Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/17863
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Uma análise hermenêutica no atual Estado de Direito sobre os bens da União e a cobrança de taxas de marinha na ilha de Vitória

Uma análise hermenêutica no atual Estado de Direito sobre os bens da União e a cobrança de taxas de marinha na ilha de Vitória

Publicado em . Elaborado em .

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo científico tem como objetivo realizar um exercício hermenêutico sobre a alteração realizada no art. 20, IV, da Constituição da República Federativa do Brasil, pela Emenda Constitucional nº 46 de 2005, que exclui dos bens da União as ilhas costeiras ou oceânicas que contenham o município capital de Estado.

Isso porque a Secretaria de Patrimônio da União (SPU), órgão competente pela guarda e preservação dos bens da União, apresenta uma interpretação que vai de encontro com a emenda constitucional aprovada, fazendo com que tal implemento constitucional não alterasse em aspecto algum a vida e a cobrança de taxas de marinha sobre a sociedade.

Isso gera insegurança e sentimento de injustiça social vez que a população é "constrangida" a contribuir simultaneamente com o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e com as taxas de marinha, o que caracteriza uma bitributação.

Com base neste ponto de discordância sobre a incidência ou não da cobrança das terras de marinha na sociedade capixaba, vez que a ilha de Vitória prima facie é contemplada pela EC nº 46/2005, é que foi proposto este artigo, o qual foi produzido com uma pesquisa de natureza qualitativa, calcado nas vertentes jurídico-dogmática e jurídico-sociológica, e apoiado em levantamentos bibliográficos e documentais.

O raciocínio utilizado para resultar em uma interpretação vigente do atual Estado de Direito como fonte de orientação social de leitura do trecho constitucional em questão, foi o hipotético-dedutivo. Isso porque partiu-se da insatisfação teórica sobre a interpretação meramente literal realizada pela SPU das implicações trazidas pela emenda constitucional, para defender a hipótese de que outros métodos interpretativos (sistemático, exegético e histórico-evolutivo) devem ser instrumentalizados no caso em questão, a fim de garantir a melhor interpretação do texto constitucional, em consonância com uma interpretação conforme à Constituição.


2. CONTEXTUALIZAÇÃO DO SURGIMENTO DO ESTADO CONSTITUCIONAL DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Estado, numa acepção mais formalista, é

[...] uma sociedade, pois se constitui essencialmente de um grupo de indivíduos unidos e organizados permanentemente para realizar um objetivo comum. E se denomina sociedade política, porque, tendo sua organização determinada por normas de Direito positivo, é hierarquizada na forma de governantes e governados e tem uma finalidade própria, o bem público. (AZAMBUJA, 2005, p. 2) (grifos no original)

Por essa definição, é a partir da criação do Estado que as normas jurídicas instituidoras de direitos passam a ser elaboradas por meio da sociedade, representada por seus mandatários eleitos, sendo essas normas postas positivamente, escrita em livros, de forma livre e socialmente deliberada para garantir as liberdades dos seres humanos, conforme propugnava o Iluminismo moderno.

Neste momento surge então o primeiro paradigma de Estado: o Estado de Direito Liberal. Segundo Santos (2008, p. 47) esse Estado funda-se com "objetivo precípuo de garantir a liberdade, quer positiva, quer negativa, em sua máxima potência".

Por essa ótica, caberia ao Estado determinar positivamente as pautas de condutas jurídicas da sociedade as quais os cidadãos deveriam seguir para garantir a máxima segurança jurídica e ser o único e legítimo detentor do uso da violência física; só assim o Estado poderia fazer valer os comandos normativos para assegurar aos seus signatários a máxima liberdade possível num convívio social.

Porém, quando os cidadãos coadunam com a instauração do Estado, há um preço a se pagar: cada um abre mão de parte da sua liberdade para dá-la ao Estado, para que esse seja dotado de supremacia de poder político (soberania). A soberania "é o grau supremo a que pode atingir esse poder, supremo no sentido de não reconhecer outro poder juridicamente superior a ele, nem igual a ele dentro do mesmo Estado". (AZAMBUJA, 2005, p. 50)

É esta concepção do surgimento do Estado que é observada em Bonavides (2008, p. 37) quando diz

Mas havia um preço a pagar pelas liberdades que seriam auferidas. Consistia ele na alienação de todas as liberdades, trasladadas ao Estado, senhor absoluto da vida e dos comportamentos humanos, pelo menos segundo a tese implícita nessa singular doutrina com que a razão buscou edificar o Estado Moderno. O homem perdia a liberdade, mas ganhava, em troca, a certeza da conservação.

Convém destacar que o surgimento do Estado, e aqui fala-se inicialmente do Estado Liberal, instaura-se num momento propício para combater o poder exacerbado de um Estado Absoluto e sem limites, concentrado na mão de poucos, transferindo esse poder para uma nova concepção, fruto de uma representação popular. Assim, o Estado tem um sentido, conforme Bastos (1995, p.68), de "coroamento de toda luta do indivíduo contra a tirania do Estado" autoritário. E, continua o autor dizendo sobre o Estado Liberal,

O seu pressuposto fundamental é que o máximo de bem-estar comum é atingido em todos os campos com a menor presença possível do Estado. É uma concepção basicamente otimista. Não repudia a natureza humana no que ela tem de egoísta e ambiciosa. Pelo contrário, parte dessa constatação para afirmar que o livre jogo dos diversos egoísmos produzirá o bem-estar coletivo. (BASTOS, 1995, p. 68)

A mínima interferência do Estado nas relações sociais, políticas e econômicas, sendo uma pedra base do Estado Liberal para trazer a felicidade social, fez com que ocorresse uma grande separação entre os detentores do capital (burguesia) e os detentores da mão de obra (operários), acarretando acesso às benesses da sociedade capitalista privilegiadamente aos primeiros.

Essa assertiva é confirmada por Bastos (1995, p. 69) quando diz que "a experiência histórica não confirmou todas as previsões do ideário liberal. Pelo livre jogo das forças econômicas não foi possível atingir o bem-estar da classe trabalhadora."

É neste contexto de descontentamento da classe trabalhadora com as desvantagens na escala social, trazidas pela visão liberal de organização de uma vida boa em sociedade, que aflora o Estado Social, considerado o segundo paradigma de Estado, em substituição ao modelo de Estado Liberal. É assim que orienta a doutrina, ao proferir que

O Estado passou, pois, a assumir um papel, de início, regulador da economia, o que era feito mediante a edição de normas disciplinares da conduta dos agentes econômicos. Num segundo momento, passou ele a protagonizar a própria atividade econômica, criando empresas para tal finalidade, ou participando, em sociedades, dos capitais de empresas privadas. Tornou-se ele, em conseqüência, um grande empregador. Sua burocracia agigantou-se. A vida social ganhou em complexidade. Aos segmentos sociais já existentes vem-se agregar uma poderosa burocracia estatal. (BASTOS, 1995, p. 70)

Esse segundo paradigma impõe ao Estado a necessidade de garantir direitos negativos e direitos positivos, ou seja, além de respeitar direitos negativos, próprios de um Estado de Direito Liberal, no que tange à não interferência na sociedade, incorpora mais alguns direitos, agora positivos, de prestar serviços públicos à sociedade, como forma de promover o bem-estar social, principalmente na condição de garantir o mínimo de direitos para a sobrevivência digna dos indivíduos.

O Estado de Bem-Estar Social, para exercer com eficácia suas atribuições, agigantou a máquina estatal fortalecendo, então, um "poder" dentro do Estado: o Executivo. Essa concentração político-jurídica de poder no Executivo balançou as estruturas do Estado, proporcionando a tendência à regressão para regimes autoritários, o que significaria um retrocesso social e a perda dos direitos já garantidos até então, pois no Estado Social de Direito

[...] permanece sempre sob este – representada por seus grupos políticos e econômicos mais reacionários e violentos – essa tendência e propensão do capitalismo ao controle econômico monopolista e à utilização de métodos políticos de caráter totalitário e ditatorial, visando a evitar, sobretudo, qualquer eventualidade realmente socialista. (SILVA, 2007, p. 116)

Viu-se, desse modo, a necessidade de adaptação do Estado para uma nova situação: mais participação do povo nas decisões, mesmo que indiretamente, uma separação de poderes mais consistente, um comando maior normativo, garantindo o modelo hierárquico de normas, separação da coisa pública da privada, promoção de segurança jurídica, a dignidade da pessoa humana, como núcleo axiológico do sistema jurídico, etc. Surge assim o Estado Constitucional Democrático de Direito conhecido também como terceiro paradigma de Estado Moderno, trazendo um

[...] caráter normativo das Constituições, as quais passam a integrar em plano de juridicidade superior, vinculante e indisponível, em linha de princípio, para todos os poderes do Estado. As normas constitucionais são vinculantes – de tal modo que resta assim superada definitivamente a imagem fraca da juridicidade constitucional característica do período liberal – e estarão situadas acima dos poderes do Estado e fora do campo de ação e conflito políticos. Desta forma, os poderes do Estado não podem dispor do sentido e conteúdo das normas constitucionais – pelo menos em condições de normalidade – e, precisamente por isso, do próprio Direito enquanto realidade constituída (CADEMARTORI, 1999, p. 28).

Neste ínterim, Cademartori (1999, p.29) complementa dizendo que o constitucionalismo

[...] é uma tentativa de superar a debilidade estrutural do âmbito jurídico. A afirmação do caráter jurídico e imediatamente vinculante da Constituição, a sua rigidez e a qualificação de determinados referentes jurídicos, tais como são os direitos fundamentais, são signos deste processo.

A sustentação supra do autor é um ponto importante abarcado pelo terceiro paradigma de Estado, uma vez que traz à baila um assunto constitucional de excelência e que não deve ser esquecido: a garantia da não exclusão dos direitos fundamentais no sistema jurídico brasileiro.

Por falar em direitos fundamentais, é importante destacar que esse novo perfil de Estado abarcou todos os direitos liberais e sociais, entretanto "o Estado constitucional assim teorizado tem um traço de extrema universalidade; nele se inserem todos os direitos fundamentais conhecidos, que se concentram no binômio liberdade e justiça." (BONAVIDES, 2008, p. 52)

Todas as passagens históricas acima apresentadas foram necessárias para compreender que o Estado é uma mera ficção de personalidade jurídica de um grupo de pessoas que se organizam dentro de uma faixa territorial, e para o pleno cumprimento das leis jurídicas é considerado poder supremo dentre todos naquele território.

Neste diapasão, para o pleno exercício das atribuições estatais de fazer ou não fazer, prestar serviços para a sociedade, ou seja, manter sua legitimidade, é necessário ter condições reais para tanto. Logo, é preciso que os signatários participem financeiramente para que a máquina estatal venha a funcionar.

Essa participação é uma forma de abrir mão de parte da liberdade e contribuir para que o Estado venha a prestar o melhor serviço público à sociedade, por meio de uma contrapartida financeira dos cidadãos chamada de tributos. Importa ressaltar que a cobrança de tributos por parte de um Estado Constitucional Democrático de Direito, para ser válida, deve estar em consonância com os preceitos constitucionais, dada a supremacia e a vinculatividade da Constituição Federal vigente frente a todos os atos normativos infraconstitucionais.


3. A CONCEITUAÇÃO DOS TRIBUTOS E A CRIAÇÃO DAS TAXAS DE MARINHA

Para a perfeita funcionalidade do Estado é necessário que os signatários financiem a máquina direta ou indiretamente, e essa participação é realizada pelos tributos, que segundo Ernst Blumenstein (apud, CARVALHO, 2007, p. 21) "[...] são as prestações pecuniárias que o Estado, ou um ente por ele autorizado, em virtude de sua soberania territorial, exige dos sujeitos econômicos que lhe estão submetidos."

Não distante de tal conceito, tem-se a orientação do Código Tributário Nacional que traz o seguinte

Art. 3.º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito [01], instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Por este prisma, os tributos podem ser considerados prestações em que a sociedade contribui para o Estado, de forma compulsória, para que o Estado possa exercer todos os seus deveres postos pelas pautas de condutas positivadas, de forma que não haja obstaculização financeira para tal exercício.

Mister se faz destacar que o tributo é gênero tendo como espécies os impostos, as contribuições de melhoria e as taxas, conforme explica o art. 5º da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, o Código Tributário Nacional (CTN), que orienta todas as esferas da República Federativa do Brasil.

À conta disso, tem-se que o imposto, segundo o CTN em seu art. 16 é "o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte." Por essa idéia, as contraprestações financeiras que não têm lastro com prestações de serviço público são consideradas impostos, incidindo, como exemplo, sobre o comércio exterior, o patrimônio e a renda, a produção e a circulação de mercadorias.

Por outro lado há também o segundo tributo, a contribuição de melhoria, que também tem instituição constitucional [02]. Trata-se de uma contribuição necessária cobrada pelas esferas federais, estaduais e municipais para promover adequações via obras públicas ao entorno dos imóveis dos contribuintes, o que acarreta em decorrência dessas obras públicas uma valorização de seus patrimônios. É essa a orientação legal do CTN em seu art. 81, a ver

Art. 81. A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é instituída para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.

Obviamente que essas contribuições não são constantes, mas sim esporádicas, e devem ser seguidas de várias orientações legais, conforme previsão legal dos artigos supra referendados.

Por fim, tem-se as taxas, que "são tributos instituídos em razão do exercício de poder de polícia [03] ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição." (MORAES, 2006, p. 770) Destaca-se aqui a vinculatividade desse tributo às prestações de serviços públicos. Para Moraes (2006, P. 771), as taxas decorrem de uma atividade estatal, em que "há necessidade de o serviço realizado trazer, em tese, benefício potencial e determinado ao contribuinte que deverá pagá-lo, mesmo que não o utilize."

A orientação doutrinaria supra, pode ser identificada pelo CTN em seu art. 77, que diz

Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.

Convém destacar que o fato gerador das taxas não pode ser considerado o mesmo dos tributos, pois se o fosse pode ser interpretado como uma bitributação, conforme diz o parágrafo único do art. 77 do CTN, visto que "a taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a imposto nem ser calculada em função do capital das empresas."

Desta forma, as taxas são instituídas pelos poderes públicos em conformidade com a Constituição Federal e a legislações infra-constitucionais que devem ser observadas para que não sejam cobrados injustamente. Assim, surgem algumas taxas como taxa de expediente, taxa de iluminação pública, taxa de esgoto bem como as taxas de marinha, que são o foco deste trabalho.

O surgimento da taxa de marinha advém da criação constitucional de terrenos de marinha, conforme preceitua a Constituição Federal de 1988 em seu art. 20

Art. 20. São bens da União:

[...]

V as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II;

[...]

VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;

Por serem considerados bens da União, esse ente federado tem assim a obrigação de realizar o controle das terras que constitucionalmente foram-lhe conferidas podendo ceder [04], emprestar para finalidade pública diversa; entretanto elas não podem ser alienadas [05], pois o próprio comando constitucional de preservação do bem público instituído no art. 191 em seu parágrafo único diz que "os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião [06]".

Coadunando com a Constituição Federal tem-se a orientação do Código Civil de 2002, que traz dispositivos importantes, a saber

Art. 100. Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar.

Art. 102. Os bens públicos não estão sujeitos a usucapião.

Para entender melhor o motivo da não alienação das terras de marinha é necessário recorrer à História para iluminar o assunto. Assim, é propícia a passagem de Manoel Madruga (apud SANTOS, 1985, p. 7) que diz

Vem de longe a campanha que brasileiros cheios de iniciativa e de enthusiamo [sic] sustentem contra o abandono clamoroso da propriedade nacional invadida a damnificada [sic] por muitos milhares de intrusos. Na imprensa e no Parlamento espiritos [sic] esclarecidos fazem ouvir sem vacillações [sic] o protesto que se pratica em todo o littoral [sic] do paiz [sic] – cujos terrenos valiosíssimos estão sendo impunemente explorados e retraçados pela ganância insaciável da açambarcadores audaciosos.

Tal passagem é aproveitada por muitos juristas, o que demonstra a preocupação do povo brasileiro com a usurpação de um território nacional por diversos aproveitadores econômicos nas terras de fronteira, principalmente as que margeiam a costa litorânea brasileira. Deste modo, algumas faixas territoriais foram constituídas como patrimônio nacional, escolhidas a priori pelo fator preventivo de segurança, bem como pela organização da exploração econômica ao longo do litoral brasileiro.

Destaca-se que a preservação e a instituição das terras de marinha já foram regulamentadas pelo Decreto nº 4.105, de 22 de janeiro de 1868, que institui as terras de marinha para atender

[...] à necessidade de regular a forma da mesma concessão no interesse, não só do domínio nacional e privado, como no da defesa militar, alinhamento e regularidade do cais e edificações, servidão pública, navegação e bom estado dos portos, rios navegáveis e seus braços.

Desde essa época até os dias atuais, os terrenos de marinha contemplam não só os litorais, mas sim todos os rios, lagos e lagoas navegáveis ou não, com seus braços e conexões, tudo para garantir a segurança nacional, bem como regulamentar o uso adequado de toda área de propriedade do país.

Neste decreto nº 4.105, de 22 de janeiro de 1868, fora instituído qual a faixa territorial que seria considerada terras de marinha, a saber

§ 1º São terrenos de marinha todos os que banhados pelas águas do mar ou dos rios navegáveis vão até a distância de 15 braças craveiras (33 metros) para a parte de terra, contadas desde o ponto a que chega o preamar médio. (grifo nosso)

§ 2º São terrenos reservados para a servidão pública nas margens dos rios navegáveis e de que se fazem os navegáveis, todos os que, banhados pelas águas dos ditos rios, fora do alcance das marés, vão até a distância de 7 braças craveiras (15,4 metros) para a parte de terra, contadas desde o ponto médio das enchentes ordinárias.

§ 3º São terrenos acrescidos todos os que natural ou artificialmente se tiverem formado ou formarem além do ponto determinado nos parágrafos 1º e 2º para a parte do mar ou das águas dos rios. (grifo nosso)

Essas definições de terras de marinha e seus acréscimos persistem até os dias atuais. A linha preamar média da maré de 1831 foi traçada pela Lei Orçamentária nº 25, de 30 de dezembro de 1891, a qual definiu os terrenos que estariam situados na região das terras de marinha, bem como a primeira previsão para os foros, aforamentos e criação das taxas de ocupação. Isso garantiu uma eficácia sobre a cobrança do uso das terras de marinha do Estado brasileiro.

Neste prisma, observa-se que as cobranças se perpetuam até a presente data conforme prevê a atual legislação das terras de marinha, pelo o Decreto-Lei nº 9.760, de 05 de setembro de 1946, recepcionado pela Constituição Federal, que predispõe

Art. 2º São terrenos de marinha, em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha do preamar-médio de 1831:

a) os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés;

b) os que contornam as ilhas situadas em zona onde se faça sentir a influência das marés.

Parágrafo único. Para os efeitos deste [sic] artigo a influência das marés é caracterizada pela oscilação periódica de 5 (cinco) centímetros pelo menos, do nível das águas, que ocorra em qualquer época do ano. (grifo nosso)

Art. 3º São terrenos acrescidos de marinha os que se tiverem formado, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha. (grifo nosso)

Segundo esse dispositivo legal vigente, os terrenos considerados de marinha poderão ser alugados, aforados ou cedidos mediante cobranças de foro, laudêmios, taxas, cotas, aluguéis e/ou multas pelo uso do terreno da União.

Destarte, neste momento, as seguintes cobranças pelo uso do terreno: foro [07] e taxas. As taxas são cobradas conforme esse Decreto-Lei nº 9.760, de 05 de setembro de 1946, da seguinte forma

Art. 81. O ocupante, em caráter obrigatório, de próprio nacional ou de outro imóvel utilizado em serviço público federal, fica sujeito ao pagamento da taxa de 3% (três por cento) ao ano sôbre [sic] o valor atualizado, do imóvel ou da parte nêle [sic] ocupada, sem exceder a 20% (vinte por cento) do seu vencimento salário.

Desta forma, os ocupantes dos terrenos de marinha que ainda não tenham solicitado e conquistado da União o aforamento [08], são obrigados a cumprir o preceito legal do art. 127 do Decreto-Lei nº 9.760, de 05 de setembro de 1946, que traz como obrigação aos ocupantes o pagamento anual da taxa de ocupação, conforme taxas acima referidas.

Quando conquistada a condição de aforamento, os foreiros passam a ter um foro privilegiado quanto à tarifação, saindo da "tabela" do art. 127 do diploma acima, passando para uma condição muito melhor insculpida no art. 101, do mesmo diploma, saindo da taxa de 3% sobre o valor atualizado para 0,6% do valor atualizado. Uma significativa redução.

Toda essa cobrança é prevista constitucionalmente, porém na capital capixaba que é uma ilha, assim como nas capitais dos Estados do Maranhão e de Santa Catarina, existe uma grande polêmica advinda da Emenda Constitucional nº 46/2005, que alterou a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu art. 20, passando a ter a seguinte redação

Art. 20. São bens da União:

IV as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 46, de 2005)

VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos; (grifo nosso)

O problema constitucional central gerado por essa emenda refere-se em especial à municipalidade de Vitória, que na linha preamar de 1831 era um conjunto de 13 ilhas, mas que ao longo do tempo foram devidamente aterradas – acrescidas – gerando uma grande ilha, chamada Vitória.

Segundo o entendimento da Secretaria de Patrimônio da União, a Emenda Constitucional nº 45/2006 foi clara ao não contemplar os acréscimos; logo grande parte da ilha de Vitória, que é acrescida, ficou de fora desse comando constitucional. Assim, ainda persistem como terras de marinha e devem ser controladas e devidamente tributadas como terras de marinha.

A cobrança é injustiça conforme a concepção da população capixaba moradora da ilha de Vitória? Essa leitura constitucional realizada pelo órgão do Ministério do Planejamento é a adequada para o caso em comento, tendo em vista o atual paradigma do Estado Democrático de Direito?

O presente artigo pretende realizar um exercício hermenêutico para buscar uma solução para o caso à luz do atual Estado de Direito vigente.


4. EXERCÍCIO HERMENÊUTICO DAS IMPLICAÇÕES TRAZIDAS PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 46/2005 PARA A COBRANÇA DE TAXA DE MARINHA

Para identificar a problemática social que envolve a cobrança de taxas de marinha na sociedade capixaba, deve-se remeter a uma cobrança tributária exacerbada dos órgãos estatais sobre a propriedade: a cobrança conjunta sobre o imóvel do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), operada pela municipalidade, e as Taxas de Marinha, cobradas pela União via Secretaria de Patrimônio da União.

Isso levanta uma polêmica que o próprio CTN já traz em seu art. 77, § único [09], a saber: uma sobretaxação, o que daria uma conotação "confiscatória" à propriedade, violando o direito à propriedade privada, bem como sendo um atentado ao princípio da proporcionalidade, próprio de um Estado de Direito.

Por esse prisma, há que observar qual seria a base de cálculo e o fato gerador do IPTU e das Taxas de Marinha, conforme tabela a seguir:

 

IPTU

Taxas de Marinha

Base de Cálculo

Valor venal do imóvel [10]

0,6% de aforamento do valor do respectivo domínio útil [11] ou 3% de ocupação do valor atualizado do imóvel [12]

Fato gerador

Propriedade, o domínio útil ou a posse por natureza ou acessão física [13]

Domínio útil [14], imóvel ou parte dele ocupada [15]

Observa-se que a tabela acima demonstra que, apesar da terminologia diferenciada, o IPTU e as taxas de marinha são calculados pela mesma base de cálculo (valor venal ou atualizado do imóvel) e pelo mesmo fator gerador (propriedade / imóvel e domínio útil), o que resulta em um conflito normativo claro segundo o parágrafo único do artigo 77 do Código Tributário Nacional, antes citado.

Realizando uma interpretação teleológica da norma jurídica em consonância com a vontade do legislador pode-se extrair dos comandos normativos a vedação da bitributação com fulcro na proteção da propriedade privada e na garantia da segurança jurídica para as relações econômico-sociais. Por esse vértice, é notável uma bitributação sobre os imóveis com a cobrança conjunta de taxas de marinha e de IPTU, visto que a base de cálculo e o fato gerador dos dois tributos são idênticos, o que demonstra a ilegalidade das duas cobranças sobre o mesmo imóvel.

É o indagado pelo doutorando Marco Antônio Chaves [16] em seu artigo Terrenos de Marinha, quando ressalta

Ora, se o IPTU tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse, entendida nesse caso como bens do Município, como poderia a União cobrar tributo que tenha o mesmo fato gerador do IPTU? Se a União julga-se detentora dessas propriedades e assim é entendido pelos magistrados, não caberia também a União manter os serviços públicos essenciais, como saneamento, melhorias viárias, transporte, entre outros?

Não distante, observando a supremacia da Constituição ao declarar os bens da União, instituindo dentre eles as terras de marinha e seus acréscimos, é ilegal a conjunta das taxas de marinha e o IPTU, uma vez que a municipalidade deve atender ao preceito do CTN, a saber:

Art. 150. Sem prejuízo de outras asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios:

VI – instituir impostos sobre:

a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; (grifo nosso)

Assim, ao realizar uma interpretação sistemática, em consonância com o princípio federativo, a cobrança do Imposto Predial Territorial Urbano sobre os imóveis que são terras de marinha é uma cobrança inconstitucional e ilegal, ferindo o princípio da legalidade – insculpido no art. 5º, II, da CF/88 – bem como o art. 77, § único, e 150 do CTN, vez que trata-se da tributação de imposto pela municipalidade sobre os imóveis de propriedade de União, uma cobrança indevida!

Não distante do acima exposto, tem-se a dúvida elencada pela interpretação literal da emenda constitucional nº 46/2005 frente à manutenção da cobrança de marinha na capital capixaba, uma vez que tal emenda garante a exclusão das ilhas em que se situam as capitais de Estado, neste caso a Ilha de Vitória – capital do Espírito Santo – como bens da União.

Para auxiliar a interpretação literal faz-se necessário utilizar de orientações histórico-evolutivas. Destarte, a capital capixaba era, segundo a planta geográfica de 1831, um conjunto de ilhas que, ao longo do tempo, foram interligadas via aterros no mar, gerando vários trechos de acréscimos ao que hoje denomina-se ilha de Vitória. Isso é amplamente demonstrado no Informativo do Fórum Permanente da Bacia do Rio Aribiri que traz à baila que

As ilhas de Vitória formavam um arquipélago. Vários pontos da cidade foram aterrados para conquistar mais espaço do mar para o desenvolvimento e a ocupação da cidade de Vitória. Então, como um arquipélago, era preciso poder contar com um transporte entre essas ilhas. Os catraieiros têm registro de que começaram suas atividades por volta de 1860, faziam transporte de cargas que vinham da região montanhosa do estado, das cidades do interior, e as cargas que eram comercializadas na Vila Rubim. (Disponível em: <http://www.movive.org.br/regiao3/Forum/informativo2.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2010)

Conforme abordado pelo depoimento histórico da formação da grande ilha de Vitória, por ser a capital composta de vários acréscimos o entendimento da Secretaria de Patrimônio da União (SPU), gestora dos bens da União, é que a capital capixaba não foi completamente atendida pela alteração da EC nº 46/2005, uma vez que essa apenas retira como bens da União as ilhas costeiras situadas na capital de Estados e não os seus acréscimos.

Observa-se, então, a interpretação literal restritiva realizada pela Coordenação Geral Jurídica da Secretaria de Patrimônio da União (CONJUR) em seu PARECER/ MP/ CONJUR/ JCJ/ N. 0486 – 5.9.9/2005, de 27 de maio de 2005, referente ao PROCESSO N. 04905.000584/2005-62, que ao ser analisado pelo Advogado da União, Adriano Martins de Paiva, entendeu que

Segundo o disposto no parecer da Consultoria do Ministério do Planejamento, pasta a que está submetida à [sic] Secretaria do Patrimônio da União, e todas as Gerências Regionais do Patrimônio da União nos Estados, estaria excluído do domínio patrimonial da União os terrenos das ilhas costeiras, exceto as áreas afetadas ao serviço público federal e à unidade ambiental de conservação federal, apenas as sedes urbanas dos municípios situados na respectiva ilha. (Disponível em: <http://www.escola.agu.gov.br/.../AsRepercussoesdaEC46_AdrianoMartins.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2010) (grifo nosso)

Por esse entendimento as áreas referentes à unidade ambiental de conservação federal, a antiga linha preamar média de 1831, ficariam mantidas como bens da União, o que é uma interpretação totalmente distorcida do comando constitucional.

Esse entendimento também está em consonância com o Manual de Regularização Fundiária de Terras da União Federal feito pelo SPU, que orienta

A emenda excluiu do patrimônio da União, os terrenos no interior das ilhas costeiras que contenham sede de município. [...] Mesmo nas ilhas costeiras que contenham sede de Município, as praias, o mar territorial, os terrenos de marinha e seus acréscimos dessas localidades, continuam pertencendo à União Federal. (Disponível em: <http://www.planejamento.gov.br/.../%20081021_PUB_Manual_regularizacao.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2010) (grifo nosso)

Pelo trecho do Manual da Regularização fica claro que o entendimento do SPU frente à capital capixaba não alterou em aspecto algum as cobranças de taxas de marinha, levantando um problema de leitura constitucional consoante ao atual paradigma de Estado Constitucional Democrático de Direito: frente a interpretações jurídicas possíveis a melhor é aquela conforme à Constituição.

Essa é a mesma opinião de Colnago (2007, p. 67) que orienta que "[...] a utilização de termos ambíguos e vagos pelo legislador ordinário contemporâneo apresenta-se como uma tendência indiscutível, razão pela qual a adoção de decisões interpretativas pela jurisdição constitucional tende também a se consolidar como uma via a ser escolhida com freqüência exponencialmente maior", vez que a validade dos demais comandos normativos deve buscar fundamento de validade no comando normativo maior do Ordenamento Jurídico brasileiro: a Constituição Federal.

Essa é a orientação do atual Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes (2008, p. 120), quando afirma

Modernamente, o princípio da interpretação conforme [à Constituição] passou a consubstanciar, também, um mandato de otimização do querer constitucional, ao não significar apenas que entre distintas interpretações de uma mesma norma há de se optar por aquela que a torne compatível com a Constituição, mas também que, entre diversas exegeses igualmente constitucionais, deve-se escolher a que se orienta para a Constituição ou a que melhor corresponde às decisões do constituinte. (grifos no original)

Neste diapasão, a interpretação não pode ser apenas literal e restritiva conforme a dada pela SPU, como fora demonstrado, mas sim deve contemplar a interpretação sistemática, histórico-evolutiva e exegética, juntamente com a interpretação gramatical, constituindo um exercício hemenêutico atualista para o caso em análise.

Inicialmente, o texto constitucional ajustado pela EC nº 45/2006 deixa claro, ao ser interpretado gramaticalmente, que as ilhas que contemplem a capital de Estado, não são mais bens da União. Logo, a ilha de Vitória não mais é considerada bem da União, por conseguinte não pode mais ser tributada por taxa de marinha sobre as propriedades ali inseridas.

Por outro vértice, ao observar a evolução histórica da ilha de Vitória é notável que o comando constitucional estabelecido pela EC nº 45/2006 buscou ajustar o benefício de retirar do rol de bens da União todos os imóveis inseridos na ilha de Vitória, a destacar que a ilha deve ser entendida conforme a visão atualizada de ilha capital capixaba, e não pela planta geográfica de 1831 como argumenta a SPU.

Outrossim, a interpretação sistemática à luz do comando constitucional deve reajustar os comandos normativos infra-constitucionais, por meio da otimização constitucional em controle de constitucionalidade direta sobre tais normas, expurgando ou realinhando as normas antes não contempladas pela emenda constitucional, a qual traz a retirada das ilhas sede de capital de Estado do rol de bens da União, sendo assim inconstitucional qualquer comando contrário a essa orientação constitucional.

Por outra visão, tem-se pela interpretação exegética a busca da "voluntas legislatoris", mas numa perspectiva do subjetivismo atualista, em que necessário se faz buscar a intenção do legislador com a produção da norma jurídica e trazê-la à atualidade para auxiliar na solução do presente caso. Desta forma, é possível observar que o pensamento do legislador ao normatizar a EC 45/2006, mais precisamente sobre a alteração do art. 20, IV, da CF/88, era de garantir aos moradores das ilhas capitais a retirada de todos os imóveis da classificação de bens da União, independente da condição de formação ou época da ilha, para que esses não fossem tributados pela União, mas apenas pela municipalidade.

Tal visão interpretativa funda-se na idéia do legislador de que, constituídas em capitais de Estado, as ilhas costeiras seriam contempladas pela utilização das terras segundo a função social da propriedade combinado com o controle municipal das propriedades, sendo desnecessário que essas propriedades passem por um controle conjunto da municipalidade e da União.

Neste contexto, pela proximidade de comando municipal alinhado com uma reforçada segurança da ilha, por ser o local de concentração política estadual de autoridades, o legislador entendeu que não tinha necessidade de tais terras continuarem na qualidade de bens da União, retirando-as, pela EC 45/2006, de tal condição.

Por fim, ressalta-se que o exercício hermenêutico demonstrou que a interpretação da norma pautada pelo Poder Executivo não está em consonância com o atual Estado de Direito, pois elas deveriam ter seu alcance retirado a partir de interpretação gramatical, sistemática, histórico-evolutiva e exegética, resultando na interpretação mais adequada ao paradigma jurídico-político vigente, o qual propugna em última instância uma organização destes métodos interpretativos perspectivada por uma interpretação conforme à Constituição.


5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pela exposição do tema importa destacar que a interpretação não deve ser restrita a um único método interpretativo, nem mesmo à adoção de uma parte de um método que não seja atual dentro do Estado de Direito vigente, sendo que este contempla diretrizes orientadoras para leitura de normas jurídicas que são formadas por uma base introdutória: a Constituição Federal.

Por esse entendimento, não pode o interprete também aceitar que a literalidade constitucional reine para com os métodos interpretativos, uma vez que a Carta Magna brasileira abarca princípios norteadores que aumentam a visão interpretativa aos utilizar os óculos constitucionais.

E foi exatamente isso que o trabalho demonstrou: o art. 20, IV, da Lex Mater brasileira, emendado pela EC nº 46/2005, não pode mais ser interpretado restritivamente como idealiza a SPU, para manutenção da tributação de taxas de marinha sobre imóveis na ilha de Vitória, mas sim deve ser o Texto Maior brasileiro observado em sua completude sistemática e histórico-evolutiva.


REFERÊNCIAS

AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do estado. 44 ed. São Paulo: Globo, 2005.

BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de teoria do estado e ciência política. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995.

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Trad. GUIMARÃES, Torrieri. 2ª ed. São Paulo: Martin Claret, 2000.

BRASIL. Constituição Federal da República de 1988. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 1988.

BRASIL. Decreto n. 4.105, de 22 de janeiro de 1868. Regula a concessão dos terrenos de marinha; dos reservados nas margens dos rios e dos acrescidos natural ou artificialmente. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Rio de Janeiro, 1988.

BRASIL. Decreto-Lei n. 9.760, de 05 e setembro de 1946. Dispõe sobre os bens imóveis da União e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Rio de Janeiro, 1946.

BRASIL. Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispões sobre o sistema tributário nacional e institui normas gerais de direito tributários aplicáveis à União, Estados e Municípios. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 1966.

BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 2002.

BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. Comp. MORRA, Nello; Trad. PUGLIESI, Márcio, BINI, Edson; RODRIGUES, Carlos E. São Paulo: Ícone, 2006.

BONAVIDES, Paulo. Teoria do estado. 7ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros Meditores, 2008.

CADEMARTORI, Sérgio. Estado de direito e legitimidade: uma abordagem garantista. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 18ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.

CASTRO, Flávia Lages de. História do Direito Geral e Brasil. 6ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

CHAVES, Marco Antônio. Terrenos de Marinha. Disponível em: http://www.correaneto.com.br/colunas/marco/17-7-08marco.htm. Acesso em: 20 out. 2009.

COLNAGO, Cláudio de Oliveira Santos. Interpretação conforme a Constituição: decisões interpretativas do STF em sede de controle de constitucionalidade. São Paulo: Método, 2007.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini Aurélio: o dicionário da língua portuguesa. 6ª ed. rev. e atual. 14ª Impressão. Curitiba: Positivo, 2008.

FÓRUM PERMANENTE DA BACIA DO RIO ARIBIRI. Informativo. Contando Causos da Região "Os Catraeiros: Aguinaldo de Moura – morador do Penado". Vila Velha, Ed. 2ª, ano 1, bimestral, out. - nov., 2006. Disponível em: <http://www.movive.org.br/regiao3/Forum/informativo2.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2010.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 2ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 19ª ed. atual. (até a EC nº 48/05). São Paulo: Atlas, 2006

PAIVA, Adriano Martins de. As repercussões da EC n. 46/2005 que exclui do domínio da União as ilhas costeiras que contenham sede de município. Disponível em:

<http://www.escola.agu.gov.br/.../AsRepercussoesdaEC46_AdrianoMartins.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2010.

SANTOS, Rosita de Sousa. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985.

SANTOS, Sérgio Roberto Leal dos. Manual da teoria da Constituição. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2008.

SECRETARIA DE PATRIMÔNIO DA UNIÃO. Manual de regularização fundiária de terras da união federal. Brasília: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, 2006. Disponível em:

<http://www.planejamento.gov.br/.../%20081021_PUB_Manual_regularizacao.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2010.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 28ª ed. rev. e atual (até a Emenda Constitucional n. 53 de 19.12.2006). São Paulo: Malheiros Meditores, 2007.


Notas

  1. "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito", é a definição de ato ilícito do art. 186 do Código Civil de 2002.
  2. Art. 145, III, da CF/88.
  3. Art. 78 do Código Tributário Nacional.
  4. Segundo o Dicionário Aurélio (2008, p. 223) significa "transferir (a outrem) direitos, posse ou propriedade de algo" ou "pôr (algo) a disposição de alguém".
  5. Para o Dicionário Aurélio (2008, p. 110) significa "transferir para outrem o domínio de; alhear".
  6. Tendo por base o Dicionário Aurélio (2008, p. 803) significa "modo de adquirir propriedade móvel ou imóvel pela posse pacífica e ininterrupta desta, por certo tempo".
  7. Segundo o Dicionário Aurélio (2008, p. 415) significa "quantia ou pensão paga anualmente pelo foreiro" ou "uso ou privilégio garantido pelo tempo ou pela lei".
  8. Pelo Dicionário Aurélio (2008, p. 100) significa "direito transmissível aos herdeiros e que confere o pleno gozo de imóvel mediante a pagamento de foro".
  9. Art. 77, § único do CTN. A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a imposto, nem ser calculadas em função do capital das empresas.
  10. Art. 33 do Código Tributário Nacional;
  11. Art. 101 do Decreto-Lei nº 9.760/46;
  12. Art. 81 do Decreto-Lei nº 9.760/46;
  13. Art. 32 do Código Tributário Nacional.
  14. Art. 101 do Decreto-Lei nº 9.760/46;
  15. Art. 811 do Decreto-Lei nº 9.760/46;
  16. CHAVES, Marco Antônio. Terrenos de Marinha. Disponível em: http://www.correaneto.com.br/colunas/marco/17-7-08marco.htm. Acesso em: 20 out. 2009.


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ASSUNÇÃO, Presley Modolo de. Uma análise hermenêutica no atual Estado de Direito sobre os bens da União e a cobrança de taxas de marinha na ilha de Vitória. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2697, 19 nov. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17863. Acesso em: 23 abr. 2024.