Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/14288
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Tributação e tutela do meio ambiente

Tributação e tutela do meio ambiente

Publicado em . Elaborado em .

A interação entre Direito Tributário e Direito Ambiental, do que resulta o ramo mais específico que tem sido denominado de Direito Tributário Ambiental, não vem sendo desenvolvida satisfatoriamente nem por nossa doutrina especializada nem pelo legislador.

INTRODUÇÃO

A crescente urgência de proteção do meio ambiente tem modificado a visão sistêmica da participação do Estado, das pessoas e das empresas no contexto de preservação do planeta em favor das gerações futuras, inclusive no que toca à atuação da tributação como ferramenta para alcançar este objetivo. Mas ainda falta muito, especialmente no Brasil, para se chegar a uma visão madura do tributo e dos princípios tributários como instrumentos desta proteção.

A interação entre Direito Tributário e Direito Ambiental, do que resulta o ramo mais específico que tem sido denominado de Direito Tributário Ambiental, não vem sendo desenvolvida satisfatoriamente nem por nossa doutrina especializada [01], nem mesmo por nosso legislador, de tal forma que ainda não rendemos as homenagens devidas, no que concerne à configuração da tributação, ao dever constitucional de proteção do meio ambiente.

São escassos os tributos nacionais que cumprem alguma função ambiental, e não houve até agora o necessário desenvolvimento, por nossa dogmática constitucional-tributária, dos princípios constitucionais tributários com os olhos voltados para a necessidade de tutela do meio ambiente, i.e., uma releitura destes princípios sob o prisma do direito fundamental ao meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado.

Nossa pretensão neste trabalho é apontar como o Direito Tributário poderia criar mecanismos que, juntando-se aos mecanismos próprios do Direito Ambiental, viessem a efetivamente cumprir importantes papéis na proteção do direito fundamental ao meio ambiente.

E assim o faremos dividindo, para fins metodológicos, nossa humilde contribuição em duas partes: na primeira parte, trataremos do desenvolvimento do direito fundamental ao meio ambiente sadio dentro de uma visão global da evolução histórica dos direitos fundamentais; e na segunda parte, tentaremos cumprir nosso efetivo propósito de apontar como o Direito Tributário, por meio dos tributos e de seus princípios fundamentais, poderia atuar como instrumento adequado e eficaz na proteção do meio ambiente.


PARTE I – DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE SADIO

Antes da conceituação de direitos fundamentais propriamente dita, devemos afastar a imprecisão terminológica existente, em razão de ser notório que a presença de termos linguísticos precisos e coerentes se mostra sempre imprescindível para o bom desenvolvimento de qualquer conhecimento científico, e especialmente para o conhecimento científico-jurídico, haja vista este ser construído sobre uma forma especial de linguagem: a linguagem jurídica.

Com efeito, a mesma realidade tem recebido denominações das mais diversas como "direitos humanos", "direitos naturais", "direitos do homem", "direitos fundamentais", "direitos humanos fundamentais", "direitos individuais", "liberdades fundamentais", "liberdades públicas" e "direitos públicos subjetivos". [02]

A ausência de consenso doutrinário, a heterogeneidade e a ambiguidade terminológicas tornam imperioso seja precisado o termo a ser empregado em nosso estudo. Esta necessidade é indiscutível, não obstante até nossa Constituição, como observa INGO WOLFGANG SARLET, possuir uma diversidade terminológica [03]: a) direitos humanos (art. 4º, inc. II); b) direitos e garantias fundamentais (epígrafe do Título II, e art. 5º, §1); c) direitos e liberdades constitucionais (art. 5º, inc. LXXI) e d) direitos e garantias individuais (art. 60, §4º, inc. IV).

Adotaremos aqui os termos "direitos humanos" e "direitos fundamentais" [04], bem como a distinção entre estes termos baseada em um critério jurídico-positivo que considera os direitos humanos como aqueles que são reconhecidos em fontes normativas internacionais (tratados internacionais) e os direitos fundamentais como os direitos reconhecidos em fontes normativas internas (constituições).

Sem embargo, embora sejam incontestáveis a íntima relação e a constante intercambialidade prática e dogmática destes termos, a distinção acima apontada obedece não apenas a razões puramente didáticas, mas também à exigência lógica de distinguir direitos que possuem fonte, eficácia e formas de proteção distintas.

Portanto, a mais forte tendência doutrinária contemporânea é a distinção entre "direitos "fundamentais" e "direitos humanos" a partir do critério da positivação dos mesmos, de modo que os direitos fundamentais são identificados como os "direitos humanos positivados a nível interno, enquanto a fórmula ‘direitos humanos’ é a mais usual no plano das declarações e convenções internacionais". [05]

Os direitos humanos estariam relacionados a um reconhecimento histórico universal, possuindo validade e eficácia universais, ao passo que os direitos fundamentais estariam relacionados a uma ordem jurídica constitucional específica de determinado Estado, comportando assim uma dogmática específica de tempo e lugar.

Tanto no plano internacional (direitos humanos) como no plano interno (direitos fundamentais) ocorre a positivação de direitos de inspiração jusnaturalista e de existência anterior ao pacto internacional e ao Estado, haja vista serem direitos inerentes à própria condição humana.

Por sua vez, a forma de positivação destes direitos importa em diferenciação dos mesmos não apenas quanto à fonte, mas também quanto à eficácia e proteção: (i) os direitos fundamentais possuem âmbito normativo mais preciso e restrito, ao passo que os direitos humanos comportam conceitos mais amplos e imprecisos; (ii) no Brasil, como em outros países, se alguns direitos humanos, não obstante sua validade universal, não forem adotados pelas constituições nacionais [06], precisarão ser reconhecidos e incorporados à ordem constitucional interna para que possam ter eficácia (art. 5º, §3º, CF/88) [07], ao passo que os direitos fundamentais possuem "aplicação imediata" (art. 5º, §1º, CF/88) [08]; (iii) os direitos fundamentais são diretamente protegidos pelas instâncias judiciais internas, diferentemente dos direitos humanos que envolvem a delicada questão da submissão dos Estados aos Tribunais Internacionais.

Em suma, considerando a proximidade e as diferenças apontadas, adotaremos em nosso trabalho os termos "direitos humanos" e "direitos fundamentais"; principalmente o último termo, haja vista nosso trabalho visar a análise do tema da tributação e do meio ambiente com referência a uma ordem constitucional específica: a brasileira.

1.1. Conceito e fundamentação dos direitos fundamentais

O conceito de direitos fundamentais no modelo vigente de Estado de Direito representa definição da mais importante, haja vista serem os direitos fundamentais o centro contenutístico (essência) e teleológico (razão) do Estado Constitucional.

Confirmando a possível intercambialidade terminológica entre "direitos humanos" e "direitos fundamentais", PEREZ LUÑO formulou conceito para "direitos humanos" que pode ser utilizado também para os "direitos fundamentais", desde que não se perca de vista a distinção desenvolvida no tópico acima:

"(...) um conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico, concretizam as exigências da dignidade, da liberdade e da igualdade humanas, as quais devem ser reconhecidas positivamente a nível nacional e internacional". [09]

Como apontado pelo próprio professor espanhol, o conceito que formulou possui as vantagens de (i) salientar "o sentido histórico dos direitos humanos" e fundamentais, (ii) de utilizar os "valores de conteúdo impreciso" da dignidade, da liberdade e da igualdade como fundamentos destes direitos e (iii) de destacar o dever de positivação dos mesmos. [10]

Vejamos individualmente estas vantagens.

Primeiramente, o autor destaca a visão histórica dos direitos humanos e fundamentais, o que não se confunde inteiramente com a fundamentação historicista dos direitos fundamentais; na verdade, destacar esta visão histórica é reconhecer a dinâmica dos direitos fundamentais, no sentido destes direitos serem conquistas progressivas das sociedades que, em cada momento histórico, evoluem e se modificam em torno de valores universalmente aceitos como dignidade, liberdade e igualdade.

Por outro lado, ao utilizar os valores dignidade da pessoa humana, liberdade e igualdade, verdadeiras pautas de valores morais carecedoras de preenchimento, como exigências a serem concretizadas por meio dos direitos humanos e fundamentais, o autor enquadrou sua formulação conceitual no "âmbito das chamadas ‘definições teleológicas’, isto é, remetida a valores de conteúdo impreciso". [11]

Os valores dignidade [12], liberdade [13] e igualdade [14] representam, na visão do autor, os três eixos fundamentais dos direitos humanos [15], ou seja, os valores que, em cada momento histórico e com conteúdo variável, fundamentam os direitos humanos e fundamentais que os explicitam.

Por fim, ao apontar o dever de positivação, o autor pretendeu ressaltar o dever do Estado de realizar efetivamente os direitos humanos, seja por meio das técnicas legislativas, seja por meio das técnicas jurisdicionais de proteção e garantia. [16]

Também concordamos com as vantagens apontadas e pensamos ser a definição adotada pelo professor PEREZ LUÑO um conceito quase totalmente adequado.

No tocante ao apontado caráter histórico dos direitos fundamentais, o autor justifica, de maneira acertada, o fenômeno incontestável da evolução dos direitos fundamentais, ou seja, o progressivo desenvolvimento de direitos que são incorporados aos textos constitucionais e internacionais na medida em que evoluem as sociedades.

Com o evoluir das sociedades, novas exigências vêm à tona como condições imprescindíveis de uma vida digna e livre, cabendo ao Estado e aos organismos internacionais reconhecerem estas exigências e positivar direitos que viabilizem, de modo efetivo, o seu cumprimento e assim o próprio desenvolvimento da dignidade humana, da liberdade e da igualdade. Os direitos humanos evoluem historicamente junto com as sociedades e sempre em torno destes valores universais fundamentais.

Em relação ao uso de pautas de valores de conteúdo indeterminado como fundamentos dos direitos fundamentais (dignidade, liberdade e igualdade), o professor espanhol nos permite entender como se torna possível a referida dinâmica dos direitos fundamentais, que se atualizam por meio da normatização legislativa e jurisdicional em cada momento histórico da sociedade e sem perder de vista os valores aos quais se referem. Por sua vez, pensamos, com PECES-BARBA [17], que a solidariedade deveria ser incluída no conceito dos direitos humanos como um dos valores que compõem a base de fundamentação destes direitos, inclusive da própria tutela do meio ambiente.

Por derradeiro, a positivação dos direitos fundamentais, no sentido amplo atribuído ao termo pelo mestre espanhol, se mostra como autêntico dever de interferência estatal, legislativa e/ou jurisdicional, necessária e até mesmo imprescindível para a efetiva realização dos direitos fundamentais, de modo que os mesmos não sejam apenas objetos de um discurso retórico.

Mas as vantagens do conceito formulado não acabam por aí. Tem razão PEREZ LUÑO ao afirmar que a "definição proposta pretende conjugar as duas grandes dimensões que integram a noção geral dos direitos humanos" (e claro, dos direitos fundamentais): (i) a exigência jusnaturalista em relação a sua fundamentação e (ii) as técnicas de positivação e proteção que permitem o efetivo exercício dos direitos. [18]

Com relação à fundamentação dos direitos fundamentais, existem duas principais correntes: (i) a fundamentação jusnaturalista dos direitos fundamentais e (ii) a fundamentação historicista dos direitos fundamentais; o conceito formulado por PEREZ LUÑO, como ele mesmo reconhece, tem a vantagem de conjugar estas duas dimensões de justificativa dos direitos fundamentais.

A fundamentação jusnaturalista dos direitos fundamentais é vinculada à ideia do Direito Natural e consiste em afirmar que a positivação dos direitos fundamentais representa um processo de reconhecimento formal pelo Estado de direitos prévios, anteriores e superiores ao próprio Estado, e que correspondem ao homem por sua própria natureza. Para esta corrente doutrinária, os direitos fundamentais existem independente do reconhecimento legislativo dos mesmos, pois são inerentes ao próprio ser humano, cabendo ao Estado reconhecer e tornar efetivos estes direitos.

Os direitos fundamentais, sob esta ótica, não seriam oriundos do ordenamento jurídico, o qual cumpriria apenas a função de declarar estes direitos; são provas desta função declaratória dos direitos: (i) a Bill of Rigths do Estado da Virgínia, Estados Unidos, de 12 de junho de 1776, que em seu artigo primeiro prescreve que "todos os homens são, por natureza, igualmente livres e independentes, e tem certos direitos inerentes (...)" dos quais não podem ser privados ou despojados [19]; e (ii) a própria Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada durante a Revolução Francesa, em 2 de outubro de 1789, que afirmava que "o fim de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis ao homem".

É fácil notar que os documentos históricos acima citados, influenciados pela doutrina do Direito Natural então vigente, referem-se aos direitos fundamentais como direitos universais e anteriores à positivação realizada, como se derivassem de uma ordem normativa natural, ou seja, da própria condição humana, e que apenas recebem o reconhecimento formal pelo Estado.

Para os que defendem uma fundamentação historicista dos direitos fundamentais, estaríamos diante de direitos "variáveis e relativos a cada contexto histórico que o homem tem e mantém de acordo com o desenvolvimento da sociedade". [20]

Como bem observa EUSEBIO FERNANDEZ, as diferenças entre estas correntes de fundamentação são bem distintas: "1. No lugar de direitos naturais, universais e absolutos se fala de direitos históricos, variáveis e relativos."; "2. No lugar de direitos anteriores e superiores à sociedade se fala de direitos de origem social (enquanto são resultados da evolução da sociedade)." [21]

Para os historicistas, os valores que fundam os direitos humanos não seriam valores universais, de todo o sempre, mas valores constituídos em uma sociedade histórica concreta, que leva em conta os fins que pretende realizar em uma dada quadra da história. Inegavelmente, este pensamento explica o incontestável fenômeno da evolução dos direitos humanos de modo mais convincente que a doutrina jusnaturalista.

Por outro lado, esta vantagem da concepção historicista, isto é, de ser mais realista para explicar o fenômeno da dinâmica dos direitos fundamentais, não significa a completa negação das ideias lançadas pela corrente jusnaturalista.

E neste ponto, o conceito formulado por PEREZ LUÑO merece o crédito de ter conformado estas concepções que são apenas prima facie inconciliáveis.

Não se pode negar que a dignidade humana, a liberdade, a igualdade e a solidariedade são pautas de valores que podem ser reconhecidas como inerentes à própria condição humana e que, portanto, justificam racionalmente quaisquer disposições normativas independente de prévio reconhecimento pelo Direito Positivo.

Neste sentido, têm razão os defensores da fundamentação jusnaturalista dos direitos humanos no sentido de existirem valores universais que servem de justificativas para os direitos fundamentais e que independem do reconhecimento formal para tanto.

De outra forma, não se pode aceitar a tese de possuírem estes valores conteúdos inalteráveis, definitivos e que, independente da atuação normativa do Estado, surtem todos os efeitos que lhe são próprios. Na verdade, trata-se de exigências éticas, cujos conteúdos devem ser preenchidos em cada tempo e lugar, mas sempre no sentido de alcançar os fins que lhe são subjacentes.

Daí que, sobre a base universal destes valores, cada momento histórico, por meio da ação do Estado, produz direitos fundamentais de conteúdo e extensão variáveis, sempre gravitando, deve-se repetir, sobre as exigências éticas da dignidade humana, da liberdade, da igualdade e da solidariedade.

Este ponto de vista, claramente previsto no conceito formulado por PEREZ LUÑO, explica bem, sem perder de vista a incontestável existência de valores inerentes ao ser humano, o fenômeno da evolução dos direitos fundamentais, isto é, a positivação destes valores em cada momento histórico da sociedade sob a forma de direitos fundamentais de conteúdo variável e de formas de efetivação diversas.

Por estas razões, adotamos aqui o conceito de direitos fundamentais, a partir da formulação operada por PEREZ LUÑO, com a inclusão da solidariedade como um dos valores fundamentes e o reconhecimento da distinção jurídico-positiva entre "direitos fundamentais" e "direitos humanos":

– Os direitos fundamentais correspondem a um conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico, concretizam as exigências da dignidade, da liberdade, da igualdade e da solidariedade humanas, as quais devem ser reconhecidas positivamente a nível nacional por meio das constituições.

1.2. A evolução dos direitos fundamentais

Como ressaltado no tópico anterior, a visão historicista dos direitos fundamentais nos permite entender que estes direitos evoluem, se transformam, têm seu conteúdo e eficácia ampliados sempre em torno dos valores éticos fundamentais da dignidade humana, da liberdade, da igualdade e da solidariedade.

Em favor desta evolução, cumprem papel decisivo as constituições que positivam estes direitos, a sua eficácia e as formas de tutela de sua efetividade.

Com efeito, a evolução dos direitos fundamentais está intimamente ligada à evolução das constituições desde os modelos liberais do séc. XVIII, passando pelas constituições sociais do início do séc. XX, e chegando às modernas constituições democráticas que vêm sendo promulgadas desde o fim da II Grande Guerra e continuaram a ser depois da queda do Muro de Berlim e do fim da separação do mundo ocidental nos blocos capitalista e socialista.

Na verdade, a evolução dos direitos fundamentais decorre da própria evolução do Estado e da sociedade em busca do modelo de organização política em que o poder deve ser contido em nome das liberdades fundamentais do homem e em que devem ser prestados serviços públicos suficientes a garantir uma sociedade de homens livres e iguais.

Estas evolução e mutações dos direitos fundamentais ao longo da história deram lugar à terminologia "geração de direitos fundamentais"; desta forma, fala-se de "direitos de primeira geração", "direitos de segunda geração", "direitos de terceira geração" e até de quarta e quinta gerações.

Desde já se deve advertir que o termo "geração" não significa que ocorreram rupturas, mas sim cumulações de direitos fundamentais, um verdadeiro processo de complementaridade, por meio do qual os direitos se transformam, se aperfeiçoam, dando lugar a "novos direitos" erguidos sobre as mesmas bases fundamentais (dignidade humana, liberdade, igualdade e solidariedade) e que se juntam aos "velhos direitos", formando o todo ético-jurídico fundamental da sociedade.

Ademais, também se deve chamar atenção para o fato que esta evolução, não de raro, se manifesta de modo diferenciado para cada país, não podendo se cogitar de uniformidade do desenvolvimento destes direitos, havendo diversidade tanto do conteúdo quanto das formas de reconhecimento e tutela dos direitos fundamentais conforme a cultura e a história de cada sociedade. [22]

Restando claras estas circunstâncias, não existem razões suficientes para se abandonar o termo e trocá-lo por outro como "dimensões dos direitos fundamentais". [23]

As gerações dos direitos fundamentais se distinguem uma das outras em razão dos novos conteúdos que ganham os valores fundamentais universais da dignidade humana, da liberdade, da igualdade ou da solidariedade, sendo assim positivados "novos direitos" (a nova geração) com estes novos conteúdos e de acordo com a vontade do legislador constituinte histórico.

Esta evolução dos direitos fundamentais, ou seja, o processo progressivo de complementaridade destes direitos pode ser melhor sentido com o exame individual das gerações de direitos que se formaram ao longo da história.

1.2.1.Os direitos fundamentais de primeira geração

Na Revolução Francesa, que culminou com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 e com a Constituição Francesa de 1791, a consagração dos direitos fundamentais (liberdades fundamentais) foi uma reação ao uso arbitrário do poder pelas monarquias absolutistas.

O levante contra o Estado Absolutista era inspirado pelo desejo de liberdade nos moldes contratualistas da época: o Estado deveria assegurar as liberdades fundamentais e não oprimi-las; o Estado deveria ser o protetor das liberdades fundamentais (Estado guarda-noturno) e não o seu algoz.

Assim, a garantia das liberdades fundamentais pelo Estado tornava-se o grande marco deste movimento revolucionário: havia a exigência de um comportamento negativo do Estado, no sentido do mesmo se abster de opor obstáculos aos cidadãos no exercício de suas liberdades fundamentais (direitos de propriedade, de locomoção, de expressão, etc.).

Estas liberdades fundamentais, bem como as condições de possibilidade de seu exercício, eram aquelas estabelecidas pela lei, assim entendida como o produto derradeiro da vontade dos representantes do povo (o Legislativo); desta forma, o Estado Liberal de Direito, surgido na Revolução Francesa como reação ao Estado Absolutista, confundia-se com o Estado Legislativo de Direito, "que se afirmava através do princípio da legalidade" [24], cabendo ao Poder Legislativo, nos moldes do constitucionalismo liberal, a palavra definitiva sobre o conteúdo das liberdades fundamentais.

A lei representava o "fator de unidade e estabilidade do Direito, cuja justificação passa a ser de natureza positivista" [25]. Àquela altura, com o positivismo jurídico como teoria vencedora e superadora do jusnaturalismo racional no Estado Liberal de Direito, a doutrina passou a desempenhar um papel predominantemente cognoscitivo do Direito posto.

Por sua vez, a generalidade e abstração das leis, com a sua aplicação desinteressada em face de todos, assegurava a igualdade meramente formal, a igualdade perante a lei, afastando-se os privilégios odiosos que marcaram o regime absolutista.

Mas não havia qualquer possibilidade de se controlar a legitimidade do conteúdo destas leis, de forma que a vontade do Estado se confundia com a própria vontade do Poder Legislativo, assim como a justiça se confundia com a lei.

Neste cenário, a separação de poderes do Estado funcionava como instrumento para assegurar a supremacia da lei e do Legislador.

No Estado Liberal de Direito atuava uma fórmula de separação de poderes com o objetivo de se assegurar as liberdades fundamentais, mas em que prevalecia a ideia de supremacia do Legislativo e da lei, e onde os demais Poderes do Estado desenvolviam suas funções de modo que esta soberania do Parlamento não fosse ameaçada: o Executivo não tinha qualquer margem de liberdade na interpretação e aplicação das leis, devendo se resumir a aplicá-las exatamente como criadas pelo Legislativo, o que era ainda mais reforçado pela falsa ideia do positivismo jurídico de clareza e determinação destas leis, ao passo que ao Judiciário cabia ser a "boca que pronunciava a vontade da lei" (MONTESQUIEU), cumprindo uma função meramente técnica de conhecimento e aplicação do Direito posto, quase que uma atividade mecânica sem qualquer criatividade.

Assim, a separação de poderes atuaria de forma a assegurar a prevalência da lei como critério único de justiça e de garantia das liberdades fundamentais.

Para os revolucionários franceses, a separações de poderes e a garantia das liberdades fundamentais seriam os pilares do Estado Liberal de Direito, de modo que o Estado que não tivesse ambos não poderia ser considerado titular de uma constituição (art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789).

Separação de poderes, supremacia da lei (do Legislativo) e garantia das liberdades fundamentais é uma boa síntese do constitucionalismo liberal e do próprio Estado Liberal burguês.

Surge então a primeira relação entre constitucionalismo e direitos fundamentais: a constituição deveria reconhecer as liberdades fundamentais e prover um sistema adequado de contenção do poder do Estado (separação de poderes) como forma de se evitar a violação destes direitos; no constitucionalismo liberal, o Estado deveria pautar sua conduta no sentido de se abster de violar as liberdades fundamentais, e esta limitação do poder se obteria por meio da separação de poderes e da supremacia da lei (da vontade do Poder Legislativo).

Pois bem, este sistema permitia a falsa ideia de que o Estado era o único destinatário dos direitos fundamentais, de forma que prevalecia também a ideia de separação entre Estado e sociedade, entre público e privado no âmbito do Estado Liberal. No Estado Liberal, a preocupação era sempre com o indivíduo e não com a coletividade, e os conflitos entre cidadãos eram resolvidos tão-somente com a aplicação do Código Civil, "suficiente" em sua "coerência e completude".

Neste sentido, os direitos fundamentais do Estado Liberal, as liberdades fundamentais (direitos civis e políticos) ou direitos fundamentais de primeira geração, eram típicos direitos de oposição ao Estado (direitos de defesa), áreas imunes da intervenção estatal, não tendo nenhuma ou quase nenhuma aplicação nas relações entre particulares, que por sua vez eram resolvidas a partir das regras estabelecidas nos códigos civis da época.

1.2.2.Os direitos fundamentais de segunda geração

O Estado Liberal entra em crise em razão da baixa representatividade da sociedade no Parlamento: a classe representada no Parlamento era a burguesia revolucionária e detentora do capital, não havendo verdadeira liberdade política em favor de toda a sociedade, haja vista a não-participação de parcela significativa da mesma nos processos de tomada de decisões legislativas.

A classe de trabalhadores não era alcançada totalmente pelos direitos fundamentais, sendo tão-somente objeto das decisões políticas, mas nunca participantes ativos destas decisões, ou seja, embora alcançados pelos direitos civis, não gozavam das liberdades políticas e assim não possuíam representantes no Parlamento.

Sem representação no Parlamento, a classe trabalhista não podia ter suas aspirações consagradas e o que era pior, sofria a opressão e abusos como o emprego de crianças, a remuneração reduzida de mulheres e as horas exorbitantes de trabalho.

Esta situação provocou o fortalecimento dos movimentos associativos dos trabalhadores na segunda metade do séc. XIX e início do séc. XX [26], por meio dos quais os trabalhadores reclamavam seus direitos a uma vida mais digna.

A vitória destes movimentos conduziu a uma reconfiguração do Estado, cuja faceta de Estado Liberal entrou em profunda crise: o Estado que tão-somente se abstém de obstaculizar o exercício das liberdades fundamentais passa a se apresentar como um modelo insuficiente para assegurar os direitos fundamentais, haja vista a não interferência positiva em favor daqueles mais necessitados e sacrificados significar, na verdade, a ausência de garantias de igualdade material entre os cidadãos.

Sem que se possa falar de ruptura do Estado Liberal, o Estado deveu acomodar novas demandas e assim realizar prestações positivas em favor de parcela da sociedade antes excluída dos centros decisórios, no sentido do Estado Liberal de Direito ter se transformado e passado a ser considerado um Estado Social de Direito: o Estado não abandona em absoluto a sua postura negativa em face das liberdades fundamentais da sociedade, mas passou também, quando necessário para assegurar a igualdade material, a intervir nestas liberdades fundamentais da sociedade.

Os direitos fundamentais, como conquistas históricas do Estado Liberal, continuaram a servir à contenção dos excessos de poder pelo Estado. Porém, no modelo de Estado Social, estes direitos não eram mais oponíveis apenas ao Estado, mas também aos particulares, de modo que o Estado passou a intervir nas relações entre atores privados e proteger as partes mais frágeis destas relações, em especial os trabalhadores, mulheres, crianças e idosos, com o objetivo de assegurar o respeito aos direitos fundamentais por parte dos mais fortes da relação, em especial os empregadores.

Estes grupos mais frágeis, notadamente os trabalhadores, passaram a participar dos processos de tomada de decisões políticas das quais estavam alijados; desta forma, os seus direitos, antes sujeitos às regras dos contratos de trabalho sobre os quais o Estado Liberal não intervinha, passaram a ser objeto de regulação direta na lei, de modo que passamos do estágio de "igualdade perante a lei" para o estágio de "igualdade na lei", ou seja, de igualdade meramente formal para a desejada igualdade material.

Podemos então afirmar que estas lutas classistas, estes movimentos que se iniciaram na segunda metade do séc. XIX, culminaram em uma segunda geração de direitos fundamentais, de conteúdo social e econômico, complementares às típicas liberdades fundamentais, também referidos à figura individual do homem e que buscaram assegurar a igualdade material na sociedade, isto é, a justiça social.

É o que deixam claro as palavras do professor espanhol PÉREZ LUÑO:

"Os direitos humanos nascem, como é notório, com marcado traço individualista, como liberdades individuais que configuram a primeira fase ou geração dos direitos humanos. Dita matriz ideológica individualista sofrera um amplo processo de erosão e impugnação nas lutas sociais do século XIX. Estes movimentos reivindicatórios evidenciaram a necessidade de completar o catálogo dos direitos e liberdades da primeira geração com uma segunda geração de direitos: os direitos econômicos, sociais, culturais. Estes direitos alcançam sua paulatina consagração jurídica e política na substituição do Estado liberal de Direito pelo Estado social de Direito". [27]

Novos direitos foram adicionados ao catálogo formado no Estado Liberal, passando a vigorar, ao lado das liberdades fundamentais oponíveis ao Estado como direitos de defesa, direitos que vinculam o Estado a realizar prestações positivas em favor da sociedade: prestações de serviços públicos na área da saúde, assistência social, educação, trabalho, liberdade de sindicalização, direito de greve, moradia, etc.. Não mais subsistiu a figura do Estado que apenas se abstém em favor da autodeterminação dos indivíduos, passando a figurar o modelo de Estado intervencionista em favor dos direitos de caráter social e econômico.

A Constituição de Weimar (Alemanha) de 1919 é um marco histórico-normativo deste novo modelo de Estado: o Estado Social. Porém, o caráter flexível desta constituição, com a inerente ausência de vinculação do Parlamento ao conteúdo do texto constitucional, e a consequente falta de controle de constitucionalidade do conteúdo das leis foram fatores decisivos que resultaram na ausência de força normativa e de eficácia dos diretos fundamentais nela previtaos [28], de modo que, tal como ocorria com o Estado Liberal, estes direitos dependiam exclusivamente da configuração dada pelo Parlamento alemão. A diferença era que os Parlamentos não eram, àquela altura, compostos apenas pela classe burguesa, mas por uma heterogeneidade de classes da qual se destacava a classe de trabalhadores, o que importava numa mudança da própria configuração legislativa dos direitos fundamentais em função dos novos interesses sociais tutelados.

Com o advento do Estado Constitucional e Democrático de Direito, revelou-se um fato histórico-normativo que estes direitos sociais ganharam uma mais ampla configuração normativa nas constituições rígidas de caráter democrático que foram promulgadas no segundo pós-guerra. Esta nova configuração normativo-constitucional os dotaram de maior eficácia normativa abstrata, passando então a ser levantadas questões pertinentes às formas de tornar esta eficácia concreta, isto é, de assegurar a efetividade destes direitos. Esta discussão passa pelo surgimento de novas formas de tutela dos direitos fundamentais e pelo complexo e controvertido dilema entre os limites da judicialidade destes direitos e o devido respeito às decisões democráticas.

Esta nova dimensão de direitos fundamentais e o correspondente (novo) modelo de Estado romperam com a tradição liberal de Estado não-intervencionista e originaram uma nova fase da relação entre Estado e sociedade: (i) os direitos fundamentais não eram mais vistos como oponíveis apenas face ao Estado, mas também aos particulares, principalmente os poderosos, em suas relações intersubjetivas, ao passo que (ii) o Estado passou, ao lado do dever de proteção, a realizar prestações positivas (inclusive de intervenção) para assegurar aos particulares, em igualdade de condições, o gozo dos direitos fundamentais. [29]

O Estado passou a participar mais do desenvolvimento da "vida social" de seus cidadãos e assim se aproximou da sociedade; passou a atuar em campos antes imunes à intervenção estatal em razão da autonomia da vontade dos particulares, tornando-se responsável pela manutenção das condições necessárias para que os indivíduos desenvolvam seus programas de vida de forma livre e digna [30]; restou assim dissipada a ideia liberal de separação rígida entre Estado e sociedade, entre o público e o privado; este movimento é inclusive bidirecional, de invasões recíprocas: também a sociedade passa a atuar em esferas antes exclusivas do Estado, isto é, a sociedade, por meio das diversas associações surgidas a partir da segunda metade do séc. XIX, passa também a cuidar de áreas como saúde, educação, moradia, pesquisas científicas, etc.

Esta metamorfose do Estado em direção ao Estado Social traz ínsito o reconhecimento de que os direitos fundamentais do homem não estão sujeitos a ameaças apenas pelo Estado, mas também e até mesmo mais por poderes não-estatais.

A liberdade é um valor que deve ser protegida efetivamente como um todo, o que inclui a proteção dos direitos fundamentais também frente a atores particulares e afasta a possibilidade de conceber estes direitos apenas como direitos de defesa frente ao Estado. [31] Sem embargo, "não se cuida mais, portanto, de liberdade do e perante o Estado, e sim de liberdade por intermédio do Estado". [32]

Conforme a lúcida lição de KONRAD HESSE, "a procura pelo Estado da efetividade dos direitos fundamentais torna-se pressuposto de que chegue a haver uma real liberdade. O Estado já não aparece só como o inimigo potencial da liberdade, senão que tem que ser também seu defensor e protetor". [33] E defensor frente a ameaças perpetradas por particulares igualmente titulares de direitos fundamentais.

1.2.3.Os direitos fundamentais de terceira geração

Da tríade ideológica da Revolução Francesa, "Liberdade, Igualdade e Fraternidade", no Estado Liberal consagrou-se tão-somente a "Liberdade", ao passo que, com o Estado Social consagrou-se a verdadeira "Igualdade". Faltava então a consagração da "Fraternidade", o que só aconteceu com os direitos fundamentais de terceira geração, cujo valor fundamental é a solidariedade. [34]

Os direitos fundamentais de terceira geração seriam o direito à paz [35], à conservação e utilização do patrimônio histórico e cultural [36], os direitos na esfera da biotecnologia e respeito à manipulação genética, à liberdade informática [37], os direitos dos consumidores e o direito à qualidade de vida e ao meio ambiente sadio.

O professor INGO SARLET aponta o direito a morrer com dignidade [38] e à mudança de sexo também como exemplos, ressaltando que muitos destes direitos de terceira dimensão, à exceção dos direitos difusos e coletivos, representam verdadeiras concretizações do princípio da dignidade humana e da liberdade-autonomia, a ainda, muitas das vezes, cuidando de "reivindicação de novas liberdades fundamentais", isto é, direitos que evidenciam a "permanente atualidade dos direitos de liberdade". [39]

Trata-se de direitos que vêm sendo positivados gradativamente nas constituições nacionais e nos tratados internacionais, e até por não contarem ainda com amplo reconhecimento jurídico-positivo constitucional ainda se fazem marcantes as divergências jurisprudenciais quanto à configuração, à eficácia e até mesmo à jusfundamentalidade destes direitos.

Mas é certo que, cada vez mais vem sendo reconhecida a existência destes novos direitos fundamentais, que possuem como grande marca peculiar serem destinados predominantemente ao coletivo, diferentemente dos direitos de primeira e segunda gerações, típicos direitos vinculados à figura individual do homem.

Ainda que resultem, em última análise, em favorecimento aos indivíduos como os demais direitos fundamentais, trata-se de direitos tipicamente coletivos e difusos, que exigem a união de esforços de toda a sociedade para sua consecução e que prestam para completar o catálogo dos direitos fundamentais [40] de acordo com as novas exigências da sociedade moderna cada vez mais marcada pelas revoluções tecnológicas [41].

É esta necessidade de esforços universais para consecução destes direitos fundamentais que nos conduz à ideia dos direitos fundamentais de terceira geração como direitos referidos ao valor solidariedade.

No conjunto dos direitos fundamentais de terceira geração, nos interessa o direito fundamental ao meio ambiente sadio.

2. A tutela fundamental do meio ambiente

O direito fundamental ao meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado afirma-se, a partir do valor solidariedade, como direito coletivo ou difuso, dotado "de altíssimo teor de humanismo e universalidade" [42], que a todos pertence e também a todos obriga, daí porque encerrar um verdadeiro direito-dever fundamental. [43]

O Min. CELSO DE MELLO, em acórdão paradigma, afirma, no mesmo sentido, "a ideia de que o meio ambiente constitui patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido pelos organismos sociais e pelas instituições estatais, qualificando-se como encargo irrenunciável que se impõe – sempre em benefício das presentes e das futuras gerações – tanto ao Poder Público quanto à coletividade em si mesma considerada". [44]

Portanto, o direito a um ambiente de vida humana sadio e equilibrado ecologicamente aproveita tanto ao ser humano considerado em sua individualidade, como à coletividade, de tal forma que a sua proteção não cabe apenas ao Estado, mas a toda esta coletividade. Todos devem compreender que o meio ambiente sadio e equilibrado é "um bem maior, cuja preservação se mostra imprescindível para a nossa própria sobrevivência que dela depende", em suma, "é tempo de erigirmos o ambiente em valor ético fundamental da humanidade, acolhendo-o no Direito como bem jurídico fundamental, ao lado de outros bens jurídicos com elevado grau de comprometimento ético, como a vida ou a dignidade humanas" [45].

No Brasil, ao contrário do que ocorre com constituições como a americana, a italiana e a alemã, o valor ético fundamental de proteção e conservação do meio ambiente adquire sua normatividade originária de forma expressa na Constituição, e especialmente nos arts. 170, VI e 225:

"Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...)

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;"

"Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações."

Isso não significa que as outras constituições citadas não protejam o meio ambiente, mas apenas que a proteção na CF/88, por ser expressa, torna a temática das restrições às atividades econômicas em favor desta proteção muito menos problemática.

Nos Estados Unidos, por exemplo, a falta de previsão expressa em sua Constituição do dever de proteger o meio ambiente (environment) faz com que a acusação de ilegitimidade de leis restritivas das liberdades fundamentais sejam levadas muito a sério, especialmente se considerarmos a composição conservadora que compõe a Suprema Corte Americana contemporânea e o movimento interpretativo chamado originalismo, capitaneado pelo Juiz ultraconservador Antonin Scalia.

Na Itália e na Alemanha, a tutela constitucional do meio ambiente é construída a partir de uma interpretação ampliativa de outros direitos fundamentais que guardam relação com o meio ambiente, como o direito à vida ou à saúde, no caso alemão, e o dever de solidariedade social, no caso italiano.

Importante fazer notar também que o desenvolvimento doméstico da tutela do meio ambiente como direito fundamental, e seu reconhecimento nos textos constitucionais, devem muito à previsão normativa deste direito em diplomas normativos supranacionais desde a pioneira Declaração de Estocolmo (1972).

Mas no Brasil, como em Portugal (art. 66º da CRP), a proteção constitucional do meio ambiente decorre de enunciado normativo expresso (art. 225) que não deixa dúvidas quanto às principais características deste direito: é norma fundamental, de direito coletivo ou difuso, que obriga tanto ao Estado quanto à própria coletividade, e por isso é autêntico direito-dever fundamental, que tem por escopo acomodar os interesses intergeneracionais no que concerne ao uso dos recursos naturais. Com uma previsão constitucional expressa neste sentido, as políticas públicas ambientais formuladas pelo legislador, ainda que restritivas de liberdades fundamentais, são passíveis de menores questionamentos quanto a sua legitimidade.

Ademais, o próprio art. 170, VI, da CF/88, prescreve que o direito ao meio ambiente é um limite à liberdade de exercício de atividades econômicas, de tal modo que, como norma fundamental inserida em um contexto constitucional de unidade hierárquico-normativo, tem a real pretensão de colisão, no campo normativo-aplicativo, com outros direitos constitucionais e em especial com estas liberdades fundamentais e com o próprio direito de propriedade.

Da necessária acomodação hermenêutica destes interesses em conflito resulta o chamado princípio do desenvolvimento sustentável, que é ligado à ideia de responsabilidade ambiental. O dever de proteção ao meio ambiente se abre para o jogo de ponderação de interesses com as liberdades fundamentais, podendo ser impostas restrições às atividades econômicas em favor da preservação do meio ambiente, devendo a constitucionalidade destas restrições ser averiguada com auxílio do princípio da proporcionalidade e levando-se em conta justamente o fim constitucional do desenvolvimento sustentável. Neste sentido, valem novamente as palavras do Min. CELSO DE MELLO no julgamento já citado:

"(...) atento à circunstância de que existe um permanente estado de tensão entre o imperativo de desenvolvimento nacional (CF, art. 3º, II), de um lado, e a necessidade de preservação da integridade do meio ambiente (CF, art. 225), de outro, torna-se essencial reconhecer que a superação desse antagonismo, que opõe valores constitucionais relevantes, dependerá da ponderação concreta, em cada caso concreto, dos interesses e direitos postos em situação de conflito, em ordem a harmonizá-los e a impedir que se aniquilem reciprocamente, tendo-se como vetor interpretativo, para efeito da obtenção de um mais justo e perfeito equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, o princípio do desenvolvimento sustentável, tal como formulado nas conferências internacionais (...) e reconhecido em valiosos estudos doutrinários que lhe destacam o caráter eminentemente constitucional."

Neste julgado, o STF deixou claro o significativo peso que a tutela ao meio ambiente, entendida em sentido amplo como a tutela do meio ambiente natural, cultural, artificial (espaço urbano) e laboral, possui quando entra em colisão com as liberdades fundamentais vinculadas ao exercício de atividades econômicas; na verdade, o STF parece fixar autêntica pauta de hierarquia valorativa prévia e apriorística, ainda que flexível, de interpretação em favor do meio ambiente, de modo que restem reforçadas de legitimidade as medidas jurídico-restritivas, de "caráter legal e natureza constitucional", impostas em face das "motivações de índole meramente econômica", para proteção da "saúde, segurança, cultura, trabalho e bem-estar da população". [46]

A construção hermenêutica do STF deixa claro que no jogo de ponderação entre o meio ambiente e as liberdades de índole econômica, a definição do que é o princípio do desenvolvimento sustentável, i.e., "o justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia", começa primeiro pela ideia de que a tutela do meio ambiente não pode ser comprometida em razão de fatores econômicos, haja vista se tratar de "bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações".

Toda esta amplitude do conteúdo constitucional do direito ao meio ambiente tem autorizado a produção de legislação infraconstitucional e regulamentação complementar de normatividade que, invariavelmente, têm sido significativamente restritivas das atividades econômicas potencialmente poluidoras, seja no que tange ao amplo catálogo de atividades que se enquadram nesta categoria, seja na imposição de pesadas multas e até de medidas de interdição de estabelecimentos em casos extremos.

Por outro lado, a grande distância entre a previsão abstrata de restrições e a aplicação concreta das mesmas revela-se como o grande desafio a ser enfrentado por nossos governantes para que a proteção ao meio ambiente no Brasil deixe de ser apenas uma aspiração.

E neste embate entre direitos de gerações diferentes – de um lado as liberdades fundamentais, direitos de primeira geração, e de outro a tutela do meio ambiente, direito "novíssimo" de terceira geração – o poder de tributar, que "nasce no espaço aberto pelos direitos humanos e por ele é totalmente limitado" [47], pode exercer papel importante, na medida em que incide sobre as liberdades e assim possui capacidade para regular o seu exercício em favor da tutela do meio ambiente. Em suma, o tributo pode servir de importante instrumento de tutela do meio ambiente ecologicamente equilibrado pelo Estado.


PARTE II – PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS

A relação entre tributação e tutela do meio ambiente tem por conteúdo o direcionamento do primeiro para a consecução do segundo, o que evidencia o papel instrumental que pode desempenhar o tributo para a proteção ambiental.

É neste sentido que se pode falar da função ambiental do tributo, que pode configurar-se tanto como típica função arrecadatória (função fiscal), quanto como função regulatória do comportamento dos contribuintes (função extrafiscal).

Na clássica distinção de GIANNINI, o fim fiscal do tributo é aquele de buscar uma entrada para os cofres do Estado, ao passo que os fins não-fiscais compreendem a limitação, por meio de elevada taxação, de algumas manifestações da vida econômica e social julgadas danosas à coletividade, bem como o favorecimento, por meio de isenções, às atividades consideradas socialmente vantajosas [48]. Por sua vez, é importante destacar a advertência de que nos complexos sistemas tributários vigentes no mundo contemporâneo, e considerando as complexidades cada vez maiores das tarefas que o Estado e instâncias especiais de decisão devem cumprir, torna-se cada vez mais difícil, senão impossível, identificar "o tributo fiscal ou extrafiscal quimicamente puro", sendo normal que no tributo "se combinem os fins fiscais com os extrafiscais". [49]

Concordamos com a advertência, mas para fins didáticos, utilizaremos a distinção tradicionalmente formulada, de tal forma que:

(I) o tributo cumpre função ambiental fiscal quando serve de fonte dos recursos necessários para o financiamento dos serviços públicos ambientais, em especial o exercício do poder de polícia ambiental, e para a cobertura de gastos originados das atividades poluentes;

(II) o tributo cumpre função ambiental extrafiscal quando busca "orientar o comportamento dos contribuintes à proteção do meio ambiente" [50], seja por meio de uma incidência mais gravosa a ponto de desestimular atividades poluentes, seja por meio de benefícios fiscais para aqueles que promovem medidas protetivas do meio ambiente.

Uma outra classificação, conexa à classificação acima, é a que distingue os tributos ambientais em sentido estrito dos tributos com função ambiental em sentido amplo; o primeiro tipo seria aquele que possui como hipótese de incidência o próprio comportamento poluente, ao passo que no segundo tipo, independente da configuração de sua hipótese de incidência, "a tutela do meio ambiente se revela principalmente como finalidade extrafiscal, assumindo a a função político-social de desencorajar os comportamentos nocivos para o meio ambiente ou de encorajar os comportamentos compatíveis com o meio ambiente". [51]

A primeira espécie acima descrita corresponde ao típico imposto verde (green tax) que, até mesmo pela distribuição rígida de competências tributárias em nossa constituição, nunca foi instituído no Brasil, de modo que, para nós, a primeira espécie de classificação acima formulada possui maiores interesses práticos.

1.1. A função ambiental fiscal do tributo.

Em nosso Sistema Tributário Nacional, cumprindo função fiscal, remuneratória de serviços públicos, temos a chamada Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental – TCFA que, instituída pela Lei nº 10.165/00, tem por fato gerador a atividade estatal de controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais (poder de polícia ambiental), e como sujeito passivo aquele que promove estas espécies de atividades. [52]

Esta taxa, cuja constitucionalidade foi confirmada pelo STF [53], serve de fonte de recursos para custear o exercício de poder de polícia do órgão encarregado (IBAMA) nacionalmente de fiscalizar, em um sistema de federalismo cooperativo com órgãos regionais e locais, as atividades potencialmente poluidoras. Daí que o montante devido deverá orientar-se principalmente pelo custo que cada contribuinte provoca para a realização da atividade (princípio do custo/benefício) [54], mas sem que issso signifique ignorar condições mínimas de capacidade contributiva.

Outro exemplo é a contribuição ao SAT, prevista no art. 22, II, da Lei 8.212/91. [55] Esta contribuição especial é arrecadada pelos empregadores para custear os benefícios previdenciários pagos aos trabalhadores que se acidentaram em razão de exposição aos chamados riscos ambientais do trabalho.

Como veremos, todos estes tributos orientam-se pelo princípio tributário específico em matéria ambiental denominado poluidor-pagador, i.e., levam em conta que as atividades poluentes efetivamente provocam custos econômicos e sociais que devem ser arcadas por quem os provoca, bem como se abrem para a necessidade de uma flexibilidade do princípio da legalidade em favor da atividade regulamentar, no que concerne à definição de quais são as atividades que justificam a configuração do sujeito passivo segundo o referido princípio do poluidor-pagador.

1.2. A função ambiental extrafiscal do tributo

Como já dito, a função extrafiscal ambiental do tributo pode se realizar tanto pela sobretaxa de atividades danosas ao meio ambiente, como pela concessão de benefícios fiscais em razão de atividades ou situações que privilegiem a tutela ambiental.

Destaca-se aqui a ação preventiva do Estado em tutelar o meio ambiente por meio da capacidade indutória de comportamentos que pode desempenhar o tributo. Estas ações preventivas, obviamente, também deve levar em conta o princípio do poluidor-pagador, sob pena de total inefetividade.

Deve-se advertir, desde já, que ainda que buscando fins que não sejam primordialmente arrecadatórios, os tributos com função extrafiscal sujeitam-se aos limites constitucionais à imposição tributária, inclusive o princípio da capacidade contributiva, de modo que a sua utilização não pode configurar-se como uma alternativa às sanções administrativas que devem ser aplicadas em face das atividades poluentes, sob pena de se produzir "um desvio patológico das categorias tributárias" [56].

Um exemplo de possibilidade de tributação mais onerosa com o objetivo de inibir situações de risco ao meio ambiente é a prevista no art. 182, §4º, II, da CF/88 [57], que permite a tributação progressiva do IPTU, com finalidade extrafiscal [58], nas hipóteses de subutilização de imóvel; a subutilização do imóvel inclui a promoção de riscos para o meio ambiente, como é o caso dos terrenos não-edificados utilizados como depositários de lixo.

A isenção do ITR sobre as áreas dos imóveis rurais consideradas de Preservação Permanente e de Reserva Legal, estabelecida pela Lei nº 8.171/91, em seu art. 104; esta isenção estimula ao proprietário buscar o reconhecimento de sua área como tal e de sujeitá-la ás condições de tratamento necessárias.

Um bom caminho para induzir o comportamento ecologicamente equilibrado dos contribuintes seria a instituição da progressividade do IR das empresas tendo por critérios tanto as atividades mais ou menos poluentes como o emprego ou não de técnicas que minimizem o impacto ambiental. Outra medida poderia ser a absoluta proibição de dedução como custo operacional de insumos ou produtos intermediários potencialmente poluentes quando o mercado oferece outros produtos que provoquem menor impacto negativo ao meio ambiente.

De qualquer forma, o uso do imposto sobre a renda como tributo indutor dos comportamentos ecologicamente responsáveis é, em nosso humilde sentir, medida que permitiria o melhor equilíbrio entre o princípio da prevenção na proteção ao meio ambiente e o princípio do poluidor-pagador, de um lado, e o princípio da capacidade contributiva, de outro lado. Mas, infelizmente, não há no Brasil ainda uma política fiscal adequada neste sentido.

2. Os princípios constitucionais tributários e a tutela do meio ambiente.

Como observa RICARDO LOBO TORRES [59], a relação jurídica tributária é totalmente vinculada aos direitos e garantias fundamentais consagrados na Constituição, verdadeiros instrumentos de proteção individual e coletiva em face da possibilidade do arbítrio estatal, o que, de certa forma, neutraliza a superioridade do Estado, tanto no que se refere à produção das leis quanto no momento de concretizá-las.

Por meio de regras e princípios nossa Constituição protege o cidadão tanto em relação à previsão de leis tributárias arbitrárias quanto em relação a atos administrativos arbitrários, ou seja, estas normas jurídicas consistem em verdadeiras "limitações constitucionais ao poder de tributar" (ALIOMAR BALEEIRO), no sentido de representarem verdadeiras restrições ao exercício do poder tributário abstrato e concreto, por meio das quais a Constituição protege valores subjacentes que são tidos por altamente relevantes e meritórios de proteção, como a justiça, a igualdade, a segurança jurídica, a liberdade e a solidariedade.

Por outro lado, deve-se buscar harmonizar estas proteções constitucionais dos contribuintes com o dever de tutela ambiental, que é, como já dito, correspondente ao direito fundamental de todos ao meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado. O grande desafio é o de encontrar o ponto de equilíbrio entre o interesse predominantemente extrafiscal de proteção ambiental pelo Direito Tributário e o dever de cuidado para não se imporem restrições desproporcionais aos contribuintes e, portanto, lesivas de seus direitos fundamentais.

A busca por este ponto de equilíbrio passa então pela revisão dos principais princípios constitucionais tributários, de modo que a incidência concreta dos mesmos, nestas circunstâncias, dê-se, segundo a lição de JOSÉ CASALTA NABAIS [60], com as devidas determinação e prudência destacadas por JOSÉ MARCOS DOMINGUES [61], sempre levando em conta o "corte oblíquo" provocado pela inserção do dever de tutela ambiental em todos os ramos do Direito:

"Um exemplo bem ilustrativo do recurso à extrafiscalidade é actualmente o constituído pelo direito do ambiente, um domínio jurídico que, mais do que formar um sector jurídico totalmente novo e justaposto aos sectores tradicionais, se configura fundamentalmente como cortando obliquamente a generalidade dos ramos de direito, tanto público como privado, mobilizando-os para a preocupação da defesa ambiental."

Seguindo a busca deste ponto de equilíbrio, observando esta justaposição da preocupação jurídica com a tutela do meio ambiente, mas sem se descuidar dos limites constitucionais à imposição tributária, passamos à revisão apontada.

2.1.Princípios da legalidade e tipicidade tributárias.

O princípio da legalidade consiste em princípio formal de imposição tributária que vincula o modo do Estado criar os tributos [62]. Princípios desta estrutura nada dizem quanto ao conteúdo da imposição, mas sim quanto ao modo de sua criação, vigência e eficácia.

Nos termos do art. 150, I, da CF/88, os tributos só podem ser criados ou majorados por lei, observadas as exceções feitas no art. 153, §1º; não estão sujeitas ao princípio da legalidade a fixação do vencimento das prestações tributárias e a sua correção monetária [63], mas, por outro lado, a instituição de sanções em face do descumprimento das obrigações principal e acessória está inexoravelmente sujeita à legalidade estrita [64]. O princípio da legalidade tributária, portanto, é expressão da segurança jurídica, do próprio Estado de Direito [65].

Em nossa doutrina, majoritariamente positivista-formalista, vigora a ideia do dever de a lei prescrever, de modo exaustivo, todos os aspectos da obrigação tributária. Neste sentido, a lei formal consistiria na fonte exclusiva de criação e majoração dos tributos, nada restando a ser implementado pelo chefe do Executivo, ou pela Administração Pública, no âmbito do exercício do seu poder regulamentar, devendo limitar-se a aplicar o direito posto nas leis.

Nos dizeres de ALBERTO XAVIER, "o princípio da legalidade da tributação (nullum tributum sine lege) não pode caracterizar-se apenas pelo recurso ao conceito de ‘reserva de lei’ (…) Vai mais além, exigindo uma lei revestida de especiais características. Não basta a lei; é necessária uma ‘lei qualificada’. Esta ‘qualificação’ da lei pode ser designada como ‘reserva absoluta de lei’, o que faz com que o princípio da legalidade da tributação se exprima como um princípio da tipicidade da tributação." [66] Pelo princípio da tipicidade tributária, o legislador está adstrito a uma rigorosa prescrição dos elementos do tributo, a estabelecer taxativamente todos os aspectos da imposição tributária.

Por outro lado, estas ideias de reserva absoluta da lei e de tipicidade fechada devem ser revistas, de modo que se reconheça, necessariamente, certo grau de criatividade à atuação reguladora do Poder Executivo e da Administração Pública, inclusive em matéria tributária.

A construção desta conclusão deve passar primeiro pela ideia de que a dinâmica do fenômeno jurídico de incidência normativa desenvolve-se por meio da passagem de uma norma geral e abstrata em direção a uma norma individual e concreta (KELSEN). Esta passagem de nível de normação pressupõe sempre uma atividade criativa do intérprete/aplicador, trata-se de "preencher um vazio, respeitando os limites traçados pelas normas de grau superior" [64]. A margem de apreciação criativa do intérprete administrativo decorre da própria impossibilidade da norma legal prever todas as circunstâncias vinculadas à situação disciplinada, não podendo se cogitar de uma normação legal completa, mas nem tampouco de uma liberdade absoluta do intérprete.

Partindo desta premissa, todo e qualquer regulamento possui, ao mesmo tempo e em diferentes graus, caráter executivo e criativo, isto é, sejam executivos ou independentes, as diferentes espécies de regulamento cumprem a mesma função e possuem o mesmo fundamento: a realização da lei. O poder regulamentar é principalmente exercido em favor da harmonia na aplicação da lei. O regulamento cumpre importante papel ao minimizar a discricionariedade dos agentes públicos na aplicação da lei, impedindo que cada agente público realize um juízo normativo próprio para cada caso concreto, evitando assim o arbítrio e privilegiando os valores constitucionais da segurança jurídica e da igualdade.

Ocorre que o grau do caráter criativo do ato regulador é diretamente proporcional à abertura da densidade normativa legal, ou seja, depende da medida do uso de cláusulas abertas, conceitos indeterminados, princípios e finalidades a serem alcançadas pela aplicação da lei. E o uso destes conceitos indeterminados, princípios e finalidades se faz cada vez mais presente nas leis contemporâneas, muito mais como uma necessidade do que como um modismo.

Portanto, não há como negar que o poder regulamentar é em certa medida um poder discricionário de editar normas gerais e abstratas a ser exercido dentro dos limites emoldurados pelo legislador democrático.

Mas isso não significa que a lei tributária deve limitar-se a estabelecer princípios e finalidades a serem preenchidos pelo pode regulamentar. Com efeito, não se pode negar que certas matérias, como a tributária e a penal, não podem ser disciplinadas por leis que se limitem a estabelecer princípios e valores a serem alcançados, sob pena de violação da própria Constituição. Ainda que não se possa cogitar de uma reserva absoluta da lei penal ou tributária, haja vista o natural caráter de abertura semântica das leis e de sua aplicação concreta ensejar certo grau de criatividade do intérprete regulador ou aplicador, o certo é que a definição legal de crimes e tributos não pode se dar pela previsão genérica e abstrata de finalidades a serem alcançadas, mas a lei deverá definir o fato gerador dos mesmos, ainda que certa margem de apreciação sempre reste em poder do intérprete.

Portanto, a reserva de lei no direito tributário é relativa, e não absoluta, o que não significa deixar os tributos para a livre criação do poder regulamentar ainda que dentro dos fins estabelecidos pelo legislador; a lei poderá delegar os poderes normativos ao poder regulamentar sobre estas matérias, mas desde que o faça por meio do estabelecimento do desenho normativo mínimo capaz de evitar o arbítrio da autoridade delegada, e nestes casos, o desenho normativo mínimo é estabelecer os elementos da obrigação tributária, ainda que por meio de conceitos jurídicos indeterminados.

Como observa LOBO TORRES, "a expressão reserva absoluta é empregada no direito tributário para expressar a possibilidade de pleno fechamento dos conceitos jurídicos e para restringir a competência da Administração no exercício do poder regulamentar", [65] mas sabemos que o pleno fechamento dos conceitos jurídicos é algo impossível de ocorrer, e nem sequer se mostra salutar em um ambiente institucional marcado pela harmonia e igualdade entre os três poderes. A ideia de reserva absoluta da lei é incompatível com a realidade dos conceitos indeterminados e das cláusulas gerais utilizadas em larga escala tanto no direito tributário, quanto no direito penal, como em outros tantos ramos do Direito, não se podendo aceitar a ideia da lei como fechamento completo dos seus conceitos e tipos, sendo sempre inadvertidamente necessária a atividade de complementação pelo poder regulamentar. Isso significa que, dependendo da matéria a ser regulada, exige-se uma densidade normativa mais ou menos aberta, uma liberdade de conformação do poder regulamentar maior ou menor, mas sempre estando presentes as ideias de reserva relativa de lei e atividade executiva e criativa do poder regulamentar. O regulamento concretizaria a norma legal em homenagem à atuação harmônica e isonômica da lei. Ao poder regulamentar competiria "concretizar a linha de valoração iniciada pela lei formal" (TIPKE).

Pois bem, esta expansão da atividade reguladora no Estado moderno, como exigência dos novos tempos de uma atividade mais criativa do corpo técnico regulador, voltada para suplementar a legislação ordinária com o uso de capacidades institucionais próprias dos agentes reguladores, tornando a lei mais apta a realizar os anseios por um Estado mais justo e eficiente, se faz muito presente no que toca à disciplina da matéria ambiental.

Com efeito, o caso do meio ambiente é paradigmático. Embora a formulação de princípios diretivos e standards para a proteção do meio-ambiente deva ficar a cargo do Legislador, este não possui tempo e nem perícia, em suma, capacidade institucional [66] para analisar os dados científicos sempre em evolução e apresentar as soluções mais adequadas para as exigências sempre atuais de proteção do meio ambiente.

Portanto, o Estado moderno, que pretende tutelar de modo eficaz o meio ambiente, requer um modelo de atuação normativa no âmbito da separação de poderes que, sem deixar de observar a prioridade da legitimidade democrática das decisões do Legislador, permita o desenvolvimento de uma normatividade suplementar que promova a regulamentação contínua e a execução eficiente das leis promulgadas em defesa do meio ambiente. Em suma, no âmbito do arranjo institucional moderno, deve-se atentar para a maior capacidade institucional do Poder Executivo e de seus órgãos para o exame de dados e situações concretas que são relevantes para a definição das melhores políticas públicas e medidas em geral para a defesa do meio ambiente.

Esta exigência reflete-se na disciplina legal da contribuição ao SAT e encontrou abrigo na posição do STF quanto à constitucionalidade da exação.

A contribuição ao SAT foi estabelecida pelo art. 22, II, da Lei 8.212/91, que prescreve que o fato gerador da mesma é o ato de remuneração aos segurados empregados e trabalhadores avulsos, enquanto a base de cálculo é o total destas remunerações pagas ou creditadas no decorrer do mês. Esta contribuição destina-se ao financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho.

As alíquotas foram previstas nas alíneas a, b e c deste inciso II, com os percentuais respectivos de 1%, 2% e 3%; o critério de aplicação destas alíquotas é o de "grau de risco de acidente de trabalho" presente na atividade preponderante do contribuinte, ou seja, a alíquota de 1% seria aplicada para a hipótese de risco ambiental leve de trabalho, 2% para o risco médio e 3% para o risco grave. Porém, a lei não definiu o que seriam riscos leve, médio ou grave, nem tampouco realizou o enquadramento dos diversos segmentos empresariais nesta escala de riscos, de modo que a definição destes conceitos indeterminados e o enquadramento legal correspondente, com a consequente determinação da alíquota aplicável, ficaram a cargo do Ministério do Trabalho e da Previdência Social. A presente delegação decorre da atenção à maior capacidade institucional deste órgão para verificar, em concreto, dados estatísticos que permitem o enquadramento que corresponde à realidade ambiental subjacente.

Sem embargo, considerando a configuração da contribuição pelo art. 22, II, da Lei 8.212/91, a definição dos conceitos indeterminados de risco leve, médio e grave é indispensável para a determinação da incidência concreta da contribuição, em especial das alíquotas a serem aplicadas para cada caso concreto. Esta circunstância levou grande parte da doutrina a afirmar a inconstitucionalidade do art. 22, II, da Lei 8.212/91, haja vista ter admitido que a definição dos conceitos vagos de riscos leve, médio e grave, como elementos essenciais à configuração da hipótese de imposição do tributo, pudesse ser feita por atos normativos infralegais a serem expedidos pelo Poder Executivo ou por seus órgãos.

Como o citado dispositivo legal apenas fixa os percentuais máximos ou mínimos incidentes sobre o total das remunerações dos segurados empregados e trabalhadores avulsos, sem, contudo, explicitar os critérios para definir-se o que deve ser considerada atividade preponderante de risco leve, médio ou grave, estaríamos então diante da violação do princípio da legalidade e da tipicidade tributária.

Porém, o STF, ao apreciar a constitucionalidade do SAT, admitiu que o Poder Executivo, por meio de delegação legal, possa expedir atos normativos que completem o tipo tributário quando este procedimento for indispensável para a fiel execução das leis. Isto é, expedir ato normativo infralegal, de caráter regulamentar, que não se limite a explicitar os comandos normativos da lei, mas sim desenvolver a "linha de valoração" iniciada pelo legislador, complementando o tipo tributário, atuando de forma secundária, mas de forma constitutiva, na criação de direitos e obrigações. Não se pode então cogitar de mero decreto de execução dentro da sistemática do pensamento tradicional, mas sim de exercício criativo do poder regulamentar com o fim de permitir a atuação concreta da lei. Esta decisão do Supremo, longe de admitir a delegação pura e simples da competência tributária, reflete exigência moderna de validade dos regulamentos concretizadores de normas [67], na qual o Executivo, mais próximo da realidade dos fatos, procede à tipificação complementar do fato gerador, encerrando a valoração da realidade iniciada na lei e buscando melhor realizar a igualdade e a justiça material. Portanto, para o STF, o Poder Executivo pode complementar a normatividade da lei, no âmbito do poder regulamentar, a partir da interpretação dos conceitos indeterminados, standards e finalidades estabelecidas legalmente, reconhecendo então que estes modelos legais abertos compõem a realidade normativa atual e que a atuação da Administração Pública, para que seja adequada à dinâmica da vida moderna, deve incorporar tarefas normativas que vão muito além de funcionar como mera "correia de transmissão" das disposições legais.

Esta decisão do STF representa avanço na flexibilização do princípio da legalidade em favor da maior tecnicidade de certos agentes públicos em matéria ambiental, de modo que mesmo a configuração normativa definitiva de tributos pode ocorrer com a participação mais criativa desta burocracia técnica se isto se mostrar necessário para melhor atender as finalidades previstas em lei para a proteção do meio ambiente, sem que isso represente qualquer violação do princípio da legalidade tributária do art. 150, I, da CF/88, mas sim a sua leitura com os olhos voltados para o equilíbrio entre direitos fundamentais dos contribuintes e exigências técnicas e concretas de uma efetiva proteção do meio ambiente.

Porém, o STF, ao decidir pela constitucionalidade do SAT, admitiu que o Poder Executivo, por meio de delegação legal, pode expedir atos normativos que completem o tipo tributário quando este procedimento for indispensável para a fiel execução das leis (decretos de execução). Esta decisão do Supremo, longe de admitir a delegação pura e simples da competência tributária, reflete exigência moderna de validade dos regulamentos concretizadores de normas [68], na qual o Executivo, mais próximo da realidade dos fatos, procede à tipificação complementar do fato gerador, encerrando a valoração da realidade iniciada na lei e buscando melhor realizar a igualdade e a justiça material.

O que nunca poderia ter sido admitida é a inteira criação do tributo pelo Poder Executivo, como ocorre com as medidas provisórias; sob uma interpretação literal do Texto Constitucional, o STF (Súmula 651, DJU 09/10/2003) ignorou o fundamento do princípio da legalidade em matéria tributária, permitindo que a imposição tributária vigorasse por vontade exclusiva do Imperador.

2.2.Princípio da capacidade contributiva

O princípio da capacidade contributiva, como princípio de justa repartição das cargas públicas entre os cidadãos, desde ADAM SMITH, foi desenvolvido pela Ciência das Finanças [69], sendo assim considerado como um princípio econômico.

Com efeito, a ausência de positivação do princípio o enfraquecia. Na Itália, por exemplo, antes da Constituição de 1947, doutrina autorizada o entendia como mero princípio de "norma de vida", que, por sua abstração, não consistia em norma obrigatória, sendo os requisitos de igualdade e proporcionalidade apenas oportunas diretivas ao legislador, não possuindo estes princípios nenhum significado para o estudo do ordenamento jurídico [70]. Pensavam também que um juízo sobre a idoneidade de determinado fato constituir ou não um índice de capacidade contributiva seria um juízo reservado unicamente ao legislador, sendo o princípio, portanto, um concetto paragiuridico, que interessaria ao economista, mas não ao jurista. [71]

Posteriormente, o reconhecimento nas Constituições modernas deste princípio e de seu papel na fixação da medida da tributação, da estrutura e do conteúdo do sistema normativo tributário, embora não tenha resolvido por completo a questão quanto ao seu conteúdo próprio, confirmou seu caráter de direito fundamental: direito a uma tributação justa (justa repartição da carga tributária), entendida como aquela que se baseia em critérios de justiça material e de igualdade, na impossibilidade de incidência sobre fatos que não denotem riqueza, na generalidade com respeito à imunidade do mínimo existencial, na progressividade e na mais completa vedação de privilégios odiosos.

Como observado por FRANCESCO MOSCHETTI [72], a Constituição italiana de 1947 não se limitou a afirmar o tradicional princípio da legalidade (art. 23 da CI), mas também interveio no plano substancial da imposição tributária, ou seja, não estabeleceu apenas princípios formais vinculadores da forma de criação dos tributos, mas também princípios materiais que vinculam a estrutura e conteúdo dos tributos (art. 53 da CI). A partir do Texto Constitucional, a doutrina italiana oscila em enxergar o princípio da capacidade contributiva ora como decorrência do princípio geral da igualdade [73], ora como fundamento de tributação [74], como critério de justiça e coerência da tributação [75], como decorrente dos deveres de solidariedade [76], como princípio autônomo [77] e até mesmo integrando estes conceitos para definir o conteúdo pesquisado [78].

O mesmo ocorre com a Constituição espanhola, onde também há princípios formais (art. 31.3) e materiais (art. 31.1) [79], como a capacidade contributiva.

Ambas as Constituições vinculam o legislador a observar o princípio da capacidade contributiva e a construir um sistema tributário progressivo.

A Constituição alemã vigente, diferentemente da anterior (Constituição de Weimar, art. 134), não prescreve nenhum princípio material específico em matéria tributária, mas nem por isso o legislador tributário alemão está livre no momento de criação dos tributos; tanto a doutrina [80] quanto o Tribunal Constitucional reconhecem o princípio da tributação conforme a capacidade contributiva como princípio fundamental de justiça impositiva e de critério adequado de medida da igualdade tributária, a partir do próprio princípio do Estado de Direito, do direito de propriedade e do princípio da igualdade jurídica material previsto no art. 3º, alínea 1, da Lei Fundamental.

Nossa Constituição também prevê o princípio da capacidade contributiva [81], embora formalmente exija sua aplicação apenas aos impostos pessoais [82] (art. 145, §1º, CF/88); mas, na realidade, este se aplica, em maior ou menor medida, a todos os tributos, por decorrência do Estado Democrático de Direito, do dever de tributação conforme a justiça material, da igualdade, do direito de propriedade, da dignidade humana, da liberdade de exercício de profissões e de atividades econômicas e até mesmo da própria condição de cidadania.

O princípio da capacidade contributiva consiste em norma fundamental de justiça tributária, pois, com seu conteúdo indeterminado, porém determinável, ele pode ser interpretado e aplicado a partir de todos os princípios que justificam um Estado de Direito, que tem por conteúdo material a plenitude dos direitos fundamentais; assim, o presente princípio pode ser tido por justificativa do dever fundamental de contribuição e ao mesmo tempo medida dela, garantia de liberdade enquanto limite de imposição, e também critério-limite para a proteção do mínimo existencial.

A questão a se saber é se este princípio, não obstante sua importância, impõe algum limite à tributação com a finalidade extrafiscal de proteção ao meio ambiente. Na verdade, esta discussão passa pela própria controvérsia mais ampla se a tributação extrafiscal está ou não sujeita ao princípio da capacidade contributiva.

Existem aqueles que afastam a incidência da capacidade contributiva sobre a tributação extrafiscal sob o argumento de que tal limitação resultaria na própria falta de funcionalidade desta técnica, haja vista a extrafiscalidade, por sua própria essência, requerer a tributação exarcebada. [83] Não concordamos com tal tese, pois acreditamos que o princípio da capacidade contributiva informa a tributação de um modo geral, inclusive àquela com finalidade extrafiscal.

Daí pensarmos que, para alcançar-se o justo equilíbrio entre proteção do meio ambiente por meio da imposição tributária e respeito aos direitos fundamentais dos contribuintes, faz-se imprescindível sempre a observância do princípio da capacidade contributiva, ainda que o mesmo deva acomodar-se com princípios específicos como o do poluidor-pagador [84]. Neste sentido, acompanhamos o pensamento de JOSÉ MARCOS DOMINGUES, para quem se deve proceder à harmonização entre tributação ambiental e capacidade contributiva "através da identificação de fatos geradores que a um só tempo indiciem, pela apreensão ou aproveitamento dos bens naturais, manifestações de riqueza suscetíveis de tributação e justifiquem uma ponderada participação dos agentes econômicos no rateio dos custos de manutenção do Estado, dissipando assim as brumas que às vezes preconceituosamente se lançam sobre a novel fiscalidade ambiental." [85]

Não viola a capacidade contributiva uma tributação progressiva sobre aqueles contribuintes que exercem atividades potencialmente poluentes, muito pelo contrário, a tributação diferenciada justifica-se em razão da própria necessidade de exigir destes contribuintes maior participação no rateio dos custos estatais para a preservação do meio ambiente; o que não se pode admitir é a imposição tributária em situações em que não há riqueza tributável, ou a imposição em níveis tão absurdos que aniquilem a própria capacidade de contribuir, ainda que sob a justificativa de tutela do meio ambiente. Portanto, o justo equilíbrio poderia então ser alcançado, no caso do princípio da capacidade contributiva, com a não objeção à tributação diferenciada (princípio do poluidor-pagador), mas com a vedação da tributação sobre fatos que não denotem riqueza ou em nível tão excessivo que importe na própria perda da capacidade econômica de contribuição aos gastos públicos.

2.3.Princípio da proibição de tributo com efeito de confisco

O exposto logo acima revela então que nem a tributação com a finalidade extrafiscal justifica a utilização do tributo com efeito de confisco, proibição prevista no art. 150, IV, CF/88.

Expondo a dificuldade da configuração deste princípio, diante da problemática de definição do seu conteúdo, PAULO DE BARROS CARVALHO, com muita propriedade e lógica, sentenciou que "aquilo que para alguns tem efeitos confiscatórios, para outros pode perfeitamente apresentar-se como forma lídima de exigência tributária" E prossegue [86]:

"Intrincado e embaraçoso, o objeto da regulação do referido art. 150, IV, da CF, acaba por oferecer unicamente um rumo axiológico, tênue e confuso, cuja nota principal repousa na simples advertência ao legislador dos tributos, no sentido de comunicar-lhes que existe limite para a carga tributária. Somente isso."

Realmente devem-se reconhecer as dificuldades na fixação destes limites, haja vista a absoluta indeterminação do conteúdo deste princípio: até onde o tributo é legítimo e em que momento ele passa a ser confiscatório?

Com muito propriedade, RICARDO LOBO TORRES [87] aconselha o uso do princípio da razoabilidade para fixação destes limites, diante da impossibilidade de fixação prévia dos mesmos. Com efeito, diante desta zona cinzenta entre o que é justo e o que é confiscatório em termos de tributação excessiva, deve ser observado a razobilidade como parâmetro e utilizada a capacidade contributiva como auxílio.

Tributar segundo a capacidade contributiva é, além de outros aspectos, tributar respeitando o limite do mínimo existencial. Neste sentido, temos aí um primeiro limite: toda tributação que não alcance o mínimo de renda para que o indivíduo possa suprir suas necessidades básicas e de sua família, ou o mínimo que uma pessoa jurídica necessite para desenvolver seus objetivos sociais, não será considerada confiscatória.

Fixado este primeiro limite, faz-se necessário configurar até onde pode o tributo avançar no patrimônio e na renda do contribuinte depois de respeitado o mínimo vital.

Cumpre afirmar que a tributação que extingue a parcela da renda e do patrimônio do contribuinte, após ter reservado-lhe o mínimo vital, também pode produzir efeitos confiscatórios se desarazoada. A vedação de tributação do mínimo vital não importa em autorização para tributar-se o todo que não lhe compreende, o todo que lhe excede, mas simplesmente vedação de tributação sobre esta específica parcela. Quanto a esta zona delimitada pelo mínimo vital e a totalidade do que lhe supera, será confiscatório o tributo que revele ônus desarazoado, i.e., o tributo que, de tão oneroso, venha a por em risco a própria capacidade econômica do contribuinte, amesquinhando a capacidade dos particulares de produzirem riqueza.

Se desmedida a imposição tributária, deixa este tributo de ser um dever constitucional do contribuinte e passa a ser instrumento estatal de invasão ilegítima da esfera de propriedade do particular. Assim a carga tributária que não observa um mínimo de razoabilidade é aquela que, aos poucos, ou até de uma vez, aniquila a capacidade contributiva dos indivíduos, configurando-se assim o seu efeito confiscatório.

Trata-se então, segundo pensamos, em limite instransponível para a intervenção tributária ainda que justificada por fins de proteção ambiental, de tal modo que a tributação sobre determinado contribuinte, ainda que potencialmente poluidor, não pode ser dimensionada em nível extremo a ponto de configurar-se autêntica interdição da atividade econômica, haja vista a atividade de tributação não poder ser confundida com a atividade sancionatória. A falta de pagamento do tributo acarreta a imposição de uma sanção, mas ele, o tributo, não pode transmutar-se em uma sanção.

2.4.Princípio do poluidor-pagador

Princípio específico do Direito Tributário Ambiental, fundado na ideia de justiça, o princípio do poluidor-pagador "sinaliza no sentido de que os potenciais poluidores devem arcar com a responsabilidade pelo pagamento das despesas estatais relacionadas com a precaução e a prevenção dos riscos ambientais." [88]

Este princípio, que informa a eleição do contribuinte do tributo que cumpre função ambiental, está presente, a toda evidência, na configuração da contribuição ao SAT e da TCFA, haja vista os contribuintes destes tributos serem, respectivamente, aqueles que possuem o poder de controle sobre os riscos ambientais de trabalho e que realizam atividades potencialmente poluidoras a ensejarem o exercício do poder de polícia ambiental. Por outro lado, a definição de quem são estes contribuintes é algo mais complexo, que exige a análise de dados concretos e estatísticos, portanto, que requer um desenvolvimento mais criativo da atividade reguladora e mesmo dos agentes administrativos nesta tarefa de tipificação, o que envolve o tema mais acima tratado da flexibilização da legalidade tributária. [89]

A eleição do sujeito passivo, segundo este princípio, se justifica por ser este quem provoca os custos sociais e econômicos decorrentes da poluição do meio ambiente, bem como por ser quem o ordenamento jurídico precisa induzir a modificar o seu comportamento em direção ao emprego de técnicas que respeitem ao meio ambiente, i.e., para que passe a pensar em termos de desenvolvimento econômico sustentável.

De qualquer forma, como já dito, este princípio deve conciliar-se com o da capacidade contributiva, de modo que a estruturação da imposição tributária deve observar uma relação de aproximação entra a capacidade de poluir e a de contribuir para os gastos públicos. Como observado acima, utilizar o lucro das empresas poluentes como grandeza econômica a sofrer a imposição fiscal indutora seria uma boa forma de alcançar este equilíbrio.


CONCLUSÃO

Como adverte AMATUCCI, está inserida na agenda interdisciplinar do Direito a investigação sobre novas formas de intervenção normativa impostas em razão das transformações que sofre a sociedade atual, com destaque para os tributos voltados para a tutela do meio ambiente. [90] Decididamente, "o Direito Tributário não podia permanecer alheio à proteção do meio ambiente" [91], de tal forma que a legislação tributária deve promover instrumentos tributários que se orientem, sem se descuidar dos direitos fundamentais dos contribuintes, à consecução dos fins constitucionais de proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Como ponto de conexão entre tributação e meio ambiente, temos que a imposição tributária deve pautar-se pela ideia de desenvolvimento econômico sustentável: a tributação não pode ser excessiva a ponto de minar o desenvolvimento econômico, mas deve seguir uma trajetória que estimule atividades de promoção do meio ambiente sadio e iniba aquelas que resultem na degradação do meio ambiente.

No Brasil, a legislação tributária ainda está muito longe de alcançar este fim; falta a previsão de benefícios fiscais consistentes, além de inexistir uma tributação progressiva sobre a renda de empresas que promovem atividades poluentes. Temos apenas tributos que pressupõem a atividade poluente já ocorrida, sem que se possa cogitar da eficiência preventiva dos mesmos.


Notas

  1. Destaque para duas obras que compõem o quadro de exceções: DOMINGUES, José Marcos. Direito Tributário e Meio Ambiente. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007; TÔRRES, Heleno Taveira (org.) Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005.
  2. Cf. a relação conceitual entre estes termos e o termo "direitos humanos" in PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución. 9ª ed. Madrid: Tecnos, 2005, pp. 31/40.
  3. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 7ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, pp. 33/34.
  4. Como leciona INGO SARLET, a escolha dos termos "direitos humanos" e "direitos fundamentais" é justificada não apenas em razão da positivação dos mesmos, mas também de serem efetivamente os que abrangem o fenômeno em sua integralidade, haja vista os outros termos estarem atrelados a "categorias específicas do gênero direitos fundamentais" (SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. ob.cit., pp. 34/35). Como exemplo do que explica o professor gaúcho, podemos nos referir ao termo "liberdades fundamentais", que em seu campo semântico excluiria os direitos sociais. Neste mesmo sentido, DIMITRI DIMOILIS e LEONARDO MARTINS apontam que estamos diante de uma "questão terminológica essencial", seja porque "os vários termos adquiriram significados diferentes na história constitucional mundial", seja porque o emprego de certo termo pela Constituição "pode oferecer argumentos sistemáticos a favor ou contra a tutela de certos direitos (...)" (Definição e características dos direitos fundamentais. In: LEITE, George Salomão e SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Direitos Fundamentais e Estado Constitucional. Estudos em homenagem a J. J. Gomes Canotilho. São Paulo/Coimbra: RT/Coimbra, 2009, pp. 118/119.
  5. PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución.ob.cit., p. 33.
  6. "(...) há que atentar para o fato de não existir uma identidade necessária – no que tange ao elenco dos direitos humanos e fundamentais reconhecidos – nem entre o direito constitucional dos diversos Estados e o direito internacional, nem entre as Constituições, e isso pelo fato de que, por vezes, o catálogo dos direitos fundamentais constitucionais fica aquém do rol dos direitos humanos contemplados nos documentos internacionais, ao passo que outras vezes chega a ficar – ressalvadas algumas exceções – bem além, como é o caso da nossa atual Constituição". (SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. ob.cit., p. 40).
  7. No Brasil, cf. a evolução jurisprudencial acerca da eficácia da proibição internacional de prisão civil do depositário infiel na ordem constitucional interna: STF – Pleno. HC 87.585/TO, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, DJ 26/06/2009: "DEPOSITÁRIO INFIEL - PRISÃO. A subscrição pelo Brasil do Pacto de São José da Costa Rica, limitando a prisão civil por dívida ao descumprimento inescusável de prestação alimentícia, implicou a derrogação das normas estritamente legais referentes à prisão do depositário infiel."
  8. "Art. 5º. (...)
  9. § 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. (...)

    § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais."

  10. PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución.ob.cit., p. 50.
  11. Idem, ibidem.
  12. Idem, p. 51.
  13. "A dignidade humana tem sido na história, e é na atualidade, o ponto de referência de todas as faculdades que se dirigem ao reconhecimento e afirmação da dimensão moral da pessoa". (PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución. ob.cit., p. 51)
  14. "A liberdade constitui, desde sempre, o princípio aglutinante da luta pelos direitos humanos, até o ponto que durante muito tempo a ideia de liberdade, em suas diversas manifestações, se identificou com a própria noção dos direitos humanos". (PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución. ob.cit., p. 51)
  15. "Em relação à igualdade, deve recordar-se, tal como se tem evidenciado (...), que constitui o direito humano mais importante em nosso tempo, ao ser considerado como postulado que fundamenta toda a moderna construção teórica e jurídico-positiva dos direitos sociais". (PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución. ob.cit., p. 52)
  16. PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución.ob.cit., p. 51.
  17. Idem, p. 53.
  18. Sobre a solidariedade como valor superior que fundamenta os direitos fundamentais, Cf. PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Curso de Derechos Fundamentales. Teoria General. Madrid: Universidad Carlos III, 1999, pp. 275/282.
  19. PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución.ob.cit., p. 53.
  20. Bill of Rights; June 12, 1776 (The Constitution of Virginia): "Section 1 – That all men are by nature equally free and independent, and have certain inherent rights, of which, when they enter into a state of society, they cannot, by any compact, deprive or divest their posterity, namely, the enjoyment of life and liberty, with the means of acquiring and possessing property, and pursuing and obtaining happiness and safety." 
  21. FERNANDEZ, Eusebio. Fundamento de los derechos humanos. In: Anuário de Derechos Humanos, vol. 1. Madrid: Universidad Complutense, 1981, p. 93.
  22. Idem, ibidem.
  23. HESSE, Konrad. Significado de los Derechos Fundamentales. In: BENDA, MAIHOFER, VOGEL, HESSE e HEYDE. Manual de Derecho Constitucional. Madrid: Marcial Pons, 1996, pp. 84/85.
  24. É o que fez: SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. ob.cit., p. 54.
  25. ZAGREBELSKY, Gustavo. Il diritto mite. Torino: Einaudi, 1992, pp. 24.
  26. BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do Direito (O Triunfo Tardio do Direito Constitucional do Brasil). In: SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. E SARMENTO, Daniel. A Constitucionalização do Direito. Fundamentos Teóricos e Aplicações Específicas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 205.
  27. Embora se possa afirmar que desde a Revolução Industrial do séc. XVIII estes movimentos já haviam iniciado, foi apenas a partir da metade do séc. XIX que ganharam força e presença.
  28. PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. La Tercera Generación de Derechos Humanos. Navarra: Aranzadi, 2006, pp. 28/29.
  29. Cf. HESSE, Konrad. Significado de los Derechos Fundamentales. ob.cit., pp. 85/86; este autor relaciona a ausência de eficácia dos direitos fundamentais durante a República de Weimar com o desenvolvimento do Nacionalsocialismo que culminou com a eliminação da ordem constitucional democrática e do Estado de Direito e os horrores contra a humanidade perpetrados pelo regime nazista.
  30. "A nota distintiva destes direitos é a sua dimensão positiva (...)". (SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. ob.cit., p. 56).
  31. "A liberdade dos cidadãos sob as relações atuais não estriba só em uma liberação da intervenção estatal. Uma configuração em liberdade e autonomia da própria existente depende muito mais de uma série de condições que não estão à disposição do indivíduo (...). Hoje em dia a dotação e a manutenção de tais condições constituem uma clara tarefa do Estado, que tem chegado a ser quem planeja, guia e configura, isto é, o Estado da procura existencial y da afirmação social". (HESSE, Konrad. Significado de los Derechos Fundamentales. ob.cit., p. 94)
  32. HESSE, Konrad. Significado de los Derechos Fundamentales. ob.cit., p. 95.
  33. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. ob.cit., p. 57.
  34. HESSE, Konrad. Significado de los Derechos Fundamentales. ob.cit., p. 95.
  35. PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. La Tercera Generación de Derechos Humanos.ob.cit., p. 34: "Se a liberdade foi o valor guia dos direitos da primeira geração, como o foi a igualdade para os direitos de caráter econômico, social e cultural, os direitos da terceira geração têm como principal valor de referência a solidariedade". Sobre a solidariedade como valor superior que fundamenta os direitos fundamentais, Cf. PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Curso de Derechos Fundamentales. Teoria General. ob.cit., pp. 275/282.
  36. Sobre o direito fundamental à paz como direito fundamental de quinta geração, cf. BONAVIDES, Paulo. A quinta geração de direitos fundamentais. ob.cit., pp. 283/299.
  37. Cf. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. ob.cit., p. 58.
  38. Cf. PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. La Tercera Generación de Derechos Humanos. ob.cit., p. 28.
  39. Cf. LEITE, George Salomão. Direito fundamental a uma morte digna. In: LEITE, George Salomão e SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Direitos Fundamentais e Estado Constitucional. Estudos em homenagem a J. J. Gomes Canotilho. São Paulo/Coimbra: RT/Coimbra, 2009, pp. 137/162.
  40. Cf. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. ob.cit., pp. 59/60.
  41. "A solidariedade se integra com os demais valores, liberdade, segurança jurídica e igualdade, pelo comum objetivo de contribuir, por meio dos direitos que fundamenta, ao dinamismo da liberdade, que facilita o exercício da liberdade de eleição tendo em vista a conservação da liberdade ou autonomia moral" (PECES-BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Curso de Derechos Fundamentales. Teoria General. ob.cit., p. 279).
  42. "Em definitivo, a terceira geração dos direitos fundamentais tem contribuído a redimensionar a própria imagem do homem enquanto sujeito de direitos. As novas condições do exercício dos direitos humanos tem determinado uma nova forma de ser cidadão no Estado de Direito das sociedades tecnológicas, do mesmo modo que o trânsito do Estado liberal ao Estado social de Direito configurou também formas diferentes de exercitar a cidadania." (PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. La Tercera Generación de Derechos Humanos. ob.cit., p. 35). Reconhecendo os impactos tecnológicos sobre a sociedade como fonte material destes direitos, e ainda acrescentando o "estado crônico de beligerância" e o "processo de descolonização do segundo pós-guerra", cf. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. ob.cit., p. 57.
  43. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 11ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 523.
  44. CRUZ, Branca Martins da. Importância da Constitucionalização do Direito ao Ambiente. In: BONAVIDES, Paulo, et all (Orgs.). Estudos de Direito Constitucional em Homenagem a Cesar Asfor Rocha. Rio de Janeiro: Renovar, 2009, p. 202.
  45. STF – Pleno, ADI 3.540-MC/DF. Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 03/02/2006.
  46. CRUZ, Branca Martins da. Importância da Constitucionalização do Direito ao Ambiente. ob.cit., pp. 205/206.
  47. STF – Pleno, ADI 3.540-MC/DF. Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 03/02/2006.
  48. TORRES, Ricardo Lobo. Os Direitos Humanos e a Tributação: Imunidades e Isonomia. In: Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário. Vol. III. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 14.
  49. GIANNINI, Achile Donato. Istituzioni di Diritto Tributário. 9ª ed. Milão: Giuffrè, 1965, pp. 75/76.
  50. ZUBILLAGA, Joxe Mari Aizega. La utilización extrafiscal de los tributos y los principios de justicia tributaria. Bilbao: Servicio Editorial de la Universidad del País Vasco, 2001, 48.
  51. Cf. COSTA, Regina Helena. Apontamentos sobre a tributação ambiental no Brasil. In: TÔRRES, Heleno Taveira. Direito Tributário Ambiental. ob.cit., p. 313.
  52. SELICATO, Pietro. Capacita Contributiva e Tassazione Ambientale. In: TÔRRES, Heleno Taveira. Direito Tributário Ambiental. ob.cit., p. 258.
  53. "Art. 17-B. Fica instituída a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental - TCFA, cujo fato gerador é o exercício regular do poder de polícia conferido ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - Ibama para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais.
  54. Art. 17-C. É sujeito passivo da TCFA todo aquele que exerça as atividades constantes do Anexo VIII desta Lei."

  55. "CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IBAMA: TAXA DE FISCALIZAÇÃO. Lei 6.938/81, com a redação da Lei 10.165/2000, artigos 17-B, 17-C, 17-D, 17-G. C.F., art. 145, II. I. - Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental - TCFA - do IBAMA: Lei 6.938, com a redação da Lei 10.165/2000: constitucionalidade. II. - R.E. conhecido, em parte, e não provido". (STF – Pleno. RE 416.601, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, DJ 30/09/2005).
  56. TORRES, Ricardo Lobo. Valores e Princípios no Direito Tributário Ambiental. In: TÔRRES, Heleno Taveira. Direito Tributário Ambiental. ob.cit., p. 30.
  57. "Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de: (...)
  58. II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos:

    a)1% (um por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;

    b)2% (dois por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;

    c)3% (três por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave."

  59. GRANDAL, Ana Maria Pita. Sistema Tributário y Médio Ambiente. In: Estúdios em Memória de Ramón Valdés Costa. Tomo I. Montevidéo: FCU, 1999, p. 593.
  60. "Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes. (...)
  61. § 4º É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: (...)

    II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;"

  62. STF – Pleno, RE 153.771. Rel. Min. MOREIRA ALVES, DJU 05.09.1997.
  63. TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 7ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, p. 199.
  64. NABAIS, José Casalta. O dever fundamental de pagar impostos. Coimbra: Almedina, 2004, p. 651.
  65. DOMINGUES, José Marcos. Direito Tributário e Meio Ambiente. ob.cit., p. 21.
  66. MACHADO, Hugo de Brito. Os Princípios Jurídicos da tributação na Constituição de 1988. 4ª ed. São Paulo: Dialética, pp. 17/56; LACOMBE, Américo Lourenço Masset. Princípios Constitucionais Tributários. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, pp. 45/75; FEDELE, Andrea. La reserva de ley. In: AMATUCCI, Andrea (org.). Tratado de Derecho Tributario, tomo I. Bogotá: Temis, 2001, pp. 158/203; ABBAMONTE, Giuseppe, Principi di Diritto Finanziario. 1ª ed., 8ª reimp. Nápoles: Liguori, 2000, pp. 117/119; MITA, Enrico de. La legalità tributaria. Contributo alla semplificazione legislativa. Milão: Giuffrè, 1993, p. 14; AYALA, Jose Luiz Perez de. e GONZALEZ, Eusébio. Curso de Derecho Tributário, I. Madrid: EDERSA, 1975, pp. 180/185; CASÁS, José Osvaldo. Derechos y Garantias Constitucionales del Contribuyente. A partir del principio de reserva de ley tributaria. Buenos Aires: AD-HOC, pp. 232 e ss.; COSTA, Ramón Valdés. Instituciones de Derecho Tributário. 2ª ed. Buenos Aires: LexisNexis Depalma, 2004, p. 121/161.
  67. STF – Pleno, RE 172.394. Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 15/09/1995.
  68. STF – 1ª T., RE 100.919. Rel. Min. Néri da Silveira, DJ 04/03/1988.
  69. "O princípio da legalidade, outrossim, é a forma de preservação da segurança, tem-se que o ser instituído em lei garante maior grau de segurança nas relações jurídicas. O princípio da legalidade, todavia, não quer dizer apenas que a relação de tributação é jurídica. Quer dizer que essa relação, no que tem de essencial, há de ser regulada em lei. Não em qualquer norma jurídica, mas em lei, no seu sentido específico." (MACHADO, Hugo de Brito. Os Princípios Jurídicos da tributação na Constituição de 1988. ob.cit., pp. 17/18. (itálico nosso)
  70. XAVIER, Alberto. Tipicidade da tributação, simulação e norma antielisiva. São Paulo: Dialética, 2001, p. 17.
  71. ARAGÃO, Alexandre Santos de. A concepção pós-positivista do princípio da legalidade. In: RDA vol. 236, Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 56.
  72. TORRES, Ricardo Lobo. A legalidade tributária e os seus subprincípios constitucionais. In: RFDT nº 03, Belo Horizonte: Editora Fórum, maio/junho 2003, p. 74.
  73. Cf. SUSTEIN, Cass R. e VERMEULE, Adrian. Interpretation and Institutions. Public Law and Legal Theory Working Paper nº 28, University of Chicago Law School, 2002, disponível em http://www.law.chicago.edu/academics/publiclaw/index.html.
  74. STF – Pleno, RE 343.446/SC. Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 04/04/2003; cf. TORRES, Ricardo Lobo. Legalidad tributaria y armonía entre los poderes del Estado. In: Estudios de Derecho Tributário constitucional e internacional. Homenage a Victor Uckmar. Buenos Aires: Abáco, pp. 254/260.
  75. STF – Pleno, RE 343.446/SC. Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 04/04/2003; cf. TORRES, Ricardo Lobo. Legalidad tributaria y armonía entre los poderes del Estado. In: Estudios de Derecho Tributário constitucional e internacional. Homenage a Victor Uckmar. Buenos Aires: Abáco, pp. 254/260.
  76. WAGNER, Adolfo. La Scienza delle Finanze. Torino: UTET, 1891, pp. 882/947; LEROY-BEAULIEU, Trattato di Scienza delle Finanze. Torino: UTET, 1906, pp. 223/305; RICCA SALERMO, Giuseppe. Scienza delle Finanze. Firenze: G. Barbèra, 1890, pp. 40/83; GERLOFF, Wilhelm. Die Steuerm. In: GERLOFF, Wilhelm e NEUMARK, Fritz (orgs). Handbuch der FinanzWissenschaft. 2ª ed. Tübingen: J. C. B. Mohr, pp. 281/285; SHIRRAS, G. Findlay. The Scienze of Public Finance. Londres: Macmillam & Co., 1924, pp. 121/149.
  77. GIANNINI, Achille Donato. Il rapporto giuridico d’imposta. Milão: Giuffrè, 1937, pp. 4/5.
  78. BERLIRI, Antonio. Principi di Diritto Tributaio, vol. I. 1ª ed. Milão: Giuffrè, 1952, pp. 255/256, nota 2.
  79. MOSCHETTI, Francesco. La Capacita Contributiva, Profili Generali. In: La Capacità Contributiva, org. Francesco Moschetti. Padova: CEDAM, 1998, pp. 3/4.
  80. ABBAMONTE, Giuseppe, Principi di Diritto Finanziario. ob.cit., pp. 71/86 e 213/216; FALSITA, Gaspare. Corso Istituzionale di Diritto Tributário. Padova: CEDAM, 2003, pp. 56/73.
  81. GIARDINA, Emilio. Le basi teoriche del principio della capacità contributiva. Milão: Giuffrè, 1961, p. 118; BERLIRI, Antonio. L’obbligo di contribuire in proporzione della capacità contributiva come limite alla potestà tributaria. In: Scritti Scelti di Diritto Tributario. Milão: Giuffrè, 1990, pp. 491/535, este último Autor, neste estudo, modificou entendimento anterior que não reconhecia relevância ao princípio; DE MITA, Enrico. Il principio di capacità contributiva. In: Interesse Fiscale e Tutela del Contribuinte. Milão: Giuffrè, 2000, pp. 79/104.
  82. Cf. os estudos de GRIZIOTTI que caracterizam a capacidade contributiva como causa da tributação que se reflete pela percepção de serviços públicos: "Intorno al concetto di causa nel diritto finanziario" e "Il principio della capacità contributiva e sue applicazioni", ambos In: Saggi sul rinnivamento dello studio della scienza delle finanze e del diritto finanziario. Milão: Giuffrè, 1953, pp. 295/317 e 347/369.
  83. MOSCHETTI, Francesco. El principio de capacitad contributiva. Madrid: IEF, 1980; VANONI, Ezio. Natura e interpretazione delle legge tributaria. In: Opere Giuridiche, vol. I. Milão: Giuffrè, 1961, p. 69.
  84. D’AMATI, Nicola. Diritto Tributario. Teoria e Pratica. Torino: UTET, 1985, pp. 78/85.
  85. TESAURO, Francesco. Istituzioni di Diritto Tributario, vol. I. 8ª ed. Torino: UTET, pp. 64/79; AMATUCCI, Andrea. L’ordinamento giuridicco della finanza pubblica. 7ª ed. Nápoles: Jovene, 204, pp. 62/68; POTITO, Enrico. L’ordinamento tributario italiano. Milão: Giuffrè, 1978, pp. 18/23.
  86. Cf. TABOADA, Carlo Palao. Apogeo y crisis del principio de capacidad contributiva. In: Estúdios Jurídicos em Homenaje al professor Federico de Castro, vol. II. Madrid: Tecnos, 1976, pp. 377/426; SAINZ DE BUJANDA, Fernando. Temas Generales de Derecho Tributario, In: Hacienda y Derecho, vol. III, cap. III. Madrid: IEP, 1963, pp. 181/289; OLLERO, Gabriel Casado. El principio de capacidad y el control constitucional de la imposición indirecta (II). In: REDF, nº 34. Madrid: Civitas, 1982, pp. 185/235; AYALA, Jose Luiz Perez de. e GONZALEZ, Eusébio. Curso de Derecho Tributario, I. ob.cit., pp. 185/193; MOLINA, Pedro Manuel Herrera. Capacidad Económica y Sistema Fiscal. Análisis Del ordenamiento español a la luz Del Derecho alemán". Madrid: Marcial Pons, 1998; BEREIJO, Álvaro Rodríguez. Jurisprudencia Constitucional y Princípios de la Imposición. In: Garantias Constitucionales del Contribuyente. 2ª ed. Valencia: Tirant lo Blanch, pp. 127/180.
  87. TIPKE, Klaus/LANG, Joachin. Steuerrecht. 18ª ed. Colônia: Otto Schmidt, 2005, pp. 77/83.
  88. Cf. TORRES, Ricardo Lobo. Valores e Princípios Constitucionais Tributários. In: Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário, vol. II. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, pp. 288/329; mesmo A., Direitos Humanos e Tributação. In: Derechos Humanos y Tributación, Anais da XX Jornadas do ILADT. Brasil: ABDF, pp. 26/31; ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. São Paulo: Saraiva, 2004, pp. 317/375; MACHADO, Hugo de Brito. Os Princípios Jurídicos da tributação na Constituição de 1988. ob.cit., pp. 57/85. LACOMBE, Américo Lourenço Masset. Princípios Constitucionais Tributários. ob.cit., pp. 27/44.
  89. STF – Pleno, RE 199.281/SP, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 12/03/1999.
  90. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988. Sistema Tributário. 9ª ed., Rio de Janeiro: Forense, p. 57.
  91. LOBO TORRES, em sentido contrário, defende que o princípio da capacidade contributiva "tem escassa importância na tributação ambiental", mesmo porque "entraria em conflito com o princípio do poluidor-pagador, que independe da situação econômica do contribuinte"; cf. TORRES, Ricardo Lobo. Valores e Princípios no Direito Tributário Ambiental. ob.cit., p. 29.
  92. DOMINGUES, José Marcos. Direito Tributário e Meio Ambiente. ob.cit., p. 22.
  93. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. ed. São Paulo: Saraiva, pp. 159/160.
  94. TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Tributário. ob.cit., pp. 66/67.
  95. TORRES, Ricardo Lobo. Valores e Princípios no Direito Tributário Ambiental. ob.cit., p. 27.
  96. Idem, p. 27.
  97. AMATUCCI, Andrea. L’ordinamento giuridicco della finanza pubblica. ob.cit., p. 413.
  98. MAÍLO, Maria Ángeles Guervós. Tasas Ambientales. In: GARCIA-QUINTANA, César Albiñana et all (org). Estudios en homenaje al professor PÉREZ DE AYALA. Madrid: Dykison, 2007, p. 627.


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAMPOS, Carlos Alexandre de Azevedo. Tributação e tutela do meio ambiente. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2410, 5 fev. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14288. Acesso em: 19 abr. 2024.