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A posição jurídica do progenitor não-guardião em Portugal

A posição jurídica do progenitor não-guardião em Portugal

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SUMÁRIO: 1. Considerações sobre guarda e responsabilidades parentais em Portugal; 2. Considerações iniciais sobre o progenitor não-guardião; 3. Direito-dever de convivência; 3.1 Negação do direito de convivência; 3.2 Execução; 3.3 Suspensão da obrigação de alimentos por incumprimento do direito de convivência; 4. Direito de vigilância; 5. Obrigação de alimentos; 5.1 Quantificação; 5.2 Execução; 5.3 Suspensão do direito de convivência por incumprimento da obrigação de alimentos; 6. Considerações finais; Referências.


1.Considerações sobre guarda e responsabilidades parentais em Portugal

O termo guarda teve sua origem nos vocábulos guardare (latim)e wardem (alemão), podendo ser traduzido nas elocuções conservar, vigiar, proteger, olhar. [01] Nas palavras de Guilherme Strenger guarda de filhos seria "o poder-dever submetido a um regime jurídico-legal, de modo a facultar a quem de direito prerrogativas para o exercício da proteção e amparo daquele que a lei considerar nessa condição". [02]

Pode-se asseverar que guarda de menores ou filhos é o complexo de relações jurídicas entre um indivíduo e o menor, resultantes do fato deste estar submetido ao poder ou à companhia daquele, e da responsabilidade daquele em relação ao infante, no tocante à educação, direção e vigilância.

Deste modo, é manifesto que a guarda compõe a estrutura das responsabilidades parentais, que está inserta naquele conjunto, uma vez que entre os direitos-deveres que a lei civil impõe aos progenitores em relação à sua prole, se faz presente a guarda.

Em Portugal, com a reforma de 1977 ocorreu aclamação do princípio do exercício exclusivo do poder paternal pelo pai que obteve a guarda do infante, originando, desta forma, ligação instantânea entre exercício do poder paternal e guarda. [03] Tal fato se manteve até o ano de 2008, quando a Lei n. 61/2008 de 31 de Outubro alterou o regime jurídico do divórcio, modificando significativamente tal situação.

Atualmente, as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores, da mesma forma em que eram levadas a cabo na constância do casamento, exceto na ocorrência de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir unilateralmente, devendo informar o outro progenitor assim que possível. [04] Note-se que tais disposições também são aplicáveis aos casais que vivam em união de facto, [05] e também aos que não vivam em condições análogas à dos cônjuges, [06] desde que a filiação esteja estabelecida quanto a ambos.

Sobre a inadequação da terminologia "poder paternal", substituída no texto da nova lei por "responsabilidades parentais", já afirmava Jorge Duarte Pinheiro que, era adequada a tutela do poder de guarda do menor mas, no entanto, era lamentável a terminologia legal. Em sua opinião, o vocabulário utilizado evocava o sinistro período pré-filiocêntrico do poder paternal em que o filho não passava de um objeto pertencente ao pai. [07]

Maria Clara Sottomayor também já evidenciava, antes mesmo do advento da nova normativa, desaprovação por tal expressão, uma vez que o termo poder denota posse, domínio, hierarquia, e defendia, de acordo com a atual percepção da família proposta pela Carta Magna e Código Civil portugueses, "uma família participativa e democrática, baseada na igualdade entre os seus membros e em deveres mútuos de colaboração". O vocábulo paternal, de acordo com seu juízo, diz respeito à supremacia do progenitor varão, que assinalava a família patriarcal, caracterizada pela colocação hierarquicamente superior do chefe masculino, em relação à mulher e aos filhos. Assim, a autora já dava preferência ao emprego de termos como "responsabilidade parental" ou "cuidado parental". [08] Hodiernamente, com a entrada em vigor da nova lei do divórcio, tal entendimento passou do campo meramente doutrinário para o campo legislativo.

A Constituição da República Portuguesa, em seu art. 36º, n. 5, consagra a isonomia entre homem e mulher, uma vez que em tal dispositivo encontra-se a previsão de que o poder paternal é um direito e dever de ambos os pais na educação e manutenção dos filhos.

Todavia, na ocorrência de uma separação, o poder paternal era, via de regra, confiado ao genitor a quem fosse deferida a guarda. Aquele que não detivesse a guarda, muito embora não perdesse a sua titularidade, se via privado do exercício assim como da participação das decisões concernentes à educação e criação do filho, de acordo com o texto revogado do art. 1906º do Código Civil português.

Por conseguinte, ao progenitor não guardião cabia unicamente a possibilidade de visitar sua prole, mantendo assim, relações pessoais, bem como a prerrogativa de fiscalizar o modo como estavam sendo educados pelo genitor que possuía a guarda. Ficava ele desprovido de poderes decisórios em relação aos filhos. Desta forma, cabia ao mesmo apenas o papel de "observador passivo". [09]

Atualmente, diversa é a situação. De acordo com a atual redação do art. 1906º do CC português, como já referido anteriormente, "as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho". [10]

Não obstante a modificação terminológica e substancial trazida pela nova normativa, ainda se observa uma ligação entre a guarda física e o exercício unilateral das responsabilidades parentais, em virtude do disposto no art. 1906º, n. 3.

O argumento, dos que defendiam a ligação instantânea entre guarda e poder paternal – e que levava os dois institutos a terem um conteúdo operante igual - é a unidade na educação da criança, além de obstar a presença do filho em ambiente aguerrido, oriundo da altercação entre os pais. Existiam também outros motivos de natureza prática, como o de afastar dificuldades do genitor guardião em obter a anuência do outro, relativamente às decisões importantes da vida do infante.

Todavia, os que já se posicionavam em sentido contrário alegavam que, esse sistema levava a um rompimento nos laços afetivos da criança com o genitor que não detém a guarda, coibindo-o de participar na educação da criança e cooperar para a formação da sua personalidade e seu brio. [11]

Tal entendimento não deixava de merecer concordância, tendo em vista que a limitação da relação entre a prole e o pai ou mãe que não possui a guarda às visitas e à vigilância leva a uma grave confinação de uma relação, que por si só é sublime.


2.Considerações iniciais sobre o progenitor não-guardião

Em Portugal, assim como no Brasil, o progenitor não detentor da guarda não fica completamente desprovido de prerrogativas e deveres. Antes do advento da lei n. 61/2008, existia a conservação da titularidade do poder paternal. Mas, apesar de titular dos poderes inerentes ao poder paternal, o progenitor não guardião não estava autorizado a exercê-los.

Entretanto, imperioso ressaltar que, independente da modalidade de exercício do poder paternal, já existiam atos que requeriam a participação de ambos os pais, como o consentimento para adoção [12] e a escolha do nome e sobrenome da prole, [13]em consonância do o disposto no Diploma Civil. Ademais, os pais podiam acordar que determinadas questões fossem resolvidas por ambos [14] ou que a administração dos bens da prole fosse assumida pelo progenitor que não detivesse o poder paternal.

O pai desprovido da guarda, conservava para além do dever de alimentos, o direito de visita e o direito de vigilância. Nas palavras de Maria Clara Sottomayor, a cada direito reconhecido ao progenitor guardião correspondia, mas em grau menor, um direito acordado ao outro progenitor. [15]

Atualmente, não existe a necessidade de um acordo para que as decisões de particular importância sejam tomadas por ambos os pais. Via de regra, as responsabilidades parentais nesse âmbito (particular importância) deverão ser exercidas por ambos os pais, salvo quando a situação se mostrar contrária ao melhor interesse da criança. [16]

Não obstante isto, as decisões acerca do dia-a-dia do filho continuam cabendo ao progenitor com quem ele reside normalmente, ou com quem se encontrar temporariamente. [17] Pode-se afirmar, portanto, que agora continua a existir uma conexão entre as responsabilidades parentais e a guarda física infante.


3.Direito de convivência

O direito-dever de convivência [18] vem para substituir o trato diário do progenitor não guardião e sua prole, uma vez que não existe mais coabitação entre os mesmos. Como no direito brasileiro, é entendido num sentido mais amplo, num sentido não apenas de ter a companhia da criança por algumas horas, mas abarcando a retirada da mesma do local onde vive, conferindo ao titular deste direito a permissão para hospedar o infante por alguns dias, seja nos finais de semana ou nas férias, por exemplo.

Deste modo, tal prerrogativa objetiva fomentar as relações e fortalecer os laços de afetividade, que se enfraqueceram com a separação dos pais. É composto por contatos esporádicos, passando por pernoites, indo até várias semanas de convívio, como no caso das férias. E consiste, ainda, em qualquer forma de comunicação, como carta, correio eletrônico, telefonemas, etc. [19]

De acordo com o art. 1906º, n. 5 do CC, "o tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamenteo eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro".

Tal direito, como já observado, assumiu um caráter de direito-dever, uma vez que é direito do progenitor em conviver com o filho e também direito daquele de ter a companhia do pai com quem não reside.

Importante relembrar que tal direito-dever não possui caráter absoluto, estando dependente do interesse do menor, podendo ser circunscrito ou até mesmo eliminado quando o seu exercício for incompatível com a saúde emocional do infante ou este manifestar oposição ao exercício, entendendo-se que a vontade do adolescente deverá, de pronto ser atendida, e a da criança, avaliada. [20]

Três são os elementos norteadores da decisão do juiz acerca do direito de convivência, a saber: as prerrogativas do detentor da guarda, o interesse do titular do direito de convivência e o interesse do menor na conservação daquela relação. Entende-se na doutrina que "é este último elemento que constitui o ponto de referência privilegiado e o princípio fundamental de que o juiz faz uso na configuração do direito de visita". [21]

Importante ressaltar que a normativa aplicável não regulamentou o direito de convivência de forma pormenorizada. Restringiu-se a citá-lo, não especificando quais os padrões que deveriam ser aplicados, entendendo que tal papel cabe ao Juiz, que pode apreciar as circunstâncias fáticas do caso concreto. Excetuando-se o caso de acordo das partes envolvidas, o Judiciário poderá determinar de forma discricionária a duração, a assiduidade e local de convívio. Note-se que em ambas as situações – no caso de acordo ou decisão judicial – a resolução deverá sempre ter como vetor o melhor interesse da criança.

3.1. Negação do direito de convivência

É assente que a tendência normativa e da prática judicial é a de estimular a manutenção dos vínculos entre a criança e ambos os pais. Entretanto, em relação àquele que não detém a guarda, numa medida de caráter excepcional, tal prerrogativa poderá ser obstada, se o interesse da prole assim evidenciar. [22]

Quando a visitação entra em choque com o interesse do menor, é este último que deverá predominar. Todavia, tal medida (a negação do direito de visita) só deverá ser aplicada em último caso, tendo em vista que o Judiciário poderá dispor de outras providências menos gravosas para salvaguardar o interesse da prole, a saber: a suspensão provisória [23] ou a subordinação do exercício da visitação a condições especiais. [24]

Mister ressalvar que a intervenção do Estado, negando o direito de visita, apenas se justifica quando se evidencie as mesmas razões que legitimam uma medida de assistência educativa [25] ou uma inibição do exercício das responsabilidades parentais. [26]

3.2.Execução

A Organização Tutelar de Menores prevê no art. 181, para os casos em que um dos pais não satisfaça a sentença ou acordo que regula o exercício do poder paternal, a possibilidade daquele cuja pretensão à visitação for obstada solicitar ao Judiciário as providências cabíveis para o cumprimento coercitivo e a condenação do negligente em multa de ate $50.000$00 (€ 249,90, conversão operada pelo art. 1º/2 do DL 323/2001, de 17/12) e em indenização a favor do filho ou do requerente, ou, ainda, de ambos.

A prática judiciária tem entendido o direito de convivência como um direito judicialmente exigível, passível de ser realizado contra a vontade daquele que detém a guarda. Todavia, não há jurisprudência em Portugal relativa à execução forçada do direito de convívio contra a passividade do progenitor não guardião. Tal acontecimento talvez se dê pelo fato de os pais nunca a terem requisitado ou pelo juízo dos Tribunais, que supõem ser improfícua a manutenção de uma relação com o auxílio de sanções e não pelo afeto que, teoricamente, une os pais à prole.

Não obstante, mostra-se possível, por meio de uma sanção pecuniária compulsória [27] a ser satisfeita pelo progenitor sem a guarda por cada dia, semana ou mês de atraso no cumprimento da visitação, criar uma forma de pressão ao exercício positivo do direito de convivência.

É imperioso, no panorama dos direitos da criança, que o Estado obrigue os progenitores sem a guarda a cumprir o direito-dever de convivência ao invés de forçar os infantes, mediante a intervenção de forças policiais ou de psicólogos, a estar com o progenitor não guardião, quando não deseja s prole tal ocorrência. [28]

Quanto ao amparo penal do direito de convivência, este se verifica na circunstância de serem satisfeitos os pressupostos do tipo legal descrito no art. 249º, n. 1, al. "c" do Código Penal. [29] Comete o ilícito e está sujeito à pena qualquer um dos progenitores: tanto o que impedir ou dificultar a convivência do filho com o pai não-guardião, como aquele que não cumprir o regime estabelecido, na regulação do exercício das responsabilidades parentais, de convivência com o filho.

3.3Suspensão da obrigação de alimentos por incumprimento do direito de convivência

Argumento habitualmente utilizado pelos pais para esquivar-se do pagamento da obrigação de alimentos é o incumprimento, por parte do genitor guarda, do regime de convivência consagrado na decisão relativa à regulação das responsabilidades parentais.

A doutrina portuguesa [30] entende que os tribunais não devem fazer uso da suspensão da obrigação de alimentos como um meio de coagir o progenitor que detém a guarda a consentir a convivência, pois se trata de uma providência que pune o comportamento ilícito de um dos pais à custa do bem-estar material da prole.

A convivência e a obrigação de alimentos são institutos distintos, com regimes próprios. Ademais, não se justifica permitir que uma criança que já está privada do convívio com o outro progenitor, por quem, habitualmente, nutre profunda estima, seja também privada do seu conforto material.

Não bastando tais fatos, admitir-se a solução de suspender judicialmente a obrigação de alimentos estimularia comportamentos estratégicos de pais que, de má fé, não queiram cumprir com sua obrigação, além de permitir que a criança seja utilizada como joguete, no meio da altercação dos pais.


4.Direito de vigilância

No ordenamento português, o Diploma Civil prevê, a favor do progenitor que não detém a guarda do filho, o direito de vigilância referente às condições de vida e à educação do mesmo. [31] Entretanto, a normativa restringe-se a citar este direito sem pormenorizar seus contornos e, conseqüentemente, sua aplicação prática. Tal incumbência ficou por conta, portanto, da doutrina e da prática judicial.

Ao progenitor não guardião cabe o direito de fiscalizar as decisões adotadas por aquele que detém a guarda, além de poder agir diretamente em relação às questões de particular importância na vida da prole. Note-se, porém, que tal prerrogativa não poderá se transformar em um direito de imiscuição.

No âmbito da vida corrente dos infantes , o progenitor guarda tem a vantagem da decisão. Nesta seara ao outro pai só resta a prerrogativa de apelar ao Judiciário para contestar os atos do guardião, quando o interesse do menor estiver ameaçado. Desta forma, o dever de vigilância poderá emergir somente quando o pai guardião atuar com irregularidade, omissão, desmazelo. Sempre que houver um desempenho anômalo da função, pode o genitor que não detém a guarda opor-se e exigir a reparação do lapso, fazendo-se a ressalva de que o requisito para tal atuação é a presença de um genuíno perigo para o interesse do menor, nomeadamente para a sua saúde, educação ou segurança. [32]

O direito de vigilância englobava, tacitamente, o direito de informação. Agora o direito de vigilância compreende expressamente o direito de informação, nos termos do qual o progenitor não guardião tem a permissão de requerer do progenitor guardião todas as informações relativas à educação, ao desenvolvimento, à saúde, às relações do menor com terceiros, etc., assim, como a todas as decisões essenciais relativas a esses âmbitos.


5.Obrigação de alimentos

Ao pai guardião caberá a responsabilidade da criação e educação dos filhos, assim como o sustento dos mesmos dentro das suas possibilidades, competindo ao outro prestar alimentos no valor determinado pelo Magistrado. No caso em tela (alimentos devidos aos filhos menores), é assente na doutrina portuguesa que a lei determina, desde que os rendimentos do genitor que não detém a guarda o possibilitem, que seja assegurado ao menor um nível de vida análogo ao que este desfrutava antes da separação dos pais, com as mesmas regalias e confortos.

5.1Quantificação

Quanto à quantificação dos alimentos, no ordenamento português [33], assim como no brasileiro, se encontra presente o princípio da proporcionalidade. Habitualmente, traz-se à baila o binômio necessidade-possibilidade, ou seja, investiga-se as necessidades do alimentando e as possibilidades do alimentante para determinar o montante da pensão.

Entretanto, no entendimento de Maria Berenice Dias, "essa mensuração é feita para que se respeite a diretriz da proporcionalidade. Por isso, se começa a falar, com mais propriedade, em trinômio: proporcionalidade-possibilidade-necessidade." [34] Para tal efeito, nas ações de alimentos e nas ações de regulação do exercício das responsabilidades parentais, deverá proceder-se a uma avaliação do patrimônio do progenitor sem a guarda.

Para a demarcação da receita do pai sem guarda não é suficiente a mera apresentação da declaração do I.R.S., mas deve ser possível calcular rendimentos em conformidade com determinados indicadores, sendo admitida a prova testemunhal para constatar os rendimentos do alimentante. Importante ressaltar que, no caso de um pai que se encontra voluntariamente numa situação de desemprego, incabível é a dispensa da obrigação de alimentos. [35]

Todavia, dispõe o Diploma Civil português que quando os filhos estão em condições de suportar, pelo produto do seu trabalho ou outros rendimentos, os encargos com a sua segurança, saúde e educação, os pais estão dispensados da obrigação de alimentos. [36]

Importante relembrar que o mero alcance da maioridade não pode ensejar a perda compulsória [37] da pensão alimentícia por parte dos filhos, como bem assevera o art. 1880º [38] do Código Civil português, tendo em vista que, quase invariavelmente a formação profissional ou universitária da prole só ocorrerá posteriormente à maioridade, devendo assim, ser prolongada a prestação de alimentos. De tal entendimento perfilha a jurisprudência [39] e a doutrina brasileira. [40]

5.2Execução

Analogamente ao ordenamento brasileiro, estipulada a pensão alimentícia e não cumprindo o devedor com a sua obrigação, possui o credor a prerrogativa de executá-lo. Assim, em Portugal, o sistema de execução, após atrasos no cumprimento da obrigação de alimentos, é composto, para além do processo de execução especial por alimentos previsto no art. 1118º e ss. do CPC, por uma dedução do valor da pensão nos rendimentos do devedor, de acordo com o art. 189º [41] da OTM e por uma sanção penal prevista no art. 250º do CP [42].

À dívida de alimentos paga com atraso deve ser acrescida uma indenização dos danos causados ao credor com atraso, de acordo com o art. 804º do CC e uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento por meio da aplicação analógica do art. 829º-A do mesmo Diploma.

Observa-se na doutrina lusitana [43]que, apesar da previsão em lei, na prática, raramente a aplicação de uma pena de prisão é decretada. Tal pena possui um propósito ao mesmo tempo punitiva e preventiva [44]. Uma vez adimplida a obrigação, o Tribunal pode dispensar de pena ou declarar extinta, total ou parcialmente, a pena ainda não cumprida, de acordo com o disposto no n. 3 do art. 250º do CP. [45]

5.3Suspensão do direito de convivência por incumprimento da obrigação de alimentos

Presente na doutrina brasileira, também emerge em Portugal o debate acerca do cabimento da suspensão do direito de convivência do progenitor não-guardião em virtude do incumprimento do dever de alimentos. Questão controversa. Pode-se entender que o não pagamento da obrigação de alimentos constitui causa legítima da negativa do progenitor guarda em permitir ao outro que exercite o seu direito de visita.

Maria Clara Sottomayor, entende em sentido diverso quando afirma que "a obrigação de alimentos e a obrigação de permitir visitas, ambas essenciais para o desenvolvimento da personalidade da criança, não são sinalagmáticas, nem uma é condição da outra". [46]

Parece justo manter um posicionamento intermediário, sendo cabível a suspensão do direito de convivência apenas, e rigorosamente apenas, quando evidenciado que o pai, solvente, reiteradamente se nega, culposa e voluntariamente, ao pagamento das prestações alimentícias, deixando seus filhos sujeitos a dificuldades de ordem material.


6.Considerações finais

Uma vez concedida a guarda única a um dos progenitores, tem-se a sensação de que o outro resta completamente preterido da relação paterno-filial. Todavia, não é o que se verifica. Com as devidas ressalvas das divergências nos Diplomas Civis e Processuais do Brasil e de Portugal, pode-se afirmar que o papel do progenitor não guardião é quase o mesmo, em ambos Estados.

Note-se que o sistema português passou de uma lógica de conexão automática e total, via de regra, entre a guarda única e o exercício unilateral do poder paternal, para um panorama de responsabilidades parentais compartilhadas, com o advento da Lei n. 61/2008. Entretanto, é imperioso ressaltar que tal compartição se restringe às questões de especial importância na vida da prole. No âmbito das questões diárias, comuns, da vida dos filhos ainda se observa uma prevalência da "autoridade" do progenitor guardião em relação ao não guardião.

Destarte, pode-se concluir que existe uma correlação entre a guarda físca da criança e o exercício unilateral das responsabilidades parentais. Pode-se afirmar também, diante da preponderância da "autoridade" do genitor-guarda, que existe uma responsabilidade parental compartilhada mas, ao mesmo tempo, limitada.

Note-se que, apesar da boa vontade do legislador, a nova normativa poderá ser fontes de um excesso evitável de conflitos. Explique-se: no regime anterior, as responsabilidades parentais compartilhadas, em relação às decisões de particular importância na vida dos filhos, estavam sujeitas a um acordo que deveria ser homologado judicialmente. Atualmente, o exercício conjunto é imposto, tanto no casos de separação, divórcio, término da união de facto, como no caso em que os progenitores não vivam em condições análogas aos dos cônjuges. Como impor o exercício comum das responsabilidades parentais a quem nunca viveu com o filho? Não será uma fonte desnecessária de conflitos?

Para a determinação da residência do infante – que, por sinal, será a seara para onde se mudará a tônica dos litígios – o legislador pareceu dar especial importância para a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro. Proposta louvável, entretanto, poderia-se ter ido mais longe, incluindo uma preferência pela figura primária de referência, que seria aquele que predominantemente cuidou do infante no seu dia a dia, ou seja, que tratou da preparação das refeições, do banho e asseio, das roupas, do transporte para o colégio ou para encontro com os amiguinhos, da preparação para dormir, de atender o filho de madrugada, de acordá-lo pela manha, da orientação de boas maneiras, da disciplina, da instrução ética, etc. [47]

Quanto ao direito de convivência, no Brasil e em Portugal observa-se uma certa omissão legislativa em relação aos seus contornos. Recentemente, no Brasil, emergiram decisões que aplicam multas com a finalidade de obrigar o progenitor não guardião em cumprir com a sua obrigação de estar com o filho. A doutrina portuguesa também comunga com a idéia da aplicabilidade de astreinte para criar uma forma de pressão ao exercício positivo do direito-dever de convivência, em prol do interesse da criança.

O direito de fiscalização (ou vigilância, como denominado em Portugal) constitui outra prerrogativa do progenitor não guardião. No ordenamento brasileiro prístino, possuía um escopo nitidamente econômico, que era o de fiscalizar o emprego da pensão alimentícia destinada ao menor. Hoje possui um caráter distinto, devendo ser enxergado como o exercício indireto, pelo pai não guardião, da sua autoridade parental, que fica encoberta e só se revela quando o pai guardião atua com irregularidade, omissão, desmazelo. Sempre que houver um desempenho anômalo da função, pode o genitor que não detém a guarda opor-se e exigir a reparação do lapso. Entretanto, como bem assevera a doutrina portuguesa, assim como a brasileira, tal direito deve ser levado a efeito com seriedade e ponderação, de forma a não se assinalar como imiscuição perturbadora no exercício das responsabilidades parentais pelo genitor guardião, no âmbito da vida corrente da prole.

Quanto à obrigação de alimentos, pode-se afirmar que é primordial e de cunho irrestrito a obrigação de os pais proverem o sustento de seus filhos. Tal dever, quando os mesmos não vivam juntos converte-se no dever legal da prestação alimentícia. Genericamente, o pai guardião será responsável não apenas pela criação e educação da prole como pelo sustento, dentro das suas possibilidades, competindo ao outro prestar alimentos no valor determinado pelo Magistrado.

Nesta seara, diversos debates são originados - quantificação dos alimentos, suspensão do direito de visitas em virtude do incumprimento da obrigação de alimentos, entre outros. Quanto à quantificação, há uma convergência do critério norteador nos ordenamentos brasileiro e no português, que é o princípio da proporcionalidade, ou seja, quanto mais ganha o pai, mais recebe o filho.

Grande inquietação se apresenta na doutrina quando do tratamento da questão da suspensão da visitação em virtude do não pagamento da pensão. Discussões e teorias à parte, parece ser de considerar posição intermediária, ou seja, defender a suspensão do direito de visitas somente quando evidenciado que o pai, que pode arcar com tal incumbência, reiteradamente se nega, culposa e voluntariamente, em cumprir com a sua obrigação.


Referências

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COELHO, Francisco Pereira; OLIVEIRA, Guilherme de. Curso de Direito da Família. Vol I: Introdução ao Direito Matrimonial. 3. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2003.

COMEL, Denise Damo. Do poder familiar.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.

DIAS, Cristina M. Araújo. Uma análise do novo regime jurídico do divórcio: Lei n. 61/2008, de 31 de Outubro. Coimbra: Almedina, 2008.

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias.4 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.

GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

PINHEIRO, Jorge Duarte. Direito da Família e das Sucessões, vol. II: Direito da Filiação: Filiação biológica, adoptiva e por consentimento não adoptivo. Constituição, efeitos e extinção. Lisboa: AAFDL, 2005.

RAMIÃO, Tomé d’Almeida. Organização Tutelar de Menores anotada e comentada. 5. ed., Lisboa: Quid Juris, 2006.

SOTTOMAYOR, Maria Clara. "Exercício do poder paternal nos casos de divórcio", em Direito da família e política social / coord. Maria Clara Sottomayor e Maria João Tomé. Porto: Publicações Universidade Católica, p. 143-162, 2001.

_________________________. Exercício do poder paternal relativamente à pessoa do filho após o divórcio ou separação de pessoas e bens. 2. ed. Porto: Publicações Universidade Católica, 2003.

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STRENGER, Guilherme Gonçalves. Guarda de filhos. 2. ed. São Paulo: DPJ Editora, 2006.

TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Família, guarda e autoridade parental.Rio de Janeiro: Renovar, 2005.


NOTAS

  1. Cfr. CASABONA, Marcial Barreto. Guarda compartilhada, p.99.
  2. STRENGER, Guilherme Gonçalves. Guarda de filhos, p. 21.
  3. Cfr. SOTTOMAYOR, Maria Clara. Exercício do poder paternal, p. 59.
  4. De acordo com a nova redação do art. 1906º, n. 1 do CC.
  5. Cfr. art. 1911º do CC.
  6. Cfr. art. 1912º do CC.
  7. PINHEIRO, Jorge Duarte. Direito da Família e das Sucessões, Vol. II, p.82. No mesmo sentido se manifesta Cristina Dias, para quem designação anterior era manifestamente inadequada, num tempo em que se reconhece cada vez mais os infantes como sujeitos de direitos. Cfr. DIAS, Cristina M. Araújo. Uma análise do novo regime jurídico do divórcio, p. 36-37.
  8. SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal. cit., p. 20.
  9. Neste sentido, Cfr. SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal,p.117.; TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Família, guarda e autoridade parental, p. 114.
  10. Atual redação do art. 1906º do CC.
  11. Neste sentido, consultar TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Família, guarda e autoridade parental, p. 115.
  12. Art. 1981º
  13. 1.É necessário para a adopção o consentimento:

    c) Dos pais do adoptando, ainda que menores e mesmo que não exerçam o poder paternal, desde que não tenha havido confiança judicial.

  14. Art. 1875º
  15. 2.A escolha do nome próprio e dos apelidos do filho menor pertence aos pais; na falta de acordo decidirá o juíz, de harmonia com o interesse do filho.

  16. Por exemplo, a escola a ser freqüentada pela criança, intervenções cirúrgicas, viagens ao exterior, práticas religiosas, etc. Neste sentido, consultar PINHEIRO, Jorge Duarte. O Direito da Família contemporâneo, p. 316; SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal, p. 194.
  17. SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal, p. 75.
  18. Art. 1906º
  19. 3.Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que essas responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores.

  20. De acordo com o art. 1906º, n. 3.
  21. Há tempos já se defendia a terminologia direito-dever de convivência. Como bem afirma Marcial Casabona, a definição de convivência no dicionário Aurélio é "o ato ou efeito de conviver, manter relações íntimas, familiaridade, convívio. Trato diário", enquanto a definição de visita não passa do "ato de ir ver alguém por cortesia, dever ou afeição". Assim, conclui que "a terminologia, por conseguinte, afigura-se muito pobre e limitativa no campo de troca amorosa necessitada pelas crianças e adolescentes, pessoas em desenvolvimento que merecem proteção especial. Em verdade, direito de visita exercem os parentes e até pessoas estranhas ao parentesco (ex. padrinhos), mas os pais merecem exercer o genuíno e efetivo direito de convivência, mesmo que por período determinado". CASABONA, Marcial Barreto. Guarda compartilhada, p. 162.
  22. Neste sentido, Cfr. COMEL, Denise Damo. Do poder familiar, p. 257; SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal, p. 76.
  23. Neste sentido, afirma Maria Clara Sottomayor que, "a decisão judicial, obrigando um menor, que tem sentimentos de repulsa por um dos pais, a conviver com o mesmo, considera o menor como um objecto que se transfere coercitivamente das mãos de um dos pais para as de outro. O menor, como qualquer ser humano, merece respeito e a sua vontade e sentimentos devem ser tidos em contra na regulação do poder paternal." SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal, p. 79-80.
  24. SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal, p. 85.
  25. De acordo com o n. 2 do art. 180º da Organização Tutelar de Menores, onde está disposto que, "será estabelecido um regime de visitas, a menos que excepcionalmente o interesse do menor o desaconselhe". Cfr. RAMIÃO, Tomé d’Almeida. Organização Tutelar de Menores anotada e comentada, p. 99.
  26. Por exemplo, na ocorrência da recusa do filho em encontrar com o progenitor ser a guarda, pode o magistrado determinar uma suspensão temporária da visitação, até que a resistência da criança amenize ou cesse.
  27. Por exemplo, a presença de uma terceira pessoa durante as visitas, ou a determinação de que o filho não seja levado a determinado lugar.
  28. CC: Art. 1918º Quando a segurança, a saúde, a formação moral ou a educação de um menor se encontrem em perigo e não seja caso de inibição do exercício das responsabilidades parentais, pode o tribunal, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer das pessoas indicadas no nº 1 do artigo 1915º, decretar as providências adequadas, designadamente confiá-lo a terceira pessoa ou a estabelecimento de educação ou assistência.
  29. CC: Art. 1915º
  30. 1.A requerimento do Ministério Público, de qualquer parente do menor ou de pessoa a cuja guarda ele esteja confiado, de facto ou de direito, pode o tribunal decretar a inibição do exercício das responsabilidades parentais quando qualquer dos pais infrinja culposamente os deveres para com os filhos, com grave prejuízo destes, ou quando, por inexperiência, enfermidade, ausência ou outras razões, não se mostre em condições de cumprir aqueles deveres.

  31. A astreinte, que é a multa diária imposta por condenação judicial na obrigação de fazer ou na obrigação de não fazer, a fim de coagir o vencido a cumprir a sentença e evitar a procrastinação em seu cumprimento..
  32. Entendimento encontrado tanto na doutrina portuguesa como na brasileira. Cfr. DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias (2007), p. 409; SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal, p. 97.
  33. O preceito pune com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias aquele que "de um modo repetido e injustificado, não cumprir o regime estabelecido para a convivência do menor na regulação do exercício das responsabilidades parentais, ao recusar, atrasar ou dificultar significativamente a sua entrega ou acolhimento".
  34. Maria Clara Sottomayor se posiciona contrariamente à suspensão da obrigação de alimentos, com o fundamento de que o direito da criança a alimentos é um direito autônomo, que não depende do cumprimento das outras obrigações insertas no acordo ou na sentença judicial. Cfr. SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal, p. 104.
  35. Art. 1906º
  36. 6. Ao progenitor que não exerça, no todo ou em parte, as responsabilidades parentais assiste o direito de ser informado sobre o modo do seu exercício, designadamente sobre a educação e as condições de vida do filho.

  37. Neste sentido, cfr. GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada, p. 101; SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal, p. 119.
  38. CC Art. 2004º
  39. 1.Os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los.

    2.Na fixação dos alimentos atender-se-á, outrossim, à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência.

  40. DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias (2007), p. 482.
  41. Neste sentido, cfr. SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal, p. 206.
  42. Art. 1879º Os pais ficam desobrigados de prover ao sustento dos filhos e de assumir as despesas relativas à sua segurança, saúde e educação na medida em que os filhos estejam em condições de suportar, pelo produto do seu trabalho ou outros rendimentos, aqueles encargos.
  43. I- A maioridade não determina a cessação automática do dever de prestação de alimentos fixadas em data precedente, carecendo a cessação de ser judicialmente decretada a requerimento do obrigado ou haver acordo no sentido de que esse direito terminou. II- A partir da maioridade o processo adequado para actualizar o regime de alimentos que foi fixado para a menoridade ou para providenciar pela fixação dos mesmos é o estipulado no art. 1412º do CPC, a requerimento do ex-menor. (Relação de Coimbra, 05/04/2005: CJ, 2005, 2º- 16).
  44. Art. 1880º Se no momento em que atingir a maioridade ou for emancipado o filho não houver completado a sua formação profissional, manter-se-á a obrigação a que se refere o número anterior na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento e pelo tempo normalmente requerido para que aquela formação se complete.
  45. ALIMENTOS. FILHA MAIOR E ESTUDANTE UNIVERSITÁRIA. 1. O pátrio poder cessa quando o filho atinge a maioridade, mas não desaparece o dever de solidariedade decorrente da relação parental. 2. Necessitando a filha de alimentos para garantir a freqüência a estabelecimento de ensino superior, como complemento da sua educação, que é dever residual do poder familiar, está o pai obrigado a auxiliá-la, mormente quando os alimentos estão fixados em patamar bastante razoável. Recurso desprovido. (TJRS, 7ª C. Cível, AC 70009290222, rel. Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, j. 15/09/2004)
  46. Neste sentido, entende Maria Berenice Dias que o adimplemento da capacidade civil, ainda que dê ensejo a extinção do poder familiar, não põe termo, automaticamente, ao encargo do pai que não detém a guarda. Tendo em vista a necessidade cada vez mais evidente de qualificação para inserção no mercado de trabalho, a prática judicial vem prorrogando o período de vigência dos alimentos. Cfr. DIAS, Maria. Manual de direito das famílias, p. 469.
  47. Sobre tal questão, complementa Regina Beatriz Tavares da Silva, em seus comentários ao Art. 1694 do Código Civil brasileiro que, "o instituto dos alimentos entre parentes compreende a prestação do que é necessário à educação independentemente da condição de menoridade, como princípio da solidariedade familiar". BRASIL. Novo Código Civil comentado, p. 1503.

  48. Artigo 189º
  49. 1 - Quando a pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos não satisfazer as quantias em dívida dentro de dez dias depois do vencimento, observar-se-á o seguinte:

    a) Se for funcionário público, ser-lhe-ão deduzidas as respectivas quantias no vencimento, sob requisição o tribunal dirigida à entidade competente;

    b) Se for empregado ou assalariado, ser-lhe-ão deduzidas no ordenado ou salário, sendo para o efeito notificada a respectiva entidade patronal, que ficará na situação de fiel depositário;

    c) Se for pessoa que receba rendas, pensões, subsídios, comissões, percentagens, emolumentos, gratificações, comparticipações ou rendimentos semelhantes, a dedução será feita nessas prestações quando tiverem de ser pagas ou creditadas, fazendo-se para tal as requisições ou notificações necessárias e ficando os notificados na situação de fiéis depositários.

    2 - As quantias deduzidas abrangerão também os alimentos que se forem vencendo e serão directamente entregues a quem deva recebê-las.

  50. Art. 250º
  51. 1 — Quem, estando legalmente obrigado a prestar alimentos e em condições de o fazer, não cumprir a obrigação no prazo de dois meses seguintes ao vencimento, é punido com pena de multa até 120 dias.

    2 — A prática reiterada do crime referido no número anterior é punível com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias.

    3 — Quem, estando legalmente obrigado a prestar alimentos e em condições de o fazer, não cumprir a obrigação, pondo em perigo a satisfação, sem auxílio de terceiro, das necessidades fundamentais de quem a eles tem direito, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.

    4 — Quem, com a intenção de não prestar alimentos, se colocar na impossibilidade de o fazer e violar a obrigação a que está sujeito criando o perigo previsto no número anterior, é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias.

    5 — O procedimento criminal depende de queixa.

    6 — Se a obrigação vier a ser cumprida, pode o tribunal dispensar de pena ou declarar extinta, no todo ou em parte, a pena ainda não cumprida.

  52. Cfr. SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal, p. 235.
  53. Função inibidora do não cumprimento do dever de alimentos por parte da generalidade dos obrigados, potenciais violadores do referido dever.
  54. Diferentemente ocorre no ordenamento jurídico brasileiro. No incumprimento da obrigação de alimentos pode ficar configurado o tipo descrito no art. 244 do Código Penal brasileiro (crime de abandono material), além de dar ensejo à prisão civil do devedor. Uma vez configurado o delito do art. 244 do Código Penal, o adimplemento da obrigação não tem o escopo de extinguir ou dispensar a pena, uma vez que tal sanção não possui uma finalidade preventiva (como da prisão civil, cujo objetivo é apenas que o devedor cumpra, de pronto, com sua obrigação), mas sim punitiva.
  55. SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal, p. 239.
  56. Posição também defendida por DIAS, Cristina M. Araújo. DIAS, Cristina M. Araújo. Uma análise do novo regime jurídico do divórcio, p. 44-45; SOTTOMAYOR, Maria Clara. Regulação do exercício do poder paternal nos casos de divórcio, p. 58-62; e pela APMJ- Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, em parecer disponível em: http://www.apmj.pt/Documentos/AR%20-%20Divórcio.pdf .


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHAVES, Marianna. A posição jurídica do progenitor não-guardião em Portugal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2715, 7 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17986. Acesso em: 18 abr. 2024.