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O paternalismo do Estado e os crimes relativos à prostituição

O paternalismo do Estado e os crimes relativos à prostituição

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Será analisado o bem jurídico tutelado pelos delitos relativos à prostituição e as razões para a sua criminalização por parte do Estado, impondo restrição de liberdade aos indivíduos.

RESUMO

O estudo do tema apresentado neste trabalho tem por objetivo analisar os delitos relativos à prostituição do Capítulo V do Título VI do Código Penal, para extrair a motivação da tutela penal destes delitos. Trata-se de paternalismo jurídico ou legítima proteção penal de um bem jurídico? Para isso, procede-se, a uma análise acerca da prostituição e de seus sistemas legais, bem como seu conceito e o conceito de exploração sexual, bem como as mudanças trazidas pela Lei 12.015/2009. Para responder a indagação proposta, será analisado o bem jurídico tutelado pelos delitos relativos a prostituição, e o paternalismo jurídico, as razões para a criminalização das condutas por parte do Estado, impondo restrição de liberdade aos indivíduos.

PALAVRAS-CHAVE: prostituição, exploração sexual, bem jurídico, paternalismo


ABSTRACT

The study of the issue presented in this paper aims to examine the crimes related to prostitution in Chapter V of Title VI of the Criminal Code, to extract the motivation of the penal protection of these crimes. This is paternalism legal or legitimate protection of a criminal and legal? To do so, it proceeds to an analysis of prostitution and about their legal systems, as well as its concept and the concept of sexual exploitation, as well as changes introduced by Law 12.015/2009. To answer the question proposal will be considered the legal interest for offenses relating to prostitution, and legal paternalism, the reasons for the criminalization of conduct by the state, imposing restriction of liberty to individuals.

KEYWORDS: prostitution, sexual exploitation, legal asset, paternalism

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS. 1.1 Prostituição e exploração sexual. 1.2 Sistemas Legais. 1.2.1 O proibicionismo. 1.2.2 O regulamentarismo clássico. 1.2.3 O abolicionismo. 2 FUNDAMENTO POLÍTICO CRIMINAL DA CRIMINALIZAÇÃO DOS COMPORTAMENTOS RELATIVOS À PROSTITUIÇÃO. 2.1 Paternalismo jurídico. 2.2 Conceito de Paternalismo. 2.3 Espécies de Paternalismo.3 O BEM JURÍDICO E AS POSSÍVEIS JUSTIFICAÇÕES AO PATERNALISMO. 3.1 Bem jurídico. 3.2 Possíveis justificações. 4 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O PATERNALISMO NOS CRIMES LIGADOS A PROSTITUIÇÃO. 5 CONCLUSÕES FINAIS. 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.


INTRODUÇÃO

Partindo da premissa de que a prostituição não é crime no Brasil, os comportamentos descritos no Título VI do Capítulo V do Código Penal brasileiro que trata do lenocínio e do tráfico de pessoas para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual serão analisados a luz do paternalismo jurídico com o fim de extrair a verdadeira motivação do legislador ao incriminar estas condutas.

Deixaremos de analisar o tráfico interno e externo de pessoas para fins sexuais, pois demandaria uma extensa abordagem a respeito da regulamentação internacional, com base em tratados e convenções. E, ainda, nas condutas de tráfico de pessoas o bem jurídico tutelado é diverso dos demais tipos penais desse Título, qual seja a integridade moral.

Já nos delitos de lenocínio o bem jurídico protegido é a liberdade sexual, o que coloca o Estado em condição diversa quanto à possibilidade ou mesmo, a obrigação de intervenção na esfera dos indivíduos que estão sob sua tutelar.

A análise do bem jurídico tutelado e do paternalismo, bem como seu conceito e suas espécies, faz com que se possa compreender como cada conduta se relaciona com a idéia de imposição de comportamento ou restrição de liberdade, que o Estado pode vir a exercer a seus cidadãos.

Assim, o paternalismo, deve sim alcançar as condutas que atingem os vulneráveis ou ainda quando há vícios de consentimento, contudo, será que Estado, pode, na aba do paternalismo, tipificar condutas de terceiros que auxiliam a prostituição, quando se tratar de pessoas maiores e capazes de consentir?

O ponto chave é a compreensão do alcance do paternalismo, dentro da dicotomia apresentada nos tipos penais de punir de forma praticamente indistinta condutas nas quais não há qualquer vício no consentimento e condutas eivadas de violência, fraude, ou ainda quando se trata de vítima vulnerável.

A intenção aqui é exatamente esta, descobrir até onde o Estado pode se utilizar do paternalismo para tipificar as condutas relativas à prostituição, já que o Direito Penal é a ultima ratio, e qual é a justificativa para a criminalização das condutas, da forma como se apresentam no Código Penal Brasileiro.


1.CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A prostituição "é uma fatalidade da vida social, sendo conhecida desde os mais remotos tempos e nem por isso deixa de ser preocupante, sendo causa de grande inquietação". [01]

Alguns penalistas clássicos, como Nelson Hungria [02], afirmavam que a prostituição é uma "atividade puramente parasitária", que "representa uma grave lesão à disciplina social. Uma conduta subversiva da organização da vida sexual e incompatível com a própria ordem econômica". Para este autor o bem jurídico protegido são os costumes, conferindo a lesão uma esfera coletiva e social, acreditando que o indivíduo, de forma individual era atingido apenas subsidiariamente.

Atualmente, a prostituição passa por uma nova roupagem seguindo as mudanças sociais. A prostituição de rua que era dominante no passado, hoje da lugar a novas formas que vão desde informes em jornais com a oferta de serviços de acompanhantes, até o turismo sexual.

1.1. Prostituição e exploração sexual

Dentro do sistema abolicionista, adotado no Brasil, a prostituição não é considerada crime. Contudo, tanto a prostituição como a exploração sexual são elementos normativos dos tipos relativos à prostituição, e, portanto, a definição desses conceitos é necessária para a compreensão do assunto e a análise dos tipos penais.

A legislação não apresenta conceitos legais de prostituição e exploração sexual, sendo necessário recorrer a doutrina para sua conceituação. Assim, a prostituição para Nucci é "o comércio habitual de atividade sexual". [03] Ou seja, para configurar a conduta do agente depende-se da habitualidade da conduta da vítima.

Para Regis Prado a prostituição pode ser conceituada como a habitualidade de contratos carnais prestados por uma pessoa a indeterminado número de indivíduos [04]. Assim, o autor acrescenta à habitualidade da prática de atos libidinosos a característica da indeterminação do número de pessoas para quem os serviços são prestados.

As principais características da prostituição são a habitualidade e a prestação de serviços a um número indeterminado de pessoas. Existe ainda uma terceira característica, a venalidade. É patente que o lucro é o que promove e facilita a prostituição.

Quanto à venalidade existe uma divergência doutrinária a respeito do assunto. Contudo, a prostituição geralmente é exercida com a finalidade venal, mas não é este um requisito imprescindível como a habitualidade e a indeterminação de pessoas. Na prática, porém, a prostituição é exercida com objetivo de lucro o que torna a discussão meramente acadêmica. [05]

A prostituição é entendida como uma forma de exploração sexual [06], contudo, a exploração sexual tem um sentido mais amplo, englobando outras condutas.

Para Nucci [07] a "exploração sexual é do gênero do qual se extrai a prostituição" ainda esclarece o autor que exploração sexual é expressão ligada a tirar proveito de alguém, em detrimento desta pessoa, valendo-se, primordialmente de fraude ou ardil.

Para María Luisa Maqueda Abreu, a exploração sexual é uma prática, graças a qual, uma pessoa obtém prazer sexual ou benefícios financeiros ou de outro tipo mediante a utilização abusiva de uma pessoa. [08]

Para João Paulo Orsini Martinelli [09] a exploração aparece como um duelo desigual de forças, no qual o mais fraco dificilmente ousa enfrentar o mais forte em busca de novas possibilidades. Há uma espécie de aceitação da exploração porque não há alternativas próximas diferentes daquelas às quais os menos favorecidos estão submetidos. Por causa de tal situação, uma pessoa explora injustamente outra quando obtém sobre esta uma vantagem indevida, aproveitando-se de sua fragilidade. Quando se diz que há uma vantagem injusta, esta não se resume apenas em um prejuízo à outra parte. Quem explora obtém um ganho substancial com sua conduta.

1.2.Sistemas legais

A prostituição embora seja conduta atípica, tem sido alvo de tentativas de controle e regulamentação. Baseando-se em três sistemas legais, diversos arranjos legais têm sido colocados em prática. São eles: o proibicionismo, o regulamentarismo clássico e o abolicionismo.

Por meio desses sistemas podemos situar a prostituição e conhecer qual é o tratamento que ela pode receber.

1.2.1.O proibicionismo

A legislação dos países que adotam o sistema proibicionista considera ilegal o ato de prostituir-se. Para Regis Prado [10] este sistema considera a prostituição um crime, proibindo seu exercício. Assim, todas as pessoas que participam do trabalho da prostituta, como clientes, agenciadores e a própria prostituta, além de outros, estão cometendo ato ilícito, proibido pela legislação.

Gisele Mendes de Carvalho [11] explica que o proibicionismo "criminalizava a prostituição em si mesma, proibindo essa prática inclusive entre adultos".

A crítica que se faz a este sistema é que, segundo Regis Prado "sua adoção, por alguns países, não surtiu o efeito almejado pela legislação penal, já que a prostituição é motivada por fatores complexos, muitas vezes por graves problemas sociais, não constituindo causa obstativa da sua prática o simples fato de ser considerada delito". [12]

O proibicionismo é o mais radical dos sistemas e por essa razão é adotado por pouquíssimos países atualmente [13], talvez pela dificuldade de fiscalização e de aplicação de punição devido à clandestinidade.

Ressalta-se que tanto a prostituta quanto o dono de casa de prostituição e até o cliente é punível pela lei, pois segundo esta concepção, é ilegal prostituir-se, ou seja, o Estado decide o que a pessoa pode ou não fazer com seu corpo.

1.2.2.O regulamentarismo clássico

Alguns países possuem uma legislação que reconhece e disciplina o trabalho das prostitutas. Nesses países o sistema adotado é o regulamentarista. Por este sistema, o trabalho das profissionais do sexo é plenamente reconhecido bem como os contratos de trabalho que ela assume. Os contratos geram todos os efeitos inerentes aos contratos de trabalho convencionais de prestação de serviços profissionais.

Esse modelo é adotado em sociedades como a Alemanha e Holanda. [14]

Nesse ínterim, Regis Prado explica que "o sistema da regulamentação tem por escopo objetivos higiênicos, a fim de prevenir a disseminação de doenças venéreas e também a ordem e a moral públicas. Por esse sistema a prostituição fica restrita a certas áreas da cidade, geralmente distantes do centro, onde as mulheres sujeitam-se a um conjunto de obrigações como a de submeterem-se periodicamente a exames médicos". [15]

Para as profissionais, há vantagens e desvantagens. Algumas regulamentações são muito conservadoras, trazendo exigências descabidas, como a de que a mulher se submeta a exames periódicos ou a de só exerça a atividade em locais determinados. Tais limitações não são exigência para outras profissões. Entre as vantagens, a possibilidade de ter um contrato de trabalho, seguridade social, inclusive aposentadoria, garantias legais, entre outros.

1.2.3.O abolicionismo

No abolicionismo, a prostituta é considerada uma vítima. Ela pratica a atividade por conta da coação de um terceiro. A legislação fundada no modelo abolicionista pune somente o terceiro, agenciador ou explorador, que obtém lucros explorando a atividade sexual das prostitutas.

Para Regis Prado "o sistema abolicionista apregoa que, por ser a prostituição uma atividade não criminosa, não deve o Estado interferir no seu exercício e nem mesmo impedi-la". [16]

No Brasil vigora o abolicionismo, desde 1942, quando entrou em vigor Código Penal, que está em vigor até hoje. Segundo Regis Prado o legislador preferiu punir o proxeneta, o rufião e o traficante de mulheres, mas não a prostituição propriamente dita [17].

No sistema do abolicionismo não há qualquer proibição quanto à negociação do sexo, contudo, o empresário ou terceiro que profissionaliza o trabalho da prostituta e dele se favorece é quem está na ilegalidade.


2.FUNDAMENTO POLÍTICO-CRIMINAL DA CRIMINALIZAÇÃO DOS COMPORTAMENTOS RELATIVOS À PROSTITUIÇÃO

A prostituição é si não é crime. Essa é a premissa básica, pois o Brasil adota o abolicionismo. É claro que a escolha do sistema que rege a prostituição dentro das fronteiras de determinado país é uma decisão que deriva da Política Criminal.

É a Política Criminal que seleciona os bens ou direitos que devem ser tutelados jurídica e penalmente, bem como os caminhos para efetivar tal tutela, o que implica a crítica dos valores e caminhos já eleitos. [18]

Assim, é por questão de Política Criminal que a prostituição é livre em nosso país, e sendo a sua prática permitida, por certo deveria haver um lugar onde ela pudesse ser praticada sem obstáculos.

Para Nucci [19] a prostituição não é punida e se dissemina na sociedade, contudo, ainda subsiste o tipo penal voltado a punir o indivíduo que contribui com a prostituição alheia.

A prostituição é livre no nosso país, tanto que hoje ela aparece de forma, muitas vezes até escachada, demonstrando que a própria sociedade vê a sua prática de forma diversa do que acontecia antigamente. [20]

Embora a prostituição seja autorizada no Brasil, o legislador entendeu pelos mesmos critérios de política criminal punir quem de alguma forma a favorece, criando tipos específicos para punir essas condutas.

2.1.Paternalismo jurídico

A premissa básica para a compreensão do assunto é o fato de que a prostituição em si não é crime, sendo que, somente as condutas de terceiros que participam da prostituição voluntária de alguém tem suas condutas descritas como crime.

Os comportamentos descritos no Título VI do Capítulo V do Código Penal brasileiro que trata do lenocínio e do tráfico de pessoas [21] para fins de prostituição ou outra forma de exploração sexual são todos comportamentos de terceiros que de alguma forma induzem, auxiliam, facilitam, ou promovem a prostituição alheia.

A não criminalização da prostituição, mas a opção de criminalizar condutas de terceiros que dela participam merece atenção e estudo, para que se compreenda qual é a verdadeira intenção do legislador ao tipificar e incriminar essas condutas.

Ao criminalizar as condutas de "mediação para servir a lascívia de outrem" (art. 227, do CP), "favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual" (art. 228, do CP), "casa de prostituição" (art. 229, do CP) e "rufianismo" (art. 230, do CP), o legislador acaba impondo uma restrição à liberdade sexual do cidadão, para proteger ele próprio das consequências de suas atitudes. Na verdade ao tipificar essas condutas, o legislador tente impedir a prostituição impedindo que outro auxiliem a prostituta ou ainda que ela tenho um local para exercer sua atividade.

A escolha do Estado de exercer determinadas restrições a liberdade de seus cidadãos para protegê-los deles mesmos é uma forma de expressar o paternalismo.

O paternalismo é conceito complexo com várias classificações que precisa ser compreendido, ainda que de forma não aprofundada, para que se consiga compreender e até mesmo criticar a opção do Estado em criminalizar ou impor determinadas condutas aos indivíduos.

Conforme a teoria clássica de Gerald Dworkin, citado por Gisele Mendes de Carvalho [22], um comportamento paternalista, em sentido amplo, é a interferência na liberdade de ação de uma pessoa, justificada por razões que se referem exclusivamente ao bem estar, à felicidade, às necessidades, aos interesses ou aos valores da pessoa coagida.

Assim, o Estado promove restrições aos seus para assegurar o seu próprio bem, ou para proteger determinado bem jurídico.

2.2.Conceito de Paternalismo

O conceito de paternalismo já foi apresentado e está diretamente relacionado a idéia de que a interferência na liberdade de ação de uma pessoa é justificada por razões de bem estar, felicidade, necessidades, interesses ou valores da pessoa coagida, conforme já citado.

No entendimento de Feinberg, pode sugerir que o Estado esteja para os cidadãos assim como um pai está para seus filhos, e que adultos capazes possam licitamente ser tratados como se fossem  crianças. Já para Gerald Dworkin paternalismo é "la interferencia en la libertad de acción de una persona justificada por razones que se refieren exclusivamente al bienestar, al bien, a la felicidad, a las necesidades, a los intereses o a los valores de la persona coaccionada. E finalmente, segundo Miguel A. Ramiro Avilés: el paternalismo jurídico se desarolla a través de normas jurídicas y políticas públicas que prohíben, hacen obrigatorio, promueven o aconsejan la realización u omisión de un comportamiento, que no daña a terceras personas, por el bien o para evitar el daño de la persona cuya libertad se interfiere". [23]

Segundo Gisele Mendes de Carvalho [24], "de modo geral, portanto, é possível afirmar que o paternalismo aparece sempre que se adote uma medida de limitação da autonomia pessoal de alguém com o fim de protegê-lo de um mal, isto é, de algo que o sujeito paternalista considera prejudicial ao sujeito cuja liberdade é limitada, de acordo com o seu próprio ponto de vista. Do ponto de vista da Filosofia moral, o termo, 'paternalismo' é empregado especialmente com o fim de aludir a uma atuação que opera uma restrição da autonomia dos indivíduos. Contudo, essa limitação da liberdade individual não acontece de forma injustificada, mas fundamenta-se precisamente na promoção do bem do sujeito cuja autonomia é restringida".

Como características do paternalismo, extraídas do próprio conceito, podemos apontar: "(1) a intervenção na liberdade de seleção de alguém; (2) quem interfere quer o bem da pessoa que sofreu a interferência; (3) aquele que interfere age contra a vontade do suposto beneficiado". [25]

Assim, duas são as partes da relação paternalista. A primeira é aquela que age paternalisticamente e a segunda é aquela que tem sua liberdade restringida pela ação paternalista. O que age de forma paternalística assim o faz porque deseja exclusivamente o bem daquele que tem sua liberdade limitada, o que se busca é garantir a obtenção de um benefício ou a evitação de um prejuízo. [26]

Já o paternalismo penal, consiste na coerção penal do indivíduo objetivando a sua própria proteção. "O paternalismo por meio de normas penais implica em coerção, mas nem todos os comportamentos paternalistas são coercitivos. No famoso exemplo do marido que, ao conhecer a tendência suicida da esposa, esconde suas pílulas de dormir para que ela não as encontre, temos uma situação em que houve restrição de liberdade sem coerção". [27]

O paternalismo acontece quando a liberdade de alguém é restringida para o próprio bem da pessoa que teve a sua liberdade limitada. Resta saber quais são suas espécies para poder classificar e entender a atitude do Estado que elege e tipifica as condutas de quem de alguma forma ajuda à prostituta.

2.3.Espécies de Paternalismo

Várias são as classificações do paternalismo, mas algumas são as mais importantes para compreendê-lo sob a ótica jurídica e para analisar os crimes relativos a prostituição. [28]

Inicialmente, o paternalismo pode ser classificado como positivo ou negativo. O paternalismo positivo, segundo Gisele Mendes de Carvalho [29] é "quando a intervenção beneficente busca promover o bem do sujeito protegido". Já o paternalismo negativo se manifesta "quando o objetivo da medida paternalista não é promover o bem, mas apenas impedir a causação de um dano".

Existem também outras classificações das normas paternalísticas.

O paternalismo será débil ou leve quando a proteção se direcionar a pessoas mais vulneráveis. Heloisa Estellita [30] explica que o paternalismo leve é o mesmo que o não censurável e "consiste em defender pessoas relativamente impotentes ou desamparadas ou vulneráveis de perigos externos, incluindo danos provenientes de outras pessoas quando as partes protegidas não consentiram voluntariamente com o risco, e fazendo-o de maneira análoga, em motivação e vigilância, àquilo que os pais fazem para proteger seus filhos". [31]

O paternalismo leve ou débil é perfeitamente aceitável, pois protege os vulneráveis, já que seu consentimento está viciado e não é genuíno. Aqui o estado presta a proteção exatamente as pessoas que ele tem por dever proteger.

Nesses casos o sujeito não possui condições suficientes para agir por si mesmo, necessitando de amparo do Estado para fazer escolhas melhores, que não tragam prejuízo ou que possam proporcionar benefícios. A vulnerabilidade pode manifestar-se de diversas formas.

A lei deve prever medidas que busquem o equilíbrio nas relações que envolvam vulneráveis. Não restam dúvidas quanto à legitimidade da tutela penal adotada pelo Estado no tocante aos delitos relativos à prostituição no caso de pessoas vulneráveis, sejam elas menores de 18 anos ou indivíduos que não estejam em pleno gozo das suas faculdades mentais. São exemplos de paternalismo débil ou leve e justificável por parte do Estado as condutas típicas descritas no artigo 227, § 1º e artigo 230, §1º, ambos do Código Penal.

Ainda, além desses, também há legitimidade estatal em assumir comportamentos paternalistas que tipificam condutas relativas à prostituição quando os crimes são cometidos contra vítimas maiores de 18 anos e no pleno gozo de suas faculdades mentais, mas mediante emprego de violência, grave ameaça ou fraude, pois, nesses casos, ou não há consentimento, ou o consentimento está viciado. Este é o caso dos tipos penais existentes no artigo 227, § 2º; artigo 228, § 2º; e artigo 230, § 2º, todos do Código Penal.

No caso dos artigos 227, § 1º e § 2º; artigo 228, § 2º e artigo 230, §1º e § 2º, todos do Código Penal, o Estado está cumprindo o seu papel de proteção em relação a estas pessoas por meio da tutela penal, protegendo pessoas cujo consentimento é irrelevante, tendo em vista ter uma validade relativa em razão de sua vulnerabilidade.

Nesses casos não há sequer discussão sobre a necessidade do Estado de atuar com paternalismo. Para melhorar a tutela dos vulneráveis, editou-se a Lei 12.015/2009 [32], que aumentou a proteção estatal criminalizando condutas praticadas contra os vulneráveis.

Além do paternalismo débil ou leve temos ainda, dentro da espécie da intensidade o paternalismo duro ou forte que é aquele explicitado como paternalismo presumivelmente censurável, dentro da divisão elaborada por Joel Feinberg, citado por Heloisa Estellita [33] como sendo aquele que "consiste em tratar adultos como se fossem crianças, ou crianças mais velhas como se fossem mais novas, forçando-os a agir ou deixar de agir de certas maneiras, seja: a) paternalismo benevolente - para seu próprio bem, não importando seus próprios desejos na matéria (...) ou b) paternalismo não benevolente – para o bem de outras partes, não importando seus próprios desejos na matéria (...)".

O paternalismo duro ou forte para Gisele Mendes de Carvalho é "pressupõe que as medidas com o fim de beneficiar ou de evitar o dano que uma pessoa possa causar-se a si mesma se justifiquem inclusive quando as decisões ou ações arriscadas ou danosas praticadas por ela sejam perfeitamente informadas, voluntárias e autônomas. Assim, o paternalismo forte não depende de considerações acerca da maioridade, saúde mental ou autonomia do sujeito para consentir validamente: desde esta perspectiva, uma medida com o propósito de proteger o indivíduo legitima-se independentemente de tais considerações, e mesmo que para isso seja necessário aplicá-la contra a sua vontade. Diferentemente do paternalismo leve, essa espécie de paternalismo é exercida sobre sujeitos capazes e autônomos, embora a danosidade dos atos a serem evitados só atinjam de forma significativa a essas próprias pessoas".

É exatamente aqui que reside a questão desse trabalho. Saber se o paternalismo duro ou forte deve ser censurável ou não por impor restrições e limitações à liberdade de pessoas que estejam no pleno gozo de suas faculdades mentais e sejam maiores de idade, não submetidas a qualquer forma de constrangimento, violência, grave ameaça ou fraude, que consintam livremente na participação de terceiros.

Outra classificação do paternalismo é puro ou direto e impuro ou indireto. Dworkin classifica o paternalismo em puro e impuro. O paternalismo puro pode ser definido como a restrição da liberdade de um grupo de pessoas que coincide com o mesmo grupo de beneficiados, ou seja, é quando a limitação da liberdade de alguém é exercida sobre ele mesmo. Já o paternalismo impuro é a falta de coincidência entre os grupos de pessoas atingidas pela restrição e de pessoas para quem se busca um bem, ou seja, nesse caso a sanção será aplicada ao terceiro visando o bem-estar do indivíduo que motiva a intervenção paternalista.

Assim podemos elencar os seguintes exemplos: "proibir a fabricação de cigarros, para proteger a saúde dos fumantes, é caso de paternalismo impuro, pois os fabricantes teriam sua atividade restringida para ajudar os consumidores do tabaco; obrigar o uso de cinto de segurança é exemplo de paternalismo puro, pois essa restrição de liberdade tem por fim o bem das próprias pessoas obrigadas a cumprirem a determinação". [34]

Dentro das espécies de paternalismo podemos classificar as demais condutas relativas à prostituição como "paternalismo negativo (ao impedir a prostituta de causar um dano moral a si mesma), forte (pois, trata-se de sujeitos plenamente capazes e cientes de sua decisão) e indireto (vez que a prostituição, em si mesma, não é delito, punindo-se tão somente o comportamento do terceiro que promove ou facilita)". [35]

Assim resta saber qual é a justificação apresentada para a tipificação dos crimes relativos à prostituição quando o consentimento é livre e exercido por pessoas maiores e capazes.


3.O BEM JURÍDICO E AS POSSÍVEIS JUSTIFICAÇÕES AO PATERNALISMO

Importa saber qual é o bem jurídico realmente protegido pelos crimes relativos à prostituição para compreender se o paternalismo do Estado, ao eleger essas condutas como delituosas, é justificável ou não.

3.1.Bem jurídico

Conforma já salientado os crimes relacionados à prostituição estão elencados nos artigos 227 a 23l-A do Código Penal, dentro do Capítulo V, do Título VI, sob o nome de crimes contra a dignidade sexual.

A rubrica dos delitos, crimes contra a dignidade sexual, foi dada pela alteração promovida pela Lei 12.015/2009. Antes dessa alteração estes crimes eram intitulados como crimes contra os costumes, demonstrando o ranço característico de um código datado de 1940.

Embora possa parecer que a mudança foi apenas uma adaptação de nomenclatura, por trás dela existe a problemática que envolve o bem jurídico tutelado por essas condutas. O que antes se protegia era a moralidade sexual e o pudor público, ao passo que agora, a proteção recai em outros bens jurídicos como a liberdade sexual e a integridade psíquica e física da vítima [36].

Com a alteração legislativa, ficou evidente que o bem jurídico protegido pelo legislador nos crimes de lenocínio é a dignidade sexual da prostituta, [37] tanto que o legislador incrimina condutas tendentes a favorecer o ingresso ou a permanência desta na prostituição.

Para Nucci [38], a "dignidade fornece a noção de decência, compostura, respeitabilidade, enfim, algo vinculado à honra. A sua associação ao termo sexual insere-a no contexto dos atos tendentes à satisfação da sensualidade ou da volúpia. Considerando-se o direito à intimidade, à vida privada e à honra, constitucionalmente assegurados, além do que a atividade sexual é, não somente um prazer material, mas uma necessidade fisiológica para muitos, possui pertinência a tu tela penal da dignidade sexual. Em outros termos, busca-se proteger a respeitabilidade do ser humano em matéria sexual, garantindo-lhe a liberdade de escolha e opção nesse cenário, sem qualquer forma de exploração, especialmente quando envolver formas de violência. Do mesmo modo, volta-se particular atenção ao desenvolvimento sexual do menor de 18 anos e, com maior zelo ainda, do menor de 14 anos. A dignidade da pessoa humana envolve, por óbvio, a dignidade sexual".

Segundo a doutrina espanhola e a jurisprudência há algum tempo criou-se um consenso no sentido de que o bem jurídico protegido nos delitos relativos à prostituição é a liberdade sexual [39]. Para María Luisa Maqueda Abreu trata-se de proteger a liberdade sexual e com ela a dignidade pessoal [40].

Sendo o bem jurídico tutelado a dignidade sexual, por certo é a própria pessoa quem possui condições para julgar aquilo que é digno à sua vida, levando em conta a definição de exploração.

Alguns entendem que a proteção vai além da dignidade sexual, sendo o bem jurídico protegido nos crimes relativos à prostituição, a dignidade da pessoa humana, direito constitucionalmente garantido e indisponível.

A dignidade é um valor inerente a todo e qualquer ser humano, e portanto deve ter seus valores respeitados por todos. Explica Rizzatto Nunes [41] que a "pessoa humana, pela condição natural de ser, com sua inteligência e possibilidade de exercício de sua liberdade, se destaca na natureza e se diferencia do ser irracional. Essas características expressam um valor e fazem do homem não mais um mero existir, pois este domínio sobre a própria vida, sua superação, é a raiz da dignidade humana".

Conceituar dignidade humana não é tarefa fácil, mas esse princípio fundamental está diretamente vinculado a idéia de liberdade. Assim, somente a liberdade pode garantir a dignidade. A dignidade humana deve analisada de maneira abrangente, abarcando a noção de todas as liberdades públicas asseguradas pelo ordenamento jurídico, incluindo a liberdade sexual, pois todos os direitos ditos fundamentais encontram seu alicerce na noção de dignidade humana.

Para Capez [42], "a tutela da dignidade sexual, portanto, deflue do princípio da dignidade humana, que se irradia sobre todo o sistema jurídico e possui inúmeros significados e incidências. Isto porque o valor à vida humana, como pedra angular do ordenamento jurídico, deve nortear a atuação do intérprete e aplicador do direito, qualquer que seja o ramo da ciência onde se deva possibilitar a concretização desse ideal no processo judicial. Na realidade, o princípio da dignidade humana como valor moral e espiritual inerente à pessoa, não foi criado nem construído pela ciência, constituindo "um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais".

Para alguns autores, como a dignidade sexual faz parte da dignidade humana  e que como nos crimes acessórios a prostituição o que está em jogo não é a liberdade sexual e sim a dignidade humana, pois vender sua escolha sexual, torna o ser humano mera coisa, objeto de mercancia. Assim o bem jurídico tutelado não é a liberdade sexual e sim a integridade moral do indivíduo que se prostitui. [43]

Contudo, mesmo para quem considera o bem jurídico protegido, a integridade moral, leva em conta que nenhum direito é absoluto, e que se tratando de direitos fundamentais sempre deve existir a ponderação entre os bens jurídicos em conflito de acordo com a proporcionalidade. Para Gisele Mendes de Carvalho [44] a "tutela deve admitir diferentes matizes ou graduações de acordo com a constatação, no caso concreto, do maior ou do menor alcance do exercício da autonomia individual por parte do indivíduo que figura como vítima desses delitos."

Assim me parece que independente do bem jurídico, seja ele a integridade moral ou ainda a liberdade sexual, a ponderação deve existir. Nesse caso temos que ponderar o direito à dignidade humana e o direito a liberdade sexual, sendo que a liberdade sexual também está incluída na dignidade humana.

Para Capez, a "tutela da dignidade sexual, no caso, esta diretamente ligada à liberdade de autodeterminação sexual da vítima, à sua preservação no aspecto psicológico, moral e físico, de forma a manter íntegra a sua personalidade. Portanto, é a sua liberdade sexual, sua integridade física, sua vida ou sua honra que estão sendo ofendidas". [45]

Contudo, existindo o consentimento livre, de pessoa maior e capaz, a liberdade sexual ser levada em consideração, pois o bem jurídico protegido pelo legislador nos crimes de lenocínio é a dignidade sexual, em sentido amplo, englobando a integridade e a autonomia sexual, que só pode ser exercida e verificada tendo em vista a liberdade.

3.2.Possíveis justificações

O paternalismo, como intervenção no Estado na liberdade de seus membros é difícil de ser justificado quando o consentimento é livre e exercido por pessoas maiores, capazes.

Observa-se que John Stuart Mill, no século XIX, entendia que a invasão da liberdade individual não se justificava mesmo no caso de prevenir algum dano físico ou moral. Para o liberal a intervenção do estado seria admissível apenas quando atingisse terceira pessoa. Para Mill a única finalidade que justifica, de pleno direito, o exercício de limitações a liberdade sobre um membro de uma comunidade civilizada, contra sua vontade é evitar que se prejudiquem terceiros. Seu próprio bem físico ou moral, não é justificação suficiente. Ninguém pode ser obrigado a realizar determinados atos somente porque é melhor para ele, ou porque na opinião dos outros é o mais acertado [46].

Porém, autores contemporâneos como Feinberg, Dworkin ou Avilés, embora com reservas, admitem o uso moderado do paternalismo. E outros estudiosos da atualidade, entretanto, tecem severas críticas às normas paternalistas, como veremos a seguir.

A aplicação de medidas paternalistas a maiores capazes é muito difícil de ser justificada, e, portanto, duramente criticada. Para seus opositores, há flagrante violação da autonomia da vontade. Contudo, quando o destinatário é um vulnerável, a medida torna-se aceitável [47].

Inicialmente, cumpre ressaltar que nos casos que envolvam vulneráveis, não restam dúvidas quanto à legitimidade da tutela penal adotada pelo Estado no tocante aos delitos relativos à prostituição. Assim, seja para os menores de 18 anos ou indivíduos que não estejam em pleno gozo das suas faculdades mentais, ou ainda, quando os crimes são cometidos contra vítimas maiores de 18 anos e no pleno gozo de suas faculdades mentais, mas mediante emprego de violência, grave ameaça ou fraude, o paternalismo é classificado como débil ou leve e é justificável por parte do Estado.

Segundo Avilés [48], a aplicação de normas jurídicas ou políticas públicas paternalistas justifica-se na incapacidade da pessoa no momento de tomar suas decisões. Todavia, embora seja uma condição necessária, o juízo de incapacidade não é suficiente. De outra forma, todas as pessoas que se comportassem de maneira irracional, desinformada ou emotiva poderiam estar sujeitas a uma medida paternalista.

A criminalização das condutas relativas à prostituição, nos casos de maiores de 18 anos, capazes e com consentimento livre com base no paternalismo jurídico, vem sendo discutida, encontrando opiniões divergentes.

Em primeira análise, impor o paternalismo tipificando as condutas relativas à prostituição, parece injustificável dentro de um Estado de Direito que tenha por base a democracia.

Nos crimes relativos à prostituição, elencados nos artigos 227 a 230 do Código Penal, se o tipo penal não exige violência ou grave ameaça contra a vítima, sua vulnerabilidade é a única explicação para a tutela da dignidade sexual. Nesses casos, a norma penal quer impedir a exploração da vulnerabilidade mesmo que haja consentimento no exercício da prostituição.

A questão que se apresenta, então é, se não há vício de consentimento e no caso de pessoas maiores e capazes, a vulnerabilidade só pode derivar da imposição da prática da prostituição pelas condições nas quais a prostituta se encontra. Assim, a vulnerabilidade nos casos de maiores de 18 anos e capazes e livres no consentimento só pode estar ligada a situações de anormalidade ou fragilidade.

Na verdade, a norma paternalista vai de encontro à vontade em estado de vulnerabilidade para impor a vontade real do ofendido caso estivesse em situação de escolher em condições normais. Por exemplo, se uma prostituta tivesse boas condições econômicas, provavelmente não estaria vendendo o próprio corpo e isso justificaria a punição de quem a explorasse [49].

O ponto chave está na definição do limite entre vontade consciente e vontade induzida pela vulnerabilidade que a situação social impõe à prostituta. O núcleo de uma escolha livre é a autonomia, que inexiste nas situações em que o indivíduo está sob coação ou engano, apresenta problemas ligados ao desenvolvimento intelectual ou se encontra vulnerável.

Contudo, é arriscado compreender que mesmo dentro do estado liberal, uma pessoa livre age contra sua vontade real. Não há garantias de que sua vontade real seja diferente daquilo que ela está praticando. Maior ainda o risco de utilizar o direito penal para suprir a suposta falta de consentimento sempre que alguém se apresentar como vulnerável [50].

Por certo o que importa aqui é a exploração ou não da prostituta por conta da situação de vulnerabilidade em que ela se encontra por precisar prostituir-se. Essa é a justificativa do Estado para resguardar o bem jurídico dignidade sexual e criminalizar as condutas de quem favorece o ingresso ou a permanência da prostituta na prostituição.

Os delitos relativos à prostituição pressupõem que a prostituta, por sua vulnerabilidade está sendo explorada por quem favorece o seu ingresso ou a sua permanência na prostituição. Diante dessa situação, o Estado interfere e tenta impedir a exploração, pois entende que o "ser humano não pode converter-se, de forma alguma em objeto de comércio" [51].

Acontece que "quando um adulto é capaz, não ocorrer a presunção absoluta que está agindo contra sua vontade real, somente porque suas condições sociais não são adequadas. Por isso não pode o direito penal utilizar critérios meramente subjetivos para apontar a vulnerabilidade do ofendido. É preciso que se estipulem exigências de ordem objetiva ou, se forem apenas subjetivas, que estejam evidentes e longe de qualquer dúvida. Quer dizer, somente é viável presumir a vulnerabilidade de uma pessoa quando existir certeza verificável sobre a precariedade e a contrariedade à vontade real. Daí dizer que o Estado não pode se servir do direito penal em primeiro plano para suprir a vulnerabilidade não verificável objetivamente" [52], no caso concreto.

O consentimento não pode ser presumível, ou seja, não há como presumir, de forma abstrata que todas as prostitutas estão se prostituindo por causa de suas condições financeiras ou sociais e que isso justifica, de forma abstrata a intervenção do Estado.

Como o pretenso bem jurídico tutelado, no exemplo da prostituição, segundo o Código Penal, é a dignidade sexual, ninguém melhor que o próprio ofendido para afirmar se há ou não exploração. Não se pode permitir a total permissão ao Estado de decidir pelas pessoas o que seja melhor para suas vidas. Pode-se abrir as portas para uma verdadeira imposição de critérios meramente morais [53].

O Direito Penal é a ultima ratio e deve ser utilizado apenas quando não existir outra forma de conter as condutas.

Para Nucci [54], "doutrinariamente, o princípio da intervenção mínima é incentivado e enaltecido, como elemento propulsor das reformas legislativas no campo criminal, porém ainda está distante de ser efetivamente acolhido pelo Poder Legislativo no Brasil. Alguns passos têm sido dados na direção correta. Outros ainda estão por vir. É preciso evoluir e abandonar o foco paternalista do Direito Penal, buscando tipificar toda e qualquer conduta lesiva a direito de outrem; não é meta da lei penal punir banalidades ou infrações menores, que outros ramos do direito podem cuidar e tutelar".

No caso dos crimes relacionados à prostituição, o Estado não criminaliza a conduta de prostituir-se, permitindo que a liberdade e a dignidade sexual sejam respeitadas, sem qualquer intervenção estatal. Contudo, tenta de outras formas desestimular a prostituição, criminalizando os terceiros que contribuem para ela.

Acontece que o Estado falha ao não proporcionar a seus cidadãos condições de vida digna e para suprir sua própria falha criminaliza condutas de terceiros que auxiliam a prostituta para desestimular própria prostituição, utilizando o Direito Penal como forma de contornar problemas sociais.


4.BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O PATERNALISMO NOS CRIMES LIGADOS A PROSTITUIÇÃO

A prostituição em si não atinge nenhum bem jurídico elencado pelo legislador e elevado a categoria de crime. Contudo, embora a prostituição não seja crime, o legislador, por uma questão de Política Criminal impõe penalidades aqueles que contribuem para ela.

Os crimes relacionados à prostituição estão elencados nos artigos 227 a 231-A do Código Penal, dentro do capítulo V, dos Crimes contra a Dignidade Sexual. Tais delitos são denominados como lenocínio e tráfico de mulheres.

Como já exarado anteriormente, os delitos de tráfico interno e externo de pessoas para fins sexuais, não serão abordados, pois demandaria uma extensa abordagem a respeito da regulamentação internacional, com base em tratados e convenções. E, ainda, nas condutas de tráfico de pessoas o bem jurídico tutelado é diverso dos demais tipos penais desse Título, qual seja a integridade moral.

Assim, analisando os crimes previstos nos artigos 227 a 230 do Código Penal, temos conforme explica Damásio de Jesus [55] que, "o lenocínio é o fato de prestar assistência à libidinagem de outrem ou dela tirar proveito. A diferença entre o lenocínio e os outros crimes sexuais é que no lenocínio o agente não quer satisfazer a própria lascívia, mas a alheia, por meio da prática sexual inter alios. O lenocínio possui duas formas: a) lenocínio principal: quando o sujeito toma a iniciativa da corrupção. Exs.: arts. 227 (mediação para servia a lascívia de outrem) e 228, primeira parte (favorecimento a prostituição). b) lenocínio acessório: quando o sujeito acede a um preexistente estado de imoralidade, favorecendo, provendo a sua continuidade. Caso dos arts. 228, segunda parte, 229 e 230."

Nos delitos constantes do Capítulo V do Título VI do Código Penal são delitos que lesionam não apenas a dignidade sexual da vítima, como também sua liberdade sexual, autonomia pessoal e integridade corporal.

Nos crimes contra a dignidade sexual encontramos normas que alguns autores podem entender que são baseadas no paternalismo, já outros entenderão que o fundamento é puramente moral.

O que diferencia os casos em que podemos considerar a presença de paternalismo ou moralismo são suas características. Enquanto o paternalismo protege os indivíduos incapazes ou vulneráveis de ações de dano a si, visando proteger o interesse das pessoas destinatárias das medidas paternalistas, o moralismo interfere na vida de um indivíduo mesmo quando nenhum fator que afeta a capacidade está presente, visa o interesse geral, independente do interesse da pessoa destinatária da norma, proíbe as ações simplesmente porque são contrárias à moral, independente de qualquer dano [56].

Com respeito ao delito do art. 227, caput [57], sendo a vítima maior de 18 anos, cabe refletir sobre a sua manutenção nó ordenamento penal vigente em nosso país. Neste delito, o agente não induz o sujeito passivo ao exercício da prostituição, em que a venalidade e a habitualidade são elementos essenciais, mas apenas induz alguém a satisfazer a lascívia de terceiro de forma gratuita, naquele momento. O fim de lucro está tipificado no artigo 227, § 3.° do Código Penal. [58]

Este tipo penal (art. 227, caput) é um exemplo de moralismo, no qual o Estado desvirtua a função do Direito Penal proteção de bens jurídicos relevantes de lesão ou ameaça de lesão. Assim deve tal dispositivo ser suprimido do ordenamento jurídico

Segundo Heloisa Estelitta "no crime de manter "casa de prostituição" (artigo 229 do Código Penal [59]), muito embora seja claro o aspecto moralista, está contido também um componente paternalista, porque nega indiretamente à prostituta um lugar para exercer sua profissão baseado, num raciocínio que pode ser assim expressado: "como ser prostituta é ruim, proibindo alguém de lhe dar auxílio (tendo uma casa de prostituição), as pessoas podem ser demovidas da idéia de se tomarem prostitutas". [60]

O tipo dos delitos dos artigos 228 [61] e 230 [62] não contém qualquer referência ao uso de violência, grave ameaça ou fraude para a obtenção da anuência da vítima. Donde se conclui que, sendo o sujeito passivo maior de 18 anos, a incriminação de tais comportamentos poderia ser também, como no caso do delito anterior, um reflexo do moralismo ou paternalismo forte injustificado por parte do Estado. [63]

Especificamente no crime de rufianismo, artigo 230, Código Penal, o que parece dar suporte ao crime são duas fundamentações. A primeira é moralista e afirma que a prostituição é ruim e a segunda, contudo, é paternalista, porque a proibição, embora sendo dirigida àqueles que vivem dos proveitos da prostituição alheia, é estabelecida para proteger a prostituta de ter o que ela deseja, sob o fundamento de que o Estado sabe melhor o que é bom para ela, ou seja, "não ser uma prostituta". [64]

Nesses casos, do artigo 228, 229 e 230 do Código Penal a tipificação das condutas é uma forma de impedir que alguém se torne uma prostituta, para o seu próprio bem, sendo uma demonstração clara de paternalismo. Aqui, o consentimento válido da prostituta que é maior e capaz deve afastar a tipicidade penal das condutas.


5.CONSIDERAÇÕES FINAIS

O paternalismo como forma de restrição a liberdade dos indivíduos deve ser analisado sob determinados prismas. Assim, a primeira conclusão que se obtém é que o paternalismo débil é aceitável quando se tratar de vulneráveis. Assim, nos casos que envolvam vulneráveis, não restam dúvidas quanto à legitimidade da tutela penal adotada pelo Estado no tocante aos delitos relativos à prostituição. Assim, sejam para os menores de 18 anos ou indivíduos que não estejam em pleno gozo das suas faculdades mentais, ou ainda, quando os crimes são cometidos contra vítimas maiores de 18 anos e no pleno gozo de suas faculdades mentais, mas mediante emprego de violência, grave ameaça ou fraude.

O paternalismo leve ou débil é perfeitamente aceitável, pois protege os vulneráveis, já que seu consentimento está viciado e não é genuíno. Aqui o estado presta a proteção exatamente às pessoas que ele tem por dever proteger.

Nos crimes relativos à prostituição, elencados nos artigos 227 a 230 do Código Penal, se o tipo penal não exige violência ou grave ameaça contra a vítima, sua vulnerabilidade é a única explicação para a tutela de sua dignidade sexual. Nesses casos, a norma penal quer impedir a exploração da vulnerabilidade mesmo que haja consentimento no exercício da prostituição, pois o bem jurídico tutelado vai além da liberdade ou dignidade sexual, atingindo também a dignidade humana.

Contudo, é arriscado compreender que mesmo dentro do estado liberal, uma pessoa livre age contra sua vontade real. Não há garantias de que sua vontade real seja diferente daquilo que está praticando. Maior ainda o risco de utilizar o direito penal para suprir a suposta falta de consentimento sempre que alguém se apresentar como vulnerável.

O consentimento não pode ser presumível, ou seja, não há como presumir, de forma abstrata que todas as prostitutas estão se prostituindo por causa de suas condições e que isso justifica, a intervenção do Estado.

O Direito Penal é a ultima ratio e deve ser utilizado apenas quando não existir outra forma de conter as condutas. No caso dos crimes relacionados à prostituição, o Estado não criminaliza a conduta de prostituir-se, permitindo que a liberdade e a dignidade sexual sejam respeitadas. Contudo, tenta de outras formas desestimular a prostituição, criminalizando os terceiros que contribuem para a prostituição.

O Estado falha ao não proporcionar para seus cidadãos condições de vida digna e para suprir sua própria falha criminaliza condutas para desestimular a prostituição.

É claro que o bem jurídico protegido vai além dignidade sexual, atingindo a dignidade da pessoa humana, que pode ser considerado como bens indisponíveis. Contudo, nenhum direito é absoluto. Portanto, deve a liberdade sexual ser levada em consideração, pois o bem jurídico protegido pelo legislador nos crimes de lenocínio é a dignidade sexual, que só pode ser exercida e verificada tendo em vista a liberdade.

Assim, analisando os tipos penais tem-se que o constante no art. 227 do Código Penal deveria ser excluído do sistema penal pátrio, pois se trata de conduta não habitual e sem venalidade, o que retira qualquer característica de prostituição do tipo. Já nos casos dos artigos 228, 229 e 230 do Código Penal a tipificação das condutas é uma forma de impedir que alguém se torne uma prostituta, para o seu próprio bem, sendo uma demonstração clara de paternalismo. Aqui, o consentimento valido da prostituta que é maior e capaz deve afastar a tipicidade penal das condutas.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

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Notas

  1. JESUS, Dámasio Evangelista de. Direito penal, 3° volume: parte especial: dos crimes contra a propriedade imaterial a dos crimes contra a paz pública. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 187.
  2. HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal: arts. 250 a 361. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959. p. 115.
  3. NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 10ª. ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 944.
  4. PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro - volume 02: parte especial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 699.
  5. ESTRELLA, Oscar Alberto. De los delitos sexuales.Buenos Aires: Hammurabi, 2005, p. 179/180.
  6. O legislador havia optado por definir o termo exploração sexual no vetado artigo 234-C: "Para os fins deste título, ocorre exploração sexual sempre que alguém for vitimam dos crimes nele tipificados". Caso não tivesse sido vetado, tal artigo não se limitaria aos crimes relativos à prostituição, mas ganharia alcance, sendo aplicável a qualquer infração penal sexual. Para Guilherme Nucci "criava-se um conceito delimitado, mas que esvaziaria o elemento normativo do tipo de certos crimes, como por exemplo, do art. 229".
  7. NUCCI, Guilherme de Souza. Op. Cit., p. 946.
  8. ABREU, María Luisa Maqueda. Prositución, feminismos y Derecho Penal. Granada: Cotnares. 2009, p. 115.
  9. MARTINELLI, João Paulo Orsini. Paternalismo jurídico-penal. 2010. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo. 2010, p. 210.
  10. PRADO, Luiz Regis. Op. Cit., p. 699.
  11. CARVALHO, Gisele Mendes. Delitos relativos a prostituição no Código Penal Brasileiro: Proteção da dignidade humana ou paternalismo jurídico?, Ciências Penais, Vol. 12, jan-jun. 2010, p. 195.
  12. PRADO, Luiz Regis. Op. Cit., p. 699.
  13. CARVALHO, Gisele Mendes. Op. Cit., p. 195. Segundo Gisele Manedes de Carvalho este é o modelo adotado em alguns estados Norte-americanos e na Suécia.
  14. O Brasil já foi regulamentarista. As prostitutas eram fichadas nas delegacias.
  15. PRADO, Luiz Regis. Op. Cit., p. 698.
  16. PRADO, Luiz Regis. Op. Cit., p. 699.
  17. PRADO, Luiz Regis. Op. Cit., p. 699.
  18. ZAFFARONI, Eugenio Raúl, PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro: Parte Geral. 2ª ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 132.
  19. NUCCI, Guilherme de Souza. Op. Cit., p. 944.
  20. Trecho de acórdão do Tribunal de Justiça de Goiás, cuidando do tema: "Ademais, vejo nisso tudo um exagero descomunal, quando se lê nos jornais de circulação diária as ofertas das chamadas ‘acompanhantes’ e até mesmo ‘garotos de programa’. Nas recheadas páginas jornalísticas deparamo-nos com a descarada mercancia do corpo humano, com a oferta se fazendo com o aceite de pagamento com cheque pré-datado, cartão de crédito e, ironicamente, até em troca de vale refeição. E tudo isso com endereço e telefone dos prostituídos, sem que o aparelho policial mova uma palha sequer para conter tais abusos, ou apologias" (HC 21580-0/217, 1ª C. rel. Paulo Teles. 04.09.2003, empate na votação, RDPPP 25/04, p.101).
  21. Este trabalho não abarcará as condutas de tráfico interno e externo de pessoas para fins sexuais, pois demandaria uma extensa abordagem a respeito da regulamentação internacional, com base em tratados e convenções, sem falar que nas condutas de tráfico de pessoas o bem jurídico tutelado é diverso dos demais tipos penais desse Título, qual seja a integridade moral.
  22. CARVALHO, Gisele Mendes de. Op. Cit., p. 179/180.
  23. RODRIGUES, Thaís de Camargo. Paternalismo legal e crimes contra os costumes. Disponível em: http://www.saraivajur.net/menuEsquerdo/doutrinaArtigosDetalhe.aspx?Doutrina=1012, acessado em 20 de maio de 2011.
  24. CARVALHO, Gisele Mendes de. Op. Cit., p. 180.
  25. MARTINELLI, João Paulo Orsini. Op. Cit., 02.
  26. ARCHARD, David. Paternalism defined. in Analysis, vol. 50, n° 01, Janeiro de 1990. p. 37.
  27. MARTINELLI, João Paulo Orsini. Paternalismo na lei de drogas. Revista das Liberdades. IBCCRIM.Disponível em http://www.revistaliberdades.org.br/site/outrasEdicoes/outrasEdicoesExibir.php?rcon_id=15, acessado em 20 de maio de 2011, p. 02.
  28. RODRIGUES, Thaís de Camargo. Paternalismo legal e crimes contra os costumes. Disponível em: http://www.saraivajur.net/menuEsquerdo/doutrinaArtigosDetalhe.aspx?Doutrina=1012, acessado em 20 de maio de 2011. Feinberg faz a seguinte divisão quando analisa o paternalismo: 1) Paternalismo presumivelmente censurável: Consiste em tratar adultos como se fossem crianças, ou crianças  mais velhas como se fossem mais novas, forçando-os a agir de determinada maneira ou a abster-se de certa conduta. Este tipo de paternalismo pode apresentar-se da seguinte forma: a) Paternalismo benevolente: É aquele para o próprio bem da pessoa, não importando sua opinião ou vontade.(o paternalismo estudado por Feinberg no livro Harm to Self, e o escopo do capítulo Legal Paternalism é analisar se esse tipo de paternalismo deve ou não ser censurável). b) Paternalismo não benevolente: É aquele que visa o benefício de terceiros, independente da vontade dos destinatários da medida paternalista. (Esse tipo de paternalismo geralmente é censurável). 2) Paternalismo presumivelmente não censurável: Consiste em defender pessoas desamparadas ou vulneráveis de perigo externo, incluindo danos provocados por terceiros quando o protegido não consentiu voluntariamente ao risco.
  29. CARVALHO, Gisele Mendes de. Op. Cit., p. 180/181.
  30. ESTELLlTA, Heloisa. Paternalismo, Moralismo e Direito Penal: Alguns crimes suspeitos em nosso Direito Positivo, Boletim IBCCRIM, out/2007, p.17.
  31. CARVALHO, Gisele Mendes de. Op. Cit., p. 189. "Entre as principais alterações introduzidas pela Lei 12.015/2009, está a inserção de um Capítulo dedicado aos crimes sexuais contra os vulneráveis (Capítulo 11 do Título VI), acabando assim o legislador com a antiga presunção de violência, que constava do revogado art. 224, CP. De acordo com a nova configuração dos tipos, o estupro (art. 217-A) , a corrupção (arts. 218 e 218-A) e o favorecimento da prostituição (art. 218-B) de sujeitos menores de 14 anos (ou de 18 anos, no caso do art. 218-B), bem como de indivíduos que, em razão de enfermidade ou doença mental, não tenham o necessário discernimento para prática do ato sexual, configuram delitos bem mais graves do que os similares praticados contra vítima maiores de idade e no pleno gozo de suas faculdades mentais. As alterações legislativas buscam, portanto, cumprir a importante missão de reprimir a pedofilia e outras práticas relacionadas à exploração sexual de menores e incapazes no Brasil, na mesma linha já seguida pela Lei 11.829/2008, que alterou o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), com o fim de combater a pornografia infanto-juvenil".
  32. ESTELLlTA, Heloisa. Op. Cit., p.17.
  33. MARTINELLI, João Paulo Orsini. Op. Cit., p.02.
  34. CARVALHO, Gisele Mendes de. Op. Cit., p. 189.
  35. CARVALHO, Gisele Mendes de. Op. Cit., p. 189.
  36. DIAS, Maria Berenice. Liberdade sexual e direitos humanos. Disponível em
  37. http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=24, acessado em 20 de maio de 2011. A autora discorre sobre o bem jurídico dignidade e liberdade sexual. "Indispensável que se reconheça que a sexualidade integra a própria condição humana. Ninguém pode realizar-se como ser humano se não tiver assegurado o respeito ao exercício da sexualidade, conceito que compreende a liberdade sexual (...). Ao serem visualizados os direitos de forma desdobrada em gerações, é de se reconhecer que a sexualidade é um direito do primeiro grupo, do mesmo modo que a liberdade e a igualdade, pois compreende o direito à liberdade sexual (...). Trata-se assim de uma liberdade individual, um direito do indivíduo, sendo, como todos os direitos de primeira geração, inalienável e imprescritível. É um direito natural, que acompanha o ser humano desde o seu nascimento, pois decorre de sua própria natureza. Também não se pode deixar de considerar a livre orientação sexual como um direito de segunda geração, por dar origem a uma categoria social que deve ser protegida, sendo considerada hipossuficiente. A hipossuficiência não deve ser identificada somente sob o viés econômico. É pressuposto e causa de um especial tratamento dispensado pelo Direito. Também devem ser reconhecidos como hipossuficiente o idoso, a criança, o deficiente, o negro, o judeu e também a mulher, porque ela, como as demais categorias, sempre foi alvo da discriminação social. (...) Igualmente o direito à sexualidade avança para ser inserido como um direito de terceira geração. Esta compreende os direitos decorrentes da natureza humana, mas não tomados individualmente, porém genericamente, solidariamente, a fim de realizar toda a humanidade, integralmente, abrangendo todos os aspectos necessários à preservação da dignidade humana. Entre eles não se pode deixar de incluir e enxergar a presença do direito de todo ser humano de exigir o respeito ao livre exercício da sexualidade".

  38. NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual: comentários à Lei 12.015, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 14.
  39. ABREU, María Luisa Maqueda. El tráfico sexual de personas. Valencia: Tirant lo blanch, 2001, p.34.
  40. ABREU, María Luisa Maqueda. Op. Cit., p. 34.
  41. NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 49/50. Disponível em http://capez.taisei.com.br/capezfinal/index.php?secao=27&subsecao=0&con_id=5647, acessado em 20 de maio de 2011.
  42. CAPEZ, Fernado. Op. Cit. p, 01.
  43. CARVALHO, Gisele Mendes de. Op. Cit., p 205.
  44. CARVALHO, Gisele Mendes de. Op. Cit., p 202.
  45. CAPEZ, Fernado. Op. Cit. p, 01.
  46. RODRIGUES, Thaís de Camargo. Op. Cit., p. 01. "laúnica finalidad por la cual el poder puede, com pleno derecho, ser ejercido sobre un miembro de una comunidad civilizada contra su voluntad, es evitar que perjudique a los demás. Su proprio bien, físico o moral, no es justificación suficiente. Nadie puede ser obligado justificadamente a realizar o no realizar determinados actos, porque eso fuera mejor para él, porque le haría feliz, porque, en opinión de los demás, hacerlo sería más acertado o más justo".
  47. RODRIGUES, Thaís de Camargo. Op. Cit., p. 01.
  48. RODRIGUES, Thaís de Camargo. Op. Cit., p. 01. Para o autor "El respeto de la libertad de las personas y de su autonomía supone que todas tengan reconocido el derecho a escoger libremente entre las distintas alternativas que se le ofrecen y supone, además, que quepa la posibilidad de errar, de equivocar-se en su elección, de adoptar modos de vida diferentes de los normales".
  49. MARTINELLI, João Paulo Orsini. MARTINELLI, João Paulo Orsini. Paternalismo jurídico-penal. 2010. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo. 2010, p. 231.
  50. MARTINELLI, João Paulo Orsini. Op. Cit., p. 231.
  51. VILLALBA, Francisco Javier de León. Proposta de reforma frente a La trata de seres humanos. Bilbao, 2009, p.139.
  52. MARTINELLI, João Paulo Orsini. Op. Cit., p. 232.
  53. MARTINELLI, João Paulo Orsini. Op. Cit., p. 232.
  54. NUCCI, Guilherme de Souza. Op. Cit.,, p. 12.
  55. JESUS, Dámasio Evangelista de. Op. Cit., p. 187.
  56. RODRIGUES, Thaís de Camargo. Op. Cit., p. 01.
  57. Art. 227 - Induzir alguém a satisfazer a lascívia de outrem: Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.
  58. CARVALHO, Gisele Mendes de. Op. Cit., p. 206.
  59. Art. 229. Manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
  60. ESTELLITA, Heloisa. Op. Cit., p.18.
  61. Art. 228. Induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la, impedir ou dificultar que alguém a abandone: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
  62. Art. 230 - Tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa
  63. CARVALHO, Gisele Mendes de. Op. Cit., p. 207.
  64. ESTELLlTA, Heloisa. Op. Cit., p.18.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SIRONI, Fernanda Menegotto. O paternalismo do Estado e os crimes relativos à prostituição. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2968, 17 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19788. Acesso em: 25 abr. 2024.