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Busca e apreensão de objeto de leasing: contestação

Busca e apreensão de objeto de leasing: contestação

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Contestação em ação de busca e apreensão de objeto dado em garantia em contrato de leasing. A ré, além de abordar a incompetência do juízo, requer a possibilidade de purgação da mora, contestando ainda a cobrança de juros abusivos e a cumulação de correção monetária com comissão de permanência.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL E ANEXOS DA COMARCA DE ESTADO DO PARANÁ.

brasileira, separada judicialmente, comerciante, inscrita no CPF/MF sob n.º ...., residente e domiciliada nesta cidade e Capital, por seus advogados abaixo assinados, com escritório profissional na Avenida Mal. Floriano Peixoto, n.º 612, Centro, nesta Capital, onde recebem intimações e notificações, vem respeitosamente ante Vossa Excelência, nos Autos supra, de BUSCA E APREENSÃO, que lhe move o Banco ABN AMRO REAL S/A., instituição financeira de Direito Privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n.º 33.066.408/0001-15, com sede na cidade de São Paulo, e filial em Curitiba, Estado do Paraná, sito á Rua Pasteur, n.º 463, 1.º andar, sala 101, Bairro Batel, tempestivamente apresentar CONTESTAÇÃO aos termos narrados na inicial de fls., pelas razões de fato e de direito adiante aduzidos:


I - DA PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA

Preliminarmente, indispensável argüir a questão da INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA, deste Douto Juízo para julgar e processar a presente ação, uma vez que o objeto da busca e apreensão remanesce ante a garantia fiduciária havida em decorrência do Contrato de Financiamento que fora firmado em Curitiba, donde elegeu-se como foro competente, a Comarca de Curitiba, sendo ainda que o domicílio da Requerida é identicamente Curitiba. Assim restou expresso no Contrato de Financiamento, o qual segue às fls. 11 verso:

"...

Fica eleito o Foro de sua celebração como competente para dirimir qualquer questão deste Contrato, sendo facultado ao BANCO optar pelo Foro de suas agências ou de domicílio do(s) CLIENTE(S).

..."

Ou seja, previu-se contratualmente que o foro competente é Curitiba, sendo facultativa a escolha de outro foro pelo Requerente.

Entretanto, em que pese a pretensão exarada pela Requerente ao inserir no respectivo contrato a disposição acima, tem-se que a mesma diante da sistemática jurídica vigente é NULA DE PLENO DIREITO, uma vez que a relação de direito material existente entre os ora litigantes, se configura de forma extreme de dúvidas numa relação de consumo, e como tal encontra-se sujeita às normas do Código de Defesa do Consumidor, cuja sistemática protege a propositura da presente ação no Domicílio da Requerente, conforme restará demonstrado no presente item.

Para tanto, fundamental declinar na presente peça, no que tange à natureza de relação de consumo que reveste o contrato entre as partes do presente litígio, esta resta evidenciada pela inconteste situação de hiposuficiência da Requerida em face da Requerente, a qual no contrato em questão, de forma extreme de dúvidas exerce a condição de fornecedora, eis que indiscutivelmente nos encontramos diante de um contrato de financiamento com garantia fiduciária, o qual pacificamente é reconhecido em nossa Jurisprudência e Doutrina como contrato protegido pela legislação de consumo.

Portanto, a respeito deste tipo de contrato, há que se ter em mente que a sistemática do Código de Defesa do Consumidor, é a de proteger o consumidor, evidentemente parte mais frágil no momento da contratação, contra as abusividades, dando assim interpretação extensiva e classificação mais ampla e abrangente aos chamados contratos de adesão, não restando dúvidas acerca da aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor ao caso em questão.

Neste sentido, resta evidente que a hiposuficiência contratual do consumidor, respalda-se não na inexistência de opção para contratar, mas no fato de que os produtos lhes são oferecidos mediante a existência prévia de cláusulas e condições, as quais se não aceitas, não há contratação, e a rara existência de alteração de alguns itens do contrato não tem o condão de retirar a natureza adesiva dos contratos de financiamentos firmados junto a Instituições Financeiras, como a Requerente.

Se seguíssemos os argumentos pretendidos pela pequena corrente doutrinária que pretende retirar a caráter de adesão dos contratos realizados pelas instituições bancárias, teríamos que abolir quase tudo o que nos trouxe o CDC, uma vez que, sempre que o consumidor tiver opção de contratar e lhe for apresentada previamente as condições do serviço e do contrato de forma escrita, não teremos relação de consumo porque não há contrato de adesão. Ora, assim, ao optar por um supermercado e ter as condições de compra apresentadas em cartazes espalhados pela loja, não terá o consumidor direito de utilizar-se das regras do CDC, porque teve opção de escolha e a forma de venda fora lhe apresentada de forma escrita ?

Apenas ‘ad argumentadum’, ressalta-se que a aplicação do CDC, ao presente caso, decorre não só da sistemática e da política jurisdicional e social que levou à criação do caderno normativo em questão, mas dos próprios termos da Constituição Federal, a qual embora não trate de forma progmática e positivada a nova visão que se há de ter em relação aos contratos em geral, e em especial aos de consumo, protege o consumidor ante os princípios dela decorrentes.

Assim sendo, inconteste se mostra a aplicação das normas do Código de Defesa de Consumidor ao presente caso, que no artigo Artigo 6º, VIII:

"São direitos básicos do consumidor:

...

VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

..."

Artigo 51, inciso XIII:

"São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

...

XIII – autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração;

..."

E, artigo 51, §1º, I e III do mesmo diploma legal:

"Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:

I – ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertencer;

II – omissis;

III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso."

Portanto, muito embora consignado no Contrato de Adesão firmado entre as partes, a faculdade imputada ao Requerente quanto à eleição de foro, esta prerrogativa é nula de pleno direito, quer por conter abusividade, quer por conter exagero em detrimento do Requerido, quer principalmente por ferir preceitos básicos inerentes ao Código do Consumidor, por dificultar a defesa dos interesses do Requerido, na qualidade de consumidor.

E, tratando-se de matéria de ordem pública, dada esta condição e qualidade ao Código de Defesa do Consumidor, requer desde já o afastamento desta imperatividade assinalada em prol do Requerente, razão porquê deve prosperar as regras estabelecidas no Código de Processo Civil, quanto à eleição do foro em detrimento da competência absoluta em razão da matéria.

Acerca da mencionada norma, os nossos tribunais assim se manifestaram:

Competência. Foro de eleição. Consórcio. Contrato de adesão. Prevalecimento do Código de Defesa do Consumidor para que o devedor tenha acesso aos órgãos judiciários e facilitação de sua defesa. Art. 6.º, incs. VII e VIII, da Lei 8.078/90 – Hipótese que não se trata de declinação de ofício de incompetência relativa, mas sim de reconhecimentos de normas de ordem pública a exigir a remessa dos autos à Comarca do domicílio do consumidor." (Rel. Juiz Nelson Ferreira, Al 561.526-1, 1.º TACSP, 2.ª Cam., Lex 145/46-48)(grifo nosso)

O entendimento acima transcrito, fora posteriormente corroborado pelo enunciado 14 do STJ, o qual consagrou a regra do artigo 101, como em se tratando de competência absoluta. Vejamos:

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, em data de 13.05.98, definiu que a competência, em se tratando de contratos de adesão, sob a disciplina do Código de Defesa do Consumidor, é de natureza absoluta, pelo que deve o juiz, consequentemente, alegar, de ofício, a sua incompetência." (Resp. 156.561/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4.ª T.).(grifo nosso)

É abusiva a cláusula de eleição de foro (inclída em contrato de adesão sobre " leasing") que dificulta a defesa da arrendante aderente" (STJ-4.ª Turma, REsp 242,732-MG, rel. Min. Ruy Rosado, j. 21,3,00, deram provimento, v.u., DJU 22.5.00, p. 116)

Em assim sendo, e considerando que questões relativas a COMPETÊNCIA EM RELAÇÃO A MATÉRIA são tidas como ABSOLUTAS, dispõe o artigo 113 do Código de Processo Civil:

"Art. 113. A incompetência absoluta deve ser declarada de ofício e pode ser alegada, em qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente de exceção.

...

§ 2.º Declarada a incompetência absoluta, somente os atos decisórios serão nulos, remetendo-se os autos ao juiz competente."

Às colações legais acima postas, tem-se que da utilização de qualquer um dos preceitos legais, o foro competente é Curitiba, senão vejamos:

- Requerida tem domicílio em Curitiba (art. 94, ‘caput’);

- A agência bancária, a qual contratou com a Requerida situa-se em Curitiba (art. 100, IV, ‘b’);

- Por fim, a exigência quanto ao cumprimento da obrigação, a ser imputada a requerida, é em Curitiba (art. 100, IV, ‘d’).

Desta forma, qualquer que seja a invocação legal à imputação do foro competente, este recai à comarca de Curitiba. Até mesmo porque:

- Nenhum ato fora praticado em Pinhais;

- O Protesto deu-se em Curitiba;

- Requerente tão somente escolheu o foro de Pinhais por ter credibilidade junto a este Cartório Cível, a cujos atos praticados neste processo mostram-se excessivamente ‘rápidos’, não condizentes com a morosidade remanescente junto aos outros processos nesta escrivania, bem assim, a dificuldade porquanto ao acesso a esta Comarca.

Continuamente, a ‘escolha’ desta Comarca de Pinhais foi realizada com o ânimo exclusivo de má-fé, objetivando a dificuldade quanto ao acesso ao Judiciário em detrimento da Requerida, vez que nenhum preceito legal converge à competência deste foro.

E, inobstante a argüição quanto à competência relativa pugnada pela Requerida em peça apartada conforme exigência disposta em nosso Código de Processo Civil, a doutrina e jurisprudência têm entendido ser de ordem pública a prerrogativa de foro inserta no artigo 94 do estatuto processual, qual seja, do ‘domicílio do devedor’. Desta maneira, em sendo vislumbrada relação de consumo, ante a característica de norma cogente atribuída ao Código de Defesa do Consumidor, têm-se entendido que a incompetência deste foro é ABSOLUTA e não, relativa.

A fim de corroborar e justificar o entendimento invocado, cumpre transcrever ‘in verbis’ decisão proferida pelo Tribunal de Alçada, em Agravo de Instrumento nº 184157-6, de Curitiba, cujo processo de origem tramita perante a 5ª Vara Cível:

"...

Vistos,

1 .UNIBANCO LEASING S/A ARRENDAMENTO MERCANTIL, agrava, por instrumento, de decisão proferida pela MM. Juíza de Direito Substituta da 5ª Vara Cível de Curitiba, nos autos de Rescisão Contratual sob nº 1051/01, em que o juízo monocrático, reconheceu, de ofício, que a cláusula de eleição de foro inserida no contrato é abusiva, determinando, via de consequência, a remessa dos autos para a Comarca de Paranaguá – PR, domicílio do consumidor.

Alega, em síntese, a impossibilidade de se declarar de ofício a incompetência do juízo, por se tratar de incompetência relativa e não absoluta; que as partes pactuaram livremente o contrato, devendo ser observado o Princípio da Pacta Sunt Servanda; que não se aplica o Código de Defesa do Consumidor e que a decisão do magistrado contraria determinações da Súmula 33 do Superior Tribunal de Justiça e da Súmula 335 do Supremo Tribunal Federal.

Por tais razões, requer seja reformada a decisão agravada para declarar o juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Curitiba, como competente para processar e julgar a ação de Rescisão Contratual.

2. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e, de plano, passo à análise do mérito, em conformidade com o disposto no artigo 557, do Código de Processo Civil, cuja disposição assim permite ao relator.

Em que pese a argumentação expendida pela parte agravante, o agravo de instrumento interposto não está a comportar seguimento, tendo em vista que a decisão agravada encontra-se em conformidade com a legislação de regência, conforme jurisprudência dominante do Tribunal de Alçada do Paraná e do Superior Tribunal de Justiça.

Com efeito.

Consta do processado, que as partes firmaram um Contrato de Arrendamento Mercantil, em cujas disposições finais, cláusula 22, foi estipulado que ‘para conhecer e dirimir as questões oriundas deste Contrato, fica eleito o foro da sede do UNIBANCO ou do domicílio do ARRENDATÁRIO, a critério do autor da demanda judicial’, f. 25-TA. Pela parte ora agravante, foi proposta ação de Rescisão Contratual perante a 5ª Vara Cível de Curitiba, na qual foi determinada, de ofício, a remessa dos autos para comarca do local do domicílio do consumidor.

A matéria enfocada tem sido objeto de apreciação pela doutrina e jurisprudência, com muita constância, prevalecendo o entendimento manifestado pelo Juízo de primeiro grau, no sentido de que, em se tratando de contratos de adesão, como é o caso, a desconsideração de cláusula de eleição de foro figura-se necessária, desde que possa acarretar sacrifício desproporcional para a parte aderente, dificultando ou até mesmo impossibilitando sua defesa, a inviabilizar ou obstacularizar o acesso ao Poder Judiciário, incidindo, na espécie, as disposições do Código de Defesa do Consumidor (artigos 6º e 51) e o que preceitua o art. 115 do Código Civil.

A propósito do tema, como anota Theotônio Negrão, o Superior Tribunal de Justiça tem considerado ineficaz a cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão:

"quando constitui um obstáculo à parte aderente, dificultando-lhe o comparecimento em juízo" (STJ – 3ª Turma, Resp, 41.540-3-RS, rel. Min. Costa Leite, j. 12.4.94 não conheceram, v.u., DJU 9.5.94, p. 10.870; neste sentido: Resp 26.788, citado em RSTJ 45/533 à p. 538, e STJ – 4ª/Turma, Resp 29.602-3-RS, rel. Min. Barros Monteiro, j. 14.12.92, negaram provimento, v.u., DJU 8.3.93, p. 3.124);

"se é ‘abusiva, resultando especial dificuldade para a outra parte’ (STJ – 3ª Turma, Resp 40.988-8-RJ, rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 15.3.94, negaram provimento, v.u., DJU 9.5.94, p. 10.870);

"se o outro contratante ‘presumivelmente não pôde discutir cláusula microscopicamente impressa de eleição de foro’ (STJ – 4ª Turma, Resp. 34.186-7-RS, rel. Min. Athos Carneiro, j. 29.6.93, negaram provimento, v.u., DJU 2.8.93, p. 14.257).

No mesmo sentido, referindo-se a possibilidade de ocorrência de prejuízo para o réu, se prevalecesse o foro de eleição:

"se há prejuízo para o réu, o foro de eleição não prevalece sobre o do seu domicílio" (RSTJ 27/52)

Daí porque, em se tratando de ação fundada em direito pessoal, aplicável à espécie a regra do art. 94 do Código de Processo Civil, e não o disposto no art. 100, IV, letras ‘b’ e ‘d’, do mesmo estatuto processual.

Assim, considerando que as disposições do CDC são de ordem pública, tem-se que uma vez detectadas cláusulas ilegais ou abusivas nos contratos de adesão, em detrimento do consumidor, a nulidade deve ser reconhecida, inclusive, de ofício, porque se trata de nulidade de pleno direito, incidindo aqui o disposto no art. 6º e seus incisos, e art. 51 e seus incisos, do código protecionista.

Portanto, a cláusula de eleição de foro não pode receber tratamento diferenciado, pois sendo abusiva vem contaminada de nulidade de pleno direito, e assim deve ser considerada pelo juiz, independente de iniciativa da parte ou interessado, por envolver matéria de conhecimento oficioso.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte de Alçada, tem se manifestado, em ambos os casos pela possibilidade de declaração de nulidade da cláusula abusiva, conforme decisões a seguir:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORO DE ELEIÇÃO EM CONTRATO DE ADESÃO. POSSIBILIDADE DE RECONHECER A NULIDADE DE OFÍCIO E TER-SE COMO ABSOLUTA A COMPETÊNCIA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES MAIS ATUAIS DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DECISÃO MONOCRÁTICA CONFIRMADA. RECURSO IMPROVIDO". (Ac. nº 9.438, 8ªC.Cív., Rel. Juiz Sérgio Arenhart, j. 13.09.99)

CONFLITO DE COMPETÊNCIA – COMPETÊNCIA TERRITORIAL – FORO DE ELEIÇÃO. O juiz do foro escolhido em contrato de adesão pode declarar de ofício a nulidade da cláusula e declinar da sua competência para o juízo do foro do Domicílio do réu. Prevalência da norma de ordem pública que define o consumidor como hipossuficiente e garante sua defesa em juízo.

Conflito conhecido e declarada a competência do suscitante.

(CC 21540/MS – 1999800036547 – 2ª Seção – Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar – DJ: 24/08/1998)

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CLÁUSULA ELETIVA DE FORO LANÇADA EM CONTRATO DE ADESÃO. NULIDADE COM BASE NA DIFICULDADE DE ACESSO AO JUDICIÁRIO COM PREJUÍZO À AMPLA DEFESA DO RÉU. CARÁTER DE ORDEM PÚBLICA DA NORMA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INAPLICABILIDADE DO ENUNCIADO Nº 33 DA SÚMULA/STJ.

Tratando-se de contrato de adesão, a declaração de nulidade da cláusula eletiva, ao fundamento de que estaria ela a dificultar o acesso do réu ao Judiciário, com prejuízo para a sua ampla defesa, torna absoluta a competência do foro do Domicílio do réu, afastando a incidência do enunciado nº 33 da Súmula/STJ (CC 19105/MS – 19970028275 – 2ª Seção – Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira – DJ 15/03/1999)

De sorte que, no caso em análise, em se tratando de contrato de adesão, a desconsideração de cláusula de eleição de foro afigura-se necessária, uma vez que pode acarretar sacrifício desproporcional para a parte aderente, dificultando ou até mesmo impossibilitando sua defesa, de modo a inviabilizar ou obstacularizar o acesso ao Poder Judiciário, uma vez que tem domicílio na Comarca de Paranaguá-PR.

Este tem sido o entendimento dos juízes da Quarta Câmara Cível deste Tribunal, da qual participo.

Por tais razões, entendo que não houve violação ao disposto no artigo 111 do Código de Processo Civil, tampouco da Súmula 33 do STJ ou 335 do STF, motivo pelo qual, mantenho a decisão monocrática.

Diante do exposto, tratando-se de recurso manifestamente em confronto com a lei e com a jurisprudência dominante do Tribunal de Alçada do Paraná e do Superior Tribunal de Justiça, na forma preconizada no caput do art. 557 do Código de Processo Civil, nego seguimento ao presente agravo de instrumento, por manifestamente improcedente.

..." (grifei)

Ainda:

PROCESSO CIVIL – DIREITO DO CONSUMIDOR – COMPETÊNCIA ABSOLUTA – FORO – DECLINAÇÃO DE OFÍCIO – POSSIBILIDADE – VOTO VENCIDO – Tratando-se de contrato de financiamento de automóvel garantido por alienação fiduciária, sobre o qual incidem as disposições do Código de Defesa do Consumidor, norma protetiva de ordem pública, a competência é absoluta e pode ser declinada de ofício pelo Julgador de primeiro grau. Recurso improvido. Voto vencido: A incompetência relativa somente pode ser argüida por meio de exceção promovida pelo réu. (Juiz Nilson Reis). (TAMG – Al 0302240-8 – 2ª C.Cív. – Rel. Juiz Manuel Saramago – J. 21.03.2000)

(grifei)

Em análise às letras de lei ora apresentadas, bem ainda, ao farto repertório jurisprudencial acima trazido, correlatamente ao Contrato de Financiamento firmado, depreende-se as seguintes normatividades insertas no Código de Processo Civil, nos artigos em referência à Competência em razão do Foro:

A primeira infere-se a que, tem-se como ‘regra geral’ o disposto no artigo 94 ‘caput’ do Código de Processo Civil;

A Segunda infere-se a que, inexiste qualquer previsão acerca da competência do foro de Pinhais;

A terceira infere-se a que, em consonância ao entendimento unânime do Superior Tribunal de Justiça e Tribunais Superiores, em tratando-se de relação de consumo, há que prevalecer a regra contida no artigo 94 do Código de Processo Civil, sendo a competência do foro do domicilio da Requerida ABSOLUTA, portanto, improrrogável.

No tocante à Competência, Moacyr Amaral Santos, em sua obra Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, 1º vol., Ed. Saraiva, 12ª edição, às págs. 251 e seguintes, discorre:

"205. DISTINÇÃO ENTRE COMPETÊNCIA ABSOLUTA E COMPETÊNCIA RELATIVA

Os limites da jurisdição nem sempre são intransponíveis. Pode, em certos casos, um juiz, incompetente segundo as normas ordinárias da competência para conhecer de uma causa, Ter sua jurisdição ampliada, prorrogada, tornando-se competente para conhecê-la. Normalmente, não teria ele competência; não teria competência segundo os critérios ordinários, determinadores da competência, mas, por força de um fato superveniente, adquire competência, que não tinha.

O exame da lei esclarece o assunto.

A ) o Código de Processo Civil, pela falta de clareza a respeito, exige uma perfeita distinção entre competência relativa e competência absoluta. Basta considerar que, conforme o seja, a incompetência relativa e a absoluta têm meios próprios e momento oportuno para a sua arguição, bem como consequências diversas.

Da primeira fala o art. 112 do mesmo Código: ‘Argúi-se, por meio de exceção, a incompetência relativa’. Esta pode ser suscitada ‘em qualquer tempo’, mas no prazo de quinze dias, contado do fato que ocasionou a incompetência (...). Não oposta no caso e no prazo legal, a competência do juiz, apesar de relativamente incompetente, permanece intacta, prorroga-se: ‘Prorroga-se a competência, se o réu não opuser exceção declinatória do foro e do juízo no caso e prazo legais’. (...).

Da incompetência absoluta trata o art. 113 do referido Código: ‘A incompetência absoluta deve ser declarada de ofício e pode ser alegada em qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente de exceção’. E acrescenta o §1º do mesmo artigo: ‘Não sendo, porém, deduzida no prazo da contestação (...), ou na primeira oportunidade que lhe couber falar nos autos, a parte responderá integralmente pelas custas’. Por outro lado, e isso é fundamental na distinção que fazemos, a sentença de mérito proferida por juiz absolutamente incompetente é nula, podendo ser rescindida por via de ação rescisória: ‘A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: (...) II – proferida por juiz absolutamente incompetente’(...).

Do exposto resulta: a incompetência relativa prorroga-se, tornando competente o juiz incompetente, se não arguida no caso e prazo legais, por meio de exceção de incompetência; a incompetência absoluta é vício insanável, incorrigível, que torna nula a sentença de mérito, suscetível de rescisão, mesmo depois de transitada em julgado, por meio de ação rescisória.

..."

Portanto:

Considerando o domicílio da Requerida ser em Curitiba;

Considerando que as obrigações são exigíveis e cumpridas em Curitiba;

Considerando que o foro de eleição contratual é Curitiba;

Considerando que o Contrato de Financiamento, o qual reveste-se tipicamente qualificado como ‘de adesão’, fora firmado em Curitiba;

Considerando que o veículo encontrava-se, quando na posse da Requerida, em Curitiba;

Por fim, considerando que inexiste razão plausível para processamento e julgamento do pedido perante a Comarca de Pinhais, há que ser declinada a INCOMPETÊNCIA para conhecer, processar e julgar o pedido formulado pelo Requerente, em sede de Busca e Apreensão de Veículo, sendo ao revés, competente, o foro da Comarca de Curitiba.

Neste sentido, tem-se que o presente feito importa na incompetência deste r. Juízo da Comarca de Pinhais, devendo, via de conseqüência, o processo ser remetido por este Juízo, imediatamente à respectiva Comarca de Curitiba, Estado do Paraná, cujo ato por certo imporá a NULIDADE DA DECISÃO DE FLS. 19.


II - DAS ALEGAÇÕES DA REQUERENTE:

Oportuno ainda, conforme transcrito acima, apresentar os termos da contestação tendo em vista ser este o momento ofertado para sua defesa. Assim sendo necessário se faz aduzir que a Requerente no afã de audaciosamente pretender induzir o andamento da presente demanda no sentido de que teria a Requerida culposamente incidido em mora, apresentou sua inicial, mediante fundamentações vagas e imprecisas, argumentando:

1."Que em face do Financiamento com Garantia de Alienação Fiduciária firmado entre as partes em data de 06/12/2000, fora concedido à Requerida um crédito no valor de R$ 5.050,00, o qual, acrescido dos encargos contratuais representou o montante de R$ 8.407,08, para pagamento em 36 parcelas mensais fixas, no valor de R$ 233,53 cada uma, tendo ocorrido o vencimento da primeira no dia 06/01/2001;

2.Que respectiva dívida fora devidamente garantida mediante alienação fiduciária através do veículo com as características de um FIAT UNO ELETRONIC, Ano 1994, Chassi 9BD146000R5220110, Cor Cinza, Placa BQO 1040, cuja posse direta do referido bem fora deixada em favor da Requerida, que expressamente assumiu a posição de depositário fiel do mesmo;

3.Que a Requerida honrou com o pagamento de apenas 07 (sete) prestações das 36 (trinta e seis) pactuadas, fato que diante das condições contratuais, ensejou ao Autor o direito de ajuizar a competente AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO, com fulcro no Dec. Lei 911/69, objetivando retomar a posse do veículo alienado fiduciariamente;

4.Que o pedido acima fora deferido por Vossa Excelência às fls 19. tendo sido a liminar executada em data de 06/12/2001.

Em que pese as alegações acima contidas na inicial e demais documentos trazidos ao feito pela Requerente, ter objetivado em seu contexto, demonstrar a Vossa Excelência, em resumo, a suposta situação da total legalidade das condições constantes no Instrumento de fls. 11, necessário entretanto, indicar no presente feito, que outra é a realidade fática envolvendo o negócio entabulado entre as partes, cujos atos arbitrários e extremamente onerosos impostos pela Requerente, implicou na impossibilidade momentânea da Requerida em cumprir pontualmente com as obrigações constantes do Instrumento firmado em suas datas respectivas, decorrendo desta situação a conclusão inequívoca no sentido de que a mora ‘in casu’ é da credora, ora Requerente, que onerou excessivamente as prestações obrigacionais, impossibilitando assim o adimplemento das mesmas pela Requerida.


III – DA REALIDADE FÁTICA E DE DIREITO:

MM. Juiz, a afirmativa declinada no parágrafo anterior, decorre das conclusões extraídas do próprio documento de fls. 11 – Contrato de Financiamento, que contém em seu bojo cláusulas e condições extremamente leoninas, bem ainda a estipulação e cobrança de juros em patamares superiores ao previsto em nossa Constituição Federal, Lei das Leis, que prevê expressamente no § 3.º do artigo 192 a proibição da cobrança de juros e encargos superiores ao limite de 12% a.a.

Desta situação, denota-se que o contrato ora reportado previu em seu contexto a cobrança de juros no patamar de 39,56% a.a., ou 2,8166415% a.m., fato que, no transcorrer da vigência do aludido financiamento, impôs a Requerida a vexatória posição de devedora, e diante de tais arbitrariedades, ao consultar especialistas acerca do tema, alarmou-se ao analisar as condições inaugurais do respectivo financiamento, defrontando-se com a seguinte situação:

- Cobrança de juros acima do limite legal;

- capitalização mensal de juros;

- correção monetária cumulada com comissão de permanência;

De posse de tais informações, a Requerida procurou o representante da Requerente, objetivando compor a dívida apresentada, tentativas estas que restaram infrutíferas, obtendo apenas respostas dúbias e evasivas da parte adversa, que em nada surtiu efeito, acarretando a mesma, ante a demora de apresentação de solução, apenas e tão somente, uma verdadeira penalidade, visto que, em razão do atraso aos pagamentos das prestações ante o aguardado de resposta, veio a ser tido pela Requerente como inadimplente.

Neste sentido, e afim de demonstrar a veracidade das informações declinadas, propõe a ora Requerida o pagamento no presente feito das prestações vencidas nos meses de agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro/2001, rogando vênia a Vossa Excelência, para em relação ao caso em tela, remeter os Autos ao Contador para que este diligencie o montante a ser depositado pela Requerida.

Que admissibilidade do pedido ora formulado, em que pese a Requerida não ter ainda pago 40% do preço financiado conforme determinado pelo artigo 3.º do Decreto 911/69, repousa na nova orientação seguida pelos Excelsos Ministros integrantes de nosso Superior Tribunal de Justiça, o qual analisando situação idêntica a ora trazida, assim decidiu:

"ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA – EMENDA DA MORA – DEVEDOR FIDUCIANTE QUE NÃO CHEGOU A SOLVER 40% DO PREÇO FINANCIADO – ADMISSIBILIDADE EM FACE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.

A exigência imposta pelo § 1.º do art. 3.º do Decreto-lei n.º 911/69 (pagamento no mínimo de 40% do preço financiado) está afastada pelas disposições contidas no Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90).

Recurso especial conhecido e provido.

(STJ-4.ª Turma, REsp 157688/RJ, rel. Min. Barros Monteiro, rel. p/ ac. Min. César Asfor Rocha, j. 19/05/98, deram provimento, DJU. 29/03/99, p. 181)

Que a decisão supra gerou na ocasião divergência entre os r. Ministros integrantes da respectiva 4.ª Turma, eis que o voto exarado pelo Relator Ministro Barros Monteiro, restou vencido pelos argumentos tecidos pelo Ministro César Asfor Rocha, acordando então citada câmara com as razões expostas no voto do Ministro anteriormente mencionado, o qual, em sua motivação, argumentou que:

"O EXMO. SR. MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA: - Sr. Presidente, data venia, discordo de V. Exa., porque acho que este art. 53 do Código de Defesa do Consumidor pode ser interpretado ampliativamente; em última análise, o que ele quer é preservar o consumidor de cláusulas abusivas que importem na perda do bem ou de alguma coisa que foi por ele paga, sobretudo como na hipótese em que se não lhe permite a quitação da dívida, com a purgação da mora, pelo fato de ter efetuado menos de 40% do valor financiado.

Quero crer que o espírito que esse art. 53 do CDC encerra está afastada a aplicação do contido no § 1.º do artigo 3.º do Decreto-lei 911, que cuida da alienação fiduciária.

Por essas considerações, data venia ouso discordar de V. Exa. Para conhecer do recurso e dar-lhe provimento."

...

VOTO VENCEDOR

...2. Inicialmente devo destacar que o Código de Defesa do Consumidor alberga normas de caráter nitidamente protecionista ao consumidor, em razão de sua presumida hipossuficiência econômica.

Assim, o inciso IV, do seu art. 6.º, estabelece que são direitos do consumidor a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos.

Por sua vez, pontifica o seu art. 53, no que interessa:

"Art. 53 -..., nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado."

Já o § 1.º, do art. 3.º do Decreto-lei n.º 911/69, só admite a purgação da mora, nas alienações fiduciárias, se o devedor já tiver pago o percentual mínimo de 40% do preço financiado.

A questão consiste em saber se esse obstáculo de purgação da mora veiculado nesse preceito ainda subsiste em razão daquela nova regra.

A norma contida no referido art. 53 deve ser interpretada ampliativamente, sempre tendo-se em conta que sua finalidade está em preservar o consumidor de regras abusivas que importem não só na perda das prestações como do próprio bem, desde que o devedor restabeleça a regularidade dos pagamentos a que se comprometera, para adquiri-lo.

Destarte, como salientado pelo recorrente, o Código de Defesa do Consumidor, ao afastar a perda da automática das prestações pagas, em razão do inadimplemento do devedor, propicia também a proibição de interpretar dispositivo de lei anteriormente vigente que possa afrontá-lo, em face de um direito individual criado pelo legislador e que objetiva impedir um dano patrimonial, como é o direito à purgação da mora nos contratos de alienação fiduciária.

Sendo assim, o obstáculo imposto pelo Decreto-lei 911/69 para purgação da mora, não mais subsiste ante a norma contida no art. 53 do Código de Defesa do Consumidor, por isso que afasta a aplicação daquela."

Ainda, no mesmo Acórdão, o Min. Ruy Rosado de Aguiar ao acolher os argumentos dispensados pelo Min. César Asfor Rocha alegou que "... a regra do Decreto-lei n.º 911,... significa uma restrição grave ao exercício do direito de purgar a mora. Tal impedimento não está mais em consonância com o sistema introduzido pela Lei n.º 8.078, tanto que está disposto no art. 6.º, inciso IV, quanto ao art. 51, inciso II".

Igualmente o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira: "Entendo que a lei da alienação fiduciária foi editada em período de características sociais bem diversas de quando foi editada a lei do consumidor, e que o animus que levou à edição de uma não se identifica com o propósito que motivou a outra"

E finalmente, a manifestação do Min. Bueno de Souza que assim argumentou:

"...em outras palavras, como se lê em boa doutrina, pagar não é somente uma obrigação; é também direito do devedor, como meio de se libertar do vínculo obrigacional. Ora, a lei dispõe que a emenda da mora (meio de liberação do devedor, ainda que apenas parcial) é somente assegurada ao devedor que já tenha quitado 40% do débito total configura severa restrição do direito do devedor, correlato ao da credora.... "

Expostos os argumentos acima, há que ser acatado por Vossa Excelência o pedido ora postulado, referente ao pagamento das parcelas vencidas, até mesmo porque, conforme já declinado anteriormente, a Requerida em data pretérita procurou a Requerente para, amigavelmente, adequar o Contrato de Financiamento anexado às fls. 11 às regras e normas contidas em nosso Ordenamento Jurídico, sendo que entretanto, tal proposição, ante a adoção do procedimento de Busca e Apreensão, seguiu recusada pela Requerente.

Neste sentido, em tendo a Requerente inserido no instrumento ora reportado cláusulas e condições contrárias ao melhor entendimento e disposições constantes em nosso Ordenamento Jurídico, deve a mesma ser responsabilizada pelos efeitos da mora, e não o ora Requerido, que tão logo seja autorizado por Vossa Excelência a proceder o depósito das prestações vencidas assim o realizará, inclusive porque negado do mesmo respectivo direito na esfera extrajudicial.

Ademais, há que se destacar ainda que o Superior Tribunal de Justiça, a mesma 4.ª Turma indicada em linhas anteriores protegendo o consumidor em casos semelhantes ao ora discutido no presente feito, no Acórdão proferido no Resp. n.º 150.099/MG, já decidiu pela inexistência de mora do devedor quando há por parte do credor a exigência de quantias abusivas, razão porque ilustramos a presente peça, com trechos dos texto declinados pelo Ministro Ruy Rosado de Aguiar, o qual para chegar a essas conclusões juntamente com os Ministros que integrantes daquela 4.ª Turma do STJ, dentre tantos conceitos, destacaram a situação de que "... mora somente existe quando o atraso resultar de fato imputável ao devedor (art. 963 do Código Civil). Se a exigência do credor é abusiva, e portanto ilegítima, o devedor que não paga o que lhe está sendo indevidamente cobrado não incide em mora, pois pode reter o pagamento enquanto não lhe for dada quitação regular."...

Convém destacar que a decisão ora reportada fora proferida em procedimento de REINTEGRAÇÃO DE POSSE, cujo teor, entretanto, também fora seguido em julgados de Busca e Apreensão, a exemplo do REsp. 185812/MG, restando de importante em relação ao respectivo tema apenas demonstrar a Vossa Excelência que, o STJ, com o advento do Código de Defesa do Consumidor passou a traçar uma profunda modificação no ordenamento jurídico pátrio.

As normas contidas no Código de Defesa do Consumidor devem ser aplicadas em perfeita consonância com as leis processuais vigentes no país. Assim, se o Código de Defesa do Consumidor possibilita ao devedor a discussão e anulação de toda e qualquer cláusula contratual abusiva, deve o juiz conhecer dessas alegações e possibilitar a discussão das cláusulas conforme determina o CDC, invertendo o ônus da prova quando cabível e dilatando a produção das provas requeridas no curso do processo. Agir diferente é massacrar o consumidor, parte hipossuficiente na relação de consumo.

Ora, se o credor pode dispor da busca e apreensão e/ou depósito para reaver o bem objeto alienação fiduciária no menor espaço de tempo, o devedor poderá, contestando a ação, alegar tudo quanto achar conveniente, inclusive atacar as cláusulas leoninas e as condições contratuais expostas.

Cabe ao juiz manter o equilíbrio da relação processual, e esse equilíbrio só poderá ser mantido se o julgador estiver aberto a interpretações progressistas, que viabilizem a aplicação do sentido espiritual da norma para que seja concedida a Justiça.

A Justiça não é a lei. A Justiça é o direito provado, devidamente conjugado com fatos, até mesmo porquê, como se poderia analisar a questão da posse sem antes analisar as cláusulas e condições contratuais que permitiram ao consumidor o direito de possuir?

Em assim sendo, pelas considerações tecidas acima, por certo que no caso em tela INEXISTE A CONFIGURAÇÃO DA MORA, vez que a consumidora ora Requerida, prevendo questões que implicariam na prejudicialidade da continuidade do pagamento das prestação assumidas, dada as abusividades ocorrida no caso em tela, requereu extrajudicialmente a adequação da cobrança de tais valores, o que no entanto, sequer foi objeto de resposta e atenção por parte da Requerente, que maliciosamente intentou o presente procedimento.

Neste sentido, observa-se do contrato firmado e juntado ao feito às fls. 10, que os juros foram pactuados na ordem de 2,8166415%a.m., equivalentes a 39,56%a.a..

Oportuno, outrossim, indicar ao caso em tela, que a Lei n° 1.521/51, que trata ‘dos crimes contra a economia popular, a ordem econômica e as relações de consumo’, traz em seu artigo 4º, a seguinte disposição:

" Usura pecuniária ou real:

a) cobrar juros, comissões ou descontos percentuais, sobre dívidas em dinheiro, superiores à taxa permitida por lei;

b) obter ou estipular, em qualquer contrato, abusando da premente necessidade, inexperiência ou leviandade da outra parte, lucro patrimonial que exceda o quinto do valor corrente ou justo da prestação feita ou prometida ".

A Lei n° 7.492, de 16 de junho de 1986, em seu artigo 8º, estabelece que constitui crime contra o Sistema Financeiro Nacional, in verbis:

"Art. 8º Exigir, em desacordo com a legislação, juro, comissão ou qualquer tipo de remuneração sobre operação de crédito ou de seguro, administração de fundo mútuo ou fiscal ou de consórcio, serviço de corretagem ou distribuição de títulos ou valores mobiliários".

É farta e bastante clara a legislação vigente, coibindo a prática mercantil que resulte em lucro fácil, extorsivo, como no caso da presente ação, em que o lucro da financeira não pode exceder a um quinto do valor financiado, ou seja, 20% (vinte por cento) do valor do financiamento e não mais que isso.

Que com a estabilização monetária a partir de 1º de julho de 1994, a ocorrência de lucros aviltantes causa indignação diante dos esforços de fortalecimento da moeda e deve ser prontamente inibida pelo órgão jurisdicional, sendo enfatizado pelo entendimento da Jurisprudência que vem se firmando no sentido de coibir tais abusos e restabelecer a equidade econômico-financeira nas avenças levadas à consideração das Altas Cortes.

Por amor ao princípio da eventualidade, a título de argumentação, de qualquer modo, a taxa de juros deverá ser estabelecida no patamar de 12% (doze por cento) ao ano, com amparo em recentes decisões do Egrégio Tribunal de Alçada do Estado do Rio Grande do Sul, Terceiro Grupo Cível e das Egrégias 4ª e 9ª Câmaras Cíveis, cujas ementas transcrevemos:

"EMBARGOS INFRINGENTES. JUROS.

A posição do Grupo, por maioria, é no sentido da auto aplicabilidade da norma do art. 192, § 3°, da CF/88, com incidência imediata da limitação dos mesmos em 12% a.a.." (Embargos Infringentes n° 194.229.555, do Terceiro Grupo Cível, julgado em 26 de maio de 1995).

"JUROS BANCÁRIOS LIMITADOS AOS DO CONTRATO, NUNCA SUPERIORES A 12% AO ANO. Não obstante o julgamento da ADIN 417/600 do STF, por isso afastada a auto aplicabilidade do § 3° do art. 192 da CF, os juros bancários permanecem limitados aos do contrato, nunca, porém, superiores a 12% ao ano, mais a correção monetária, haja vista a legislação infraconstitucional, art. 1°, do DL 22.626/33, combinado com o art. 1.062 do CCB, que não foi revogado pela Lei 4.595/64" (Apelação cível nº 195058631, 9ª Câmara Cível do TARGS, julgada em 13 de julho de 1995).

INDEPENDENTEMENTE DA APLICAÇÃO OU NÃO DO ART. 192, PARÁGRAFO 3°, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

A legislação infraconstitucional é bastante, por si mesma, para limitar os juros em 12% ao ano, na inteligência do art. 1.062 do Código Civil c/c artigo 1° do Decreto n° 22.626/33, que os excepcionaram, limitando ao dobro dos juros legais de 6% ao ano, em plena vigência. Apelação não provida, sentença mantida integralmente." (Apelação Cível n° 195057179, da 4ª Câmara Cível, julgada em 29 de junho de 1995).

Não pairam dúvidas de que a competência para legislar sobre matéria financeira é do Congresso Nacional, estabelecida pelo artigo 48 da Constituição Federal. Por isso mesmo, são írritas e eficazes as disposições constantes do Decreto 22.626/33 (Arts. 1° e 4°) e do Código Civil (Arts. 1.062 e 1.063), que limitam as taxas de juros ao máximo de 6% (seis por cento) ao ano e vedam a capitalização dos juros, exceto quando o disser expressamente.

Igualmente, caberá a Vossa Excelência porquanto da instrução do presente procedimento, deferir a realização de prova pericial no caso em tela, afim de que o Requerido possa demonstrar a Vossa Excelência a ocorrência de capitalização de juros sobre juros no mesmo contrato indicado às fls. 11, cuja prática é repudiada pela Jurisprudência desde há muito tempo. Porém, acostumada a impor vontades e agir com supremacia nos períodos mais terríveis da famigerada espiral inflacionária, nos moldes a que tem se espelhado a Requerente, em seus cálculos, fez incidir a capitalização de encargos, isto é, calculou juros sobre juros, o que implica em ilícito contratual, que recebeu o devido tratamento pelo Superior Tribunal de Justiça, consoante decisão de suas Colendas 3ª e 4ª Turmas, como a seguir transcrito:

"DIREITO PRIVADO - Juros - Anatocismo - Vedação incidente também sobre instituições financeiras. Exegese do Enunciado nº 121, em face do nº 596, ambos da Súmula STF. Precedentes da Excelsa Corte. A capitalização de juros de juros é vedada pelo nosso direito, mesmo quando expressamente convencionada, não tendo sido revogada a regra do art. 4° do decreto 22.626/33 pela Lei n° 4.595/64. O anatocismo, repudiado pelo verbete n° 121, da Súmula do Supremo Tribunal Federal, não guarda relação com o Enunciado nº 596 da mesma súmula." (STJ – 4ª T. REsp 1.285 – GO, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo; J. 14.11.89; DJU 11.12.89, pág. 18.141).

"DIREITO PRIVADO - Juros - Anatocismo - A contagem de juros sobre juros é proibida no Direito Brasileiro, salvo exceção dos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano. Inaplicabilidade da lei da Reforma Bancária (nº 4.595, de 31.12.64). Atualização da Súmula 121 do STF. Recurso provido." ( STJ – 3ª T. REsp 2.293 – AL, Rel. Min. Cláudio Santos; J. 17.04.90; DJU 17.09.91), pág. 383, Seção 1).


IV - DA EQÜIDADE CONTRATUAL

MM. Juiz, os fatos apontados na ordem acima, demonstram ‘per si’ que não houve por parte da Requerente a conduta esperada pelo Ordenamento Jurídico Positivo quando da realização do um contrato, emanado de vontade bilateral das partes.

Doutrinariamente, o contrato de financiamento é considerado de "adesão", vez que traz cláusulas estanques e uniformizadas, previamente formuladas pela arrendante e impostas unilateralmente, segundo comenta Arnaldo Rizzardo, ob. cit., pág. 66 que diz que:

"Diante da prepotência de um dos contratantes, algumas regras de interpretação devem ser obedecidas, embora inexistam, no Direito brasileiro, disposições legais especificamente ordenadas à disciplina dos vínculos jurídicos oriundos da adesão a imposições preestabelecidas por uma das partes. O Código Civil nada previu sobre a matéria. Apenas o Código de Defesa do Consumidor trouxe alguma disciplina, em campo restrito. Mas temos normas sobre o contrato em geral".

Pela importância dos esclarecimentos trazidos pelo Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e Professor da Escola Superior da Magistratura, autor de várias obras e que ousou esmiuçar a complexa espécie do arrendamento mercantil, permitimo-nos transcrever os ensinamentos constantes da obra citada, pág. 67 e seguintes:

"Reza o art. 85 do CC: "Nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção que ao sentido literal da linguagem".

"Na exposição de Othon Sidou, encontramos a seguinte lição: "No conjunto de normas, convém concluir que o sentido literal das palavras contratuais pode: ser contrário à vontade real; trair a lealdade e confiança de um ou de ambos os contratantes, tendo em conta representar o contrato, subjetivamente, uma luta de vontades; enganar a boa-fé, consoante o que, embora seja defeso ao juiz revisionar a convenção das partes, é-lhe facultado, em contraposição, o poder de interpretar a vontade dos contratantes, segundo preleciona Martinho Garcez..." (A vontade real nos contratos de adesão, apud Revista Jurídica 49/12).

"Na interpretação, tem-se em mente sempre a intenção de ambas as partes, mas sem abandonar a inspiração na eqüidade e na utilidade social, de modo a não se tolerarem os excessos contratuais".

"Tem-se em alta consideração a interpretação contra o estipulante e em favor do aderente, norma vigente em várias legislações. Máxime no caso de cláusula obscura e ambígua.

A interpretação, nas regras ditadas pelo hermeneuta Carlos Maximiliano, é a seguinte:

"a) contra aquele em benefício do qual foi feita a estipulação;

"b) a favor de quem a mesma obriga, e, portanto, em prol do devedor e do promitente;

"c) contra o que redigiu o ato ou cláusula, ou melhor, contra o causador da obscuridade ou omissão".

"É oportuna a lembrança da seguinte passagem de Carlos Maximiliano: "Todas as presunções militam a favor do que recebeu, para assinar, um documento já feito. As vezes, pouco entende do assunto e comumente age com a máxima boa-fé: lê às pressas, desatento, confiante.

É justo, portanto, que o elaborador do instrumento ou título sofra as conseqüências das próprias ambigüidades e imprecisões da linguagem, talvez propositadas, que levaram o outro a aceitar o pacto por tê-lo entendido em sentido inverso do que convinha ao coobrigado.

Casos freqüentes desta espécie de litígio verificam-se a propósito de apólices de seguros e notas promissórias. Palavras de uma proposta interpretam-se contra o proponente; de uma aceitação, contra o aceitante."

"Assim, pois, as dúvidas resultantes da obscuridade e imprecisões em apólices de seguros interpretam-se contra o segurador. Presume-se que ele conheça melhor o assunto e haja tido inúmeras oportunidades práticas de verificar o mal resultante de uma redação, talvez propositadamente feita em termos equívocos, a fim de atrair a clientela, a princípio, e diminuir, depois, as responsabilidades da empresa na ocasião de pagar o sinistro".

Bem assim ocorreu quanto às cláusulas padronizadas. A eqüidade financeira dos contratos se faz necessária e urgente, até porque a Requerida precisa prosseguir dando continuidade às suas atividades comerciais, livre desse incômodo, que está a acarretar prejuízo incalculável à sua saúde financeira.

Em todos os sistemas jurídicos o pressuposto fundamental é o principio de ser nulo o contrato quando um dos contratantes, "abusando das condições gerais dos negócios", agindo contra a boa-fé e a moral, vem a prejudicar, excessivamente, o outro.

A teoria moderna do direito traz uma nova visão do contrato e das suas conseqüências na utilidade social, pois embora permaneça o princípio da liberdade contratual, um dos princípios fundamentais do direito civil, nas sociedades com economias não dirigidas e orientadas para uma economia de mercado, afirma-se cada vez mais a convicção de que a ordem jurídica precisa definir as premissas desta liberdade, fixar os parâmetros de seus limites e delinear seus resultados.

Por tratar-se de contrato de adesão, o que é fartamente reconhecido pela doutrina e jurisprudência pátrias, é inadmissível que prevaleçam os objetivos violadores dos princípios que norteiam o ordenamento jurídico, como a eqüidade, a comutatividade, o justo e a boa fé, impondo-se a interpretação contra a estipulante e em favor do aderente, no caso, o Requerido.

Atualmente tem-se como fato público e notório que "...as empresas que contratam com os bancos não o fazem numa situação de igualdade, mas em verdadeiros contratos de adesão, em nítida inferioridade. É preciso recompor o equilíbrio" (RT 639/253) No mesmo sentido: (RJTJRGS 138/134).


V - DA DEFESA DO CONSUMIDOR

Na condição de destinatário final do financiamento, pois evidente que os recursos financeiros foram destinados a aquisição de bens, a Requerida, encontra na Lei n.º 8.078/90 que dá a proteção do direito que busca, pois sendo um Contrato de Crédito Direito - Contrato de Financiamento direto ao Consumidor, sujeita-se ao CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, diante dos termos do artigo 3, § 2º, da Lei que o instituiu.

Nelson Nery Junior, em sua obra "Código de Processo Civil", Ed. RT, 1997, pág. 1374, comentando o artigo 46 do CDC, ensina que:

"Todas as operações e contratos bancários se encontram sob o regime jurídico do CDC. Não só os serviços bancários, expressamente previstos no § 2º do artigo 3º do CDC, mas qualquer outra atividade, dado que o banco é sociedade anônima, reconhecida a sua atividade como de comércio, por expressa determinação do Código Comercial, artigo 119. Assim, as atividades bancárias são de comércio. Por ser comerciante, o Banco é sempre fornecedor de produtos e serviços."

O Código de Defesa do Consumidor busca disciplinar situações como estas, tendo acolhido os princípios doutrinários antes referidos, não deixa dúvidas quanto a possibilidade da revisão dos contratos e o restabelecimento do equilíbrio entre as partes.

Destaca-se do referido texto legal:

"Art. 6º. São direitos básicos do consumidor:...

V- A modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que os tornem excessivamente onerosos.

Art. 47 - As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor. "

O art. 51 do CDC é imperativo à questão:

"Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

...

IV - Estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou seja, incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;

§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:

I - Ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;

II - Restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou o equilíbrio contratual;

III - Se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e o conteúdo do contrato, interesses das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.

§ 4º É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o represente requerer ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para ser declarada a nulidade de cláusula contratual que contrarie o disposto neste Código ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes. "

De igual forma dispõe o artigo 52:

Art. 52. No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre:

...

II – montante de juros de mora e da taxa efetiva anual de juros;

...

Na lição de RUY ROSADO DE AGUIAR JÚNIOR, Ministro do Superior Tribunal de Justiça, em artigo publicado na Revista AJURIS, Nº 52, pág. 181, sob o título "Aspectos do Código de Defesa do Consumidor", encontramos o seguinte ensinamento:

"Para a fase da execução do contrato, está prevista a importantíssima regra sobre a possibilidade de modificação de cláusula, sempre que fato superveniente tornar a avença excessivamente onerosa, estabelecendo o desequilíbrio entre as partes e a quebra da equivalência entre prestação e contraprestação (art. 6°, inc. V).

Não está aí incluído o requisito da imprevisão, como insistentemente se tem exigido até hoje no Brasil, nem que o prejuízo atinja a ambas as partes, como consta no projeto do CC. Consagrou-se, isto sim, a teoria da base do negócio, que autoriza a notificação, uma vez alteradas as condições objetivamente postas ao tempo da celebração. Como a regra da equivalência é uma norma de sobredireito, ela se aplica para ambos os lados e funciona a favor de qualquer das partes".

Exaustivamente demonstra-se que, no caso em exame, o procedimento desigual e arbitrário da Requerente, com o fim de cobrar encargos extorsivos, fraudar a lei, promover a insolvência, etc., é totalmente contrário aos princípios edificadores dos bons costumes, da norma jurídica e aos relevantes interesses sociais.

Além da doutrina e da jurisprudência, invoca-se a lei para dizer que os instrumentos sub judice devem ser tipificados como contratos de adesão (art. 54, Lei n° 8.078/90), reclamando interpretação de maneira mais favorável ao Requerido, (art. 47 da lei citada), como legítimo consumidor de serviços de natureza bancária, financeira e de crédito (artigos 3°, § 2° e 29 da citada lei).


VI - DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ

Diante dos fatos supra narrados, tem-se que o ajuizamento do pedido ora posto à Vossa apreciação, perante este Juízo de Direito, atem-se ao fato de que:

- O contrato fora firmado em Curitiba;

- Requerido tem domicílio em Curitiba;

- Os pagamentos sempre foram efetuados em Curitiba;

- O veículo transitava em Curitiba;

- E, o foro de eleição foi Curitiba,

Não remanesce justificativa alguma ao ajuizamento do pedido nesta Comarca de Pinhais, senão o objetivo quanto a obstação da ‘res adversa’ ao Poder Judiciário, bem assim, a maior agilidade do processo nesta Comarca, em desrespeito à ordem dos processos distribuídos na Comarca de Curitiba, prejudicando sobremaneira a Requerida e a defesa dos seus direitos.

Percebe-se de tais atitudes, que o único objetivo do Requerente é ludibriar o Judiciário, mediante o desrespeito à ordem dos processos distribuídos no foro competente de Curitiba, e igualmente prejudicar a Requerida, a qual vê-se obstada quanto ao exercício de seu direito, bem assim, para fazê-lo valer (a fim de prorrogar a competência).

Não obstante a dificuldade porquanto da defesa dos direitos da Requerida, mister à declaração da INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA, face a inexistência razão plausível ao ajuizamento do pedido perante a Comarca de Pinhais, mister que o Requerente arque com os prejuízos do Requerido, não somente quanto ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, mas igualmente, que responda à litigância de má-fé, dada a razão de litigar imbuído com a má-fé.

Neste interim cumpre ainda atentar que o Requerente, que as buscas realizadas junto à internet e aos Cartórios dos Distribuidores Cíveis, por suas outras carteiras de ações, distribui seus processos no foro competente, qual seja, Curitiba, restando a exceção às causas patrocinadas pelos advogados subscritores da petição inicial, os quais intencionalmente, eis que cientes da violação às leis, ajuízam seus pedidos perante esta Comarca.

O artigo 17 do Código de Processo Civil preceitua:

"Reputa-se litigante de má-fé aquele que:

I – deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;

...

V – proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;

..."

Ainda, traz como efeito à litigância de má-fé o contido no teor do artigo 18 do Código de Processo Civil:

"O juiz, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a indenizar à parte contrária os prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e as despesas que efetuou.

...

§2º O valor da indenização será desde logo fixado pelo juiz, em quantia não superior a vinte por cento sobre o valor da causa, ou liquidado por arbitramento."

O pedido ora formulado a Vossa Excelência, revela-se cabível à espécie, senão vejamos.

Ao inciso primeiro, por demandar a pedido de BUSCA E APREENSÃO, em Juízo notoriamente INCOMPETENTE. Neste sentido, os comentários de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery, em Comentários ao Código de Processo Civil e Leis Extravagantes, Ed. RT, 1ª edição, às págs. 288:

"6. Pretensão contra texto de lei. Quanto ao autor, o problema se situa na causa de pedir e no pedido; quanto ao réu, normalmente na contestação. Os fundamentos de fato deverão ser deduzidos em consonância com os fatos incontrovertidos, pois, do contrário, haverá má-fé. Relativamente aos fundamentos jurídicos (litigar contra texto expresso de lei), a falha normalmente será do advogado, pois a parte não tem conhecimentos técnicos para saber se está ou não litigando contra texto expresso de lei. Mas mesmo assim, será responsável pela indenização à parte contrária, podendo voltar-se em regresso contra seu advogado...." (grifei)

Ao inciso quinto, procede de modo temerário, ao ‘escolher imprudentemente’, logo com culpa, Juízo incompetente, a processar e julgar o feito.

Neste sentido, Pontes de Miranda, em sua obra Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo I, 5ª edição, Ed. Forense, às págs. 376 e seguintes, ensina:

"13. Conduta temerária em qualquer incidente do processo – Temeridade, temeritas, é palavra usada na terminologia jurídica luso-brasileira para designar o que se pratica com imprudência, arrojo, ousadia, audaciosidade. Não é preciso para que o procedimento se considere ‘de modo temerário’ que nele haja dolo ou mesmo malícia (...). Pergunta-se se basta a má-fé. A resposta tem de ser afirmativa.

A má-fé prova-se por simples conjectura e presunções; não o dolo (...).

...

No art. 17, V, fala-se de proceder o litigante ‘de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo’. Com isso não se dilata o sentido de má-fé, pois a temeridade nele se contém.

A temeridade pode ser de ato físico ou simplesmente verbal, consistir em provocação ou revide demasiado imprudente, ou violento, ou arrojamento reprovável.

...Em todo o caso, o fato de optar pela forma mais danosa ao réu e menos útil in casu ao autor, em vez de seguir o caminho do menos danoso ao réu e mais eficaz para o autor, serve para reforçar o pressuposto da má-fé."

(grifei)

Excelência, tal descompasso e prática imbuída de ânimo de lesar a Requerida não pode ser aceita, eis que o Requerente invoca a tutela jurisdicional do Estado perante este Juízo, objetivando única e exclusivamente a obtenção de fim repudiado perante nosso ordenamento jurídico, mormente aquele inerente ao Consumidor, dificultando o acesso à Justiça.

Tal assertiva revela-se verdadeira à medida que a lei processual civil pátria prevê a condenação em litigância por má-fé a todo aquele que buscar judicialmente demanda consubstanciada em deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso’ e ‘proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo’, rogando por melhor direito, objetivando o prejuízo alheio.

E, a dedução judicial contra texto expresso de lei, previsto no mencionado inciso I do artigo 17, encontra-se representado em sua máxime, no óbice quanto ao acesso ao Judiciário, bem assim, no desrespeito à ordem dos processos do foro Competente e aos gastos necessários ao Requerido para fazer valer seus direitos, na forma preceituada em lei.

Desta forma, em restando comprovado o todo alegado pela Requerida, cujas provas já encontram-se acostadas nos autos, mister a condenação do Requerente em litigância por má-fé, nos termos aduzidos no presente petitório.


VI - DO PEDIDO:

Ex positis, confia o Requerido que V. Exa., após apreciada as questões ora trazidas na presente contestação, julgue IMPROCEDENTE A AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO ofertada pela Requerente, em todos os seus termos, determinando para tanto:

a) – A declaração da Incompetência deste Juízo, a fim de declará-la em proveito da Comarca de Curitiba, consubstanciada na INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA, consoante entendimento já pacificado dos Tribunais Superiores e igualmente, do Tribunal de Alçada do Estado do Paraná,

b) – A revogação do ato que concedeu em caráter liminar a busca e apreensão, ante sua nulidade diante da incompetência imposta, determinando pois, a devolução do bem à posse da Requerida, dada a incompetência deste Juízo, bem assim, a nulidade dos atos decisórios perante ele exarados;

c) – Em não sendo a tese da INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA, o depósito das prestações vencidas nos meses de agosto, setembro, novembro e dezembro de 2001, nos moldes previstos na presente petição, bem ainda as subseqüentes, com a imediata devolução da posse do bem objeto da apreensão ao Requerido;

d) - Determinar que a Requerente se abstenha de encaminhar o nome da Requerida para inscrição em organismos de proteção do crédito e ainda, se digne determinar ao SERASA que não se divulgue o nome da mesma nas listagens negativas;

e) - A total improcedência da presente ação para os seguintes efeitos, julgando:

e.1 - violadas as normas do Código de Defesa do Consumidor, citadas no bojo desta ação, bem como a enorme lesão contratual em que a Requerente submeteu a Requerida, fraudando a lei, inclusive, com a INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA conforme lhe faculta respectiva legislação do consumidor;

e.2 - ilegais as taxas de juros praticadas pela Requerente, determinando o ajuste dos contratos à taxa que não ultrapasse a taxa legal de 12% a.a. (doze por cento ao ano); o sistema de composição da prestação através da TABELA PRICE; bem ainda, em relação a COMISSÃO DE PERMANÊNCIA lastreada em juros de mercado;

e.3 - que, depositadas os valores pretendidos, considerar-se-ão quitados o contrato, liberando o domínio pleno sobre o bem dado em garantia;

e.4 – a condenação da Requerente ao pagamento em dobro dos valores efetivamente cobrados a maior, caso a prova pericial pleiteada venha a apontar valores inferiores ao exigido no contrato de fls. 11 e na presente ação, sem prejuízo ainda da determinação de Vossa Excelência de indenização por danos morais;

e.5 - a condenação da Requerente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados de acordo com padrões deste juízo, bem ainda pela litigância de ma fé.

e.6 – provar os fatos alegados na presente contestação por todos os meios de provas em direito admitidas, em especial, a produção de prova pericial, testemunhal e depoimento do representante da Requerente;

Isto posto, deve este Nobre Magistrado, ater aos fatos narrados na Contestação ora ofertada, a qual objetiva afastar e descaracterizar os termos constantes da Ação proposta pela Requerente para ao final, ver reconhecida por sentença, os termos da presente defesa, por ser esta a única e verdadeira expressão da JUSTIÇA !.

Nestes Termos, Pede Deferimento,

Curitiba, 28 de Dezembro de 2001.

Janaínna de Cássia Esteves

Estagiária em Direito



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ESTEVES, Janaínna de Cássia. Busca e apreensão de objeto de leasing: contestação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 56, 1 abr. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16482. Acesso em: 25 abr. 2024.