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Responsabilidade civil do Estado e de particulares em acidentes de trânsito provocados por animais.

Análise da doutrina da responsabilidade civil e apanhado da jurisprudência nacional

Responsabilidade civil do Estado e de particulares em acidentes de trânsito provocados por animais. Análise da doutrina da responsabilidade civil e apanhado da jurisprudência nacional

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No que concerne a acidentes de trânsito causados por animais sem dono, caberia ao Estado, em tese, a prova de que agiu diligentemente no sentido de evitar a presença do animal na pista.

Resumo:

No presente artigo objetivamos estudar e discutir um tema por demais observado no cotidiano dos cidadãos em geral, ao menos no Brasil, que é o de, eventualmente, envolver-se em acidente de trânsito causado por animais soltos na pista de rolamento dos veículos. Inobstante relevante juridicamente, é da cultura geral tratar o fato com viés de mera casualidade, mormente quando acontecido nas auto-estradas. Com efeito, é comum que o cidadão comente, até em tom aventureiro, que, durante uma viagem, atropelou um animal doméstico de pequeno porte, ou colidiu com um bicho maior, tendo prejuízos materiais em seu veículo. Tal fato, para o Direito, contudo, acoberta-se de juridicidade e atrai normas legais atinentes à responsabilidade civil e ao dever de reparar o dano. Ainda quando motivado por animais aparentemente não sujeitos à propriedade de determinado particular, a responsabilidade civil existe, podendo aquele prejudicado com o sinistro acionar as vias processuais adequadas à reparação do prejuízo. Neste estudo, investigamos, à luz da doutrina e da jurisprudência brasileiras, como o Estado ou o particular podem ser alcançados pelo instituto da responsabilidade civil em face de acidentes de trânsito causados ou motivados por ação ou omissão suas, enfocando o entendimento dos tribunais brasileiros sobre a questão. A matéria debatida no presente estudo foi tema da tese de graduação deste autor, em monografia que alcançou a nota máxima para a obtenção do título de bacharel em Direito pela Universidade Estadual do Piauí, e representa uma versão simplificada para adequação à modalidade de artigo, para fins de publicação nesta importante revista eletrônica nacional.

Palavras-chave: Responsabilidade civil. Estado. Particular. Animal na pista. Acidente de trânsito. Responsabilidade subjetiva. Responsabilidade objetiva.


1. Introdução – abordagem histórica do tema da responsabilidade civil

Apesar de muito antigo, o tema da responsabilidade civil desperta constantemente o interesse dos pesquisadores. Inobstante vasta a fonte bibliográfica já existente sobre o assunto, a evolução doutrinária do instituto ainda continua nos dias atuais, o que justifica a constante renovação da literatura sobre o assunto, bem como explica a coexistência de diversas teses, umas muito antigas e outras mais recentes, para explicar o mesmo tema. Em verdade, pode-se dizer que as modalidades de responsabilidade hoje observadas surgiram há milênios, modificando-se apenas as premissas adotadas para fundamentá-las.

Veja-se o exemplo da responsabilidade civil na modalidade objetiva. A responsabilidade objetiva implica a responsabilização do agente, ou daquele que por este for ou estiver responsável, independentemente de culpa. Diz-se ser uma modalidade nova, inovadora. A responsabilidade objetiva, porém, existe desde o berço da civilização, quando ainda se observava a primitiva e instintiva manifestação da natureza humana da lex talionis. O Código de Hamurábi, por exemplo, escrito em 1780 a.C. – há 38 séculos, portanto – era todo ele lastreado no sistema de ação e reação em que implica a lei do talião: “olho por olho, dente por dente”. Dispositivos jurídicos do antigo “código”, como os artigos (chamados de “leis”) n. 196, 197 e 200, expressam bem a filosofia adotada: “Se um homem arrancar o olho de outro homem, o olho do primeiro deverá ser arrancado”; “Se um homem quebrar o osso de outro homem, o primeiro terá também seu osso quebrado”; “Se alguém parte os dentes de um outro, de igual condição, deverá ter partidos os seus dentes”. Havia um denominado “castigo-espelho”, que não levava em consideração qualquer alusão à culpa ou dolo do agente. Ocorrendo o dano previsto em lei (no exemplo dado, a perda do olho ou a do dente), o agente seria o responsável. Ponto. Ora, isso nada mais é que responsabilidade objetiva.

Observa-se, pois, que o tema da responsabilidade civil, por si só, não guarda conotação de novidade. O próprio Hammurabi já previa, na rocha talhada com suas 282 (duzentos e oitenta e duas) leis (ou artigos), em 3600 (três mil e seiscentas) linhas, hipóteses variadas de responsabilidade civil, que nossos códigos, séculos e séculos depois, passaram a prever ora como responsabilidade subjetiva, ora como objetiva – de que é exemplo, quanto a esta última, a responsabilização pelo fato do animal, objeto deste estudo (“Se o boi de alguém dá chifradas [...] e investe contra um homem e o mata, seu dono deverá pagar uma meia mina”; “lei” n. 251). O referido código previa ainda hipóteses de exclusão de responsabilidade, consistentes no caso fortuito e força maior (“Se um homem arrendar sua terra por um preço fixo, e receber o preço do aluguel, mas o mau tempo prejudicar a colheita, o prejuízo irá cair sobre quem trabalhou o solo”; “lei” n. 45).

O que houve, portanto, com o avanço da ciência jurídica, não foi a criação ou descoberta de um tema novo, mas o aperfeiçoamento de algo inerente à própria natureza do homem, refletida no instinto de reparação, de revide, de castigo daquele que lhe causou um prejuízo. A responsabilidade continuou a existir, modificadas apenas suas teses fundamentadoras, que terminaram, inclusive, por aumentar o campo de abrangência do instituto da responsabilidade para outras áreas do Direito, surgindo, além da responsabilidade penal e de sua evolução para a responsabilidade civil, as espécie de responsabilidade administrativa, trabalhista, consumerista, etc.

As normas das civilizações primitivas configuram o primeiro estágio evolutivo da responsabilidade. Já a referência mais citada pelos autores a balizar o segundo estágio na evolução histórica do instituto é a Lei das XII Tábuas (450 a.C.), sendo que alguns autores colocam, para esse efeito, o Direito Romano, modo geral.

Historicamente, Roma passou por três fases: Monarquia, República e Império.  A primeira fase, segundo GAVAZZONI (2002, pp. 69-76), resultou na criação de uma versão ocidental do alfabeto grego, aperfeiçoando-se a língua originariamente falada na região do Lácio, entorno de Roma, o que viria depois a se tornar o latim. Afora este fato, a história de Roma, nessa primeira fase, desinteressa à ciência jurídica.

O Direito Romano surge somente na segunda fase, após os primeiros cinquenta anos republicanos, com a Lei das XII Tábuas, que, ao trazer normas relativamente desenvolvidas para a época (lastreadas em estudos nas leis gregas de Sólon, sendo a Grécia notória e culturalmente mais desenvolvida que Roma), sobre várias matérias (direito de crédito, direito de propriedade e posse, casamento, pátrio poder, herança, vizinhança, etc.), marcou toda a história jurídica da humanidade, dali por diante.

Há, pois, uma nítida evolução jurídica entre a Lei das XII Tábuas e o primitivo Código de Hamurábi, mas, no que tange à responsabilidade civil, a lei de talião ainda está presente, conforme Tábua VII, art. 11, já colacionada no texto introdutório a este capítulo do presente estudo (“Se alguém ferir a outrem, que sofra a pena de talião, salvo se houver acordo”). Em verdade, o grande diferencial da Lei das XII Tábuas para o antigo Código de Hamurábi é que, aqui, embora a pena de talião estivesse prevista, ela poderia deixar de ser aplicada, caso houvesse acordo entre as partes. É por isso que a lei romana, no que concerne ao instituto da responsabilidade civil, representa um estágio mais avançado.

Indene de dúvidas, pois, que a lei romana, além de marcar o surgimento do Direito Romano, configurou uma evolução histórica do instituto da responsabilidade que, inclusive, passou a ser aplicada no âmbito meramente cível, muito embora os romanos ainda não detivessem consciência dessa divisão, pois tudo era considerado como delito, desde o corte não autorizado de galhos da árvore de um vizinho ao assassinato de um escravo. Conquanto não conscientes da natureza jurídica diversa das várias espécies de delitos, os romanos previram a principal consequencia jurídica da responsabilidade civil, que é a reparação do dano, ainda que não se tivesse uma noção de teoria ou princípio da responsabilidade civil que regulamentasse a generalidade dos casos.

Quase duzentos anos depois, mas ainda na fase republicana da história romana, exsurgiu a Lei Aquília (286 a.C). Embora punisse apenas os atos intrinsecamente ilícitos – isto é, aqueles que, como explica FIUZA (2004, pp. 686-7), por sua própria natureza, ainda que tomados isoladamente, se depreende serem ilícitos, como matar alguém – não abrangendo os atos de mero abuso de direito, a Lei Aquília é considerada a primeira lei a tratar especificamente sobre o instituto da responsabilidade civil e, por isso, é seu terceiro estágio de evolução.

A partir da Lei Aquília, surgiu uma verdadeira teoria da responsabilidade civil baseada no seguinte fundamento: de qualquer ato danoso deveria sobrevir a reparação pecuniária, com base no valor que a coisa danificada teria nos trinta dias anteriores ao dano. Aparecia a noção de indenização, de reparação do dano. Sobre a Lei Aquília, diz TZIRULNIK (artigo cit.):

A lei Aquília não se limitou a especificar melhor os atos ilícitos, mas substituiu as penas fixadas, editadas por certas leis anteriores, pela reparação pecuniária do dano causado, tendo em vista o valor da coisa durante os 30 dias anteriores ao delito e atendendo, a princípio, ao valor venal; mais tarde, estendeu-se o dano ao valor relativo, por influência da jurisprudência, de sorte que a reparação podia ser superior ao dano realmente sofrido, se a coisa diminuísse de valor, no caso prefixado.

Surgiu, com a Lei Aquília, o esboço da ação indenizatória cível. Não se cuidava mais de aplicar a medida legal prevista (corporal ou pecuniária) para um dano eminentemente civil, no bojo de uma ação penal. Não havia mais talião, escravidão do agente ou sujeição a uma pena em dinheiro prefixada em lei, para a generalidade das ocorrências. O autor do dano agora deveria ressarcir a vítima com exatidão, lastreado no valor da coisa danificada. Além disso, foi com a Lei Aquília que apareceu, pela primeira vez, para efeito de apuração da responsabilidade, o elemento culpa. Não é, em absoluto, que tal elemento estivesse previsto expressamente no bojo da lei, mas estava ali, implicitamente presente, extraível da interpretação de seu texto; tese que a jurisprudência da época logo tratou de solidificar.

A Lei Aquília trouxe uma perspectiva totalmente nova, na medida em que carreou o termo “ato ilícito”. A partir dela, seria imperioso não apenas identificar o autor do dano, mas perquirir as características ou circunstâncias do ato praticado, dentre as quais a vontade do agente. Se o ato se concretizasse como ilícito, partindo da noção de que seria ilícito aquele considerado intrinsecamente como tal, caberia ao agente ressarcir o prejuízo da vítima.

Não podemos olvidar de que houve em torno da lei toda uma construção jurisprudencial romana. A teoria não foi prevista pelos legisladores; foi extraída da norma pelos magistrados. Entrementes, a nova lei indiscutivelmente teria introduzido na ciência jurídica o elemento da culpa subjetiva como requisito essencial ao direito da vítima a ter ressarcido o prejuízo sofrido. A Lei Aquília revolucionou a teoria da responsabilização civil sem contrato, ainda que os romanos mal tivessem consciência disso naquele momento, e é em face dela que se justifica a sinonímia até hoje empregada pela doutrina à responsabilidade extracontratual ou delitual (ex delictu) – responsabilidade aquiliana – em contraponto à responsabilidade negocial ou contratual (ex contractu).

Prosseguindo na análise histórica, verificou-se que, na fase do Império, o Direito Romano se desenvolveu. Quatrocentos, quinhentos anos depois da edição da Lei Aquília, a jurisprudência fazia-lhe referência como nunca, tendo aperfeiçoado a teoria da responsabilização. Ulpiano (150-228), grande jurista romano, elevou a noção da culpa a patamares extremos, sendo seu o brocardo que se popularizou: in lege Aquilia et levissima culpa venit (“sob a lei  Aquília, a mais leve culpa deve ser considerada”). Finalmente, no ano de 527, ascendeu ao poder Justiniano I, que tinha grande interesse na preservação da cultura romana, especialmente a jurídica, fazendo publicar, entre os anos de 529 a 534, os livros do Corpus Iuris Civilis Romani; obra que imortalizou e preservou para as gerações o Direito Romano.

Vistos estes três estágios (pena de talião, com o Código de Hamurábi; possibilidade de acordo, na Lei das XII Tábuas; e o surgimento da noção de culpa, com a Lei Aquília), a doutrina em geral encerra aqui a evolução histórica do instituto. Os diplomas que se seguiram, por mais importantes que fossem, no que concernem à responsabilidade civil apenas teriam aperfeiçoado o tema, sem, no entanto, revolucioná-lo, modificá-lo profundamente. Foi o caso do Code Civil des Français, ou Código Civil dos Franceses, outorgado por Napoleão Bonaparte em 21 de março de 1804. O código civil francês adotou apuradamente a teoria da responsabilidade civil fundada na culpa do agente, tornando-se modelo para a feitura de vários códigos do mundo moderno, não só no tema da responsabilidade,  mas  em vários outros do Direito Civil. Porém, não inovou no que concerne à responsabilidade. A teoria culposa por ele adotada já o havia sido pelos romanos. Em verdade, o código francês expôs em suas linhas o que a jurisprudência romana já havia extraído da antiga Lei Aquília. Portanto, o mérito da criação teórica pertence a esta, e à jurisprudência que se seguiu; o mérito da positivação da teoria, ao código francês, que a expôs, aliás, em uns poucos cinco artigos, epigrafados “dos delitos e quase-delitos”, deixando claro tratar-se de normas positivas sobre responsabilidade delitual ou aquiliana.

Em sequência ao diploma napoleônico vieram todos os modernos códigos ocidentais, ao menos nos muitos países cuja escola jurídica é altamente influenciada pelo Direito Francês, incluindo o Brasil.


2. A teoria da responsabilidade civil extracontratual

Como se denota do anteriormente exposto, a presença da responsabilidade civil oriunda do ato legalmente reprovável remonta às civilizações primárias, enquanto sua teoria só veio a ser desenvolvida com os romanos (teoria do ato ilícito) e positivada com os franceses. Noutro passo, algo parecido aconteceu com a responsabilidade civil oriunda do descumprimento contratual. A doutrina especializada aponta a existência de normas regulamentadoras de contrato presentes desde os primeiros códigos, até uma posterior esmerilação romana. Assim, também nessa seara, a história se repetiu: os romanos levaram às ultimas conseqüências os ditames do direito contratual então elaborado por eles próprios, daí originando-se o princípio flamular desse ramo jurídico (pacta sunt servanda) que, mais tarde, vai ser incorporado (também) ao Direito francês. Sobre esse assunto, vide COELHO (artigo cit.).

Dessarte, a ciência jurídica abrange, como sempre abrangeu, duas espécies de responsabilidade civil, hoje bem separadas. A primeira se denomina responsabilidade contratual ou negocial, e é aquela presente em torno de um instrumento de contrato celebrado entre duas partes interessadas, tidas como contratante e contratada. Caso alguma dessas partes descumpra seus deveres contratuais, causando dano ao outro contratante, exsurgirá para si a responsabilidade e as respectivas sanções pela não observância dos deveres do contrato.

Já a segunda espécie de responsabilidade civil, objeto deste estudo, denomina-se responsabilidade civil extracontratual, extranegocial ou aquiliana. Cuida-se da responsabilidade que tem o indivíduo frente à prática de atos ou a ocorrência de fatos que a lei reputa ilícitos ou em relação aos quais se lhe atribui a responsabilização. Caso descumpra as normas legais, causando dano a outrem, assumirá o infrator as respectivas sanções.

Nas palavras de GONÇALVES (2008, p. 26):

Na responsabilidade extracontratual, o agente infringe um dever legal, e, na contratual, descumpre o avençado, tornando-se inadimplente. Nesta, existe uma convenção prévia entre as partes que não é cumprida. Na responsabilidade extracontratual, nenhum vínculo jurídico existe entre a vítima e o causador do dano,quando este pratica o ato ilícito.

Foi CAVALIEIRI (2007, p. 02) quem teceu a famosa definição aglutinadora de ambas as espécies de responsabilidade – contratual e extracontratual – quando definiu que “responsabilidade civil é um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário”. Assim, a depender do instituto emanador desse dever jurídico originário (se a lei ou o contrato), ter-se-ia então identificada a espécie de responsabilidade civil presente no caso (aquiliana ou contratual).

Enfim, a responsabilidade havida em decorrência da mera prática de ato civil, sem referência a qualquer contrato, é do tipo extracontratual.

A responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana, para se configurar, deve apresentar três elementos fatais: a conduta, o dano e o nexo causal. A conduta é a ação, a atitude do agente que causa o prejuízo à vítima. No que tange à responsabilidade civil extracontratual, pode-se dizer – com lastro no que até agora foi visto – que a responsabilidade do agente decorre de uma conduta sua que viola direito de outrem, e se assim o é, significa que sua conduta é ilícita, pois o que viola direito de terceiro não pode ser lícito. A conduta é o ato ilícito prenunciador da responsabilidade civil, embora, como se verá mais adiante, nem toda conduta ensejadora de responsabilidade civil seja ilícita. Fica a observação de que tanto a ação quanto a inação podem levar à responsabilidade civil. É que, para o direito, a omissão consciente, quando sabia o indivíduo ter o dever de agir, equivale a ação. Em verdade, a omissão é uma ação negativa, que, se ilícita, gerará, do mesmo modo, a responsabilidade.

O segundo elemento da responsabilidade civil é o dano. O dano é o prejuízo experimentado pela vítima da conduta, e que se apresenta como consequência desta. No dizer de CAVALIERI (op. cit., p. 79), “o dano é, sem dúvida, o grande vilão da responsabilidade civil. Não haveria que se falar em indenização, nem em ressarcimento, se não houvesse o dano. Pode haver responsabilidade sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem dano.”. Importante deixar marcado que o dano a que se refere a lei e a maior parte da doutrina é qualquer prejuízo causado à pessoa, seja patrimonial ou moral.

Como terceiro e último elemento da responsabilidade civil, tem-se o nexo causal, que é o liame fático entre a conduta e o dano. Quando há nexo causal, tem-se que o dano só ocorreu porque a conduta foi praticada. Se o dano ocorreria conquanto não houvesse conduta, o nexo de causalidade não se configuraria, e sem ele, não haveria, no caso concreto, responsabilidade. É o caso do incêndio causado por um raio, que termina por destruir um imóvel de A, em que residia B. Se B acendeu velas (conduta) durante a tempestade que cortou a energia da residência, e a casa veio a pegar fogo (dano), mas se sabe que o incêndio foi provocado pelo evento natural, não se vislumbra o nexo causal entre a conduta imputada ao agente e o dano que a ela se quer relacionar. Não há, pois, neste caso, responsabilidade civil aquiliana.

Apenas por este exemplo, pode-se perceber que o nexo causal, muitas vezes, é de difícil identificação, porque outros fatores podem ter concorrido para a causação do prejuízo. No exemplo dado, o raio, assim como em geral o caso fortuito e a força maior, ou a culpa exclusiva da vítima, são excludentes de responsabilidade, por remover, na espécie, o nexo de causalidade. Isto pode ser aplicável a acidentes causados pela presença de animais na pista, como se comentará à frente.

 Alguns doutrinadores colocam a culpa como um quarto elemento da responsabilidade civil. Nos dias atuais, a tese não prospera, porque a noção de culpa (lato sensu) diz com a vontade do agente. Tem culpa aquele que age porque assim quer, visando a deliberadamente causar prejuízo ao algoz (residindo aí o já citado “ato intrinsecamente ilícito”), bem como tem culpa quem age descuidadamente, negligentemente, e do ato displicente resulta prejuízo a outrem (cuida-se da “culpa levíssima” de Ulpiano). No primeiro caso, diz-se que a conduta é dolosa; no segundo, culposa. Em ambos os casos, há culpa em sentido amplo, porque o agente, ao praticar o ato, quis o resultado danoso, ou assumiu, com sua negligência ou imprevidência, o risco de causá-lo. Portanto, a culpa é inerente à vontade do agente. Se assim, quando muito, poderá ser elemento da conduta; não da responsabilidade. Colocar a culpa como quarto elemento da responsabilidade civil seria redundante, pois esta, via de regra, já está imersa no elemento volitivo. Ademais, há modalidades de responsabilidade nas quais não se cogita de culpa.

Estes os elementos que compõem, em restritíssima suma, a responsabilidade civil. A responsabilidade civil existirá quando presentes todos eles, no caso sub judice.

2.1. A responsabilidade civil subjetiva

O Código Civil de 1916 incorporou ao Direito brasileiro a teoria da responsabilidade civil pela prática de atos ilícitos, da seguinte forma: “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano” (CCB de 1916, art. 159).

A responsabilidade civil subjetiva é aquela em que o indivíduo responde pelos atos que praticar culposamente, dos quais resultem dano a outrem. É a modalidade de responsabilidade civil aquiliana por essência, vez que surgiu, com a Lei Aquília, justamente para coibir a prática dos atos intrínsecamente ilícitos, dos quais se subsome a culpa do sujeito, conforme a jurisprudência romana, posteriormente positivada pelos franceses no Código de 1804, que, por sua vez, serviu de modelo para o brasileiro de 1916. O surgimento da idéia de culpa representou a natural evolução do instituto. No caso da lei brasileira do século passado, deixava-se claro que seria considerado responsável aquele que agisse ou se omitisse voluntariamente, ou com negligência ou imprudência, e desse ato resultasse dano a outra pessoa. Consagrava-se a responsabilidade subjetiva no Direito brasileiro, que é a modalidade de responsabilidade civil fundada na culpa.

Perceba-se a evolução jurídica do tema da responsabilidade civil, em que o que antes se considerava genericamente de delito passou a ser nominado de quase-delito, separando-se assim o ilícito sumamente cível da noção de crime. Explica-se então a terminologia empregada pelo código francês. Se o ato ilícito ocorrer exclusivamente no âmbito civil, não teremos um delito, mas um quase-delito. Porém, face à origem comum dos dois ramos jurídicos, o fundamento para a responsabilização do agente, tanto no âmbito cível quanto no criminal, será sempre a culpa.  Não havendo culpa, não há ato ilícito, qualquer que seja.

A culpa, para colocar definição nossa, é uma violação de comportamento ou regra de conduta, legalmente imputável ao agente, e que não seria cometida por uma pessoa diligente, avisada, em circunstâncias normais. Por pessoa avisada, entenda-se aquela de tirocínio ou diligência normal, que atua de modo a prever as consequências de seus atos. Isto é especialmente importante quando se estuda a culpa em sentido estrito, consubstanciada na negligência, imprudência ou imperícia. Essas modalidades de culpa stricto sensu são conceitos delicados, no que se convencionou estipular um marco referencial a definir se, em determinado caso concreto, há ou não a culpa. Esse marco referencial é o homem médio; denominado de bonus pater familias.

Quanto aos elementos citado no art. 159, CCB/1916, a negligência é o agir displicente, é o descuido puro e simples, a falta de cuidado, de atenção. Revela a personalidade indolente, despreocupada, inerte do agente para com os riscos de seus atos. Caso clássico é o do pai que deixa uma arma carregada em casa, ao alcance de crianças. Já a imprudência é o agir perigosamente, imprevidentemente, que denota precipitação na conduta. Tanto naquela – a negligência – quanto nesta – a imprudência – há a falta de cuidado do agente, mas se diz, para diferenciá-las, que, enquanto a negligência é o “ir aquém”, a imprudência é o “ir além”. Exemplo melhor de imprudência é o ato de dirigir em alta velocidade, “costurando” o trânsito.

A imperícia – conceito que nossos códigos civis não trouxeram – é também modalidade culposa, conforme paralelo traçado com o Direito Penal, que a incorporou no Direito brasileiro desde a edição do Código Penal de 1940 (Dec.-Lei 2.848/1940, art. 15, II, redação original; art. 18, II, redação atual). A imperícia é a falta de qualificação técnica, de habilitação ou de preparo técnico ou científico, teórico ou prático, para praticar determinada conduta, como no caso do profissional da medicina que atua sem o devido diploma. No âmbito do Direito Civil, como não foi citado no art. 159 do CCB de 1916, nem o é no art. 186 do CCB de 2002, o conceito de imperícia incorpora-se aos dois anteriores.

O referencial do homem médio é importante porque o que pode ser considerado imperícia para uns, pode não ser para outros, a depender da qualificação técnica do autor da conduta, bem como o que pode ser imprudente para alguém pode não sê-lo para outrem, mais bem capacitado em suas habilidades. Daí a razão de existir da referência doutrinária do “bom pai de família”, que servirá para identificar o grau de culpa presente na conduta – particularidade irrelevante, pois toda culpa deve ser considerada, a teor da teoria de Ulpiano, que fundamenta a responsabilidade subjetiva – ou a própria existência da culpa – e aqui, sim, a referência ganha relevo. Portanto, para evitar que em casos semelhantes se possa decidir pela presença da culpa em sentido estrito, e em outros não, utiliza-se o referencial do homem médio, razoavelmente diligente, cujo conceito Maria Helena DINIZ (2009, p. 44) complementa:

(...) o bom pai de família seria o protótipo do cidadão médio, prudente, normal, atento, dotado de ordinária inteligência, hábil, empenhado e dedicado. Seria o paradigma do homem abstratamente diligente que cumpre seus deveres legais ou convencionais sem que se considerem sua cultura, aptidão, instrução.

Noutro giro, se a culpa é grave, leve ou levíssima, como muitos autores frisam, entendemos que tal constatação não é relevante para a configuração da responsabilidade subjetiva, mas tão-somente para fixar o quantum indenizatório.

Esta a teoria clássica da responsabilidade civil, ou teoria da responsabilidade civil subjetiva, onde a culpa é o fundamento da obrigação de reparar o dano. Se não há culpa, não há responsabilidade. Denota-se dessa teoria, portanto, que a questão da culpa reveste-se de natureza eminentemente probatória: aquele que se sentir lesado com a conduta de alguém deverá provar em juízo, no bojo de uma ação civil, a culpa do autor do dano.

O CCB de 1916 estipulava algumas situações em que o agente não seria punido, mesmo agindo, a priori, culposamente. Sob a égide do antigo código, situações havia nas quais, conquanto agindo com dolo o agente, este não seria alcançado pelo instituto da responsabilidade civil. Cuida-se das excludentes de ilicitude, como a legítima defesa e o estado de necessidade (art. 160 do CCB de 1916), também denominadas excludentes de culpabilidade. Nestas circunstâncias, o agente não seria responsabilizado, pois tais institutos excluiriam a ilicitude da conduta, o que reforçava a tese, segundo a doutrina mais antiga, de que a ilicitude (ou a culpa) deveria ser considerada elemento da responsabilidade civil.

2.2. A responsabilidade civil objetiva

Pleiteando ressarcimento nos moldes da teoria subjetiva, alguém que se diz em Juízo vítima da conduta danosa praticada por outrem, deverá comprovar, com os elementos lícitos de prova que tiver à disposição, a culpa do réu.

Ocorre que, historicamente, a responsabilidade civil subjetiva prevista na lei, somada à sistemática processual de obrigar à vítima a provar o alegado, passou a não mais fazer justiça frente a uma enormidade de casos concretos. Situações havia em que seria impossível ou extremamente difícil à vítima comprovar a culpa de seu algoz; hipóteses em que terminaria por não fazer jus à indenização, meramente pelo mecanismo processual do ônus da prova, pressuposto da fundamentação da decisão judicial de mérito, quando se exigiria a prova do alegado: no caso, a prova da culpa.

Curiosamente, a mais avançada teoria acerca da responsabilidade civil – a teoria objetiva – surgiu em torno de fato que hoje é objeto do Direito do Trabalho: o acidente de trabalho. Sobre isso, explana ARAGÃO (artigo cit.):

O empregado vítima de um acidente deveria oferecer três tipos de provas: a primeira, que havia sofrido um dano; a segunda, que o agente cometeu um delito; e a terceira, que o dano decorreu do delito: dano, culpa e relação de causalidade. Caso o empregado, em virtude do ônus probatório, não conseguisse satisfazer essas provas, estaria derrotado no processo, sem direito algum a indenização.

Exsurgiu então a necessidade de mudança na teoria jurídica da responsabilidade civil. A responsabilidade civil subjetiva, fundada exclusivamente na culpa, não era mais suficiente para fazer justiça frente a uma série de situações cada vez mais comuns.

O mesmo autor cita a Revolução Industrial, havida na Europa, ainda no Sec. XVIII, como grande marco para o aparecimento da responsabilidade civil objetiva. Com efeito, é que com o surgimento da grande escala de produção laboral, demandando enorme mão-de-obra nas fábricas e metalúrgicas recém-surgidas, aumentou também a produção de bens e a circulação de riquezas. A Revolução Industrial provocou assim uma crescente de produção que exigia mais e mais trabalho. O trabalhador foi levado a extremos, numa situação de penúria, com jornadas de trabalho esmagadoras e salários aviltantes, o que levou ao aumento da frequencia dos acidentes de trabalho. Foi daí que se teria desenvolvido a teoria do risco, como locomotiva de uma nova espécie de responsabilidade civil: a responsabilidade objetiva.

Evidentemente, as teorias atinentes à responsabilidade civil objetiva não surgiram, em face da Revolução Industrial, da noite para o dia. Quando as primeiras teorias objetivistas começaram a se materializar, o Código Civil da França, propagador da responsabilidade civil exclusivamente subjetiva, já vigorava havia mais de 80 (oitenta) anos, sendo que, por esse prisma, o próprio código já estava defasado quando entrou em vigor, no início do Sec. XIX, haja vista que o movimento da Revolução Industrial iniciou-se ainda no Sec. XVIII, a partir da Inglaterra. Cuida-se da constatação do inevitável fenômeno de que o Direito caminha muito mais lentamente que os fatos sociais que regulamenta.

Conquanto outros autores tenham dantes suscitado o tema, comete-se com maior definitividade a autoria do aperfeiçoamento da responsabilidade objetiva aos franceses Saleilles e Joserrand; o primeiro com uma obra sobre acidentes de trabalho, e o segundo pertinentemente a um estudo sobre a responsabilidade civil no fato das coisas inanimadas; ambas escritas em 1897. Este último, em famosa hermenêutica extraída do art. 1.384 do Código de Napoleão, dissertou que o termo “fait” (fato, em francês), estaria abrangido no “faute” (culpa, também em francês), exsurgindo, pois, a noção de responsabilidade civil pela “culpa da coisa”, animada ou inanimada; hoje denominada de responsabilidade civil pelo fato da coisa. Tais concepções, na lição de GONÇALVES (op. cit., pp. 168-9), representaram “um avanço em relação ao tradicional sistema baseado na idéia de culpa do agente causador do dano, a ser demonstrada pela vítima. Isto equivalia, muitas vezes, a deixá-la irressarcida, ante a impossibilidade de se produzir tal prova”.

As situações concretas atraentes à responsabilidade objetiva, com o tempo, a lei passou a normatizar, fugindo-se do campo concreto para a abstração da teoria, o que culminou com a generalização de duas teorias da responsabilidade civil: a primeira e mais antiga, denominada clássica, fundada na culpa, que se diz a regra; e a segunda, mais moderna, fundada no risco da atividade ou no fato da coisa (animada ou inanimada) ou da pessoa.

A noção que se tem hoje de responsabilidade civil independente de culpa, como sinonímia para responsabilidade civil objetiva, é em certo modo diferente daquela havida à época em que se desenvolveu a teoria. Coloca-se opinião de que, naquele tempo de um positivismo tão arraigado, soaria irrazoável a qualquer estudioso extrair completamente a noção de culpa da teoria da responsabilidade, mormente sob a égide de um código tão firmemente nela calcado. Portanto, em tema de responsabilidade civil, passou-se a entender que haveria as hipóteses de responsabilidade fundada na culpa, e aquelas em que a culpa seria presumida. E, a partir desse contexto, a doutrina se desenvolveu, teorizando as mais variadas espécies de culpa presumida: in vigilando, in neligendo, in custodiendo, in comittendo, in omittendo, etc., até surgir, finalmente, a aglutinadora expressão culpa in re ipsa, ou “culpa pelo fato”, que, em verdade, o código francês já trazia.

Estas novas escolas doutrinárias francesas se refletiram no Brasil. O CCB de 1916, lastreado no modelo francês, é todo ele fundamentado na culpa, no que concerne à responsabilidade civil. Aliás, tanto o é que o código só associa responsabilidade civil à ilicitude do ato. Trata a responsabilidade civil subjetiva (arts. 159-60) no Tít. II – Dos Atos Ilícitos – de seu Livro III – Dos Fatos Jurídicos – da Parte Geral; e as exceções à responsabilidade civil subjetiva (arts. 1.518-32) no Tit. VII – Das Obrigações por Atos Ilícitos – de seu Livro III – Do Direito das Obrigações – da Parte Especial. Portanto, tinha-se a responsabilidade civil por culpa direta, e responsabilidade civil por culpa presumida. A maior parte das hipóteses de responsabilidade civil objetiva que hoje estão no CCB de 2002 já eram previstas no CCB de 1916, e até pelo código francês de 1804. A perspectiva de avaliação doutrinária – que não se desligava da idéia de culpa – é que era diferente.

Hodiernamente, todas essas hipóteses são tratadas como sendo de responsabilidade civil objetiva, rigorosa e verdadeiramente independente culpa, pelo que, modernamente, é incorreto falar em culpa presumida. Fala-se, tão-somente, em responsabilidade objetiva. Se um menor de idade, ad exemplum, causa dano material a alguém, seu pai, tutor ou responsável incorrerá na responsabilidade civil, independentemente de culpa. Isto quer dizer que não há se cogitar de culpa alguma, seja direta, seja presumida (como diriam alguns ter ocorrido na espécie: culpa in vigilando do pai em relação à criança); será o pai responsabilizado porque a lei assim prevê. A responsabilidade objetiva é independente de culpa simplesmente porque, na situação prevista em lei, não se cogita desta. Não irá interessar, pois, para o deslinde da ação de reparação civil (salvo para, talvez, majorar o quantum indenizatório), que o julgador investigue se, de fato, no caso concreto, o pai descurou-se de vigiar o filho, ou se nada fez para impor-lhe limites, ou se mesmo induziu ou ordenou ao filho que causasse o dano. Será ele responsabilizado simplesmente porque a lei imputa-lhe tal ônus.

O ordenamento jurídico prevê, atualmente, várias modalidades de responsabilidade civil objetiva, a saber:

a)                  Responsabilidade civil objetiva pelo risco da atividade (art. 927, parágrafo único, 2ª parte, do CCB/2002);

b)                 Responsabilidade civil por acidente de trabalho (art. 7º, XXVIII, da CF/88, c/c Lei 6.367/76 e arts. 59, caput, e 60, §3º, da Lei 8213/91);

c)                  Responsabilidade civil consumerista (arts. 12 e 14 do CDC);

d)                 Responsabilidade civil pelo fato da coisa, que, por sua vez, divide-se em responsabilidade pela ruína de edifício ou construção (CCB/2002, art. 937), responsabilidade pelas coisas caídas (CCB/2002, art. 938), e responsabilidade pelo fato do produto (CCB, art. 931);

e)                  Responsabilidade pelo fato de terceiro (CCB/2002, art. 932);

f)                  Responsabilidade pelo fato do animal (CCB/2002, art. 936).

Há outras hipóteses bem específicas, previstas em legislação esparsa, mas, aqui, interessará apenas a responsabilidade pelo fato do animal, que, talvez seja a mais antiga das modalidades de responsabilidade objetiva. Apesar de desenvolvida, enquanto manifestação da teoria objetiva da responsabilidade, apenas há algo mais que um século, a responsabilidade pelo fato do animal era já prevista em lei desde as civilizações primeiras, como ocorria na Babilônia do já estudado Código de Hamurábi, em seus artigos (ou leis) de nºs 251 (“Se o boi de alguém dá chifradas e se tem denunciado seu vício de dar chifradas, e, não obstante, não se tem cortado os chifres e prendido o boi, e o boi investe contra um homem e o mata, seu dono deverá pagar uma meia mina”) e 252 (“Se ele mata um escravo de alguém, dever-se-á pagar um terço de mina”). Nestes exemplos, o dono do animal respondia pelos prejuízos que o semovente causasse a terceiros.

Pois bem. Nos dias de hoje, mais do que nunca, essa premissa é verdadeira. Desenvolveu-se apenas uma teoria para explicá-la, que fundamenta as várias outras hipóteses já estudadas: a teoria do risco. Aliás, das modalidades de responsabilidade civil já previstas no antigo Código de 1916 e repetidas no de 2002, reside aqui a maior das mudanças empreendidas pelo novo código. Veja-se a redação do art. 1.527 do CCB/1916, verbis:

O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar: I – Que o guardava e vigiava com o cuidado preciso; II – Que o animal foi provocado por outro; III – Que houve imprudência do ofendido; IV – Que o fato resultou de caso fortuito, ou força maior.

Como explica CAVALIEIRI (op. cit., pp. 158-9), o dispositivo dividia a doutrina:

Para alguns autores, a responsabilidade pelo fato do animal é objetiva, fundada na teoria do risco (...). Nos termos do art. 1.527 do Código Civil, todavia, não há dúvida de que a nossa lei, fiel ao sistema subjetivo por ela adotado, consagra uma presunção de culpa in vigilando ou in custodiando. E assim é porque esse dispositivo permite ao dono ou detentor do animal elidir a sua responsabilidade provando que o guardava e vigiava com cuidado (...). Em que pese à grande autoridade dos autores que sustentam haver, aqui, responsabilidade objetiva, para onde caminham, aliás, a doutrina e a legislação dos outros países, à luz do Código Civil essa posição é insustentável enquanto não houver uma mudança em nossa legislação (...).

A responsabilidade pelo fato do animal, no novo código, foi colocada na seguinte redação (art. 936 do CCB/2002), simples e direta: “O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior”. Desta forma, não há mais o que discutir: trata-se de genuína hipótese de responsabilidade objetiva, cuja obrigação de reparar o dano só se esvairá, para o guardião do animal, se incidente alguma das excludentes de responsabilidade, como força maior ou culpa exclusiva da vítima. Não o havendo, seu dono ou detentor responderá, sem que se cogite de culpa, ainda que presumida.

Sobre a responsabilidade pelo fato do animal, diz PAMPLONA (2009, pp. 169-72, passim):

Imagine, a título de ilustração, um pitbull solto – aquele simpático cãozinho cuja dentada equivale a algumas toneladas de pressão – que ataca uma criança, causando-lhe lesões irreparáveis (...). A responsabilidade pelos danos causados pela coisa ou animal há que ser atribuída àquela pessoa que, no momento do evento, detinha poder de comando sobre ele (...). Partindo-se da teoria do risco, o guardião somente se eximirá se provar quebra do nexo causal em decorrência da culpa exclusiva da vítima ou evento de força maior, não importando a investigação de sua culpa (...).

A rigor, a responsabilidade civil pelo fato do animal deveria ser estudada na responsabilidade civil pelo fato da coisa, como uma modalidade desta, pois coisa, para o Direito, pode ser animada (ou semovente) ou inanimada. Animal não se dota de vontade, sendo coisa, no mundo jurídico. Maria Helena DINIZ assim entende, e estuda o fato do animal como hipótese do fato da coisa, em sua obra (op. cit., pp. 529 e 550).


3. A responsabilidade civil do Estado

Assim como o particular, o Poder Público também incorre na responsabilidade civil, quando de seus atos resulta dano ao administrado.

Nem sempre foi assim. Até a metade do Sec. XIX, a idéia prevalecente no mundo ocidental era a de que o Estado não poderia ser responsabilizado frente ao cidadão. A idéia de poder divino do rei e a concentração de poderes nas mãos deste (“L'État c'est moi”) incompatibilizava-se com a questão da responsabilidade civil estatal. Como leciona CARVALHO FILHO (2011, p. 502):

(...) A solução era muito rigorosa para com os particulares em geral, mas obedecia às reais condições políticas da época (...), de modo que a doutrina de sua irresponsabilidade constituía mero corolário da figuração política de afastamento e da equivocada isenção que o Poder Público assumia àquela época  (...).96

Sucessivamente a essa idéia de Estado irresponsável, surgiu a noção de Estado de direito, segundo a qual ao Estado se deve imputar, do mesmo modo que ao administrado, pessoa física ou jurídica, os direitos e deveres ordinários. A tese de que o Estado era um ente todo-poderoso, intangível, particularidade decorrente diretamente da irresponsabilidade do monarca (“Le Roi ne peut mal faire” ou “The King can do no wrong”), não mais podia ser aceita. As pessoas jurídicas, como as físicas, têm a obrigação de ressarcir os prejuízos causados a terceiros. Sendo o Estado pessoa jurídica, com ele não deveria ser diferente. O Estado de direito surgiu para se impor à responsabilização civil. No dizer de J. J. CANOTILHO (apud DINIZ, op. cit., pp. 637-8):

(...) Conquista lenta, mas decisiva do Estado de Direito, a responsabilidade estadual é, ela mesma, instrumento de legalidade. É instrumento de legalidade, não apenas no sentido de assegurar a conformidade ao direito dos actos estaduais: a indenização por sacrifícios autoritariamente impostos cumpre uma outra função ineliminável no Estado de Direito Material – a realização da justiça material.

A partir daí, uma vez superada a tese da irresponsabilidade, a teoria da responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana do Estado evoluiu, passo a passo, até chegar ao nível atual. Cada doutrinador, porém, explica essa evolução da tese da responsabilidade civil estatal de uma maneira, mais ou menos rápida, mais ou menos detalhada, com uma classificação própria. CARVALHO FILHO (op. cit., pp. 502-3), por exemplo, menciona, no correr de tal evolução, a teoria da responsabilidade com culpa, a teoria da culpa administrativa e a teoria da responsabilidade objetiva. Já Maria Helena DINIZ (op. cit., pp. 642-3) trata de culpa administrativa, teoria do acidente administrativo ou da falta impessoal do serviço público, e, finalmente, teoria do risco integral. DI PIETRO (2011, pp. 644-5), por sua vez, divide as teorias em civilistas e publicistas.

Sem embargo da autoridade de um e de outro autor, pode-se dizer que a etapa seguinte à tese da irresponsabilidade foi a teoria da bipartição dos atos de Estado, que dividiu os atos estatais em atos de império e de gestão, admitindo-se a responsabilidade civil do Estado quanto a estes últimos, posto que, quando de sua prática, o Poder Público se aproximaria ao particular. DI PIETRO (op. cit., p. 645) explicita a questão:

Essa distinção foi idealizada como meio de abrandar a teoria da irresponsabilidade do monarca por prejuízos causados a terceiros. Passou-se a admitir a responsabilidade civil quando decorrente de atos de gestão e a afastá-la nos prejuízos resultantes de atos de império. Distinguia-se a pessoa do Rei (insusceptível de errar – the king can do no wrong), que praticaria atos de império, da pessoa do Estado, que praticaria atos de gestão, através de seus prepostos (...).

Cuidava-se do que os outros autores chamam de teoria da responsabilidade com culpa, ou de culpa administrativa do preposto, e que a autora citada acima denomina de teoria da culpa civil. Em verdade, nada mais se trata do que a teoria subjetiva aplicável ao Estado, ainda que de uma maneira tímida.

A questão da responsabilidade extracontratual do Estado tomou grandes proporções, finalmente, com o trágico falecimento da menina francesa Agnès Blanco, em 1873, colhida por um trem do sistema ferroviário nacional francês. Seu pai moveu uma ação de reparação com lastro na suposta responsabilidade que teria o Estado acerca dos atos, quaisquer que fossem, de seus agentes. A partir de então, surgiram na França (verdadeira locomotiva jurídica no que concerne ao tema da responsabilidade civil, como já se pode notar), o que DI PIETRO chama de teorias publicistas, sendo a primeira delas a teoria da culpa do serviço, ou da culpa anônima do serviço, (ou, ainda: teoria da culpa administrativa, do acidente administrativo, ou da falta impessoal do serviço público), alargando-se sobremaneira a teoria subjetiva na responsabilidade civil do Estado. Ao se falar em culpa do serviço, e não mais do agente – por isso mesmo a sinonímia “culpa anônima” do serviço – sacramentava-se, definitivamente, a responsabilidade aquiliana do Estado, o que foi adotado pelo Código Civil Brasileiro de 1916 (art. 15).

Entrementes, florescia a problemática inerente à adoção da culpa como pressuposto da responsabilidade: o lesado deveria comprovar processualmente a falta na prestação do serviço, embora não precisasse provar a culpa de um agente em particular.

A adesão da teoria objetiva para o Poder Público só surgiu no ordenamento jurídico brasileiro com a Constituição Federal de 1946, quando, em seu art. 194, afirmava: “As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros”. E complementava o parágrafo único: “Caber-lhes-á ação regressiva contra os funcionários causadores do dano, quando tiver havido culpa destes”. A redação é muito parecida com a do texto magno atual, e, com ela, a doutrina passou a admitir a responsabilização civil do Estado na modalidade objetiva, como nova expressão da teoria do risco.

Comete-se, porém, a Hely Lopes Meirelles, grande administrativista da história jurídica nacional, a façanha de subdividir a teoria do risco aplicável ao Estado em teoria do risco integral e teoria do risco administrativo. Enquanto a primeira refuta qualquer excludente de responsabilidade, a segunda a admite, sendo esta a adotada pela atual Constituição Federal de 1988 (CF/88), em seu art. 37, §6º, verbis:

As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

A teoria do risco administrativo é, portanto, a manifestação da teoria do risco no âmbito público. Genericamente, nosso sistema constitucional adota, para o Estado, ou melhor, para as pessoas jurídicas de direito público – abrangidas as formas de autonomia político-administrativa decorrentes do modelo federativo atual (União, Estados-Membros e Municípios), as autarquias e as fundações públicas – a modalidade objetiva da responsabilidade civil, como de fato o faz desde a Constituição Federal de 1946, fundada na teoria do risco administrativo.

A redação do §6º do art. 37 constitucional guarda, porém, uma importantíssima particularidade. De sua leitura, denota-se que a norma se refere à responsabilidade civil do Estado pelos atos comissivos de seus agentes, isto é, pelos atos de que resulte um dano proveniente do agir estatal. Mas e se o dano resulta, não da ação, mas da omissão do Estado?

Sabe-se que a finalidade do Poder Público é atingir o bem comum, que se expressa nos direitos fundamentais à saúde e segurança públicas, educação, lazer, moradia, etc.. Se esse bem comum não é observado, conforme os ditames das normas programáticas que lhe impõe a Constituição, diz-se que o Estado se omite, torna-se inerte em suas finalidade institucionais, o que fere, de igual modo, ou maiormente, o texto constitucional.

Contudo, se admitida fosse a responsabilidade civil objetiva do Estado, no que concerne à omissão, impossibilitado ficaria o Poder Público de gerir a sociedade, tamanha seria a quantidade de ações de indenização a que responderia, por omissão. E, nesse contexto, pode-se imaginar toda a sociedade ajuizando ação de indenização civil pela falta do Estado em propiciar boas escolas; bons hospitais; previdência social de qualidade; segurança pública efetiva 24 horas por dia e que abarque todos os lugares; etc. Como se vê, se adotada fosse a teoria objetiva na omissão do Estado, a própria instituição, enquanto ente provedor do bem comum, na impossibilidade de atingir a infalibilidade – o agir estatal, além de economicamente limitado, dá-se por meio de agentes, seres humanos que são, sujeitos naturalmente ao erro – iria à falência financeira.

Partindo-se dessa análise, adere-se à corrente doutrinária defensora de que a responsabilidade do Estado por omissão não está contida no dispositivo constitucional (§6º do art. 37), sendo, portanto, subjetiva. Sobre isso, explana DI PIETRO (op. cit., pp. 649-655):

No dispositivo constitucional estão compreendidas duas regras: a da responsabilidade objetiva do Estado e a da responsabilidade subjetiva do agente público. (...) Existe controvérsia a respeito da aplicação ou não do artigo 37, §6º, da Constituição às hipóteses de omissão do Poder Público, e a respeito da aplicabilidade, nesse caso, da teoria da responsabilidade objetiva. Segundo alguns, a norma é a mesma para a conduta e a omissão do Poder Público (...). Para outros, a responsabilidade, no caso de omissão, é subjetiva, aplicando-se a teoria da culpa do serviço público ou da culpa anônima do serviço público (...) adotam a teoria da responsabilidade subjetiva em caso de omissão, José Cretella Júnior, Yussef Said Cahali, Álvaro Lazzarini, Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, Celso Antônio Bandeira de Mello. É a corrente a que também me filio.

A doutrinadora ainda expõe outro fundamento para a adoção da teoria subjetiva, nos casos de omissão estatal: o de que o dano, nestas situações, não é causado diretamente pelo agente, mas por terceiro ou pela força da natureza. Assim sendo, se não é o agente o causador direto do dano, mas outro fator, imputável a terceiro, porém em relação ao qual tenha o Estado dever de vigilância, há de se verificar se o Poder Público, nas circunstâncias do sinistro – e isto depende da análise de cada caso concreto – poderia ter evitado o resultado, se houvesse agido. Cuida-se do princípio da reserva do possível.

Percebe-se, diante do exposto, que a adoção da tese subjetiva é mais acertada para fundamentar a responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses de omissão do Poder Público. Se assim não fosse, aderindo-se à teoria objetiva, o fato de alguém vir a falecer num hospital público, ou o de o corpo de bombeiros não conseguir debelar um incêndio de grandes proporções, ou o de alguém ser atropelado por não ter visto o semáforo que sinalizava para a não-travessia da rua, poderia ser suficiente para, compondo os fundamentos de ação judicial indenizatória cível, atrair a procedência da causa em desfavor do Poder Público. Isto, do ponto de vista financeiro, levaria o Estado à bancarrota, impedindo sua própria continuidade. Eis porque a tese a ser adotada, de um ponto de vista mais ponderável, deve ser a subjetiva. Repisa-se, contudo, que há duas correntes doutrinárias, havendo cizânia também nos tribunais [1-2].

Atente-se, porém, que o ajuizamento da causa com lastro na omissão do Estado não torna, por si só, consumada ou incontroversa a ocorrência da omissão. O fato da omissão é matéria de mérito. A suposta omissão será investigada pelo juiz, na instrução processual. E a omissão, uma vez verificada, configurará a própria culpa do Estado. Pode-se, assim, perguntar: se ao administrado, nesta hipótese, bem como em qualquer outra em que se discuta a conduta omissiva do Poder Público, compete provar-lhe a culpa, ou seja, a faulte do serviço, não seria isto regressar à antiga e injusta sistemática de se exigir do particular que demonstre a culpa de quem, por presunção, já a tem? Tal indagação, não se deve esquecer, fez surgir a teoria objetiva nas hipóteses de acidentes de trabalho (bem como nos de fato do animal e coisa), quando se passou a inexigir do hipossuficiente a prova da culpa do empregador, com vistas ao alcance da responsabilização deste, como medida de justiça.

Para superar esta questão, a doutrina que admite a tese subjetiva nos atos de omissão do Poder Público adota a idéia de culpa presumida. Em verdade, não compete ao particular provar, de início, a culpa do Estado, mas a este, isto sim, demonstrar que fez o possível ou agiu regularmente para impedir o resultado. Em não o fazendo, fica configurada a omissão, que teria restado, assim, provada, por presunção. Trata-se do mesmo raciocínio tomado por Joserrand e Saleilles na idealização da teoria do risco: refutar a obrigatoriedade da prova cabal de culpa, de difícil configuração, por parte do mais fraco da relação jurídica, substituindo-a pela idéia da culpa presumida, sem, no entanto, chegar-se à tese objetiva da responsabilidade.

A idéia da culpa presumida do Estado, nas hipóteses de omissão, foi desenvolvida por Celso Antônio BANDEIRA DE MELLO, e não parece abalar a teoria subjetiva, eis que remanesce a noção de culpa, pilar da teoria, alinhavando-se a idéia da presunção com a tese adotada, de responsabilidade civil subjetiva. O que não se admite é falar em culpa presumida para fundamentar a teoria objetiva, se fosse esta a tese eleita para as hipóteses omissivas. Ou se adota a responsabilidade objetiva – e, neste caso, não se fala em culpa, ainda que presumida – ou a tese da responsabilidade subjetiva, cujo elemento primordial – a culpa – será considerado presumidamente presente, até prova em contrário pelo ente público, parte mais forte da relação processual. Aceita-se, para a responsabilização civil estatal por omissão, a idéia da culpa in vigilando, sobre a qual explana BANDEIRA DE MELLO (2001, p. 887):

 (...) Tal presunção, entretanto, não elide o caráter subjetivo desta responsabilidade, pois, se o Poder Público demonstrar que se comportou com diligência, perícia e prudência – antítese da culpa -, estará isento da obrigação de indenizar, o que jamais ocorreria se fora objetiva a responsabilidade (...).

Pelo exposto, no que concerne a acidentes de trânsito causados por animais sem dono, por exemplo, caberia ao Estado, em tese, a prova de que agiu diligentemente no sentido de evitar a presença do animal na pista. Nesse sentido, a doutrina de DI PIETRO (op. cit., p. 656):

 (...) Acolhemos a lição daqueles que aceitam a tese da responsabilidade subjetiva nos casos de omissão do Poder Público. Com Celso Antônio Bandeira de Mello, entendemos que, nessa hipótese, existe uma presunção de culpa do Poder Público. O lesado não precisa fazer a prova de que existiu a culpa ou dolo. Ao Estado é que cabe demonstrar que agiu com diligência, que utilizou os meios adequados e disponíveis e que, se não agiu, é porque a sua atuação estaria acima do quer seria razoável exigir; se fizer essa demonstração, não incidirá a responsabilidade.


4. A responsabilidade civil do Estado e de particulares frente a acidentes de trânsito causados por animais

O sinistro de trânsito pode ocorrer numa via pública de livre passagem ou numa rodovia pedagiada; pode ser causado por um animal pertencente a particular ou por animal silvestre ou sem dono; pode acontecer numa rua da cidade ou numa grande estrada federal; etc. Essas diferentes circunstâncias são aptas a tornar diverso o pedido/causa de pedir da ação, bem como os próprios fundamentos da decisão de mérito. Por isto, a gama de casos concretos podem ser agrupadas em três hipóteses: a) a dos acidentes de trânsito causados por animais pertencentes a particulares; b) a dos acidentes causados por animais sem dono; c) a dos sinistros ocorridos em vias administradas por concessionárias de serviço público.

4.1.  Acidentes de trânsito causados por animais pertencentes a particulares

Quanto a este tipo de acidente, surge a responsabilidade civil pelo fato do animal, de natureza objetiva, na forma do art. 936 do CCB/2002, cuja redação transcreve-se novamente: “O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior”. Essa responsabilidade pelo fato do animal independe de culpa, e compreende danos de qualquer natureza (materiais, morais, estéticos, etc.). Portanto, o dono ou detentor do animal – denominado genericamente de guardião – é quem responderá pelos danos causados a terceiros, incluindo as hipóteses de acidentes de trânsito provocados pelo bicho.

Há farta jurisprudência nos juizados especiais cíveis e nos tribunais de justiça da Justiça Comum dos Estados sobre a questão. Leia-se o seguinte julgado, proveniente do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, divulgado nacionalmente em vários sites jurídicos, na época:

A Câmara Especial Regional de Chapecó, por votação unânime, manteve sentença da Comarca de Concórdia que condenou Variste Consuelo Vivan ao pagamento de indenização no valor de R$ 3 mil em favor de Givanildo Pereira, por conta de um acidente de trânsito provocado por cachorro sob sua responsabilidade. Segundo os autos, Givanildo transitava com sua moto (...) quando abruptamente teve a frente cortada pelo cachorro pertencente a Variste Consuelo. Houve a colisão - que provocou inclusive a morte do animal, com o motociclista amargando prejuízos materiais em seu veículo e um período de inatividade no trabalho de quatro meses. (...) Ainda que Variste tenha alegado não ser proprietário do animal, ficou patente nos autos ser ele o detentor do cão. Para os magistrados, ser dono ou detentor do animal, para fins de responsabilidade civil, se equivalem.[3]

Trata-se de acidente de trânsito provocado por um cão e que terminou por causar danos ao veículo e ao próprio condutor, que permaneceu por alguns meses sem poder trabalhar. Observe-se que o guardião do animal foi condenado, não sendo considerada, acertadamente, a tese da defesa de que não seria ele o dono do animal, posto que, para o Código Civil, isto não interessa. A responsabilidade civil pelo fato do animal é objetiva, independentemente de culpa, e abrange o guardião, seja ele dono ou pessoa sob os cuidados de quem está o animal

Relembre-se que a responsabilidade objetiva só pode ser elidida por excludente de responsabilidade, a exemplo da força maior, caso fortuito ou culpa exclusiva da vítima, bem como pode ser minorada pela prova da culpa concorrente da vítima. Foi o que tentou demonstrar, sem sucesso, a requerida em ação de indenização semelhante à anterior, também compreendendo acidente de trânsito provocado por um cão, em trâmite no Tribunal de Justiça de Mato Grosso:

Há presunção de culpa à proprietária de um cão que, solto na rua, provocou acidente de trânsito, de forma a causar lesões físicas e morais ao condutor de uma moto no município de Rondonópolis (218 km de Cuiabá). (...) Conforme relato da única testemunha do acidente, a dona do animal abriu o portão da residência para apanhar o jornal, ocasião em que o cão escapou. Neste instante o condutor da moto trafegava pela rua e, ao tentar desviar do animal, perdeu o controle do veículo e caiu, o que lhe causou graves ferimentos. (...) para esses casos, a legislação prevê a responsabilidade do dono ou detentor do animal, no artigo 936 do Código Civil, que diz que o dono ou detentor do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior. (...) a culpa da proprietária do cão é presumida, ante a ausência do dever de guarda e vigilância do animal (...).[4]

Há uma atecnia jurídica na decisão, à qual já se referiu no presente estudo: a de se utilizar indistintamente a terminologia “culpa presumida”. O órgão julgador reconheceu a responsabilidade objetiva pelo fato do animal, justificando, contudo, a incidência do art. 936 do código com o emprego da expressão “a culpa da proprietária do cão é presumida”. Não é de rigor jurídico sequer a menção ao elemento da culpa, como já visto, porque na responsabilidade objetiva não se cogita desta. Trata-se de terminologia ultrapassada, pelo menos à luz do Código Civil de 2002.

Animais maiores eventualmente podem causar acidentes de proporções mais grandiosas, como se verifica nas estradas, em que é comum a presença de semoventes do meio rurícola, como caprinos e equinos. Animais de tal porte causam danos também em automóveis e caminhões – via de regra, veículos maiores e mais caros, e que conduzem mais pessoas – o que, em tese, agrava o resultado danoso, mormente quando se considera a velocidade com que se trafega numa rodovia; deveras maior do que no interior da cidade.

Nesse sentido, exemplo muito comum é a travessia do gado pelo vaqueiro, que dificilmente sinaliza a pista de rolamento. A seguir, colaciona-se decisão do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, sobre o fato:

Ao realizar a travessia de gado em rodovia movimentada, o condutor dos animais deve tomar as cautelas necessárias para evitar acidentes, sinalizando ambos os sentidos da pista a alguns metros do local, sob pena de ser responsabilizado por acidente envolvendo veiculo que, dirigindo em velocidade compatível com o local, venha a colidir com seus animais (...).[5]

Noutras vezes, o gado é deixado solto na relva, e termina por chegar ao acostamento da via. Fato muito comum, inclusive, observado por quem costuma viajar à noite, é a visualização do gado deitado na pista de rolamento, atraído pelo calor do asfalto. A seguinte decisão, oriunda do STJ, refere-se a sinistro causado pelo rebanho solto na rodovia:

RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE VEICULO. ANIMAIS SOBRE A PISTA. RECONHECIDA A CULPA DO DONO DOS ANIMAIS. NEGLIGENCIANDO NA SUA GUARDA, DESCABE REAPRECIAR OS FATOS NO RECURSO ESPECIAL. (...) O autor provou a culpa do réu, desincumbindo-se, assim, do ônus que lhe impõe o artigo 333, inciso I, do CPC (...).[6]

Nesta última decisão, o tribunal mencionou o elemento da culpa no decisum, mas aqui não há imprecisão, visto que a causa foi julgada em 1995; à luz, ainda, do código de 1916, em que a aplicação da responsabilidade civil pelo fato do animal era subjetiva com culpa presumida. Hoje, a responsabilidade do particular pelo fato do animal é indiscutivelmente objetiva.

Pode-se tecer a seguinte indagação, que poucos livros trazem: ainda que identificado o guardião do animal, poderia a vítima direcionar a demanda também contra o Poder Público, ou apenas contra este, por se tratar de sinistro ocorrido em via publica?

Não se encontrou doutrina que enfrente com segurança o assunto. Entrementes, se se entender pela adoção da teoria subjetiva do Estado, pela suposta omissão em retirar o animal da via, as duas espécies diversas de responsabilidade civil (objetiva do particular e subjetiva do Poder Publico) haveriam de se excluir, uma à outra. É que a responsabilidade do particular pelo fato do animal, mais ampla, suplanta a que teria o Estado, em tese, pela omissão. Afinal, caberia ação de regresso deste contra aquele, encontrando a responsabilidade civil, de qualquer forma, seu destinatário final. Ademais, processualmente, não seria interessante à vítima. A uma, porque, do ponto de vista processual, é mais dificultoso exigir a reparação daquele contra quem se deverá provar a culpa. A duas, porque a responsabilidade estatal omissiva encontra-se modulada pelo princípio da reserva do possível, como já dito, o que também faria atrair uma análise muito mais acurada dos fatos.

Cuidando-se, porém, de sinistro ocorrido em vias públicas sujeitas à administração de uma concessionária, é possível que a ação seja movida contra o particular, dono do animal, e contra a administradora da rodovia. A jurisprudência tem admitido, nestes casos, a condenação do particular, da concessionária do serviço público, ou de ambos, como se comentará adiante.

4.2.  Acidentes de trânsito causados por animais sem dono

Cuidando-se de animal sem dono, não há que se falar, à evidência, em responsabilidade civil com lastro no art. 936 do CCB/2002. Resta saber se, na hipótese, é possível exigir a reparação do Poder Público, e, se positiva a resposta, sob que fundamento.

Há um entendimento geral no sentido de que ações com essa causa de pedir devem se fundamentar na omissão do Estado. E se assim o é, deve ou deveria o autor, ressalvando-se entendimento diverso, ajuizar a pretensão com pleito na responsabilidade subjetiva. Para a maior tendência, a omissão não é alcançada – e se adere à corrente doutrinária e jurisprudencial que assim entende – pelo art. 37, §6º, constitucional. Sendo omissivo o ato, atraída estaria, em tese, a teoria subjetiva, devendo o interessado demonstrar a culpa do Estado, atentando para a matéria probatória.

É indiscutível o dever do Estado em propiciar segurança nas vias públicas. Tanto é assim que o Poder Público dos municípios geralmente mantém órgãos que efetuam trabalho de “carrocinha” (órgãos de controle de zoonoses, relativos à saúde pública), recolhendo cães e gatos das ruas. A Polícia Rodoviária Federal, além de veículos possantes para a fiscalização das rodovias, também possui em sua frota caminhões do tipo “boiadeiro”, para coleta de animais livres, como jegues e burros. Caprinos e suínos, outros bastante comuns nas estradas, geralmente pertencem a particulares, mas também são passíveis de recolhimento.

São vários os julgados do STJ sobre acidentes causados por animais sem dono, todos pela responsabilidade subjetiva por omissão:

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ANIMAL NA PISTA. AUSÊNCIA DE FISCALIZAÇÃO E SINALIZAÇÃO. OMISSÃO DO ESTADO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA.  INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS (...).[7]

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ACIDENTE DE TRÂNSITO EM RODOVIA FEDERAL. ANIMAL NA PISTA. LEGITIMIDADE DA UNIÃO E DO DNER. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. OMISSÃO. OCORRÊNCIA DE CULPA. (...). [8]

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. ANIMAL QUE SE ENCONTRAVA EM RODOVIA ESTADUAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. DEVER DE FISCALIZAÇÃO (...).[9]

Observa-se que, em todos os julgados acima, proferidos na atualidade pelo intérprete máximo da legislação federal, foi reconhecida a responsabilidade civil do Estado, por omissão, com lastro na teoria subjetiva. Como se trata de corte extraordinária, que não reaprecia os aspectos probatórios da causa, seus julgados são verdadeiras referências, no que concerne ao pano de fundo (matéria jurídica), isto é, ao que se deva interpretar da lei.

Quanto ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, sua antiga composição, durante os anos 90, havia se dividido quanto à possibilidade de alcance do art. 37, §6º, da Constituição Federal às omissões do Estado. Atualmente, já não se faz tão fácil encontrar jurisprudência do STF sobre o tema – por contraditório que possa parecer, vez que a questão também possui patamar constitucional.

Há, porém, uma tendência da composição atual do STF em julgar que a questão de ser ou não subjetiva a responsabilidade do Estado, nos casos de omissão, é matéria de legislação infraconstitucional – o que leva à conclusão de que o tribunal estaria entendendo, majoritariamente, ser a omissão do Poder Público não atingida pelo art. 37, §6º, da CF/88. Ademais, para o STF, a questão demandaria exame de fatos e provas, que, como já se expôs, inviabiliza-se nas instâncias extraordinárias. Sobre isso, o seguinte julgado:

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO, POR DANO CAUSADO POR TERCEIRO, EM RAZÃO DE NEGLIGÊNCIA CULPOSA DE AGENTE PÚBLICO: RECURSO EXTRAORDINÁRIO: DESCABIMENTO: QUESTÃO DE NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL OU QUE DEMANDA REEXAME DE FATOS E PROVAS. Acertado, definitivamente, nas instâncias de mérito, a existência de omissão ou de negligência culposa do agente público, nas circunstâncias do caso e o nexo de causalidade entre a sua culpa e a ação do terceiro, a questão ou é de ser resolvida à luz do regime da responsabilidade subjetiva, de natureza infraconstitucional, ou demanda o reexame de toda a matéria de fato e das provas dos autos, inviáveis no extraordinário (...).[10]

Infelizmente, é comum que os tribunais, até pelo excesso de trabalho, prendam-se à letra das alegações das partes, deixando de analisar a matéria, no seu todo. Entende-se que o fato de mencionar a parte interessada, nas razões do recurso, unicamente a tese da responsabilidade subjetiva do Estado não impediria a apreciação, no julgado, da questão acerca da incidência ou não, nessa espécie de responsabilidade, do art. 37, §6º, da Constituição, considerada a matéria em tese. Noutro giro, se suscitasse a parte interessada a tese objetiva, em suas razões recursais, para ver a demanda apreciada pelo STF, correria o risco de ter seu recurso improvido, vez que o caso concreto seria de omissão, e não de ação estatal. A matéria de revestimento é probatória, mas o pano de fundo pertine à lei em tese, pelo que poderia o Supremo apreciá-lo. Erigir o tema da responsabilidade subjetiva não significa necessariamente pedir que o tribunal reaprecie a prova (da culpa). Tal proceder, porém, tem se repetido na jurisprudência daquele tribunal:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DANO EM VEÍCULO AUTOMOTOR EM DECORRÊNCIA DE PASSAGEM SOBRE BURACO EM VIA PÚBLICA. OMISSÃO DO ESTADO. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. MATÉRIA DE FATO. SÚMULA 279 DO STF. I - Decisão monocrática que negou seguimento ao recurso extraordinário por entender que concluir de forma diversa do acórdão recorrido necessitaria de reexame de matéria de prova (...).[11]

Em pesquisa mais avançada, alcançando-se julgados menos atuais, verificou-se que a matéria em tese foi enfrentada no seguinte acórdão:

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO CULPOSA NO PREVENIR DANOS CAUSADOS POR TERCEIROS À PROPRIEDADE PRIVADA: INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO. 1. Para afirmar, no caso, a responsabilidade do Estado não se fundou o acórdão recorrido na infração de um suposto dever genérico e universal de proteção da propriedade privada contra qualquer lesão decorrente da ação de terceiros: aí, sim, é que se teria afirmação de responsabilidade objetiva do Estado, que a doutrina corrente efetivamente entende não compreendida na hipótese normativa do art. 37, § 6º, da Constituição da República. 2. Partiu, ao contrário, o acórdão recorrido da identificação de uma situação concreta e peculiar, na qual - tendo criado risco real e iminente (...) - ao Estado se fizeram imputáveis as conseqüências da ocorrência do fato previsível, que não preveniu por omissão ou deficiência do aparelhamento administrativo. 3. Acertado, assim, como ficou, definitivamente, nas instâncias de mérito, a existência da omissão ou deficiência culposa do serviço policial do Estado nas circunstâncias do caso - agravadas pela criação do risco, também imputável à administração -, e também que a sua culpa foi condição sine qua da ação de terceiros - causa imediata dos danos -, a opção por uma das correntes da disceptação doutrinária acerca da regência da hipótese será irrelevante para a decisão da causa. 4. Se se entende - na linha da doutrina dominante -, que a questão é de ser resolvida conforme o regime legal da responsabilidade subjetiva (C.Civ. art. 15), a matéria é infraconstitucional, insusceptível de reexame no recurso extraordinário (...).[12]

Apesar de proferido pouco antes ainda da vigência do novo código civil, o voto do outrora Procurador-Geral da República e Ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Sepúlveda Pertence, enfrenta a matéria de forma clara. Observe-se que primeiro foi analisada a questão de estar ou não a tese recursal (da responsabilidade subjetiva por omissão estatal) abrangida pelo art. 37, §6º, da CF/88. No acórdão, o Tribunal reconhece a falta de alcance deste dispositivo à espécie, concluindo que a responsabilidade civil do Estado, em se tratando de omissão, é subjetiva. Via de consequencia, não incidindo o art. 37, §6º nem havendo na Constituição Federal outro dispositivo que regulamente a questão, entendeu-se pela infraconstitucionalidade da matéria. Ademais, se é subjetiva a responsabilidade, imprescinde-se da prova de culpa, cuja análise (fatos e provas) se faz inviável em sede extraordinária. Todos os aspectos foram, portanto, analisados, para se chegar à ilação de impossibilidade de exame de fatos e provas, o que não fica claro nos julgados atuais do excelso pretório.

Dentre as instâncias ordinárias, entendeu pela tese subjetiva, na responsabilidade civil estatal pelos acidentes de trânsito causados por animais livres, a Justiça Federal da 1ª Região, no seguinte julgado:

ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE EM ESTRADA FEDERAL. ANIMAL NA PISTA. OMISSÃO DO DNER QUANTO À MANUTENÇÃO DA RODOVIA. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. AUSÊNCIA DE PROVA DE CULPA EXCLUSIVA OU CONCORRENTE DA VÍTIMA. DANOS MATERIAIS DEVIDOS (...).[13]

Já as Justiças Federais da 2ª e 5ª Regiões, nos casos de acidentes de trânsito causados por animais livres, entendem pela responsabilidade civil objetiva do Estado, mesmo na omissão, com lastro no art. 37, §6, constitucional:

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANO MATERIAL. ACIDENTE DE VEÍCULO. RODOVIA FEDERAL. ANIMAL MORTO NA PISTA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. (...) em hipóteses de colisão de veículos com animal na pista, a responsabilidade afigura-se objetiva, acompanhando o espírito finalístico da regra inscrita no art. 37, § 6º, da Constituição Política de 1988 (...).[14]

RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. ATROPELAMENTO DE ANIMAL EM RODOVIA FEDERAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO (POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL) E DO DNIT. NEXO DE CAUSALIDADE. PROVA. DANOS MATERIAIS. DIREITO À INDENIZAÇÃO. (...) A orientação que vem prevalecendo nas Turmas da Suprema Corte é no sentido de que subsiste a responsabilidade objetiva em se tratando de conduta omissiva, devendo esta ser apurada pela existência de um dever jurídico, inadmitindo-se a designada omissão genérica (...).[15]

Curiosamente, há quem entenda tratar-se a presença de um animal na pista de rolamento de força maior ou caso fortuito, para excluir a responsabilidade estatal, em caso de acidente de trânsito. Nesse sentido, o seguinte julgado, oriundo da Justiça Federal da 4ª Região:

SEGURO. AÇÃO DE REGRESSO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ANIMAL NA PISTA (CASO FORTUITO). RESPONSABILIDADE CIVIL (INEXISTÊNCIA). FATO IMPREVISÍVEL. RESSARCIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A responsabilidade civil da Administração por omissão é subjetiva, impondo-se a comprovação da culpa (...). 2. Seja na hipótese de responsabilização por ação, seja por omissão, podem incidir eventos externos à pretendida relação causal que se mostrariam verdadeiras causas, quebrando o nexo de causalidade. (...) Deve-se reconhecer, portanto, que a presença repentina de um animal na rodovia trata-se de um caso fortuito, imprevisível e na prática absolutamente inevitável (...).[16]

A decisão, na completa oposição à evolução da teoria, coloca o Estado como ente intangível, irresponsável. Caso fortuito e força maior são fatos imprevistos e imprevisíveis, que, uma vez que surgem, tornam o evento inevitável. Partindo-se do próprio conceito desses institutos, é inadmissível entender que a presença de um animal na pista de rodagem de uma auto-estrada é fato imprevisível, a ponto de qualificá-lo como fortuito. Tanto não o é que o Poder Público mantém aparato para retirar esses animais da pista, como já dito.

4.3.  Sinistros causados por animais em rodovias administradas por concessionárias

Nos casos de acidentes veiculares causados por animais em vias públicas sujeitas à concessão, o aspecto jurídico da matéria muda de figuração. É que, em se tratando de rodovias administradas por particulares, em que os condutores, além da contraprestação tributária que já providenciam ao Estado, têm que pagar a tarifa (ou taxa, como queira) ao particular concessionário – o chamado pedágio –, o que haverá, em verdade, é a prestação de um serviço, nos termos do Código de Defesa do Consumidor. Ora, como se sabe, a relação de consumo atrai a responsabilidade objetiva daquele que presta o serviço (art. 14 do CDC).

Pela responsabilidade civil objetiva do concessionário, vejam-se os seguintes julgados; o primeiro deles, da lavra do falecido ministro do STF, Carlos Alberto Menezes Direito, à época no STJ :

CONCESSIONÁRIA DE RODOVIA. ACIDENTE COM VEÍCULO EM RAZÃO DE ANIMAL MORTO NA PISTA. RELAÇÃO DE CONSUMO. As concessionárias de serviços rodoviários, nas suas relações com os usuários da estrada, estão subordinadas ao Código de Defesa do Consumidor, pela própria natureza do serviço. (...) Entre o usuário da rodovia e a concessionária, há mesmo uma relação de consumo, com o que é de ser aplicado o art. 101, do Código de Defesa do Consumidor (...).[17]

O STJ, no julgado acima, afirma a responsabilidade objetiva do prestador do serviço, com força no Código de Defesa do Consumidor – CDC. Melhor seria que tivesse mencionado o art. 14 em suas razões de decidir, em lugar da menção ao art. 101, que, em verdade, trata apenas de aspectos acessórios à responsabilidade civil, como a fixação do foro e a possibilidade de denunciação da lide a eventual seguradora contratada pelo réu.

Neste outro, ainda do STJ, intérprete maior da legislação ordinária federal, frise-se, o tribunal reafirma o entendimento de que a concessionária responde objetivamente em caso de sinistro ocorrido na rodovia por ela administrada, nos termos do CDC:

RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE EM ESTRADA. ANIMAL NA PISTA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES. (...) as concessionárias de serviços rodoviários, nas suas relações com os usuários, estão subordinadas à legislação consumerista. Portanto, respondem, objetivamente, por qualquer defeito na prestação do serviço, (...) inclusive, pelos acidentes provocados pela presença de animais na pista (...).[18]

Há ainda este outro caso concreto, julgado pelo TJ/SP, em que a vítima conseguiu identificar o particular proprietário do animal, e moveu sua ação indenizatória contra ambos: particular guardião do animal e particular concessionário do serviço. Ambos foram condenados, em solidariedade:

ACIDENTE DE VEÍCULO. ATROPELAMENTO DE ANIMAL EM RODOVIA. (...) RESPONSABILIDADE DO DONO DO ANIMAL (...) E DA PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO AUTOVIAS. (...) RESPONSABILIDADE DOS CO-APELANTES OBJETIVAS E CONCORRENTES. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA (...).[19]

Como o julgado acima, há muitos outros, os quais, por economia de espaço, furtamo-nos de colacionar. Entrementes, pela análise de todos eles, a vítima restará sempre albergada pela responsabilidade objetiva da concessionária da via, com lastro no CDC, e esta pela responsabilidade objetiva do particular, com apoio no art. 936 civil.

Há, porém, interpretações injustificáveis, como a observada na decisão proferida pelo STF, de relatoria do ex-ministro Nelson Jobim, que julgou pela ilegitimidade passiva do Poder Público, atribuindo a obrigação de reparar o dano apenas ao dono do animal:

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. (...) O acórdão recorrido concluiu que a DERSA [concessionária de serviço público], por não ter poder de polícia, descabia guardar animais pertencentes a terceiros [sic]. Transcrevo parte da doutrina de HELY LOPES MEIRELES [sic], citada no acórdão recorrido: “... o artigo 37, par. 6º, só atribuiu responsabilidade objetiva à administração pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causem a terceiros. Portanto, o legislador constituinte, [sic] só cobriu o risco administrativo da autuação [sic] ou inação dos servidores públicos; não responsabilizou objetivamente a administração por atos predatórios de terceiros...”. Ressalto, por último, que a culpa exclusiva da vítima não é a única excludente da responsabilidade. São excludentes o fato de terceiro, o caso fortuito e a força maior. Nego provimento ao agravo regimental, por improcedente.[20]

Demais das fraquezas com relação ao vernáculo (incluindo o nome do doutrinador, grafado erroneamente) e das atecnias jurídicas presentes no texto (o relator simultaneamente julgou o recurso improvido e “improcedente”), tecnicamente não haveria que se falar em fato de terceiro, que é o nomen iuris consagrado para as hipóteses do art. 932 do CCB/2002, que nada têm a ver com o caso. Pode-se falar em evento provocado unicamente por terceiro, que seria, portanto, aquele a ser responsabilizado, se não fosse, contudo, objetiva a responsabilidade. O entendimento esposado no acórdão inevitavelmente termina por retirar o alicerce que fundamenta a responsabilidade objetiva, que é a teoria do risco. O concessionário, responderia objetivamente porque estaria imerso no risco de prestar o serviço (art. 14, CDC).

Nesta outra recentíssima decisão, assaz curiosa, o juízo condenou a concessionária do serviço público na responsabilidade objetiva e na subjetiva:

ACIDENTE DE TRÂNSITO. ANIMAL NA PISTA LEGITIMIDADE PASSIVA DA CONCESSIONÁRIA E RESPONSABILIDADE CIVIL CARACTERIZADAS, JÁ QUE INCUMBE A ELA A FISCALIZAÇÃO E REMOÇÃO DO ANIMAL. (...) Bem reconhecida sua responsabilidade indenizatória, portanto. Não só no aspecto objetivo, como também no aspecto subjetivo, tendo em conta sua conduta culposa, decorrente da falta de fiscalização e remoção do animal na pista (...).[21]

Apreciando os casos desta forma, não há como o judicante errar a fundamentação, porque, por certo, ou a responsabilidade civil é de uma espécie, ou de outra.

Por fim, no seguinte julgado, também proferido recentemente, entendeu-se pela responsabilidade objetiva do Estado, com apoio no art. 37, §6º, independentemente de ser dele, diretamente, ou de um concessionário, a incumbência de fiscalizar a via:

ACIDENTE. RESPONSABILIDADE CIVIL. AUTARQUIA ADMINISTRADORA DE RODOVIA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA POR DANOS CAUSADOS POR COLISÃO DE VEÍCULO COM ANIMAL NA PISTA. CUIDADO E VIGILÂNCIA INSUFICIENTES. PRESTAÇÃO DO SERVIÇO DE FORMA INADEQUADA E INSEGURA. Mesmo quando o Estado utiliza terceiros (agentes) para a prestação de serviços públicos, ocorrendo danos, responde objetivamente, sem prejuízo da via de regresso (art. 37, §6° da CF) (...).[22]

Os fundamentos desse entendimento – quanto a ser o Estado responsável, ainda quando haja feito concessão a particulares no tocante à administração da via – são até compreensíveis.  O que se revela absolutamente atécnico é denominar de concessionária a autarquia responsável pela fiscalização da estrada. Quando o Estado presta serviço mediante autarquias, é o Poder Público quem está presente, e não terceiro em seu nome. O Poder Público atua, ele próprio, por seus órgãos (administração direta) ou entidades (administração indireta). Concessão, permissão, autorização, cessão; todas estas são formas de utilização de bem público por particulares, o que não seria o caso.


5. Conclusão – a previsão legal do Código de Trânsito Brasileiro

Como visto, a grande e forte parte da doutrina, a maior parte da jurisprudência do STJ, grande parte da jurisprudência dos tribunais federais e tribunais de justiça, e, ao que parece, a maior parte da jurisprudência do STF, inclina-se no sentido de aceitar a tese subjetiva para a responsabilização civil do Estado, nos casos de omissão, a exemplo do que ocorre nos acidentes de trânsito causados por animais na pista, não sujeitos à propriedade de um particular identificado. Para estes doutrinadores e tribunais, a omissão não está abrangida pelo art. 37, §6º, da Constituição Federal.

Já para outra banda doutrinária, e para parte da jurisprudência nacional, incluindo alguns ministros do STF, a responsabilidade civil do Estado, nos acidentes veiculares causados por animais livres, em trânsito na via pública, bem como nas omissões em geral, é objetiva, com lastro no mesmo art. 37, §6º, constitucional.

Nenhuma dessas decisões está inteiramente correta.

Há uma determinação legal que pouquíssimos julgados expõem, e que sacramenta o tema, com exatidão. Trata-se do art. 1º da Lei 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro – CTB), verbis:

Art. 1º - O trânsito de qualquer natureza nas vias terrestres do território nacional, abertas à circulação, rege-se por este Código.

(...)

§2º - O trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito (...);

§3º - Os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito respondem, no âmbito das respectivas competências, objetivamente, por danos causados aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro na execução e manutenção de programas, projetos e serviços que garantam o exercício do direito do trânsito seguro.

É dever do Estado, por seus órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, propiciar um trânsito em condições seguras. Na forma da lei, estes mesmos órgãos e entidades responderão, objetivamente, por danos causados aos cidadãos em virtude de ação ou omissão na execução dos programas ou serviços relacionados. Logo, claro está que a responsabilidade civil do Estado e de seus órgãos e entidades, neste tocante, é objetiva, porque prevista em lei desta maneira.

A rigor, as decisões relativas a ações de reparação civil em acidentes de trânsito motivados por animais, ajuizadas contra o Poder Público, deveriam estar, todas elas, fundamentadas no dispositivo (art. 1º, §3º) do Código Brasileiro de Trânsito. Contudo, não é isso que se observa, como se viu, ao longo do estudo. Cogita-se das mais variadas teses – umas mais, outras menos adequadas – quando a solução da questão, no mais das vezes, não é de difícil complexidade.

É importante deixar marcado algumas questões. A primeira delas, que se cerra fileira com a doutrina e a jurisprudência dominantes – e isto é assunto repisado – no sentido de que a responsabilidade estatal pelos atos omissivos é subjetiva, e que tais atos não estão albergados no art. 37, §6º, da Constituição Federal.

Esta, no entanto, é uma regra. Na ausência de previsão na legislação infraconstitucional, a responsabilidade do Estado, nas omissões, será subjetiva, porque se entende que o art. 37, §6º só se aplica aos atos comissivos, do mesmo modo que a responsabilidade do particular será sempre subjetiva, se o caso concreto não se enquadrar em alguma das modalidades de responsabilidade objetiva previstas na lei.

Observe-se o seguinte julgado, tecnicamente adequado:

RESPONSABILIDADE CIVIL. ANIMAL NA PISTA. RODOVIA ESTADUAL ADMINISTRADA PELO DEPARTAMENTO DE ESTRADAS DE RODAGEM DO ESTADO DE SÃO PAULO. (...) No caso de acidente com animal da pista, a Administração responde pela omissão em adotar as providências necessárias para impedir que animais circulem soltos nas rodovias, uma vez que o trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito de suas competências, adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito (Lei n. 9.503/97, art. 1º, §2º). Dentro desse âmbito de compreensão, a responsabilidade só é afastada se demonstrada a existência de causas excludentes da responsabilidade, tais como a culpa exclusiva da vítima ou ocorrência de caso fortuito ou força maior, hipóteses, no caso, não verificadas.[23]

Observe-se que não se está a cambiar a natureza do ato: deixar de remover um animal da pista de rolamento, bem como deixar de tapar um buraco de grandes proporções, são atos omissivos que põem em risco a segurança de trânsito. A espécie de responsabilidade civil do Estado, neste caso, é objetiva, porque assim está previsto em lei específica. Portanto, não julgam corretamente, segundo os preceitos esposados neste estudo, os tribunais que condenam o Estado na responsabilidade subjetiva, ou na responsabilidade objetiva genérica.

A questão ganha profundidade quando se trata de sinistro ocorrido na zona urbana, com animal pertencente a particular. Haveria de se aplicar o CTB, condenando o Estado objetivamente, em qualquer caso?

A resposta positiva seria uma primeira conclusão. Não foram encontradas decisões judiciais que enfrentassem o problema. Com efeito, todos os julgamentos de sinistros ocorridos dentro das ruas e avenidas da zona urbana, encontrados durante a pesquisa, foram proferidos em ações que foram direcionadas contra o dono do animal.

A nosso entender, a questão reside em identificar a quem compete o dever de vigilância, no dado caso concreto. É que, se justificarmos não ter havido, no “caso do jornal”, para citar como exemplo (vide item 4.1), a falta do serviço, estaremos incutindo na questão o elemento da culpa, que é inerente à teoria subjetiva.

Os aspectos históricos da responsabilidade civil deslindam o problema. A teoria do risco, que fundamenta as hipóteses de responsabilidade objetiva, historicamente, origina-se da noção do dever de vigilância. O guardião do animal é responsável objetivamente porque a ele incumbe o dever de vigilância sobre a coisa. Num caso como o que o Tribunal de Justiça de Mato Grosso analisou, em que o cão escapou à rua em fração de segundos, e, em igual intervalo de tempo, veio a causar um acidente, não seria razoável exigir do Estado dever de vigilância, pois o cão, instantes antes, estava confinado à residência do particular. E se não o seria, não haveria de incidir, naquela hipótese, o risco que, objetivamente, torná-lo-ia o responsável. O dever de vigilância é preexistente ao evento danoso.

Cuidando-se de res nullius, não há dúvidas de que o Estado há de ser responsabilizado, pois a ele é dado o dever de propiciar um trânsito seguro, seja na rodovia, seja na região urbana, sem mencionar que a remoção desses animais sem dono é política de promoção de saúde pública.

Ainda que a responsabilidade do Poder Público em acidentes de trânsito causados por animais seja objetiva, com lastro no CTB, cabe ao magistrado, com prudência, aplicar a razoabilidade, quando da análise de cada caso concreto.


REFERÊNCIAS

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[1]DI PIETRO, op. cit., pp. 656, faz apanhado de julgados controversos entre as duas turmas do STF, nos anos 90.

[2]O Ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), é árduo defensor da tese objetiva para a responsabilidade civil do Estado, em qualquer hipótese, seja de ação ou de omissão. Nesse sentido, trecho de seu voto, condutor da tese vencedora nos autos do AgRSTA 223/PE, para citar decisum mais atual, publicado em 08/05/2008: “(...) situações configuradoras de falta de serviço podem acarretar a responsabilidade civil objetiva do Poder Público, considerado o dever de prestação pelo Estado, a necessária existência de causa e efeito, ou seja, a omissão administrativa e o dano sofrido pela vítima, e que, no caso, estariam presentes todos os elementos que compõem a estrutura dessa responsabilidade (...)”. Sítio virtual do STF. Disponível em: <http://www.stf.jus.br//arquivo/ informativo/documento/informativo502>. Acesso em 20 dez. 2011.

[3] TJ/SC. AC 2008.027386-5. Relator Des. LÉDIO ROSA DE ANDRADE. DJ 16/03/2009.

[4] TJ/MT. AC 2009.44441. Relator Des. SEBASTIÃO DE MORAES FILHO. DJ 16/08/2010.

[5] TJ/MS. AC 744.754. Relator Des. ATAPOÃ DA COSTA FELIZ. DJ 30/06/2000.

[6] STJ. REsp. 59.611/BA. T4. Relator Min. RUY ROSADO DE AGUIAR. DJ 14/08/1995.

[7] STJ. REsp. 438.831/2002/0068815-1 RS. T2. Relator Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA. DJ 02/08/2006.

[8] STJ. REsp. 1.198.534/2010/0114221-6 RS. T2. Relatora Minª. ELIANA CALMON. DJ 20/08/2010.

[9] STJ. REsp. 1.173.310/2010/0002471-0 RJ. T2. Relatora Minª. ELIANA CALMON. DJ 24/03/2010.

[10] STF. AgR-RE 235.524/AC. T1. Relator Min. SEPÚLVEDA PERTENCE. DJ 20/08/2004.

[11] STF. AgR-RE 585.007/DF. T1. Relator Min. RICARDO LEWANDOWSKI. DJ 05/06/2009.

[12] STF. RE 237.561/RS. T1. Relator Min. SEPÚLVEDA PERTENCE. DJ 05/04/2002.

[13] TRF1. AC 7343/1998.35.00.007343/GO. T5. Relator Des. FAGUNDES DE DEUS. DJ 04/07/2008.

[14] TRF5. AC 324024/0003228-56.2002.4.05.84/RN. T4. Relator Des. MARCELO NAVARRO. DJ 17/07/2006.

[15] TRF2. ACReex. 2006.51.02.005267-4/RJ. T7. Relator Des. JOSÉ ANTÔNIO LISBOA NEIVA. DJ 26/11/2010.

[16] TRF4. 2006.70.00.017975-2/PR. Relatora Des.ª MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA. DJ 02/04/2009.

[17] STJ. REsp. 467.883/RJ. T3. Relator Des. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO. DJ 01/09/2003.

[18] STJ. REsp. 647.710/RJ. T3. Relator Des. CASTRO FILHO. DJ 30/06/2006.

[19] TJ/SP. AC 2003.1205853-6. Relator Des. PAULO RAZUK. DJulgto 10.02.2004.

[20] STF. AI 402.967/SP. T2. Relator Min. NELSON JOBIM. DJ 04.04.2003.

[21] TJ/SP. AC 9145043-97.2009.8.26.0000. Relator Des. FRANKLIN NOGUEIRA. DJ 04.10.2011

[22] TJ/SP. AC 0099404-20.2006.8.26.0000. Relator Des. LEONEL COSTA. DJ 30.06.2011.

[23] TJ/SP. AC 0164575-21.2006.8.26.0000. Relator Des. JOSÉ SANTANA. DJ 14.03.2011


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VERÇOSA, Alexandre Herculano. Responsabilidade civil do Estado e de particulares em acidentes de trânsito provocados por animais. Análise da doutrina da responsabilidade civil e apanhado da jurisprudência nacional . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3194, 30 mar. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21387. Acesso em: 23 abr. 2024.