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O contrato de Hedge-Hedging

O contrato de Hedge-Hedging

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I. INTRODUÇÃO

Nova Iorque, 1929. O mundo desestabilizado pela crise gerada após a Primeira Guerra Mundial sofre com aquele que seria considerado o maior impacto sobre a economia no século XX. Investidores, que dantes confiavam cegamente nos postulados de Adam Smith observam pela primeira vez uma crise de superprodução; pela primeira vez, em nível internacional, o mercado não consegue absorver o que produz.

E isto serviu de lição. O mercado internacional não é nenhum brinquedo, e as empresas que sobreviveram ao crack de Nova Iorque aprenderam isso muito bem, que dirá as que não sobreviveram. Os sérios homens de negócios, doravante, demandaram maior segurança em seus investimentos. E a Segunda Guerra Mundial repetiu a recessão do entre-Guerras.

Hoje em dia, e cada vez mais, o mercado é facilmente abalado por crises avassaladoras, como foi a do México e a das Bolsas asiáticas recentemente, e como tem sido atualmente a tensão financeira criada pelos problemas da indústria de tecnologia o medo incitado pela questão do Oriente Médio, e conseqüente alta dos preços do petróleo. A celeridade de que se revestem as negociações do mercado internacional hoje, sobretudo com as facilidades criadas entre os países integrantes dos Blocos Econômicos, as grandes somas de capital que envolvem as chamadas megafusões – questões mais atuais no painel financeiro mundial – facilitam em muito as crises em nível internacional.

A questão da proteção, em tempos neoliberais, aponta cada vez mais para a procura de segurança por meio de instituições particulares, ligadas diretamente ao mercado especulativo, e que sejam tão sólidas a ponto de oferecer seus préstimos àqueles que navegam em águas tão atormentadas.

Num mercado tão predatório, empresas consideradas antes sólidas torres, podem ser derrubadas em um único dia, e grandes impérios podem ser derrotados por uma ou outra negociação errada. Hoje e doravante, o mercado demanda e demandará cada vez mais decisões rápidas. Essa celeridade, por sua vez, deve ser revestida de proteção.

Mas, que proteção pode oferecer um contrato em um mercado em que milhares de negócios são fechados e rescindidos diariamente, do momento em que se abre o pregão da bolsa de Hong Kong até o fechamento do índice Dow-Jones?

Essas metamorfoses a que se sujeitam as finanças mundiais têm sido tema de inúmeras discussões sobre os benefícios (e conseqüentes males) do processo de Globalização que vemos operar-se a pleno vapor atualmente.

É a partir desse cenário que apresentaremos um mecanismo de proteção, o contrato de hedge-hedging.


II. DESENVOLVIMENTO

1. HISTÓRICO

Inicialmente, o hedge foi estabelecido apenas pelo "The A. W. Jones Group", o qual foi fundado em 1o de Janeiro de 1949. Como uma maneira de reagir à instabilidade econômica do pós-guerra, o instrumento de hedging foi visto com bons olhos. A proteção que o hedge passava a oferecer, não ainda no âmbito do mercado de derivativos, mas em termos de estoques de indústria, pode ter sido um dos fatores que influenciaram a crescente industrialização estadunidense dessa época. Além disso, a partir da Segunda Guerra Mundial, sob pretexto de ajuda humanitária, os eua contribuíram com os países da Europa (plano Marshall), e assim puderam aumentar suas exportações tanto quanto tiveram de aumentar as importações. Essa dependência do mercado externo criou a necessidade de se explorar de maneira segura as transações industriais e internacionais, o câmbio em moeda estrangeira, etc. É nesse panorama que nasce e se expande o hedge.

É claro que experientes homens de negócios do mundo todo acabaram vislumbrando as vantagens que ofereciam esse contrato, e logo tornou-se muito utilizado no mercado de derivativos, que se expandiu muito desde os anos 60. Por essa razão, o hedge tornou-se um contrato muito diferente daqueles que se usa celebrar. Apesar de oferecer segurança, não é como um contrato de seguro. Oferece uma proteção, embora alguns prefiram utilizar sua margem de risco (em um caráter especulativo). O hedge não é o mesmo do criado pelo A. W. Jones Group, mas suas bases ainda resistem, e as estratégias do Group podem ser aplicadas até mesmo nos dias de hoje.


2. CONCEITO

O hedging (do inglês, cerca, muro, barreira, proteção ou cobertura de riscos) é o método de dirimir os riscos de perda, causados pela flutuação do preço. Consiste na compra ou venda a termo de produtos semelhantes, em dois mercados diferentes, com a expectativa de compensar lucros e prejuízos, por se encontrarem em posições opostas.

O termo hedging caracteriza uma transação comercial que visa primordialmente uma proteção contra os riscos do mercado financeiro. "Trata-se de operação que economicamente consiste numa cobertura contra os riscos das variações e oscilações dos preços", conceitua o insigne comercialista, Waldirio Bulgarelli "é, assim, uma das formas das chamadas operações futuras (futures)". (Bulgarelli, 2000, pg. 269)

Segundo Celso Ribeiro Bastos, outro estudioso no assunto, "o hedge tem a finalidade de proteger alguém de eventuais perdas resultantes de aumento do valor de seus bens" (Bastos, 1990, pg. 165).

São vários os motivos para se fazer um contrato de hedge, entre eles: obrigação de pagar, quando se compra em moeda estrangeira, resultado de uma compra efetuada no exterior; empréstimo realizado em moeda estrangeira para movimentar o capital de giro de determinada sociedade; proteção de recurso externo que foi investido no país, e portanto, convertido em moeda nacional. Nos dois primeiros exemplos, a proteção está relacionada a um possível aumento no valor da obrigação decorrente de uma desvalorização cambiária, deste modo, "é necessário mais recursos para adquirir a moeda estrangeira necessária para o cumprimento de sua obrigação" (Bastos, 1990, pg. 165). E no terceiro caso, a desvalorização também é a causadora e dos riscos, pois ao converter capital estrangeiro em moeda nacional para viabilizar o investimento, a desvalorização da moeda local, reduz o valor absoluto dos investimentos se comparados ao valor investido inicialmente.

Essa estratégia aplica-se ao participante que, pela natureza de sua atividade econômica, é obrigado a manter "posições à vista" ou ativos cujos preços estão expostos à flutuações futuras. O mercado de derivativos(1) pode permitir que esse investidor se proteja transferindo o risco de mudança da tendência de preços que afeta de forma negativa o valor de sua posição a vista, para um terceiro que esteja disposto a assumir esse risco.

A operação de hedging é do tipo a termo, ou também chamada futures, baseia-se em um preço determinado no ato em que é estabelecida a venda; no entanto, a entrega é realizada em data posteriormente fixada, e como nos ensina Waldirio Bulgarelli "podendo ser liquidada pela diferença da cotação do registro do contrato e a do dia da liquidação (dia anterior)". Não se deve confundir contrato futuro, que consiste na venda a termo, com compra com entrega futura, que compromete a entrega da obrigação em data posterior. O hedging está relacionado em compra e venda a termo e venda a vista que caso se entrecruzem, são chamadas operações casadas(2).

A utilização do mecanismo de hedging está relacionada à proteção de um risco. Desta forma, quando é empregado com este escopo podemos considerá-lo como um "seguro" (mais a frente, encontrar-se-ão as diferenças entre o contrato de seguro e o contrato de hedge), entretanto, pode ser utilizado como forma de especulação, com o propósito de ganho financeiro, lucro.

O hedger (aquele que usufrui do hedging) protege-se dos riscos advindos da oscilação do mercado, transferindo o risco para os agentes financeiros que obtêm lucros ou prejuízos tentando prever as tendências do mercado; que por sua vez podem assumir a posição de hedgers ao revender no mercado futuro.

Geralmente, são grandes empresas do setor produtivo que se interessam pelo hedging como as que geram bens de capital, as que fabricam eletrônicos, carros, peças, como também, as ligadas ao setor agrícola.

Apesar do hedging visar proteção, um desvio do seu inicial objetivo foi realizado por ação de especuladores. Eles "apostam" (mais a frente, encontrar-se-ão as diferenças entre a aposta e o hedge) que determinado investimento terá maior rendimento que outro, fazem uma troca, assumem os riscos almejando auferir apenas retorno financeiro, lucro.

Os especuladores são a minoria no mercado, em regra, não estão ligados à atividade produtiva, como os que visam proteção. Também não tem, tal operação especulativa, amparo legal, conforme nota-se do voto dos relatores em jurisprudência do STJ.


3. NATUREZA JURÍDICIA DO CONTRATO DE HEDGE

A natureza jurídica do contrato de hedging é uma questão controvertida em nossa escassa doutrina, por apresentar várias peculiaridades. O Prof. Oscar Barreto Filho nos ensina que "o hedging, em si mesmo, não constitui figura diferençada do contrato, típico ou atípico, dotado de elementos originais e característicos. Por outro lado, a operação de hedging também não resulta da fusão de prestações ou elementos próprios de diferentes contratos, de modo a configurar-se como contrato misto (como é o caso, por exemplo, do leasing, do factoring e do franchising)". (Revista de Direito Mercantil, 1978, n.º 29, p.11ss).

Em contraposição, Caio Mário, uns dos maiores civilistas deste país, entende que a denominação "contrato de hedging" não é apropriada por não conter esse contrato caracteres típicos e próprios. Para ele, "é uma modalidade de operação de bolsa, com caráter aleatório, tendo por objeto a comercialização de mercadorias a termo" (PEREIRA, 2000, p.389). Nos ensina que "no hedging,..., inexiste uma figura contratual típica. Cada operação tem a sua autonomia negocial. Mas a interdependência é que constitui o hedging.". (PEREIRA, 2000, p.389)

O hedging não é visto unitariamente na operação de cobertura de riscos inerentes às operações de compra e venda, mas sim na união de dois contratos de compra e venda a termo, de mesmo objeto, contudo, uma das partes assume a posição ora de vendedor, ora de comprador. Não existe, em verdade, uma união instrumental de contratos, nem interdependência jurídica dos contratos, que são celebrados por pessoas diferentes.

Os dois contratos (de hedging e, de compra e venda a termo) são independentes para sua existência e validade. O de hedge existe paralelamente, apenas para cobrir os riscos decorrentes da variação de preços.

Não há que se falar em um contrato unitário de hedge, mas sim de uma figura extracontratual e que se define como uma operação econômica complexa, envolvendo dois contratos completos de venda a termo.


4. A OPERAÇÃO

Configura-se Hedge Natural, a posse de ativo e passivo na mesma moeda, como por exemplo nas empresas que importam para investir num setor e exportam um produto na mesma moeda. Diz-se, então, que se está "hedgiado", ou seja, casado.

Contudo, quando isto não ocorre, a empresa está un-hedged (descasada), há ativo e passivo em moedas diferentes, surge, assim, a necessidade de se procurar uma instituição financeira para evitar um possível prejuízo com a desvalorização de alguma moeda que está sendo utilizada. Neste caso, faz-se o hedge para se proteger de um risco. Convém um exemplo para ilustrarmos:

Uma determinada empresa "A" que comercializa derivados de milho, decide importar equipamentos em dólar para investir no setor produtivo, mas em contrapartida, só vende seus produtos no mercado interno brasileiro, ou seja, recebe na moeda corrente, o real.

Constata-se, então, que esta empresa é uma das que tipicamente precisa fazer hedge, pois ela está descasada. O investidor dirige-se ao banco e este, através de suas consultas, faz uma previsão estimada de que US$ 1,00 estará R$ 2,00 dali a 6 meses (prazo suposto para o vencimento da dívida em dólar), o que pode ou não se confirmar. Três hipóteses podem ocorrer, quais sejam:

a) o dólar realmente está R$ 2,00 seis meses adiante conforme o previsto. Não será oneroso a nenhuma das partes;

b) o dólar está R$ 1,90, abaixo do previsto. O investidor pagou a diferença que foi estabelecida para garantir que não iria ter prejuízo;

c) o dólar está acima do previsto, R$ 2,10. O banco é quem paga. O investidor recebe tudo que estiver acima dos R$ 2,00. Então, é R$ 0,10 sobre o valor de milhares de dólares que este fez a posição.

Este mecanismo de proteção estimou uma taxa para o dólar para um determinado período. Posteriormente, quando se apura esta taxa, o valor que estiver acima, o investidor recebe como crédito. Afinal, o que houve foi uma desvalorização da moeda brasileira em relação ao estimado.

Nota-se, que quando a empresa protege-se a R$ 2,00 o dólar, não importa se ele chegou a R$ 3,00, ela pagará a dívida no valor protegido (R$ 2,00) e irá receber a diferença, honrando, o banco, o acordo.

As operações de hedge, normalmente, envolvem um agente financeiro, via de regra um banco internacional em regra. Para que o banco realize uma operação de hedge com uma pessoa, é necessário que esta possua uma empresa, um cadastro e o limite de crédito aprovados. É, ainda, obrigada a assinar um Contrato de Derivativos, no qual consta que as repercussões podem ser positivas ou negativas, o que vai variar conforme o posicionamento da pessoa, e que determina também as coobrigações das partes (o banco e a pessoa).

O contrato de hedge pode ser levado a registro no Cartório de Registro Especial. Na prática, esta possibilidade é decidida caso a caso. Um dos motivos para que se registre pode ser a vontade do investidor, que exige tal ato, mas, geralmente, esta decisão é tomada pelo banco. Este o faz quando não tem total "confiança" no cliente, dependendo do crédito da pessoa. Se for alto, o agente financeiro, claro, "dispensa o investidor de tal incômodo".


5. DO PAGAMENTO

O hedge, não necessariamente, movimenta dinheiro, pois há dois tipos: 1º) O hedge com caixa, que é o com recursos; 2º) O hedge sem caixa, que é sem recursos.

Com caixa o investidor dirige-se ao banco com uma determinada quantia de reais e aplica num papel em dólar, o export notes que existe no mercado, ou seja, aplica em dólar para que tenha um ativo e um passivo casados.

O cliente do banco tem três maneiras de pagar por estas operações:

a) no final da transação, no prazo, o pagamento é feito no vencimento da obrigação que motivou o hedge;

b) no ato, na ocasião do fechamento do contrato;

c) o pagamento dia a dia.

Quando se decide pelo pagamento no ato, está, na realidade, fazendo-se a chamada Opção, uma operação do mercado de derivativos, que nada mais é que um hedge. A desvantagem deste procedimento é que o custo pago no ato é o que está sendo estimado, na realidade ele poderá ser constatado como mais baixo mais para frente, mas como diz o próprio nome, é uma opção do cliente.

Quanto ao pagamento diário, é chamado de Ajuste de Margem. Ele rege-se pelo movimento da Bolsa de acordo com o posicionamento do cliente, pois se for necessário cobrir a margem devido à alta ou baixa, por exemplo, do dólar, o cliente terá de fazê-lo hodiernamente. Esta forma, em regra, não é adotada pelos bancos, devido às dificuldades trazidas pelos constantes reajustes.

Quanto a empresa gasta para fazer um hedge? Paga-se ao banco?

Quando o banco estipula uma taxa de R$ 2,00 o dólar para o cliente, como naquele exemplo, já tem seu custo analisado, pois possivelmente está comprando o dólar a R$ 1,50 de um terceiro e vendendo para o investidor que quer fazer hedge por R$ 2,00. O banco tem lucro sobre as transações de seus clientes. Assim, o investidor não irá ter despesas com o instrumento de hedge: apenas, se fechar a cotação acima do previsto, receberá e, se fechar abaixo, nada receberá.

Então, a empresa não gasta nada para fazer o mecanismo de hedge?

Na verdade, quando a empresa fez um contrato com o banco, ela assumiu um risco. O agente financeiro ganhou sobre ela, pois usou uma taxa já compondo o lucro dele. A empresa pagou por fazer, como num seguro de vida, se morrer ganha o prêmio, se não morrer, não ganha.

O "lucro" para o cliente, na realidade, quando visa proteção, é o que ele deixou de pagar. Por exemplo, o cliente deve US$ 100.000,00, quando a cotação está a R$ 1,00 o dólar, pode, sem a segurança do hedge, passar a dever R$ 300.000,00 se o dólar passar a custar R$ 3,00, ou seja, ao invés de dever R$ 200.000,00, como deveria a empresa que comercializa derivados de milho, que se protegeu a R$ 2,00 o dólar, passa a dever R$300.000,00, num prazo de 6 meses. Em resumo, deixou de ter um prejuízo.

O cadastro feito no banco, um pressuposto para a realização de hedge, não estabelece prazo, mas quando se fizer um contrato, nele estará estipulado um valor, um prazo, a taxa, a moeda ou a taxa de juros e etc., mas isto não ligado à obrigação motivadora (empréstimo, dívida em qualquer moeda ou indexador), afinal o contrato de hedge é um contrato paralelo. Assim, uma empresa pode decidir fazer um hedge a qualquer tempo, mesmo que seja por um ou dois dias; se uma dívida em marco vence daqui a um ano, a empresa pode fazer hedge, se assim quiser, apenas no 8º mês. Afinal, o custo para manter esta proteção por um período longo é, normalmente, alto.

É de se notar que o custo é mais caro quanto maior for a procura. Em uma época de desvalorização da moeda corrente, há grande procura e pequena oferta. Os bancos se comunicam, suas tesourarias trocam informações, resultando em elevação do custo conforme o aumento do risco.

O contrato de hedge, além de poder ser feito a qualquer tempo, pode também ser cancelado a qualquer momento, ou seja, há a possibilidade de ele ser recomprado antes de esgotado o prazo estabelecido. Se feito para 6 meses, pode ser anulado logo no 1º mês, por exemplo, basta que o banco concorde.


6. O HEDGING E O MERCADO DE DERIVATIVOS

6.1- O Mercado de Derivativos

Antes de passarmos à exposição do mecanismo de hedging dentro do mercado de derivativos, mister se faz compreendermos o que vem a ser este tipo de mercado e quais seus sub-tipos mais comuns, para que possamos então concluir onde se encaixa o mecanismo de hedge nesse tipo de mercado.

Um derivativo é um instrumento cujo valor decorre (ou deriva) do valor de um outro ativo, como por exemplo uma opção sobre ações da Telebrás, que tem seu valor dependente dos valores dessas ações, acompanhando suas altas e quedas e até mesmo oscilando conforme as expectativas sobre o valor das ações.

O mercado de derivativos compreende uma gama de segmentos, cada qual com lógica, regras e características próprias. São eles:

1 - Mercados a Termo, também chamados de Forwards;

2 - Mercados Futuros, os denominados Futures;

3 - Mercados de Opções; e

4 - Mercado de Swap.

6.2- Mecanismos Financeiros de Garantia

A fim de garantir a honra aos compromissos assumidos, mesmo que isso resulte em vultosos prejuízos, a Bolsa possui mecanismos próprios de garantia, que podem ser institucionais ou financeiros. Interessa-nos, porém, apenas os do último tipo, que passaremos a analisar agora. Duas são as espécies de mecanismos financeiros de garantia das Bolsas: o depósito de boa vontade, também chamado margem inicial; e o ajuste diário.

6.2.1- Do Depósito de Boa Vontade

Uma das maiores vantagens do mercado de Derivativos é também sua maior fragilidade: a capacidade de alavancagem, ou seja, a possibilidade de se ter enormes lucros ou vultosos prejuízos aplicando-se pouco ou quase nada no início da transação. Daí sua fragilidade: o investidor, ou a empresa que firmaram um compromisso podem ter um prejuízo cujos valores ultrapassem sua capacidade para honrá-lo. Para garantir o adimplemento dos compromissos, sem no entanto retirar deles seu principal atrativo, é que surge o depósito de boa vontade.

Essa margem inicial consiste em um percentual do valor do contrato que é cobrado daqueles que mantiverem opções em aberto - sem liquidá-las de imediato. Tal percentual, baixo o suficiente para manter atrativo o negócio, mas suficiente para cobrir o risco de eventual inadimplência, é fixado, geralmente, calculando-se o potencial de flutuação dos preços de determinado ativo e fixando-se um valor que cubra com folga tal potencial.

6.2.2- Ajuste Diário ( Market to Market )

Os preços de um ativo podem variar muito em um período de tempo. Este é, aliás, um dos principais atrativos do mercado de Derivativos. Mas, se de um lado a oscilação pode trazer grandes ganhos, pode de outro trazer vultosos prejuízos a um investidor que veja seu ativo-objeto(4) oscilar negativamente durante o prazo do compromisso. Para evitar que o prejuízo seja muito grande, surge o mecanismo de ajuste diário das posições, também chamado market to market.

O mecanismo é bem simples. Consiste, basicamente, em um acerto de contas diário entre os contratantes. Analisando-se os preços de abertura e de fechamento do ativo, pagando-se o lucro resultante à parte ganhadora no dia. No dia seguinte, faz-se a mesma comparação, tomando agora como base o valor de fechamento do dia anterior. É como se a posição fosse renovada a cada dia em relação ao valor de fechamento do dia anterior, possibilitando, assim, a diminuição dos prejuízos para a parte perdedora, uma vez que raro é variar muito o preço de um ativo em um só dia(5).

6.3 O Hedging Dentro do Mercado de Derivativos

Analisadas as características básicas do Mercado de Derivativos, passemos à inserção do hedging dentro deste mercado.

O Mercado de Derivativos apresenta vários instrumentos, permitindo diversas estratégias financeiras, de acordo com os objetivos, avaliações de cenários, perfis de investidores. O mecanismo de hedging é uma dessas estratégias financeiras. Visa, primordialmente, proteger determinada empresa cujas dívidas dependam de um ativo que sofra oscilações freqüentes, de oscilações muito bruscas que resultariam na impossibilitação do pagamento das dívidas.

Pelo fato de a Bolsa cobrar taxas elevadas para garantir o adimplemento de compromissos assumidos, nem sempre - na verdade, quase nunca - compensa à empresa recorrer à Bolsa para fazer hedge. Na maioria das vezes as empresas recorrem a bancos privados, que têm a vantagem de não estabelecerem um custo inicial, mas limitam os contratos a um valor mínimo que hoje gira em torno de US$ 100.000,00.

Sendo um mecanismo que não gera tantos lucros, praticamente apenas cobrindo as perdas advindas do outro contrato, o hedging é principalmente utilizado para a proteção das empresas, sendo muito pequeno o número de investidores que se utilizam do hedging com fins especulativos: cerca de 90% dos contratos de hedging são voltados à proteção enquanto apenas 10% deles tem como finalidade a especulação.

Hedging é proteção contra riscos de oscilação de preços (que pode se descaracterizar com a especulação). A forma como essa proteção pode se dar varia de acordo com o risco da operação e com o perfil do investidor, que pode optar tanto por utilizar-se de mecanismos mais seguros, porém mais onerosos, ou de estratégias mais arriscadas, mas menos dispendiosas, uma vez que a oscilação prevista nem sempre ocorrerá. As estratégias mais comuns de hedge em bolsa - swap e opções - serão analisadas a seguir.

6.4 Estratégias de Hedge

Após breve exposição sobre o mercado de derivativos e da inserção do hedging dentro desse mercado, passaremos agora à analise das principais estratégias utilizadas para se proteger uma obrigação das variações do mercado.

6.5 O mecanismo de SWAP

Uma das estratégias utilizadas pelos investidores para fazer o hedge de suas obrigações é o chamado SWAP.

Swap, no mercado, é um acordo entre duas ou mais partes, afim de trocar fluxos de caixa a um período futuro, fluxos esses que podem se referir a moedas, taxas de juros ou indexadores. A operação cria uma "posição virtual" que pode eliminar um descasamento existente (hedge) ou modificar a posição inicial. Além do hedge, o swap serve às finalidades de Posicionamento (troca a natureza de ativos ou passivos e/ou aposta no diferencial entre dois indexadores) e Trading.

Apresenta como características peculiares:

a) As partes do contrato são denominadas contra partes;

b) O valor sobre o qual serão calculados os fluxos é denominado "Valor Nocional";

c) Negocia-se a diferença entre os dois fluxos definidos no swap;

d) O ajuste da operação é feito ao seu final, computando-se a diferença entre os dois fluxos negociados, não necessitando saída de caixa no início da operação, o que fez com que a operação ficasse conhecida no Brasil como "hedge sem caixa".

Os swaps, sendo operações de balcão6 apresentam as mesmas vantagens e desvantagens de toda operação de balcão - a realizada fora do mecanismo de bolsa. Como vantagens, podemos citar a variedade de produtos cotados (não há padrões obrigatórios, existentes nas Bolsas); flexibilidade de prazos e volumes (não há a imposição de limites no valor do contrato nem prazos pré fixados, ao contrário das Bolsas); não há a necessidade de um desembolso inicial (nas Bolsas, há o depósito de boa vontade, inicial). Já sua principal desvantagem é a inexistência de mecanismos de garantia institucional, o que aumenta o risco da operação. Para solucionar tal deficiência, os investidores nacionais têm registrado seus contratos de swap na BM&F que cobra uma taxa naturalmente mais elevada. Essa opção, no entanto, vem sendo pouco utilizada.

Mas como se pode utilizar o mecanismo de swap para se fazer o hedge ? Simples. Imaginemos uma empresa que importe produtos em moeda estrangeira e os revenda no mercado interno. Ora, essa empresa terá passivo em dólares - ou outra moeda estrangeira, enquanto seus ativos serão em reais. Elevando-se a taxa de câmbio R$ X US$, o que não é uma raridade, a empresa pode ficar sem ativos suficientes para comprar dólares e, assim, saldar suas dívidas. Diz-se que as dívidas assim estão desprotegidas ( ou descasadas ou un-hedged). A empresa pode proteger-se fazendo um swap de moedas, trocando seu ativo para dólares ou seu passivo para reais, tendo, assim, menores prejuízos em uma possível maxi-desvalorização da moeda nacional face à estrangeira, ou seja, fazendo um hedge das dívidas

6.6 As Opções

A maioria das estratégias de hedge, prescindam ou não de uma despesa inicial, tem sempre um inconveniente: uma vez firmado o contrato, ele deve ser exercido. Ora, se o cenário final for realmente aquele do qual se buscou proteção, não há problemas para solver o compromisso, já que o investidor teria a ganhar. Mas, e no caso de o cenário final não condizer com aquele previsto? Se for um cenário onde o investidor não necessitaria do hedge? Na maioria dos casos, o investidor perderia a chance de ganho, tendo que honrar seu compromisso e exercer os valores, fixos, do hedge acordado.

Mas há um instrumento que parece ser o que todos os investidores pediram aos céus. Acorda-se um preço futuro e, se o cenário for favorável ao investidor, este tem o direito de não exercer o contrato.

Tais instrumentos, as chamadas opções, onde um investidor - chamado titular - compra de outro - o lançador - o direito de comprar ou vender determinado ativo por determinado preço em uma determinada data, não sendo, porém, obrigado a exercer o preço se, chegada a data, as condições não propiciarem.

Porém, como tudo, as opções não são perfeitas. Se de um lado elas propiciam ao titular apenas direitos e ao lançador apenas obrigações, seu preço é muito elevado e, pior, este preço, chamado prêmio7, deve ser pago no início da operação.

Sendo negociadas na Bolsa, as opções têm seus objetos padronizados. A BOVESPA, por exemplo, tem dois tipos de opções padronizadas sobre ações da TELEBRÁS - uma opção de compra e outra de venda de ações - e uma sobre dólar comercial, respectivamente as opções denominadas OTC6, OTC57 e JL 14.

Como, então, funcionaria uma estratégia de hedge utilizando-se opções? Um exemplo que pode ilustrar é ainda o da empresa importadora. Imaginemos agora que, aconselhada por especialistas, o empresário decida fazer o hedge utilizando opções. Como procederia? Bastar-lhe-ia comprar opções de compra de dólar, pagando o prêmio correspondente ao montante de moeda que pretende comprar, digamos, R$ 1,00 a cada US$1.000,00. Na data de vencimento, se lhe for conveniente, pode exercer a opção, e efetuar a compra, ou não, e comprar do mercado pelo preço do dia.

Caso inverso seria o de uma empresa exportadora, a quem a queda do dólar desinteressaria. Para esse empresário, a opção correta seria a opção de venda de dólar a um valor estabelecido. Compradas as opções, pago o prêmio, no vencimento da opção o empresário teria o direito de vender ou não os dólares ao preço acordado.

6.7 Outras Estratégias de Hedge

Após analise das principais estratégias de hedge no Mercado, apresentaremos agora, apenas a título ilustrativo, algumas outras estratégias de hedge que são utilizadas mundialmente nas Bolsas de Valores.

Tabela de Estratégias de Hedge no Mundo(8)

O Estilo

A Estratégia

Risco Esperado

Mercado Neutro

Posições a curto e longo prazo são tomadas igualmente; o foco é o "stock picking"

Baixo Risco

Arbitragem Conversível

Longo prazo em seguros conversíveis e curto prazo em "underlying equities"

Baixo Risco

Oportunística

"Trading" orientado

Baixo Risco/ Risco Moderado

Crescimento

Tem como alvo o real crescimento e o crescimento potencial de ganhos e

Risco

Moderado

Valores

Os mercados são escolhidos de acordo com fluxo de caixa e valores específicos

Risco

Moderado

Quantitativo

Baseia-se em análises feitas por computadores

Risco

Moderado

Distressed Securities

Compra os seguros de companhias em reorganização ou em bancarrota

Risco

Médio

Macros

Aposta em mudanças na economia global

Alto

Risco

Internacionais

Compra de Ações Internacionais

Alto

Risco

Leverage Bonds

Nivelamento aplicado aos "bonds" e derivativos de entrada fixa.

Alto

Risco

Mercados Emergentes

Compra de Ações em Mercados Emergentes

Risco

Muito Alto

Curto Prazo Apenas

Seguros individuais com posições a curto prazo

Risco

Muito Alto


8. PARTICULARIDADES

8.1- Singularidades do Hedge

A idéia principal do hedging – proteção – está profundamente vinculada à questão do risco, conforme já foi mencionado. O hedge nasceu do risco e sua única razão de existência reside nas perigosas oscilações do mercado de derivativos, de futuros, bem como a variação cambial. Desde o ano passado, o governo deixou de intervir nas variações cambiais como vinha fazendo. Embora as razões que levaram o governo brasileiro a tomar essa decisão não sejam de interesse específico para essa matéria, fato é que expôs empresários "descasados" a uma variação cambial alarmante, até os dias de hoje. Fato é, também, que aumentou a procura pelo hedge, mas tal número já se estabilizou, embora não se possa dizer o mesmo da política cambial.

Se a assustadora desvalorização do Real aumentou a procura pelo hedge nos poucos bancos que realizam esse tipo de contrato, pode parecer um mistério porque o hedge é ainda um ilustre desconhecido: é um contrato muito pouco divulgado, apenas poucos bancos o celebram, e neles a procura não é muita. Isso se deve a determinadas peculiaridades que o hedge apresenta frente a outros contratos.

Em primeira instância, o hedge não é um contrato unicamente bancário, como já se pôde perceber em seu histórico. Além disso, os contratos têm função de oferecer uma segurança jurídica, na medida em que firmam-se entre as partes os termos de negociação, e a palavra é registrada e acordada entre os contratantes. O hedge vai além, pois oferece também uma segurança econômica para quem o procura e um caminho de capitalização do risco por parte de quem o oferece.

O que se pode observar no mercado é a extrema elitização a que se sujeita o hedge. O contratante de hedge se enquadra num perfil muito restrito; apenas um pequeno número de empresas necessita especificamente de um contrato como este. Geralmente os hedgers são grandes empresas, que trabalham com valores de importação muito altos, e que têm uma boa situação de crédito no banco em que se opera o contrato. Por ser um contrato tão específico é que o hedge está restrito a uma pequena parcela do empresariado.

Tal elitização decorre do fato que um banco, para oferecer essa segurança (que é a idéia-base do hedge), corre riscos muito grandes. O hedge envolve índices flutuantes que, hoje em dia e cada vez mais, estão sujeitos a mudanças repentinas, quase automáticas. O mercado de futuros é um oceano de riscos que se tornam cada vez mais violentos, a verdadeira concepção de um "darwinismo financeiro". O banco que oferece um serviço como o hedge está ciente de que, para que possa promover tal proteção, estará expondo-se a um risco muito maior. É claro que o know-how de um banco nessa área é muito maior que de seu contratante, mas o risco é proporcionalmente grande.

O banco que contrata o hedge investirá no mercado de capitais internacional, seja o Dow-Jones, seja Nasdaq, para poder capitalizar o risco, transformar seu passivo em ativo no mercado estrangeiro. Operará swaps, medirá os lucros e os virtuais prejuízos, como é de hábito fazer. Todavia, nem todo banco poderá navegar com tanta facilidade nesse mar revolto, e é também por isso que o hedge é tão raro.

Além disso, os bancos estrangeiros, por terem maior experiência em mercado internacional, têm maior possibilidade de estarem "casados", pelo menos em relação aos bancos de atuação estritamente nacional.

O hedge pode, ainda, ser um investimento especulativo relativamente seguro. Apesar dessa característica secundária do hedge ser pouco utilizada (e, ressalte-se, nem mesmo a principal é muito usual), há que se mencionar o mecanismo especulativo que se pode mover com esse contrato.

Como as oscilações cambiais ocorrem repentinamente, sem que se possa perceber, em tempo hábil, quando tal ou qual moeda sofrerá desvalorização, esse caráter especulativo do hedge é muito pouco explorado.

9.2- Diferenças entre o hedge e o contrato de seguro

O contrato de seguro pode ser classificado como bilateral (posto que ambas as partes do contrato têm obrigações umas com as outras), oneroso (na medida em que gera rendimentos para as partes contratantes), consensual (porque representa as vontades de ambas as partes), aleatório (já que está adstrito a sinistro imprevisível) e de adesão (visto que as cláusulas são rígidas). Além disso, como o próprio nome já diz, o contrato de seguro visa proteger os interesses daquele que o realiza frente a uma seguradora.

O contrato de hedge também visa assegurar que os efeitos dos acontecimentos do mercado de derivativos não exerçam impacto negativo sobre as finanças daquele que contrata. Seria aproximadamente um contrato de seguro, mas não há que se confundir.

Primeiro porque o contrato de seguro é aleatório (apesar de o hedge também o ser), mas as os fatos a que se refere o "sinistro" são imprevisíveis (álea absoluta). Não há como saber quando um raio cairá sobre uma casa, por exemplo; enquanto que no mercado de derivativos a previsibilidade de acontecimentos (uma alta na cotação de tal ou qual safra) é muito maior, e os analistas financeiros existem justamente para isso. Além disso, o prêmio recebido pelo segurado tem caráter indenizatório, ou seja, objetiva reparar o dano causado, enquanto que o lucro auferido pelo hedger é, na realidade, uma maneira de evitar que um dano seja causado.

Dessa maneira, observa-se que o contrato de seguro não elimina o risco – não evitará que um raio caia sobre uma casa ou que o segurado morra. Apenas proverá financeiramente aquele que foi lesado, na medida em que repare as perdas em que o sinistro envolver. Nesse sentido difere em muito o hedge, porque a instituição financeira não terá de reparar dano algum, porque o contrato serviu para preveni-lo, para transferir os riscos que correria o hedger para a instituição financeira.

9.3- Diferenças entre o hedge e o jogo e a aposta

Tampouco há que se confundir o caráter especulativo do hedge com o jogo, ou a aposta. O caráter especulativo do hedge, é bem verdade, expõe o hedger a ganhar ou perder, mas não há como confundi-los, pois existem, diferenças estruturais no que se refere à álea.

O jogo, conforme conceitua o eminente douto Caio Mário da Silva Pereira é "contrato em que duas ou mais pessoas prometem, entre si, pagar certa soma àquele que lograr resultado favorável em acontecimento incerto" (Pereira, 2000, p. 332). Já a aposta é "contrato entre duas ou mais pessoas prometem, entre si, pagar certa soma àquele cuja opinião prevalecer em razão de acontecimento incerto" (Clóvis Beviláqua apud. Pereira, 2000, p. 332).

Em outras palavras, o jogo envolve probabilidades adstritas à ação humana ("lograr resultado favorável"), enquanto que a aposta envolve áleas absolutas e independentes de fato humano ("cuja opinião prevalecer em razão de acontecimento incerto"). Assim, joga-se para se saber quem é o mais destro em tal ou qual atividade; aposta-se para saber se um fato acontecerá ou não.

O hedger que se utiliza do contrato para fins especulativos está revestido de uma previsibilidade muito maior na medida que não se envolverão riscos diretos ao operar, uma vez que, conforme já foi dito, as mudanças nos derivativos são previstas com muita facilidade; o hedge não é um contrato de álea absoluta.

Embora o Código Civil, em seu artigo 1.479, equipare os contratos de Bolsa ao jogo, é notoriamente claro que há um erro material, e tais contratos são de interesse do Direito Comercial, e não do Direito Civil. E a doutrina tem se mostrado muito severa quanto à adoção desse dispositivo, conforme J. X. Carvalho de Mendonça, que estabelece a diferença entre esses contratos e o jogo, visto que os contratos visam a oferecer uma segurança econômico-jurídica, enquanto que o jogo e a aposta operam direta e eminentemente com o risco. (Perin Junior, p. 5)

Além disso, muitos jogos são tidos como contravenção penal, uma vez que a ação humana a que se sujeita o jogo pode envolver astuto ardil contra "jogador de boa-fé". O hedge não dá margem a esse tipo de fraude, uma vez que está adstrito a variações dos derivativos, que somente são controladas visando interesse de cada um dos investidores; logo não há como alguém controlar o índice Dow-Jones para levar vantagem em um hedge.


III. CONCLUSÃO

O mercado como um todo se rege pela interação interesse-necessidade; tem origem nessa interação, é movido por essa interação.

Dessa forma, não soaria absurdo para Adam Smith se lhe dissessem que o hedge exerce um papel quase que social para o desenvolvimento do mercado financeiro. Obviamente, não é pela benevolência de instituições financeiras que os investidores podem contar com contratos que oferecem maior segurança para seus investimentos e dessa maneira crescerem economicamente. Os bancos têm interesse e se beneficiam da necessidade dos investidores, mas não há como negar que o hedge, ainda que indiretamente, exerce uma função de rara importância para os grandes investimentos a futuro.

Certamente, o mercado internacional, hoje, não movimentaria as quantias que movimenta. E, mesmo para o mercado de derivativos, que envolve as maiores empresas, nacionais e transnacionais, informatizadas ou não, ao redor do mundo todo, os trinta trilhões de dólares anuais movimentados representam um número cuja expressividade não deve ser descartada, e se esses investimentos se vissem desprotegidos, com certeza a riqueza das nações ver-se-ia mergulhada no caos e na desordem: o darwinismo financeiro seria substituído pela total selvageria, e o mercado, já predatório, seria uma senda por demais impenetrável para aqueles que não estivessem preparados.


NOTAS

1. O Mercado de Derivativos é um conjunto de segmentos específicos de mercado, cada qual com sua lógica, regras, características conceituais e operacionais e critérios de formação de preço e apregoação.

2. Termo utilizado como jargão entre bancários. Refere-se à condição de ter-se ativo e passivo em mesma moeda, compensando-se em relação à variação de valores.

3. Cf apostila do Bank Boston

4 Ativo-objeto é todo ativo que serve de base para um derivativo, como, por exemplo, ações de uma companhia, taxas de juros, etc...

5 Esse mecanismo, aliado ao depósito de boa vontade diminui, mas não elimina por completo o risco de inadimplência, já que é possível, remotamente, que os preços de um ativo variem de tal forma em um só dia que produzam enormes prejuízos que não poderão ser pagos pelo investidor, nem cobertos pela margem inicial. É por essa razão que se criaram os mecanismos institucionais. Tais mecanismos, no entanto, não são imprescindíveis ao assunto ora em estudo, já que o hedging se utiliza mais do ajuste diário.

6 Operações de balcão é a denominação dada àquelas operações realizadas em bolsa que fogem de seus padrões e que, por isso mesmo, não têm regulamentação específica da Bolsa. Utilizando-se do mecanismo de swap.

7 As minúcias sobre o cálculo do valor do prêmio, com os modelos binomial e de Black & Scholles, por serem de cunho primordialmente econômico, interessando mais aos que lidam com ele diariamente, e pouco ou quase nada ao estudo ora realizado sobre o Hedge, não serão tratadas aqui.

8 Traduzido da tabela apresentada na página da internet : http://www.hedgemanager.com/stile_guide.html.


BIBLIOGRAFIA

BASTOS, Celso Ribeiro e KISS, Eduardo A. Gurgel. Contratos Internacionais.São Paulo: Editora Saraiva. 1990

BULGARELLI, Waldirio. Contratos Mercantis. 12ª edição. São Paulo: Editora Atlas. 2000

GRUPO OPÇÕES DE TREINAMENTO. Introdução a Derivativos. Apostila de Ensino da Fundação BankBoston

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 10º edição. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2000

SPINOLA, Noenio. O futuro do futuro: pequeno relatório de viagem ao mercado brasileiro de capitais e de trabalho no século XXI. São Paulo: Editora Futura. 1998

http://www.hedgemanager.com/stile_guide.html

http://www.tj.rj.gov.br


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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LENHARO, Ana Carolina Pereira; LOURENÇO, Daniel Pedro et al. O contrato de Hedge-Hedging. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 51, 1 out. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2143. Acesso em: 19 abr. 2024.