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Trabalho infantil

Trabalho infantil

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A título de intróito, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, consigna que criança é a pessoa com faixa etária entre 0 a 12 anos incompletos; adolescente, aqueles com idade entre 12 e 18. A realidade de muitas dessas crianças e adolescentes, embora a sociedade hipocritamente não enxergue, é iníqua à sua formação como pessoa, ser humano. É irrefutável que as crianças deveriam estar estudando e brincando, pois só o estudo lhes permitirá um futuro melhor. Quanto à necessidade de brincar, parece despiciendo tecer comentários. A brincadeira é fator essencial no desenvolvimento psicossocial da criança. Todavia, há muitos adultos que não se recordam de sua infância, pois não a fruíram. E o pior é que há crianças, e não são poucas, nos dias hodiernos, que têm a sua infância usurpada pelo trabalho.


O exército de trabalhadores infantis perfaz 400 milhões de "soldados". São crianças e adolescentes alijados de qualquer expectativa de futuro. As maiores incidências de exploração estão na Ásia (61%), e na África (30%). Na América Latina, 20%. No Brasil, segundo estimativas da Unicef, há 9,3 milhões de crianças e adolescentes sendo explorados, e expostos a uma mutilação física e psicológica.

Oportuno desmascarar alguns mitos arraigados na sociedade capitalista, a saber: a) O trabalho é necessário à formação da criança; b) A criança que labuta fica mais esperta, com melhores oportunidades de inserção no mercado de trabalho, e c) O trabalho enobrece a criança. São verdadeiras falácias, haja vista que o trabalho infantil afeta diretamente à freqüência escolar e, como corolário, engendra uma maior dificuldade no aprendizado. Assim, a fadiga além de debilitar o seu estado físico favorece acidentes de trabalho.

É terrificante saber que um terço das crianças começam a trabalhar antes de completarem 10 anos de idade. A sociedade promove uma estranha e enigmática onda de tolerância ao trabalho infantil.

Se não bastasse tudo o que se disse, há uma variante do trabalho infantil que nos envergonha, isto é, a prostituição infantil. Trata-se da "locação" do corpo da criança a adultos, para que estes satisfaçam suas mais pérfidas fantasias sexuais.

Suporte jurídico para erradicação do trabalho infantil há. Basta uma lacônica leitura da nova redação dada ao art. 7º, XXXIII (EC nº 20), e também do art. 227. Ambos da Constituição Federal. Deve-se ler, ainda, dentre outros, o art. 67 da Lei 8.069/90 – ECA.


Enfim, mister trazer à colação alguns fatores que contribuem para a retroalimentação do trabalho infantil, a saber: concentração de renda; desemprego; falta de uma política educacional eficaz; precarização (flexibilização) das leis do trabalho, ..., e o fator ideológico do trabalho (ele enobrece; faz bem à criança). A Carta da Unicef elucida que a preferência dos empregadores pela mão-de-obra infantil ocorre porque esta é "mais hábil, mais dócil, mais explorável e menos custosa". Com efeito, não se pode fechar os olhos a essa realidade do trabalho infantil, muitas vezes em regime de escravidão. Albert Einstein, imortal cientista, propugnava que: "A palavra progresso não terá qualquer sentido enquanto houver crianças infelizes."


Autor

  • Augusto Cesar Ramos

    Augusto Cesar Ramos

    advogado, especialista em Direito e Processo do Trabalho pelo CESUSC

    é autor dos livros “Direito e Sociedade: ensaios para uma reflexão crítica” (Tubarão: UNISUL, 2001) e “Eutanásia: aspectos éticos e jurídicos da morte” (Florianópolis: OAB/SC, 2003), ex-aluno da Escola da Magistratura do Trabalho da AMATRA XII, e sócio da Casa da Cultura Jurídica e do Instituto de Direito Alternativo.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAMOS, Augusto Cesar. Trabalho infantil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 40, 1 mar. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1663. Acesso em: 24 abr. 2024.