta nova conduta típica em nosso ordenamento jurídico.


2 A NOVA LEI 12.015/09

Em 7 de agosto do ano corrente de 2009, foi promulgada a Lei 12.015, sendo publicada do Diário Oficial da União, em 10 do mesmo mês, trazendo em si significativas mudanças em relação ao Título VI do Código Penal, anteriormente denominado "Dos Crimes Contra os Costumes".

A nova Lei surgiu de uma iniciativa da CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, que, juntamente com o Ministério da Justiça, a Secretaria Especial de Direitos Humanos, o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Federal, a Defensoria Pública da União, e a Organização Internacional do Trabalho, deu origem ao Anteprojeto de Lei que, por sua vez, forneceu os parâmetros basilares para a formação do Projeto de Lei nº. 253 de 2004 do Senado Federal, cujo objetivo seria justamente a criação da nova Lei.

Ter o conhecimento da origem de tal Projeto é o que torna possível discernir as motivações que levaram a propositura do mesmo, e, portanto, os bens jurídicos que este procura proteger, possibilitando a análise da coerência entre os objetivos do Projeto, e o que o legislador realmente alcançou na formulação da nova Lei.

2.1 Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual: modificações trazidas pela nova Lei

Com a nova redação do Título VI do Código Penal Brasileiro, diversas e abrangentes foram as transformações sofridas pelo ordenamento jurídico penal, com a modificação de crimes já existentes, a supressão de outros e, ainda, a criação de novos tipos.

Assim, podemos citar como os tipos constituintes da nova Lei: Estupro (Art. 213); Violação sexual mediante fraude (Art. 215); Assédio sexual (Art. 216-A); Estupro de vulnerável (Art. 217-A); Corrupção de menores (Art. 218); Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente (Art. 218-A); Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável (Art. 218-B); Mediação para servir a lascívia de outrem (Art. 227); Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual (Art. 228); Casa de prostituição (Art. 229); Rufianismo (Art. 230); Tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual (Art. 231); Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual (Art. 231-A); Ato obsceno (Art. 233); Escrito ou objeto obsceno (Art. 234);

Em contrapartida, houve tipos penais que se encontravam nas anteriores previsões legais que não foram modificados, mas que restaram revogados pela Lei 12.105/09; entre eles os pretéritos artigos 214 (Atentado violento ao pudor) e o 216 (Atentado ao pudor mediante fraude), assim como os artigos 223 e 224, que tratavam, respectivamente das Formas Qualificadas e da Presunção de Violência, e o art. 232, que tratava destes mesmos artigos.

2.2 Exposição de Motivos do PLS nº 253/04 e a Nova Lei 12.015/09

Fácil notar que, por advir de iniciativa de uma CPMI destinada à investigação da Exploração Sexual, o Projeto de Lei em questão se destina, em especial, justamente à proteção do bem jurídico dignidade sexual, com destaque para crianças e adolescentes.

A motivação inicial apontada no Projeto de Lei são os reclames da sociedade por uma legislação penal mais atualizada, e em acordo com as novas concepções sociais acerca da sexualidade, pois considera-se que nosso Código Penal, por ser de 1940, já não atende de forma eficaz as novas demandas sociais. Deste modo, a primeira preocupação do projeto foi a mudança do Título VI do Código Penal, que antes era denominado de "Dos Crimes Contra os Costumes", passando a ser conhecido como "Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual".

Verifica-se, a partir do contraste entre as expressões "Costumes" versus "Dignidade Sexual", que o bem jurídico que agora se busca salvaguardar é diametralmente diverso do anterior, na medida em que se preocupava com as concepções sociais acerca da sexualidade, com os valores morais atribuídos a esta, e não com a própria naturalidade e dignidade em relação ao objeto, e com o indivíduo ofendido imediatamente.

Neste sentido, a Justificação do Projeto de Lei 253/04:

Para a ciência penal, os nomes e os títulos são fundamentais, pois delineiam o bem jurídico a ser tutelado. Assim, a concepção atual brasileira não se dispõe a proteger a liberdade ou dignidade sexual, tampouco o desenvolvimento benfazejo da sexualidade, mas hábitos, moralismos e eventuais avaliações da sociedade sobre estes. Dessa forma, a construção legislativa deve começar por alterar o foco da proteção, o que o presente projeto de lei fez ao nomear o Título VI da Parte Especial do Código Penal como Dos crimes Contra a Liberdade e o Desenvolvimento Sexual [01]. (SENADO FEDERAL, PLS nº 253, 2004). (grifo nosso)

Ainda em se tratando das concepções morais intrínsecas à antiga redação do Código Penal, este trazia, em seu Título VI, determinadas previsões legais que traziam em seu tipo, como causa de aumento de pena, ou até mesmo como elementar do tipo, expressões como "praticá-lo contra mulher virgem, menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos", como, por exemplo, nos antigos crimes de Violação Sexual Mediante Fraude e o crime de Sedução.

Via-se aqui o equívoco do legislador, ao valorar a medida da proteção que merece a vítima, com base em sua virgindade ou ausência desta, quando na verdade sua maior proteção deveria dar-se, única e exclusivamente, por sua tenra idade. Assim justificou o mencionado Projeto: "Ora, o crime contra pessoas que se encontram em determinada faixa etária não deve ser condicionado à virgindade, nem crimes contra mulheres devem ser avaliados por sua pretensa honestidade (...)".

Outra modificação bastante significativa trazida pela nova Lei, foi justamente a conversão do crime de Estupro em uma conduta na qual, tanto homem, quanto mulher, poderiam ser sujeito ativo ou passivo. Isto porque antes o Estupro somente se daria por meio da conjunção carnal (cópula vagínica), como anteriormente explicado. Assim, restava discriminatória a disposição do legislador ao prever crimes distintos, para condutas semelhantes (pois ambos advêm de ato sexual) e bens jurídicos iguais (a liberdade sexual), com base exclusivamente no gênero da vítima.

Corrobora tal afirmação, novamente, a Justificação do supramencionado Projeto:

(...) o presente projeto, por inspiração da definição ínsita no Estatuto do Tribunal Penal Internacional, cria novo tipo penal que não distingue a violência sexual por serem vítimas pessoas do sexo masculino ou feminino. (...) A nova redação pretende também corrigir outra limitação da atual legislação, ao não restringir o crime de estupro à conjunção carnal em violência à mulher, que a jurisprudência entende como sendo ato sexual vaginal. (SENADO FEDERAL, PLS nº 253, 2004).

Por fim, como já afirmado, o PLS nº. 253/04 foi uma proposição da CPMI da Exploração sexual, de modo que seu enfoque principal certamente é a proteção á liberdade e dignidade sexual de crianças e adolescentes, contra este tipo de exploração. Por este motivo é que, de forma mais explícita, porém não tão acertada, o novo crime faz jus a sua origem ideológica, na medida em que protege estas vítimas tão específicas, em razão de sua idade e maturidade sexual, tanto no aspecto físico, quanto psicológico.

Explica-se na Justificação que:

O constrangimento agressivo previsto pelo novo art. 213 e sua forma mais severa contra adolescentes a partir de 14devem, ser lidos a partir do novo art. 217 proposto. Esse artigo, que tipifica o estupro de vulneráveis, substitui o atual regime de presunção de violência contra criança ou adolescente menor de 14 anos, previsto no art. 224 do Código Penal. (SENADO FEDERAL, PLS nº 253, 2004).

Deste modo, não há mais que se falar em Presunção de Violência no crime de estupro contra menor de 14 anos, pois se considera aqui que, em virtude da tenra idade, a prática sexual é, em qualquer hipótese, uma violação da liberdade e dignidade sexual do ofendido. Assim descreve a Justificação, quando diz que:

O projeto de reforma do Código Penal, então, destaca a vulnerabilidade de certas pessoas, não somente crianças e adolescentes, mas também a pessoa que, por enfermidade ou doença mental, não possuir discernimento para a prática do ato sexual, e aquela que não pode, por qualquer motivo, oferecer resistência; e com essas pessoas considera como crime ter conjunção carnal ou praticar qualquer outro ato libidinoso; sem entrar no mérito da violência e sua presunção. Trata-se de objetividade fática. (SENADO FEDERAL, PLS nº 253, 2004). (grifo nosso)

Em virtude deste novo entendimento, nos ateremos, no decorrer deste trabalho, ao novo tipo penal Estupro de Vulnerável, apontando nossa compreensão sobre este, e as considerações doutrinárias acerca do mesmo, abordando para tanto, seu conceito, os elementos objetivos e subjetivos do tipo, suas modalidades típicas, e a ação penal cabível, além de outros aspectos que julgamos necessários à compreensão dos efeitos desta nova mudança em nosso ordenamento jurídico penal.


3 ART. 217-A: ESTUPRO DE VULNERÁVEL

Entre os Crimes Contra a Dignidade Sexual, certamente o crime de Estupro é o que mais se destaca por sua gravidade e reprovação, por atingir não somente a esfera física do indivíduo, mas também seu bem estar psicológico.

O antigo art. 213 descrevia o crime de Estupro, descrevendo o tipo como: "Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça. Pena- reclusão, de 6 a 10 anos". Era, como se pode depreender da descrição, uma espécie de constrangimento ilegal, cuja ação nuclear consistia em constranger mulher à conjunção carnal, cujos meios poderiam ser tanto a grave ameaça, quanto a violência real, exigindo-se para a consumação do crime, o dissenso da vítima.

O art. 214, por sua vez, descrevia o crime de Atentado Violento ao Pudor, consistindo na prática de atos libidinosos diversos da conjunção carnal [02], quando previa que: "Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal: Pena- reclusão, de 6 a 10 anos". Assim como no antigo crime de Estupro (e também no atual), também exigia dissenso da vítima, de modo que o crime deveria proceder mediante violência real ou grave ameaça.

O que ocorre agora, com a nova Lei 12.015/09, é que o crime de Estupro passou a abarcar, além do anteriormente previsto, também as condutas delitivas do Atentado Violento ao Pudor (revogado), de modo que passou a dispor da seguinte forma: "Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos". Note-se que, na verdade, não houve efetiva criação de uma nova conduta típica, se não a agregação de duas já existentes, com meios de execução, condutas e penas semelhantes.

Quando passamos a considerar este crime sob a perspectiva de uma vítima infante ou adolescente, o tipo adquire um caráter ainda mais repugnante e merecedor de repreensão estatal, pois, como disposto no art. 227, em especial no seu §4º, da própria Carta Magna de nosso país:

Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 1º - (...)

§ 2º - (...)

§ 3º - (...)

§ 4º - A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente. (BRASIL, 1988). (grifo nosso)

Desta feita, foi trazido pela nova Lei o crime Estupro de Vulnerável, e, em virtude da proteção constitucional acima demonstrada, nos ateremos às vítimas crianças e adolescentes, quando tratando desta nova conduta típica.

3.1 Conceito e Elementos do Tipo

Discorre o caput do art. 217-A do Código Penal: "Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos".

Temos assim que incorre no crime de Estupro de vulnerável aquele que realiza atos sexuais, que podem incluir tanto a conjunção carnal, como qualquer outro ato libidinoso, com menor de 14 anos. Destacam-se, portanto, duas ações nucleares distintas "ter" conjunção carnal, e "praticar" outro ato libidinoso. Essa multiplicidade de meios de produção do crime advém de outra mudança introduzida pela Lei 12.015/09, que é já mencionada a absorção do Crime de Atentado Violento ao Pudor, que tratava os atos libidinosos diversos da conjunção carnal, pelo crime de Estupro, que tratava somente do coito vagínico.

Pela legislação anterior, a proteção às vítimas menores de 14 anos ocorria através do art. 224 do CP, nas Disposições Gerais dos Crimes Contra a Liberdade sexual, através da cominação de pena mais gravosa para quem cometesse os crimes de Estupro ou atentado Violento ao Pudor contra pessoas nesta faixa etária. Descrevia o artigo que: "Presume-se a violência, se a vítima: Não é maior de 14 anos. É alienada ou débil mental, que o agente conhecia essa circunstância. Não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência".

O artigo em tela previa o fenômeno da Presunção de Violência [03], por considerar que, em virtude de sua idade e imaturidade, tanto física, quanto psicológica, o passivo do crime seria indefeso, e, por este motivo, incapaz de consentir na prática do ato sexual, presumindo-se deste modo, a violência da conduta. Não era exigido o dissenso da vítima, de modo que bastava a vítima encontrar-se em uma das hipóteses do artigo para que se materializasse o crime, representando uma verdadeira adoção da Responsabilidade Objetiva pelo Código Penal, contrariando postulados fundamentais do mesmo, vez que os fatos não devem ser tratados como se presumíveis fossem.

Diante desta celeuma, a doutrina se inclinava para a relativização da Presunção de Violência, considerando o consentimento da vítima como válido em determinados casos, corroborando com este entendimento, Nucci:

Uma menor de 14 anos prostituída, que já tenha tido inúmeros contatos sexuais, com a ciência geral da comunidade, inclusive de sues pais, não poderia ser considerada incapaz de dar o seu consentimento. Não seria razoável – e o direito, em última análise, busca a justiça – punir o agente por estupro, caso mantenha com a jovem conjunção carnal. (NUCCI, 2007, p. 839).

O entendimento dos Tribunais, no entanto, não seguia a mesma tendência, considerando totalmente inválido o consentimento do menor de 14 anos, afirmando ser a Presunção absoluta. Apesar disso, nos últimos anos, até mesmo os Tribunais Superiores começavam a aceitar a Presunção como relativa, em uma demonstração de adaptação da norma à evolução da realidade social.

A alteração do Título VI, do Código Penal, trazida pela Lei 12.015/09, incluiu também uma importante mudança no que diz respeito aos sujeitos ativo e passivo do crime, qual seja a possibilidade de que tanto o agente, quanto a vítima, possam ser do sexo masculino, ou feminino, sem que isto importe o enquadramento da conduta em outro tipo penal, isto porque já não exige características ou condições morfológicas especiais do agente para a realização de tal conduta, exigindo-se, por outro lado, em relação à vítima, que esta seja menor de 14 anos.

O que ocorre com o novo tipo penal é que não exige que o crime proceda mediante violência real ou grave ameaça. Importa dizer, por conseqüência, que, como já demonstrado previamente, não se trata aqui de presunção de violência, nem relativa, nem absoluta, mas sim de "objetividade fática", isto é, basta que a vítima seja menor de 14 anos para que se configure o crime, mesmo que não haja violência, real ou ficta, nem mesmo ameaça, direta ou indireta, explícita ou implícita.

Compartilhando este pensamento, Greco:

(...) surge em nosso ordenamento jurídico penal, fruto da Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009, o delito que se convencionou denominar de estupro de vulnerável, justamente para identificar a situação de vulnerabilidade que se encontra a vítima. Agora, não poderão os Tribunais entender de outra forma quando a vítima do ato sexual for alguém menor de 14 (quatorze) anos. (GRECO, 2009, p. 65).

O que se poderia questionar, a partir destes apontamentos, é: o Estupro de vulnerável realmente atendeu a este objetivo, ou simplesmente ratificou de forma ainda mais gravosa uma situação jurídica já estabelecida?

Na verdade, embora a Justificação do Projeto de Lei considere que não há mais que se falar em Presunção de Violência, o novo tipo penal simplesmente provoca efeito no sentido de que há violência ficta na realização da conduta, recaindo no entendimento de uma presunção absoluta, pois presume-se que, em qualquer hipótese, independentemente das circunstâncias fáticas, a suposta vítima é incapaz de consentir.

3.2 Elemento Subjetivo do Tipo

O chamado elemento subjetivo do crime, ou elemento normativo, é a culpa lato sensu, composta, por sua vez pelo dolo, que pode ser direto ou eventual, e pela culpa. Sem estes elementos do fato típico, segundo as Teorias Bipartida e Tripartida, não se configura o crime.

Levando em consideração a conduta descrita no art. 217-A, podemos inferir que o crime Estupro de vulnerável admite tão somente a modalidade dolosa, nos moldes do art. 18, inc. I: "Diz-se o crime: I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo". Este dolo poderá ser direto, quando o agente souber da circunstância da vítima ser menor de 14 anos, optando ainda assim pela realização da conduta; ou eventual, quando o sujeito, embora não tenha certeza da tenra idade da vítima, mas pudesse percebê-la por seu aspecto físico, assumindo mesmo assim o risco de realizar a conduta.

Não há pela descrição do tipo como conceber a modalidade culposa, pois o retromencionado artigo, em seu inc. II descreve que: "Diz-se o crime: II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia", de modo que o tipo do 217-A não tangencia o conceito de culpa stricto sensu.

Em que pese o caput do art. 20 do Código Penal, este descreve que: "O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei".

Inferimos desta previsão legal que, em não sabendo o agente sobre a idade da vítima por esta possuir um desenvolvimento físico que a faça parecer adulta, levando o agente ao erro sobre uma elementar do tipo (a idade da vítima), poderão ocorrer duas situações: a primeira, se o agente não pratica o ato sexual mediante violência, nem grave ameaça, excluindo-se o dolo e a tipicidade da conduta; a segunda, se o faz mediante violência ou grave ameaça, caso em que a conduta recairá no tipo do art. 213, o Estupro.

Neste sentido, Greco:

No que diz respeito à idade da vítima, para que ocorra o delito em estudo, o agente, obrigatoriamente, deverá ter conhecimento de ser ela menor de 14 (catorze) anos, pois, caso contrário, poderá ser alegado o chamado erro de tipo que, dependendo do caso concreto, poderá conduzir até mesmo à atipicidade do fato, ou a sua desclassificação para o delito de estupro, tipificado no art. 213 do Código Penal. (GRECO, 2009, p. 66-67).

Complementa ainda seu pensamento, quando afirma que:

Se, na hipótese concreta, o agente desconhecia qualquer uma dessas características constantes da infração penal em estudo, poderá ser alegado o erro de tipo, afastando-se o dolo e, consequentemente, a tipicidade do fato. Não é admissível a modalidade culposa, por ausência de disposição legal expressa nesse sentido. (GRECO, 2009, p. 75).

Assim sendo, conclui-se que para a configuração do crime Estupro de Vulnerável, é necessário que o sujeito ativo conheça da característica pessoal da vítima, qual seja o fato de ser menor de 14 anos, ou ao menos que, não tendo certeza, mas sabendo do risco, persista no intuito e na realização da conduta.

3.3 Consumação e Tentativa

O momento consumativo do crime é aquele em que se realiza a conduta nele descrita. Portanto, o crime de Estupro de Vulnerável se consuma no instante em que o agente tem a conjunção carnal, com a penetração, total ou parcial, ou pratica ato libidinoso diverso do coito vaginal, com a penetração anal, ou o sexo oral, por exemplo.

Afirma este entendimento, Greco:

(...) o delito de estupro de vulnerável se consuma com a efetiva conjunção carnal, não importando se a penetração foi total ou parcial, não havendo, inclusive, necessidade de ejaculação. Quanto à segunda parte prevista no caput do art. 217-A do estatuto repressivo, consuma-se o estupro de vulnerável no momento em que o agente pratica qualquer outro ato libidinoso com a vítima. (GRECO, 2009, p. 74).

A tentativa, deste modo, se dará quando, por circunstâncias alheias à vontade do agente, não conseguir realizar a conjunção carnal ou o ato libidinoso necessário à configuração do crime, nos moldes do art. 14, inc. II do CP, e seu parágrafo único: "Diz-se o crime: II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. Parágrafo único - Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços".

3.4 Modalidades Típicas

Depreende-se da previsão legal do art. 217-A, que este possui uma modalidade simples, contida no caput do artigo, já estudado nesta produção, com complementação no §1º, e duas modalidade qualificadas, nos §§ 3º e 4º.

Quanto à complementação de sua modalidade simples, esta prevê que poderão ser agentes do crime Estupro de vulnerável aqueles que o cometerem contra pessoas com enfermidade ou deficiência mental, ou que não possam oferecer resistência ao ato, como dispõe o §1º do art. 217-A: "Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência".

As formas qualificadas, assim o são por protegerem, além do bem jurídico dignidade sexual, a integridade física do indivíduo e sua vida, respectivamente, como preveem os supracitados parágrafos: "§3º - Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos. §4º - Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos".

3.5 Classificação Doutrinária

Quanto à sua classificação, temos que o crime Estupro de Vulnerável é: em relação à conjunção carnal, crime de mão-própria, visto que exige atuação pessoal do sujeito ativo, e comum, em relação aos demais atos libidinosos; é próprio em relação à vítima, pois esta necessariamente deverá ser menor de 14 anos (caput); doloso, como já apontado; e comissivo, pois é praticado mediante ação do agente, cabendo no entanto a omissão imprópria, quando o sujeito ativo for garantidor;

É ainda crime material, pois o tipo menciona a conduta e o evento, exigindo sua produção para que se consume o mesmo, podendo ser de forma vinculada, quanto à conjunção carnal, ou de forma livre, quanto aos demais atos libidinosos; de dano, pois somente se consuma com a efetiva lesão do bem jurídico dignidade sexual; simples, pois apresenta um tipo penal único; e, por fim, plurissubsistente, pois se perfaz com vários atos, admitindo, por este mesmo motivo, tentativa.

3.6 Penas Cominadas

Dispõe o art. 217-A do CP:

Art. 217-A - Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:

Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

§ 1o Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.

§ 2o (VETADO).

§ 3o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.

§ 4o Se da conduta resulta morte:

Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. (BRASIL, 2009). (grifo nosso)

Como se pode observar, a pena aplicada à forma simples do Estupro de vulnerável pode ir de 8 (oito) a 15 (quinze) anos, independendo do ofendido a quem a conduta se dirige. Assim, se comparada com a pena prevista para o crime de Estupro na lei antiga, de 6 (seis) a 10 (dez) anos, a penalidade prevista para a nova conduta delitiva é muito mais gravosa, equiparando-se inclusive, quanto ao seu limite mínimo, à pena prevista para a forma qualificada do atual crime de estupro, se praticado contra menor de 18 anos e maior de 14, enquanto que seu limite máximo pode alcançar até três anos a mais.

Em sua forma qualificada pelo resultado de lesão corporal de natureza grave, a pena possui um limite mínimo de 10 (dez) anos, e um máximo de 20 (vinte); na modalidade qualificada pelo resultado de morte, a pena poderá variar de 12 (doze) a 30 (trinta) anos, o máximo de tempo possível para a manutenção de um condenado em reclusão ou detenção.

Note-se que a previsão legal para o crime em tela é sempre pena restritiva de liberdade, na modalidade de reclusão, e, em sendo o crime atualmente elencado no rol de crimes hediondos, deverá o regime ser sempre fechado no início, podendo haver progressão de pena para o regime aberto, ou semi-aberto.


4 LEI Nº. 12.015/2009 E A LEI DE CRIMES HEDIONDOS

Prevê o art. 5º, XLIII, da Constituição da República, que:

Art. 5º, inc. XLIII - A lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem. (BRASIL, 1988).

Desse modo, entendendo que tais delitos constituem crimes de especial gravidade, diante de sua maior repulsividade social, uma vez que traduzem um maior desprezo pela condição humana por parte do agente, a Carta Magna recomenda que, para tais delitos, seja aplicado um tratamento normativo mais rigoroso por parte do legislador.

Assim, surge a Lei de Crimes Hediondos como forma de aplicar especial atenção a tais delitos, de forma que as normas jurídicas dessa lei impliquem em uma maior severidade, criando obstáculos para concessão de benefícios e, bem como diz o doutrinador NUCCI, 2008, pg. 600: "Impor maior aspereza no trato com essa espécie de delinqüência". Assim, a Lei 8.072/90 dispõe em seu art. 1º, o rol dos delitos considerados hediondos, devendo-se aqui ressaltar a mudança sofrida por esta com a entrada em vigor da Lei 12.015/2009.

Com a nova Lei, passou-se a incluir expressamente o estupro em sua forma simples, contida no caput do art. 213, e suas formas qualificadas, nos §§ 1º e 2º do mesmo artigo, como crimes hediondos. Revogou-se, portanto, o inciso VI, uma vez que a figura típica do Atentando Violento ao pudor não mais existe, sendo considerado como o próprio tipo penal de Estupro, havendo, desse modo, apenas uma modificação típica normativa e não o fenômeno da abolitios criminis.

Essa modificação, na realidade, trouxe-nos a solução para a celeuma doutrinária existente com relação à mens legis do inciso V do art. 1º da Lei 8.072/90, devido à redação apresentar-se dúbia, uma vez que, entendiam alguns doutrinadores, este só abarcava as formas qualificadas, enquanto outros, como Guilherme Nucci, entendiam que, na verdade, tratava tanto da forma simples, quanto da qualificada. Assim, o advento da nova lei pôs fim a estas discussões, prevendo como crime hediondo, tanto o estupro na forma simples, quanto na qualificada.

A grande inovação trazida pela Lei em questão foi à revogação do art. 224 do Código Penal, que tratava de uma extensão do conceito de violência, configurando a denominada Presunção de Violência, desde que presentes determinados requisitos estabelecidos no próprio artigo, que passaram, por sua vez, a delinear um novo tipo penal disposto no art. 217-A. Denominado de Estupro de Vulnerável, que também passou a figurar no rol dos crimes hediondos, no inciso VI, do art. 1º da Lei, tanto seu caput, quanto os §§ 1º, 2º, 3º e 4º.

Contudo, apesar das consideráveis inovações trazidas com o advento da Lei 12.015/09, ressaltando a suma importância destas, deixou o legislador a desejar, porém, em alguns pontos, em especial com relação à adaptação desta lei ao ordenamento jurídico brasileiro.

Quando da criação ou modificação de qualquer norma ou instituto jurídico, deve o legislador proceder a um amplo estudo acadêmico jurídico-social, para que assim, possa inserir tais modificações ou produções de forma lógica dentro de todo o sistema jurídico vigente, evitando, pois, situações de inadequação das mudanças decorrentes destas novas normas. Foi, todavia o que aconteceu com a revogação do art. 224, do Código Penal e a ausência de reforma expressa do art. 9º da Lei 8.072/90.

Dispõe o art. 9º da Lei 8.072/90, que:

Art. 9º - As penas fixadas no art. 6º. Para os crimes capitulados nos arts. 157, § 3º., 158, § 2º., 159, caput e seus §§ 1º., 2º. e 3º., 213, caput e parágrafo único, 214 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único, todos do Código Penal, são acrescidas de metade, respeitado o limite superior de 30 (trinta) anos de reclusão, estando a vítima em qualquer das hipóteses referidas no art. 224 também do Código Penal. (BRASIL, 1990).

Insta esclarecer que, com a criação do tipo penal Estupro de Vulnerável, os requisitos previstos no art. 224, do Código Penal passaram a constituir elementares do tipo incriminador previsto no art. 217-A, não mais podendo, desse modo, ser aplicado o art. 224, como causa de aumento de pena citado no art. 9º da Lei de Crimes Hediondos, sob pena de ocorrer o chamado bis in idem. Em consequência, tratando-se de Estupro de Vulnerável não incidirá, em hipótese alguma, o art. 9º da Lei 8.072/09, tendo a discussão relevância apenas para os outros tipos penais.

Como aplicar, então, o retromencionado artigo, diante da revogação expressa do art. 224, do CP, trazida no art. 7º da Lei 12.015/09 [04]? Ocorreu definitivamente à revogação tácita do art. 9º da Lei de Crimes Hediondos, ou ainda perdurará o mesmo, tendo em vista que o art. 217-A traz os mesmo requisitos do antigo art. 224 do Código Penal? Se revogado haverá sua retroatividade?

Entendemos que, uma vez que o legislador revogou expressamente o art. 224 do Código Penal, e tendo este quedado inerte não reformulando o artigo 9º da Lei de Crimes Hediondos, teve-se, como corolário, a revogação tácita da causa de aumento em questão, visto que já não existe mais o tipo penal ali indicado. Uma vez revogado, cria-se uma situação benéfica, pois não mais incidirá a causa de aumento, tanto para os réus já condenados, como para os que ainda estão sendo somente processados, sem trânsito em julgado. A retroatividade da Lei Penal mais benéfica é um direito subjetivo do acusado, sendo garantido tanto na Constituição da República, quanto no Código Penal in verbis:

Art. 5º, inc. XL, CR/88 - A Lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu; (BRASIL, 1988). (grifo nosso)

Art. 2º, CP - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Parágrafo Único – A Lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. (BRASIL, 1940). (grifo nosso)

Corrobora com a Carta Magna e o Código Penal o Pacto de São José da Costa Rica, surgido por ocasião da Convenção Americana de Direitos Humanos, em 1969, que prevê em seu art. 9º:

Art. 9º - Ninguém poderá ser condenado por atos ou omissões que, no momento em que foram cometidos, não constituam delito, de acordo com o direito aplicável. Tampouco poder-se-á impor pena mais grave do que a aplicável no momento da ocorrência do delito. Se, depois de perpetrado o delito, a lei estipular a imposição de pena mais leve, o deliquente deverá dela beneficiar-se. (CADH, 1969). (grifo nosso)

Diante do exposto, todos aqueles que tiveram sua pena aumentada em virtude do art. 9º da Lei de Crimes Hediondos devem ter sua pena reduzida na mesma proporção, bastando que este dirija uma petição ao Juízo de Execução Penal, uma vez que caberá a este juízo a competência para a apreciação do pedido. É este o entendimento da súmula 611 do Supremo Tribunal Federal: "Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna".

Assim, apesar das acertadas e necessárias modificações trazidas pela lei 12.015/09, em especial, a tratada no art. 1٥ da Lei de Crimes Hediondos, deixando clara sua incidência no Estupro, nas formas simples e qualificada, além da presença do Estupro de Vulnerável, também nas formas simples e qualificada, no rol destes delitos considerados hediondos, há pontos ausentes na reforma, que acabaram por ensejar novas celeumas doutrinárias, tais como a incidência ou não do art. 9º da lei em questão, apesar de que, em um raciocínio lógico-sistemático, venha-se concluir pela sua revogação tácita.


5 AÇÃO PENAL DIANTE DA LEI 12.015/09

Um ponto importante a ser analisado, a respeito do Estupro de Vulnerável, diz respeito à Ação Penal cabível a este delito, ressaltando-se que estas previsões estão presentes nas Disposições Gerais dos Crimes Contra a Liberdade Sexual, abarcando, desta forma, nosso objeto de estudo.

Assim, de forma sistemática, analisaremos as consequências desta inovação de maneira geral, partindo da análise de quais e onde houveram tais mudanças, assim como os objetivos das mesmas, e, ao final, proporcionando um melhor entendimento sobre alteração da Ação Penal para o delito de Estupro de Vulnerável.

Antes da modificação tinha-se como regra geral que os denominados Crimes Contra os Costumes procederiam mediante queixa, ou seja, por uma ação penal privada, havendo, entretanto exceções, quais sejam:

- A ação seria Penal Pública Incondicionada: se o crime fosse cometido pelo sujeito com abuso do poder familiar, tutela ou curatela; se da violência empregada resultasse lesão corporal grave ou morte; ou com emprego de violência real, para os crimes de estupro, segundo súmula 608 do Supremo Tribunal Federal, que dispõe da seguinte maneira: "No crime de estupro praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada".

- A ação seria Penal Pública Condicionada à Representação: se a vítima ou seus pais não pudessem prover as despesas do processo sem se privarem dos recursos indispensáveis à manutenção própria ou da família.

Faz-se mister esclarecer que quando ocorre lesões corporais leves produzidas pelo delito de estupro, estas são abarcadas pelo próprio tipo legal mencionado, uma vez que enquadrava-se no seu modo de execução.

Dessa forma, entendia o legislador que um delito praticado contra a liberdade sexual de uma pessoa afetava tão profundamente a esfera íntima do indivíduo, que não caberia ao Ministério Público provocar a persecução penal para punir o ofensor, cabendo apenas a vítima ou seu representante legal; ademais, por muitas vezes, a exposição de um ofendido nesta situação poderia provocar neste, danos ou situações consideradas incômodas, de modo que o denominado "escândalo do processo" (strepitus judicii) venha a ocasionar um mau maior para a vítima do que a possível impunidade do ofensor, assim determinava o legislador que, em regra, tais delitos proceder-se-ia mediante queixa.

Todavia, o legislador, dessa forma, permitia que a vítima pudesse perdoar o acusado, abandonar a causa, renunciá-la, ocorrendo perempção, que são causas extintivas de punibilidade, tudo isto a despeito do tratamento mais rigoroso exigido pela lei para os crimes hediondos, revelando a aparente contradição operada quanto à ação penal cabível, como se pode depreender da seguinte afirmação de Prado:

Por um lado, têm-se crimes que são considerados hediondos, como no caso do estupro e do atentado violento ao pudor, merecedores de tratamento rigoroso do legislador [...] Por outro lado, permite este mesmo legislador que a ação penal fique não só ao alvedrio da vítima, ou dos seus representantes do processo (lide), perdoando o acusador (art. 105 do CP) ou abandonando a causa, dando lugar à perempção (art. 60 do CPP). (PRADO, 2002, 255).

Diante da gravidade dos delitos contra a liberdade sexual, que demonstra a necessidade de sua condenação, vez que atingem de forma reprovável não só o ofendido, repercutindo em todo o seio da coletividade, evidente, mostra-se, a necessidade na modificação da Ação Penal cabível.

Com a entrada em vigor da Lei 12.015/09, portanto, ocorreu o que se chama de Mutação da Titularidade, uma vez que para os Crimes Contra a Liberdade Sexual não se procederá, via de regra, mediante queixa, mas sim por uma ação penal Pública Condicionada à Representação. É o que diz o novo art. 225 do Código Penal, in verbis:

Art. 225 - Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação.

Parágrafo Único – Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável. (BRASIL, 2005). (grifo nosso)

Logo, conclui-se que ocorreu uma mudança no pólo ativo da ação, ou seja, na titularidade para mover a ação penal, que caberá agora ao Ministério Público. Desse modo, o Órgão Ministerial passa da legitimidade extraordinária, no sistema anterior, à substituição processual, atuando, a partir de então, com legitimidade ordinária, uma vez que ocorreu mudança na legitimidade ad causam.

Vale ressaltar, sobre o conceito de legitimidade ad causam, o ensinamento de Capez:

É a legitimação para ocupar tanto o pólo ativo da relação jurídica processual, o que é feito pelo Ministério Público, na ação penal pública, e pelo ofendido, na ação penal privada, quanto o pólo passivo, pelo provável autor do fato [...] partes legítimas, ativa e passiva, são os titulares dos interesses materiais em conflito; em outras palavras, os titulares da relação jurídica material levada ao processo. (CAPEZ, 2009, p. 112).

É necessário observar também, que a representação é condição de procedibilidade da ação, como um requisito de autorização para que o Ministério Público possa dar início à persecutio criminis. É nos seguintes dizeres, do mesmo autor:

É a manifestação de vontade do ofendido ou do seu representante legal no sentido de autorizar o desencadeamento da persecução penal em juízo. Trata-se de condição objetiva de procedibilidade. [...] É condição específica da ação penal pública. [...] É um obstáculo ao legítimo exercício da ação penal, cuja remoção fica ao exclusivo critério do ofendido, ou de quem legalmente o represente, ou, ainda do ministro da justiça". (CAPEZ, 2009, p. 121) (grifo nosso)

Ressalta-se, ainda, que uma vez ocorrendo a morte do ofendido caberá a titularidade para a representação ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, em igual prazo, conforme art. 31 do Código de Processo Penal.

Vale lembrar que essa representação não exige qualquer formalidade vinculada à lei, podendo se apresentar de forma escrita ou oral, conhecida através de um Boletim de Ocorrência ou por pedido mediante uma autoridade judiciária, policial ou do Ministério Público. A única exigência é que esta representação expresse uma manifestação de vontade inequívoca quanto à vontade do ofendido ou ofendida em se ter o prosseguimento da presecutio criminis.

Todavia, mais uma vez, surge uma problemática com a nova redação dada ao art. 225 do Código Penal pela Lei 12.015/09. A questão diz respeito à mudança do tipo de Ação Penal que deverá ser intentada com relação aos processos que já se encontram em tramitação, ou seja, aqueles ainda não transitados em julgado, devendo-se aferir se ocorrerá ou não retroatividade do art. 225 do CP para esses processos.

Para chegarmos a alguma conclusão, é imperioso que se determine qual a natureza jurídica da norma contida no dispositivo do artigo em questão: se este possui natureza penal, podendo retroagir para beneficiar o réu; se guarda natureza processual, não havendo a ultratividade; ou, por fim, se é mista. Afirma Capez (2008; p. 51), que: "Sempre que houver lei híbrida (misto penal e processo), a parte penal tende a prevalecer, para fins de retroatividade em benefício do agente".

O que se pode concluir dentro de uma visão hermenêutica-material da norma contida no art. 225, é que esta possui natureza jurídica processual uma vez que exige uma condição de procedibilidade da ação penal, qual seja a representação, trazendo também, entretanto, natureza penal, pois o não oferecimento dessa manifestação de vontade ocasionará a decadência e a extinção de punibilidade, que são matérias de direito penal.

Como conseqüência lógica de todo o entendimento doutrinário acerca de normas com natureza jurídica híbrida, se esta norma for benéfica para o réu, deverá retroagir. Sendo assim, há que se observar que, se a Ação Penal fora iniciada mediante queixa, não haverá nenhuma providência a ser tomada em juízo, prosseguindo a ação seu curso normal. A questão de grande relevância é se a ação intentada tiver sido Pública Incondicionada.

Ressalta-se que, necessitando o Órgão Ministerial da representação para dar início à persecução penal, essa condição de procedibilidade cria um obstáculo para o Parquet, de modo que, as ações Públicas Condicionadas à Representação são mais benéficas que as ações Públicas Incondicionadas. Desta feita, sendo o art. 225, do Código Penal uma norma processual penal material, deve esta retroagir, com fulcro no art. 5º, XLIII da CR/88 e art. 2º, CP, quando houver sido intentada uma ação penal Pública Incondicionada, nos casos em que, com a entrada em vigor da lei 12.0105/09, deveria ter sido procedida mediante ação penal Pública Condicionada à Representação. Com isso, serão esses processos principiados por iniciativa exclusiva do Ministério Público, dependendo da representação do ofendido, que será notificado para manifestar sua vontade, sob pena de decadência.

A questão a ser auferida neste ponto diz respeito ao prazo. Apesar da prematuridade da Lei dos Crimes Contra a Liberdade Sexual, alguns já têm entendido que o prazo será o definido no Código de Processo Penal, em seu art. 38 [05], qual seja de 6 (seis) meses a contar da data da notificação. Em outro sentido, já há manifestação entendendo que, em havendo lacuna, poder-se-á utilizar o art. 91 da Lei 9.099/95, que dispõe que: "Nos casos em que esta Lei passa a exigir representação para a propositura da ação penal pública, o ofendido ou seu representante legal será intimado para oferecê-la no prazo de trinta dias, sob pena de decadência". Parece-nos mais acertada a primeira posição, pois trata-se de uma condição de procedibilidade exigida e disciplinada pelo Código de Processo Penal.

Entretanto, apesar da gravidade dos delitos em questão, uma vez que estes, em regra, dependem de uma representação para que se proceda à ação penal necessária, ocorrerá à extinção de punibilidade de muitos desses delitos sexuais, pois, na maioria dos casos, após o decurso do prazo para a manifestação de vontade do ofendido (seis meses – prazo decadencial), apesar do jus puniende do Estado ainda existir, este não mais poderá promover a prestação jurisdicional; é que muitas vezes a vítima não se manifesta imediatamente, fazendo-o muito tempo depois de decorrido o prazo decadencial para a representação.

Vale salientar que, apesar de várias críticas feitas ao legislador, por ter contemplado a ação penal Pública Condicionada ao invés da Incondicionada, a nosso ver, há de se considerar ainda, a possibilidade da strepitus judicii para o ofendido, uma vez que os delitos sexuais, mesmo repercutindo no âmbito social, atingem gravosamente a própria vida íntima da vítima; logo, procedeu o legislador de forma correta agravado a situação com a modificação da ação penal Privada para ação penal Pública, evitando que ocorresse, desta maneira, tanto certas impunidades ante o perdão da vítima, quanto que ocorresse a perempção, como colocado anteriormente.

Insta esclarecer que, a despeito de ser a ação penal Pública Condicionada à Representação, a ação devida para os crimes Contra a Liberdade Sexual, proceder-se-á por ação penal Pública Incondicionada nos delitos enquadrados no parágrafo único do novo art. 225, ou seja, nos casos de Estupro de Vulnerável, objeto deste estudo, e Mediante Fraude.

É evidente a necessidade de tratamento mais rigoroso para as situações acima mencionadas, diante da maior vulnerabilidade dos sujeitos passivos, e, portanto, de uma maior exigência de proteção, ademais configurarem delitos de reprovabilidade social de maior extensão. Com relação a estes casos, faz-se mister a exposição dos motivos presentes no Projeto de Lei nº 253/04, que deu origem a Lei 12.015/09:

Sem dúvida, a eficácia na proteção da liberdade sexual da pessoa e, em especial, a proteção ao desenvolvimento da sexualidade da criança e do adolescente são questões de interesse público, de ordem pública, não podendo em hipótese alguma ser dependente de ação penal privada e passível de das correlatas possibilidades de renúncia e de perdão do ofendido ou ofendida, ou ainda de quem tenha qualidade para representá-los. Na prática, as qualidades da ação penal privada, no caso de violação de criança ou adolescente, têm contribuído para resguardar cumplicidades, intimidar e, assim, consagrar a impunidade. (SENADO FEDERAL, PLS nº 253, 2004).

Ademais todas as considerações feitas sobre as modificações introduzidas no art. 225 do Código Penal, restam-nos ainda alguns apontamentos, os quais consideramos de enorme relevância, entre elas a omissão do legislador nos casos antigamente previstos no inciso II, do art. 225, que tratava do crime cometido com abuso do pátrio poder, ou da qualidade de padastro ou curador, que se procedia mediante ação penal Pública Incondicionada.

Isto ocorria dado ao fato de que como bem afirma, Nucci:

É natural que, nessas hipóteses, torne-se muito difícil para a pessoa ofendida representar ou patrocinar um advogado para ajuizar queixa-crime contra a pessoa que deveria representá-la em juízo, defendendo seus interesses. Assim, é interesse público punir o sujeito que desvirtua sua função protetora, atacando a pessoa de quem deveria cuidar. (NUCCI, 2007, p.847).

A nova lei não abarcou essa situação como causa de ação penal Pública Incondicionada, determinando que se proceda mediante ação penal Pública Condicionada à Representação. Tal fato ocorre, uma vez que já se contemplou no mesmo artigo penal que, se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos, a ação deverá ser a Pública Incondicionada; nunca haverá um maior de idade sendo representado em juízo, a não ser que seja curatelado, em virtude de alguma doença ou falta de discernimento, situações essa também abarcadas pelo conceito de vulnerável. Sendo assim, apesar da aparente incoerência trazida com a modificação do art. 225 do Código Penal, vê-se que, na verdade, as situações da antigo inc. II já foram abrangidas pelas hipóteses do Parágrafo Único do artigo supracitado.

5.1 Quadro Sinótico da Ação Penal

ANTES DA NOVA LEI 12.015/09

COM A ENTRADA EM VIGOR DA LEI 12.015/09

Em Regra

Mediante Ação Penal Privada

Mediante Ação Penal Pública Condicionada à Representação

Violência Real

Mediante Ação Penal Pública Incondicionada

Mediante Ação Penal Pública Condicionada à Representação

Menor de 18 Anos e Vulnerável

Mediante queixa, salvo os incs. I e II, do art. 225 do CP

Mediante Ação Penal Pública Incondicionada

Vítima sem Condições de Arcar com as Despesas do Processo

Mediante Ação Penal Pública Condicionada à Representação, tendo em vista o inc. I, do art. 225 do CP.

Mediante Ação Penal Pública Condicionada à Representação, vez que se enquadra na regra geral

Crime Cometido com Abuso do Pátrio Poder, ou da qualidade de Padrasto, Tutor ou Curador

Mediante Ação Penal Pública Incondicionada

Mediante Ação Penal Pública Condicionada à Representação

Legitimidade Ordinária

O Ofendido

O Ministério Público

 

O Brasil constitui-se em um Estado Democrático de Direito, tendo como características a submissão à lei, a separação dos poderes e o respeito aos direitos e garantias fundamentais. Desta forma, qualquer conduta atentatória a esses direitos, cujo caráter é indisponível, estará indo de encontro à ordem constitucional.

Estando a Constituição Federal no ápice do ordenamento jurídico brasileiro, todas as normas infraconstitucionais devem seguir suas orientações e diretrizes, sob pena de serem declaradas inconstitucionais. Sendo assim, o Direito Penal brasileiro somente pode ser concebido à luz dos Princípios Constitucionais do Estado Democrático de Direito.

Desse importante princípio emergem diversos outros que serão os norteadores da atividade legislativa e da aplicação da lei ao caso concreto.

O Direito Penal, portanto, deve ser orientado em conformidade com a ordem constitucional sob pena de torna-se um instrumento de repressão, contrário ao perfil constitucional brasileiro.

6.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

A Dignidade da Pessoa Humana, fundamento da República Federativa do Brasil, é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem.

O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana apresenta-se em três dimensões: a dimensão fundamentadora, que consiste em um núcleo informativo e uma diretriz de todo ordenamento jurídico; a dimensão orientadora, que traça metas que devem ser seguidas, tornando ilegítima qualquer disposição normativa distinta; e a dimensão crítica, que é o parâmetro para auferir a legitimidade da produção legislativa.

Com relação ao Direito Penal, essas orientações devem ser analisadas de forma ainda mais cuidadosa, tendo em vista que aquele exerce um controle social, aplicando sanções aos membros da coletividade.

Com relação à figura penal do art. 217-A do CP, o Estupro de Vulnerável, introduzida pela Lei n° 12.015/09, é necessário verificar se o seu grau de reprovação é proporcional à pena aplicada, visto que tipos penais que revelam desproporção entre a efetiva potencialidade lesiva e a pena aplicada atentam contra a Dignidade da Pessoa Humana.

Nesse contexto convém lembrar a lição de Mello:

Violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um especifico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comando. E mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido representa a ingerência contra todo o sistema, subversão de valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura. (MELLO, 1994, p.451).

Como se pode compreender de tal afirmação, o tipo penal deve obedecer a critérios formais e materiais, pois de nada adiantará estar haver previsão legal que afronte valores basilares de toda a ordem jurídica, dentre eles o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

Diante do exposto, o art.217-A, do CP (Estupro de vulnerável) atende a um critério formal, pois descreve a conduta típica em lei, atendendo ao princípio da legalidade, porém não leva em consideração a sua potencialidade lesiva. Este despreza a potencialidade lesiva ao bem jurídico, quando admite haver crime mesmo sem violência ou grave ameaça e com anuência da vitima no ato. Sendo, portanto, inquestionável a afronta a dignidade da pessoa humana.

Aplica-se a justiça, quando observa-se não apenas critérios formais, mas a interpretação fundada em valores superiores, como os adotados pela sociedade como norma moral de conduta, pela qual regem seus atos, sem que possa ser considerado um fato típico.

O princípio da dignidade da pessoa humana faz, portanto, um controle da qualidade do tipo penal, ou seja, de seu conteúdo, diante de cada contexto fático, tendo em vista, a constante evolução social em contraste com a estagnação normativa

6.2 Princípio da Adequação Social

Para que possa atingir verdadeiramente os fins sociais do Estado Democrático, o Direito Penal deve tipificar, unicamente, condutas que tenham relevância social. O legislador ao selecionar tais comportamentos, tem obrigação de escolher aqueles que tutelem bens jurídicos importantes para a convivência social, sendo necessário, além disso, que estes sejam atentatórios e nocivos ao interesse público.

O tipo penal Estupro de Vulnerável tutela, sem dúvida, um bem jurídico importante em uma sociedade democrática. No entanto, esta proteção foi tratada de forma equivocada pelo legislador, quando incrimina toda e qualquer prática sexual com menores de 14 anos e doentes mentais, considerando de todo irrelevante o consentimento da vítima.

Essa tipificação atenta flagrantemente ao Princípio da Adequação Social, de modo que se encontra desvinculado da realidade social brasileira, pois é inegável que os jovens iniciam sua vida sexual cada vez mais cedo, nos dias atuais, sendo esta uma prática já inserida no contexto social com as transformações dos valores e costumes.

Este é o entendimento compartilhado pelo Ministro Marco Aurélio do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 73.663, que trata da conjunção carnal com vítima menor de 14 anos:

Assim é que, sendo irrestrito o acesso à mídia, não se mostra incomum reparar-se a precocidade com que as crianças de hoje lidam, sem embaraços quaisquer, com assuntos concernentes à sexualidade, tudo de uma forma espontânea, quase natural. Tanto não se diria nos idos dos anos 40, época em que exsurgia, glorioso e como símbolo da modernidade e liberalismo, o nosso vetusto e ainda vigente Código Penal. (STF, HC 73.662 – MG, 2ª T., rel. Marco Aurélio. 21/05/1996)

Acrescenta ainda em seu voto:

Nos nossos dias não há crianças, mas moças de doze anos. Precocemente amadurecidas, a maioria delas já conta com discernimento bastante para reagir ante eventuais adversidades, ainda que não possuam escala de valores definida a ponto de vislumbrarem toda sorte de conseqüências que lhe podem advir. (STF, HC 73.662 – MG, 2ª T., rel. Marco Aurélio. 21/05/1996)

Por este motivo, no tocante à idade especialmente, deve-se fincar a interpretação penal à realidade, buscando manter o equilíbrio jurídico na aplicação da lei.

Outro ponto conflitante no dispositivo em apreço, quando se remete à questão do consentimento da vítima, é que este seja considerado absolutamente inválido, em conflito com as próprias disposições do Estatuto da Criança e Adolescente. O ECA deixou determinada a distinção entre criança e adolescente, nos termos do art.2°: "considera-se criança, para efeitos desta lei, a pessoa até 12 (doze) anos incompletos, e adolescente entre 12 (doze) e18 (dezoito) de idade".

Nestes termos, tanto a criança quanto o adolescente são considerados inimputáveis, ou seja, não praticam crime ou contravenção penal, consequentemente não se aplicando a eles o Código Penal. Entretanto, o mencionado dispositivo considera que, quando a criança ou adolescente pratica uma figura típica, essa conduta é um ato infracional (art.105, ECA), sendo punido de acordo com suas determinações.

Sendo assim, às crianças aplicam-se as medidas de proteção, e aos adolescentes as medidas socioeducativas, que são mais gravosas que as anteriores. Essa medida mais severa aplicada aos adolescentes é o reconhecimento de sua capacidade de discernimento e compreensão em relação a suas atitudes e escolhas.

Tal entendimento é compartilhado pelo juristaCapez:

Um fato não pode ser definido como infração penal e, ao mesmo tempo, ser aplaudido, tolerado e aceito pela sociedade. Tal antinomia fere as bases de sistema que se quer democrático. (...) Com apoio nessa premissa básica construiu-se a teoria da adequação social, para excluir do âmbito de incidência típica algumas condutas que são socialmente toleradas, praticadas e aceitas pela sociedade. Faltava, nesse caso, uma elementar implícita, não escrita, que está em todo modelo descritivo legal, que é o dano de repercussão coletiva. (CAPEZ, 2008; p.128-129)

O reconhecimento da relevância da adequação social na jurisprudência e na doutrina pátria é um forte indício de que a legislação penal deve adequar-se aos anseios e valores sociais e aos princípios fundamentais que regem todo o arcabouço jurídico.

6.3 Princípio da Proporcionalidade

No âmbito internacional, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, traz expressamente o princípio da proporcionalidade, nos seguintes termos, art.15: "a lei só deve cominar penas estritamente necessárias e proporcionais ao delito" (grifo nosso). Na legislação pátria, este princípio vem disciplinado em vários dispositivos da Constituição Federal [06]·, para oferecer equilíbrio entre as limitações impostas à sociedade e os benefícios por ela auferidos.

No que concerne ao Direito Penal, toda vez que o legislador cria um novo tipo penal, ou faz alteração em seu conteúdo para tornar a resposta estatal mais gravosa, impõe um ônus à sociedade, que conseqüentemente sofre uma limitação em seu poder de agir. Em contrapartida, a sociedade deve ser compensada pela vantagem de proteção do bem jurídico.

Segundo o Princípio da proporcionalidade, quando o ônus imposto for superior a vantagem auferida, o tipo penal será inconstitucional, visto que fere a Dignidade da Pessoa Humana e, por conseguinte, a própria razão de ser do Estado Democrático de Direito.

O tipo penal Estupro de Vulnerável (art. 217-A do CP) fere, deste modo, o Princípio da Proporcionalidade, na medida em que traz mais limitação do que beneficio à sociedade, visto que a pena cominada no delito traz desproporção entre a extensão do dano se comparado com o de outros delitos considerados mais reprováveis pela sociedade.

Tomando-se como exemplo, se for comparada a resposta estatal (pena) para o Estupro de Vulnerável àquela aplicada ao Homicídio Simples, observa-se ser flagrante o desequilíbrio. Isto porque, a pena para o Homicídio Simples é de 6 a 20 anos de reclusão, enquanto que a pena para o Estupro de Vulnerável é de 8 a 15 anos de reclusão, sendo considerado, inclusive, crime hediondo, o que torna a sanção ainda mais gravosa. Agindo assim, o legislador considerou mais grave a prática sexual consentida com uma pessoa de 13 anos, do que matar uma pessoa.

Verifica-se também violação a esse princípio, a diferenciação da resposta estatal, em relação à vítima com 14 anos completos, que não pode ser enquadrada no tipo penal do art.217-A, do CP, em virtude da elementar típica "menor de 14 anos". Dessa maneira, se o crime for cometido mediante grave ameaça ou violência será enquadrado no tipo do art.213, do CP (estupro), que tem pena de reclusão de 6 (seis) a 10 (dez) anos, enquanto que se o fato for consentido pela menor será atípico.

Tais exemplos deixam claro a desproporção do tipo penal em apreço em relação a outros delitos do ordenamento jurídico brasileiro. A doutrina já tem se posicionado contra essas contradições que o legislador comete no exercício de suas funções. Neste sentido, pode-se citar a lição de Bitencourt:

O campo de abrangência, e por que não dizer de influencia do princípio da proporcionalidade, vai além da simples confrontação das conseqüências que podem advir da aplicação das leis que não observam dito princípio. Na verdade, modernamente a aplicação desse princípio atinge inclusive o exercício imoderado do poder, inclusive do próprio legislativo no ato de legislar. (...) Na verdade, a evolução dos tempos tem nos permitido constatar, com freqüência, o uso abusivo do "poder de fazer leis had hocs", revelando, muitas vezes contradições, ambigüidades, incongruências e falta de razoabilidade, que contaminam esses diplomas de inconstitucionalidades. (BITENCOURT, 2006, p.310).

Esses excessos não podem ser admitidos em um Estado Democrático de Direito, cominando penas iguais para crimes de lesividade distintas, pois frustra um de seus postulados, a garantia a direitos inalienáveis como a liberdade.

6.4.Princípio da Culpabilidade

Antes de discorrer mais especificamente sobre o princípio da culpabilidade, faz-se necessário, uma breve explanação sobre o conceito de crime na doutrina.

Crime pode ser definido da várias maneiras, porém, neste estudo, nos interessa o aspecto analítico, que é aquele que busca, sob um prisma jurídico, estabelecer os elementos estruturais do conceito de crime.

Parte da doutrina considera que crime é todo fato típico e ilícito, tendo como elementos integrantes apenas a tipicidade e a ilicitude. Entendimento do jurista Capez, que adota a Teoria Bipartida:

Sob esse ângulo, crime é todo fato típico e ilícito. Dessa maneira, em primeiro lugar deve ser observada a tipicidade da conduta. Em caso positivo, e só neste caso, verifica-se se a mesma é ilícita ou não. Sendo fato típico e ilícito já surge a infração penal. A partir daí, é só verificar se o autor foi ou não culpado pela sua prática, isto é, se deve ou não sofrer um juízo de reprovação pelo crime que cometeu. (CAPEZ, 2008, p.113). (grifo nosso)

Outra parte da doutrina discorda deste posicionamento, incluindo a culpabilidade como elemento integrante do conceito de crime, adotando a Teoria Tripartida. Neste sentido, pode-se citar Noronha:

A ação humana, para ser criminosa, há de corresponder objetivamente à conduta descrita pela lei, contrariando a ordem jurídica e incorrendo seu autor no juízo de censura ou reprovação social. Considera-se, então, o delito ação típica, antijurídica e culpável. Ele não existe sem uma (compreendendo também a omissão), a qual se deve ajustar à figura descrita na lei, opor-se ao direito e ser atribuível ao indivíduo a titulo de culpa lato sensu. (NORONHA, 1986, p.94). (grifo nosso)

Verifica-se que independentemente da concepção adotada, a culpabilidade demonstra fundamental importância para o estudo da conduta delituosa. Sendo assim, segundo o princípio da culpabilidade não há crime ou imposição de pena sem culpabilidade, a depender da concepção adotada.

O princípio da culpabilidade contrapõe-se à Responsabilidade Objetiva, que se caracteriza com a simples produção do resultado, sem analisar o seu contexto fático, estando, por esse motivo, praticamente erradicada do Direito Penal contemporâneo.

O ordenamento jurídico brasileiro adota a responsabilidade subjetiva, considerando que nenhum resultado pode ser atribuído a quem não o tenha produzido por dolo ou culpa, sendo, portanto, inconstitucional qualquer lei que despreze esse preceito.

O que ocorre, porém, ao analisar o tipo penal Estupro de Vulnerável, "Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15(quinze) anos", o legislador não levou em conta a responsabilidade subjetiva, tendo em vista que basta realizar a conjunção carnal ou o ato libidinoso com uma pessoa menor de 14 anos para configurar o crime, não importando as circunstancias fáticas em que foi realizado, ou se a vitima consentiu com a prática, uma vez que o critério objetivo é cometê-lo com "menor de 14 anos".

6.5 Princípio da Individualização da Pena

Pelo princípio constitucional criminal da Individualização Punitiva, a pena deve ser adaptada ao condenado, considerando as características do sujeito ativo. Assim, a imposição da pena depende do juízo de culpabilidade do agente (censurabilidade de sua conduta).

Dessa forma, o art. 217-A do Código Penal se demonstra novamente contrário as garantias constitucionais e ao próprio art. 59 do CP, tendo em vista que o novo tipo penal não permite ao aplicador do direito valorar as particularidades de cada pessoa, nem a conduta do agente, bastando a configuração do fato, sem importar-se com o comportamento da vítima, seu consentimento ou se o agente usou de violência.

Caracteriza-se, de tal modo, flagrante o desrespeito ao Princípio da Individualização da pena, vez que o sujeito que praticar a conduta com o consentimento da vítima sofrerá a mesma sanção que aquele que o cometer com violência ou grave ameaça, se, neste último caso, o crime não deslanchar em sua modalidade qualificada.

6.6 Princípio da Presunção de Inocência

A Constituição Federal, em seu art. 5°, inc. LVII, estabelece que "Ninguém será considerado culpado até o transito em julgado da sentença penal condenatória", consagrando a Presunção de Inocência como um dos princípios basilares do Estado Democrático de Direito, e do Direito Processual Penal.

A Presunção de Inocência é juris tantum, exigindo um mínimo de provas colhidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa para ser afastada, materializando-se o devido processo legal.

Quando o tipo penal Estupro de Vulnerável estabelece que ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos é crime, está implicitamente admitindo que o agente é culpado, sem considerar em que condições a conduta foi praticada, a intenção do agente ou o comportamento do vitima. Basta, portanto, para a comprovação da materialidade a autoria e a idade da vítima, sem a necessidade de comprovação da existência de dano ou dissenso da vítima, uma vez que, são irrelevantes para a tipificação.

Isto, como se pode depreender das declarações feitas ao longo desta produção, é uma afronta clara à Presunção de Inocência e à Teoria da Responsabilidade Subjetiva adotada pelo Código Penal, pois é inadmissível que alguém possa ser responsabilizado, sem que reúna todos os requisitos da culpabilidade, sejam eles: imputabilidade, potencial consciência da ilicitude, exigibilidade de conduta diversa. Sendo, assim, o agente só será considerado culpado se preencher todos esses requisitos; faltando qualquer um deles, não haverá culpabilidade.


7 PRESUNÇÃO DE VIOLÊNCIA VERSUS OBJETIVIDADE FÁTICA

Para adentrarmos no assunto de presunção de violência, faz-se mister que esclareçamos o que conceito de presunção. Para tanto, utilizaremos do conceito dado por Hildebrand, em seu Dicionário Jurídico:

Presunção – 1. Consequência que a lei deduz de certos atos ou fatos, e que estabelece como verdade, por vezes até contra prova em contrário. 2. Tomar como verdadeiro um fato, independente de prova, levando-se em consideração aquilo que normalmente acontece. (HILDEBRAND, 2009, p. 112)

Desse modo, podemos concluir por presunção, no ordenamento jurídico, como sendo os resultados deduzidos de um fato conhecido, para se chegar a um fato desconhecido, isto é, nas presunções deduzem-se os resultados.

Ocorre que a conseqüência das presunções, para o direito, está situada justamente no campo das provas, pois, dependendo do tipo, desde que comprovada a adequação típica, o réu poderá ser condenado, seja porque não provou o contrário, ou porque não se admite prova em contrário.

Diante disso temos os dois tipos de presunções, as denominadas juris et de jure e as juris tantum, que podem ser conceituadas no dizer de Hildebrand, em sua obra supracitada:

Presunção Absoluta – Circunstância conhecida e provada que não admite prova em contrário [...] Presunção juris et de jure – Diz-se da presunção legal que não admite prova em contrário.

Presunção relativa – Circunstância conhecida e provada que admite prova em contrário [...] Presunção juris tantum de veracidade – Diz-se da presunção legal que prevalece até prova em contrário. (HILDEBRAND, 2009, p. 122). (grifo nosso)

Por questões político-criminais adotou o nosso Código Penal, antes da vigência da Lei 12.015/09, a Presunção de Violência, também denominada de Violência Ficta, nas hipóteses consagradas no art. 224 do Código Penal Brasileiro. Dessa forma, tinha-se a seguinte redação para o artigo supramencionado: "Presume-se a violência, se a vítima: a) não é maior de 14 (catorze) anos; b) é alienada ou débil mental, e o agente conhecia esta circunstância; c) não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência".

Como se pode perceber, o artigo em questão não menciona nova pena, nem se caracteriza como qualificadora, nem como causa de aumento ou diminuição de pena. Na verdade, este artigo fora criado para ser uma norma de extensão do conceito de violência empregado nos delitos contra os costumes. Buscava, desta forma, abarcar situações em que o ofensor não se utilizava de violência real, ou de grave ameaça, aproveitando-se, entretanto, de alguma situação da vítima, ou seja, quando esta última não possuía tinha capacidade para anuir validamente (alíneas "a" e "b" do art. 224), ou quando por qualquer situação não tinha capacidade para oferecer resistência (alínea "c" do art. 224).

A primeira hipótese a ser amparada pelo Código Penal é o caso dos menores de 14 anos, objeto central de nosso estudo. Nesta, em razão da idade e considerada imaturidade do menor, merece este maior proteção legal, vez que a legislação o considera incapaz de consentir, de modo que qualquer consentimento dado pelo menor será considerado inválido, tronando, portanto, o ato sexual com este sujeito passivo um fato punível.

Entretanto, questão de grande relevo, diz respeito à caracterização da presunção tida no art. 224, do CP, buscando-se compreender se esta é absoluta ou relativa.

Observa-se que o artigo penal mencionado apresenta-se como uma presunção juris et de jure, todavia, diante da dicotonomia existente sobre a relativização desta presunção, havia doutrinadores que afirmavam que, uma vez admitida o erro tipo para o art. 224 do Código Penal, estar-se-ia relativizando-o. Desta forma, passou-se a admitir, mesmo que minoritariamente, mas de forma significante, tanto na doutrina, quanto na jurisprudência, o caráter relativo da presunção de violência.

A nosso ver este era o entendimento mais correto, uma vez que, se o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê que maiores de 12 (doze) anos já podem ser responsabilizados pelos seus atos infracionais, na verdade, estar-se-ia considerando-o capaz de discernir e consentir na prática de atos, podendo, assim, consentir de forma válida na realização de um ato sexual.

Como exemplo, os entendimentos doutrinário e jurisprudencial colacionados abaixo, acerca da relativização dessa presunção:

Entendemos que a presunção não pode ser absoluta, sob pena de adoção indevida da responsabilidade objetiva. (CAPEZ, 2009, p. 68).

Recurso Especial. Estupro. Vítima menor de 14 anos de idade. Violência presumida. Presunção Relativa. 1. É Relativa a presunção de violência contida na alínea ‘a’ do artigo 224 do Código Penal. 2. Recurso conhecido e improvido. (STJ, REsp 206.658 – SC, 6ª T., rel. Min. Vicente Leal, 18/04/2002, D.J, 10/03/2003). (grifo nosso)

Ocorre que, diante destes entendimentos, o Projeto de Lei do Senado nº. 253/04 afirma que não há mais que se falar em Presunção de Violência, nem absoluta, nem relativa, dispondo tratar-se de uma objetividade fática, como já fora expositado neste trabalho.

Consideramos, no entanto, que embora haja denominação diversa para os efeitos da norma do art. 217-A, do CP, o que vigora, na realidade, é uma norma cujo o caráter é de verdadeira presunção absoluta, vez que continua a presumir-se que em qualquer hipótese a suposta vítima seria incapaz de consentir, independente da análise fática, ou se quer da existência de violência real ou grave ameaça, sem analisar as características pessoais do sujeito ativo, qual seja sua culpabilidade.

Quando o tipo Estupro de Vulnerável prevê que há violência em toda e qualquer situação, sem levar em consideração as características pessoais de cada vítima e do agente, acaba por reputar que haverá somente um tipo de fato social para todos os casos concretos a que a norma seria aplicável, quais sejam o abuso da condição de despreparo físico e psicológico da vítima.

Na verdade, esta previsão demonstra o retrocesso trazido pelo legislador, pois ratifica um entendimento que já vinha sendo afastado, em razão de sua desproporcionalidade, pela doutrina, e inclusive por nossa jurisprudência, como bem demonstra o juízo arbitral do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio de Mello, colacionado abaixo:

A presunção de violência prevista no art. 224 do Código Penal cede à realidade. Até porque não há como deixar de reconhecer a modificação de costumes havida, de maneira assustadoramente vertiginosa, nas últimas décadas, mormente na atual quadra. [...] de qualquer forma, o núcleo do tipo é o constrangimento, e, à medida que a vítima deixou patenteado haver mantido relações sexuais espontaneamente, não se tem, mesmo à mercê da potencialização da idade, como concluir, na espécie, pela caracterização. A presunção não é absoluta, cedendo às peculiaridades do caso como são as já apontadas, ou seja, o fato de a vítima aparentar mais idade, levar a vida dissoluta, saindo altas horas da noite e mantendo relações sexuais como outros rapazes, como reconhecido no seu depoimento e era de conhecimento público" (STF, HC 73.662 – MG, 2ª Turma – Voto do Min. Marco Aurélio). (grifo nosso)

Ademais, fazendo uma análise desta inovação trazida pelo legislador dentro do sistema penal brasileiro, podemos encontrar alguns pontos obscuros, que acabaram por evidenciar uma aparente contradição na tutela de bens jurídicos.

Uma vez considerando as consequências de uma objetividade fática, importa ressaltar a hipótese de uma menor de 14 anos que viesse a engravidar, por puro descuido, em não em decorrência de uma violência real, e posteriormente a abortar, de modo não natural. Neste caso, a própria legislação penal autorizaria este tipo de aborto, enquadrando-se no art. 128, inciso II do Código Penal Brasileiro: "Não se pune o aborto praticado por médico: II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal".

Como se poderia punir a gestante ou seu representante legal pelo aborto praticado mesmo que por hospitais clandestinos, uma vez que a própria legislação permite o aborto nestas condições?

Seria de se analisar que, uma vez que o art. 128, inc. II do CP é norma permissiva, cujo embasamento jurídico é de que a mulher não deve ser obrigada a levar adiante uma gravidez decorrente de ato que fora realizado contra sua vontade, como este fundamento seria respeitado, quando uma adolescente menor de 14 anos, em decorrência de uma prática sexual consentida com maior de 18 anos, viesse, por irresponsabilidade sua, conceber uma criança? Seria justo e direito que esta norma permissiva fosse alargada, a tal ponto de abranger estas situações em que sequer há verdadeiramente um bem jurídico a ser tutelado, a não ser a vida do próprio feto que está sendo gerado? Óbvio e evidente que não.

Do mesmo modo, não consideramos válido que o legislador haja criado uma norma de cunho tão absoluto, que englobe até mesmo situações em que não há, a despeito da precocidade dos sujeitos passivos, qualquer indício real de dignidade e liberdade sexual a ser protegida, contrariando, de forma tão inconsequente, o Princípio do Direito Penal Mínimo, entre diversos outros tão quanto importantes, recaindo em uma verdadeira e arbitrária imposição de crimes e penas por parte do Estado, em muitas situações nas quais em verdade não haveria o que se proteger, revelando o detrimento dos Princípios e finalidades de um Estado Democrático de Direito.


CONCLUSÃO

O Direito, além de ser um fenômeno de ordem jurídica, é primordialmente um fato social, devendo sempre estabelecer-se em consonância com os anseios e necessidades sociais, para que os fins do Estado Democrático possam ser atingidos de forma justa e eficaz, tipificando única e exclusivamente condutas que, em virtude de seu grau de reprovação e nocividade à paz social, tenham verdadeira relevância para a sociedade. Assim, o Direito deve estar em constante dinâmica, adaptando-se às novas realidades.

A despeito dessa dinamicidade, deve-se salientar que o Código Penal Brasileiro é produto legislativo da década de 40, refletindo idéias morais e sociais daquela época, valores estes não mais condizentes com as novas concepções da sociedade, em especial no que se refere à sexualidade.

Inegável, pois, a necessidade de alteração de muitos dos tipos penais trazidos neste Código, especificamente em se tratando de seu Título VI, que antes dispunha sobre os Crimes Contra os Costumes, cuja tutela se dirigia tão somente à proteção de uma moral sexual de uma época já anciã. Portanto, diante desta necessidade, a alteração do Título VI, para uma nova denominação de Crimes Contra a Dignidade Sexual foi sobremaneira acertada, coadunando, a partir da promulgação da Lei 12.015/09, com a própria ideologia constitucional, qual seja o respeito às Garantias Fundamentais e aos Direito Humanos, procurando expiar-se de qualquer forma de discriminação em suas previsões legais.

Contudo o que se vê com a introdução do tipo penal no art. 217-A é uma verdadeira distorção dos reais objetivos penais e sociais. Buscou-se proporcionar maior proteção legal aos indivíduos tidos como mais vulneráveis a violação de seus bens. Na verdade pode e deve o ordenamento jurídico conferir-lhe maior proteção, mas deve fazer conforme os preceitos e princípios de nossa própria Carta Magna.

Em contrapartida, em que pese o art. 217-A introduzido por esta nova Lei, o Estupro de Vulnerável, flagrante é a desobediência à múltiplos Princípios Constitucionais norteadores do próprio Direito Penal, entre eles a Dignidade da Pessoa Humana, a Adequação Social, a Proporcionalidade, a Culpabilidade, a Individualização da Pena e a Presunção de Inocência, entre diversos outros, demonstrando a clara inconstitucionalidade desta figura típica.

Não se pode negar que os menores de 14 anos, sujeitos passivos sob estudo neste artigo, encontram-se, na maioria dos casos, em real situação de vulnerabilidade, demandando maior proteção legal, sendo, contudo, inconcebível a objetivação fática do Estupro de Vulnerável, pois esta constitui afronta clara aos já mencionados Princípios Fundamentais do Estado Democrático de Direito, não havendo, a nosso ver, outra solução, a não ser a declaração de inconstitucionalidade do art. 217-A do CP, visando a adequação da norma vigente aos alicerces ideológicos de nosso ordenamento, e ainda às novas concepções e demandas sociais, em respeito, principalmente aos limites de um Direito Penal mínimo.

Sabemos, em verdade, por simples conhecimento de mundo, estudando o Estupro de Vulnerável sob a ótica de passivos menores de 14 anos, que não se pode afirmar, nos dias de hoje, que todo aquele que se encontra nesta faixa etária está incapacitado para consentir, pois, embora de forma precoce, possuem sim desenvoltura para escolher iniciar ou não uma vida sexual, fazendo-o de plena ciência sobre o que estão para fazer, mesmo que por vezes analisando as consequências que podem advir de um relacionamento sexual, como uma gravidez, por exemplo, o que, diga-se de passagem, muitas vezes até mesmo pessoas de maior idade têm.

Não se pode conceber, desta feita, que no momento de punir um suposto ofensor, o Direito Penal observe apenas as características de uma presumida vítima, sem ao menos avaliar as condições pessoais do sujeito, a existência ou não de um dolo de ferir a dignidade e a liberdade sexual do sujeito passivo, tendo em vista que o tipo previsto no 217-A do CP não exige a presença de violência real ou até mesmo de grave ameaça, como apontado nesta produção.

É ponto passivo na doutrina atual, que o Direito Penal é inteiramente baseado na culpabilidade do agente, sendo inaceitável sua punição sem considerar este elemento do fato típico, sob pena de verdadeira adoção da Responsabilidade Objetiva, indubitavelmente rechaçada por nosso Código Penal. É, no entanto, o que ocorre na figura do Estupro de Vulnerável.

Uma vez que o Direito Penal encontra fundamento para sua existência na proteção dos indivíduos de uma coletividade, punindo tão somente aqueles que violem bens jurídicos fundamentais, não há lógica, nem bom senso em sancionar indivíduos por condutas que, na verdade, não demonstram qualquer violação de bem a ser protegido, qual seja a dignidade e liberdade sexual dos menores de 14 anos, nos casos em que se possa auferir a capacidade destes para consentir validamente no ato sexual, tendo em vista que o próprio ordenamento jurídico, mais especificamente no Estatuto da Criança e do Adolescente, prevê que estes possuem um nível suficiente de consciência de seus atos infracionais para arcar com suas consequências.

O objetivo de toda a discussão empregada neste trabalho, em verdade, destina-se à resposta de uma única pergunta: a introdução do crime de Estupro de Vulnerável em nossa sistemática jurídica representou um avanço, ou um retrocesso em relação às previsões legais anteriormente vigentes?

Como demonstrado previamente, quando da Justificação do Projeto de Lei que deu origem à Lei 12.015/09, foi-se alegado que houvera uma substituição da anteriormente vigente Presunção de Violência, por uma objetividade fática, isto é, não haveria mais que se aplicar as hipóteses e previsões legais do revogado art. 224 do CP, com a introdução do crime Estupro de Vulnerável.

O que ocorreu, no entanto, é que embora se haja dado uma nova denominação ao fenômeno constante do art. 217-A do CP, continua a prevalecer a presunção de que, independentemente do consentimento da vítima, ou da existência de grave ameaça ou violência real, há uma violência ficta, precisamente o que decorria das antigas disposições do art. 224 do CP, quando tratava da Presunção de Violência. Logo, não há que se falar em real mudança entre o que se previa antes, e o que se observa agora.

A própria doutrina, em sua maioria, já considerava que aquela Presunção de Violência deveria ser relativizada, encaminhando-se até mesmo a jurisprudência de nossos Tribunais Superiores a este entendimento, demonstrando-se que a interpretação desta presunção dar-se-ia em acordo com os Princípios Fundamentais de Direito, e, sobretudo, com a própria realidade social que há muito se descortinava às vistas de todos os setores da comunidade: o desenvolvimento cada vez mais precoce das crianças e adolescentes.

Seria de se esperar que, assim como na maior parte das demais valiosas alterações trazidas pela nova Lei, fosse mantida tal evolução de pensamento, e não que esta trouxesse uma previsão legal que, além de produzir obscuridades dentro do próprio ordenamento, como a revogação tácita do art. 9º da Lei de crimes Hediondos, e a esdrúxula possibilidade de autorização do aborto para todas as menores de 14 anos, com base em uma objetividade fática que representa a adoção da Responsabilidade Objetiva pelo Direito Penal.

Concluímos, portanto, que, muito além de uma intenção inovadora, o legislador, quando da criação do tipo Estupro de Vulnerável, caminhou tão somente para a ratificação de preceitos que já restavam ultrapassados e destoantes da realidade fática do século XXI, uma vez que, ao contrário do que representava a relativização da Presunção de Violência na relação sexual com menores de 14 anos, teve-se, na verdade, a manutenção de verdadeira Presunção Absoluta, camuflada sob o vulgo de Objetividade Fática, promovendo uma inverídica percepção de justa e necessária proteção legal, para encobrir a tutela de uma falsa moral, denotando uma arbitrariedade estatal característica de Estados eminentemente ditatoriais.


BIBLIOGRAFIA

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BRASIL. Código Penal: Decreto-Lei nº. 2.848, de 7 de Dezembro de 1940. Organização do texto: Anne Joyce Angher. Vade Mecum Acadêmico de Direito. 6ª Ed. São Paulo: Rideel, 2008.

___________________ Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Organização do texto: Anne Joyce Angher. Vade Mecum Acadêmico de Direito. 6ª Ed. São Paulo: Rideel, 2008.

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___________________ Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12015.htm. Acesso em: 15 set 2009.

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STF. 2ª Turma. HC 73.662 – MG. EMENTA Ementa: COMPETÊNCIA - HABEAS-CORPUS - ATO DE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Na dicção da ilustrada maioria (seis votos a favor e cinco contra), em relação à qual guardo reservas, compete ao Supremo Tribunal Federal julgar todo e qualquer habeas-corpus impetrado contra ato de tribunal, tenha esse, ou não, qualificação de superior. ESTUPRO - PROVA - DEPOIMENTO DA VÍTIMA. Nos crimes contra os costumes, o depoimento da vítima reveste-se de valia maior, considerado o fato de serem praticados sem a presença de terceiros. ESTUPRO - CONFIGURAÇÃO - VIOLÊNCIA PRESUMIDA - IDADE DA VÍTIMA - NATUREZA. O estupro pressupõe o constrangimento de mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça - artigo 213 do Código Penal. A presunção desta última, por ser a vítima menor de 14 anos, é relativa. Confessada ou demonstrada a aquiescência da mulher e exsurgindo da prova dos autos a aparência, física e mental, de tratar-se de pessoa com idade superior aos 14 anos, impõe-se a conclusão sobre a ausência de configuração do tipo penal. Alcance dos artigos 213 e 224, alínea "a", do Código Penal. Relator Min. Marco Aurélio. Acórdão publicado no DJ 20-09-1996 PP.

STJ. 6ª Turma. REsp 206.658 – SC. EMENTA: RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO. VÍTIMA MENOR DE 14 ANOS DE IDADE. VIOLÊNCIA PRESUMIDA. PRESUNÇÃO RELATIVA. 1. É relativa a presunção de violência contida na alínea "a" do artigo 224 do Código Penal. 2. Recurso conhecido e improvido. Relator Min. Vicente Leal. Publicado no D.J, 10/03/2003.


Notas

  1. O novo Título VI do Código Penal se chama "Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual".
  2. Vez que a própria conjunção carnal é considerada ato libidinoso.
  3. Modalidade de violência ficta.
  4. Art. 7º Revogam-se os arts. 214, 216, 223, 224 e 232 do Decreto-Lei nº. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e a Lei nº. 2.252, de 1º de julho de 1954.
  5. Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.
  6. Podem-se citar como dispositivos que tem respaldo no princípio da proporcionalidade: exigência de individualização da pena (art.5°, XLVI); proibição de determinadas modalidades sanções penais (art.5°, XLVII); admissão de maior rigor para infrações mais graves (art.5°, XLII, XLIII e XLIV)

Autores


Informações sobre o texto

Elaborado sob orientação da Professora Ana Alice Ramos Tejo Salgado - Mestra em Ordem Constitucional pela UFC; professora da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) e da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas (FACISA) na disciplina de Direito Penal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RODRIGUES, Júlia de Arruda; CARDOSO, Larissa Ataide et al. O novo tipo penal estupro de vulnerável e suas repercussões em nossa sistemática jurídica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2338, 25 nov. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13908. Acesso em: 19 abr. 2024.