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Lei de Responsabilidade Fiscal: como a Lei Complementar nº 131/2009 democratizou o controle orçamentário?

Lei de Responsabilidade Fiscal: como a Lei Complementar nº 131/2009 democratizou o controle orçamentário?

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RESUMO: O presente artigo tem por finalidade analisar a alteração da Lei Complementar nº. 101 pela nº. 131, principalmente quanto à inovação da previsão do controle popular nas contas públicas. Pretende-se verificar como essa mudança repercutiu, sob as aspirações do Estado Democrático de Direito, e como se compatibilizou com a Constituição pelo fato de ter fortalecido a concepção do povo como legítimo detentor do poder. Então, sob o amparo dos preceitos constitucionais, busca-se demonstrar que a alteração de qualquer espécie normativa que aumente a possibilidade de fiscalização empreendida pelo cidadão, pode representar uma evolução para o Estado. Ao longo dos modelos de Estado liberal e social, a democracia participativa nos atos de gestão, não apenas administrativa como também fiscal, era algo desconhecido e impraticável. Contudo, ainda na perspectiva do paradigma democrático, existem resistências contrárias ao efetivo controle do povo na gestão do Estado.

PALAVRAS-CHAVES: Lei de Responsabilidade Fiscal – controle popular – orçamento público – Estado Democrático de Direito.


Introdução

Questão controvertida e pouco fomentada na realidade dos entes federados é a participação popular na fiscalização e controle das contas públicas. Até a vigência da Lei Complementar nº. 101, ainda inexistia uma lei infraconstitucional destacando a abertura de um canal efetivo de controle da gestão fiscal sem deixar de suprimir a relevância do administrado nesse processo de fiscalização.

Reconhecendo a ausência da democracia participativa na regulação da arrecadação e dos gastos públicos, a lei de responsabilidade fiscal, como é vulgarmente conhecida, ainda permitia brechas em que os gestores públicos utilizavam para se esquivarem da apresentação dos resultados financeiros de seus governos.

A lei de responsabilidade fiscal limitava-se tão-somente a incentivar a participação popular no âmbito fiscal sem propor os meios pelos quais os interessados pudessem se utilizar para controlarem o orçamento público. Obviamente se não houvesse qualquer manifestação popular, a Administração Pública se quedaria inerte e não teria nenhuma responsabilidade a ser apurada.

Contudo, as alterações de alguns dispositivos e a inserção de outros no texto da lei em comento mudaram completamente esse panorama camuflado de malícias pelos órgãos gestores, que se escoravam no argumento de que haveria falta de interesse do povo na realização de um controle público na gestão fiscal.

Assim, a LC nº. 131 promoveu as modificações necessárias para assegurar a participação popular no controle orçamentário e, consequentemente, criou os instrumentos úteis colocados à disposição do cidadão e das entidades de classes para tornar mais efetivo o ato de controlar o orçamento público.

O que realça a nova redação da LC nº. 101 é a sujeição dos diversos níveis de poder a ter que empregar esforços dentro do prazo pré-estabelecido para viabilizar a fiscalização das contas públicas, sob pena de sanção em caso de descumprimento da prescrição legal.

Para se ponderar acerca desse processo moderno de controle do orçamento público, deve-se primeiro contextualizar a evolução dos mecanismos de controle orçamentário, para depois se analisar numa linha de tempo a postura do cidadão e a flexibilização da Administração Pública em aceitar o controle popular.

Essas serão as etapas perseguidas ao longo do artigo para se alcançar o objetivo de demonstrar como a lei de responsabilidade fiscal está sintonizada com o ideal constitucional de concretização da democracia participativa.


1. A evolução do papel do cidadão: do Estado Liberal ao Estado Democrático de Direito

Em razão dos diversos fenômenos ocorridos durante o curso da história, o Estado acabou adotando posturas que variaram entre atuações marcadas pela intervenção no domínio econômico ou pela ausência de regulação.

Essa oscilação ligava-se às tendências ideológicas da época, que ora priorizava uma conduta negativa do Estado para impedir a invasão na esfera privada e garantir o direito público subjetivo do indivíduo (Estado Liberal), ora enfatizava a necessidade de uma intervenção positiva do aparato Estatal para dar ensejo ao desenvolvimento e à concretização da justiça social (Estado Social).

Aos poucos as ações negativas do Estado mostraram-se ineficazes na promoção de sujeitos emancipados e detentores de direitos fundamentais, pois a omissão Estatal em intervir na economia e na recusa em implementar a igualdade material desencadearam a derrocada do modelo liberal pela ineficiência de se satisfazer os anseios dos cidadãos, especialmente dos menos favorecidos que estavam vulneráveis aos problemas sociais.

Outrossim, o modelo social também apresentou fragilidades estruturais ao não efetivar a igualdade material devido ao rechaço das classes sociais privilegiadas em ter que ceder suas regalias em detrimento daquelas que se encontravam despidas de recursos materiais, resultando na estagnação do desenvolvimento econômico e social e na crise do Estado Social.

A tentativa de corrigir as falhas apresentadas nos Estados Liberal e Social aparece com a implantação do Estado Democrático de Direito, entendido procedimentalmente como condição de aceitabilidade racional para lidar com questões políticas. Segundo Jürgen Habermas:

The rational acceptability of results achieved in conformity with procedure follows of communication that, ideally speaking, ensure that all relevant questions, issues, and contributions are brought up and processed in discourses and negotiations on the basis of the best available information and arguments. [01] (HABERMAS, 1996, 170)

Resulta, portanto, que somente através da democracia participativa é que se poderia efetivar a coexistência da soberania popular e do primado da legalidade, inexistente no modelo liberal, e também desconstituir a opressão dos governos totalitários no modelo social.

O cidadão, no Estado Democrático de Direito, passa a desempenhar um papel fundamental ao ter reconhecido pelas esferas de poder a sua importância na condução do Estado. As Constituições democráticas começam a prever a criação de ambientes públicos e instrumentos legítimos que favoreçam as discussões envolvendo as contas e as políticas públicas, sendo isso um autêntico canal de comunicação direta entre o Estado e a sociedade civil.

Esse processo fortalece a concepção de cidadão moderno, assim considerado aquele que se preocupa com a humanidade apesar de se agrupar em categorias específicas ou estratificadas, e que é capaz de perceber sua necessidade no engajamento global. Surge então um personagem [02] que reconhece a relevância da participação popular no controle das contas e das políticas públicas, proporcionando o pluralismo, a valorização das diferenças, a igualdade de oportunidades e a prática cívica.

O aparecimento de cidadãos dispostos a participar democraticamente da tomada de decisões políticas condiciona-se à existência de espaços em que estes possam se reunir, de modo que seja proporcionado o direito de opinar, mesmo que a opinião da minoria não seja prevalecente.

Na concepção de Müller, a ideia de democracia não pode se limitar ao exercício do direito de voto, senão vejamos:

A idéia fundamental da democracia é a seguinte: determinação normativa do tipo de convívio de um povo pelo mesmo povo. Já que não se pode ter autogoverno, na prática quase inexeqüível, pretende-se ter ao menos a autocodificação das prescrições vigentes com base na livre competição entre opiniões e interesses, com alternativas manuseáveis e possibilidades eficazes de sancionamento político. Todas as formas da decisão representativa arredam a imediatidade. Não há nenhuma razão democrática para despedir-se simultaneamente de um possível conceito mais abrangente de povo: do da totalidade dos atingidos pelas normas: one man one vote. Tudo o que se afasta disso necessita de especial fundamentação em um Estado que se justifica como ‘demo’cracia. (MÜLLER, 2003, p. 50)

O que de fato interessa é a tomada de decisão baseada no consenso entre os envolvidos no debate público. Nesse contexto, Habermas sustenta que deve existir o agir comunicativo no Estado Democrático de Direito, ou seja, o entendimento entre falantes e ouvintes como um consenso sobre algo em comum no universo que os envolve.

Segundo Habermas, o corpo político se constitui de pessoas que se reconhecem mutuamente como portadoras de direito recíprocos. O reconhecimento de todos esses direitos pelos cidadãos funda-se em leis, e estas para serem legítimas tem que garantir o acesso de todos aos mesmos níveis de liberdade, inclusive os de participação e resolução dos problemas sociais enfrentados. [03]

Assim, a soberania do povo, mesmo se este se encontrar no anonimato, somente tem espaço no processo democrático, bem como atinge a consolidação jurídica de seus pressupostos comunicacionais se essa soberania popular tiver por fim precípuo a validação do poder criado através da comunicação. [04]

Com isso, o cidadão assume uma postura condizente com aquilo que se espera do modelo de Estado Democrático de Direito, já que a democracia participativa garante o acesso a qualquer indivíduo, em pleno gozo de seus direitos políticos, a exercer em todos os graus a sua liberdade de participar das discussões e resoluções dos problemas atinentes à sua sociedade.

E esse espaço de debates e deliberações públicas vem se ampliando gradativamente, sobretudo, para incluir o cidadão nas tomadas de decisões sobre o orçamento público, de modo que seja garantido o exercício efetivo do controle das contas públicas.

O acesso ao orçamento público pela sociedade é um mecanismo salutar de controle da arrecadação e dos gastos, pois os beneficiários dos investimentos realizados com recursos públicos podem acompanhar o processo de tomada de decisões prioritárias. Com isso, somente aqueles que conhecem com maior proximidade a realidade da educação, da saúde, do sistema de transporte coletivo, da urbanização, do saneamento básico, das moradias, do meio ambiente, enfim, de todos os setores mantidos pelos Municípios brasileiros, tem maior legitimidade para definir os investimentos mais urgentes.

Essa característica peculiar do Estado Democrático de Direito marcada pela democracia participativa irradia-se inclusive no compartilhamento das decisões envolvendo os investimentos públicos, fazendo com que os verdadeiros legitimados, também conhecedores das carências locais, sejam elevados ao status de controladores das contas públicas.

E, se tal assertiva não é uma novidade diante da legislação que cuida da matéria, como a Lei de Improbidade Administrativa, a Lei do Orçamento Público, dentre outras, não é menos verdade que os avanços na área fiscal voltadas para o controle dos atos dos agentes políticos não pode ser desconsiderado ou mesmo ignorado como uma mudança paradigmática na forma do controle orçamentário.

Por essa razão é que a as alterações recentemente promovidas pela Lei Complementar nº. 131 de 27 de maio de 2009 não devem ser lançadas ao vazio ou quedadas no esquecimento. Eis o motivo pelo qual sua análise é fundamental:


2. Novas tendências do orçamento municipal depois da Lei Complementar nº. 131

Sérgio Jund define orçamento público como: "(...) um instrumento de planejamento da ação governamental composto das despesas fixadas pelo Poder Legislativo, autorizando o Poder Executivo realizá-las durante um exercício financeiro mediante a arrecadação de receitas suficientes e previamente estimadas." (JUND, 2007, p.49)

O orçamento, na acepção da palavra, denota tudo aquilo que pode ser gasto até um determinado limite, sem ultrapassar o que foi efetivamente recebido durante um espaço de tempo. Não se deve gastar mais do que se recebe para evitar a ocorrência do déficit orçamentário, sendo essa uma lógica comum no cenário da ciência da economia.

Essa é uma regra que geralmente aplica-se tanto no setor privado quanto no setor público, e que faz convergir consequências semelhantes: na área privada gastar mais do que o limite orçamentário pode culminar na desintegração patrimonial; na área pública esse mesmo fenômeno acarreta o endividamento da Administração Pública municipal e o corte de investimentos em segmentos fundamentais, principalmente na educação, saúde, moradia, saneamento básico e urbanização, embora parte do orçamento esteja vinculado à manutenção dessas áreas.

No âmbito público, o estabelecimento de regras orçamentárias e a tomada de decisões acerca dos gastos e investimentos nos setores de responsabilidade do Município estiveram restritos somente ao decisionismo dos governos municipais. O orçamento público, até a edificação do novo modelo de Estado implantado em 1988, era de responsabilidade exclusiva dos representantes do povo, "eleitos" [05] para representarem os legítimos detentores do poder.

Com a entrada em vigor da Lei Complementar (LC) nº. 101 em 2000, estabelecendo normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, é que se possibilitou a participação democrática no controle das contas e dos investimentos públicos. Enfim foi criada uma lei com o objetivo de proporcionar aos cidadãos: transparência, controle e fiscalização na gestão fiscal.

O artigo 48 da LC nº. 101, de forma inédita, reconheceu a democracia participativa como um instrumento de transparência fiscal, representando um grande avanço para o processo democrático brasileiro, que até então desconhecia outro instrumento normativo tão aberto à inclusão cidadã na tomada de decisões públicas, verbis:

Art. 48.São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.

Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos.

O controle da gestão fiscal ocorreria, principalmente, pelo acesso público aos planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias, inclusive por meios eletrônicos, sendo de toda maneira estimulada a participação popular no ato do controle e da fiscalização das contas públicas, sem que isso representasse efetivamente uma obrigação da Administração Pública municipal prestar contas aos administrados.

Esse fato fez surgir a necessidade de revisão da LC nº. 101 para compelir todos os níveis de Poder, inclusive o municipal, a tomarem a iniciativa de prestarem suas contas sem a imediata provocação dos cidadãos.

Ressalta-se que isso também possibilitou uma forma de garantir a força normativa da Constituição, uma vez que a Lei Complementar tem como fim promover especificações do texto constitucional que, no caso da LC nº. 101, é criar instrumentos que assegurarem o controle popular na gestão fiscal.

Antes da vigência da LC nº. 131 o controle das contas públicas era pouco efetivo porque ficava limitado ao controle repressivo adotado pelo Ministério Público, pelo Tribunal de Contas, bem como pelos instrumentos previstos na Lei de Ação Civil Pública (Lei nº. 7.347/85) e na Lei de Ação Popular (Lei nº. 4.717/65).

Assim, os artigos 48, 48-A, 73-A e 73-B da LC nº. 101, incluídos pela recente LC nº. 131 de 2009, ampliaram os mecanismos de controle existentes a fim de determinarem a disponibilização em tempo real de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, o que deixou de ser apenas um mero estímulo à participação popular e passou a ser uma obrigação dos entes federados proporcionarem, a qualquer pessoa física ou jurídica e às entidades de classes, o acesso às informações relativas às suas gestões fiscais dentro de certos prazos, sob pena de sanção.

Dentre as alterações que merecem destaque, aponta-se a ampla divulgação sobretudo em meios eletrônicos do acesso público como instrumento de transparência da gestão fiscal, sendo garantido também o incentivo à participação popular, a liberação de informações detalhadas, a adoção de sistema integrado de administração financeira, dentre outros recursos acrescentados à nova redação do artigo 48. [06]

É importante frisar, da mesma forma, que os entes federados são obrigados a disponibilizar a qualquer pessoa física ou jurídica informações relativas aos atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução das despesas e no lançamento e recebimento de todas as receitas (art. 48-A). [07]

Outro detalhe que deve ser salientado é a possibilidade de qualquer cidadão e entidades de classes serem partes legítimas para denunciarem ao Tribunal de Contas e ao Ministério Público o descumprimento das disposições da LC nº. 101 após as alterações feitas pela LC nº. 131 (art. 73-A). [08]

E quanto às mudanças acrescentadas à lei de responsabilidade fiscal ficou estabelecida ainda a previsão de prazos para o cumprimento espontâneo das exigências dispostas no texto da lei por parte dos diversos níveis de poder (art. 73-B). [09]

A nova redação dada à LC nº. 101 inovou ao tornar mais rígido o controle nas gestões fiscais e ainda por conferir maior legitimidade ao controle popular. Com efeito, o reconhecimento pelo legislador da necessidade do controle popular ser mais efetivo demonstra que a lei de responsabilidade fiscal está em sintonia com a Constituição.


3. O controle popular na lei de responsabilidade fiscal: compatibilidade com o texto constitucional

Conforme prevê o artigo 5º, inciso XXXIII do texto constitucional, "todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;".

A LC nº. 101, após sofrer algumas alterações, determinou não apenas a existência de meios de fiscalização e de controle popular, mas também estabeleceu a exigência de que os entes da Federação se prontifiquem a prestar informações orçamentárias à população, o que se acopla com a disposição do artigo 163, inciso V, do texto constitucional, quando este dispositivo impõe que "Lei Complementar disporá sobre: (...) V – fiscalização financeira da administração pública direta e indireta;".

A abertura do canal de fiscalização das contas públicas tornou-se mais um recurso colocado à disposição dos administrados que contam ainda com o privilégio de opinarem sobre a destinação dos recursos públicos arrecadados, definindo quais são as prioridades dos investimentos locais.

Esse fenômeno deu origem ao orçamento participativo, que consiste numa espécie de programa de governo em que os gestores públicos dividem com a população a responsabilidade pela tomada de decisões públicas. Então, por meio do processo democrático, os administrados são chamados a decidirem quais são as prioridades dos investimentos previstos na dotação orçamentária.

Nesse sentido, Maria Cristina Seixas Vilani ressalta que na modernidade o cidadão assume a co-responsabilidade no processo decisório, especialmente na elaboração e aplicação das leis. A referida autora aponta que: "A peculiaridade do Estado democrático de direito reside na expansão e democratização do sistema jurídico, ao fazer do cidadão intérprete da Constituição e co-autor das leis que o regem." (VILANI, 2002, p. 60)

Ocorre que a democracia participativa espelha a preocupação do Estado Democrático de Direito em confirmar a legitimidade dos cidadãos como detentores do poder, tanto no processo legislativo, judicial, administrativo, quanto no processo de fiscalização e de controle das contas públicas.

Não resta dúvida de que o canal de participação aberto pela lei de responsabilidade fiscal iniciou uma fase de transformação da Administração Pública, notadamente na esfera municipal, em razão das dotações orçamentárias dos Municípios serem mais facilmente fiscalizadas e controladas pelos administrados.

A LC nº. 131 deu novos contornos ao controle popular no que se refere ao orçamento público, sendo que os reflexos dessa inovação modularam o comportamento dos cidadãos diante das novas tendências da Administração Pública, embora não se tenha alcançado o nível de participação ainda adequado. [10]

Moacir Marques da Silva, Francisco Antônio de Amorim e Valmir Leôncio da Silva entendem que a sociedade contemporânea está mais consciente e preocupada com a destinação dos recursos públicos. Os autores mencionados asseveram que a transparência fiscal torna-se mais efetiva e que:

Nos dias de hoje, a sociedade apresenta maior preocupação com os valores dos impostos pagos por ela, sendo assim inevitável o desejo de conhecer os recursos aplicados pelos administradores públicos. A forma de se atender aos anseios dessa sociedade seria tornar transparente os atos da administração pública, nos quais envolvessem todas as receitas e despesas. (SILVA; AMORIM; SILVA, 2007, p. 117)

Aquilo que era somente um ideal da Constituição teve concretização no plano real quando se reconheceu a importância do cidadão nas discussões e deliberações acerca dos investimentos públicos. E isso está em plena consonância com as disposições constitucionais pelo fato de ser a democracia participativa princípio fundamental no paradigma do Estado Democrático de Direito.

A própria lei de responsabilidade fiscal depois de ser alterada pela LC nº. 131 enfatizou a necessidade de efetivação do controle popular ao adotar outros meios mais corriqueiros de acesso público às contas públicas, com destaque para os meios eletrônicos. Além disso, os cidadãos e as entidades de classes estariam habilitados a transmitir informações aos órgãos incumbidos de realizarem uma fiscalização mais severa e detalhada, como o Ministério Público e o Tribunal de Contas.

Outra peculiaridade da LC nº. 101 é que os membros da Federação também estão sujeitos ao cumprimento de prescrições legais, especialmente quanto à observância de prazos para que prestem informações aos administrados sobre despesas e receitas orçamentárias. Não somente as pessoas físicas ou jurídicas e as entidades de classes seriam estimuladas a adotarem posturas mais ativas, como também a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, se obrigariam a contribuir para a concretização do ideal constitucional de que todo o poder pertence aos seus detentores.

O fato de a Administração Pública direta ou indireta, federal, estadual ou municipal estar vinculada à prestação de contas aparece como um consectário do princípio da transparência dos atos de gestão fiscal da Administração Pública. Seria inconcebível que os gestores públicos, ao fazerem uso dos recursos públicos com finalidade de promoção dos interesses coletivos, se eximissem de demonstrar o quanto foi arrecadado e o quanto foi gasto nos investimentos.

A prestação de contas é essencial para se apurar os resultados obtidos durante os períodos governativos, sendo realizado um balanço para que sejam analisados os avanços e os percalços encontrados. Com o controle do povo acerca do que foi efetivamente arrecadado e investido, é possível se ter um parâmetro do grau de desenvolvimento alcançado.

Isso corresponde a uma justificativa apresentada aos administrados de todo o trabalho desempenhado num espaço delimitado de tempo, no qual será avaliado o nível de eficiência do governo. Assim, os cidadãos têm a oportunidade de sopesarem e valorarem os feitos em prol do interesse coletivo obtidos pelos governantes e decidirem, democraticamente, se o governo deve ser mantido.

A transparência das contas públicas correlaciona-se também à eficiência administrativa em função de que somente a gestão fiscal da Administração Pública embasada na lisura e boa-fé poderá impedir a responsabilização legal dos governantes quanto ao que se arrecadou e se gastou. Então, ser rotulada de boa ou ruim é uma decorrência natural do índice de eficiência reconhecido pelos administrados.

Talvez essa seja a maior razão pela qual a LC nº. 131 trouxe as inovações na lei de responsabilidade fiscal. A própria Administração Pública faz uma autocrítica de si mesma apresentando um relatório minucioso de suas contas aos administrados, o que viabiliza a inclusão democrática no processo de gestão fiscal e administrativa.

Nesse contexto emerge a democracia participativa como um mecanismo de controle das contas públicas, mas também como uma manobra política eficiente de perseguir o prestígio popular e a eficiência administrativa.

Em que pese essas considerações, a abertura de um canal eficaz de controle das contas públicas feita diretamente pelos cidadãos tem por escopo a concretização do texto constitucional, ainda mais se se considerar a ausência de leis no ordenamento jurídico brasileiro que ampliam as bases do sistema democrático.


4 – O controle popular na perspectiva da jurisprudência brasileira

Os Tribunais brasileiros gradativamente consolidam posicionamentos jurisprudenciais alinhados ao ideal do Estado Democrático de Direito: a participação popular no controle fiscal e funcional da Administração Pública. Embora ainda seja bastante incipiente o reconhecimento de que o povo é o legítimo detentor do poder, sendo, portanto, o principal interessado na prestação das contas públicas, nota-se uma reviravolta na concepção da fiscalização ser somente exercida pelos órgãos que assumem essa característica.

A doutrina e a própria jurisprudência renovam a argumentação jurídica a partir de fundamentos lastreados no texto da Constituição, quebrantando o paradigma do Estado Social, em que o Estado avocava para si a responsabilidade pela prestação de políticas públicas e o controle de seus próprios atos.

Na perspectiva do modelo calcado pelo exercício efetivo da democracia popular, o monopólio do poder de controle e fiscalização pelo Estado perde eficácia. Abandona-se a crença de representação e o povo passa a ocupar a posição de co-responsável pela gestão fiscal e administrativa através de conselhos municipais, ouvidorias, audiências públicas e demais instrumentos de participação.

O poder constituinte originário assegurou nessa nova ordem constitucional a possibilidade para a abertura do canal de participação popular direta nos atos de gestão pública. A Lei Complementar nº. 101, que dispõe sobre normas direcionadas à responsabilidade na gestão fiscal, foi criada justamente para especificar a norma constitucional que garante o controle e a fiscalização do povo enquanto detentor do poder.

Mesmo tendo se passado mais de vinte anos de promulgação da Constituição, não apenas os gestores públicos apresentam-se resistentes e receosos quanto ao compartilhamento com o povo pela responsabilidade administrativa e fiscal, mas também a jurisprudência. São escassas as decisões jurisdicionais contendo argumentos jurídicos construídos sob o respaldo constitucional, que reconhece a força dos instrumentos de controle e fiscalização popular.

A lei nº. 4.717 de 29 de junho de 1965, por exemplo, que criou a ação popular, apesar de prever que qualquer cidadão é parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público, ainda é pouco explorada. Se já é raro se constatar a tramitação de uma ação popular sob o manto da lei em comento, uma decisão judicial envolvendo a referida ação torna-se ainda mais infreqüente.

Contudo, a inovação na lei de responsabilidade fiscal sinaliza a busca por novos horizontes. Sem dúvida alguma, certifica-se a ocorrência de um grande avanço o legislador favorecer a possibilidade de o povo interferir no processo de prestação de contas. E isso ainda é consubstanciado pelo fato da jurisprudência do Tribunal de Contas da União (TCU) dar indícios de que, o povo enquanto legítimo detentor do poder, precisa estar ciente dos atos praticados pelos gestores públicos, senão vejamos:

Auditoria. BACEN. Verificação da economicidade, eficiência e eficácia dos gastos com publicidade e propaganda do Governo Federal e apuração de denúncia acerca do assunto. Veiculação de campanhas desconectadas dos objetivos institucionais da autarquia. Campanhas comemorativas do Plano Real sem o conhecimento das peças básicas orientadora dos gastos dos recursos pelo BACEN e sem autorização expressa da Secretaria de Comunicação da Presidência da República. Utilização de meios de comunicação de massa inadequados ao esclarecimento do Programa PROER, com o objetivo de direcionar a opinião pública no sentido de amenizar a imagem negativa do Programa. Celebração de termo aditivo para pagamento de diárias e passagem vedado pelo contrato original. Celebração de termo aditivo para prorrogação da vigência de contrato para realização de serviços que já dispunham de valor global para execução. Acolhimento das justificativas apresentadas por alguns responsáveis. Alegações de defesa do ex-Diretor Administrativo do BACEN rejeitadas, em parte. Multa. Determinação. Juntada às contas.

(...)

Ora, para poder participar realmente dos atos de governo, o cidadão precisa ficar sabendo o que o governo está fazendo ou pretende fazer. Sem publicidade fica seriamente prejudicado o exercício da democracia participativa.

Em resumo, os princípios fundamentais da Constituição da República Democrática e Federativa do Brasil indicam claramente que a Administração Pública não pode ser secreta, reservada, acessível apenas aos detentores do Poder.

Também não é razoável que os assuntos administrativos cheguem ou não cheguem ao conhecimento do povo na dependência do interesse ou da boa vontade da imprensa. (TCU, Processo nº. 000.526/1998-3, Rel. Adylson Motta, DOU 12/12/2000)

A democracia participativa taxada como ultraje aos interesses da Administração Pública em passado remoto, no atual contexto constitucional encontra-se em fase embrionária, desenvolvendo-se principalmente pela readequação da postura política do cidadão frente às exigências ideológicas do Estado Democrático de Direito.

Os entraves de ordem burocrática até então capazes de impedir a participação popular, agora são incompatíveis com essa realidade constitucional que paira sobre o Estado brasileiro. Essa situação começa a ser inclusive rechaçada pela jurisprudência dos Tribunais, especialmente do TCU, que reconhece ser o controle popular o mecanismo que proporcione a atuação eficiente das instituições e órgãos públicos.

Nesse sentido, destaca-se a decisão do TCU acerca da importância da participação popular, verbis:

Pedido de reexame. Representação. Pessoal. Pagamentos irregulares de diárias. Negativa de provimento. Nega-se provimento a Pedido de Reexame em que os argumentos oferecidos pela recorrente não se mostram hábeis a alterar a deliberação atacada.

(...)

O controle social é a concretização do ideal de democracia participativa. Revela-se promissor na medida em que os indivíduos e suas entidades representativas podem deflagrar ações concretas para proteger o bem de todos. É a participação cidadã emergindo como agente de mudança e mostrando o papel de cada um ante a ação do Estado. É o homem comum sentindo-se responsável pelos seus rumos.

Agindo assim, a nova cidadania efetiva essa eficiente fiscalização, provocando a atuação das instituições que têm como missão zelar pelo patrimônio público. É o desejo do aperfeiçoamento da administração estatal se manifestando em atitudes que buscam evitar desvios ou mau uso dos dinheiros do erário, desencadeando a punição dos responsáveis quando não for possível impedir o prejuízo. (TCU, Processo nº. 008.506/1999-0, Rel. Valmir Campelo, DOU 14/09/2007)

Sob essa ótica, a alteração da lei de responsabilidade fiscal para admitir o controle popular nos atos praticados por gestores públicos envolvendo matérias fiscais e orçamentárias, representou uma mudança de postura do legislador chancelada pela jurisprudência. Esse fato marca uma evolução compatível com a Constituição na medida em que o TCU, também na condição de órgão fiscalizador, prestigia a participação como o instrumento mais viável de controle das contas públicas.


Conclusão

O Estado Democrático de Direito de certa forma tem que festejar a queda do autoritarismo perpassado na sua história constitucional. Após sua instituição mediante a promulgação da Constituição de 1988, ainda era desconhecida uma lei que sequer tivesse como primado facilitar o acesso popular nas funções primordiais da Administração Pública.

Perdurou por muito tempo a idéia de que os órgãos de gestão administrativa deveriam permanecer restritos a uma atuação meramente representativa. Isso provocou o surgimento do mito pelo qual ao povo não era dado o direito de intervir diretamente nos atos de gestão administrativa, ainda mais em assuntos fiscais e orçamentários.

O legítimo detentor do poder esteve durante todo esse período ausente do exercício de sua soberania, configurada apenas no momento de consumação do pleito eleitoral. A partir disso, a vontade popular seria delegada aos seus representantes eleitos por um espaço de tempo delimitado, cabendo aos órgãos apropriados o papel de exigirem e fiscalizarem as prestações de contas dos gestores públicos.

O povo permanecia relegado ao papel de coadjuvante enquanto o controle das contas públicas realizava-se às escuras. A fragilidade do controle orçamentário culminou em inúmeros escândalos políticos de corrupção e na diluição de exorbitantes quantidades financeiras.

A burocracia no acesso às prestações de contas foi outro fator de incerteza quanto à veracidade dos resultados, uma vez se contrapunham drasticamente à realidade do País, em especial na esfera municipal.

Esses acontecimentos fizeram com que o povo se despertasse para a necessidade de uma reação imediata, ainda pouco intensa na atual conjuntura. Por isso que a inovação trazida pela lei de responsabilidade fiscal representa um marco evolutivo no processo de controle orçamentário.

Agora em diante os administrados assumem a co-responsabilidade pela condução da Administração Pública, inclusive com a prerrogativa de escolherem democraticamente quais são as prioridades dos investimentos públicos.

Essa descentralização do poder decisório acentua as características do papel do povo no paradigma do Estado Democrático de Direito, principalmente quando a questão envolve matéria fiscal e orçamentária.

Portanto, a LC nº. 101 é um indicativo de que o legislador começou a consentir que o povo é o titular do poder político, sendo fundamental a sua participação direta no processo de apuração e controle dos recursos arrecadados e gastos pelos gestores públicos.


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MÜLLER, Friedrich. Quem é o povo? 3. ed., rev. e ampl., Tradução: Peter Naumann. São Paulo: Max Limonad, 2003.

PETIT, Philip. Democracia e contestabilidade. In: MERLE, Jean-Christophe; MOREIRA, Luiz (Org.). Direito e legitimidade. São Paulo: Landy editora, 2003, p. 370-384.

VILANI, Maria Cristina Seixas. Cidadania moderna: fundamentos doutrinários e desdobramentos históricos. Caderno de Ciências Sociais, Belo Horizonte, 2002, p. 47-64.


Notas

  1. "A aceitabilidade racional dos resultados conseguidos em conformidade com o procedimento segue de uma comunicação que, idealmente falando, assegura que todas as perguntas relevantes, questões e contribuições são colocadas e processadas nos discursos e nas negociações com base nas melhores informações e argumentos disponíveis." (Tradução livre)
  2. Paulo Bonavides sustenta que o cidadão enquanto parte do parte do povo é o instrumento de rompimento do regime representativo. Segundo o autor: "O cidadão, nesse sistema, é, portanto, o povo, a soberania, a nação, o governo; instância que há de romper a seqüência histórica na evolução do regime representativo, promovendo a queda dos modelos anteriores e preparando a passagem a uma democracia direta, de natureza legitimamente soberana e popular." (BONAVIDES, 2004, p. 34-35)
  3. Para Habermas, é necessário assegurar a existência de um canal de comunicação para viabilizar a participação popular. O autor expõe que: "A formação de opinião que se dá de maneira informal desemboca em decisões eletivas institucionalizadas e em resoluções legislativas pelas quais o poder criado por via comunicativa é transformado em poder administrativamente aplicável." (HABERMAS, 2004, 289)
  4. Philip Petit aponta que o legislativo também precisa facilitar a participação popular mediante a concessão de oportunidades de deliberação aos diversos grupos sociais. Segundo o autor: "Um legislativo verdadeiramente inclusivo deverá incorporar, em seu próprio benefício, todos os diferentes canais encontrados no seio da comunidade. Deverá assegurar que, ao longo dos debates decisórios, as deliberações manifestadas sejam consideradas pela assembléia legislativa não apenas com base em um conjunto restrito de pareceres privilegiados, mas com base no extenso leque de perspectivas sociais." (PETIT, 2003, p. 374)
  5. Antes de 1988, o Brasil esteve submetido durante mais de vinte anos à opressão do Estado ditatorial marcado pelo longo período de governo militar. O início desse período ocorreu a partir de um golpe de Estado praticado em 1964, sendo que em momentos posteriores diversos governos militares comandaram o País. O período militar findou-se em 1985, quando o Brasil passou por um forte processo de redemocratização.
  6. Art. 48.São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.
  7. Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante: 

    I – incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos; 

    II – liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público;

    III – adoção de sistema integrado de administração financeira e controle, que atenda a padrão mínimo de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União e ao disposto no art. 48-A.

  8. Art. 48-A. Para os fins a que se refere o inciso II do parágrafo único do art. 48, os entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso a informações referentes a:
  9. I – quanto à despesa: todos os atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução da despesa, no momento de sua realização, com a disponibilização mínima dos dados referentes ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e, quando for o caso, ao procedimento licitatório realizado;

    II – quanto à receita: o lançamento e o recebimento de toda a receita das unidades gestoras, inclusive referente a recursos extraordinários.

  10. Art. 73-A. Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para denunciar ao respectivo Tribunal de Contas e ao órgão competente do Ministério Público o descumprimento das prescrições estabelecidas nesta Lei Complementar.
  11. Art. 73-B. Ficam estabelecidos os seguintes prazos para o cumprimento das determinações dispostas nos incisos II e III do parágrafo único do art. 48 e do art. 48-A:
  12. I – 1 (um) ano para a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios com mais de 100.000 (cem mil) habitantes;

    II – 2 (dois) anos para os Municípios que tenham entre 50.000 (cinquenta mil) e 100.000 (cem mil) habitantes;

    III – 4 (quatro) anos para os Municípios que tenham até 50.000 (cinquenta mil) habitantes. 

    Parágrafo único. Os prazos estabelecidos neste artigo serão contados a partir da data de publicação da lei complementar que introduziu os dispositivos referidos no caputdeste artigo.

  13. Interessante notar que a doutrina vem dando demonstrações ainda superficiais acerca da importância do controle popular nos gastos públicos. Carlos Pinto Coelho e Motta e Jorge Ulisses Jacoby Fernandes sustentam que: "Nesse contexto, não parece, por exemplo, sustentável que havendo o dever coletivo de contribuir para ingresso de recursos a serem aplicados pelo Estado, segundo a mais legítima vontade popular, possam as autoridades a pretender que seja mantido sigilo quanto ao cumprimento ou não desse dever. Não se trata de um apego a uma extremada posição socialista, mas uma efetiva ação do parâmetro da responsabilidade, valor fundamental e pressuposto da democracia." (MOTTA; FERNANDES, 2001, p. 179)

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ABRAS, Michelle; SANTOS, Andréa Cristina Correia de Souza Renault Baêta dos et al. Lei de Responsabilidade Fiscal: como a Lei Complementar nº 131/2009 democratizou o controle orçamentário?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2764, 25 jan. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18337. Acesso em: 19 abr. 2024.