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Reforma previdenciária na República Federativa do Brasil.

Aspectos jurídicos elementares

Reforma previdenciária na República Federativa do Brasil. Aspectos jurídicos elementares

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Ao extinguir a aplicabilidade dos princípios da integralidade e da paridade, institui-se no Brasil o modelo previdenciário complementar, realidade já presente em diversos países neoliberais.

1.INTRODUÇÃO

O presente trabalho institucional discorre acerca da Reforma da Previdência Social na República Federativa do Brasil, empreendida ao longo do século XX, e pretensamente conclusa no ano terceiro da década passada. Seguindo tendência global em torno da Reforma do Estado, o Brasil adota um novo modelo, baseado no conceito de Seguridade Social (como será visto adiante), cuja vertente previdenciária se verifica conforme aos ditames do Estado Neoliberal.

Objetiva-se com este trabalho científico-acadêmico traçar um panorama geral da reforma previdenciária iniciada no início do século XX, entretanto focada em duas principais emendas constitucionais da Carta Política de 1988: a emenda 20/1998 e a emenda 41/2003. Tangencia-se igualmente a emenda 19/1998, embora atinente à reforma administrativa, porém não menos relevante que as demais.

Apenas para intuito explicativo, segue-se metodologia acadêmica baseada na nova formatação promovida pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), veiculada em 2010.

A teleologia do estudo se encontra voltada para uma análise crítica acerca do modelo previdenciário pátrio, com vistas a uma maior discussão sobre como o Brasil encara o fenômeno da aposentadoria, notadamente de seus agentes públicos, a qual sofreu radicais mudanças com a publicação da emenda constitucional 41/2003, que consolidou a reforma da Previdência Social brasileira.

Este estudo foi dividido, pois, em diversas parcelas, abordando cada qual um aspecto desta relevante temática, desde a Principiologia do Direito Previdenciário (para uma visão mais profunda do conteúdo disciplinar), até uma crítica análise jurisprudencial acerca dos reflexos que a reforma em comento promoveu no cenário pátrio ao longo de sua vigência.

Com seu foco norteado para um estudo doutrinário e jurisprudencial, porém sem se retirar a devida importância da matéria fática, tenciona-se acrescentar mais um capítulo à seara dos trabalhos científicos da matéria previdenciária. Neste opúsculo, pois, encontram-se preciosa análise, a qual certamente se constituirá como essencial apontamento para a matéria discorrida.


2.PRINCIPIOLOGIA DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO

O Direito Previdenciário brasileiro certamente proporciona ao estudioso comparatista fértil terreno de pesquisa. Como um dos Estados que mais distribui recursos na área de seguridade social, o Brasil paradoxalmente possui uma gama bastante complexa e nebulosa de normas atinentes à matéria previdenciária. Rica legislação extravagante compõe a disciplina, delineada por imperativos constitucionais presentes nos artigos 194 a 204 da Carta Magna.

O Estado Brasileiro adota o modelo de seguridade social, presente nas legislações de diversos países desde a década de 1950, aproximadamente. Um dos reflexos do fenômeno do Welfare State, é gênero que se compõe das espécies Saúde, Previdência Social, e Assistência Social. Especificamente, o objeto do presente estudo é a segunda das espécies, que sofreu gradativa evolução ao longo dos séculos e se consolidou no modelo estatal supramencionado. Traz-se à colação, neste momento, as lições de José Afonso da Silva:

“Previdência Social é um conjunto de direitos relativos à seguridade social. Como manifestação desta, a previdência tende a ultrapassar a mera concepção de instituição do Estado providência (‘Welfare State’), sem, no entanto, assumir características socializantes, até mesmo porque estas dependem mais do regime econômico do que do social” [1].

A Previdência Social, como espécie do gênero Seguridade Social, possui uma série de princípios informadores, pelo que os mais relevantes passaremos a analisar, sob a égide de um panorama geral[2]. Após abordá-los, passaremos no próximo capítulo a uma análise do fenômeno internacional da Reforma do Estado, tencionando aplicar tais conceitos ao caso brasileiro, empreendido pelas emendas constitucionais realizadas à Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Tal se constituirá relevante para o estudo da reforma previdenciária, como um dos reflexos da reestruturação estatal iniciada pela emenda constitucional 19/1998 (atinente à reforma administrativa).

2.1 – Princípio da Filiação Obrigatória

Baseado em uma fórmula tripartite de custeio, em que trabalhadores, empregadores e Estado contribuem, o princípio da filiação obrigatória é decorrente da natureza de seguro social conferida ao atual modelo previdenciário, como forma de garantir a todos os contribuintes o necessário benefício por intercorrência de determinados fatores de risco (ou sinistros, caso se adote popular nomenclatura em matéria de seguros). Atualmente, deve-se considerar a Previdência Social como uma complexa seguradora do Estado, em que o indivíduo, ao contribuir, é privilegiado por uma série de benefícios que poderá gozar em caso de doença incapacitante, invalidez, aposentadoria, etc. Logo, assim que o indivíduo inicia sua relação laboral, ao término de cada ciclo mensal deve-se recolher a contribuição previdenciária, para que assim estejam resguardados seus direitos atinentes ao seguro social (social insurance, na doutrina estadunidense norte-americana). O órgão destinado a executar as operações resultantes da proteção previdenciária conferida ao trabalhador ativo e inativo em Regime Geral de Previdência é a pessoa jurídica da administração pública indireta, sob a modalidade de autarquia, denominada Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

2.2 – Princípio da Solidariedade

Tal princípio informativo apregoa a necessidade de que a maioria dos segurados contribua em prol de uma minoria que não possui condições de contribuir. Como dissertado anteriormente, a Seguridade Social é um sistema tripartido, que abarca as espécies Saúde, Previdência Social e Assistência Social. Esta última espécie é destinada a todos aqueles que não possuem condições de contribuir regularmente para adquirir os benefícios relativos à previdência. Assim como o ruralista, em determinados casos, pelo claro aspecto de sua base econômica de subsistência e pela ignorantia iuris que sempre o acompanha, pois nem sempre o Estado expande seus tentáculos por todo o território nacional, a fim de conscientizar a população de seus direitos básicos como cidadãos brasileiros.

2.3 – Princípio da Unicidade

Preleciona este princípio que o indivíduo goza de apenas um único benefício previdenciário, haja vista o caráter intuitu personae do regime de Previdência Social. Em remissão legislativa, o artigo 124 da Lei Ordinária 8213/1991 relaciona a série de benefícios previdenciários não cumulativos, a saber:

“Art. 124. Salvo no caso de direito adquirido, não é permitido o recebimento conjunto dos seguintes benefícios da Previdência Social:

I - aposentadoria e auxílio-doença;

II - mais de uma aposentadoria;

III - aposentadoria e abono de permanência em serviço;

IV - salário-maternidade e auxílio-doença;

V - mais de um auxílio-acidente;

VI - mais de uma pensão deixada por cônjuge ou companheiro, ressalvado o direito de opção pela mais vantajosa.

Parágrafo único. É vedado o recebimento conjunto do seguro-desemprego com qualquer benefício de prestação continuada da Previdência Social, exceto pensão por morte ou auxílio-acidente”.

2.4 – Princípio da Imprescritibilidade do Direito Previdenciário

O direito subjetivo a benefício previdenciário não prescreve; o que é submetido à prescrição são as prestações de tal benefício. Segundo a Lei Ordinária 8213/1991, tal prazo prescricional é de 10 (dez) anos[3]. Entretanto, o indivíduo sempre terá a oportunidade de reconhecer, seja por vias extrajudiciais ou jurisdicionais, a existência de seu direito ao benefício previdenciário e se tornar beneficiário da previdência social brasileira.

2.5 – Princípio da Expansividade Social

Decorrente do Princípio da Universalidade da Cobertura, preceitua que o sistema previdenciário nacional deverá possuir como precípuo objetivo abarcar o maior número possível de contribuintes e beneficiários, seja em regime obrigatório ou facultativo (encampado pelos antigamente denominados autônomos).


3.APONTAMENTOS SOBRE A REFORMA DO ESTADO

Para que se compreenda, de modo claro, como se desenvolveu o ideário em torno das grandes reformas pelas quais perpassou o Estado brasileiro na década de 1990, mister se explique o fenômeno internacional da Reforma dos Estados. Reflexo notadamente das políticas de ideologia Neoliberal, esta iniciativa se deu no plano global a partir da década de 1970, impulsionando a Sociedade Internacional rumo a um momento histórico reacionário quanto a determinados conceitos existentes no Liberalismo Clássico, em contraposição ao modelo do Estado de Bem Estar Social (Welfare State). Segundo dedicado texto doutrinário:

“Tal como ocorrera no passado com o Keynesianismo, o Neoliberalismo passou a dominar todos os planejamentos econômicos, empresariais e estatais, já que cabia ao Estado legitimar e formalizar o desmantelamento de sua própria capacidade de intervenção na sociedade. Entretanto, os próceres do Neoliberalismo atribuíam uma função primordial ao Estado, estranha ao velho liberalismo. Mais do que garantir a propriedade privada e a segurança social, através de seu aparato coercitivo, o Estado deveria ser garante dos agentes econômicos privados, quer financeiros quer produtivos, garantindo a estabilidade dos mercados. Assim, se uma empresa não honrasse seus empréstimos no exterior, caberia ao Estado nacional fazê-lo, para não diminuir a confiança dos investidores, nacionais e estrangeiros, nos fundamentos econômicos daquele país. Se um banco ou uma financeira quebrassem, caberia ao Estado saná-los, absorver os prejuízos, garantir os investidores e repassar a empresa saneada para novos agentes econômicos privados. Era a expressão do paraíso econômico na Terra”.[4]

Podem-se verificar diversos desdobramentos do fenômeno internacional da Reforma dos Estados na Doutrina Jurídica, influenciando a produção científica após a década de 1970: o conceito de Direito Dúctil de Gustav Zagrebelsky, a ascensão da corrente pós-positivista e do neoconstitucionalismo[5], dentre outros.

Um dos primeiros potenciais reflexos da reforma estatal no Brasil se deu com a formulação da emenda constitucional 19, de 04 de julho de 1998. Denominada jocosamente, por abalizada doutrina[6], de “Emendão”, esta modificação do Código Supremo de 1988 promoveu radical mudança na estrutura da administração pública pátria, sendo denominada, pois, de Reforma Administrativa. Trouxe para a realidade brasileira diversos mecanismos gerenciais provenientes de países desenvolvidos europeus e norte-americanos; entretanto, não fora acompanhada de uma correta internalização, consagrando o período de nossa história política sob a égide do ideário neoliberalista, em que contraditórios, e por vezes polêmicos projetos (tais como os afobados planos de privatização em determinadas áreas estratégicas do Estado, e o deficiente regime de concessões na prática de serviços públicos) foram postos em prática. Neste desiderato, relevante modificação foi a ocorrida no âmbito do artigo 41 da Constituição, a saber:

“"Art. 41. São estáveis após três anos de efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público.

§ 1º O servidor público estável só perderá o cargo:

I - em virtude de sentença judicial transitada em julgado;

II - mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa;

III - mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa.

§ 2º Invalidada por sentença judicial a demissão do servidor estável, será ele reintegrado, e o eventual ocupante da vaga, se estável, reconduzido ao cargo de origem, sem direito a indenização, aproveitado em outro cargo ou posto em disponibilidade com remuneração proporcional ao tempo de serviço.

§ 3º Extinto o cargo ou declarada a sua desnecessidade, o servidor estável ficará em disponibilidade, com remuneração proporcional ao tempo de serviço, até seu adequado aproveitamento em outro cargo.

§ 4º Como condição para a aquisição da estabilidade, é obrigatória a avaliação especial de desempenho por comissão instituída para essa finalidade."

Em seguida, cabem algumas explicações acerca da emenda constitucional 20, de 15 de dezembro de 1998. Igualmente realizada durante o período governamental do presidente Fernando Henrique Cardoso (1994-2002), tornou-se um prólogo para a Reforma Previdenciária de 2003. Instituiu pontuais modificações na disciplina trabalhista-constitucional, e promoveu intensa mudança no que tange à matéria de seguridade social. Parcela de seu conteúdo seria revogado pela Emenda Constitucional 41, analisada no próximo capítulo.

Logo, pode-se determinar que o fenômeno da reforma do Estados, ocorrida na Sociedade Internacional no transcorrer da década de 1970, relacionada com a ideologia Neoliberal presente nos governos de Ronald Reagan (Estados Unidos da América – 1980 a 1989), Margaret Thatcher (Reino Unido – 1979 a 1990) e em demais países do sistema global, veio a se integrar à política brasileira durante os governos de Fernando Collor de Melo (1990-1992) e, potencialmente, Fernando Henrique Cardoso (1994-2002). Ao propor uma vinculação de determinadas políticas governamentais a métodos de gestão presentes na iniciativa privada, desnatura o clássico modelo do Estado de Bem Estar Social (Welfare State), presente na realidade internacional ao longo do período histórico conhecido como “Guerra Fria” (1947-1991), e cria diversos transtornos socioeconômicos que persistem até os dias atuais e diversos Estados, incluindo o Brasil. Tal fenômeno ocasionou diversas mudanças no Direito Previdenciário nacional, como será visto adiante.


4.ANÁLISE DA EMENDA CONSTITUCIONAL 41/2003

Durante a vigência do período de governo do presidente Luís Inácio da Silva (2002-2010), foi promulgada a emenda constitucional 41, em 19 de dezembro de 2003, a qual promoveu grande modificação na disciplina previdenciária nacional, cognominada de Reforma da Previdência por este fato. A partir deste ponto serão analisados pormenorizadamente os principais dispositivos presentes na supramencionada emenda à Constituição da República Federativa do Brasil, com a respectiva reflexão crítica acerca de seus preceitos modificativos.

Primeiramente, a emenda 41 trata do teto remuneratório dos agentes públicos em todos os níveis do pacto federativo, em modificação ao artigo 37, inciso XI, da Carta Política de Outubro[7], a saber:

“Art. 37. XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos”.

Como hodiernamente se estabelece pela doutrina administrativista, a nomenclatura Funcionário Público não mais é utilizada, denominando-se Agente Público a todo indivíduo que exerce cargo, emprego, ou função pública, estendendo-se tal conceito aos concessionários e permissionários da prática de serviços públicos (porém, não aos estabelecidos em regime de autorização[8]. Vincula-se, pois, o teto das remunerações e subsídios (no caso de agentes políticos e membros da magistratura e conselheiros dos tribunais de contas) ao percebido pelos agentes políticos de maior relevância dentro do ente federativo respectivo (seja aos Ministros do Supremo Tribunal Federal, ao Prefeito, Governador de Estado, Deputados Estaduais e Distritais, e aos Desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados-Membros da Federação), entretanto sempre limitados ao subsídio mensal dos julgadores do Excelso Pretório.

A maior modificação introduzida pela emenda 41 se refere à extinção dos princípios previdenciários da integralidade (ou da totalidade) e da paridade no que tange aos proventos percebidos pelos servidores públicos e às pensões por morte em relação a seus beneficiários, preceptivo este presente na novel redação do artigo 40, §8º da Carta Magna. Em um excêntrico fenômeno na realidade do Direito Constitucional Comparado, mas lamentavelmente comum em nosso ordenamento jurídico, o texto da emenda 41 reformou o texto da emenda 20 (em infeliz figura de linguagem, uma reforma da reforma). Verifique-se abaixo a redação incluída pela emenda 20, e a posterior modificação trazida pela emenda 41:

“Art. 40. §8º - Observado o disposto no art. 37, XI, os proventos de aposentadoria e as pensões serão revistos na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, sendo também estendidos aos aposentados e aos pensionistas quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão, na forma da lei” (Texto Incluído pela Emenda Constitucional 20/1998).

“Art. 40. §8º - É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme critérios estabelecidos em lei” (Redação dada pela Emenda Constitucional 41/2003)

Com supedâneo nos ensinamentos do constitucionalista Luís Roberto Barroso, a reforma pela qual passou o sistema previdenciário nacional é reflexo de uma crise estrutural, iniciada pela ascensão das novas ideologias políticas mencionadas no capítulo anterior deste estudo. Em excerto de artigo científico de sua autoria:

“Além dos fatores de alcance mundial, há um conjunto de circunstâncias nacionais, que vão do texto constitucional a problemas gerenciais, que tem agravado a crise da Previdência Social. Alguns traduzem mudanças positivas que, no entanto, oneram o sistema previdenciário. Outros são conjunturais, como o elevado índice de informalidade no mercado de trabalho, que compromete a arrecadação para o sistema geral. A seguir se procede a um levantamento sumário das causas das dificuldades vividas pelo sistema, algumas já sanadas e outras que precisam ser enfrentadas pelo modelo novo:

1.Inexistência de contribuição dos servidores civis para a aposentadoria, como regra, até o advento da emenda constitucional nº 3, de 1993 (embora houvesse contribuição para pensões). Ainda hoje, os militares não contribuem para a aposentadoria, mas somente para pensões e assistência médica;

2.Transferência para o regime jurídico único e, consequentemente, para o regime previdenciário próprio dos servidores públicos, da imensa massa de empregados públicos regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), operada por força do disposto no art. 39 da Constituição de 1988 e na lei 8112/90;

3.Ausência de idade mínima para a aposentadoria voluntária, dando margem, até a emenda constitucional nº 20, de 1998, a uma grande quantidade de aposentadorias precoces, onerando o sistema por muito mais tempo do que seria razoável;

4.Disfunções existentes até a EC nº 20/98, como ausência de prazos mínimos de permanência no sistema próprio, bem como de prazos mínimos de contribuição, além de figuras equívocas como a contagem de “tempo ficto”, a exemplo de férias e licenças computadas em dobro, período de estudos em escolas técnicas, tudo sem custeio adequado ou estudos atuariais;

5.Reconhecimento da ilegitimidade constitucional da imposição de idade máxima para a participação em concursos públicos: a orientação, respaldada pelo Supremo Tribunal Federal, que é correta e desejável, propiciou o ingresso, no regime previdenciário próprio, muito mais oneroso para o Poder Público, de pessoas que haviam contribuído tendo por base as regras do regime geral, onde não há nem integralidade de proventos nem paridade entre ativos e inativos;

6.Expressiva redução, desde 1990, do número de servidores públicos, inclusive pelas restrições à realização de novos concursos, com a consequente diminuição do número de contribuintes do sistema próprio;

7.Fatores políticos e problemas gerenciais, como a concessão de benefícios sem fonte de custeio e previsão orçamentária, deficiência nos mecanismos de controle, desvios de recursos, dentre outras vicissitudes ligadas ao estágio civilizatório do país “[9].

Realizado este breve panorama geral acerca da realidade existente antes da reforma da Previdência Social no Brasil, personificada pela formulação da emenda 41, em 2003, e do conteúdo de seus preceitos de maior monta para a produção deste trabalho acadêmico, passa-se no próximo capítulo a analisar os principais reflexos da supracitada norma após o início de sua vigência. Notadamente, serão analisados os dispositivos de transição para o novo modelo (e a influência da posterior emenda constitucional 47/2005, o que certamente é de grande relevância para o presente estudo.


5.REFLEXOS DA REFORMA PREVIDENCIÁRIA NO BRASIL

Por óbvio que relevantíssimos se constituíram os reflexos da emenda constitucional 41 no ordenamento previdenciário brasileiro. Sua formulação marca o estabelecimento de um novo período na história da seguridade social pátria, em que a ideologia liberal associa-se com o dirigismo do Estado, proporcionando novos modelos e um contemporâneo paradigma em matéria de Previdência Social. Diz-se que fora uma consagração, haja vista que a reforma previdenciária finca suas raízes em iniciativas mais antigas, até mesmo que as das emendas constitucionais 19 e 20, em 1998. Trata-se de processo iniciado com a centralização dos Institutos de Previdência; perpassou pela unificação em torno da autarquia Instituto Nacional do Seguro Social (INSS); e ironicamente seu término promove nova descentralização, ao instituir em nova redação do artigo 40, §15, a criação de entidades fechadas de previdência complementar[10].

A questão de maior relevo no que se refere à reforma previdenciária brasileira é a das denominadas regras de transição. Trata-se de preceptivos destinados a organizar o regime jurídico dos indivíduos alcançados pelo novo sistema, porém privilegiados por direitos adquiridos do regime anterior. Como supramencionado, o sistema previdenciário até a ascensão da emenda 41 contemplava a observância dos princípios da integralidade e da paridade na distribuição dos proventos de aposentadoria aos servidores públicos dos entes federativos que compõem a República. Muito se discutiu acerca da situação jurídica dos que ingressaram, mediante concurso público, e gozavam do direito adquirido a estes dois princípios inseridos em sua eventual aposentação. Serão analisados no presente capítulo destes estudos as principais regras de transição em matéria do regime previdenciário posterior à reforma consagrada pela emenda constitucional 41. Lembre-se sempre que, para os servidores públicos em exercício de suas atividades após a vigência da modificação constitucional em comento, seus proventos de aposentadoria terão como valor máximo o maior valor presente no regime geral de previdência social, a saber, R$ 2400,00, reajustáveis a partir da promulgação da citada emenda (2003).

5.1 – Regras de Transição e Entendimentos Doutrinários

Ao ser promulgada a 41ª modificação de nosso Supremo Código, os estudiosos administrativistas dedicaram-se a realizar comentários sobre a emenda produzida no transcorrer do governo de Luís Inácio da Silva. A própria emenda descreve algumas regras de transição em seu corpo, como as presentes na modificação do art. 40, §§ 17 a 20 da Constituição; e nos art. 2º, 3º e 6º da própria emenda 41[11].

Certamente o sistema previdenciário implantado após a emenda 41/2003 foi deveras mais gravoso para os servidores do que o antes vigente (emenda 20/1998), pois exigiu idade mínima e período mínimo de contribuição para se perceber aposentadoria cujo teto era o do regime geral de previdência social. Para tanto, em seu art. 3º, §§ 2º e 3º, a comentada emenda assegura o direito adquirido aos que já haviam completado os requisitos para aposentação, vigendo para estes os princípios da integralidade e da paridade.

Além disso, a emenda 41 previu uma espécie de aposentadoria voluntária com proventos proporcionais (§6º de seu art. 2º), de forma semelhante ao estabelecido na emenda constitucional 20/1998, a fim de proporcionar chance aos que quisessem se evadir do novo corpo normativo.

O dispositivo cujos reflexos foram mais duramente criticados pela doutrina foi o art. 4º da emenda 41, ao estabelecer contribuição previdenciária por parte dos que já se encontravam inativos. Vale-se nesta argumentação das sábias lições de Celso Antônio Bandeira de Melo:

“O art. 4º da emenda, fazendo praça de escandaloso desprezo pelo Direito, grosseira, estabeleceu que os inativos e os pensionistas que ‘já estavam fruindo dos correspondentes benefícios quando do advento dela’, tanto como os abrangidos pelo art. 3º (isto é, os que já haviam cumprido com base em legislação precedente requisitos para lhes obter a concessão), ficam abrangidos pela obrigação da contribuição previdenciária e em percentual igual ao estabelecido para os titulares de cargos públicos. Sem embargo, dispôs que dita contribuição incidirá apenas sobre a parcela de proventos e pensões que supere 50% do limite máximo de benefícios do regime geral da previdência social, caso sejam vinculados às órbitas estaduais, distritais e municipais, e 60%, se vinculados à União (parágrafo único, I e II).

Sem embargo do escandaloso e teratológico respaldo que lhe deu o Supremo Tribunal Federal, não é difícil perceber que a cobrança de contribuição previdenciária dos que já eram inativos e pensionistas agride à força aberta o ato jurídico perfeito e o direito adquirido, porquanto se propõe – como é solarmente evidente – a atingir situações conclusas “[12].

5.2 – Notas Conclusivas

Pode-se considerar que a reforma previdenciária no Brasil produziu reflexos mais acentuados que em outros Estados componentes do sistema global, principalmente pelo fato de que o funcionalismo público nacional sempre gozou de privilégios variados em relação aos demais componentes do mercado de trabalho. O regime único estabelecido para seus integrantes (denominado estatutário, e assentado na Lei Ordinária 8.112, promulgada em 11 de dezembro de 1990) certamente restou abalado no que tange a fase da aposentadoria dos servidores públicos, estejam instalados em cargos, empregos ou funções. Embora a emenda constitucional 47, em seu artigo 3º[13], tenha estabelecido novas regras de transição, a derradeira verdade é a de que o quadro de servidores sofreu significativa perda de suas prerrogativas com a ascensão da comentada reforma, retrato dos novos parâmetros de gestão pública e administração estatal.


6.ANÁLISE JURISPRUDENCIAL

Pretende-se nesta altura do opúsculo científico analisar, brevemente, o entendimento pretoriano acerca dos preceitos estabelecidos nas reformas constitucionais que caracterizam a reforma da Previdência Social brasileira. Não se pretende delongar por demais, haja vista que o posicionamento adotado nestes estudos norteia-se pelo caráter precípuo de nosso sistema jurídico romano-germânico (denominado Civil Law por doutrina pátria e estrangeira). Logo, não se compactua com o estudo detido da jurisprudência para se compreender a essência de nosso Direito, embora grande parte dos estudiosos e da comunidade jurídica insista em apoiar-se, na atualidade, em devaneios estabelecidos pelas únicas mentes julgadoras nos tribunais superiores, e a maioria dos exames destinados a carreiras públicas dedique como foco o mecanizado método de memorização de entendimentos jurisprudenciais sumulados.

A opinião da máxima instância interna no Brasil, o Supremo Tribunal Federal, converge para a eficácia dos preceptivos dispostos nas emendas constitucionais 20/1998, 41/2003 e 47/2005, como se vê no supramencionado excerto doutrinário ,de autoria do ilustre Celso Antônio Bandeira de Melo, e pelo disposto no Agravo de Instrumento 793893/RS, da relatoria do ministro Celso de Mello, presente nos anexos deste trabalho.

No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, igualmente se nota tendência a ratificar as regras presentes nas emendas constitucionais atinentes à reforma previdenciária brasileira, como se verifica nos Embargos de Declaração em Agravo Regimental presentes no Recurso em Mandado de Segurança 27391/RJ, igualmente presentes em documento anexo. Neste caso, notadamente, verifica-se a aplicação das regras de transição presentes nas modificações constitucionais analisadas.

Por fim, na realidade presente no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por óbvio, se verifica o respeito às decisões emanadas pelos tribunais superiores, quais sejam, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal. Tal é observado na breve análise da Apelação Cível em Reexame Necessário 0003481-53.2006.8.19.0002, na íntegra de seu acórdão.

Logo, verifica-se lamentavelmente a estrita observância aos preceitos estatuídos pela reforma, para duras críticas de grande parte da doutrina.


7.CONCLUSÃO

Após o estabelecimento deste panorama geral acerca do fenômeno internacional da Reforma dos Estados, e suas principais vicissitudes na realidade brasileira, afirmam-se determinadas assertivas acerca das consequências que a reforma previdenciária produziu no âmbito teórico e na prática governamental.

A reforma da previdência social, como exemplo das iniciativas realizadas pelo Estado brasileiro para se adequar aos novos paradigmas estabelecidos pelo ideário do Estado Neoliberal (outros exemplos são os da reforma tributária, trabalhista e política), promoveu novos rumos ao Direito Previdenciário. Ao extinguir a aplicabilidade dos princípios da integralidade e da paridade, institui o modelo previdenciário complementar, realidade já presente em diversos países neoliberais, tais como os Estados Unidos da América do Norte e determinadas soberanias europeias não inscritas no modelo de Bem Estar Social reinante na região nórdica (o Reino Unido estaria inserido nesta realidade).

Igualmente, afirma-se que o quadro dos agentes públicos foi regulamentado no que tange aos valores percebidos por suas atividades, com o teto remuneratório analisado no estudo da emenda constitucional 41. Da mesma forma, as regras de transição permitiram aos servidores públicos que reuniam (grife-se, realmente) as condições necessárias para continuar gozando dos cânones da totalidade e da paridade em seus proventos de aposentadoria, assim como foi disposto aos demais a possibilidade de requerer a aposentação com proventos proporcionais ao tempo de serviço efetivado, de acordo com o disposto legalmente no conjunto das emendas 20, 41 e 47.

Portanto, sob um olhar crítico frente às mudanças estabelecidas pelas emendas constitucionais 20/1998, 41/2003, 47/2007, e mesmo na preliminar análise da emenda 19/1998, pode-se afirmar que os reflexos proporcionados pela Reforma Previdenciária foram gravemente prejudiciais aos servidores públicos, e conveniente a um Estado que se encontra, durante grande parcela de seu desenvolvimento histórico, submisso aos ditames de países que se arrogaram no decorrer das eras como pretensas ”potências”, em clara violação ao princípio interestatal da isonomia (ao se realizar uma interdisciplinaridade com o Direito Internacional). Necessária a mobilização doutrinária e popular para renovação hermenêutica desta Reforma.


BIBLIOGRAFIA

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BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Editora Saraiva, 2010.

MELO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 27ª Edição. Rio de Janeiro: Editora Malheiros, 2010.

BARROSO, Luís Roberto. Constitucionalidade e Legitimidade da Reforma da Previdência (Ascensão e Queda de um Regime de Erros e Privilégios). Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, nº 20, dezembro, janeiro e fevereiro, 2009, 2010. Disponível na internet: <http://www.direitodoestado.com/revista/RERE-20-DEZEMBRO-2009-LUIS-ROBERTO-BARROSO.pdf>. Acesso em: 17 de Janeiro de 2011.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Consulta Virtual à Jurisprudência. Disponível na Internet: <http://www.stf.jus.br>. Acesso em: 19 de Janeiro de 2011.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Consulta Virtual à Jurisprudência. Disponível na Internet: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em: 19 de Janeiro de 2011.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Consulta Virtual à Jurisprudência. Disponível na Internet: <http://www.tjrj.jus.br>. Acesso em: 19 de Janeiro de 2011.


ANEXOS

AI 793893 / RS - RIO GRANDE DO SULAGRAVO DE INSTRUMENTORelator(a):  Min. CELSO DE MELLOJulgamento: 30/06/2010

Publicação

DJe-148 DIVULG 10/08/2010 PUBLIC 12/08/2010

Partes

AGTE.(S)            : AGAFISP - ASSOCIAÇÃO GAÚCHA DOS FISCAIS DA PREVIDÊNCIA

ADV.(A/S)           : MIRIAM WINTER E OUTRO(A/S)

AGDO.(A/S)          : UNIÃO

ADV.(A/S)           : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

AGDO.(A/S)          : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

PROC.(A/S)(ES)      : PROCURADOR-GERAL FEDERAL

Decisão

DECISÃO: A contribuição previdenciária incidente sobre os proventos da inatividade dos servidores públicos e sobre o valor das pensões por estes deixadas a seus dependentes, embora exigível no período que antecedeu a EC nº 20/1998 (RTJ 164/98-99 – RTJ 166/890), veio a perder, no entanto, com o advento da referida Emenda, o suporte normativo que legitimava, constitucionalmente, até então, a instituição e cobrança dessa exação de caráter tributário (RTJ 181/73-79). Cumpre reconhecer, desse modo, que se revela juridicamente possível, sob uma perspectiva de ordem constitucional, exigir-se, de pensionistas e de servidores públicos inativos, o recolhimento da contribuição previdenciária em questão, desde que a respectiva cobrança refira-se a período anterior ao advento da EC nº 20/1998 (RTJ 186/353, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – RE 357.652-AgR/MG, Rel. Min. ELLEN GRACIE – RE 372.356-AgR/MG, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – RE 372.429-AgR/MG, Rel. Min. ELLEN GRACIE – RE 376.500-AgR/MG, Rel. Min. ELLEN GRACIE), pois, a partir da promulgação dessa emenda à Constituição da República, tornou-se incabível, quer no plano da União Federal, quer no âmbito dos Estados-membros e do Distrito Federal, quer, ainda, na esfera dos Municípios, a própria instituição de tal modalidade de contribuição especial:

“Revela-se constitucionalmente possível exigir-se, de pensionistas e inativos, o recolhimento de contribuição previdenciária, desde que a respectiva cobrança refira-se a período anterior ao advento da EC 20/98, pois, a partir da promulgação dessa emenda à Constituição da República – e quanto a inativos e pensionistas -, tornou-se juridicamente incabível, quer no plano da União Federal, quer no âmbito dos Estados-membros e do Distrito Federal, quer, ainda, na esfera dos Municípios, a própria instituição de tal modalidade de contribuição especial. Precedentes. Se o Poder Público, no entanto, mesmo após o advento da EC 20/98, continuar a exigir, dos respectivos servidores inativos e pensionistas, o correspondente pagamento da contribuição previdenciária, sujeitar-se-á à obrigação de devolver-lhes os valores por eles eventualmente já recolhidos. Precedentes. (...).”

(RTJ 189/758, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Torna-se relevante observar, no entanto, que essa orientação jurisprudencial deixou de subsistir após a promulgação da EC nº 41/2003, cujo art. 4º, “caput” – que teve sua constitucionalidade confirmada, contra o meu voto, pelo Plenário desta Suprema

Corte, quando do julgamento da ADI 3.105/DF (RTJ 193/137-138) – possibilita, agora, a incidência de contribuição previdenciária sobre servidores públicos inativos e pensionistas. Conclui-se, desse modo, considerada a própria jurisprudência prevalecente no Supremo Tribunal Federal, que se revela legítima a exigibilidade da contribuição previdenciária de servidores inativos e pensionistas, desde que em período anterior ao advento da EC nº 20/1998 ou em momento posterior à promulgação da EC nº 41/2003, vedada tal exigibilidade, no entanto, apenas no intervalo de tempo que se registrou entre a vigência da EC nº 20/1998 e a edição da EC nº 41/2003:

“(...) CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE PROVENTOS DE INATIVOS E PENSIONISTAS. ILEGITIMIDADE APÓS A EMENDA CONSTITUCIONAL 20/1998.

É inconstitucional a cobrança, após o advento da EC 20/1998, de contribuição previdenciária sobre os proventos de inativos e pensionistas, conforme jurisprudência firmada neste Supremo Tribunal Federal. Essa orientação aplica-se até o advento da Emenda Constitucional 41/2003, cujo art. 4º foi declarado constitucional por esta Corte, no julgamento das ADIs 3105 e 3128. Agravo regimental a que se nega provimento.”

(AI 536.407-AgR/MG, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA - grifei)

“1. Contribuição previdenciária prevista na Lei  7.672/82 do Estado do Rio Grande do Sul. Incidência sobre proventos e pensões de servidores públicos e pensionistas. Ilegitimidade a partir da Emenda Constitucional nº 20/98, conforme reiterados julgados desta Corte.

2. Importante ressaltar que essa orientação aplica-se até o advento da Emenda Constitucional nº 41/03, cujo art. 4º, caput - considerado constitucional por esta Suprema Corte no julgamento das ADIs 3105 e 3128 - que permitiu a cobrança de contribuição previdenciária dos servidores inativos e pensionistas.

3. Agravo regimental improvido.”

(AI 441.849-AgR/RS, Rel. Min. ELLEN GRACIE - grifei)

O exame da presente causa evidencia que o acórdão impugnado em sede recursal extraordinária ajusta-se à diretriz jurisprudencial que esta Suprema Corte firmou na matéria em referência. Sendo assim, e considerando as razões expostas, nego provimento ao presente agravo de instrumento, eis que se revela inviável o recurso extraordinário a que ele se refere.

Publique-se.

Brasília, 30 de junho de 2010.

Ministro CELSO DE MELLO

Relator: EDcl no AgRg no RMS 27391 / RJEMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA2008/0164725-2

Relator(a): Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) (8175)

Órgão Julgador:T6 - SEXTA TURMA

Data do Julgamento:27/04/2010

Data da Publicação/Fonte:DJe 17/05/2010

Ementa:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. GRATIFICAÇÃO INCORPORADA À REMUNERAÇÃO POR DECISÃO JUDICIAL. TETO REMUNERATÓRIO. SUBSÍDIO DO GOVERNADOR. ALTERAÇÃO DO SUBSÍDIO POR LEI ESTADUAL SUPERVENIENTE. DIREITO ADQUIRIDO. ATO JURÍDICO PERFEITO. IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. EMENDA CONSTITUCIONAL 41/2003. JURISPRUDÊNCIA DO STJ.

1. Com o advento da Emenda Constitucional nº 41/2003, que deu nova redação ao inciso XI do art. 37 da CR/88, e, posteriormente, com a Emenda Constitucional nº 47/2005, com efeitos retroativos à EC 41/03, o impetrante teve a partir do seu contracheque de setembro de 2007, redutibilidade na remuneração com o desconto de R$ 8.763,13.

2. O Tribunal a quo denegou a segurança, afirmando que a garantia da irredutibilidade da remuneração dos servidores, do direito adquirido não assegura o direito de continuar percebendo quantia que ultrapassa o teto remuneratório disposto no art. 37, XI, da CR/88.

3.  Cinge-se a questão acerca da caracterização do direito adquirido de servidor público estadual em continuar percebendo a integralidade de sua remuneração em face da nova ordem constitucional estipulada com base na Emenda Constitucional 41/2003.

4. A jurisprudência do STJ, em sintonia com o Supremo Tribunal Federal tem entendimento firmado de que não existe direito adquirido ao recebimento de remuneração além do teto estabelecido pela Emenda n.º 41/2003, não prevalecendo a garantia da irredutibilidade de vencimentos em face da nova ordem constitucional, de forma absoluta.

5. A jurisprudência do STJ e do STF reforçam que após a entrada em vigor da Emenda Constitucional n.º 41/2003, não há mais falar em direito líquido e certo à exclusão das vantagens pessoais no cálculo do teto constitucional remuneratório.

6. A coisa julgada, também, deverá ser relativizada quando tratar de vantagem reconhecida ao servidor, que somada à remuneração extrapole o teto constitucional.

7. Embargos de declaração acolhidos para sanar omissão, sem injunção no resultado.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, acolher os embargos de declaração apenas para suprir a omissão apontada, sem injunção no resultado, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE) e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Og Fernandes.

Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.

TJRJ

0003481-53.2006.8.19.0002 - APELACAO / REEXAME NECESSARIO - 2ª Ementa

DES. JORGE LUIZ HABIB - Julgamento: 13/01/2011 - DECIMA OITAVA CAMARA CIVEL

Íntegra do Acórdão

Vez que preenchidos todos os requisitos para tal, o servidor tem o direito adquirido a tê-las incorporados aos seus vencimentos ou proventos, conforme o caso. Sepultou a questão a jurisprudência emanada do Supremo Tribunal Federal, em decisão no Mandado de Segurança n. 24.875 impetrado por ex- Ministros do STF, que exclui do cômputo do teto remuneratório as vantagens de natureza pessoal, os quais estarão sujeitos à absorção por futuros aumentos do subsídio.

“EMENTA: I. MINISTROS APOSENTADOS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: PROVENTOS (SUBSÍDIOS): TETO REMUNERATÓRIO: PRETENSÃO DE IMUNIDADE À INCIDÊNCIA DO TETO SOBRE O ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO (ATS), NO PERCENTUAL MÁXIMO DE 35% E SOBRE O ACRÉSCIMO DE 20% A QUE SE REFERE O ART. 184, III, DA LEI 1711/52, COMBINADO COM O ART. 250 DA L. 8.112/90: MANDADO DE SEGURANÇA DEFERIDO, EM PARTE...V. MAGISTRADOS: ACRÉSCIMO DE 20% SOBRE OS PROVENTOS DA APOSENTADORIA (ART. 184, III, DA L. 1.711/52, C/C O ART. 250 DA L. 8.112/90) E O TETO CONSTITUCIONAL APÓS A EC 41/2003: GARANTIA CONSTITUCIONAL DE IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS: INTANGIBILIDADE. 1. Não obstante cuidar-se de vantagem que não substantiva direito adquirido de estatura constitucional, razão por que, após a EC 41/2003, não seria possível assegurar sua percepção indefinida no tempo, fora ou além do TETO a todos submetido, aos impetrantes, porque magistrados, a Constituição assegurou diretamente o direito à irredutibilidade de vencimentos - modalidade qualificada de direito adquirido, oponível às emendas constitucionais mesmas... 3. Os impetrantes - sob o pálio da garantia da irredutibilidade de vencimentos -, têm direito a continuar percebendo o acréscimo de 20% sobre os proventos, até que seu montante seja absorvido pelo subsídio fixado em lei para o Ministro do Supremo Tribunal Federal...(MS 24.875-1-DF - Tribunal Pleno - Relator: Ministro Sepúlveda Pertence)”

Por tais motivos, com fundamento no art. 557, caput, do CPC, nego seguimento ao recurso, mantendo íntegra a douta sentença monocrática em reexame necessário.”

Correta, portanto, a decisão guerreada.

Por todo o exposto, nega-se provimento ao recurso.


Notas

[1] Cf. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 31ª Edição. Rio de Janeiro: Editora Malheiros, 2008.

[2] O tabuleiro de princípios analisado é desenvolvido por Miguel Horvath Junior, Doutor em Direito Previdenciário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Cf. HORVATH JUNIOR, Miguel. Direito Previdenciário. 6ª Edição. São Paulo: Editora Quartier Latin do Brasil, 2006.

[3] “Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo” (in fine).

[4] Cf. JÚNIOR, Lier Pires Ferreira; GUANABARA, Ricardo; JORGE, Vladimyr Lombardo. O Estado na Ordem Jurídica Internacional. In: GUERRA, Sidney (Org.). Tratado de Direito Internacional. Rio de Janeiro: Editora Freitas Bastos, 2008.

[5] Neste sentido, em brilhante tese de refutação à doutrina neoconstitucionalista, Cf. BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Editora Saraiva, 2010.

[6] Cf. MELO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 27ª Edição. Rio de Janeiro: Editora Malheiros, 2010.

[7] Nomenclatura utilizada por Carlos Ayres Brito em função de Ministro do Supremo Tribunal Federal. Cf. RE 418.852, Rel. Min. Carlos Britto, julgamento em 6-12-2005, Primeira Turma, DJ de 10-3-2006.

[8] Cf. MELO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 27ª Edição. Rio de Janeiro: Editora Malheiros, 2010.

[9] BARROSO, Luís Roberto. Constitucionalidade e Legitimidade da Reforma da Previdência (Ascensão e Queda de um Regime de Erros e Privilégios). Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, nº 20, dezembro, janeiro e fevereiro, 2009, 2010. Disponível na internet: <http://www.direitodoestado.com/revista/RERE-20-DEZEMBRO-2009-LUIS-ROBERTO-BARROSO.pdf>. Acesso em: 17 de Janeiro de 2011.

[10] “Art. 40. §15 - O regime de previdência complementar de que trata o § 14 será instituído por lei de iniciativa do respectivo Poder Executivo, observado o disposto no art. 202 e seus parágrafos, no que couber, por intermédio de entidades fechadas de previdência complementar, de natureza pública, que oferecerão aos respectivos participantes planos de benefícios somente na modalidade de contribuição definida”.

[11] Denota-se neste ponto a relevância do detido estudo da própria emenda constitucional como norma jurídica autônoma, e não como mero adendo modificativo ao texto constitucional. Para todos os efeitos, considera-se que o texto presente unicamente nas diversas emendas possui força constitucional, e similar hierarquia em relação às demais normas presentes na Constituição da República.

[12] MELO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 27ª Edição. Rio de Janeiro: Editora Malheiros, 2010, p. 301.

[13] Transcreve-se aqui o teor do dispositivo: “Art. 3º - Ressalvado o direito de opção à aposentadoria pelas normas estabelecidas pelo art. 40 da Constituição Federal ou pelas regras estabelecidas pelos artigos 2º e 6º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, o servidor da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que tenha ingressado no serviço público até 16 de dezembro de 1998 poderá aposentar-se com proventos integrais, desde que preencha, cumulativamente, as seguintes condições: I – trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher; II – vinte e cinco anos de efetivo exercício no serviço público, quinze anos de carreira e cinco anos no cargo em que se der a aposentadoria; III – idade mínima resultante da redução, relativamente aos limites do art. 40, § 1º, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, de um ano de idade para cada ano de contribuição que exceder a condição prevista no inciso I do caput deste artigo. Parágrafo único. Aplica-se ao valor dos proventos de aposentadorias concedidas com base neste artigo o disposto no art. 7º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, observando-se igual critério de revisão às pensões derivadas dos proventos de servidores falecidos que tenham se aposentado em conformidade com este artigo”.


Autor

  • Divo Augusto Cavadas

    Divo Augusto Pereira Alexandre Cavadas é Advogado e Professor de Direito. Procurador do Município de Goiânia (GO). Doutorando em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo (FADISP). Mestre em História pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC/GO). Especialista em Direito Penal e Filosofia. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ). Realizou estudos junto à Universidad de Salamanca (Espanha), Universitá di Siena (Itália), dentre outras instituições. Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB). Diplomado pela Câmara Municipal de Goiânia e Comendador pela Associação Brasileira de Liderança, por serviços prestados à sociedade.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAVADAS, Divo Augusto. Reforma previdenciária na República Federativa do Brasil. Aspectos jurídicos elementares. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3173, 9 mar. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21250. Acesso em: 6 maio 2024.