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ADIN contra a lei de quotas para negros no vestibular

intervenção de entidades afro-brasileiras como "amicus curiae"

ADIN contra a lei de quotas para negros no vestibular: intervenção de entidades afro-brasileiras como "amicus curiae"

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A Confederação Nacional de Estabelecimentos de Ensino (CONFENEN) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, pretendendo ver declarada a inconstitucionalidade das leis estaduais que estabelecem quotas para estudantes negros nos exames vestibulares do Rio de Janeiro. Oito entidades de defesa dos direitos dos cidadãos afro-brasileiros peticionaram no feito, pedindo sua admissão como "amicus curiae", a fim de expor suas razões em defesa das referidas leis.

          EXCELENTÍSSIMO SENHOR RELATOR MINISTRO CARLOS VELLOSO DO EGRÉGIO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

          Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.858-8.

           1) INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS AFRO-BRASILEIROS - IPEAFRO, sociedade civil sem fins lucrativos constituída sob o regime jurídico de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 31.607.377/0001-37, sediado na rua Benjamin Constant, nº 55, 1.101, Glória, Rio de Janeiro, RJ, neste ato presentado por: seu Fundador ABDIAS DO NASCIMENTO, brasileiro, casado, escritor e professor aposentado, portador da carteira de identidade nº XXX.xxx, expedida pelo IFP-RJ, e do CIC/MF nº xxx.xxx.xxx-xx; seu Presidente OSWALDO BARBOSA SILVA, brasileiro, casado, advogado, portador da carteira de identidade nº xx.xxx, expedida pela OAB-RJ e do CIC/MF nºxxx.xxx.xxx-xx; sua Diretor-Executiva ELIZABETH LARKIN NASCIMENTO, norte-americana, casada, escritora, portadora da carteira de identidade nº RNEWxxxxxxxx, expedida pelo SE/DPMAF/DPF e do CIC/MF nº xxx.xxx.xxx-xx; 

           2) SOCIEDADE AFROBRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO SÓCIO CULTURAL – AFROBRAS, sociedade civil sem fins lucrativos constituída sob o regime jurídico de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 02.473.832-0001-50, sediada na rua Rui Barbosa, nº 567, Bela Vista, São Paulo, SP, CEP: 01.326-010, neste ato presentada por sua Diretora Executiva RUTH LOPES COSTA, brasileira, socióloga, portadora da carteira de identidade nº xx.xxx.xxx-x, expedida pelo SSP-SP, e do CIC/MF nºxxx.xxx.xxx-xx; 

           3) GELEDÉS – INSTITUTO DA MULHER NEGRA, sociedade civil sem fins lucrativos constituída sob o regime jurídico de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 61.375.614/0001-42, sediado na rua Santa Isabel, nº 137, conjuntos 41/42, Vila Buarque, São Paulo, SP, CEP: 01.221-010, neste ato presentada por sua Vice-Presidenta APARECIDA SOLIMAR CARNEIRO, brasileira, solteira, secretária, portadora da carteira de identidade nº x.xxx.xxx, expedida pelo SSP/SP, e do CIC/MF nº xxx.xxx.xxx-xx; 

           4) CENTRO DE ESTUDOS DAS RELAÇÕES DE TRABALHO E DESIGUALDADES - CEERT, sociedade civil sem fins lucrativos constituída sob o regime jurídico de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 64.161.086/0001-17, sediado na rua Duarte de Azevedo, nº 737, São Paulo, SP, neste ato presentado por seu Presidente LUIS ANTONIO DA SILVA BENTO, brasileiro, casado, contador, portador da carteira de identidade nº x.xxx.xxx, expedida pelo SSP/SP, e do CIC/MF nº xxx.xxx.xxx-xx; 

           5) FALA PRETA! ORGANIZAÇÃO DE MULHERES NEGRAS, sociedade civil sem fins lucrativos, constituída sob o regime jurídico de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 01.847.932/0001-37, sediada na rua Vergueiro, nº 434, 3º andar, Aclimação, São Paulo, SP, CEP: 01.504-000, neste ato presentada por sua presidenta EDNA MARIA SANTOS ROLAND, brasileira, separada judicialmente, psicóloga, portadora da carteira de identidade nº xx.xxx.xx-x, e do CIC/MF nº xxx.xxx.xxx-xx; 

           6) CONGRESSO NACIONAL AFRO-BRASILEIRO - CNAB, sociedade civil sem fins lucrativos constituída sob o regime jurídico de direito privado, inscrito no CNPJ/MF sob o nº 00.898.019/0001-05, sediado na rua Mato Grosso, nº 539, sala 1.004, Barro Preto, Belo Horizonte, MG, CEP: 30.190-080, neste ato presentado por seu presidente EDUARDO FERREIRA DE OLIVEIRA, brasileiro, casado, professor/escritor/poeta, portador da carteira de identidade nº x.xxx.xxx-x, expedida pelo SSP/SP, e do CIC/MF nº xxx.xxx.xxx-xx; 

           7) CENTRO BRASILEIRO DE INFORMAÇÃO E DOCUMENTAÇÃO DO ARTISTA NEGRO - CIDAN, sociedade civil sem fins lucrativos constituída sob o regime jurídico de direito privado, inscrito no CNPJ/MF sob o nº 03.877.143/0001-74, sediado na Av. Epitácio Pessoa, nº 1.924, apto. 202, Lagoa, nesta cidade, neste ato presentada por seu presidente JAQUES EDGARD FRANCOIS DADESKY, economista, portador da carteira de identidade nº xxxxxxx-G, expedida pelo SE/DPMAF/DPF, e do CIC/MF nº xxx.xxx.xxx-xx; e 

           8) CRIOLA, sociedade civil sem fins lucrativos constituída sob o regime jurídico de direito privado, inscrito no CNPJ/MF sob o nº 73.514.044/0001-03, sediada na Avenida Presidente Vargas, nº 482, sobreloja 203, Centro, nesta cidade, neste ato presentada por suas coordenadoras e bastante procuradoras LÚCIA XAVIER DE CASTRO, brasileira, portadora da carteira de identidade nº xxxxxxxx-x, expedida pelo DETRAN-RJ, e do CIC/MF nº xxx.xxx.xxx-xx e JUREMA PINTO WERNECK, brasileira, médica, portadora da carteira de identidade nº xxxxxxx-x, expedida pelo CRM-RJ, e do CIC/MF nºxxx.xxx.xxx-xx, 

           nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade acima epigrafada, em que figuram, como Requerente, CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS ESTABELECIMENTOS DE ENSINO – CONFENEN, e Requeridos, GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO e ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, na condição de amicus curiae, por intermédio de seus advogados (cf. instrumento de mandato em anexo), que subscrevem a presente, que declaram, para fins do artigo 39, Inciso I, do CPC em vigor, manter escritório na rua Senador Dantas, nº 75, grupo 2.602, Centro, RJ, CEP: 20.031-201, nesta cidade, vêm a V. Ex.ª expor para depois requerer o seguinte:


  1. DO PEDIDO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA

          1. INICIALMENTE, os Peticionantes requerem a V. Exª seja deferido pedido de gratuidade de justiça, pois que se tratam de sociedades civis sem fins lucrativos, que perseguem o adensamento dos direitos humanos fundamentais em nosso país, os quais devem defender estatutariamente. O atendimento desse pedido viabilizará o acesso à Justiça constitucionalmente garantido, haja vista que os poucos recursos existentes se destinam à implementação de projetos sociais.

          2. O próprio Judiciário, por este e outros motivos, vem concedendo este benefício às pessoas jurídicas, conforme demonstra a ementa abaixo transcrita:

          "ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. INCIDENTE. AUTOS APARTADOS. INDEFERIMENTO JUDICIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PESSOA JURÍDICA. POSSIBILIDADE. – Assistência judiciária gratuita Decisão de indeferimento proferida em autos de processo cível em andamento. Interposição no qüinqüídio de recurso de apelação. Conhecimento do recurso como Agravo de Instrumento, ante o principio da fungibilidade, atendido o prazo legal deste recurso. Pessoa jurídica também pode ser beneficiaria de justiça gratuita. Recurso provido. (TARS – AC 185.044.401 – 3ª CCiv. – Rel. Juiz Ivo Gabriel Da Cunha – J. 04.09.1985)".

          3. Deferido o pleiteado direito, requerem a V. E.x.ª sejam confirmados seus advogados, os signatários.


II. DO PEDIDO DE ADMISSIBILIDADE DAS ENTIDADES REQUERENTES NOS AUTOS NA CONDIÇÃO DE AMICUS CURIAE.

          8. Mediante as lesões aos interesses difusos consubstanciados no interesse pacífico da integração dos diversos grupos étnicos que compõem a sociedade brasileira, as Entidades requerentes - a exemplo das hipóteses da Lei nº 7.347 de 24.07.85 (LCP), nos artigos 1º, incisos IV e art. 5º, caput e incisos I e II - preenchem os suportes fáticos constantes da Lei nº 9.868, de 10.11.1999 (LADI e ADC), artigo 7º, § 2º, para integrarem os autos na condição de amicus curiae, haja vista seus deveres estatutários de se oporem a quaisquer formas de atos que possam concorrer para o prejuízo dos cidadãos, por motivos de ordem social, econômica, racial, religiosa e sexual em todo o território nacional ou não, em especial, os Afro-brasileiros, onde se incluem os assim denominados pardos e negros.

          9. Rezam os estatutos das entidades arroladas na qualificação acima, todas há mais de 01 ano registradas no Registro Civil de Pessoas Jurídicas (cópia dos estatutos em anexo):

          IPEAFRO

          1o – O INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS AFRO-BRASILEIROS – IPEAFRO é uma sociedade civil com duração de tempo indeterminado, de finalidades educacionais e culturais, com o objetivo de promover as seguintes atividades.

          a) cooperar com a população de descendência africana na recuperação de sua história, e na manutenção e expansão de seus valores culturais de origem e do respeito à sua integridade e dignidade étnicas;

          b) (...);

          c) promover e contribuir para o conhecimento sistemático da realidade dinâmica e pluridimensional da comunidade afro-brasileira, bem como das suas relações históricas e implicações atuais com os africanos e suas culturas, tanto no Continente quanto na Diáspora africana, aplicando uma metodologia em consonância com os valores endógenos da própria comunidade afro-brasileira."

          GELEDÉS:

          "Art. 3º - São objetivos sociais do GELEDÉS:

          I – (...);

          II – A defesa dos direitos dos cidadãos negros, especialmente mulheres e jovens, e o incentivo a sua integração no mercado de trabalho e na sociedade civil organizada".

          III – (...).

          Parágrafo Único: Para efeito do que dispõe o inciso II, são cidadãos negros todos que se definem ou são designados por negros, pretos, pardos, ou mestiços de descendência africana".

          CEERT:

          "Art. 2º - Constituem finalidade do CENTRO DE ESTUDOS DAS RELAÇÕES DE TRABALHO E DESIGUALDADES "CEERT" contribuir para o desenvolvimento e aperfeiçoamento do processo educacional no país para o exercício da cidadania mediante a realização, patrocínio ou promoção de pesquisas, estudos, cursos, conferências, eventos, seminários, mesas – redondas e conclaves relativos a problemas e fenômenos que constituem objeto de conhecimento das relações do trabalho e desigualdades, suas distintas ramificações e especializações, inclusive concernentes ao desenvolvimento econômico e social, e aos métodos e técnicas de investigação e análise (...), e, especialmente, a defesa judicial da igualdade racial, incluindo a propositura de ações civis coletivas e/ou públicas destinadas à proteção dos direitos e interesses difusos e coletivos da população negra, e de qualquer outros segmentos vitimados por discriminação injusta".

          CNAB:

          "Art. 2º - Constituem princípios do CNAB promover a luta da comunidade negra contra a discriminação racial e miséria social, desenvolvendo todos os esforços na busca da paz, da integração das raças e do progresso, da democracia e da independência nacional".

          "Art. 7o – Defender e promover a educação e profissionalização da comunidade negra em geral, bem como de integrantes de outras raças, em especial, nas áreas de serviços, comércio, indústria, alfabetização, saúde básica e cultura entre os jovens e a 3a idade".

          FALA PRETA:

          "Art. 3º - São objetivos sociais da FALA PRETA! :

          I - (...).

          II – A defesa dos direitos humanos e da cidadania da população negra, especialmente das mulheres, crianças e jovens, inclusive das comunidades rurais remanescentes de quilombos, visando o acesso à educação e capacitação de recursos humanos e à qualidade de vida através de padrões sustentáveis de produção e consumo e serviços adequados à saúde, saneamento básico, habitação e transporte que resultem em um ambiente saudável".

          III – (...). 

          IV (...) – Contribuir para a formulação e implementação de políticas públicas, a partir de processos de participação social, que favoreçam a superação das desigualdades estruturais que excluem negros e mulheres"

          CIDAN:

          "Art. 7º - São objetivos do CIDAN:

          I. (...);

          II. (...);

          III. (...);

          IV. Promover a valorização da imagem do negro na mídia, em especial nos seriados e novelas da televisão e nas produções cinematográficas, bem como no seu uso nas propagandas comerciais ou institucionais, através da divulgação de estudos e relatórios técnicos, assim como através de assistência jurídica no campo trabalhista para os artistas negros"

          CRIOLA:

          " Art. 2o – A sociedade tem por objetivo:

          a) constituir-se num espaço de discussão, reflexão e ação, visando a eliminar todas as formas discriminatórias a que estão submetidas as mulheres, em especial as mulheres negras."

          10. Destarte, demonstra-se com isso, que estão os Requerentes legitimados em seus estatutos a requererem ingresso no presente feito, na qualidade de AMICUS CURIAE.

          11. Com efeito, é o parágrafo 2º, do artigo 7º, da Lei nº 9.868/99, que indica os requisitos para admissão do amicus curiae nos autos da ação ou representação de inconstitucionalidade, senão vejamos:

          "Art. 7o ...

          § 2o O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros órgãos ou entidade".

          12. Examinando-se os requisitos elencados na citada lei, teremos:

          a. quem pode ser admitido como Amicus Curiae? Para os efeitos desta lei, além dos legitimados tradicionais, indicados nas Constituições Federal e Estadual, poderão se manifestar outros órgãos ou entidades. A palavra "entidade" no caso, deverá ser compreendida na sua acepção mais ampla, especialmente, como no caso concreto, as sociedades civis sem fins lucrativos ora requerentes.

          b. representatividade: no caso, essa representatividade não há de ser medida pelo número de integrantes que a entidade congrega, tampouco por sua abrangência interestadual ou municipal, e sim pelo reconhecimento por parte das autoridades estatais, da sociedade civil ou das comunidades onde atuam. O mais importante é que o manifestante prove que possui interesse jurídico, para que reste justificada a sua participação no debate, o que se caracteriza pela pertinência temática a ser constatada através do exame de seu estatuto social. As entidades que pleiteiam o ingresso nestes autos são pública e notoriamente reconhecidas como sendo atuantes e influentes na comunidade negra brasileira, por sua dedicação no combate ao racismo, à discriminação racial, e pela implementação dos direitos humanos fundamentais dessa mesma comunidade;

          c. relevância da matéria: como relevância da matéria, na hipótese das Postulantes, entendemos deva esta consistir na relação entre a matéria discutida e a os objetivos sociais desenvolvidos pelas mesmas, por força de seus estatutos sociais.

          13. No caso da presente representação de inconstitucionalidade as entidades requerentes agem em defesa dos interesses difusos e coletivos da população Afro-brasileira, qual seja o de ver implementada e mantida a ação afirmativa que o governo do Estado do Rio de Janeiro instituiu na área da Educação, através de sistemas cotas (reserva de vagas) para preenchimento das vagas existentes na Universidade do Estado do Rio de Janeiro e do Norte Fluminense, fundado nas Leis Estaduais n° 3.524/2.000 e 3.708/2001 e nos Decretos Estaduais nº 30.766/2002, 29.090/2001 e 31.468/2002, e da Lei nº 4.061/2003, no Exame Vestibular para ano de 2003, objetivando a equalização das disparidades sócio-econômicas havida entre os diversos grupos étnicos que compõe a nacionalidade brasileira, em cumprimento às programações normativas determinadas pela atual Constituição Federal, posta em perigo pela medida liminar deferida nestes autos.

           14. A doutrina nacional respalda a pretensão das Requerentes, senão vejamos:

          15. Gustavo Binenbojm, diz que essa iniciativa da Lei nº 9.868/99, (...) se insere no contexto de abertura da interpretação constitucional no país, permitindo que os indivíduos e grupos sociais participem ativamente das decisões do Supremo Tribunal Federal que afetem seus interesses. Além dos órgãos e entidades formalmente legitimados para a propositura da ação direta, poderão ser ouvidos quaisquer entes e organizações cuja representatividade autorize a sua manifestação". (SARMENTO, Daniel (org.). O controle da constitucionalidade e a Lei no 9.868/99: A democratização da jurisdição Constitucional e o Contributo da Lei no 9.868/99. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002, p. 159).

          16. E menciona que a exposição de motivos do Projeto de Lei se inspirou no modelo norte-americano, no "chamado Brandies-Brief – memorial utilizado pelo advogado Louis D. Brandeis, no case Müller Vs Oregan (1908) contendo duas páginas dedicadas às questões jurídicas e outras cento e dez voltadas para os efeitos da longa duração do trabalho sobre a situação da mulher – permitiu que se desmistificasse a concepção dominante, segundo a qual a questão constitucional configurava simples questão jurídica de aferição de legitimidade da lei em face da Constituição".

          17. No mesmo sentido, Gilmar Ferreira Mendes, cita que "afigura-se digno de realce o dispositivo ( § 2o do art. 6o) constante da Lei 9882 que permitir que o relator, segundo critérios seus, admita a manifestação de interessados no processo. Trata-se de figura assemelhada à contida na Lei 9868 (art. 7o, § 2o). Em ambos os casos, o que se pretendeu foi introduzir em nosso direito positivo a figura do "amicus curiae" no processo de controle de constitucionalidade. O instituto em questão, de longa tradição no direito americano, visa a um objetivo dos mais relevantes: viabilizar a participação no processo de interessados e afetados pelas decisões tomadas no âmbito do controle de constitucionalidade. Como há facilmente de se perceber, trata-se de medida concretizadora do princípio do pluralismo democrático que rege a ordem constitucional brasileira. Para além disso, o dispositivo em questão acaba por ensejar a possibilidade de o Tribunaldecidir as causas com pleno conhecimento de todas as suas implicações ou repercussões". (In: Controle de constitucionalidade: uma análise das leis 9868/99 e 9882/99. Salvador: Revista Diálogo Jurídico, no 11 – fevereiro de 2002. Acesso em: 08, mar. 2003. Disponível em: <www.direitopublico.com.br>.).

          18. Diz o mesmo autor, Ministro do nosso STF, que "Nesse novo quadro metodológico, assume relevo a proposta de Peter Häberle, que, de forma radical e dissolvente, acentua que a doutrina tradicional padece de um grande déficIt", referindo-se sobre o que a doutrina especializada denomina de "o debate hermenêutico e a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição". (In: Juridição Constitucional: O controle abstrato de normas no Brasil e na Alemanha. 3a. ed. São Paulo: Saraiva, p. 340).

          19. Nesse mesmo sentido, ampliando o debate, Gustavo Binenbojm (Op. cit., pp. 159-60), diz que:

          "Trata-se de inovação bem inspirada, que se insere no contexto de abertura da interpretação constitucional no país, permitindo que os indivíduos e grupos sociais participem ativamente das decisões do Supremo Tribunal federal que afetem seus interesses. Além dos órgãos e entidades formalmente legitimados para a propositura da ação direta, poderão ser ouvidos quaisquer outros entes e organizações cuja representatividade autorize a sua manifestação.

          A norma, se bem utilizada, poderá ensejar significativo efeito democratizante nos processos objetivos de controle da constitucionalidade. É o que, a par de permitir a apresentação formal de memoriais de conteúdo jurídico – o que por si só, já seria medida salutar – o dispositivo possibilita ao Supremo Tribunal Federal ter conhecimento das posições daqueles que vivenciam a realidade constitucional e sofrem a incidência da lei objeto do controle.

          Ao menos em termos ideais, o cidadão é elevado de sua condição de destinatário das normas jurídicas para atuar simultaneamente como intérprete da Constituição e considerada pelo Tribunal Constitucional.

          O artigo 9o da Lei no 9.868/99 institui outra saudável e auspiciosa inovação nos processos de fiscalização abstrata da constitucionalidade no Brasil. Costuma-se dizer – e esta tem sido mesmo a posição do Supremo Tribunal Federal – que a ação direta não comporta dilação probatória, à vista de seu caráter estritamente objetivo. Todavia, a Lei no 9.868/99, § 1o, a possibilidade de o relator "em caso de necessidade de esclarecimento de matéria ou circunstância de fato ou de notória insuficiência das informações existentes nos autos, requisitar informações adicionais, designar perito ou comissão de peritos para que emita parecer sobre a questão, ou fixar data, para, em audiência pública, ouvir depoimentos e pessoas com experiência e autoridade na matéria".

          20. Por fim, o Supremo Tribunal Federal sufragou a tese esposada nestes autos pelas Requerentes, na ADI. 2.130-SC, ao permitir o ingresso nos autos, na condição de amicus curiae, da Associação dos Magistrados Catarinenses – AMC, que invocou sua "condição de entidade representativa dos magistrados Catarinenses", abaixo transcrito:

          Amicus Curiae e ADI. (Transcrições). ADI. 2.130-SC (medida cautelar)* RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

          EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. INTERVENÇÃO PROCESSUAL DO AMICUS CURIAE. POSSIBILIDADE. LEI Nº 9.868/99 (ART. 7º, § 2º). SIGNIFICADO POLÍTICO-JURÍDICO DA ADMISSÃO DO AMICUS CURIAE NO SISTEMA DE CONTROLE NORMATIVO ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE. PEDIDO DE ADMISSÃO DEFERIDO.

          - No estatuto que rege o sistema de controle normativo abstrato de constitucionalidade, o ordenamento positivo brasileiro processualizou a figura do amicus curiae (Lei nº 9.868/99, art. 7º, § 2º), permitindo que terceiros - desde que investidos de representatividade adequada - possam ser admitidos na relação processual, para efeito de manifestação sobre a questão de direito subjacente à própria controvérsia constitucional.

          - A admissão de terceiro, na condição de amicus curiae, no processo objetivo de controle normativo abstrato, qualifica-se como fator de legitimação social das decisões da Suprema Corte, enquanto Tribunal Constitucional, pois viabiliza, em obséquio ao postulado democrático, a abertura do processo de fiscalização concentrada de constitucionalidade, em ordem a permitir que nele se realize, sempre sob uma perspectiva eminentemente pluralística, a possibilidade de participação formal de entidades e de instituições que efetivamente representem os interesses gerais da coletividade ou que expressem os valores essenciais e relevantes de grupos, classes ou estratos sociais.

          Em suma: a regra inscrita no art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99 - que contém a base normativa legitimadora da intervenção processual do amicus curiae - tem por precípua finalidade pluralizar o debate constitucional.

          DECISÃO: A Associação dos Magistrados Catarinenses - AMC, invocando a sua "condição de entidade representativa dos Magistrados Catarinenses" (fls. 255), requer, nos termos do art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99, seja admitida, formalmente, a manifestar-se na presente causa. Passo a apreciar o pedido ora formulado pela entidade de classe em questão.

          Como se sabe, o pedido de intervenção assistencial, ordinariamente, não tem cabimento em sede de ação direta de inconstitucionalidade, eis que terceiros não dispõem, em nosso sistema de direito positivo, de legitimidade para intervir no processo de controle normativo abstrato (RDA 155/155 - RDA 157/266 - ADI 575-PI (AgRg), Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).

          A Lei nº 9.868/99, ao regular o processo de controle abstrato de constitucionalidade, prescreve que "Não se admitirá intervenção de terceiros no processo de ação direta de inconstitucionalidade" (art. 7º, caput).

          A razão de ser dessa vedação legal - adverte o magistério da doutrina (OSWALDO LUIZ PALU, "Controle de Constitucionalidade", p. 216/217, 1999, RT; ZENO VELOSO, "Controle Jurisdicional de Constitucionalidade", p. 88, item n. 96, 1999, Cejup; ALEXANDRE DE MORAES, "Direito Constitucional", p. 571, 6ª ed., 1999, Atlas, v.g.) - repousa na circunstância de o processo de fiscalização normativa abstrata qualificar-se como processo de caráter objetivo (RTJ 113/22 - RTJ 131/1001 - RTJ 136/467 - RTJ 164/506-507).

          Não obstante todas essas considerações, cabe ter presente a regra inovadora constante do art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99, que, em caráter excepcional, abrandou o sentido absoluto da vedação pertinente à intervenção assistencial, passando, agora, a permitir o ingresso de entidade dotada de representatividade adequada no processo de controle abstrato de constitucionalidade.

          A norma legal em questão, ao excepcionalmente admitir a possibilidade de ingresso formal de terceiros no processo de controle normativo abstrato, assim dispõe:

          "O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros órgãos ou entidades." (grifei).

          No estatuto que rege o sistema de controle normativo abstrato de constitucionalidade, o ordenamento positivo brasileiro processualizou, na regra inscrita no art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99, a figura do amicus curiae, permitindo, em conseqüência, que terceiros, investidos de representatividade adequada, sejam admitidos na relação processual, para efeito de manifestação sobre a questão de direito subjacente à própria controvérsia constitucional.

          A regra inscrita no art. 7º, § 2º da Lei nº 9.868/99 - que contém a base normativa legitimadora da intervenção processual do amicus curiae - tem por objetivo pluralizar o debate constitucional, permitindo que o Supremo Tribunal Federal venha a dispor de todos os elementos informativos possíveis e necessários à resolução da controvérsia.

          É certo que, embora inovadora em tema de controle abstrato de constitucionalidade (que faz instaurar processo de natureza marcadamente objetiva), a disciplina legal pertinente ao ingresso formal do amicus curiae já se achava contemplada, desde 1976, no art. 31 da Lei nº 6.385, de 07/12/76, que permite a intervenção da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em processos judiciais de caráter meramente subjetivo, nos quais se discutam questões de direito societário, sujeitas, no plano administrativo, à competência dessa entidade autárquica federal.

          Cabe registrar, por necessário, que a intervenção do amicus curiae, para legitimar-se, deve apoiar-se em razões que tornem desejável e útil a sua atuação processual na causa, em ordem a proporcionar meios que viabilizem uma adequada resolução do litígio.

          Na verdade, consoante ressalta PAOLO BIANCHI, em estudo sobre o tema ("Un´Amicizia Interessata: L´amicus curiae Davanti Alla Corte Suprema Degli Stati Uniti", in "Giurisprudenza Costituzionale", Fasc. 6, nov/dez de 1995, Ano XI, Giuffré), a admissão do terceiro, na condição de amicus curiae, no processo objetivo de controle normativo abstrato, qualifica-se como fator de legitimação social das decisões do Tribunal Constitucional, viabilizando, em obséquio ao postulado democrático, a abertura do processo de fiscalização concentrada de constitucionalidade, em ordem a permitir que nele se realize a possibilidade de participação de entidades e de instituições que efetivamente representem os interesses gerais da coletividade ou que expressem os valores essenciais e relevantes de grupos, classes ou estratos sociais. Presente esse contexto, entendo que a atuação processual do amicus curiae não deve limitar-se à mera apresentação de memoriais ou à prestação eventual de informações que lhe venham a ser solicitadas.

          Cumpre permitir-lhe, em extensão maior, o exercício de determinados poderes processuais, como aquele consistente no direito de proceder à sustentação oral das razões que justificaram a sua admissão formal na causa. Reconheço, no entanto, que, a propósito dessa questão, existe decisão monocrática, em sentido contrário, proferida pelo eminente Presidente desta Corte, na Sessão de julgamento da ADI 2.321-DF (medida cautelar).

          Tenho para mim, contudo, na linha das razões que venho de expor, que o Supremo Tribunal Federal, em assim agindo, não só garantirá maior efetividade e atribuirá maior legitimidade às suas decisões, mas, sobretudo, valorizará, sob uma perspectiva eminentemente pluralística, o sentido essencialmente democrático dessa participação processual, enriquecida pelos elementos de informação e pelo acervo de experiências que o amicus curiae poderá transmitir à Corte Constitucional, notadamente em um processo - como o de controle abstrato de constitucionalidade - cujas implicações políticas, sociais, econômicas, jurídicas e culturais são de irrecusável importância e de inquestionável significação.

          Tendo presentes as razões ora expostas - e considerando o que dispõe o art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99 -, entendo que se acham preenchidos, na espécie, os requisitos legitimadores da pretendida admissão formal, da ora interessada, nesta causa: a relevância da matéria em exame, de um lado, e a representatividade adequada da entidade de classe postulante, de outro.

          Sendo assim, admito, na presente causa, a manifestação da Associação dos Magistrados Catarinenses - AMC, que nela intervirá na condição de amicus curiae, anotando-se, ainda, na autuação os nomes de seus ilustres procuradores (fls. 271).

          2. O pedido de medida cautelar será submetido à apreciação do Plenário desta Corte, em uma das Sessões que o Supremo Tribunal Federal fará realizar na primeira quinzena do mês de fevereiro de 2001.

          3. Depois que se proceder à juntada desta decisão ao processo, voltem-me conclusos, imediatamente, os presentes autos.

          Publique-se.
Brasília, 20 de dezembro de 2000.

          Ministro CELSO DE MELLO. Relator

          * decisão publicada no DJU de 2.2.2001

          21. As Postulantes, referindo-se ao que Gilmar Ferreira Mendes chama de "apreciação dos chamados fatos e prognoses legislativos" no âmbito do controle de constitucionalidade", com o seu ingresso nos autos, como amicus curiae, o que de fato requerem neste momento, querem prestar a suacolaboração à sociedade brasileira e ao Poder Judiciário, através de apresentação de memorial, sustentação oral e com oitiva de peritos e testemunhas de notório saber teorético e empírico, sobre as causas do racismo e a discriminação racial e seu impacto na sociedade brasileira.


          II. CARÊNCIA DE AÇÃO. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE PERTINÊNCIA TEMÁTICA ENTRE O ATO IMPUGNADO E AS FUNÇÕES DA CAUSA ÀS FINALIDADES ESTUTÁRIAS. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM A APRECIAÇÃO E JULGAMENTO DO MÉRITO.

          22. Sabe-se que, no processo objetivo de fiscalização abstrata de constitucionalidade, as partes são meramente formais, embora "seja possível falar-se em legitimidade ativa e passiva" (CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no Direito brasileiro. 2ª. ed. revista e atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 159).

          23. Não se desconhece, ainda, que "como regra, não se deve reconhecer, na ação direta de inconstitucionalidade, a possibilidade de aplicação sistemática, em caráter supletivo, das normas concernentes aos processos de índole subjetiva" (BARROSO, Luis Roberto. Conceitos fundamentais sobre o controle de constitucionalidade e a jurisprudência. In SARMENTO, Daniel (org.). O controle da constitucionalidade e a Lei no 9.868/99. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002).

          24. Mas, porque estamos diante de processo objetivo, em que não há partes, algumas singularidades podem ser observadas, com o intuito de instrumentalizar a própria prestação jurisdicional, como a questão da falta de interesse de agir, alçada como condição de ação.

          25. Em termos de legitimidade ativa para agir na ação direta de inconstitucionalidade, a doutrina nacional, secundando a jurisprudência dessa Excelsa Corte, em exegese do artigo 103 da CRFB, estabelece diferença de tratamento entre os denominados legitimados universais (Presidente da República, as Mesas do Senado e da Câmara, o Procurador-Geral da República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e o partido político com representação no Congresso Nacional) e os legitimados especiais (Governador de Estado, Confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional). (V. por todos, CLÈVE, ob.cit., p. 165).

          26. A importância prática dessa distinção reside em que os primeiros não precisam demonstrar interesse (relação de pertinência entre o ato impugnado e as funções da causa às finalidades estutárias), e os segundos, inevitavelmente, sim. (cf. ADIn 1.184-DF, j. 22.10.1996, Rel. Min. Celso de Mello; ADIn 1.114-DF, Rel. Min. Ilmar Galvão).

          27. É que a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal reconhece que os legitimados universais têm interesse em preservar a supremacia da Constituição por força de suas próprias atribuições institucionais. Mas quanto aos demais legitimados, os denominados legitimados especiais, o Supremo Tribunal Federal tem estabelecido restrições, pois muitas podem ser propostas por espírito de emulação ou por razões políticas. E com isso não se diga que estaria a Alta Corte brasileira transformando a ação direta em processo subjetivo de tutela de interesse concreto, ainda que coletivo.

          28. Isso, também tem o escopo de se evitar que a ADI se torne uma ação popular, colocando-se "em risco o funcionamento razoável do órgão pela sobrecarga de trabalho e pela ameaça do perigo da litigância aventureira ou de má-fé". (v. MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição constitucional. 3.a ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 61).

          29. No caso dos autos não se vislumbra um interesse de agir da Requerente. Isso não está claro, inclusive, pela eslasticidade que tentou empregar ao conceito de "pertinência temática". Nos parece que estes relevantes interesses que a Requerente almeja proteger caberiam melhor em atuação na condição de amicus curiae ou de representante a um legitimado universal para a ADI, e não como requerente de ADI, mais ainda para atuar "como auxiliar do Poder Público", no "estudo e solução dos problemas do ensino e da educação nacionais".

          30. Há ainda a circunstância de que, parece-nos, está ocorrendo um desvio de finalidade na utilização da presente ADI, em que a Confederação, de âmbito nacional com direito ao ajuizamento de ADI junto ao STF, está servindo de veículo de atendimento a interesse econômico exclusivo local, de um filiado seu, qual seja dos das escolas e cursinhos pré-vestibular. Para corroborar esta tese, vemos que no instrumento de mandato outorgado (às fls. 45 dos autos) consta que "a responsabilidade pela contratação, por honorários advocatícios e custas judiciais é do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Município do Rio de Janeiro".

          31. Com isso, não se entenda que se negue o direito à atividade econômica, pois o direito à livre iniciativa é protegido constitucionalmente, mas não a ponto de tornar a Educação, o Ensino, um commodities, uma mercadoria. O que está em questão é tentativa de se subordinar o interesse público ao interesse privado.

          32. Por todos estes motivos, as Manifestantes entendem que não há relação de pertinência temática entre o ato impugnado e as funções da causa às finalidades estutárias da Requerente, e por isso requerem a extinção do feito, sem a apreciação e julgamento do mérito.


          III. PRELIMINAR: LITISPENDÊNCIA: EXISTÊNCIA DE REPRESENTRAÇÕES DE INCONSTITUCIONALIDADE EM CURSO NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADUAL, COM MESMO OBJETO DE ADI AJUIZADA PERANTE O STF. EXTINÇÃO DO FEITO SEM A APRECIAÇÃO E JULGAMENTO DO MÉRITO.

          36. Conforme mencionado no item 4 desta petição e nestes autos, há duas Representações por Inconstitucionalidade em curso no Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, sob os nº 2003.007.00020 e 2003.007.00021, propostas pelo Deputado Estadual Flávio Bolsonaro, GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO e ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

          37. Essas Representações por Inconstitucionalidade têm por objeto o mesmo objeto almejado por esta ADI, qual seja a declaração de inconstitucionalidade das leis estaduais 3.525, de 28.12.00 e 3.708, de 09.11.01. 

          38. A princípio a Representação de Inconstitucionalidade ajuizada no Tribunal de Justiça estadual não veda o ajuizamento de idêntica ADI perante o Supremo Tribunal Federal. Mas, movimentar duas vezes o Poder Judiciário para resolver o mesmo problema, além de causar um dispêndio econômico desnecessário ao País, aumenta a excessiva carga de trabalho que assoberba esse Excelso Pretório, o que, d. v., entendemos deva ser evitado. Mas, diga-se, por oportuno, dizendo isso, não querem as Manifestantes ter a pretensão de requerer que essa Excelsa Corte renuncie à sua competência constitucional, inclusive, quando o artigo 102 da CRFB diz que este é o seu principal guardião..

          39. Em razão desses fatos, as Manifestantes requerem a extinção do feito, sem a apreciação e julgamento do mérito.


          IV. PRELIMINARMENTE: PEDIDO DE SOBRESTAMENTO (SUSPENSÃO) DO ANDAMENTO DA ADI ESTADUAL. Da existência de ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade Estadual, com o mesmo objeto, perante o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Expedição de Ofício para o Tribunal de Justiça.

          40. Conforme já noticiou o Requerente nos autos (fls. 4-8), se bem que o fez parcialmente, como veremos, há em curso no Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro duas Representações por Inconstitucionalidade, sob os nº 2003.007.00020 e 2003.007.00021, propostas pelo Deputado Estadual Flávio Bolsonaro, GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO e ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

          41. Na Representação por Inconstitucionalidade nº 2003.007.00020, o Desembargador Relator José Carlos Murta Ribeiro, monocraticamente, entendendo existir fumus boni iuris e periculum in mora, deferiu medida cautelar para suspender a eficácia da Lei nº 3.524, de 28.12.2000 (relativo ao Vestibular SADE, e transcrito nos autos), sendo certo que o Estado do Rio de Janeiro já interpôs Agravo Regimental contra essa medida, que aguarda julgamento (cópia do andamento extraído da internet em anexo).

           42. Na Representação por Inconstitucionalidade nº 2003.007.00021, o Desembargador Relator Nilton Mondego, indeferiu pedido de medida cautelar contra a Lei nº 3.708, de 09.11.2001, (Vestibular pardos e negros), sob o fundamento de que: "2 - A SUSPENSÃO DO ATO IMPUGNADO SO TEM CABIMENTO SE MANIFESTA A CONVENIÊNCIA POR MOTIVO RELEVANTE DE ORDEM PUBLICA (ALÍNEA "B" DO DISPOSITIVO SUPRA CITADO). 3 - ESTÃO AUSENTES, NA ESPÉCIE TAIS REQUISITOS, EM RAZÃO DE QUE SUSPENSÃO LIMINAR NÃO PODE SER DEFERIDA. 4 - NEGO-A, PORTANTO".

          43. Em razão desse fato, as Manifestantes requerem a suspensão do andamento das Representações de Inconstitucionalidade indigitadas, até final julgamento desta ADI nº 2.858-8, ajuizada pela CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS ESTABELECIMENTOS DE ENSINO – CONFENEN, expedindo-se ofício ao Egrégio Tribunal de Justiça Estadual para esse fim. 


V. DO MÉRITO:

          VI. AS AÇÕES AFIRMATIVAS E AS COTAS NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO.

          44. Inicialmente, as Postulantes requerem não seja deferida a medida liminar pleiteada nestes autos, em face dos motivos que justificam a existência do sistema de cotas em nosso país, bem como pela inexistência de motivo relevante de ordem pública para tanto.

          45. Tema ainda pouco debatido no Brasil, as cotas não constituem nenhuma novidade por aqui, pois que já foram previstas e instituídas com outros nomes pelos legisladores constitucional e ordinário, bem como pelos governantes de todas as esferas de poderes de nossa federação. Mas, é importante ressaltar, que até a promulgação da atual Carta Federal, como muito bem acentuou o Prof. Jorge da Silva em seus livros, a discriminação racial e o racismo no Brasil foram disciplinados pela legislação penal repressiva, inexistindo políticas públicas em favor dos negros brasileiros, como houve, v. g., para os imigrantes europeus no início do séc. XX. Ratifica estas alegações o fato de que, a questão racial no Brasil, até a promulgação da CRFB de 1988, foi tratada como contravenção pela legislação penal, mais especificamente, pela chamada Lei Afonso Arinos.

          46. Porém, é preciso que não se confundam os sistemas de cotas - como são denominadas certas políticas públicas mais radicais objetivando a concretização da igualdade material - com as ações afirmativas: as cotas nasceram no bojo ações afirmativas, mas com essas não se confundem. (v. SILVA, Luiz Fernando Martins da. Sobre a implementação de cotas e outras ações afirmativas para os Afro-brasileiros. Revista Jurídica Virtual Jus Navigandi. Acesso em: 23. março. 2003. Disponível em: <www.jus.com.br>).

          47. O professor da Faculdade de Direito da UFRJ e Membro do Ministério Público Federal, Joaquim B. Barbosa Gomes, observa que:

          "Atualmente, as ações afirmativas, podem ser definidas como um conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com vistas ao combate à discriminação racial, de gênero e de origem nacional, bem como para corrigir os efeitos presentes da discriminação praticada no passado, tendo por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade de acesso a bens fundamentais como a educação e o emprego. Diferentemente das políticas governamentais antidiscriminatórias baseadas em leis de conteúdo meramente proibitiva, que se singularizam por oferecerem às respectivas vítimas tão somente instrumentos jurídicos de caráter reparatório e de intervenção ex post facto, as ações afirmativas têm natureza multifacetária, e visam a evitar que a discriminação se verifique nas formas usualmente conhecidas – isto é, formalmente, por meio de normas de aplicação geral ou específica, ou através de mecanismos informais, difusos, estruturais, enraizados nas práticas culturais e no imaginário coletivo. Em síntese, trata-se de políticas e mecanismos de inclusão concebidas por entidades públicas, privadas e por órgãos dotados de competência jurisdicional, com vistas à concretização de um objetivo

          constitucional universalmente reconhecido – o da efetiva igualdade de oportunidades a que todos os seres humanos têm direito". (In: Ação Afirmativa & princípio constitucional da igualdade: o Direito como instrumento de transformação social. A experiência dos EUA. Rio de Janeiro e São Paulo: Renovar, 2001, pp. 40-41).

          48. A origem das ações afirmativas quase sempre é atribuída aos Estados Unidos nos anos 50/60, mas autores como o professor Jacques d´Adesky (In: Ação Afirmativa e igualdade de oportunidades, Rio de Janeiro, mimeo, p. 1), menciona que estas "não se limitam aos países ocidentais. Desde 1948 foi introduzido na Índia um sistema de quotas que ampara as ´classes atrasadas’ para garantir-lhes acesso a empregos públicos e às universidades". No mesmo estudo citado, comentando a passagem do princípio de igualdade para a noção de eqüidade, diz que "Mesmo com a multiplicação de medidas de ação afirmativa em muitos países democráticos, observa-se o surgimento constante de controvérsias a respeito da necessidade ou não de adotar legislações específicas que determinem políticas para solucionar fenômenos como o racismo, sexismo e outras formas de intolerância. As controvérsias em torno destas iniciativas variam muito, quer em termos de suas justificativas políticas, quer no modo de sinalizar legalmente as minorias e grupos beneficiários por essas medidas".

          49. Continua o citado autor, dizendo que no plano político, "os programas de ação afirmativa resultam da compreensão cada vez maior de que a busca de uma igualdade concreta deve realizar-se não mais somente pela aplicação geral das mesmas regras de direito para todos, mas também através de medidas específicas que levam em consideração as situações particulares de minorias e de membros pertencentes a grupos em desvantagem. Considera-se que a referência a um indivíduo abstrato, percebido como universal e reconhecido como cidadão, digno de igual respeito em razão de seu status de agente racional, deve ter a preeminência na formulação de políticas públicas. Observe-se, ao mesmo tempo, que tal referência torna-se insuficiente para combater o preconceito, racismo, sexismo etc. que permanecem na sociedade impedindo o total reconhecimento da dignidade da pessoa.

          50. No plano moral, diz que "a exigência moral desta perspectiva conduz a buscar uma dimensão mais exigente da igualdade. O que implica assumir racionalmente, no terreno de políticas públicas, o caráter dialógico da pessoa humana no sentido que possui uma dignidade inerente igual a todo ser humano e uma identidade individual portadora de culturas construídas parcialmente por diálogos coletivos. Significa também reconhecer de modo subjacente que a pessoa é um indivíduo insubstituível e, ao mesmo tempo, um membro de uma comunidade".

          51. Por fim, em obra seminal para a compreensão da questão racial em nosso país, Jacques d´Adesky, diz que "Se é preciso admitir, com Taguieff, que existem limites à ação do Estado na condução da luta anti-racista, há de se concordar também que as políticas públicas fornecem aos regimes democráticos um importante meio de engajamento contra o racismo. Elas oferecem um leque variado de ações anti-racistas, que vão das políticas de ação afirmativa à organização de campanhas multimídia de luta contra o racismo, os preconceitos e a segregação residencial no espaço urbano, passando pela eliminação do vocabulário, segundo a lógica do politically correct, de palavras ou expressões consideradas ofensivas a determinados grupos culturais ou comunidades étnicas" (In Pluralismo étnico e multiculturalismo: racismos e anti-racismos no Brasil. Rio de Janeiro: Pallas, 2001, pp. 229 e 230).

          52. Com efeito, o legislador pátrio, mesmo não as denominando de cotas ou ações afirmativas, já editou diversas leis e outros tipos normativos, que reconhecem o direito à diferença de tratamento legal para diversos grupos vulneráveis. Dentre outros, destacamos:

          I. Decreto-Lei 5.452/43 (CLT), que prevê, em seu art. 354, cota de dois terços de brasileiros para empregados de empresas individuais ou coletivas.

          II. Decreto-Lei 5.452/43 (CLT), que estabelece, em seu art. 373-A, a adoção de políticas destinadas a corrigir as distorções responsáveis pela desigualdade de direitos entre homens e mulheres.

          III.  Lei 8.112/90, que prescreve, em art. 5º, § 2º, cotas de até 20% para os portadores de deficiências no serviço público civil da união.

          IV.  Lei 8.213/91, que fixou, em seu art. 93, cotas para os portadores de deficiência no setor privado.

          V. Lei 8.666/93, que preceitua, em art. 24, inc. XX, a inexigibilidade de licitação para contratação de associações filantrópicas de portadores de deficiência.

          VI.  Lei 9.504/97, que preconiza, em seu art. 10, § 2º, cotas para mulheres nas candidaturas partidárias. (5).

          53. Vale ainda notar, que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ministro Marco Aurélio Mendes de Farias Mello, no seminário "Discriminação e Sistema Legal Brasileiro", promovido pelo Tribunal Superior do Trabalho, em 20 de novembro de 2001, proferiu uma palestra intitulada "Óptica Constitucional - A Igualdade e as Ações Afirmativas", onde defendeu a constitucionalidade da implementação de ações afirmativas em favor dos negros brasileiros.

          54. Ainda no mês de dezembro do mesmo ano o Supremo Tribunal Federal expediu edital de licitação que prevê cota para negros nos serviços terceirizados do Tribunal. A concorrência objetivava contratar 17 profissionais para prestação de serviços na área de jornalismo e reserva 20% das vagas para negros. O próprio governo federal vem fazendo alguns esforços para a implementação de ações afirmativas para os afro-brasileiros, como é o caso do Ministério da Reforma Agrária. Recentemente, foi lançado o Programa de Ação Afirmativa do Instituto Rio Branco, lançado em cerimônia presidida pelo Chanceler Celso Lafer, em 14 de maio de 2002, que ofereceu 20 bolsas anuais candidatos afro-descendentes que desejem se preparar para o concurso do Instituto Rio Branco, com vistas ao ingresso na carreira diplomática. (v.através do site www.mre.gov.br/irbr). A comunidade indígena da Amazônia também já foi contemplada com a sua cota, pois conseguiram que a Universidade Federal do Amazonas abrisse um curso de graduação para os povos indígenas, no qual o ingresso dos índios é diferenciado.

          55. Já no campo da legislação, existe um verdadeiro arsenal normativo exemplificando ou respaldando a implementação de ações afirmativas ou cotas no Brasil.

          Na ordem internacional, tem-se:

          1. A Convenção relativa à luta contra a discriminação no campo do ensino (Conferência Geral da UNESCO, reunida em Paris, de 14 de novembro a 15 de dezembro de 1960, em sua Décima Primeira Sessão. Aprovada no Brasil pelo Decreto Legislativo no 40, de 1967 (DO 17.11.67), "consciente de que incumbe conseqüentemente à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, dentro do respeito da diversidade dos sistemas nacionais de educação, não só proscrever qualquer discriminação em matéria de ensino, mas igualmente promover a igualdade de oportunidade e tratamento para todos neste campo", estabelece no seu Artigo I, que "Para os fins da presente Convenção o termo ‘discriminação’ abarca qualquer distinção, exclusão, limitação ou preferência que, por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião pública ou qualquer outra opinião, origem nacional ou social, condição econômica ou nascimento, tenha por objeto ou efeito destruir ou alterar a igualdade de tratamento em matéria de ensino", e, no item 2, do mesmo Artigo, diz que: "Para os fins da presente Convenção, a palavra ‘ensino’ refere-se aos diversos tipos e graus de ensino e compreende o acesso ao ensino, seu nível e qualidade e as condições em que é subministrado".

          2. A Convenção Internacional para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial (Adotada pela Resolução n. 2.106, da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 21.12.1965), que não se limita apenas a propor medidas punitivas de combate à discriminação racial, ao lado de ações repressivas, estabelece a possibilidade de adoção de políticas públicas promocionais, ou seja, "ações afirmativas". Assim, o artigo I, item 4, diz que: "Não serão consideradas discriminação racial as medidas especiais tomadas com o único objetivo de assegurar progresso adequado de certos grupos raciais ou étnicos ou de indivíduos que necessitem da proteção que possa ser necessária para proporcionar a tais grupos ou indivíduos igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais, contando que tais medidas não conduzam, em conseqüência, à manutenção de direitos separados para diferentes grupos raciais e não prossigam após terem sido alcançados os seus objetivos".

          56. Na ordem interna, para nos limitarmos apenas à superestrutura jurídica nacional, tem-se, na Constituição Brasileira de 1988:

          Artigos 1º, inciso III (princípio que resguarda o valor da dignidade humana); 3º, incisos I, III e IV (constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil construir uma sociedade livre, justa e solidária, bem como promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, e erradicar a (....) marginalização e reduzir as desigualdades sociais...); 4º, incisos II e VIII (a República Federativa do Brasil, No plano das relações internacionais, deve velar pela observância dos princípios da prevalência dos direitos humanos e do repúdio ao terrorismo e ao racismo); 5º, incisos XLI e XLII (consagra o princípio da igualdade; punição para qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais", e, enuncia que racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei), e parágrafo 2º, consagrando a incorporação do direito advindos dos tratados internacionais); 7º inciso XXX (no campo dos direitos sociais, proíbe a diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil); 23, inciso X (combater (...) os fatores de marginalização); 37, inciso VIII (a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão); 145, § 1º (Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte...); 170, incisos VII (redução das desigualdades (...) sociais) e IX ( tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País); 179 (A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei), e 227, inciso II - criação de programas (...) de integração social dos adolescentes portadores de deficiência).


          VII. BREVÍSSIMOS COMENTÁRIOS A RESPEITO DAS PRINCIPAIS TESES DEFENDIDAS PELA REQUERENTE CONTRA A MANUTENÇÃO DO SISTEMA DE COTAS PREVISTAS NAS LEIS OBJETO DA PRESENTE ADIN:

          57. Trecho pág. 12, item 16, primeira parte, da inicial:

          57.1. No caso, fazendo letra morta do texto da Convenção Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial, promulgada em 1965 pelas Nações Unidas e ratificada pelo Brasil em 1968, somente para ficarmos no plano da proteção internacional dos Direitos Humanos Fundamentais, a Requerente trata como se anomalias fossem os efeitos de uma medida especial destinada a promover a igualdade racial. Apenas para lembrar, no seu artigo 1º, parágrafo 4º, esta Convenção explicitamente afirma que: "Não serão consideradas discriminação racial as medidas especiais tomadas com o único objetivo de assegurar o progresso de certos grupos raciais ou étnicos ou de indivíduos que necessitem da proteção que possa ser necessária para proporcionar a tais grupos ou indivíduos, igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais, contanto que tais medidas não conduzam, em conseqüência, à manutenção de direitos separados para diferentes grupos raciais e não prossigam após terem sido alcançados os seus objetivos".

          58. Trecho pág. 12, item 16, segunda parte, da inicial:

          58.1. Neste tópico, a afirmação de que o candidato oriundo de escola privada, e que obteve nota sensivelmente maior do que a candidato vindo de escola pública perde a vaga que por mérito lhe seria destinada é falaciosa. Primeiro porque o sistema do vestibular estabelece as normas com base nas quais o mérito dos candidatos será avaliado: não há um método abstrato e genérico com base no qual em qualquer época, e em qualquer lugar se possa aquilatar o mérito.

          A proposta da reserva de vagas não rompe com o sistema do mérito, pelo contrário, busca aperfeiçoá-lo comparando candidatos em condições semelhantes para que o mérito individual possa ser melhor apurado.

          58.2. Outro equívoco deste argumento é considerar que o atual vestibular tenha a capacidade de medir o "mérito do candidato". O que o vestibular atual mede, mais freqüentemente, é a qualidade do ensino que foi oferecido aos candidatos, e as condições de estudo e vida dos mesmos. Mais do que o mérito do candidato, o nosso vestibular mede o mérito do sistema escolar e do sistema social, a desigualdade de oportunidades. Não por acaso, o vestibular das universidades públicas seleciona os estudantes que vieram de escolas privadas e das classes mais abastadas. Não creio que se considere que o mérito se distribui desigualmente como a riqueza, concentrando-se no topo da pirâmide social.

          58.3. Mas se a preocupação de muitos é com a necessidade de manutenção de um processo competitivo, a proposta de cotas não abole a competição: a proposta de cotas, ao reconhecer as profundas desigualdades de oportunidade, estabelece que a competição deve se dar entre candidatos com igualdade de condições, para que, de fato, se possa medir o mérito dos candidatos e não o mérito dos diferentes sistemas escolares. Não se pode dar um fusca para um piloto, e uma BMW para outro, e achar que nessa corrida vai se medir o mérito dos pilotos

          58.4. O mérito não desconsiderado. Ao contrário, busca um aprimoramento deste conceito, na medida que é um novo formato do Vestibular, cuja idéia central é promover a igualdade de oportunidades entre os grupos da sociedade que se encontram em posições de desigualdade por motivos de raça e de renda. Nesse sentido, o vestibular procura medir o mérito do candidato não em relação a todos os outros candidatos, mas dentro da realidade sócio-econômica de cada grupo específico: o grupo oriundo da escola pública que por motivo de renda está em condição de desvantagem em relação aos candidatos que cursaram escola particular, e o grupo de candidatos negros e pardos que estão em condições de maior desvantagem em relação aos dois outros grupos, como já foi comprovado pelos indicadores sócio-econômicos do IBGE, do IPEA, e do IDH, acrescidos dos resultados de várias pesquisas realizadas nas décadas de 80 e 90 no âmbito acadêmico brasileiro.

          58.5. Esse novo Vestibular procura, portanto, adotar o conceito de igualdade de oportunidades baseado no princípio da eqüidade que possibilita buscar maior justiça aos que estão em desvantagens desproporcional na sociedade.

          58.6. Nos EUA, mais ainda no Brasil, o mérito tem sido usado como ideologia, para impedir o adensamento de medidas compensatórias a favor da população afro-descendente. Ou seja, a ação afirmativa contrariaria um princípio universalista básico, qual seja: a lei aplica-se aos indivíduos, independentemente de suas pertenças sociais e de suas características naturais.

          58.7. Ora, no caso do Ensino de 3º grau no Brasil, onde a existe uma rede pública de excelente qualidade e, ao mesmo tempo, uma pequena proporção de negros, mormente nos cursos de Medicina e de Direito, faz sentido falar em estabelecer metas que privilegiem a matrícula.

          58.8. Do ponto de vista normativo, não se questiona que o mérito e os dotes intelectuais estejam sendo empanados por desigualdades raciais e de classe, que podem ser corrigidas por políticas compensatórias.

          58.9. A controvérsia nos EUA sobre este tema não é pouca. Mas este critério tem sido muito utilizado na implementação de ação afirmativa. Mas vale ressaltar que, nos EUA, o mérito, consignado nas melhores notas, não é o único passaporte para o ingresso nas universidades, pois concorre com: ser filho de benfeitores ou de membro do alumni; ser residentes regionais; ter habilidades esportivas, estar numa certa faixa de idade; demonstrar (por meio de entrevistas) habilidades específicas para algumas áreas do saber, etc.

          58.10. Ronald Dworkin, no seu livro Questão de Princípio, define a especificidade das discriminações raciais por terem "sido, historicamente, motivadas não por um cálculo instrumental qualquer, como no caso da inteligência, idade, distribuição regional, ou habilidade atlética, mas por causa do próprio desprezo pela raça ou religião excluídas. Exclusão por raça era, em sim mesmo, um insulto porque era gerada por desprezo e o revelava". (...) "Não há nenhuma combinação de habilidades e qualidades e traços que constitua ´mérito´ em abstrato".

          58.11. O filósofo Peter Singer, da Universidade de Princeton, no seu livro Ética Prática ratifica essa posição:

          "Como já afirmei antes, a maior inteligência não traz consigo nenhuma pretensão correta ou justificável a um maior desfrute das coisas boas que a nossa sociedade tem a oferecer. Se uma universidade admite alunos de maior inteligência, ela não o faz em consideração ao maior interesses que eles têm em ser admitidos, nem em reconhecimento ao seu direito de ser admitidos, mas porque, com isso, favorece objetivos que, acredita, serão propiciados por esse processo de admissão. Portanto, se essa mesma universidade resolver adotar novos objetivos e usar a ação afirmativa para fomentá-los, os candidatos que teriam sido admitidos pelo processo anterior não poderão reclamar que a nova maneira de agir viola os seus direitos a ser admitidos, ou dispensa-lhes menos respeito que aos outros. Para começar, não tinham nenhum reclamo especial para ser admitidos; eram felizes beneficiários da velha política da universidade" (São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 58).

          59. Trecho pág. 13, item 17 a 20, da inicial:

          59.1. A intenção de dar-se um tratamento mais favorável a quem está em situação de desvantagem, em razão de serem grupos débeis econômica e socialmente, não caracteriza arbítrio ou violação do princípio da igualdade, pelo contrário, pretende viabilizar a isonomia material. Para principiar este tópico, é fundamental a manifestação do Professor e advogado Carlos Roberto de Siqueira Castro:

          "Tudo porque, em tal contexto de estatísticas sociais desfavoráveis para aqueles contingentes humanos inferiorizados da sociedade, a persistência nas generalizações legislativas, com adoção de normas simplistas, genéricas e iguais para todos, independentemente das notórias diferenças sociais e econômicas que são fruto, por exemplo, do escravismo e da cultura machista, não propicia a mobilidade e a emancipação social desses grupos discriminados e, até mesmo, aprofunda e reproduz os condenáveis preconceitos histórica e culturalmente enquistados no organismo social. Nesse campo de questões, que bem exprime as relações sempre tensas entre o Direito e a sociedade, a caracterizar o fenômeno a que designamos de constitucionalismo de resultado, percebe-se nitidamente o abandono do classicismo isonômico e a busca de instrumentos de aplicação e interpretação da Constituição capazes de enfrentar o imobilismo conservador e de prestigiar as políticas públicas mudancistas e de transformação social. Aqui, altera-se a dimensão e o próprio eixo de referência da igualdade, substituindo-se a idéia da não-discriminação formal pelo ideal da não-discriminação material. Por esse viés teórico, o postulado da isonomia não mais se refere apenas à proibição de tratamento discriminatório, mas inclui na análise sociológico-jurídica o impacto e as seqüelas sociais impostas pela longa sujeição histórica e cultural ao tratamento desigual antes prevalente. Nessa ótica, vislumbra-se o duplo aspecto (social e jurídico) da teorização da igualdade, ou seja, as "as teorias da discriminação", que no modelo americano foram denominadas de "teoria do tratamento diferencial" (disparate treatment theory) e "teoria do impacto diferencial" (disparate impact theory). Em tal ordem de convicções, as ações positivas despontam como um mecanismo da justiça distributiva, destinado a compensar inferioridades sociais, econômicas e culturais associadas a dados da natureza e ao nascimento dos indivíduos, como raça e sexo".

          (...) Ressalte-se portanto que a ação afirmativa tem como objetivo não somente coibir a discriminação mas sobretudo eliminar os chamados "efeitos persistentes" da discriminação do passado, que tendem a perpetuar. Ainda nesse contexto, revela destacar que partindo-se da premissa de que os grupos minoritários normalmente não são representados ou sub-representados nos mais diversos ramos de atividade, as ações afirmativas pretendem a implantação de uma certa diversidade e de uma maior representatividade dos grupos minoritários nos mais diversos domínios de atividade pública e privada. Nesse contexto, destaque-se que o efeito mais visível das políticas afirmativas, além do estabelecimento da diversidade e da representatividade propriamente ditas, é a eliminação de "barreiras invisíveis" que acabam por impedir o avanço de negros e mulheres, independentemente da existência ou não de política oficial tendente a subordina-los".

          (...) A adoção de cotas para ingresso de estudantes negros em universidades brasileiras afigura-nos como uma necessária medida para solucionar o desproporcional quadro do ensino superior em nosso País". (Castro, Carlos Roberto de Siqueira.Constituição aberta e os direitos fundamentais.Rio de Janeiro: Forense, no prelo, pp. 444-446 e 451).

          59.2. Comentando o entendimento de Celso Antônio Bandeira de Mello, acerca do conteúdo jurídico do princípio da igualdade, em célebre estudo de todos conhecido, Marcelo Neves diz que "Numa perspectiva rigorosamente positivista, Bandeira de Mello enfatiza que o princípio constitucional da isonomia envolve discriminações legais de pessoas, coisas, fatos e situações. Discute, então, quando discrímenes se justificam sem que o princípio vetor seja deturpado. E aponta três exigências: a presença de traços diferenciais nas pessoas, coisas, situações ou fatos; correlação lógica entre fator discrímen e desequiparação procedida; consonância da discriminação com os interesses e valores protegidos na Constituição". (NEVES, Marcelo. Estado democrático de direito e discriminação positiva: um desafio para o Brasil".In MAIO, Marcos C; SANTOS, Ricardo V. (orgs). Raça, ciência e sociedade. Rio de Janeiro: Fiocruz/Centro Cultural Banco do Brasil, 1996, p. 262).

          59.3. Marcelo Neves segue, então, esses parâmetros para verificar que"quanto mais se sedimenta historicamente e se efetiva a discriminação social negativa contra grupos étnico-raciais específicos, principalmente quando elas impliquem obstáculos relevantes ao exercício de direitos, tanto mais se justifica a discriminação jurídica positiva em favor dos seus membros, pressupondo-se que esta se oriente no sentido da integração igualitária de todos no Estado e na sociedade". (Op. cit., p. 262).

          59.4. O jusfilósofo conclui, enfim, que "as discriminações legais positivas em favor da integração de negros e índios estão em consonância com os princípios fundamentais da República Federativa do Brasil, estabelecidos nos incisos III e IV do seu artigo 3º. (Op. cit., p. 263.).

Nesse mesmo sentido temos a manifestação do prof. Hédio Silva Jr.: "Salvo engano, é certo que a Constituição de 1988, implícita e explicitamente, não apenas admitiu como prescreveu discriminações, a exemplo da proteção do mercado de trabalho da mulher (artigo 7º, XX) e da previsão de cotas para portadores de deficiência (artigo 37, VIII), donde se conclui que a noção de igualdade circunscrita ao significado estrito de não-discriminação foi contrapesada com uma nova modalidade de discriminação, visto como, sob o ângulo material, substancial, o princípio da igualdade admite sim a discriminação, desde que o discrímen seja empregado com a finalidade de promover a igualização." (In: Direito de igualdade racial: aspectos constitucionais, civis, e penais: doutrina e jurisprudência. São Paulo: editora Juarez de Oliveira, 2002, p. 112).

          60. Trecho pág. 14, item 21, da inicial:

          60.1. A comparação entre o caso referido e a ação em questão é inadmissível: no primeiro caso, a empresa ofereceu um privilégio com base na nacionalidade do trabalhador, deixando de aplicar o Estatuto Pessoal da Empresa. No caso do vestibular da UERJ, a universidade está aplicando uma lei estadual, que se baseia em legislação internacional, que conforme prevê a Constituição Federal, tem força de lei.

          61. Trecho pág. 14, item 22, da inicial:

          61.1. A argumentação da Requerente omite, mais uma vez, o texto da Convenção Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial, acima mencionado, que exclui da definição de discriminação as medidas especiais que têm como objetivo promover a igualdade dos grupos e indivíduos discriminados com base nos atributos de raça, cor, origem nacional ou étnica.

          62. Trecho págs. 15-16, item 23 a 25, da inicial:

          62.1. O argumento é mais uma vez falacioso, transformando o remédio da lei em veneno: a Requerente pretende ignorar que a arbitrariedade não está na lei que tem como objetivo equalizar as condições da competição, na medida em que estudantes oriundos de escolas privadas e públicas, bem como estudantes negros e brancos, e estudantes portadores de deficiência e não portadores partem de condições absolutamente diversas. Seria cômico se não fosse cínico: ignorar o impacto da absoluta desigualdade de condições sócio-econômicas entre negros e brancos, ignorar o diferente grau de aparelhamento das escolas fundamentais e do ensino médio, públicas e privadas, ignorar os obstáculos que precisam ser vencidos pelos portadores de deficiências para freqüentar a escola e utilizar qualquer espaço público ou privado, num país que os confina pela quase total ausência de acessibilidade.

          63. Trecho págs. 16-19, item 26 a 39, da inicial:

          63.1. A Constituição deve ser entendida à luz do espírito que animou o legislador. Como uma peça construída a muitas mãos, num determinado momento da nossa história, poderá não ter reconhecido explicitamente em toda a sua extensão as necessidades dos indivíduos e grupos que necessitam ser protegidos para que o princípio da isonomia se torne realidade. É evidente que a reserva de vagas para as pessoas portadoras de deficiência no acesso aos cargos e empregos públicos não poderá se realizar como direito se os mesmos não dispuserem da necessária formação técnica e educacional para exercer os cargos a que concorrerem. A reserva de vagas não se trata de favor, não se trata de cabide de empregos, de um depósito em que as pessoas portadoras de deficiências devessem ficar confinadas. Está, portanto, implícito no espírito da Lei Maior a necessária complementação do direito à educação para que o direito ao trabalho possa se realizar.

          63.2. O Princípio da diferença na igualdade, inserta no artigo 208, inciso V, da Constituição da República Federativa do Brasil: Importante ressaltar, que ficou consagrado a partir da Conferência de Direitos Humanos, realizada em Viena no ano de 1993, que as populações vulneráveis merecem proteção particularizada dos Estados, entendendo-se que a vulnerabilidade não deve ser confundida com inferioridade, mas com as pessoas ou grupamentos humanos que reconhecidamente sofrem violações de direitos humanos. Nesse sentido, cabe ao órgão legiferante e aos demais poderes, inclusive o Judiciário, conformar-se à ordem jurídica interna, presidida pelo texto Constitucional, bem como os princípios consagrados pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos.

          63.4 As regras, os princípios, os costumes, as normas internacionais e demais fontes, in casu, comprometem ou vinculam o Estado brasileiro, juridicamente ou politicamente ao contexto das relações internacionais.

          63.5. O inciso V, do artigo 208, da Constituição da República Federativa do Brasil, alinhado a toda essa sistemática acima aludida, sobretudo em consonância com os dispositivos que compõem os objetivos fundamentais do Estado (artigos 3º e 4º), inspirado no cariz das Cartas Constitucionais que centradas no multiculturalismo e no pluralismo étnico-racial, como desiderato do Constitucionalismo pós-moderno, sob a perspectiva comunitária em contraposição ao individualismo liberal, acentua que a universalização do ensino deve ser pautada não na igualdade meritocrática e sim na igualdade segundo a capacidade de cada um.

          66.6 Assim, estão juridicamente conceituados ambos os princípios de ordem igualitária: "O critério segundo o próprio merecimento – A distribuição dos benefícios se dá segundo o merecimento das pessoas.

          66.7. Somente aqueles que possuem determinados méritos são destinatários dos benefícios. Tal critério pode ser inigualitário em sociedades cujos méritos obedecem a uma hierarquização racial. Quanto ao segundo critério o adotado pelo legislador Constitucional, a cada um segundo a sua capacidade – "Associadas aos princípios de igual satisfação das necessidades fundamentais e igualdade de oportunidades, regras de distribuição inigualitária possibilitam uma competição menos desigual, eis que pelo menos teoricamente. A ocupação final de cada um dependerá da sua capacidade ou habilidade. A meritocracia, propugnada por Young, in The rise of meritocracy, determina deva " Observa-se que o princípio (in) igualitário da meritocracia esta ligado com as regras da igualdade de oportunidades e de satisfação das necessidades fundamentais, mas é incompatível com outra regra de nivelamento; a cada um segundo a sua necessidade não levada em conta a capacidade".(ABREU, Sérgio. Os Descaminhos da Tolerância: O Afro-brasileiro e o princípio da igualdade e da Isonomia no Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001).

          66.8. Assim leciona Patrícia Fontes Marçal, in Estudo Comparado do Preâmbulo da Constituição Federal do Brasil: Forense, Rio de Janeiro. 2001: "É insuficiente portanto a afirmação de que o princípio da igualdade consiste em "tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais". A afirmativa é tautológica, ou seja, devemos saber quem são os iguais e quem são os desiguais. O princípio resta vago uma vez que pode lesar as pessoas que deveriam estar incluídas na norma, e algumas vezes, deixar de acolher outras que deveriam estar envolvidas pela norma.(...) Na verdade, o objetivo da norma é tratar de igual forma todos que estivessem na mesma situação, prevenindo o cidadão contra arbítrio e a discriminação infundada".

          66.9. Adotando as características dos direitos humanos consagrados a partir da Conferência Mundial de Direitos Humanos realizada na cidade de Viena em 1993 que categorizou os direitos humanos em universais, indivisíveis e interdependentes, a Terceira Conferência Mundial de Direitos Humanos, realizada em Durban, África do Sul, no ano de 2001, cuja temática versou acerca do combate ao racismo discriminação racial, xenofobia e intolerâncias correlatas, adotou na sua Declaração e Programa de Ação as políticas de ação afirmativa, com o propósito de instar os Estados-Partes a implementarem políticas públicas de superação de desigualdades às suas populações vulneráveis, dentro dos critérios consagrados na Declaração de Viena.

          66.10. Nesse sentido, a Educação integra naquela Declaração e Programa de Ação o compromisso dos Estados-Partes na superação e adoção de políticas públicas e legislação interna, de proteção particularizada às populações vulneráveis. A participação do Brasil foi importante, por representarmos a segunda maior população de afro-descendentes do planeta.

          66.11. O processo preparatório contou não só nas pré-Conferências, bem como nos encontros nacionais com a atuação da população afro-brasileira através das suas organizações não-governamentais. O resultado desta Conferência foi o reconhecimento, por parte do Estado brasileiro, da existência do racismo e da discriminação racial.

          66.12. O Programa Nacional de Direitos Humanos, vinculado ao Ministério da Justiça, já contemplava a adoção de políticas públicas de equalização das disparidades, bem como o atual governo, recém empossado.

          66.13. Portanto, resta ao Estado brasileiro o compromisso jurídico-político, no âmbito das relações internacionais, bem como, perante a sociedade civil, quanto à implementação das políticas de ação afirmativa, cuja cota e espécie do gênero.

          66.14. No campo do Direito Internacional dos Direitos Humanos, a problemática que envolve a dualidade inclusão/exclusão, sob a perspectiva racial, é o cerne das iniqüidades que violam a idéia de universalidade, indivisibilidade e interdependência.

          66.15. A educação está inserida nos direitos sociais econômicos e culturais e não pode ser dissociada dos direitos civis e políticos, dado o caráter de universalidade, interdependência e indivisibilidade.

          66.16. O texto Constitucional, já em seu Preâmbulo, coloca o Brasil como uma sociedade multicultural e pluralista. O "conceito de democracia pluralista envolve toda a substância da Constituição, e seus princípios informam como sua provisões devem ser interpretadas. Devido ao princípio da unidade da Constituição, o intérprete tem de considerar as normas constitucionais em seu conjunto, globalmente, conciliando as tensões existentes". (MAIA, Luciano Mariz, Seminários Regionais Preparatórios para a Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e IntolerÂncia Correlata. Os direitos das Minorias Étnicas. Anais do Ministério da Justiça do Brasil).

          66.17. É nesse sentido, que o cariz do texto Fundamental, multicultural e pluriétnico, consagra inclusive nos artigos 215 e 216, a proteção étnico-cultural dos grupamentos formadores do processo civilizatório nacional, com proteção particular às populações afro-brasileiras.

          66.18. Despiciendo, o tour de force hermenêutico, uma vez que, os princípios da carta geratriz são informadores da igualdade material, substancial. Não cabe dúvida, o conceito de cidadania visa à superação da dualidade inclusão/exclusão.

          66.19. Vale destacar a Convenção Relativa à luta contra a Discriminação no Campo do Ensino, Aprovada pelo Decreto Legislativo nº 40, de 1967 (DO 17.11.67), bem como, a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, adotada pela Resolução nº 2.106, da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 21. 12. 1965. O último instrumento retro mencionado, no item 4 do artigo 1º dispõe que: "Não serão consideradas discriminação racial as medidas especiais tomadas com o único objetivo de assegurar progresso adequado de certos grupos raciais ou técnicos ou de indivíduos que necessitem da proteção que possa ser necessária para proporcionar a tais grupos ou indivíduos de igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais, contanto que tais medidas não conduzam, em conseqüência, à manutenção de direitos separados para diferentes grupos raciais e não prossigam após terem sido alcançados os seus objetivos".

          66.20. Seguindo a mesma esteira ideo-jurídica temos, a Declaração dos Princípios Acerca da Tolerância. Proclamada e assinada em 16 de novembro de 1995, traz a seguinte dicção: "Enfatizando as responsabilidades dos Estados Membros no desenvolvimento e encorajamento do respeito pelos direitos humanos e liberdades fundamentais para todos sem discriminação de raça, gênero, língua, origem, religião ou deficiência, e no combate à intolerância".

          66.21. A CFRB assegura como fundamento da República: I - omissis; II cidadania; III - dignidade da pessoa humana; IV - omissis: V – omissis. Constituindo objetivos fundamentais da RFB: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - omissis; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Nas relações internacionais rege-se pelos seguintes princípios: I - omissis; II - prevalência dos direitos humanos; III - omissis; IV - omissis; V - omissis; VI - omissis; VII - omissis; VIII- repúdio ao terrorismo e ao racismo; (...).

          66.22. O inciso LXXVII, § 2º do artigo 5º, da CRFB dispõe que: "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais que a República Federativa do Brasil seja parte". Tal dispositivo integra os tratados e convenções de direitos humanos no cardápio de direitos fundamentais, a exemplo da Constituição Portuguesa 1976 (art. 16, I) e do Texto Francês de 1958 e norte-americano, 1791, Emenda IX).

          66.23. Portanto, coube ao legislador infraconstitucional, a elaboração de norma que atendesse ao disposto no item 4, do artigo 1º, da Convenção Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, e demais instrumentos jurídicos internacionais versando sobre a matéria os quais o Brasil ratificou.

          66.24. Nesse sentido, a ausência de norma infraconstitucional regulando a matéria, implicaria na inconstitucionalidade por omissão.

          66.25. O artigo 208 da CRFB dispõe que: O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: inciso V: acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um. José Carlos Gal (In: Linhas Mestras da Constituição Federal de 1988, São Paulo: Saraiva, 1989) leciona que: "O direito à educação faz-se um direito de todos, porque a educação já não é um processo de especialização de alguns para certas funções na sociedade, mas a formação de cada um e de todos para a sua contribuição à sociedade nacional, que quer construir com a modificação do tipo de trabalho e do tipo de relações humanas".

          66.26. Prossegue o autor: "Uma análise mais profunda mostra, no entanto, que parte extremamente importante das desigualdades na distribuição dos rendimentos, na sociedade moderna a, deriva não do fato de o patrimônio ser distribuído desigualmente, mas do fato de que alguns gozam da felicidade de ter acesso ao ensino e outros não. Aqueles que têm a oportunidade de acesso ao ensino conseguiram instrumentalizar-se de tal forma, que constroem uma diferencial de rentabilidade que perdura por toda a vida. É evidente, em estudos empíricos muito cuidadosos, que parte extremamente importante da desigualdade na distribuição de rendimentos é devido ao nível de escolaridade e à diferença da taxa de retorno da educação, mais do que qualquer outra variável".

          66.27. A hermenêutica constitucional coloca como, raison d’être, do Estado Democrático de Direito, conforme visto nos dispositivos constitucionais retromencionados, a justiça, a solidariedade, o pluralismo e o combate às desigualdades sociais e regionais. Portanto, a retórica liberal da igualdade formal, não pertence mais aos objetivos do Estados brasileiro.

          66.28. É fácil de verificar que a articulação desses direitos constitucionalmente consagrados, ao revés do passado, visa a superação dos obstáculos que pessoas e grupamentos étnico-raciais vitimizados pelo colonialismo escravista. A meritocracia nada mais é do que a perpetração das desigualdades. O dever do "Estado é garantir a todos o acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um".

          66.29. Segundo a capacidade de cada um, não é o mesmo que segundo o mérito, por uma razão muito simples, para haver mérito é preciso que haja oportunidade. A Universidade deve obedecer aos princípios do Texto Fundamental. O ingresso de grupamentos de étnico-culturais na universidade garante a pluralidade, própria da diversidade propalada pelo texto maior. O fruto da diversidade étnico-cultural eleva a qualidade da produção acadêmica que deve ser vista não a partir de uma perspectiva individualista-meritocrática, que não permite que outros seguimentos da sociedade possam participar da produção intelectual.

          66.30. Contrário senso, além da concentração racial da riqueza haverá, também, a concentração etnocêntrica da produção acadêmica. Não resta dúvida, que seria uma contradição nos próprios termos, a universidade negando a universalidade do conhecimento por não oportunizar, em conseqüência dos mecanismos sociais e políticos de exclusão, a contribuição daqueles que foram e são um dos seguimentos responsáveis pelo processo civilizatório nacional, segundo o texto constitucional.

          66.31. Aferir a capacidade de cada um é levar em conta a sua história, o seu passado e as suas habilidades. Não há de haver hegemonia de valores étnico-raciais como critério de ingresso na universidade. O mérito nesse sentido seria a preservação de valores mantenedores da exclusão. A devolução para o meio social dos conhecimentos construídos na diversidade é sumamente relevante. A diversidade de acordo com o Texto Maior está nas formas de expressão, nos modos de criar, fazer e viver, bem como nas criações científicas, artísticas e tecnológicas.

          67. Trecho págs. 19-41, item 40 a 96, da inicial:

          67.1. Muitas das questões suscitadas nos itens acima destacados, estão relacionados aos temas debatidos nos itens anteriores aos mesmos, pelo que adiante se fará apenas algumas considerações finais, mesmo porque a questão será melhor analisada e exposta nos memoriais requeridos, que ora se reitera.

          67.2. DA RAZOABILIDADE DO LEGISLADOR NA PRODUÇÃO DAS LEIS IMPUGNADAS:

          Na hipótese dos autos, quando se questiona a possibilidade de utilização de ações afirmativas pelo Estado, para equalizar desigualdades concretas, no caso afro-brasileiros, portadores de necessidades especiais e pobres em geral, DENTRO DE UMA UNIVERSIDADE PÚBLICA, nada mais razoável e proporcional.

          67.3. Estes são, talvez, pela quantidade ou qualidade, os mais afastados da sociedade inclusiva neste país, e continuam sem muita ajuda do Poder Público, vivendo à própria sorte.

          67.4. A Situação dos afro-brasileiros à luz de Indicadores Sócio-Econômicos (v. SILVA, Luiz Fernando Martins da. Racismo e desigualdade social na ordem do dia. Revista Jurídica Virtual Jus Navigandi. Acesso em: 23. março. 2003. Disponível em: www.jus.com.br).

          67.5 A exclusão do afro-brasileiro tem sido colocada em evidência por diversas análises de natureza sociológica e antropológica, e é até mesmo constatável a partir da simples visualização de dados estatísticos. Filosoficamente, o agitado debate acerca da problemática igualdade x desigualdade, enquanto ethos das sociedades democráticas, supera o ideal liberal clássico que sustentava a igualdade enquanto valor totêmico, não desfrutado materialmente pelos "socialmente indesejáveis".

          67.6. Algumas conclusões de relatórios de organizações de idoneidade insuspeitável descrevem o dramático cenário do lugar do afro-brasileiro no mercado de trabalho e na educação. As análises estatísticas das relações raciais no Brasil ratificam o quanto o escravismo influenciou na estratificação social, sobretudo na concentração racial da riqueza.

          67.7. O atual censo demográfico brasileiro adotou como uma das formas de classificação da população, o critério cor. De acordo com tal critério os brasileiros foram classificados como: amarelos, brancos, índios, negros e pardos. Negros e pardos no Brasil, segundo o censo, são cerca de 45% da população, perfazendo algo em torno de 70 milhões de pessoas. A questão cultural e étnica passa au delà dessas estatísticas. O Brasil possui a maior população negra fora da África. É a segunda maior população negra do mundo, só inferior numericamente à população do mais populoso país africano, a Nigéria.

          67.8. Uma análise dos indicadores sociais que o IBGE publicou em 1999, permite aferir que a população branca ocupada tinha um rendimento médio de 5 salários mínimos, enquanto os negros e pardos alcançavam valores em torno de 2 salários mínimos; ou seja, menos da metade dos rendimentos médios dos brancos. Estas informações confirmam a existência e a manutenção de uma significativa desigualdade de renda entre brancos, negros e pardos na sociedade brasileira.

          67.9. O "Instituto Sindical Interamericano pela Igualdade Racial" (INSPIR), em trabalho também publicado em 1999, intitulado "Mapa da População Negra no Mercado de Trabalho", concluiu que "os resultados da pesquisa trazem um conjunto de informações que demonstram uma situação de reiterada desigualdade para negros, de ambos os sexos, no mercado de trabalho das seis regiões estudadas, independentemente da maior ou menor presença da raça negra nestas regiões. (INSPIR, 1999)

          67.10. A similitude das conclusões das duas instituições citadas, demonstra que a discriminação racial é um fato presente, cotidiano. Nenhum outro fato, que não a utilização de critérios discriminatórios baseados na cor dos indivíduos, pode explicar os indicadores sistematicamente desfavoráveis aos trabalhadores negros, seja qual for o aspecto considerado.

          67.11. No mesmo sentido, a "Inter-American Commission on Human Rights" (IACHR), no relatório sobre a situação dos direitos humanos no Brasil, observa que "a expressão principal dessas disparidades raciais é a distribuição desigual da riqueza e de oportunidades" .

          67.12. No que se refere à renda dentro do nível de pobreza, o relatório informa que, em 1995, 50% dos negros auferiam renda mensal inferior a dois salários mínimos (US$ 270), ao passo que 40% dos brancos estavam nessa situação. Quanto aos salários altos, informa: "ao passo que 16% dos brancos recebiam mais de dez salários mínimos, a proporção entre negros era de 6%". (IACHR, cap. IX, item a.2).

          67.13. Em 2000, a ONU elaborou um programa (PNUD) para, com base na construção de um índice, medir o desenvolvimento humano (IDH). O índice, um indicador sintético, agregou três variáveis: renda per capita, longevidade e alfabetização combinada com a taxa de escolaridade. Com base nesse indicador, o PNUD classificou 174 países num ranking. O Brasil ocupou o 74º lugar, sendo considerado um país de médio índice de desenvolvimento humano.

          67.14. Recentemente, estudo sobre os indicadores de desenvolvimento humano, realizado pelo projeto "Brasil 2000 – Novos Marcos para as Relações Raciais" (Fase), valendo-se da mesma metodologia do PNUD, mediu as disparidades entre os grupos étnicos branco e afro-descendente. As bases de dados utilizadas foram as da Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar (PNAD) de 1998 (4). O estudo constatou o alto grau de desigualdade entre negros e brancos no país.

          67.15. Aplicado o mesmo indicador para a população branca, nosso país ocupa a 49ª posição. Aplicado à população afro-descendente, o Brasil está na escandalosa 108º posição (5). O IDH, se calculado para os brancos (0,791) colocaria o Brasil quase como um país de desenvolvimento humano elevado (último país no ranking tem 0,801 de índice). Já se calculado para os afro-descendentes, o Brasil teria um IDH abaixo de países africanos como a Argélia e muito abaixo de países americanos de maioria negra como Trinidad Tobago. Comparado à África do Sul, o Brasil estaria sete pontos abaixo desse país, recém saído de um regime segregacionista.

          67.16. O "Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas" (IPEA) mostra que quase não mudou, desde os anos 50, a distância entre a escolaridade de brancos e negros de mais de 25 anos. O trabalho tem como fonte a "Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios" (PNAD), de 1999. Os brancos têm sempre dois anos e meio a mais de escolaridade. No último meio século, o padrão da discriminação racial, no que se refere à escolaridade, manteve-se estável, concluiu Ricardo Henriques, coordenador do estudo.

          67.17. Neste contexto, há de ser mencionado o trabalho de Daniel Sarmento, no qual propõe que para que haja uma prestação positiva do Estado para reduzir os direitos do cidadão é necessária a adoção do princípio da proporcionalidade, que na prática nada mais é do que a razoabilidade da solução encontrada pelo administrador público. O princípio da proporcionalidade deve ser equacionado da seguinte forma:

          a) adequação – a medida deve ser adequada a sanar os malefícios a que se visa por termo;

          b) necessidade – em função do panorama existente deve haver necessidade na tomada da solução que se depare com a restrição a direitos fundamentais de outrem.

          c) proporcionalidade em sentido estrito – entre os requisitos acima deve haver uma proporcionalidade, com intuito das medidas tomadas pelo Poder Público não sejam arbitrárias.

          67.18. Pelo todo exposto, temos que as medidas legais adotadas são proporcionais aos fins que se destinam, já que com a adoção do sistema de cotas, pretende-se criar uma democracia inclusiva.

          68. DA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DOS COMPONENTES DA FEDERAÇÃO X TEORIA GERAL DO DEFERALISMO DEMOCRÁTICO:

          Não assiste razão à Requerente. A legislação sobre a Educação é de interesse de todos os componentes da Federação. E, esta Forma de Estado, ancorada no princípio da subsidiariedade, é indispensável às democracias modernas, justamente porque lhes permite a melhor forma de equalizar os problemas sócio-políticos de um País.

          68.1. Quando se fala em Federação num sistema democrático, fala-se sobre qual é o papel do sistema federal como mecanismo de fortalecimento da descentralização e da democracia. Dentro do mesmo tema, é capital às relações entre a Federação e o Poder Judiciário, em face da necessidade da proteção do Judiciário, como órgão neutral imbuído da capacidade fundamental de resolução dos conflitos potencialmente existentes entre os entes federativos.

          68.2. Mas o principal, e que nos interessa, é quanto o sistema federativo pode ser um instrumento fundamental para o Estado Democrático transformar a realidade social, "também porque a democracia, em contexto marcado por heterogeneidades de base territorial (que podem ser tradução de heterogeneidades lingüísticas, religiosas ou étnicas), só pode subsistir sob a forma federada".

          68.3. Isso faz muito mais sentido, quando lemos no Inciso V, do artigo 23, da Constituição Federal, que:

          "Art. 23: É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

          "V. Proporcionar os meios de acesso à cultura, é educação, e à ciência".

          "Combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a integração social nos setores desfavorecidos".

          68.4. Nesse mesmo rumo, temos ainda o artigo 24, inciso IX, e seus parágrafos, da CRFB:

          Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

          IX - educação, cultura, ensino e desporto;

          § 1º - No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.

          § 2º - A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

          § 3º - Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

          § 4º - A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.

          68.5. Com tudo isso, concluímos, que a Requerente não tem razão no particular, eis que "tendo em vista a composição pluralista, preferivelmente subsidiária, de entes autônomos, o Estado federal possui a peculiaridade capaz de assim se transformar num agente regulador da convivência harmônica entre os grupos territoriais, reunidos para tanto num pacto federativo, mas também nacional e de união perpétua". (ZIMMERMANN, Augusto. Teoria Geral do Federalismo Democrático. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 1999, p.47).

          69. DAS CRÍTICAS DE EDUCADORES CONTRA A AÇÃO AFIRMATIVA E AS COTAS E SEUS BENEFÍCIOS:

          Muitos dos argumentos expostos pela Requerente para este tema já foram suficientemente debatidos ao início da presente, mas não podemos deixar de apresentar as argumentações de Peter Singer, professor de filosofia da Universidade de Princeton, sobre os motivos e benefícios que as ações afirmativas e as cotas no âmbito da educação trazem para as minorias e a sociedade onde as mesmas estão inseridas:

          "Outra maneira de defender uma decisão de aceitar um aluno vindo da minoria em detrimento de um aluno do grupo majoritário que se saiu melhor no exame de admissão seria afirmar que os testes padrão não oferecem uma indicação precisa da aptidão quando um aluno foi seriamente desfavorecido. Isso está de acordo com a questão levantada na seção anterior, quando nos referimos à impossibilidade de chegar à igualdade de oportunidades. A educação e os antecedentes familiares provavelmente influenciam os resultados obtidos em testes. Um aluno com um histórico de privações que obtenha 55% num exame de admissão pode ter melhores perspectivas de se formar em pouco tempo do que um aluno mais privilegiado, que tenha obtido 70%. O ajuste, com base nisso, dos pontos obtidos em testes não significaria admitir alunos de grupos minoritários e desfavorecidos em detrimento de alunos com melhor qualificação. Refletiria uma decisão de que os alunos desfavorecidos tinham, de fato, melhor qualificação do que outros. Isso não configuraria nenhum tipo de discriminação racial". (Op. cit., p. 56).

          "Dentro do objetivo geral da igualdade social, a maior representatividade das minorias em profissões como a advocacia e a medicina é desejável por várias razões. Os membros de grupos minoritários são os mais propensos a trabalhar junto aos seus iguais do que os que vêm dos grupos étnicos dominantes, e isso pode ajudar a superar a escassez de médicos e advogados que se verifica nas comunidades pobres, onde vive a maior parte dos membros das minorias menos favorecidas. Eles também podem compreender os problemas dos pobres melhor que os que provêm de famílias abastadas. Médicas e advogadas, bem como estes profissionais oriundos de minorias, podem servir de modelo para outros membros de grupos minoritários e para as mulheres, rompendo as barreiras mentais inconscientes contra a aspiração ao exercício de tais profissões. Por fim, a existência de grupos diferentes de estudantes ajudará os membros do grupo étnico dominante a aprender mais sobre as atitudes dos afro-americanos e das mulheres, o que lhes dará melhores condições de servir a comunidade enquanto médicos e advogados".(Op. cit., p. 59).

          70. ALGUMAS CITAÇÕES DE RONALD DWORKIN SOBRE O CASE REGENTES DA UNIVERSIDADE DA CALIFORNIA CONTRA ALLAN BAKKE (1977):

          Vale a pena trazer à colação algumas considerações que o filósofo do Direito norte-americano Ronald Dworkin trouxe ao debate nos EUA, sobre as cotas raciais e ações afirmativas para minorais, quando do julgamento do case Bakke, pois entendemos que algumas questões se aplicam ao caso concreto:

          "Em 12 de outubro de 1977, o Supremo Tribunal ouviu a sustentação oral no caso Regentes da Universidade da Califórnia contra Allan Bake" (...)..

          "(...) Portanto, é a pior incompreensão possível supor que os programas de ação afirmativa têm como intuito produzir uma América balcanizada, dividida em subnações raciais e étnicas. Eles usam medidas vigorosas porque as mais suaves fracassaram, mas seu objetivo final é diminuir, não aumentar a importância da raça na vida social e profissional norte-americana".

          "Segundo o censo de 1970, apenas 2,1 por cento dos médicos norte-americanos eram negros. Os programas de ação afirmativa pretendem prover mais médicos negros para atender pacientes negros (...)".

          "A história da campanha contra a injustiça racial desde 1954, quando o Supremo Tribunal decidiu Brown contra Conselho de Educação, é, em grande parte, uma história de fracassos. Não conseguimos reformar a consciência racial de nossa sociedade por meios racionalmente neutros. Portanto, somos obrigados a olhar os argumentos a favor da ação afirmativa com solidariedade e espírito aberto".

          "Archibald Cox, da Escola de Direito de Harvard, falando pela Universidade da Califórnia em uma sustentação oral, disse ao Supremo Tribunal que essa é a escolha que os Estados Unidos devem fazer. Tal como estão as coisas, disse ele, os programas de ação afirmativa são o único meio eficiente de aumentar o número absurdamente baixo de médicos negros".

          "Os programas de ação afirmativa parecem encorajar, por exemplo, um mal-entendido popular, de que eles supõem que grupos raciais ou étnicos têm direito às quotas proporcionais como os negros, chicanos ou índios, têm direito às quotas que os atuais programas lhe oferecem. Isso é um erro óbvio: os programas não se baseiam na idéia de que os que recebem auxílio têm a auxílio, mas apenas na hipótese estratégica de que ajudá-los agora é uma maneira eficaz de atacar um problema nacional".

          "Não há nenhuma combinação de capacidades, méritos e traços que constituam o "mérito" no sentido abstrato; se mãos ágeis contam com "mérito" no caso de um possível cirurgião, é somente porque mãos ágeis irão capacita-lo a atender melhor o público. Se uma pele negra, infelizmente, capacita outro médico a fazer melhor um outro trabalho médico, a pele negra, em prova do que digo, também é um mérito.".

          "Não há, naturalmente, nenhuma sugestão nesse programa de que Bakke divide alguma culpa individual ou coletiva pela injustiça racial nos Estados Unidos, ou que ele tem menos direito a ser tratado com mais consideração ou respeito, que qualquer estudante negro aceito no programa. Ele ficou desapontado e merece a devida solidariedade por essa frustração, assim como qualquer outro candidato desapontado – mesmo um com notas muitos piores, que não teria sido aceito de maneira alguma. Todos ficaram desapontados, porque as vagas em escolas de medicina são recursos escassos que devem ser usados para oferecer à sociedade aquilo de que ela mais necessita. Não é culpa de Bakke que a justiça racial agora seja uma necessidade especial – mas ele não tem o direito de impedir que sejam usadas as medidas mais eficazes para assegurar essa justiça". (DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. São Paulo: Martins Fontes, 2000 – Justiça e Direito - , pp. 437-451).

          71. FALTA DE BASE OBJETIVA PARA DEFINIR O CONCEITO DE RAÇA, PARA IDENTIFICAR OS BENEFICIÁRIOS DAS AÇÕES AFIRMATIVAS OU DAS COTAS:

          71.1. Para finalizar as manifestações das Requerentes, traremos a essa Excelsa Corte, a questão da identificação de quem é negro no Brasil, para os fins de ação afirmativa ou sistemas de cotas. O critério político da auto-definição é o mais correto e democrático, e é utilizado pelos principais pesquisadores e institutos de pesquisas no Brasil (IBGE e IPEA) e no exterior (ONU, OIT).

          71.2. É importante registrar que a metodologia atual do IBGE utiliza a auto-classificação. No último censo, a pessoa entrevistada deveria escolher uma dentre as seguintes categorias: branca, preta, parda, amarela, indígena, respondendo à pergunta qual é a sua cor ou raça? Esse argumento é recorrente em nosso país, e sempre presente entre nós, quando se discute a possibilidade de ações afirmativas. Ora, uma política compensatória só tem razão de ser se a população beneficiária compensa por meio dela uma situação, mais geral, de desvantagem e desprestígio. Tal política compensatória, porque tem um âmbito limitado de validade, não anula a situação desprivilegiada que visa corrigir pontualmente. Tampouco a situação social.

          71.3. Cumpre dizer, que a idéia do senso comum de que o Brasil vive uma democracia racial é o principal fator para que haja um falso juízo de que não existem critérios harmônicos para o estabelecimento de critérios que objetivem se saber quem é o negro e pardo, para o fim de implementação das cotas. Com o mito da democracia racial, que cumpre um papel ideológico, há uma recusa de se reconhecer raças no Brasil. E isso, com diz Joaze Bernardino, em Ação afirmativa e a Rediscussão do Mito é "uma recusa estratégica que ocorre somente em momentos de conceder eventuais benefícios àqueles que são identificados como membros do grupo de menor status. A não separação de raças do ponto de vista biológico tampouco significa que elas não estejam separadas, do ponto de vista social, da concessão de privilégios e de distribuição de punições morais, econômicas e judiciais. Neste sentido, contrariando a interpretação racial hegemônica no Brasil e respaldado nos diversos estudos da Unesco, advogamos que a raça existe, não como uma categoria biológica, mas como uma categoria social" (Op. Cit., Rio de Janeiro: Estudos Afro-Asiáticos, Ano 24, nº 2, 2002, pp. 255).

          71.4. O termo "raça" refere-se, neste livro, ao uso de diferenças fenotípicas como símbolos de distinção social. Significados raciais são, nesse sentido, culturalmente e não biologicamente construídos, distinguindo-se, a partir da inserção nestas categorias, lugares sociais dominantes e dominados. "Raça é, assim, síntese de diferenças fenotípicas, mas também de status, de classe, de diferenças, em suma, políticas. De modo quem podemos dizer que relações de raça são relações de poder. A partir deste ambiente, constituído por "relações raciais", modos de "consciência racial" emergem. Tal consciência é definida como o resultado dialético do antagonismo entre grupos sociais justamente definidos como raças no curso de um processo histórico". (trecho tirado da resenha feita por Osmundo de Araújo Pinho, publicado na revista Estudos Afro-Asiáticos, Ano 24, nº 2, 2002, p. 416, do livro do cientista político african-american Michel Hanchard, intitulado: Orfeu e Poder. Movimento Negro no Rio e São Paulo. Rio de Janeiro: EdUERJ/UCAM-Centro de Estudos Afro-Asiáticos, 2001).

          71.5. Vale a pena ressaltar, que outras políticas de cotas já foram devidamente implementadas pelo governo federal, que utilizou o critério da auto-definição para a identificação racial de negro ou pardo, sem que houvesse nenhuma polêmica ou argüição de inconstitucionalidade. É o caso do Programa de Ação Afirmativa do Instituto Rio Branco, lançado em cerimônia presidida pelo Chanceler Celso Lafer, em 14 de maio de 2002, que ofereceu 20 bolsas anuais candidatos afro-descendentes que desejem se preparar para o concurso do Instituto Rio Branco, com vistas ao ingresso na carreira diplomática. (vide site: através do site www.mre.gov.br/irbr). A comunidade indígena da Amazônia também já foi contemplada com a sua cota, pois conseguiram que a Universidade Federal do Amazonas abrisse um curso de graduação para os povos indígenas, no qual o ingresso dos índios é diferenciado.

          71.5. O Hédio Silva Jr., professor e advogado, em artigo recente publicado na Folha de São Paulo, sintetizou muito bem a compreensão que tema exige, sintetizando toda a polêmica:

          "Há uma base objetiva para definir o conceito de raça? SIM. Preto é cor, negro é raça.

          O refrão de uma marchinha carnavalesca, de amplo domínio público, oferece uma pista interessante para a compreensão do critério objetivo que a sociedade brasileira emprega para a classificação racial das pessoas: "O teu cabelo não nega, mulata, porque és mulata na cor; mas como a cor não pega, mulata, mulata eu quero o teu amor".

          Escrita por Lamartine Babo para o Carnaval de 1932, a marchinha realça a ambigüidade das relações raciais, ao mesmo tempo em que ilustra a opção nacional pela aparência, pelo fenótipo. Honesto e preconceituoso em sua definição de negro, Lamartine contribui mais para o debate sobre classificação racial do que muitos doutores.

          Com efeito, ao contrário do que pensa o presidente eleito, bem como certos acadêmicos, os cientistas pouco podem fazer nesta seara, além de, em regra, exibirem seus próprios preconceitos ou seu compromisso racial com a manutenção das coisas como elas estão.

          Primeiro porque, como se sabe, raça é conceito científico inaplicável à espécie humana, de modo que o vocábulo raça adquire relevância na semântica e na vida apenas naquelas sociedades em que a cor da pele, o fenótipo dos indivíduos, é relevante para a distribuição de direitos e oportunidades.

          Segundo, porque as pessoas não nascem negras ou brancas; enfim, não nascem "racializadas". É a experiência da vida em sociedade que as torna negras ou brancas.

          "Todos sabem como se tratam os pretos", asseveram Caetano Veloso na canção "Haiti".

          Em sendo um fenômeno relacional, a classificação racial dos indivíduos repousa menos em qualquer postulado científico e mais nas regras que regem as relações, intersubjetivas, econômicas e políticas no passado e no presente.

          Negro e branco designam, portanto, categorias essencialmente políticas: é negro quem é tratado socialmente como negro, independentemente de tonalidade cromática. É branco aquele indivíduo que, no cotidiano, nas estatísticas e nos indicadores sociais, abocanha privilégios materiais e simbólicos resultantes do possível mérito de ser branco. Esse sistema funciona perfeitamente bem no Brasil desde tempos imemoriais.

          A título de exemplo, desde a primeira metade do século passado, a Lei das Estatísticas Criminais prevê a classificação racial de vítimas e acusados por meio do critério da cor. Emprega-se aqui a técnica da hetero-classificação, visto que ao escrivão de polícia compete classificar, o que é criticado pela demografia, que entende ser mais recomendável, do ângulo ético e metodológico, a auto-classificação.

          Há um outro banco de dados no qual o método empregado é o da auto-classificação: o Cadastro Nacional de Identificação Civil, feito com base na ficha de identificação civil, a partir da qual é emitida a cédula de identidade, o popular RG. Trata-se de uma ficha que pode ser adquirida em qualquer papelaria, cujo formulário, inspirado no aludido Decreto-Lei das Estatísticas Criminais, contém a rubrica "cútis", neologismo empregado para designar cor da pele. Assim, todas as pessoas portadoras de RG possuem em suas fichas de identificação civil a informação sobre sua cor, lançada, em regra, por elas próprias.

          Vê-se, pois, que o Cadastro Nacional de Identificação Civil oferece uma referência objetiva e disponível para o suposto problema da classificação racial: qualquer indivíduo cuja ficha de identificação civil, dele próprio ou de seus ascendentes (mãe ou pai), indicar cor diversa de branca, amarela ou indígena, terá direito a reivindicar acesso a políticas de promoção da igualdade racial e estará habilitado para registrar seu filho ou filha como preto/negro. Fora dos domínios de uma solução pragmática, o procedimento de classificação racial, que durante cinco séculos funcionou na mais perfeita harmonia, corre o risco de se tornar, agora, um terrífico dilema, insolúvel, poderoso o bastante para paralisar o debate sobre políticas de promoção da igualdade racial.

          No passado nunca ninguém teve dúvidas sobre se éramos negros. Quiçá no futuro possamos ser apenas seres humanos" (Hédio Silva Júnior, coordenador do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades e consultor da Unesco. Foi relator do documento brasileiro apresentado na conferência da ONU sobre racismo, em Durban).


VII. DOS PEDIDOS:

          Diante do exposto, os Peticionantes requerem a V. Ex.ª:

          a. admissão das Requerentes nos autos, na qualidade de amicus curiae, com direito de apresentar memorial, fazer sustentação oral, produzir oitiva de peritos e testemunhas de notório saber teorético e empírico sobre o tema versado nos autos;

          b. deferimento do pedido da assistência judiciária gratuita;

          c. indeferimento do pedido de concessão de medida liminar, em face da ausência de motivos de ordem pública ou periculum in mora; conhecimento e deferimento das preliminares suscitadas, de carência de ação e de litispendência, com decretação da extinção do processo sem a apreciação e julgamento do mérito, ou, no mérito, seja julgada improcedente a presente ação direta de inconstitucionalidade.

           d. Suspensão do andamento das Representações por Inconstitucionalidade em curso no Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, sob os nº 2003.007.00020 e 2003.007.00021, expedindo-se ofício ao Egrégio Tribunal de Justiça Estadual para esse fim.

Pede Deferimento.

Rio de Janeiro, 4 de abril de 2003.

Luiz Fernando Martins da Silva
OAB/RJ nº 57.095

Humberto Adami Santos Junior
OAB/RJ nº 830-B

Sergio Luiz da Silva de Abreu
OAB/RJ nº 53.479



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Luiz F. M.; S. JUNIOR, Humberto et al. ADIN contra a lei de quotas para negros no vestibular: intervenção de entidades afro-brasileiras como "amicus curiae". Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 65, 1 maio 2003. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16572. Acesso em: 25 abr. 2024.