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Argumentos em defesa da Tabela Price.

Comprovação prática da inexistência de anatocismo ou de capitalização composta das taxas de juros

Argumentos em defesa da Tabela Price. Comprovação prática da inexistência de anatocismo ou de capitalização composta das taxas de juros

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A fim de oferecer conteúdo científico em defesa da Tabela Price, objetiva-se demonstrar minuciosamente, pela análise técnica, que no Sistema de Amortização Francês não existe anatocismo.

Sumário: INTRODUÇÃO; I. ASPECTOS CONCEITUAIS INICIAIS; II. FUNCIONAMENTO DA TABELA PRICE; III. ARGUMENTOS ACERCA DO FATOR EXPONENCIAL DA FÓRMULA DA TABELA PRICE; IV. TABELA PRICE E CORREÇÃO MONETÁRIA; V. TABELA PRICE X SISTEMA DE AMORTIZAÇÃO CONSTANTE (SAC); VI. TABELA PRICE X MÉTODO DE GAUSS; VII. CONCLUSÃO.


INTRODUÇÃO

Na atualidade muito se tem falado e discutido, principalmente em Juízos de todo o país, a respeito do Sistema Francês de Amortização (Tabela Price). Este sistema alcançou proporções impensáveis, sendo utilizado em diversos tipos de operações financeiras, mormente no financiamento de bens e serviços e no financiamento da casa própria pelo Sistema Financeiro da Habitação.

Conhecido por ser um Sistema prático, fácil e útil, tanto para o tomador do financiamento, quanto para o mutuante, pelo fato de calcular prestações uniformes em todo o período do financiamento, e extinguir integralmente a dívida ao final do contrato, encontra-se hoje fortemente criticado e sendo rejeitado, sofrendo com a possibilidade de ser substituído por outro sistema de amortização menos eficiente.

Isto porque, contra o sistema enfeixam-se vorazes críticas, modeladas sem consistência técnica, sem comprovação matemática cabal, pautadas em conceitos puramente teóricos, que na maioria das vezes não guardam consonância alguma com a constatação prática, constituindo-se apenas em descuidadas teorias sem precisão científica, todas elas concluindo equivocadamente pela existência do anatocismo na Tabela Price.

Tendo em vista que tais teorias estão sendo aceitas em grande medida pelo Judiciário brasileiro, sendo até mesmo comum observar-se decisões judiciais que, revisando contratos de financiamento, determinam a substituição daquele sistema de amortização por outro, neste trabalho, a fim de oferecer conteúdo científico em defesa da Tabela Price, apresentamos este estudo, que objetiva, em síntese, demonstrar minuciosamente, pela análise técnica dos principais pontos debatidos quanto à Tabela Price, que no Sistema de Amortização Francês (Tabela Price) inexiste qualquer incidência de anatocismo.


I. ASPECTOS CONCEITUAIS INICIAIS

Antes de adentrarmos ao cerne específico do estudo que ora se propõe - comprovação da não-incidência de anatocismo no Sistema Francês de Amortização (Tabela Price) - entendemos útil a apresentação de alguns conceitos iniciais de matemática financeira, no cotejo com a legislação proibitiva do anatocismo, que, embora básicos, pressupõem o entendimento do funcionamento daquele sistema.

Freqüentemente vemos doutrinadores, juristas e estudiosos igualarem as expressões capitalização e juros compostos, como se fossem sinônimas, porém entre estes conceitos não há semelhança. Capitalização é a incorporação dos juros ao capital, que pode se dar tanto por meio de um regime de capitalização simples, como por meio de um regime de capitalização composta.

No primeiro caso, estamos diante de juros simples, ou lineares, em que os juros do período são calculados sobre o valor principal inicial, não incidindo sobre o montante do período anterior (soma dos juros ao saldo devedor). Não há qualquer cálculo de juros sobre juros, embora haja incorporação dos juros ao capital. É representado pela fórmula: J = C x (1 + i x n).

Já quando falamos de regime de capitalização composta, a situação é diferente, o que ocorre é que os juros do período são calculados sobre o montante do período imediatamente precedente ao considerado, e não sobre o valor principal inicial, como acontece com os juros simples. Assim, os juros do período serão calculados considerando também os juros incorporados ao capital do período precedente, ocasionando a contagem de juros sobre juros, se não forem pagos no vencimento. É representado pela fórmula: J = C X [(1 + i)n - 1]

Vejamos como os juros se comportam em cada um dos critérios acima expostos no exemplo de um financiamento de R$ 10.000,00, com taxa de juros de 1% ao mês para ser pago em 12 meses, considerando-se pagamento zero e capitalização simples e composta na periodicidade mensal.


II. FUNCIONAMENTO DA TABELA PRICE

Uma análise no funcionamento do sistema Price de Amortização, procurando demonstrar como os juros são calculados e de que forma se dá a evolução do saldo devedor, constatará a inexistência de qualquer incidência de juros sobre juros, concluindo ser aquele entendimento defendido por alguns juristas e doutrinadores insustentável na prática.

Adotando o mesmo exemplo alhures comentado, passamos à análise do funcionamento da Tabela Price. Assim, considerar-se-á um financiamento de R$ 10.000,00, com taxa de juros de 1% ao mês, a ser pago em 12 meses.

Inicialmente, tem-se que encontrar o valor da prestação periódica a ser paga em cada período de maneira uniforme. Para tanto, utilizamos a fórmula para cálculo da prestação, e não dos juros, que será mais adiante melhor apreciada, mas que para o momento é suficiente lembrar que é representada da seguinte maneira:

Dessa maneira, com aqueles dados aplicados à fórmula para cálculo da prestação, encontramos o valor uniforme da prestação de R$ 888,49, a ser pago em todo período, de modo a quitar integralmente o financiamento no último período. Assim, podemos iniciar o entendimento acerca do funcionamento da Tabela Price.

No primeiro período, considerando 0 (zero) de entrada, calculamos o valor dos juros devidos, à taxa de 1% sobre o saldo devedor total (R$ 10.000,00), o que resulta em R$ 100,00 de juros.

Ato contínuo subtraímos esse valor de juros do valor da prestação calculada pela fórmula da Tabela Price, ou seja, R$ 888,49 – R$ 100,00 , o que resulta na importância de R$ 788,49. Este será o valor da amortização do primeiro período do financiamento, que servirá para abatimento do saldo devedor (R$ 10.000,00 – R$ 788,49), resultando um saldo devedor no segundo período de R$ 9.211,51.

No segundo período, portanto, teremos um saldo devedor de R$ 9.211,51 e sobre esse valor deverá ser calculado os juros referentes ao segundo período, de 1%. Assim, teremos no segundo período que pagar R$ 92,12 de juros, que por sua vez será subtraído da prestação uniforme mensal calculada para se encontrar o valor amortizado na segunda prestação, a saber: R$ 888,49 – R$ 92,12 = R$ 796,37.

O funcionamento do Sistema Price de Amortização, então, é que do valor total da prestação devemos subtrair o valor dos juros do período, calculado sobre o saldo devedor anterior, obtendo então como resultado o valor que será amortizado no mês. Finalmente, deduzimos do saldo devedor anterior o valor da amortização, constituindo assim o saldo devedor do período subseqüente.

A planilha abaixo demonstra como se comportam os juros, a amortização e a evolução do saldo devedor no exemplo escolhido pelo sistema Francês de Amortização.

No último período é possível constatar que o saldo devedor restante do 11° período é exatamente igual ao da amortização que irá ser paga: R$ 879,69, ocorrendo a quitação integral da dívida no final do prazo avençado.

Come se vê, o Sistema Francês de Amortização possibilita a quitação integral do débito, utilizando-se de juros que evoluem de maneira decrescente, pagando mais nos primeiros períodos e menos nos últimos períodos, e amortização crescente, pagando menos nos primeiros períodos e mais nos últimos períodos, sempre com prestações uniformes, o que é de inegável praticidade ao tomador do empréstimo.

Da análise do sistema, concluímos que não há em nenhum momento incidência de juros sobre juros, pois o cálculo do juro mensal incide sobre o saldo devedor já amortizado do mês anterior, e não sobre os juros que foram pagos juntamente com a amortização. Também não existe soma alguma de juros ao saldo devedor, haja vista que este é resultado tão-somente da subtração da amortização ao saldo do mês precedente.

Portanto, não há que se falar em juros sobre juros ou juros compostos ou capitalização composta nesse sistema.

A clareza da inexistência de capitalização composta de juros é ainda mais patente quando se constata que o sistema possibilita o pagamento periódico de juros e, portanto, não há mesmo como se admitir cobrança de juros sobre juros, vez que estes são pagos, não se incorporando ao capital.

Outrossim, interessante notar que os juros no Sistema Price obedecem a uma evolução que é calculada com base na seguinte fórmula: J = C x I, fórmula esta representativa de juros simples, e não de juros compostos, o que faz com que na prática não haja capitalização composta.

Todavia, em que pese a demonstração prática e cabal da inexistência de capitalização composta (cobrança de juros sobre juros) na Tabela Price, ainda existem aqueles que discorrem que o anatocismo encontra-se inserido no cálculo inicial da prestação uniforme e periódica, utilizando como fundamento o fato de que a expressão (1 + i) n ,denota juros compostos pela existência do fator exponencial "n", encontrado na fórmula da Tabela Price alhures apresentada. Para estes, apresentamos no tópico seguinte nossos argumentos.


III. ARGUMENTOS ACERCA DO FATOR EXPONENCIAL DA FÓRMULA DA TABELA PRICE

Para entender e refutar as teses que se embasam simplesmente na fórmula da Tabela Price de cálculo da prestação acima exposta e principalmente em seu fator exponencial, para defender a existência de anatocismo e juros compostos no sistema francês de amortização, dispusemo-nos a estudar e pesquisar de forma mais amiúde qual a proveniência de tal expoente e o porquê de estar ele inserido no método de cálculo do sistema, a fim de oferecer ao leitor, precisa e induvidosa explicação a seu respeito.

Em resumo, as razões pelas quais o fator exponencial se encontra na fórmula da Tabela Price podem ser vislumbrada por meio de uma análise das origens do sistema francês de amortização, ou seja, das tabelas de seu idealizador Richard Price.

Nesse sentido, a razão para na fórmula da Tabela Price estar inserido o fator exponencial que representa juros compostos remonta a uma análise mais aprofundada a respeito dos primeiros estudos de Richard Price, tendo em vista que seu livro intitulado Observations on Reversionary Payments, que apresenta tabelas para cálculos de anuidades de planos de seguros de vida, aposentadoria e sobre a dívida interna de seu país, tem sido utilizado como base para o entendimento de que no Sistema Francês de Amortização há cobrança de juros sobre juros. Passemos, então, à análise dos estudos de Richard Price.

Em primeiro lugar, impende destacar que o livro de Richard Price e seus teoremas e tabelas foram concebidos a pedido de uma seguradora da época (Society for Equitable Assurance on Live), a fim de que o matemático apresentasse formas de cálculos para pagamentos de anuidades, utilizado em sistema de seguro de vida, sistema de aposentadoria e que tratam da dívida interna e de que forma quitá-la.

Desse modo, as tabelas de Richard Price apresentam a evolução do dinheiro no tempo, de forma a possibilitar o pagamento de anuidades e a devolução depois de determinado tempo de benefícios aos contribuintes. Não tratam de amortização ou diminuição do capital durante o tempo, mas ao contrário, da evolução deste e de seu aumento.

Nesse ponto, importante esclarecer que o Sistema Francês de Amortização (Tabela Price) como hoje o conhecemos não deriva diretamente dessas tabelas de Richard Price. Assim, há confusão no entendimento que diz que as tabelas de Richard Price e a atual Tabela Price são idênticas. Não são. A Tabela Price não visa pagamentos de aposentadorias, ou seguro de vida, como as originais tabelas de Richard Price. Sua utilidade é no campo dos financiamentos e empréstimos, na amortização de dívidas durante um certo e determinado período de tempo.

Na verdade, a única relação que há entre o Sistema Francês de Amortização (Tabela Price) e as tabelas originalmente concebidas de Richard Price em seu livro Observations on Reversionary Payments é o que se denomina de fator TP, que é calculado por meio da fórmula abaixo reproduzida, que acima também foi exposta, índice este que quando dividido pelo valor do financiamento, resulta no valor da prestação constante e uniforme do Sistema Price de Amortização. É dessa tabela de cálculo do fator TP que se extrai a proveniência do fator exponencial da fórmula da Tabela Price.

Não há incidência de juros compostos nesse sistema. Primeiro porque o fator TP é utilizado para calcular o valor da prestação do financiamento, e não os juros que serão pagos no decorrer do mesmo, consoante explicação anteriormente noticiada. Segundo, porque em sua concepção original realmente não são calculados juros dos juros, e sim desconto composto de juros, vejamos melhor tal assertiva.

Para comprova-la utilizaremos as primeiras tabelas de Richard Price, valendo-nos da tradução juramentada encomendada pelo Sr. José Jorge Meschiatti Nogueira e exposta em seu livro "Tabela Price - Da Prova Documental e Precisa Elucidação de seu Anatocismo".

Em suma, as tabelas apresentadas por Richard Price são quatro, sendo certo que as de número III e IV em nada interessam para o Sistema Francês de Amortização, pois são aplicáveis inteiramente aos planos de seguro de vida e aposentadoria, em nada se relacionando à amortização de dívidas, haja vista que a terceira realiza um simples cálculo de juros compostos no capital de uma unidade monetária, e a quarta opera a soma destes valores a cada período a mais uma unidade monetária.

O que irá nos interessar é a tabela de número II, que apresenta o fator TP para cálculo da prestação periódica e constante. Pedimos vênia para transcrever as quatro tabelas, a fim de facilitar a consulta do leitor e a explicação de sua construção.

TABELA I - O presente valor de 1 Libra a ser recebido ao Final de qualquer Número de Anos, não excedendo a 100; descontado à Taxas de 2, 2,5, 3, 3,5, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 10 por cento de Juro Composto.

TABELA II - O valor presente da anuidade sobre uma Libra em qualquer Número de Anos não excedendo a cem.

TABELA III - Mostra a quantia a qual o Capital de 1 Libra crescerá a Juro Composto em qualquer Número de Anos não excedendo a cem.

TABELA IV - Mostra a quantia a qual 1 Libra anual crescerá a Juro Composto em qualquer Número de Anos não excedendo a cem.

Como dito, somente a tabela de número II nos interessa, pois é esta que expressa o valor do fator TP para cálculo da prestação constante e uniforme da Tabela Price. Para demonstrar esta assertiva faremos o cálculo utilizando a fórmula do fator TP alhures exposta, no exemplo de um financiamento com taxa de juros de 8% e prazo de 5 meses.

Assim, temos que, substituindo a letra i pela taxa de juros de 8% e a letra n por 5 e realizando o cálculo da operação aritmética, encontramos o resultado 3,9927, valor este que é exatamente igual ao valor encontrado na tabela de número II de Richard Price, pelo confronto da linha "5" com a coluna "8%". Logo, constata-se que a tabela de número II de Richard Price é a única que interessa para o Sistema Francês de Amortização, pois calcula o fator TP, para cálculo da prestação, a qual é encontrada pela divisão do valor do financiamento pelo referido fator TP encontrado.

A partir dessa constatação, muitos autores entendem que, embora na Tabela Price não ocorra soma de juros ao capital, as próprias parcelas constantes e uniformes embutem a cobrança de juros compostos. Contudo, esse entendimento é facilmente descartado, à medida que em qualquer financiamento, as parcelas se prestam para pagar os juros calculados sobre o saldo devedor existente em cada período, e o valor pago que exceder a quantia necessária para pagar os juros necessários para remunerar o capital ainda em aberto, deve ser utilizado para amortizar o saldo da dívida gradativamente, até que quando do último pagamento ocorrido, o capital financiado seja totalmente devolvido ao financiador.

Ainda a respeito de as parcelas calculadas pela Tabela Price comportarem em si juros compostos, faz-se necessária minuciosa análise de como foi a tabela número II de Richard Price, construída, a fim de demonstrar que não há em qualquer momento incidência de juros sobre juros, bem como apresentar de forma elucidativa a proveniência do exponencial da fórmula do fator TP.

Em primeiro lugar, portanto, imperioso notar que os valores contidos na tabela de número II de Richard Price foram encontrados a partir da soma dos valores calculados na tabela de número I do mesmo matemático. Assim, veja, por exemplo, na coluna de "2%" que o primeiro valor encontrado é 0,9804, valor este idêntico à mesma posição da tabela I, também de 0,9804. O segundo valor encontrado, na linha "2", de 1,9416, por sua vez, é o resultado da soma do primeiro valor da tabela II com o valor da posição "2" na coluna "2%" da Tabela I - 0,9612. O terceiro valor da tabela II, continuando, é a soma do valor precedente (1,9416) com o valor da posição "3" da coluna "2%" da tabela I (0,9423), ou seja, 2,8839, e assim opera-se sucessivamente.

Sabendo, desse modo, que os valores dos fatores TP para cada prazo e taxa de juros da tabela de número II de Richard Price são encontrados a partir da tabela de número I, cumpre-nos, nesse momento, analisarmos como os valores desta última tabela foram encontrados e calculados.

A tabela de número I tem como título "O presente valor de 1 Libra a ser recebido ao Final de qualquer Número de Anos, não excedendo a 100; descontado à Taxas de 2, 2,5, 3, 3,5, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 10 por cento de Juro Composto". (grifos nossos). Com efeito, os valores contidos na tabela representam o valor de uma unidade monetária descontada a determinada taxa de juros compostos.

Ou seja, é o valor do capital representado por uma unidade monetária com desconto de determinada taxa de juros compostos. Vejamos como este valor é encontrado.

Sendo calculado o valor dos juros sobre uma unidade monetária, de forma composta a cada período, obtemos os resultados apresentados na tabela de número III de Richard Price. Dos juros encontrados em cada período, se descontarmos referido valor do capital integral, ou seja, uma unidade monetária, obteremos os resultados da tabela de número I. Assim, a tabela I representa a seguinte fórmula, o que, frise-se, representa a fórmula do desconto composto de juros, vejamos:

Assim, observa-se, por exemplo, na tabela III, que a 2% de juros no período "1", encontra-se o valor de 1,0200, sendo que 0,200 é o valor de juros, que descontado da unidade monetária 1, resulta no valor de 0,9804, constante da mesma posição na tabela I. No segundo período o cálculo dos juros compostos a taxa de 2% resulta no valor 1,04040, conforme tabela III, representando 0,04040 de juros, que descontada da mesma unidade monetária 1, resulta no valor da mesma posição da tabela I, ou seja, 0,9612. Assim opera-se sucessivamente, até que no período 10 encontra-se o valor a taxa de juros de 2% de 1,2189, representando 0,2189 de juros, que descontada da unidade monetária 1, resulta no valor do período 10 a taxa de 2% da tabela I - 0,8203.

Deste estudo, forçoso concluir que os valores que são apresentados na tabela de número I em nada se referem a juros; são apenas os valores do capital representado por uma unidade monetária com desconto dos juros calculados a determinada taxa e em determinado período; e não juros, frise-se. Logo, não há que se falar em incidência de juros sobre juros, ou cálculo de juros compostos na tabela de número I, embora os valores ali encontrados sejam obtidos pelo desconto de juros, os quais são calculados de forma composta.

Assim sendo, como não são juros os valores encontrados na tabela de número I, mas sim uma unidade de capital descontada a juros compostos, sua soma consecutiva com a soma dos valores precedentes obtendo os valores da tabela de número II também não representam juros. Logo, o fator TP utilizado para cálculo da prestação constante e uniforme não compreende em si juros sobre juros, mas sim de certa forma desconto composto de juros.

Sob esse prisma, resta demonstrar o porquê do fator exponencial constar da fórmula do fator TP. E esta explicação é de fácil visualização, diante das demais explicações acima ofertadas. Como o fator TP é obtido pela soma de valores que representam uma unidade monetária com desconto de juros, e estes últimos são calculados de maneira composta, a representação do cálculo dos juros compostos devem estar inscritas em sua fórmula, por ser uma operação matemática, não para expressar a incidência de juros sobre juros na operação da tabela I, mas para demonstrar que houve desconto de juros compostos no valor principal de uma unidade monetária.

Portanto, embora não seja de cunho prático, pois o fator TP apenas calcula o valor uniforme das prestações, e a Tabela Price calcula juros sobre o saldo devedor remanescente de cada período, não incidindo em nenhum momento sobre os juros do período precedente, realizamos o estudo das tabelas de Richard Price, a fim de cabalmente refutar o argumento daqueles que defendem a tese de que os juros compostos estão de forma maquiada, embutidos nas prestações da Tabela Price, o que de fato não é verdade, como demonstrado restou.


IV. TABELA PRICE E CORREÇÃO MONETÁRIA

Percebendo que por ocasião da aplicação da correção monetária, esta muitas vezes desnatura a finalidade da Tabela Price fazendo com que no final do financiamento o saldo devedor não reste zerado, e atentando-se para o fato de que possivelmente muitos juízes, juristas, estudiosos e doutrinadores acabam sendo induzidos a erro no entendimento e formulação de um correto julgamento a respeito da Tabela Price, por interpretar tal aplicação como ocasião da capitalização composta de juros, e não da correção monetária, passamos a esclarecer os efeitos da incorreta aplicação da correção monetária em financiamentos de longo prazo.

Em economias de grande inflação, que oneram o poder de compra da moeda, desgastando-o sobremaneira, os contratos de longo prazo, especialmente os financiamentos do Sistema Financeiro da Habitação, não comportam em suas taxas de juro, percentual suficiente para re-equilíbrio do poder de compra da moeda desgastado, tendo de ser aplicada a competente correção monetária.

A aplicação dessa correção monetária, contudo, nos valores da prestação e nos valores do saldo devedor, devem ser iguais. Ou seja, deve ser aplicado o mesmo índice de correção monetária, tanto para a prestação, quanto para o saldo devedor. Assim fazendo, a Tabela Price será integralmente respeitada, operando-se da maneira como explicitada acima.

No entanto, freqüentemente se vê, sobretudo nos financiamentos do Sistema Financeiro da Habitação, por ocasião de políticas do Governo, a aplicação de um índice de correção monetária para os valores das prestações mensais, e outro, para os valores do saldo devedor. Essa aplicação incorreta da correção monetária desnatura e distorce o financiamento habitacional de diferentes maneiras. Vejamos os cenários possíveis.

1) É possível que as prestações sejam corrigidas por índices menores que os aplicados ao saldo devedor. Neste caso, sendo o juro calculado pelo saldo devedor, sempre será nele computada a diferença da correção, ocasionando, por conseguinte, uma menor amortização que a devida, caso os índices de correção fossem uniformes. Assim, a diferença dessa amortização a menor em relação a que existiria caso os índices de correção monetária fossem uniformes, ocasionará um resíduo na amortização do mês.

Evoluindo dessa forma até o final do financiamento, não será possível a extinção da dívida, haja vista que todos os valores desses desajustes de correção aplicados mensalmente resultarão num saldo residual a ser pago, saldo este que de maneira nenhuma provém da capitalização, mas da diferença na aplicação de correção monetária não uniforme para a prestação e o saldo devedor do financiamento.

2) A segunda possibilidade é extensão da primeira. É possível que os índices de correção aplicados às prestações sejam demasiadamente menores que os aplicados ao saldo devedor, de tal forma que a prestação corrigida não seja muitas vezes nem mesmo suficientes para pagar os juros calculados com base no saldo devedor corrigido.

Neste caso, não sendo possível pagar o total dos juros, haverá um remanescente de juros a ser pago, que por ser débito do mutuário, incorporar-se-á ao saldo devedor. A este fenômeno, dá-se o nome de amortização negativa, haja vista que a prestação paga do mês resultará num saldo devedor referente aos juros remanescentes.

Advertimos que neste caso haverá incidência de anatocismo, porém importante frisar que este anatocismo em nada se relaciona com a utilização da Tabela Price, mas sim com a distorção ocasionada pela aplicação incorreta da correção monetária, já que esta anomalia poderá acontecer com todos os sistemas de amortização existentes (SAC; SACRE; SAM e etc).

3) A terceira possibilidade é exatamente inversa às outras duas. Ocorre quando os índices de correção monetária aplicados às prestações são maiores que os índices aplicados ao saldo devedor. Aqui, o valor da amortização será sempre maior que o valor previsto caso os índices de correção monetária fossem uniformes. Isto porque os juros serão calculados com base no saldo devedor corrigido por índice menor, e subtraídos de amortização corrigida com maior índice, o que resulta numa amortização maior. Assim sendo, o que haveria seria a quitação do financiamento antes do prazo final do contrato.

Da análise dos cenários expostos acima, conclui-se que as distorções eventualmente ocasionadas na Tabela Price não são causadas por conta da incidência de juros sobre juros, ou anatocismo, mas por ocasião da aplicação incorreta da correção monetária, em índices distintos para as prestações e para o saldo devedor.

Todavia, se utilizados índices uniformes, tanto para as prestações, como para o saldo devedor, a Tabela Price em nada se altera em seu funcionamento, permanecendo incólume e perfeito o plano de financiamento, que será liquidado invariavelmente quando do pagamento da última prestação.


V. TABELA PRICE E SISTEMAS DE AMORTIZAÇÃO

Os críticos da Tabela Price, ainda não convencidos das incontestáveis teses acima cabalmente demonstradas, afirmam que outros Sistemas de Amortização, como o Sistema de Amortização Constante (SAC), oferecem mais vantagens aos mutuários que a Tabela Price, já que ao final do financiamento a soma dos juros atinge quantia menor do que àqueles calculados num financiamento pela Tabela Price, presumindo que isso ocorreria devido à cobrança de juros de forma composta na mesma.

Todavia, o entendimento supra, decorre da falta de conhecimentos técnicos elementares de finanças, haja vista que tanto a Tabela Price como qualquer outro Sistema de Amortização são sistemas de amortização absolutamente equivalentes, ou seja, em que pesem serem os valores finais dos pagamentos de cada sistema, diferentes, em qualquer sistema de amortização o mutuário sempre amortiza 100% da dívida, e sempre paga juros proporcionais ao saldo devedor de cada período.


VI. TABELA PRICE X MÉTODO DE GAUSS

Quanto a sistemas de amortização de dívidas tem-se visto, ainda, no âmbito do Judiciário Brasileiro, a constante incidência de casos em que por ordem judicial o sistema Price tem sido substituído pelo mais novo sistema denominado Método de Gauss, sob o fundamento de que este último não calcula juros compostos, mas tão-somente juros simples no decorrer de todo o período do financiamento.

Como se vê, o ponto central de base para que se opere referida substituição concentra-se no equivocado entendimento de que a Tabela Price calcula juros compostos e o Método de Gauss, juros simples. Todavia, tal entendimento realmente é equivocado. Primeiro, porque a Tabela Price não calcula juros compostos, como já se demonstrou por todos os meios possíveis anteriormente. Segundo, porque o Método de Gauss não se presta a amortização de dívidas, não sendo um sistema de amortização, conforme passamos a demonstrar e analisar pormenorizadamente.

Inicialmente, insta esclarecer que o Método de Gauss foi originalmente formulado pelo matemático e renomado cientista, Sr. Karl Friederich Gauss, que deu continuidade aos estudos de Abraham de Moivre sobre o que se denomina na matemática de curva normal, utilizada no campo da estatística, a qual ficou posteriormente conhecida como distribuição de Gauss, ou curva normal de distribuição de erros.

Para melhor entender o Método de Gauss, portanto, necessário se faz entender, ainda que não profundamente, a respeito da curva normal de distribuição de erros, e para tanto, transcrevemos o exemplo da época para explicação, exemplo este denominado de lei dos grandes números de Bernoulli: numa situação de eventos casualóides, onde as alternativas são independentes, obter coroa em lances de uma moeda de cara e coroa, tem a probabilidade matemática exata de 50% (porque são somente dois eventos possíveis: cara ou coroa), mas na prática esta probabilidade de 50% é apenas aproximada.

Ou seja, efetuando, por exemplo, quatro lances, segundo a média exata, as moedas cairão duas vezes coroa, e duas vezes cara, porém assim não ocorre na prática, pois é possível que dos lances seja resultado quatro, três, dois, ou um lance que resulte em cara ou coroa. Logo, a média de 50% é aproximada, e não exata, de tal forma que à medida que os lances aumentam, a proximidade com a média é maior.

Assim elaborou-se a curva normal de distribuição de Gauss, onde a média exata é o vértice da curva, e as aproximações são os lados da curva, que decaem para a esquerda e para a direita, formando uma imagem de sino, de tal sorte que se entendeu que a média da curva é a norma, isto é, as coisas todas deviam ser como a média, de forma que tudo que se desvia da média é considerado erro - à esquerda, erros que subestimam a média; à direita, erros que superestimam a média - distribuindo-se, portanto, os erros em relação à média.

Da análise do esquema, portanto, forçoso concluir que o Método de Gauss calcula aproximações, bem como que o método, como originalmente concebido, não se presta a amortizações de dívidas, visto que o matemático Karl Friederich Gauss dedicou-se ao estudo da estatística e da curva normal, com enfoque especial em dados astronômicos, que em nada se relacionam à Matemática Financeira ou à amortização de dívidas, e que, portanto, não podem ser utilizados neste campo.

Para demonstrar a impropriedade do método como sistema de amortização de dívidas, faremos a análise minuciosa do mesmo, buscando comprovar que na prática não se presta a este fim, sendo, como se relatou, um método da estatística de aproximação e distribuição de erros. Para tanto, iniciaremos a exposição pelo modo de cálculo das prestações, para após analisarmos o desenvolvimento dos pagamentos de juros e amortização, vez que o cálculo dos juros tem como requisito o valor da prestação.

Assim, a fórmula matemática do cálculo da prestação é expressa da seguinte maneira:

Utilizando o exemplo que citamos para o cálculo da Tabela Price, de financiamento no valor de R$ 10.000,00, à taxa de juros de 1% ao mês, no prazo de 12 meses, e substituindo os dados na fórmula, constataremos o seguinte:

O valor resultante no numerador será de 11.200,00; o valor resultante do denominador será de 12,66, e o valor da prestação será igual a R$ 884,68, pouco abaixo do valor encontrado pela Tabela Price, de R$ 888,49.

Diante dessas conclusões e resultados, algumas ponderações se impõem.

Note-se que a fórmula constante do numerador da fórmula é exatamente igual à fórmula de cálculo dos juros simples. Ou seja, o numerador da fórmula do Método de Gauss calcula o valor dos juros simples distribuído por todo o período do financiamento: R$ 11.200,00.

Já o denominador apresenta o cálculo de um fator de distribuição dos erros no decorrer do financiamento, nos moldes da curva normal de distribuição de erros acima explicada, a fim de oferecer, como acima demonstrado, um cálculo por aproximação do que se entende por exato, ou normal.

Tal assertiva é confirmada pelo valor resultante da fórmula do denominador. Veja que ali se encontra o valor de 12,66, que significa o prazo do financiamento (12 meses), somado a um acréscimo de 0,66, provavelmente decorrente da aproximação do cálculo de distribuição de erros da curva normal. Caso fosse um cálculo exato, o valor do denominador seria 12, e não 12,66.

O valor da prestação (884,68) simboliza esta distribuição, pois é o resultado da divisão de R$ 11.200,00 (valor total do financiamento somado aos juros simples do período), pelo fator divisor 12,66 (prazo do financiamento acrescido de um fator de distribuição dos erros). O cálculo da prestação se trata, portanto, de uma média aritmética simples que utiliza um fator de distribuição de erros, proveniente da curva normal de distribuição de erros dos estudos de estatística de Gauss.

Na forma de cálculo dos juros, esta aproximação e conseqüente distribuição de erros é mais facilmente visualizada. Isto porque o cálculo dos juros é elaborado a partir de uma segunda fórmula, que calcula um determinado coeficiente multiplicador do número de prestações restantes do financiamento. Vejamos, então, a composição desta fórmula, para após, analisarmos como se dá o pagamento de juros e amortização no decorrer do financiamento que utiliza o Método de Gauss.

Em nosso exemplo, o coeficiente seria 7,899487. Para cálculo dos juros, em cada período, deve-se, multiplicá-lo pelo valor das prestações restantes para o término do financiamento. Assim, em nosso exemplo, no primeiro mês o coeficiente deve ser multiplicado por 12; no segundo mês, o mesmo coeficiente deve ser multiplicado por 11; no terceiro, por 10, e assim sucessivamente, até o último mês, quando será multiplicado por 1. Vejamos a evolução dos pagamentos.

A partir desse cálculo de juros, que não tem por fundamento o saldo devedor, mas sim um coeficiente previamente determinado que é multiplicado pelo número de prestações restantes, é que se verifica o cálculo por aproximação que faz o Método de Gauss. Ou seja, o Método de Gauss não calcula 1% de juros ao mês, mas sim um valor aproximado de juros. Dividindo-se o valor do saldo devedor pelo valor dos juros cobrados obtém-se a taxa realmente praticada em cada período. Vejamos, então, no caso prático, quais os percentuais das taxas de juros praticadas em cada período:

Como se percebe, as taxas de juros efetivamente praticadas em cada período não alcançaram o percentual de 1% ao mês, sendo inferiores a esta, sendo que ao final do financiamento verificou-se uma taxa efetivamente praticada de 11,09% ao ano, também bem inferior aos 12% ao ano inicialmente contratado.

Dessa análise, verifica-se que o Método de Gauss calcula os juros por aproximação, utilizando-se da curva normal de distribuição de erros concebida por Gauss para cálculo no campo da estatística, pois em vez de calcular 12% ao ano, ou 1% ao mês, presta-se a calcular 11,09% ao ano de juros, e taxas mensais que variam de 0,90% a 0,95%.

De todo o estudo realizado a respeito do Método de Gauss, forçoso concluir que embora o método calcule prestações menores que as da Tabela Price, vale-se de cálculos por aproximação para tanto, utilizados no campo da estatística para distribuição de erros, bem como não se presta a cumprir estritamente com o que fora estipulado em contrato, nesse ponto prejudicando tanto o financiador quanto o tomador do empréstimo, sendo certo que, por fim, não se presta a finalidade de amortização de dívidas.


IX. CONCLUSÃO

De todo o exposto, forçoso concluir que o uso da Tabela Price utilizada como sistema de amortização de empréstimos em parcelas, não enseja a capitalização composta das taxas de juros, ou cobrança de juros dos juros, vez que, pela fórmula de cálculo que adota, sua prestação é constante e uniforme, valendo-se para o tomador do empréstimo de eficaz instrumento de planejamento financeiro de suas dívidas, bem como de inigualável praticidade, pois extingue totalmente a dívida ao final do empréstimo.

A assertiva supra é facilmente comprovada quando se percebe que os juros são calculados sobre o saldo devedor do período precedente ao considerado, e não se somam ao saldo devedor remanescente, que é resultado da subtração da parcela atinente à amortização do saldo devedor do período anterior quando a prestação é normalmente paga.

No mais, sua fórmula de cálculo de prestação, que se vale do fator TP, também não capitaliza juros, vez que não se trata de sistema que leva em conta os juros compostos, mas adota o que na Matemática Financeira se denomina desconto composto de juros, justificando, assim, a existência do fator exponencial em sua fórmula.



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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAIVA, Leonardo Carlo Biggi de. Argumentos em defesa da Tabela Price. Comprovação prática da inexistência de anatocismo ou de capitalização composta das taxas de juros. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2965, 14 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19721. Acesso em: 19 abr. 2024.