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A implantação dos consórcios públicos instituídos pela Lei nº 11.107/2005.

Oportunidades e desafios deste instrumento de cooperação federativa

A implantação dos consórcios públicos instituídos pela Lei nº 11.107/2005. Oportunidades e desafios deste instrumento de cooperação federativa

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Vamos mostrar a forma de se organizar um consórcio público, a sua administração, os contratos e figuras relacionadas e as oportunidades, sem deixar de apontar as fragilidades que também existem.

"O que mais preocupa não é o grito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem-caráter, nem dos sem-ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons!"

"Se soubesse que o mundo se desintegraria amanhã, ainda assim plantaria a minha macieira. O que me assusta não é a violência de poucos, mas a omissão de muitos. Temos aprendido a voar como os pássaros, a nadar como os peixes, mas não aprendemos a sensível arte de conviver como irmãos."

Martin Luther King

I – Nota Propedêutica

Passamos por um momento econômico conturbado e a necessidade de adotarmos uma postura agressiva na busca por alternativas é imperiosa. Como decorrência desta crise econômica, vivemos um cenário de escassez de recursos, inclusive públicos, o que impacta de forma direta a capacidade de investimento, acarretando uma drástica redução na disponibilidade dos recursos necessários para a implantação de projetos voltados para a melhoria da infraestrutura de serviços essenciais.

É justamente neste ambiente conturbado que o consórcio público se mostra como alternativa otimizadora na alocação de recursos para consecução de políticas públicas, sendo que o legislador passou a priorizar a transferência de recursos para os entes organizados sob esta forma, o que abre a possibilidade para que, pelo menos no plano teórico, os Municípios mais carentes obtenham recursos para a melhoria das condições de vida da população local.

No presente trabalho vamos procurar mostrar as alternativas viáveis, a forma de se organizar um consórcio público, a sua administração, os contratos e figuras relacionadas e as oportunidades deste instrumento jurídico novo, sem deixar de apontar as fragilidades que também existem.


II – A Gênese e Fundamento dos Consórcios Públicos

O Brasil é um caso raro de país que rompeu com o Federalismo clássico adotado por vários países no mundo, notadamente os Estados Unidos da América – EUA, pois ao contrário dos que adotam essa forma de Estado com um Poder central e os Estados-Membros, formamos um modelo de Federação tripartite, formado pela União, Estados (e Distrito Federal) e Municípios, repartindo competências para a atuação autônoma, porém integrada, de cada um destes entes.

Tivemos, assim, o surgimento atual do que alguns doutrinadores passaram a denominar "Administração Pública Consensual" [01], contrapondo-se à figura do Estado centralizador e imperativo, onde se infere que "a nova disciplina legal dos consórcios públicos está afinada com um perfil contemporâneo de Administração Pública, em que há destaque para atividades e procedimentos negociais que culminem com a conciliação e a compatibilização de todos os interesses envolvidos em torno de uma causa comum" [02].

A Lei nº 11.107/05 introduziu em nosso ordenamento a figura do consórcio público, em atendimento ao preceito do art. 241, da Constituição da República Federativa do Brasil - CRFB, que estabelece, in verbis:

"A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos".

Passamos, felizmente, por uma fase de amadurecimento institucional e nos parece que há uma tendência em se buscar soluções consensuais, acordadas, que acabam contribuindo para a formação de um modelo de desenvolvimento duradouro e sustentável.

Esse momento é chamado pelo Prof. Marçal Justen Filho de "amadurecimento incompleto" do processo político brasileiro, onde sustenta que "embora a Constituição de 1988 tenha representado um passo decisivo na modelagem da organização estatal brasileira, não se produziu uma organização política dotada de estabilidade definitiva. Somente a estabilidade democrática é que produzirá a estabilidade institucional" [03].

O papel do Município ganha especial contorno neste contexto, pois é o ente federativo que melhores condições reúne para que se faça chegar à população local as soluções para suas carências. Bem administrado, o Município consegue exercer importante função gerencial e a proximidade com os problemas cotidianos permite uma melhor visualização das alternativas de solução dos mesmos. Ainda que seja possível a constituição de consórcios públicos entre outros entes, os Municípios serão peça fundamental na maioria dessas associações.


III – Conceito Sintético de Consórcio Público

Os consórcios públicos são parcerias formadas por dois ou mais entes da Federação, para a realização de objetivos de interesse comum, em qualquer área onde este interesse esteja presente.

Ainda que pairem algumas dúvidas, que serão abordadas neste breve trabalho, não podemos deixar de destacar a oportunidade de contarmos com mais um instrumento de gestão pública, que abre caminho para o aprimoramento da cooperação interfederativa, ainda que reconheçamos a existência de pesadas críticas [04] de alguns importantes estudiosos da matéria, que em alguns pontos são pertinentes e em outros entendemos que não.


IV – Histórico Recente da Atuação Conjunta dos Entes Federados

Embora seja possível apontarmos algumas tentativas de atuação conjunta dos entes federados em nosso ordenamento jurídico já no século XIX, foi somente no início da década de 1960 que a discussão ganhou corpo, pois em 1961 é criado o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul - BRDE, que enfrentou muitas dificuldades para conseguir contornar sua condição de autarquia interfederativa, sendo a questão levada inclusive ao STF, e que será analisada adiante de forma mais detida.

Com a CRFB de 1988 o país realmente despertou para a necessidade dos entes federativos serem dotados de autonomia, para que pudessem melhor atender aos anseios da população, sendo necessário aprofundar os laços de cooperação entre eles, por intermédio de mecanismos de atuação conjunta.

A Emenda Constitucional nº 19, de 04.06.1998, alterou a redação do art. 241, possibilitando a formalização de consórcios públicos e convênios de cooperação para que fosse implantada a gestão associada de serviços públicos.

Dada esta permissão, agora expressamente prevista no texto constitucional (embora não fosse necessária para alguns doutrinadores [05]), o legislador ordinário, após relativo debate acerca de alguns Projetos de Lei [06], aprovou a Lei Federal nº 11.107, de 06.04.2005, finalmente se institucionaliza a atuação conjunta e coordenada dos entes federados, dotando-se o consórcio público de personalidade jurídica própria, de modo a produzir maior segurança e estabilidade nas relações interfederativas, sendo regulamentada pelo Decreto nº 6.017, de 17.01.2007.

Por fim, cumpre destacar que, mesmo antes desta legislação específica sobre consórcios públicos, já tínhamos outras formas de cooperação federativa entre as esferas administrativas, sendo que a constituição de consórcios administrativos e a celebração de convênios eram as mais comuns.


V – Dos Entes Consorciantes e Áreas de Atuação dos Consórcios Públicos

Pelo texto da Lei nº 11.107/05, podemos ter várias composições para os integrantes dos consórcios públicos, desde que observadas certas regras previamente fixadas. Desta forma, podem ser constituídos consórcios públicos com as seguintes formatações:

a) Município + Município;

b) Estado + Estado ou Distrito Federal;

c) Estados ou Distrito Federal + Municípios;

d) União + Estados ou Distrito Federal

e) União + Distrito Federal ou Estados + Municípios.

É importante destacar que a União Federal não pode se consorciar com um Município, sem a respectiva participação do Estado em cujos territórios estejam situados os Municípios consorciados, como preconizado no § 2º, do art. 1º, da Lei nº 11.107/2005. O preceito busca evitar possíveis questionamentos quanto à ingerência indevida da União sobre os Municípios, ferindo a autonomia federativa dos Estados, mas em contrapartida, acaba por ferir esta mesma autonomia federativa dos Municípios, pois estes se colocam a depender da adesão dos Estados ao consórcio público, possibilitando o uso político deste instrumento, até que tenhamos um certo grau de maturidade das instituições e dirigentes políticos no país.

Essa preocupação com possíveis conflitos federativos acabou por gerar também o veto presidencial dos incisos III e V do § 1º do art. 4º, da Lei nº 11.107/2005, baseado na Mensagem nº 193, de 06.04.2005, da Casa Civil da Presidência da República. Nos dispositivos vetados, a justificativa foi proibir que a área de atuação dos consórcios públicos abarcasse territórios de Municípios que estivessem em outros Estados que não participassem do consórcio e sem que os territórios fossem contíguos.

Não escapou ao legislador a fundada preocupação acerca da possibilidade de se constituir consórcios públicos entre entes municipais de um Estado com outros Estados distantes, sem qualquer relação de proximidade territorial, podendo gerar conflitos entre eles (Estados), mas, em contrapartida, isso acaba por enfraquecer a autonomia dos Municípios, por lhe tirar a liberdade de associação.

E a mera relação de proximidade territorial não pode ser o único critério de justificativa para a formalização de um consórcio público, pois temos alguns objetivos que não carecem de nenhuma relação de vizinhança geográfica, como, por exemplo, "o apoio e fomento do intercâmbio de experiências e de informações entre os entes consorciados" ou a "produção de informações ou de estudos técnicos [07]".

Neste ponto, ainda que a falta de amadurecimento institucional contribua para uma desconfiança generalizada nas parcerias formadas entre agentes públicos, andou mal o veto dos incisos acima, por dificultar a formação de consórcios públicos que poderiam contribuir muito para os entes consorciantes em determinadas situações, em ações que independem do fato de que sejam seus territórios limítrofes.

O legislador se preocupou, também, com a disciplina da área de atuação dos consórcios públicos, até mesmo para se tentar, uma vez mais, evitar a possível ocorrência de conflitos entre entes da Federação, principalmente no plano político. Desta forma, fixou o critério territorial para a delimitação da área de atuação dos consórcios públicos, sendo a soma dos territórios, independentemente do fato da União figurar como consorciada.

Assim, por exemplo, a área de atuação dos consórcios públicos onde estes forem constituídos somente por Municípios ou por um Estado e Municípios com territórios nele contidos, será a soma dos territórios dos respectivos Municípios.

Agora, se o consórcio público resultar da união de mais de 01 (um) Estado ou por 01 (um) ou mais Estados e o Distrito Federal, a área de atuação será a que compreender a soma dos respectivos territórios dos Estados ou dos Estados e do Distrito Federal.

Ressalte-se que a participação da União Federal não foi considerada para definição da área de atuação, pois faria com que todo consórcio público em que ela participasse se tornasse nacional, o que não traria nenhum benefício na aplicação da Lei, pois o intuito é justamente resolver problemas com impacto na realidade regional e/ou local dos entes consorciados.

Desta forma, não se permitiu também que a União Federal formalizasse um consórcio público diretamente com os Municípios, sendo necessária a presença do respectivo Estado, embora isso reflita na perda de autonomia municipal. Foi uma opção legislativa, onde os responsáveis pela elaboração normativa pátria, uma vez mais, desprezaram princípios fundamentais previstos em nossa Carta de 1988, golpeando de morte a independência e liberdade de associação dos entes que integram o nosso pacto federativo.


VI – A Natureza Jurídica dos Consórcios Públicos

A Lei Federal nº 11.107/05, admite duas formas possíveis de constituição dos consórcios públicos, uma vez que o art. 1º, em seu § 1º, estipula que "o consórcio público constituirá associação pública ou pessoa jurídica de direito privado", e o art. 6º, reproduziu esta disposição, tentando abordar os detalhes desse processo de criação do consórcio público.

O art. 241, da CRFB, cuidou de separar os "consórcios públicos" dos "convênios de cooperação", de forma que não restam dúvidas quanto à diferença de tratamento entre ambos. O convênio é, em sua essência, um contrato entre entes estatais, sendo largamente praticado em nosso ordenamento e como bem salientado pelo Prof. Marçal Justen Filho [08], em Parecer elaborado a pedido do Ministério das Cidades, nada mais é que um consórcio público despersonalizado, se manifestando nos seguintes termos, nas páginas 18-19 do aludido trabalho:

"Ora, a alusão às duas figuras significa a ausência de identificação entre elas. Se a vontade constitucional fosse negar ao consórcio público personalidade jurídica, o resultado seria uma modalidade de convênio. Logo, bastaria a Constituição ter-se referido a convênios de cooperação.

Ou seja, a própria Constituição diferenciou convênios e consórcios. E o único aspecto que pode conduzir à diferenciação entre ambas as figuras reside na atribuição de personalidade jurídica autônoma ao consórcio público. Qualquer outra solução conduz a que o consórcio público seria uma modalidade de convênio.

Portanto, se a Constituição diferenciou ambas as figuras, o intérprete não pode ignorar a vontade constitucional. Cabe-lhe respeitar a vontade constitucional.

Em suma, afirmar que o consórcio público não pode ter personalidade jurídica autônoma equivale a tornar inútil a figura e a própria redação constitucional."

Todavia, há uma questão preliminar que se coloca: teria este "convênio de cooperação" que é mencionado no art. 241, da CRFB, a mesma natureza jurídica dos convênios administrativos já consagrados na doutrina pátria e amplamente utilizados? A festejada Professora Alice Gonzalez Borges [09] entende se tratar de espécie de ajuste nova, distinta do convênio administrativo, na esteira do posicionamento adotado pelo Prof. Wladimir António Ribeiro [10].

Alguns autores sustentam que o consórcio público teria natureza jurídica contratual [11], pois a Lei menciona que os entes da Federação poderão contratar "consórcios públicos", conforme previsto no art. 1º. Todavia, fica extremamente complicado se justificar um "contrato" assumindo obrigações perante terceiros, exercendo direitos, promovendo desapropriações e instituindo servidões sem que se tenha um ente dotado de personalidade jurídica, quer seja de direito público ou de direito privado sem fins econômicos [12].

O contrato é instrumento hábil para a formalização do consórcio público, sendo inclusive uma das etapas necessárias para o seu regular funcionamento, mas não há como se sustentar que seja essa a sua natureza jurídica, até porque o próprio texto legal deu aos entes consorciantes a possibilidade de escolha quanto à forma, que será sempre uma associação, de direito público (associação pública com o mesmo tratamento de uma autarquia) ou de direito privado (associação privada, figura típica do direito civil).

Aqui vale uma análise mais detida quanto ao tratamento dado para ambas as formas de associação facultadas aos entes consorciantes.

VI.1 – A Personalidade Jurídica do BRDE: o início do debate

A doutrina sempre utilizou a expressão "autarquia interfederativa", "autarquia multifederativa" ou "autarquia plurifederativa" para esta forma de pessoa jurídica de direito público quando composto por mais de um ente da Federação. O caso mais citado, e que já foi inclusive analisado pelo Supremo Tribunal Federal – STF, foi o que envolveu a natureza jurídica do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul - BRDE, uma importante instituição financeira destinada ao fomento da Região Sul, criada de forma conjunta pelos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná em 15 de junho de 1961, sob a forma de autarquia interfederativa, e que foi o primeiro caso de associação semelhante ao consórcio público atual.

Ocorre que a Constituição vigente à época era a de 1946, e embora tivesse inspiração num processo de redemocratização após o período do Estado Novo, não consagrava a cooperação interfederativa de forma expressa, até porque os Municípios não eram tratados como entes da Federação ao lado dos Estados e da União Federal. Isto trouxe uma série de problemas quanto à possibilidade de se adotar essa forma de personalidade jurídica para o BRDE, sendo que o STF se manifestou acerca do tema, negando esta característica em decorrência do que dispunha nosso ordenamento jurídico à época, conforme noticiado no Informativo de Jurisprudência nº 247, desta Corte.

Em julgamento que serviu de fundamento para a decisão do STF mencionada no Informativo, o Tribunal se manifestou no Recurso Extraordinário nº 120.932/RS, julgado em 24.03.1992, Diário da Justiça de 30.04.1992, tendo como Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, in verbis, sem negrito no original:

Ementa

Execução fiscal: débito representado por Cédula de Crédito Industrial em favor do BRDE - Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul: inidoneidade da via processual, resultante da solução negativa a questão constitucional da suposta natureza autárquica interestadual, que se arroga o credor exequente: RE provido.

I. Atividade econômica do Estado: intervenção suplementar no domínio econômico ou exploração de serviço público.

1. Ainda que se devesse reduzir a participação suplementar do Estado na atividade econômica "stricto sensu" - objeto do art. 170 CF/69 - aquela que se faça mediante o apelo à técnica privatística das empresas estatais de forma mercantil não basta a descaracterização, em tese, da natureza autárquica de um banco de desenvolvimento criado pelo Poder Público.

2. (...)

II. Autarquia interestadual de desenvolvimento: sua inviabilidade constitucional.

3. O dado diferencial da autarquia e a personalidade de direito público (Celso Antônio), de que a podem dotar não só a União, mas também as demais entidades políticas do Estado Federal, como técnicas de realização de sua função administrativa, em setor específico subtraído a administração direta.

4. Por isso mesmo, a validade da criação de uma autarquia pressupõe que a sua destinação institucional se compreenda toda na função administrativa da entidade matriz.

5. O objetivo de fomento do desenvolvimento de região composta pelos territórios de três Estados Federados ultrapassa o raio da esfera administrativa de qualquer um deles, isoladamente considerado; só uma norma da Constituição Federal poderia emprestar a manifestação conjunta, mediante convênio, de vontades estatais incompetentes um poder que, individualmente, a todos eles falece.

6. As sucessivas Constituições da Republica - além de não abrirem explicitamente às unidades federadas a criação de entidades públicas de administração interestadual -, têm reservado a União, expressa e privativamente, as atividades de planejamento e promoção do desenvolvimento regional: analise da temática regional no constitucionalismo federal brasileiro.

Cumpre destacar que o atual arcabouço jurídico é distinto do momento em que foi proferido o julgamento acima, pois a Emenda Constitucional nº 19/1998, deu nova redação ao art. 241, da CRFB, disciplinando de forma explícita a possibilidade dos entes federativos se unirem mediante consórcios públicos ou convênios de cooperação para a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos.

Caso a organização dos consórcios públicos sob a forma de associação pública, representando uma autarquia interfederativa, chegue novamente ao STF, desta vez, tudo leva-nos a crer que o debate será mais amplo e existe a possibilidade de definitivamente se reconhecer esta forma de organização dos entes associados.

VI.2 – A Personalidade Jurídica de Direito Público

Os consórcios públicos com personalidade jurídica de direito público integram a Administração Indireta de todos os entes da Federação consorciados, e esta regra certamente trará problemas práticos no decorrer dos anos, como por exemplo, eventuais conflitos entre Tribunais de Contas de Estados distintos ao analisarem as contas do consórcio público e chegarem a conclusões divergentes. Basta imaginarmos uma situação, bem provável de ocorrer na prática, onde um Tribunal aprove e o outro reprove as mesmas contas apresentadas.

Por mais que o art. 9º, parágrafo único da Lei nº 11.107/05, tenha tentado disciplinar a matéria, evitando a sobreposição de controles, ao dispor que "o consórcio público está sujeito à fiscalização contábil, operacional e patrimonial pelo Tribunal de Contas competente para apreciar as contas do Chefe do Poder Executivo representante legal do consórcio, inclusive quanto à legalidade, legitimidade e economicidade das despesas, atos, contratos e renúncia de receitas, sem prejuízo do controle externo a ser exercido em razão de cada um dos contratos de rateio", não se pode simplesmente ignorar a atribuição dos demais Tribunais de Contas, como bem assevera a Profª. Di Pietro [13], in verbis:

"Isto (a previsão do art. 9º, parágrafo único), contudo, não tem e não pode ter o condão de afastar o controle efetuado pelo Tribunal de Contas competente para apreciar as contas dos demais entes federativos partícipes do consórcio, sob pena de infringência às normas constitucionais sobre fiscalização pelo Poder Legislativo, com o auxílio do Tribunal de Contas."

Por fim, vale destacar que a pretensão inicial do legislador (como enviada a proposta de Projeto de Lei do Executivo ao Congresso) era criar apenas a figura do consórcio público com personalidade jurídica de direito público e, neste sentido, merece transcrição um trecho do Parecer proferido pelo Prof. Floriano de Azevedo Marques Neto [14], onde estatui que:

"seria um verdadeiro pleonasmo constitucional (não admitido na boa hermenêutica, pois, não se pode ver na norma constitucional palavras inúteis ou rebarbativas) entender que o constituinte quis que fossem públicos os consórcios que já naturalmente o seriam! Ao contrário, o constituinte recorreu ao adjetivo público exatamente porque, pretendendo que eles assumam personalidade jurídica (já que os consórcios se prestarão para exercer de forma contínua função pública – gestão associada de serviços públicos - e receberão um plexo de direitos e obrigações, v.g., encargos, bens, serviços), quis afastar a hipótese de serem eles constituídos como pessoas jurídicas de direito privado (mesmo que fossem sociedades de economia mista, empresas públicas ou mesmo fundações). Emerge a terceira nota: o adjetivo "públicos" pós-posto ao conceito de consórcios obriga que estes entes estejam submetidos ao regime de direito público não só na sua gestão, mas na sua constituição. Mais ainda, predica que os entes consorciais criados com vistas ao cumprimento do preceito contido no art. 241 sejam dotados de personalidade jurídica de direito público. Em verdade, a adjetivação em referência opera uma significativa distinção em relação aos comezinhos consórcios administrativos de que há muito temos conhecimento."

VI.3 – A Personalidade Jurídica de Direito Privado

Por outro lado, quando o consórcio for pessoa jurídica de direito privado, sua constituição deve ser efetivada conforme a legislação civil, de modo que a aquisição da personalidade ocorrerá com o registro dos atos constitutivos no registro público. Todavia, ainda estará sujeito às normas de direito público, no que concerne à realização de licitação, celebração de contratos, prestação de contas e admissão de pessoal, como não podia deixar de ser.

A Lei nº 11.107/05 foi omissa e não esclarece se os consórcios públicos de direito privado integram ou não a Administração Pública, mas ao dispor expressamente que os consórcios públicos com personalidade jurídica de direito público integram a Administração Indireta, e nada dizer a respeito dos consórcios públicos de direito privado, poderíamos até imaginar que a pretensão do legislador foi que estes não integrassem formalmente a Administração Pública [15].

Contudo, não parece que será esse o melhor caminho a ser seguido. Carece de lógica aventarmos a possibilidade de várias pessoas jurídicas políticas, portanto, com personalidade jurídica de direito público, se reunirem e desta união resultar uma pessoa jurídica de direito privado, que vai desempenhar atividades próprias dos entes instituidores e mesmo assim ela não integrar a Administração Pública, como se fosse da iniciativa privada [16]. Corroborando esse entendimento, vale citar Di Pietro [17], in verbis:

"Todos os entes criados pelo Poder Público para o desempenho de funções administrativas do Estado têm que integrar a Administração Pública Direta (se o ente for instituído como órgão sem personalidade jurídica) ou Indireta (se for instituído com personalidade jurídica própria). Até porque o desempenho dessas atividades dar-se-á por meio de descentralização de atividades administrativas, inserida na modalidade de descentralização por serviços."

Portanto, ao que tudo indica, caminhamos, no sentido de adoção da conclusão de que os consórcios públicos são novas pessoas jurídicas, que podem ser dotadas de personalidade jurídica de direito público ou de direito privado, sendo que, independentemente da forma que adotem, integrarão sempre a Administração Pública Indireta.

Não podemos deixar de notar que o legislador parece ter se arrependido pela opção de permitir a criação de consórcios com personalidade jurídica de direito privado e tem buscado, desde então, mecanismos de incentivo para a constituição de consórcios públicos na forma de associação pública (de natureza autárquica), fazendo com que a emenda saia pior que o soneto, pois é flagrantemente ilegal e inconstitucional este tratamento diferenciado. Como exemplo, citamos o art. 39, do Decreto nº 6.017/07, ao estabelecer que a União só celebrará convênios, a partir de 01 de janeiro de 2008, com consórcios públicos constituídos sob a forma de associação pública.

VII – A Estruturação de um Consórcio Público

Pode soar estranho, mas, por incrível que pareça, ainda temos um número elevado de Municípios, e até mesmo de Estados, que desconhecem as regras para a constituição de um consórcio público em conformidade com o disposto na Lei nº 11.107/05, ao confundirem este instituto com as figuras assemelhadas, notadamente os consórcios despersonalizados em algumas áreas, como saúde e saneamento básico, anteriores à edição da aludida legislação.

Por vezes, já nos deparamos, em reuniões para discutir formas de incentivo a Municípios que se diziam integrantes de um consórcio público, com situações em que pedíamos para analisar o Protocolo de Intenções, e éramos surpreendidos com a afirmação de que não sabiam do que se tratava. Isso ocorria por várias razões, sendo que as principais são duas: a ausência da participação das Procuradorias Municipais (infelizmente constatamos, em mais de uma ocasião, que os pequenos Municípios sequer contam com este órgão estruturado) no momento inicial de formatação do consórcio público e a falta de estrutura dos Municípios na concepção destas operações por intermédio deste instrumento de cooperação.

Para que fique mais clara a compreensão dos procedimentos a serem adotados na formação de um consórcio, em observância ao disposto na Lei nº 11.107/05, optou-se por dividir em 04 (quatro) fases distintas o trâmite de constituição:

1ª Fase – Tratativas Iniciais

Embora poucos falem dessa fase ao tratar do assunto, consideramos ser ela a mais importante, pois é sabido por todos que a reunião de vários entes políticos quase nunca é tarefa fácil, pois temos vários interesses pessoais envolvidos, e que, por vezes, acabam inviabilizando um projeto maior que beneficiaria a população.

Essa fase preliminar, nas palavras de MEDAUAR e OLIVEIRA [18] seria "um espaço de diálogo e de concertação, o qual se alinha a uma tendência crescente nas práticas administrativas mundiais."

2ª Fase – Protocolo de Intenções

Nos exatos dizeres do art. 3º, da Lei nº 11.107/05, o consórcio público é constituído por intermédio de um contrato, cuja celebração dependerá da prévia subscrição de protocolo de intenções. Deste breve período, podemos inferir que, sem a elaboração prévia de um documento intitulado protocolo de intenções, ainda que eu tenha a assinatura de um contrato de consórcio, este não produzirá os efeitos da Lei nº 11.107/05, por não seguir o rito imposto pelo legislador.

Sem o protocolo de intenções, o contrato de consórcio celebrado terá os mesmos efeitos dos consórcios celebrados antes desta Lei, sendo um ente despersonalizado, constituído para alcançar interesses comuns dos entes reunidos.

Este erro era muito comum no início de vigência da novel legislação e agora tem diminuído com um maior rigor na observância dos ritos necessários, muito em decorrência do intenso debate sobre a matéria e da implantação das primeiras experiências.

Segundo a definição dada pelo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, a palavra "protocolo" assenta suas raízes no vocábulo grego "protókollon", que seria a "primeira folha colada aos rolos de papiro, e na qual se escrevia um resumo do conteúdo do manuscrito". Em termos jurídicos, o significado pouco mudou, sendo exatamente entendido como um instrumento preliminar à celebração de outro que o substituirá, o definitivo.

A acepção que se quis dar para o protocolo de intenções é exatamente essa, sendo possível defini-lo com um documento preliminar necessário à formação de um consórcio público, com conteúdo mínimo fixado por Lei, que carece da assinatura de cada um dos Chefes do Poder Executivo interessados (ou seus representantes legais devidamente habilitados) na formalização do consórcio.

E onde temos a delimitação deste conteúdo mínimo? Na própria Lei nº 11.107/05, no seu art. 4º, temos o vasto rol de cláusulas que necessariamente devem estar previstas no protocolo de intenções.

Não cumpre aqui fazer uma análise sobre cada uma das cláusulas obrigatórias, mas não podemos deixar de traçar algumas considerações relevantes acerca do tema.

O primeiro ponto versa sobre a existência de algumas cláusulas que, apesar de serem elencadas como obrigatórias, só deverão ser reproduzidas, caso tenham alguma relação com o escopo, com o objetivo a ser executado pelo consórcio.

Devemos observar, também, que o protocolo de intenções deve indicar o prazo de duração do consórcio público, que, via de regra, será por tempo indeterminado, mantendo-se a instituição enquanto for conveniente o seu prosseguimento. Todavia, o que fazer caso o prazo seja determinado e após o vencimento ainda haja interesse em prosseguir com o consórcio público, já que a Lei nº 11.107/05 não fixou limites mínimos e máximos de duração e nem tratou da prorrogação do prazo? Basta existir a previsão de prorrogação, com aprovação da Assembléia Geral e a autorização legislativa respectiva, pois, acima de formalismos, devem estar a constante busca pela eficiência e o melhor atendimento à população diretamente interessada.

Fixadas as diretrizes e conteúdo mínimo do protocolo de intenções, temos praticamente a essência do futuro consórcio público, que será ainda objeto de apreciação pelo Poder Legislativo de cada um dos entes envolvidos.

3ª Fase – Ratificação do Protocolo de Intenções mediante Lei

Remonta a Aristóteles [19] as bases de uma teoria de "tripartição dos Poderes", onde o soberano seria o encarregado de exercitar as três funções básicas do Estado (legislar, administrar e julgar). Já no século XVII, Montesquieu na sua clássica obra [20], proclamava a necessidade de existir um controle recíproco entre os Poderes, numa forma de se evitar os abusos, que fatalmente levariam ao arbítrio, exatamente o que se combatia no Absolutismo. A tese por ele defendida ficou conhecida no constitucionalismo moderno como "teoria dos freios e contrapesos", ou "checks and balances" no Direito norte-americano.

Uma forma moderna de se buscar esta interpenetração dos Poderes é conferir transparência na forma de ação de cada um deles e, se possível, com a participação dos demais, propiciando uma gestão integrada na consecução dos interesses da nação.

A ratificação do protocolo de intenções se dá por intermédio de uma lei específica, que deve ser aprovada por cada Poder Legislativo dos entes que pretendem integrar a estrutura do consórcio público, nos termos do que determina o art. 5º, da Lei nº 11.107/05. Aqui fica evidente uma forma de controle sobre o Chefe do Poder Executivo, até como forma de respaldar a sua atuação, que será referendada pelos representantes eleitos pelo povo para legislarem em prol da coletividade.

O próprio legislador permitiu que, caso assim esteja previsto em alguma cláusula, o contrato de consórcio possa ser celebrado por apenas determinado número de entes da Federação que subscreveram o protocolo de intenções [21], da mesma forma que a ratificação também pode ser realizada com reserva que, aceita pelos demais entes subscritores, implicará consorciamento parcial ou condicional [22].

Como já salientado, não se poderia deixar nas mãos de um dos entes a discricionariedade de postergar a sua adesão ou não ao consórcio público, gerando atrasos na sua implantação e consecução dos seus objetivos, e como forma de controle contra esses possíveis abusos, a ratificação realizada após 02 (dois) anos da subscrição [23] do protocolo de intenções dependerá de homologação da Assembleia Geral do consórcio, até para que se possa avaliar a conveniência ou não da adesão tardia, já que a associação já estará em pleno funcionamento, e certamente com sua estrutura toda formada.

Todavia, nada impede que um ou mais interessados aprovem a sua Lei com reservas a determinados pontos do consórcio, sendo perfeitamente possível o Poder Legislativo exercer esse controle sobre a conveniência de se aderir ou não a determinadas condições [24].

Cumpre destacar que o consórcio público pode ser constituído sem que seja necessária a ratificação de todos os que assinaram o protocolo, pois se a unanimidade fosse condição para a formação de todo consórcio, certamente teríamos imensas dificuldades na sua efetiva implantação. Além disto, seria aberta uma verdadeira janela para o leilão de favores.

4ª Fase – Elaboração dos Estatutos, Regimentos e Demais Instrumentos Jurídicos Necessários

Para a constituição do consórcio, além do protocolo de intenções, já firmado entre os entes consorciantes, e sua ratificação pelas respectivas Casas Legislativas, faz-se necessário convocar uma Assembleia Geral, a instância máxima do consórcio, composta apenas pelos entes consorciados [25], para elaborar os estatutos e regimento e os contratos com as responsabilidades financeiras de cada consorciado.

Após as etapas anteriores, será convocada a Assembleia Geral do consórcio público, que decidirá sobre os seus estatutos que, em tudo, deverão obedecer ao estatuído no protocolo de intenções que, após a ratificação, converte-se no contrato de constituição do consórcio público.

Um aspecto relevante a ser tratado no protocolo de intenções e que está relacionado com o funcionamento da Assembleia Geral é o número de votos a que cada ente consorciado tem direito. A premissa básica é a de que cada ente consorciado tenha, pelo menos, direito a 01 (um) voto [26], e desta maneira, jamais teremos participante do consórcio sem direito a voto. Todavia, por uma série de fatores, podemos ter entes com direito a um número maior de votos que outros partícipes.

Desta maneira, já no protocolo de intenções, os entes devem definir essa questão e, pela prática dos nossos arranjos político-administrativos, supomos que só teremos a regra do "um pra um" (um ente = um voto) alterada quando tivermos a participação de entes de esferas distintas, como um consórcio vertical, onde teremos União e Estados se consorciando com Municípios, ou quando tivermos a associação de um grande Município, como uma capital, com outro de menor envergadura.

Essa possibilidade de pesos diferentes nas votações da Assembleia Geral tem levado a doutrina [27] a criticá-la, pois se o intuito é uma gestão associada, cada integrante deve ter direito a um voto na Assembleia. Entretanto, o momento oportuno para o debate acerca desta distribuição de poderes é na fase de tratativas e confecção do protocolo de intenções, de tal sorte que, na elaboração dos estatutos, o debate não trará nenhuma alteração neste critério previamente definido.

O consórcio público, por ter personalidade jurídica própria, necessita ser representado nas suas relações perante terceiros e por isso é prevista a escolha do representante legal do consórcio, devendo tal obrigação recair sobre o Chefe do Poder Executivo de ente da Federação consorciado, conforme determina o art. 4º, no seu inciso VIII, da Lei nº 11.107/05.

A duração do mandato do representante legal do consórcio estará previamente fixada no protocolo de intenções, e um dos casos que pode levar a disputas dentro do consórcio, atrapalhando seu bom funcionamento, é a existência de vários entes consorciados, fazendo com que nem todos os Chefes do respectivo Poder Executivo consiga exercer a tarefa de representar o consórcio. A prática nos dirá se o grau de amadurecimento das nossas instituições e dos respectivos mandatários do povo nos permite considerar esta possibilidade uma mera hipótese acadêmica.


VIII – Contrato de Rateio

Como o leitor mais atento já deve ter percebido, uma das questões essenciais consiste em como se formar um patrimônio próprio para o consórcio público, para que este tenha autonomia na sua gestão financeira, sem confusão com o patrimônio dos entes instituidores. Foi pensando nesta sistemática que o legislador criou a figura do contrato de rateio.

O Decreto nº 6.017, de 17.01.2007, regulamentou a Lei nº 11.107/05, e no inciso VII, do art. 2º, definiu o contrato de rateio como o "contrato por meio do qual os entes consorciados comprometem-se a fornecer recursos financeiros para a realização das despesas do consórcio público".

O contrato de rateio foi o mecanismo eleito pelo legislador como único instrumento autorizado a cuidar da sistemática de aporte de recursos necessários à sustentabilidade dos consórcios públicos pelos entes consorciados. Deste modo, nenhum aporte de recursos pode ser feito de outra forma, fazendo com que seja possível maior controle sobre a transferência de recursos dos entes públicos para o consórcio público. As duas únicas exceções são os casos de contratos dos projetos contemplados em plano plurianual de investimentos, e os de gestão associada de serviços públicos, mantidos pela receita de tarifas ou outros preços públicos, uma vez que os recursos não têm origem no orçamento dos integrantes do consórcio.

Os repasses estipulados no contrato de rateio devem ter previsão nos respectivos orçamentos dos entes participantes do consórcio, até mesmo para que seja indicada a fonte de receita, além de permitir o controle pelo Poder Legislativo correspondente, e dos respectivos Tribunais de Contas.

Este contrato de rateio tem sua validade condicionada ao prazo das dotações orçamentárias, sendo, portanto, anual, justamente para acompanhar a sistemática orçamentária, de cada ente envolvido, propiciando a constante adequação às mudanças sofridas ao longo do exercício.


IX – Financiamentos e Outras Fontes de Recursos dos Consórcios Públicos

Vamos analisar agora a possibilidade ou não do consórcio público poder contar com outras fontes de recursos, diferentes das contempladas na Lei nº 11.107/2005 e acima elencadas, como a celebração de operações de crédito com instituições financeiras, inclusive os bancos estatais que geralmente são os responsáveis pela concessão de financiamentos para projetos de longo prazo, tais como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, e a Caixa Econômica Federal – CEF.

O art. 2º, § 1º, I, da Lei nº 11.107/05, prevê que o consórcio público pode ser destinatário de auxílios, contribuições e subvenções sociais ou econômicas oriundos de outras entidades e órgãos governamentais. A definição para cada uma destas modalidades de transferências de recursos está no texto da Lei nº 4.320, de 17.03.1964, que dispõe sobre normas gerais de direito financeiro.

O que causa estranheza é a existência de afirmação na página da Presidência da República na internet, destacando que: "consórcios não podem contratar operações de crédito. Devem receber dinheiro apenas dos entes consorciados" e consigna que "a alocação de recursos nos consórcios por meio de empréstimos obtidos pelos entes da federação, deve respeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF e os limites de endividamento" [28], dando a entender que esta seria a única forma de recursos oriundos de operações de crédito chegarem ao consórcio.

Em prevalecendo este entendimento, estaremos criando realmente uma nítida classe discriminatória de pessoa jurídica, onde esta já nasce com sua capacidade reduzida (verdadeira "capitis diminutio" [29]), pois não terá condições de exercer em toda a sua plenitude os direitos que são conferidos a outras instituições que se encontram, em muitos casos, incumbidas da mesmíssima atividade desempenhada pelo consórcio. Esse entendimento nos remete à ideia de uma instituição que não terá direito a crédito, ainda que este seja o pilar de todo processo de produção e circulação de riquezas, sendo instrumento indispensável para o desempenho de qualquer atividade que demande investimentos.

Podemos chegar ao absurdo de termos um consórcio público com ótima situação econômica, mostrando-se capaz de gerir bem a prestação de serviço público que lhe foi atribuída e não poder contar com o financiamento decorrente de operações de crédito pelo fato dos Municípios que dele fazem parte estarem desajustados dos limites da LRF e/ou dos limites de endividamento. Bastaria o consórcio oferecer parte da sua receita em garantia da operação de crédito (preservando sempre uma margem prudencial suficiente de recursos livres, de modo que eventual execução não inviabilize a prestação do serviço).

Realmente, terá andado muito mal o legislador neste aspecto, caso prevaleça este posicionamento, do qual somos obrigados a discordar. Todavia, o próprio Decreto que regulamentou a Lei de Consórcios Públicos, no seu art. 10, inciso I, expressamente prevê esta possibilidade do consórcio público contratar operações de crédito, claro que após o preenchimento dos mesmos requisitos a que qualquer outro ente da Administração está submetido para celebrar estas operações de crédito. Eis a dicção do referido art. sem negrito no original, in verbis:

Art. 10.  Para cumprimento de suas finalidades, o consórcio público poderá:

I - firmar convênios, contratos, acordos de qualquer natureza, receber auxílios, contribuições e subvenções sociais ou econômicas;

(...)

Parágrafo único.  A contratação de operação de crédito por parte do consórcio público se sujeita aos limites e condições próprios estabelecidos pelo Senado Federal, de acordo com o disposto no art. 52, inciso VII, da Constituição.

Não nos parece restar dúvida alguma quanto à possibilidade de se celebrar uma operação de crédito com um consórcio público, e por esta razão causa espanto a afirmação constante no endereço eletrônico da Presidência da República em sentido contrário.

A única vedação que existe para a realização de operações de crédito e transferências voluntárias é a destinação dos recursos fornecidos pelo ente federativo [30] por meio de contrato de rateio para a cobertura de despesas genéricas, que são aquelas em que a execução orçamentária se faz com modalidade de aplicação indefinida [31], em nada interferindo na relação do consórcio com terceiros.

Talvez em decorrência deste posicionamento aparentemente institucional adotado pela Casa Civil de não admitir que os consórcios públicos celebrem operação de crédito, a Secretaria do Tesouro Nacional ainda não tenha disciplinado por intermédio de algum ato normativo o procedimento necessário para que os consórcios públicos tenham os seus limites de endividamento verificados e consigam autorização desta Secretaria para a contratação de operações de crédito, seguindo a mesma sistemática usada para Estados e Municípios, em cumprimento aos preceitos da LRF.

Em que pese alguns equívocos na condução política [32] e outras imperfeições na metodologia de escolha dos entes destinatários dos recursos, o atual governo vem adotando uma postura de buscar manter investimentos constantes em alguns setores importantes, como habitação, urbanização de áreas e, sobretudo, em saneamento ambiental, por meio de repasse de recursos do Orçamento Geral da União – OGU e por intermédio de concessão de financiamento para Estados e Municípios (inclusive por meio de suas autarquias de saneamento), através dos bancos oficiais, notadamente BNDES e CEF.

Como admitir-se a impossibilidade deste consórcio ter acesso a esta importante fonte de captação de recursos, ficando a depender sempre do aporte de recursos por parte dos membros do consórcio?

Outra questão relevante a ser debatida por todos é a forma de garantia destes financiamentos, já que o regime jurídico adotado será o de direito público, mesmo para os consórcios que se constituírem sob a forma de associações com personalidade jurídica de direito privado, dada a natureza das atividades desempenhadas.


X – Contrato de Programa

O contrato de programa é definido no inciso XVI, do art. 2º, do Decreto nº 6.017/07, como o "instrumento pelo qual devem ser constituídas e reguladas as obrigações que um ente da Federação, inclusive sua administração indireta, tenha para com outro ente da Federação, ou para com consórcio público, no âmbito da prestação de serviços públicos por meio de cooperação federativa".

De início devemos salientar que o contrato de programa é uma das modalidades de gestão associada, da mesma forma que o consórcio público, o convênio de cooperação e outros instrumentos correlatos, e pode ser celebrado tanto no âmbito de um consórcio público ou mesmo fora deste e importa destacar que o que vai nortear a escolha do modelo a ser adotado será a possibilidade de uma melhor prestação do serviço, revertendo em proveito do cidadão, ultima ratio da atuação estatal (pelo menos em tese).

Podemos ter a associação por intermédio do contrato de programa de algumas maneiras, dependendo das partes envolvidas. Deste modo, pode-se ter um contrato de programa, pela letra da lei, entre entes federativos (Município com Estado, por exemplo), entre estes e um consórcio público (caso de Município com consórcio público) e entre um ente federativo e uma entidade da Administração Pública Indireta (Estado com uma sociedade de economia mista de um Município) e por fim, de duas pessoas de Administrações Públicas Indiretas distintas (por exemplo, fundações públicas de Municípios diferentes) [33].

Uma coisa deve ficar clara: o contrato de programa é um instrumento de cooperação federativa e por isto, envolverá sempre a figura de entidades públicas, vinculadas à Administração [34].

O contrato de programa deve atender a uma série de requisitos elencados na própria Lei [35] em comento, e que foram pormenorizados no seu Decreto regulamentar [36], em seu artigo 33.

Não podemos deixar de lembrar que o contrato de programa é mais um instrumento à disposição dos entes federativos para a cooperação entre eles, sendo admitida a celebração deste contrato inclusive com entes que não integrem o consórcio público, já que são instrumentos distintos [37].


XI – A Alteração e Extinção dos Consórcios Públicos

A extinção de um consórcio pode ocorrer por vários motivos, que vão desde o esgotamento da atividade para a qual foi originariamente criado até o eventual desinteresse por parte dos integrantes em continuar o desempenho dos objetivos do mesmo.

Podemos ainda ter a alteração da composição dos integrantes do consórcio, ou no objeto a ser por ele executado [38]. Podemos ter o ingresso de algum novo integrante, ou pela saída de algum outro participante. Se o consórcio público é formado apenas por dois entes, a saída de um deles acarreta a extinção do consórcio [39].

A retirada (ou recesso, termo utilizado pelo Decreto regulamentador no art. 25) de um ente da Federação do respectivo consórcio público dependerá de ato formal de seu representante na Assembleia Geral, na forma previamente disciplinada por lei, sendo que trata-se de um afastamento voluntário do ente consorciado, uma vez que nenhum "ente da Federação poderá ser obrigado a se consorciar ou a permanecer consorciado" [40], por ser a liberdade de associação um direito constitucionalmente assegurado.

Obviamente que a retirada causará alguma alteração na rotina de funcionamento do consórcio e por isso ela deve atender a um procedimento pré-estabelecido, onde teremos a formalização do pedido de retirada, através de ato formal, que pode ser um Decreto, Ofício ou qualquer outro documento hábil a produzir estes efeitos, emitido pelo representante legal, em Assembleia Geral do consórcio público, seguindo o que determina a lei que disciplinar a saída do ente do consórcio.

Este processo de retirada, ainda que seja voluntário, fará com que o ente retirante se mantenha responsável por obrigações contraídas anteriormente à sua efetiva saída, e por esta razão, o art. 11, § 2º, da Lei nº 11.107/05, determina que "a retirada ou a extinção do consórcio público não prejudicará as obrigações já constituídas, inclusive os contratos de programa, cuja extinção dependerá do prévio pagamento das indenizações eventualmente devidas".

Da mesma forma, teremos uma apuração de haveres, sendo que os "os bens destinados ao consórcio público pelo consorciado que se retira somente serão revertidos ou retrocedidos no caso de expressa previsão no contrato de consórcio público ou no instrumento de transferência ou de alienação" [41].

Nesta linha de raciocínio, "a alteração ou a extinção de contrato de consórcio público dependerá de instrumento aprovado pela Assembleia Geral, ratificado mediante lei por todos os entes consorciados" [42], de modo a preservar a estabilidade necessária ao pleno funcionamento do consórcio público.

Falta-nos falar ainda da exclusão de ente consorciado, que trataremos dentro deste ponto, pois a exclusão não deixa de ser uma modalidade de alteração na composição do consórcio público. Consiste no afastamento compulsório ou involuntário do ente, em virtude de fato superveniente ensejador na justa causa necessária para a sua expulsão.

Ao ingressar no consórcio público, o ente federativo consorciante assume uma série de responsabilidades perante o consórcio e os demais entes agrupados, onde o descumprimento destas obrigações faz surgir a justa causa ensejadora da medida extrema por parte dos demais integrantes, sendo uma forma de punir a inadimplência do ente em mora.

Prevendo forma de evitar eventuais perseguições no âmbito do consórcio, que poderiam ocorrer, por exemplo, com a mudança no comando político de determinado participante, o legislador fez constar que "a exclusão de ente consorciado só é admissível havendo justa causa" [43].

O legislador ordinário criou a figura do contrato de rateio como a única forma de aporte de recursos dos entes consorciados no consórcio público e estipulou que "poderá ser excluído do consórcio público, após prévia suspensão, o ente consorciado que não consignar, em sua lei orçamentária ou em créditos adicionais, as dotações suficientes para suportar as despesas assumidas por meio de contrato de rateio" [44].

A exclusão, por ser ato extremo de repreensão para com o ente inadimplente, deve ser precedida de prévia suspensão, abrindo-se assim a oportunidade para que o ente ameaçado de expulsão regularize a sua situação perante o consórcio e seus integrantes, reabilitando-se [45] e, assim, voltando a participar ativamente do consórcio. Além disto, para garantir um procedimento justo, o consorciado tem assegurado o direito à ampla defesa e ao contraditório [46].

O art. 26, § 1º, do Decreto nº 6.017/07, estipula que, "além das que sejam reconhecidas em procedimento específico, é justa causa a não inclusão, pelo ente consorciado, em sua lei orçamentária ou em créditos adicionais, de dotações suficientes para suportar as despesas que, nos termos do orçamento do consórcio público, prevê-se devam ser assumidas por meio de contrato de rateio", reforçando a importância dada ao devido aporte de recursos no consórcio público.

Ainda temos outra causa de exclusão, no caso em que, mediante previsão no contrato de consórcio público, um ente consorciado, sem autorização dos demais integrantes do consórcio, subscrever protocolo de intenções para constituição de outro consórcio com finalidades, a juízo da maioria da Assembleia Geral, iguais, assemelhadas ou incompatíveis com as desempenhadas pelo consórcio [47].


XII – Reflexões Finais: Oportunidades e Vantagens

Uma das maiores críticas que constantemente se faz à Administração Pública diz respeito ao tempo de execução das ações propostas, e o consórcio se coloca como uma boa alternativa gerencial, já que há um ganho de escala que terá como consequência a possibilidade de contratação de empresas mais preparadas para a execução de projetos de maior envergadura, acirrando a disputa e barateando custos. Além disto, a execução dos projetos ganha em agilidade e atende de forma mais direta e rápida as demandas locais e regionais.

Outro ponto que devemos destacar é a maior transparência na utilização das receitas arrecadas, já que o consórcio terá a participação de vários entes, o que significa um processo de fiscalização recíproco entre todos, além dos controles externos.

Apontando para uma clara alternativa de incentivo na formação de consórcios públicos, o Poder Executivo federal, por intermédio do Decreto nº 6.017/07, determinou que "os órgãos e entidades federais concedentes darão preferência às transferências voluntárias [48] para Estados, Distrito Federal e Municípios cujas ações sejam desenvolvidas por intermédio de consórcios públicos" (art. 37) tenham prioridade no recebimento de recursos.

Atento para a necessidade de ganho de escala na execução de projetos, o Decreto também estabelece que "quando necessário para que sejam obtidas as escalas adequadas, a execução de programas federais de caráter local poderá ser delegada, no todo ou em parte, mediante convênio, aos consórcios públicos" (art. 38), ressaltando que os Estados e Municípios poderão executar, por meio de consórcio público, ações ou programas a que sejam beneficiados por meio de transferências voluntárias da União.

O consórcio público se coloca, assim, como um importante instrumento de cooperação federativa, pois permite uma maior articulação institucional, transversal e territorial entre os três entes da Federação. Antes, os consórcios eram considerados meros pactos administrativos, despersonalizados e mesmo assim, centenas de consórcios já funcionavam no País.

Como se percebe, o consórcio público será incentivado como mecanismo de desenvolvimento econômico e social e certamente sairá na frente os entes que melhor se prepararem para esta nova realidade que se apresenta, permitindo investimentos em áreas como saneamento básico, integração dos sistemas de transporte urbano, destinação final de resíduos sólidos, segurança pública, gestão ambiental e vários outros.

Enfim, o consórcio público é, antes de mais nada, um valioso instrumento de gestão pública, que se bem utilizado, reúne todas as condições para produzir excelentes resultados, contribuindo para o desejado aprofundamento da cooperação federativa entre as nossas esferas de poder, numa demonstração de amadurecimento institucional, fundamental para a consolidação da nossa ainda jovem democracia, pois, parafraseando Winston Churchill, esta "é a pior forma de governo, com exceção de todas as outras que têm sido tentadas de tempos em tempos".


XIII – Referências Bibliográficas

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Notas

  1. Essa expressão é utilizada por Odete Medauar e Gustavo Oliveira in MEDAUAR, Odete e OLIVEIRA, Gustavo Justino de. Consórcios Públicos: Comentários à Lei 11.107/2005. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 30.
  2. Ibidem, p. 30
  3. Conforme "Parecer elaborado sobre a Proposta Legislativa de criação de Consórcios Públicos", publicado na Revista Eletrônica de Direito do Estado (REDE), nº 03, elaborado a pedido do Ministério das Cidades, por intermédio da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental, versando sobre o Projeto de Lei nº 3.884/2004, que cuidava de normas gerais sobre a constituição de consórcios públicos para a gestão associada de serviços públicos, pág. 06. Cumpre salientar que embora a pesquisa tenha sido feita tomando por base cópia do Parecer original apresentado e assinado pelo Prof. Marçal, optamos por fazer referência à publicação disponível pela Revista Eletrônica de Direito do Estado (REDE), pois a paginação utilizada facilita a consulta aos originais do autor.
  4. A Profª. Maria Sylvia Zanella Di Pietro usa a mesma crítica em dois de seus livros que abordam o tema: Direito Administrativo. 19ª Ed. – São Paulo: Atlas, 2006, pág. 463 e Parcerias na Administração Pública: concessão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 6ª Ed. – São Paulo: Atlas, 2008, pág. 235, lamentando a edição da Lei nos moldes em que foi aprovada.
  5. Neste sentido, temos opinião de Marçal Justen Filho, no já mencionado Parecer, págs. 15-6. Todavia, o STF entendeu que o BRDE não poderia adotar a forma de autarquia interfederativa, e um dos fundamentos da decisão foi, justamente, a falta de previsão expressa no texto da Constituição.
  6. Vale mencionar o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 1.071, de 1999 (nº 148/01 no Senado Federal), serviu de base para o Projeto de Lei nº 3.884/2004, de autoria do Poder Executivo e acabou se tornando o texto da Lei nº 11.107/2005.
  7. Estes objetivos estão expressamente previstos no art. 3º, incisos VIII e IV, do Decreto nº 6.017/2007, respectivamente.
  8. O aludido Parecer, vale repisar, foi elaborado a pedido do Ministério das Cidades, por intermédio da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental, versando sobre o Projeto de Lei nº 3.884/2004, que cuidava de normas gerais sobre a constituição de consórcios públicos para a gestão associada de serviços públicos, e aproveitou algumas contribuições do Projeto de Lei nº 1.071, de 1999 (nº 148/01 no Senado Federal), que "Dispõe sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos e dá outras providências", servindo de base para a edição da Lei nº 11.107/2005.
  9. Vide seu artigo intitulado "Os Consórcios Públicos na sua legislação Reguladora", in Revista Eletrônica de Direito do Estado (REDE), nº 03, com esta posição externada à pág. 10.
  10. O Prof. Wladimir António Ribeiro foi um dos co-autores do anteprojeto da Lei 11.107/2005, e expôs este ponto de vista no I Congresso Brasileiro de Licitações e Contratos, realizado em Salvador/BA, no período de 01 a 03/06/2005.
  11. É o caso de Cléber Demétrio Oliveira da Silva, em artigo intitulado "Lei nº 11.107/05: marco regulatório dos consórcios públicos brasileiros, disponível para consulta no seguinte endereço eletrônico: http://jus.com.br/artigos/6872. Acesso em 19.04.2009.
  12. Não vamos aqui adentrar na análise da constitucionalidade ou não de alguns destes dispositivos, pois o assunto será tratado em ponto específico mais adiante.
  13. A Profª. Maria Sylvia Zanella Di Pietro usa crítica idêntica em dois de seus livros que abordam o tema: Direito Administrativo. 19ª Ed. – São Paulo: Atlas, 2006, pág. 467 e Parcerias na Administração Pública: concessão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 6ª Ed. – São Paulo: Atlas, 2008, pág. 240.
  14. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Os Consórcios Públicos. Revista Eletrônica de Direito do Estado (REDE), Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, nº 03, julho/agosto/setembro de 2005, pág. 16.
  15. Na verdade, como já ficou consignado neste trabalho, a intenção original era que esse anacronismo não tivesse nem mesmo sido criado, conclusão que se chega ao pesquisarmos o trâmite do Projeto de Lei e os Pareceres elaborados por grandes juristas envolvidos no processo.
  16. Também no sentido do texto, destacamos o prof. Carvalho Filho, ao afirmar que "formalizando-se o consórcio por meio de entidade dotada de personalidade jurídica autônoma, não poderia ela de nenhuma forma integrar o sistema da Administração Direta. Diante de tal óbvia exclusão, os consórcios, formados que são por entes federativos no exercício da atividade administrativa, não podem deixar de ser inseridos senão no sistema da Administração Indireta, seja qual for a natureza jurídica de que se revestem (grifos do autor) in Consórcios Públicos, págs. 39-40.
  17. Parcerias na Administração Pública: concessão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 6ª Ed. – São Paulo: Atlas, 2008, pág. 239.
  18. MEDAUAR, Odete e OLIVEIRA, Gustavo Justino de. Consórcios Públicos: Comentários à Lei 11.107/2005. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 47.
  19. Aristóteles, na sua clássica obra "A Política" bem abordava esta necessidade de distinção entre os Poderes, todavia, em virtude do momento histórico em que vivia, entendia ser normal a concentração dos Poderes na mão do soberano, sem que isso diminua sua contribuição para o desenvolvimento do debate.
  20. Montesquieu, no seu "O Espírito das Leis", de certa forma, aprimorou a teoria aristotélica, ao defender que as três funções básicas do Estado fossem exercidas por Poderes distintos, que atuassem de forma independente e harmônica entre si.
  21. É a previsão do art. 5º, § 1º, da Lei nº 11.107/05, que priorizou, uma vez mais, a liberdade dos entes envolvidos na forma de agilizar a operacionalização do Consórcio Público, que poderia ser sofre atrasos na sua implantação em decorrência de alguma dificuldade por parte de algum envolvido. O legislador, talvez por ser ele também destinatário das normas, por vezes busca mitigar os riscos de surtos maquiavélicos por partes de alguns governantes tentando exercitar essa faceta quando da elaboração das leis, surgindo assim mecanismos de controle para eventuais problemas de operacionalização. Aqui não foi diferente.
  22. Esta possibilidade de reserva está no art. 5º, § 1º, da Lei nº 11.107/05 e é muito comum em negociações envolvendo Estados Soberanos em celebração de Acordos e Tratados Internacionais, de forma a possibilitar que os signatários se comprometam apenas na medida do que acham proporcional às vantagens que pretendem alcançar.
  23. Conforme art. 5º, § 3º, da Lei nº 11.107/05.
  24. Alguns doutrinadores criticam este controle, por considerarem se tratar de uma ingerência indevida do Legislativo sobre a liberdade do Chefe do Executivo no desempenho de suas atribuições, dentre as quais liberdade de firmar acordos, mas não podemos ignorar a valia deste mecanismo como eficaz forma de controle e de sua contribuição para uma maior transparência na fixação das condições e cláusulas do consórcio. Além do mais, o controle prévio do Legislativo sobre o Executivo não é exclusividade da Lei nº 11.107/2005, sendo previsto em outros diplomas legislativos, como na Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) para ficarmos apenas com um caso.
  25. O prof. Carvalho Filho, na sua obra "Consórcios Públicos", pág. 75, critica esta composição definida pelo Decreto nº 6.017/07, destacando que seria interessante a participação de representantes da sociedade civil na assembleia geral, ressaltando não tratar-se de uma forma de interferência na administração pública e que "somente com a mudança dessa mentalidade anacrônica é que o Poder Público vai receber em seu seio a participação da sociedade civil."
  26. É o que preceitua o § 1º do art. 5º do Decreto nº 6.017/07.
  27. Uma vez mais o prof. Carvalho Filho na sua obra "Consórcios Públicos", pág. 74, demonstra preocupação ao comentar esta possibilidade de diferenciação, colocando-a como hipótese excepcional.
  28. Informação obtida no site http://www.planalto.gov.br/sri/consorcios/duvidas.htm, em seção destinada especificamente a esclarecer dúvidas sobre consórcios públicos. Acesso em 09.04.2009.
  29. Expressão latina usada no texto como "redução da capacidade para exercício de determinados atos", e que numa tradução literal significa "diminuição da cabeça", embora seja constantemente usada como "redução de capacidade", "perda de autoridade", em decorrência da sua origem na figura do pater familiae, que perdia autoridade ao sair alguém do seu círculo de poder e controle, perdendo assim uma cabeça dentre o seu clã de comandados.
  30. Conforme o § 2º do art. 8º, da Lei nº 11.107/05 e art. 15, do Decreto nº 6.017/07.
  31. Definição dada pelo § 1º do art. 15, do Decreto nº 6.017/07.
  32. A partir do ano de 2003, com a criação do Ministério das Cidades, houve uma concentração de recursos nas mãos deste Ministério, que passou a ser o responsável pela seleção prévia de projetos, que são habilitados e hierarquizados, seguindo uma ótica setorial (saneamento ambiental, habitação etc), conforme as prioridades do governo central, retirando a liberdade dos Estados e Municípios na condução de suas políticas públicas. Como sabemos do cenário de escassez de recursos e dos limitadores de endividamento dos entes públicos, não resta outra saída aos entes da Federação a não ser ceder aos ditames da União. O ideal seria que os entes tivessem liberdade de concepção de suas políticas públicas, sendo que o governo federal poderia induzir algumas, como o apoio a projetos multissetoriais concebidos de forma integrada, propiciando verdadeira revolução social nos locais destas intervenções articuladas.
  33. O exemplo é do Prof. Carvalho Filho, no seu livro "Consórcios Públicos", pág. 133.
  34. Art. 30, § 1º, do Decreto nº 6.017/07.
  35. Art. 13, caput e parágrafos, da Lei nº 11.107/05.
  36. Art. 33, do Decreto nº 6.017/07.
  37. Para comentários específicos sobre cada uma das cláusulas do contrato de programa, remetemos o leitor ao trabalho do Prof. José dos Santos Carvalho Filho, "Consórcios Públicos", págs. 135-152, por fugir ao escopo do presente trabalho tratar individualmente cada um dos respectivos incisos.
  38. O prof. Carvalho Filho trabalha com a distinção entre alterações objetivas (implicam modificação no objeto) e alterações subjetivas, que recaem sobre os sujeitos integrantes do consórcio. (Consórcios Públicos, pág. 113).
  39. Art. 25, § 3º, do Decreto nº 6.017/07.
  40. Art. 24, do Decreto nº 6.017/07.
  41. Art. 11, § 1º, da Lei nº 11.107/05 e art. 25, § 1º, do Decreto nº 6.017/07.
  42. É o que determina o art. 12, caput, da Lei nº 11.107/05.
  43. É a dicção usada pelo art. 26, caput, da Lei nº 11.107/05.
  44. Art. 8º, § 5º, da Lei nº 11.107/05.
  45. O art. 26, do Decreto nº 6.017/07, no seu § 2º usa expressamente o termo "reabilitar".
  46. Esta previsão é expressa no art. 27, do Decreto nº 6.017/07, embora hoje não reste mais dúvida quanto a esse direito consagrado na nossa Constituição de 1988, como reflexo de um Estado Democrático de Direito.
  47. Cumpre salientar que esta previsão do art. 28, do Decreto nº 6.017/07 depende de análise da Assembleia Geral para dar causa ao procedimento de exclusão.
  48. Aqui cumpre destacar que o texto fez alusão a transferências voluntárias, que não se confundem, com outras formas de apoio, como as operações de crédito. Neste sentido, ver nosso artigo intitulado "A liberação de recursos públicos no contexto da legislação eleitoral: necessidade de distinção terminológica entre operações de crédito e transferências voluntárias", publicado na Revista Jurídica da Presidência da República, volume 10, nº 92, pág. 01-20, out.2008 a jan.2009 e também no Boletim de Convênios e Parcerias, ano 5, nº 47, março de 2009. Curitiba: Governet, 2009, pags. 140-152.

Autor

  • Franderlan Ferreira de Souza

    Franderlan Ferreira de Souza

    Gerente Jurídico da Área de Inclusão Social do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES. Graduado em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. Especialista em Direito Civil Constitucional pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Franderlan Ferreira de. A implantação dos consórcios públicos instituídos pela Lei nº 11.107/2005. Oportunidades e desafios deste instrumento de cooperação federativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2395, 21 jan. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14204. Acesso em: 19 abr. 2024.