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A aplicação do princípio da insignificância nos crimes contra o patrimônio do Código Penal Brasileiro

A aplicação do princípio da insignificância nos crimes contra o patrimônio do Código Penal Brasileiro

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Embora não consagrado expressamente na Constituição Federal ou no Código Penal ou mesmo no Código de Processo Penal, o princípio da insignificância vem sendo aplicado pelos tribunais nacionais.

Resumo: O direito é definido como o conjunto de normas jurídicas que regulam a vida em sociedade. Tais normas devem ser encaradas em sentido amplo, devendo ainda o conceito abranger as ideias de princípios, costumes etc. Os princípios atualmente encontram grande importância na aplicação prática do direito de modo geral. Ainda que muitos deles não estejam previstos expressamente na Constituição Federal ou na lei, cada dia mais têm-se a necessidade de aplicá-los visando maior aproximação daquilo que chamamos “justiça”. Uma justiça ideal que agrade a todos é uma verdadeira utopia, no entanto, a conjunção da finalidade da lei, com a finalidade do ramo do direito e com a adequação dos princípios pode ocasionar bons resultados no sistema judiciário e indiretamente para a sociedade como um todo. Hoje em dia fala-se muito do princípio da insignificância e sua aplicação no direito penal, especialmente em relação aos crimes contra o patrimônio visto que são os crimes mais comuns e que acabam atingindo as mais diversas camadas da sociedade. O objetivo desta pesquisa é definir no que consiste o princípio da insignificância, qual é a sua natureza jurídico-penal, quais os requisitos para aplicá-lo e quais dos crimes contra o patrimônio previstos no Código Penal Brasileiro que admitem a sua aplicação. A pesquisa foi realizada através do confronto da doutrina com decisões recentes proferidas pelos tribunais pátrios, focalizando a situação do Estado de São Paulo. Ao término da pesquisa, verificou-se que o judiciário paulista encontra-se numa situação de verdadeiro caos e que a sanção penal, do modo que é realizada no Brasil, acaba não atingindo suas finalidades, sendo certo que a aplicação do princípio da insignificância nos crimes contra o patrimônio do código penal quando observados determinados requisitos, a nosso ver, pode melhorar um pouco a situação do judiciário sendo, inclusive, defendido a aplicação desse princípio previamente ao processo.

Palavras-chave: Princípio. Insignificância. Crimes. Patrimônio.


INTRODUÇÃO

É comum a mídia vincular casos que geram grande indignação popular devido à natureza insignificante do delito cometido. Somos constantemente “bombardeados” por clamores coletivos que exigem a liberdade daquele indivíduo que furtou um boné ou uma manteiga.

A doutrina contemporânea tenta definir aquilo que seria um crime aceitável daquele que não seria. Busca-se justificar a conduta delituosa relacionando-a com as condições do agente, o meio social em que este vive e o valor do bem ofendido.

Essa preocupação, que não está somente relacionada ao direito penal como também à própria sociologia, há tempos instiga o homem. No início do século XIX, alguns autores já nos faziam raciocinar a respeito deste assunto. Victor Hugo, em Os miseráveis, nos apresentava um personagem que teve que mudar completamente a sua vida para não ter que enfrentar as duras penas decorrentes do furto de um pão, ocorrido em época de grande dificuldade.

Mas será que essa é realmente a finalidade do Direito Penal? Condenar, condenar e condenar, aplicar cegamente e friamente a lei, eximindo-se da análise de quaisquer outros elementos?

Questões tais como essas e outras podem surgir quando vemos algumas das notícias exemplificadas acima. O princípio da insignificância é um tema polêmico e ao mesmo tempo interessante, pois desperta a curiosidade de grande parte da população haja vista que os casos em que esse princípio será aplicado são corriqueiros ao dia-a-dia de toda a população.

Embora consagrado e amplamente difundido na doutrina, o princípio da insignificância encontra grande apatia por boa parte dos magistrados. Há quem diga que para vê-lo reconhecido é necessário recorrer-se às instâncias superiores. Alguns talvez questionem: Essa afirmativa é verdadeira? Por que o princípio da insignificância não é aplicado?

Outros podem ainda perguntar: há base legal para aplicação de tal princípio? Ou ainda que não haja disposição expressa, quando o delito será insignificante e a que se justifica a aplicação desse princípio?

Neste trabalho abordar-se-á a aplicação do princípio da insignificância nos crimes contra o patrimônio do Código Penal Brasileiro.

Analisaremos o conceito de bem jurídico, estudaremos os crimes contra o patrimônio individualmente, a sanção penal, o conceito, os requisitos para aplicação do princípio da insignificância e correlacionaremos a doutrina aos casos práticos em que os Tribunais já se manifestaram favoravelmente à aplicação desse princípio.

Verificar-se-á, ainda, se é possível ou não a aplicação do princípio da insignificância em fase prévia à ação penal.

Por fim, tentaremos tecer algumas conclusões frente a toda pesquisa realizada para a elaboração deste trabalho, haja vista que durante todo o desenvolvimento deste surgiram mais e mais questionamentos, além daqueles supramencionados, os quais foram, pari passu, respondidos capítulo a capítulo.


01: DO BEM JURÍDICO

A definição do termo bem jurídico é necessária em razão de todos os tipos penais possuírem uma objetividade jurídica, objetividade esta que visa a proteção e manutenção de um bem jurídico. Essa definição é de suma importância neste momento, pois somente com tal definição é que poderemos, posteriormente, considerar uma conduta como relevante ou irrelevante, de modo a sujeitá-la ou não à aplicação do princípio da insignificância.

Temos que bem, de maneira geral, é a coisa. Bem é “tudo aquilo que, corpóreo ou incorpóreo, móvel ou imóvel, é suscetível de utilidade, conveniência, vantagem, proveito, apropriação, economicamente apreciável, e objeto de direito.” [1] No sentido jurídico, bem pode ser definido como “o direito ou vantagem de que alguém é titular, inerente à sua pessoa, protegido pela ordem jurídica.” [2]

Em termos simples, bem jurídico pode ser definido como aquilo que o legislador considerou como relevante e merecedor de proteção, é aquilo que se pretende preservar. É “todo valor da vida humana protegido pelo Direito.” [3]

Embora a conceituação do termo bem jurídico pareça simples, vários doutrinadores, nacionais e estrangeiros, vem, ao longo dos anos, tentando entrar num consenso do significado dessa expressão.

Hanz Wenzel, por exemplo, entende que bem jurídico é um “bem vital da comunidade ou do indivíduo, que por sua significação social é protegido juridicamente.”[4] Muñoz Conde, por seu turno, considera os bens jurídicos como “os pressupostos de que a pessoa necessita para sua auto-realização na vida social”.[5] Aníbal Bruno, por sua vez, defende que os bens jurídicos “são valores de vida individual ou coletiva, valores da cultura”[6].

Embora vários sejam os conceitos de bem jurídico, entendemos que a melhor definição e a mais clara, nos é dada por Assis de Toledo que assim os definem:

são valores ético-sociais que o direito seleciona, com o objetivo de assegurar a paz social, e coloca sob sua proteção para que não sejam expostos a perigo de ataque ou a lesões efetivas[7].

Feita essas breves considerações, cabe salientar que a nós nos interessa o conceito de bem jurídico penal. Ao passo que já conceituamos bem jurídico em seu sentido amplo, fica mais fácil definirmos o bem jurídico penal.

Bem jurídico penal é o bem merecedor de proteção penal e que, por isso, subentende-se como mais importante. Nessa linha de raciocínio, Luiz Regis Prado aduz que “a ingerência penal deve ficar adstrita aos bens de maior relevo”[8] e ainda complementa que “a lei penal, advirta-se, atua não como limite da liberdade pessoal, mas como seu garante”[9].

Nos dizeres de Polaino Navarrete é o bem ou valor merecedor da máxima proteção jurídica, cuja outorga é reservada às prescrições do Direito Penal. Bens e valores mais consistentes da ordem de conveniência humana em condições de dignidade e progresso da pessoa em sociedade[10].

Por fim, convém mencionar que no direito penal, o bem jurídico terá as seguintes funções[11]:

  1. Função de garantia ou de limitar o direito de punir do Estado;

  2. Função teleológica ou interpretativa;

  3. Função individualizadora; e,

  4. Função sistemática.

Tais funções servem para evidenciar ainda mais a importância do bem jurídico penal.


02: DOS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO DO CÓDIGO PENAL

2.1 Conceito de crime

O conceito de crime é um tema que há anos causa discussões entre os doutrinadores, principalmente no que tange ao conceito analítico de crime. Apenas para se ter uma ideia, crime poderá ser: fato típico e antijurídico; fato típico, antijurídico e culpável; ou ainda fato típico, antijurídico, culpável e punível. Há de se ressaltar que dentre essas correntes não há uma que seja majoritária em relação às outras, sendo certo que a adoção de cada uma dependerá em muito da região em que se estuda o tema, bem como do entendimento e próprio convencimento pessoal do estudante.

Aqui não se pretende abordar profundamente as questões divergentes pertinentes ao tema. Pretende-se, apenas, prestar um breve esclarecimento do conceito de crime para facilitar a compreensão daqueles que não estão bem habituados com o assunto, bem como fornecer as bases para o que será abordado nos capítulos subsequentes.

Considerando que o tema deste trabalho é “O princípio da insignificância e sua aplicação nos crimes contra o patrimônio do Código Penal Brasileiro”, é sensato deixar que a própria Lei de Introdução ao Código Penal (Decreto-lei n. 3.914/41) defina o que é crime. Dispõe o artigo 1º da referida lei, in verbis:

Considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente, com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente[12] (grifos nossos) 

Como se observa, a legislação pátria preocupou-se em apenas diferenciar as infrações penais, que podem ser tanto crimes como contravenções. A diferença básica reside no tipo de sanção que será atribuída a cada infração. Os crimes por serem considerados condutas mais gravosas terão, consequentemente, sanções mais severas.

Pode-se dizer que o legislador deixou ao encargo dos doutrinadores elaborar uma definição mais simples e objetiva do conceito de delito.

Formalmente, crime pode ser definido como “toda ação ou omissão proibida por lei, sob a ameaça de pena”[13]. Em relação ao seu conceito material, crime “é a ação ou omissão que contraria os valores ou interesses do corpo social, exigindo sua proibição com a ameaça de pena”[14].

Analiticamente, vamos considerar crime como sendo fato típico, antijurídico e culpável.

A palavra antijuridicidade é sinônimo de ilicitude e transmite a ideia daquilo que é contrário à legislação, ou seja, a antijuridicidade representa a prática de uma conduta que é contrária ao direito.

A culpabilidade não é apenas um mero pressuposto para aplicação da pena. A culpabilidade representa a reprovação social e, também, o fator que possibilitará a efetiva responsabilização do autor pelo crime por ele cometido. Há de se salientar que para a ocorrência de crime, devem estar presentes os seguintes elementos: a) imputabilidade, b)potencial consciência da ilicitude, e c)exigibilidade de conduta diversa, tais elementos constituem a culpabilidade. Na ausência de qualquer desses elementos, não haverá crime por falta de culpabilidade. 

O fato típico é “a síntese da conduta ligada ao resultado pelo nexo causal, amoldando-se ao modelo legal incriminador”[15]. O fato típico é constituído pela conduta, pelo resultado, pelo nexo de causalidade e pela tipicidade.

A conduta é a ação ou omissão humana, consciente e voluntária, dirigida a uma finalidade. O dolo ou a culpa estão presentes na conduta.

O resultado é aquilo que decorre da ação. É toda alteração no mundo exterior decorrente da conduta (naturalístico) ou toda lesão ou ameaça de lesão ao bem jurídico tutelado (normativo).

O nexo de causalidade representa a relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado. Causa é qualquer acontecimento sem o qual o resultado não teria ocorrido.

A tipicidade é um dos elementos mais complexos do fato típico e por isso será analisada separadamente.

2.1.1 Tipicidade

Tipicidade pode ser conceituada como a adequação do fato concreto (o fato material, o acontecimento real) ao fato abstrato previsto no tipo penal (artigo de lei).

Em outras palavras, “Tipicidade é a correspondência entre o fato praticado pelo agente e a descrição de cada espécie de infração contida na lei penal incriminadora”[16].

A tipicidade decorre do princípio da reserva legal que determina que não há crime sem lei anterior que o defina (art. 1º do Código Penal). 

O estudo mais detalhado do conceito de tipicidade é fundamental em razão do princípio da insignificância ser uma excludente supralegal da tipicidade, conforme anota Sérgio Salomão Shecaria e Alceu Corrêa Junior, in Teoria da pena:

“(...) O princípio da insignificância, por seu turno, equivale à desconsideração típica pela não-materialização de um prejuízo efetivo, pela existência de danos de pouquíssima importância”[17].

Luiz Flávio Gomes[18] ao explicar o conceito de tipicidade discorre sobre a tipicidade penal e a tipicidade legal. Para ele, tipicidade legal seria tudo o que foi dito até agora sobre tipicidade, ou seja, tipicidade legal é a subsunção do fato concreto ao tipo penal. Entretanto, a tipicidade penal constitui algo mais abrangente.

Para o referido autor, a tipicidade penal compreende três dimensões: a) a formal (ou fática/legal ou linguística), que envolve a conduta, o resultado naturalístico, o nexo de causalidade bem como as exigências temporais, espaciais, modo de execução da conduta etc., ou seja, a adequação do fatoà letra da lei; b) a material (ou normativa), que exige três juízos valorativos distintos: (a) juízo de desaprovação da conduta (criação ou incremento de riscos proibidos relevantes); (b) juízo de desaprovação do resultado jurídico (ofensa desvaliosa ao bem jurídico ou desvalor do resultado, que significa lesão ou perigo concreto de lesão ao bem jurídico) e (c) juízo de imputação objetiva do resultado (o resultado deve ter conexão direta com o risco criado ou incrementado –‘nexo de imputação’); c) a subjetiva (constatação do dolo e outros eventuais requisitos subjetivos especiais)[19].

Esse conceito de tipicidade é fruto da teoria constitucionalista do delito, adotada pelo autor supracitado. Pode-se dizer que o conceito de tipicidade penal mencionado acima, é uma evolução do conceito de tipicidade sistemática e conglobante elaborada por Zaffaroni.

Para Zaffaroni[20] a tipicidade nos crimes dolosos é complexa e composta de uma parte objetiva e outra subjetiva. A tipicidade objetiva divide-se em uma parte sistemática e outra conglobante. A conduta, o resultado naturalístico, o nexo de causalidade e a adequação típica do fato à letra da lei integram a parte sistemática enquanto que a lesividade e a imputação objetiva integram a parte conglobante. A tipicidade subjetiva, por sua vez, abrange o dolo e eventuais outros requisitos subjetivos.

Luiz Flávio Gomes, comentando a teoria de Zaffaroni, destaca:

Zaffaroni sublinha que o tipo penal (que é uma construção dogmática) tem a missão de limitar o exercício do poder punitivo, que não pode se transformar numa irracionalidade. A tipicidade objetiva tem a função de retratar um fato criminoso, isto é, um conflito penal (a conflitividade), que é uma das barreiras insuperáveis da racionalidade do poder punitivo. Do tipo objetivo, então, fazem parte o tipo sistemático (conduta, resultado, etc.) assim como o tipo conglobante. A tipicidade conglobante é a sede da conflitividade. Logo, cuida ela da lesividade assim como da imputação objetiva[21].

A tipicidade conglobante de Zaffaroni é aquela entendida por Luiz Flávio Gomes e Antonio García-Pablos de Molina como tipicidade material que, entretanto, possui três juízos valorativos.

Mais adiante, verificar-se-á a importância de tais conceitos (tipicidade legal, tipicidade conglobante e tipicidade material) ao enfrentarmos as questões pertinentes ao tema deste trabalho.

 Feitas essas breves considerações acerca do conceito de crime, bem como de seus elementos, tratar-se-á, a seguir, especificamente sobre os crimes contra o patrimônio do Código Penal Brasileiro.

2.2 Dos crimes contra o patrimônio

O Título II da Parte Especial do Código Penal Brasileiro (Decreto-lei 2.848/40) trata dos crimes contra o patrimônio. Tal título possui oito capítulos sendo que os sete primeiros tratam dos crimes em espécie, enquanto o ultimo capítulo trata das disposições gerais.

Os crimes contra o patrimônio estão elencados nos artigos 115 ao 180 do Código Penal.  São eles: furto, roubo, extorsão, usurpação, dano, apropriação indébita, estelionato e outras fraudes e receptação.

Como o próprio nome sugere o objeto jurídico tutelado nesses delitos é o patrimônio. Patrimônio, de modo geral, é o “conjunto dos bens de alguém a que se pode atribuir valor econômico, compreendendo a propriedade, direitos reais, pessoais e obrigacionais, ativos e passivos”[22].

O objeto material, em todos os crimes, é a coisa alheia móvel, sendo está considerada aquela passível de apreensão humana, que pode ser deslocada do tempo e no espaço. Em direito penal, despreza-se os padrões estabelecidos pelo Direito Civil no que tange ao conceito de bem móvel e imóvel.

Há de se ressaltar, ainda, que a coisa alheia imóvel poderá ser objeto dos delitos de dano, alteração de limites, usurpação de águas, esbulho possessório, de algumas espécies de estelionato e receptação, sendo certo que neste último a doutrina não é pacífica em relação ao seu reconhecimento.

As penas cominadas a esses crimes são tanto as de detenção quanto as de reclusão.

A competência para julgar os crimes contra o patrimônio é da Justiça Comum, podendo esta ser a Justiça Federal ou Estadual dependendo do objeto material violado e se a União tem interesse ou não no julgamento do caso concreto. 

Aos crimes em que a lei prever pena igual ou inferior a 02 (dois) anos de reclusão ou detenção, o feito será processado e julgado pelo Juizado Especial Criminal, nos termos do artigo 61 da Lei 9.099/95.

Nos crimes praticados sem violência ou grave ameaça, será isento de pena o agente que cometer o delito contra o cônjuge, na constância da sociedade conjugal; ou contra o ascendente ou descendente, legítimo ou ilegítimo, civil ou natural (artigo 181 combinado com artigo 183, ambos do Código Penal).

Nos crimes cometidos em prejuízo: a) do cônjuge desquitado ou judicialmente separado; b) de irmão, legítimo ou ilegítimo; c) de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita, o feito somente será processado mediante representação. Não se aplicará tais imunidades relativas quando o delito for praticado com violência ou grave ameaça (artigo 182 combinado com artigo 183, ambos do Código Penal).

As imunidades previstas nos artigos 181 e 182 do Código Penal não se estendem ao estranho que participou do crime, bem como não serão aplicadas quando o ofendido for pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos (artigo 183 do Código Penal).

De modo geral, essas são as características comuns dos crimes previstos no Título II do Código Penal.

A seguir, abordar-se-á os crimes desse Título individualmente, indicando brevemente suas principais características e peculiaridades.

2.2.1 Do furto

O delito de furto simples vem especificado no “caput” do artigo 155 do Código Penal que assim dispõe, in verbis:

“Furto

Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.”

Pela própria leitura do “caput” do artigo 155 é possível conceituar o delito de furto. Assim, temos que furto é surripiar coisa alheia móvel para si ou para terceiro, com a finalidade de assenhoramento definitivo.

Sobre o objeto material (coisa alheia móvel), é importante destacar que “a coisa que nunca teve dono (res nullius), a abandonada (res derelicta) e a perdida (res desperdita) não são objeto de furto”[23]·.

O objeto jurídico desde delito não é somente a propriedade como também a posse e a detenção.

Trata-se de crime comum, ou seja, o sujeito ativo poderá ser qualquer pessoa exceto o próprio proprietário do bem. O sujeito passivo ou o ofendido será o proprietário, possuidor ou detentor do bem subtraído.

Salvo na hipótese do artigo 182 do Código Penal, a ação penal será pública incondicionada.

O delito de furto admite a forma tentada. Doutrinariamente é classificado como crime comum, material, de forma livre, comissivo, de dano, instantâneo, unissubjetivo e plurissubsistente[24].

A pena cominada ao furto é a de reclusão de um a quatro anos cumulada com a pena de multa. A pena de reclusão é aquela que poderá ser cumprida em regime fechado, aberto ou semiaberto, nos termos do artigo 33 do Código Penal.

O furto noturno é previsto no parágrafo primeiro do artigo 155, que nos diz:

“§ 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.”

Quando a subtração de coisa móvel ocorrer durante o repouso noturno, a pena será aumentada de um terço.

Atualmente, prevalece o entendimento de que para a ocorrência dessa causa de aumento de pena, é necessário que o furto seja realizado em casa habitada, cujos moradores estejam repousando[25].

A jurisprudência vem entendendo que o repouso noturno compreende as madrugadas, bem como o tempo que, segundo os costumes sociais, se destina ao repouso noturno (TACrSP, RJDTACr 24/213 e STF, RT 600/459).

O furto noturno é incompatível com qualquer forma de furto qualificado.

Assim como em outros delitos, o legislador também elaborou a modalidade de furto privilegiado, o qual está previsto no parágrafo segundo do artigo 155:

“§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.”

A aplicação do privilégio pressupõe dois requisitos: a) que o criminoso não seja reincidente e b) que a coisa furtada seja de pequeno valor.

Primário é o agente que nunca foi condenado por crime algum ou aquele que, embora já condenado, não tenha cometido novo crime durante os cinco anos subsequentes ao cumprimento ou extinção da pena a ele aplicada anteriormente.

Em relação ao pequeno valor da coisa furtada, a doutrina e a jurisprudência não são pacíficas em relação à sua conceituação.  A este respeito, Celso Delmanto comenta:

Atualmente, são dois os principais critérios usados na aferição do ‘pequeno valor’: a. Refere-se ao prejuízo efetivamente sofrido pelo ofendido. b. É relativo ao valor da coisa e não ao prejuízo. Quanto À quantidade que se considera como ‘pequeno valor’, tem-se em vista, geralmente, valor igual ou inferior ao salário mínimo, que pode, porém, ser ultrapassado em casos especiais[26].

O parágrafo terceiro trata do furto de energia:

“§ 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.”

 Como se depreende da leitura, a energia elétrica e outras energias tais como internet, radioatividade, térmica, mecânica etc. são equiparada à coisa móvel de modo que podem ser objeto material do crime de furto.

2.2.1.1 Furto qualificado

Os parágrafos quarto e quinto do artigo 155 do Código Penal tratam do furto qualificado.

As qualificadoras alteram a própria pena base que será aplicada ao criminoso. É de se ressaltar que o juiz na aplicação destas deverá observar as circunstâncias judiciais, bem como as atenuantes e agravantes e as causas de aumento e diminuição de pena.

Tanto o parágrafo quarto quanto o parágrafo quinto do artigo 155 são claros em descrever as hipóteses em que o furto será qualificado e assim versam:

Furto qualificado

§ 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:

I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;

II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;

III - com emprego de chave falsa;

IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.

§ 5º - A pena é de reclusão de 3 (três) a 8 (oito) anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior.

2.2.1.2 Furto de coisa comum

Dispõe o artigo 156 do Código Penal:

Furto de coisa comum

Art. 156 - Subtrair o condômino, coerdeiro ou sócio, para si ou para outrem, a quem legitimamente a detém, a coisa comum:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

§ 1º - Somente se procede mediante representação.

§ 2º - Não é punível a subtração de coisa comum fungível, cujo valor não excede a quota a que tem direito o agente.

A coisa comum é aquela que pertence a mais de uma pessoa e por isso mesmo não pode ser apropriada por alguém já que pertence a todos.

O sujeito ativo deste delito será o condômino, o coerdeiro ou o sócio. Consequentemente, o sujeito passivo será os demais condôminos, coerdeiros ou sócios que estiverem na posse legítima da coisa.

Na hipótese deste artigo, a ação penal será pública condicionada à representação.

2.2.2. Do roubo

O artigo 157 trata do crime de roubo. Tal artigo é divido e estudado pela doutrina da seguinte forma: a) roubo próprio, b) roubo impróprio, c)causas de aumento de pena, d) roubo qualificado e e) latrocínio.

2.2.2.1 Roubo próprio

O crime de roubo próprio está previsto no “caput” artigo 157 do nosso Código Penal, que dita:

Roubo

Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:

Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

O roubo constitui crime complexo, pois é composto por fatos que individualmente constituem crimes[27].  Assim como no delito de furto, no roubo o núcleo do tipo é subtrair. Entretanto, para que o agente consiga realizar seu intento, este se utiliza de violência, grave ameaça a pessoa ou qualquer outro meio que reduza a possibilidade da vítima resistir. Essa conduta (violência, grave ameaça ou qualquer outro meio) é realizada antes ou durante a retirada do bem.

O patrimônio, a integridade física e a liberdade do indivíduo são os objetos jurídicos desse delito.

O roubo próprio admite a tentativa. O tipo subjetivo é o dolo (vontade livre e consciente de realizar a conduta, no caso, a subtração). A consumação ocorre quando o indivíduo consegue retirar a coisa alheia móvel da esfera de vigilância da vítima, obtendo, assim, a posse tranquila do bem.

Qualquer pessoa poderá ser o sujeito ativo ou passivo do crime, ressalvado o próprio proprietário do bem como sujeito ativo.

A ação penal será pública incondicionada em qualquer um dos casos do artigo 157.

2.2.2.2 Roubo impróprio

“§ 1º - Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro.”

O parágrafo primeiro do artigo 157 do Código Penal trata do roubo impróprio. Pela simples leitura do dispositivo é possível diferenciá-lo do roubo próprio.

No roubo impróprio a violência ou grave ameaça contra a pessoa é exercida posteriormente à retirada da coisa, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa.

O dispositivo é taxativo, não se verifica a utilização da fórmula genérica prevista no “caput” do artigo 157 (ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência).

Diferentemente do roubo próprio, o impróprio não admite a forma tentada, haja vista que a tentativa constituiria furto tentado ou consumado dependendo do caso concreto. É importante ressaltar que esse é o entendimento majoritário da doutrina, no entanto, há quem discorde de tal posicionamento entendendo ser possível a tentativa de roubo impróprio (Hungria e Mirabete).

2.2.2.3 Causas de aumento de pena

Embora costumeiramente diga-se que o emprego de arma ou o concurso de pessoas qualifiquem o roubo, observa-se que tal expressão é incorreta, uma vez que tais situações aumentam a pena e não modificam suas penas bases.

As causas de aumento de pena do crime de roubo estão previstas no parágrafo segundo do artigo 157 e sua compreensão não demanda um estudo aprofundado do tema. Assim, temos que as penas serão aumentadas de um terço até a metade:

I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;

II - se há o concurso de duas ou mais pessoas;

III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância.

IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior;

V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade.

2.2.2.4 Roubo qualificado e latrocínio

“§ 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de sete a quinze anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa.”

O roubo será qualificado quando da violência resultar lesão corporal grave. Nesta hipótese a pena será de sete a quinze anos de reclusão, além da multa. Caso as lesões corporais sejam de natureza leve, estas ficarão absorvidas pelo crime de roubo, não havendo que se falar em roubo qualificado nem em roubo em concurso material ou formal com lesão corporal simples (artigo 129, “caput”, do Código Penal) em razão do princípio da consunção.

A lesão corporal grave poderá decorrer de culpa ou dolo do agente, sendo certo que em ambos os casos haverá a qualificação do crime.

O latrocínio ou o roubo qualificado pelo resultado morte é descrito na segunda parte do dispositivo em análise. O latrocínio é considerado crime hediondo, conforme o artigo 1º da Lei 8.072/90. O caráter hediondo atribuído a determinado crime altera os lapsos temporais para progressão de regime ao criminoso, bem como altera o lapso temporal ou impossibilita a concessão de livramento condicional. Em suma, a classificação do crime como hediondo ressalta a gravidade da infração.

Para ocorrência de latrocínio, o agente deve agir com dolo na conduta antecedente (roubo) e dolo ou culpa da conduta subsequente (morte)[28].

A doutrina comumente aborda hipóteses que poderiam gerar dúvidas na hora de tipificar determinada conduta, de modo que teremos[29]:

a)           Roubo consumado e homicídio tentado = tentativa de latrocínio;

b)           Roubo consumado e homicídio consumado = latrocínio consumado;

c)            Roubo tentado e homicídio tentado= tentativa de latrocínio;

d)           Roubo tentado e homicídio consumado = latrocínio consumado.

Por conta do enunciado da súmula 603 do Supremo Tribunal Federal e em razão do latrocínio estar previsto no título dos crimes contra o patrimônio, a competência para julgar tal delito será do juiz singular.

2.2.3 Da extorsão

A extorsão está prevista no artigo 158 do Código Penal que assim dita:

Extorsão

Art. 158 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar fazer alguma coisa:

Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

Ao ler o artigo supracitado, desde logo, identificamos suas características. Conforme nos ensina Fernando Capez, “a característica básica desse crime é que o agente coage a vítima a fazer, não fazer ou tolerar que se faça algo, mediante o emprego de violência ou grave ameaça. Em suma, estamos diante de uma forma do crime de constrangimento ilegal, acrescida, contudo de uma finalidade especial do agente, consubstanciada na vontade de auferir vantagem econômica”[30].

Os objetos jurídicos tutelados por esse crime são: o patrimônio, a integridade física e a liberdade do indivíduo.

Tanto o sujeito ativo quanto o sujeito passivo poderá ser qualquer pessoa. Em relação ao sujeito passivo, este poderá ser, inclusive, aquele que sofre o constrangimento sem, no entanto, ter seu patrimônio lesionado.

O tipo subjetivo é o dolo específico, isto porque o agente tem o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica.

Trata-se de crime formal, ou seja, embora o tipo penal descreva uma conduta e um resultado, este não precisa ocorrer para que o crime esteja consumado. Antigamente, discutia-se se a extorsão era crime formal ou material. Tal discussão foi cessada com o advento da Súmula 96 do STJ que dispõe: “o crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida”.

O delito em tela admite a forma tentada e doutrinariamente é classificado em crime comum, formal, de forma livre, complexo, comissivo, instantâneo, de dano, unissubjetivo, plurrisubsistente e doloso.

A ação penal será sempre pública incondicionada.

O delito de extorsão possui as seguintes espécies: simples (“caput” do artigo 158), com causa de aumento de pena (§1º) e qualificada (§§ 2º e 3º).

Por uma questão didática, tratar-se-á neste item também dos delitos de extorsão mediante sequestro e extorsão indireta.

2.2.3.1 Extorsão com causa de aumento (§1º, art. 158, CP)

“§ 1º - Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, aumenta-se a pena de um terço até metade.”

A pena de reclusão de quatro a dez anos será aumentada de um terço até a metade se o crime for cometido por duas ou mais pessoas ou com emprego de arma.

Há na doutrina quem entenda que para a ocorrência dessa causa de aumento de pena, no que diz respeito ao concurso de pessoas, todos os agentes devem realizar o núcleo do tipo, diferentemente do que ocorre no delito de roubo que admite a coautoria ou a participação.

2.2.3.2 Extorsão qualificada

A extorsão qualificada vem descrita nos parágrafos 2º e 3º do artigo 158, in verbis:

§ 2º - Aplica-se à extorsão praticada mediante violência o disposto no § 3º do artigo anterior.

§ 3º  Se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa condição é necessária para a obtenção da vantagem econômica, a pena é de reclusão, de 6 (seis) a 12 (doze) anos, além da multa; se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no art. 159, §§ 2º e 3º, respectivamente.

Quando a extorsão praticada mediante violência ocasionar lesão corporal grave ou morte, a pena será de reclusão de sete a quinze anos ou de vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa, respectivamente.

O delito de extorsão qualificada pela morte também é considerado crime hediondo (art. 9º da Lei 8.072/90).

O parágrafo 3º do artigo 158 foi introduzido só recentemente no Código Penal Brasileiro, com a edição da Lei 11.923/2009. O referido parágrafo trata do já conhecido “sequestro relâmpago”.

Assim, na hipótese em que o agente restringe a liberdade da vítima para conseguir extorqui-la e tal condição seja necessária para que ele obtenha seu intento, a pena será de seis a doze anos de reclusão, além da multa. Se durante a restrição da liberdade a vítima vier a sofrer lesão corporal grave ou morrer, as penas serão de reclusão de dezesseis a vinte e quatro anos ou de vinte e quatro anos a trinta anos, respectivamente. 

Cumpre salientar que a restrição da liberdade é temporária, por isso mesmo que se diz sequestro “relâmpago”. Essa restrição deve durar menos que vinte e quatro horas, haja vista que caso dure mais de vinte e quatro horas configurará o delito do artigo 159,§1º do Código Penal.

2.2.3.3 Extorsão mediante sequestro

Art. 159 - Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate

Pena - reclusão, de oito a quinze anos

§ 1º Se o sequestro dura mais de 24 (vinte e quatro) horas, se o sequestrado é menor de 18 (dezoito) ou maior de 60 (sessenta) anos, ou se o crime é cometido por bando ou quadrilha

Pena - reclusão, de doze a vinte anos.

§ 2º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena - reclusão, de dezesseis a vinte e quatro anos.

§ 3º - Se resulta a morte:

Pena - reclusão, de vinte e quatro a trinta anos.

§ 4º - Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços.

O delito de extorsão mediante sequestro é a modalidade de extorsão que apresenta a maior gravidade. Cezar Roberto Bitencourt tece os seguintes comentários acerca desse delito: “A prática mais ou menos frequente, em alguns países, na primeira metade do século passado, recomendou sua tipificação como crime mais grave. Desnecessário, por óbvio, destacar a frequência rotineira e insuportável com que esse crime passou a ser praticado no Brasil em fins do século XX, justificando-se sua maior punibilidade pela gravidade dos danos que pode produzir”[31].

O verbo nuclear do tipo sequestrar abrange o cárcere privado embora o legislador tenha se quedado inerte nesse sentido e significa “impedir que alguém, mediante qualquer meio exercite seu direito de ir e vir, com a finalidade de obtenção de qualquer vantagem, como condição ou preço de resgate”[32].

Os bens jurídicos tutelados por esse delito são: o patrimônio, a liberdade individual e a integridade física e psíquica do ser humano.

O tipo subjetivo é o dolo e ação penal é pública incondicionada.

Trata-se de crime formal e permanente, ou seja, a consumação do crime se prolonga no tempo ou que permite que ocorra prisão em flagrante a qualquer momento.

Os parágrafos 1º ao 3º tratam das hipóteses em que o crime de extorsão mediante seqüestro será qualificado.

Tanto a figura simples quanto a qualificadas são consideradas como crimes hediondos.

O parágrafo quarto traz uma causa de diminuição de pena, a delação premiada. Na hipótese em que um dos agentes que concorreu para a execução do crime denunciar à autoridade e assim facilitar a libertação do seqüestrado, esse terá sua pena diminuída de um a dois terços.

Trata-se de direito subjetivo do acusado, ou seja, presentes os requisitos o réu terá obrigatoriamente sua pena reduzida.

2.2.3.4 Extorsão indireta

Art. 160 - Exigir ou receber, como garantia de dívida, abusando da situação de alguém, documento que pode dar causa a procedimento criminal contra a vítima ou contra terceiro:

Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.

Cezar Roberto Bitencourt comentando acerca desse delito diz: “Esse crime pode ser praticado, normalmente, por agiotas, embora para sua configuração não seja indispensável à existência de usura. É suficiente, em princípio, que o sujeito ativo procure garantir-se, exigindo do devedor documento que possa dar causa a processo criminal contra si ou contra terceiro. A lei procura, com efeito, impedir que credores inescrupulosos (não necessariamente agiotas ou usurários) aproveitem-se do desespero de eventuais devedores para extorqui-lhes compromissos documentais idôneos para, havendo inadimplemento, instaurar procedimento criminal contra o devedor ou terceira pessoa”[33].

Os bens jurídicos protegidos por este dispositivo são o patrimônio, bem como a liberdade individual.

Tanto o sujeito ativo quanto o sujeito passivo poderá ser qualquer pessoa. O elemento subjetivo é o dolo e a ação penal é publica incondicionada.

Trata-se de crime formal, que admite a modalidade tentada.

2.2.4 Da usurpação

O termo usurpação deriva do latim usurpatione e é o ato ou efeito de usurpar. Usurpar é o ato de apoderar-se de, com fraude ou violência[34].

O Capítulo III do Título II do Código Penal trata da usurpação e abrange os crimes de alteração de limites, usurpação de águas, esbulho possessório e supressão ou alteração de marca em animais.

2.2.4.1 Da alteração de limites, da usurpação de águas e do esbulho possessório

Art. 161 - Suprimir ou deslocar tapume, marco, ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória, para apropriar-se, no todo ou em parte, de coisa imóvel alheia:

Pena - detenção, de um a seis meses, e multa.

§ 1º - Na mesma pena incorre quem:

Usurpação de águas

I - desvia ou represa, em proveito próprio ou de outrem, águas alheias;

Esbulho possessório

II - invade, com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de mais de duas pessoas, terreno ou edifício alheio, para o fim de esbulho possessório.

§ 2º - Se o agente usa de violência, incorre também na pena a esta cominada.

§ 3º - Se a propriedade é particular, e não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.

O artigo 161 do Código Penal, diferentemente dos artigos até então estudados, tem como objeto material a coisa imóvel.  Pode-se dizer que o artigo 161 visa a proteção da propriedade imobiliária.

Com relação ao “caput” do artigo supracitado, é importante dizer que trata-se de crime formal e que admite a tentativa.

O tipo subjetivo é o dolo e o sujeito passivo será o proprietário ou o possuidor do imóvel que sofreu a alteração dos limites. No que tange ao sujeito ativo, a doutrina diverge. Há quem entenda que somente o vizinho contíguo da vítima ou o futuro comprador possam ser os sujeitos ativos, outros entendem que somente o proprietário do prédio limítrofe é que poderá praticar esse crime[35].

O inciso I do parágrafo primeiro discorre que na mesma pena de detenção de um a seis meses incorrerá aquele que desviar ou represar, em proveito próprio ou de outrem, águas alheias. Neste caso, o crime será formal, comum e plurissubsistente (a conduta pode ser fracionada e por isso admite-se a tentativa).

O inciso II aborda a hipótese em que o agente invade terreno ou edifício alheio para o fim de esbulho possessório e para isso utiliza-se de violência ou grave ameaça ou mediante concurso de duas ou mais pessoas.

Havendo violência, o agente responderá por esta em concurso material com o delito do artigo 161, §1º, II do Código Penal (§2º).

Não havendo o emprego de violência e em se tratando de propriedade particular, a ação penal será privada. Nos demais casos, a ação penal é pública incondicionada.   

Importante ainda mencionar que as figuras típicas desses delitos são consideradas infrações de menor potencial ofensivo e por isso serão de competência do Juizado Especial Criminal.

2.2.4.2 Supressão ou alteração de marca em animais

“Art. 162 - Suprimir ou alterar, indevidamente, em gado ou rebanho alheio, marca ou sinal indicativo de propriedade:

Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa”.

Os bens jurídicos protegidos por esse dispositivo são a posse e a propriedade de semoventes[36]. Para efeitos penais, os animais são considerados coisas móveis.

O sujeito ativo desse delito poderá ser qualquer pessoa exceto o proprietário, admitindo-se, entretanto, que o possuidor do animal também seja o sujeito ativo. O sujeito passivo será o proprietário. Trata-se de crime comum.

O tipo subjetivo é o dolo. Admite-se a tentativa e a ação penal é pública incondicionada.

2.2.5 Do dano

“Dano

Art. 163 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa”.

O dano simples é tido como infração de menor potencial ofensivo e por isso é de competência do Juizado Especial Criminal. Nos termos do artigo 167 do Código Penal, a ação penal será privada, haja vista que somente se procede mediante queixa-crime.

O bem jurídico protegido é o patrimônio e o tipo subjetivo é o dolo. Trata-se de crime comum que admite a forma tentada.

O tipo penal prevê três verbos nucleares: a) destruir – que significa demolir, arruinar ou devastar; b) inutilizar – que significar tornar inválido, comprometer o uso ou fazer falhar; e c) deteriorar – que significa pôr em mal estado, degenerar ou tornar economicamente inferior[37].

2.2.5.1 Dano qualificado

O parágrafo único do artigo 163 trata das hipóteses em que o dano será qualificado e, consequentemente, terá os limites de pena alterados que passará a ser de seis meses a três anos de detenção e multa, além da pena correspondente à violência quando esta ocorrer. O dano será qualificado quando cometido:

I - com violência à pessoa ou grave ameaça;

II - com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui crime mais grave

III - contra o patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista;

IV - por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima

Quando o dano for cometido por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima, a ação penal será privada, nos demais casos será pública incondicionada.

2.2.5.2 Introdução ou abandono de animais em propriedade alheia

“Art. 164 - Introduzir ou deixar animais em propriedade alheia, sem consentimento de quem de direito, desde que o fato resulte prejuízo:

Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, ou multa”.

O delito previsto nesse artigo somente se procede mediante queixa-crime. Trata-se de infração de menor potencial ofensivo, a qual é de competência do Juizado Especial Criminal.

Aqui, tutela-se a propriedade e a posse de bem imóvel contra danos que poderão ser produzidos por animais nele introduzidos ou abandonados[38].

Trata-se de crime material (exige a ocorrência do resultado), doloso, comum e que não admite a forma tentada.

2.2.5.3 Dano em coisa de valor artístico, arqueológico ou histórico

“Art. 165 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa tombada pela autoridade competente em virtude de valor artístico, arqueológico ou histórico:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa”.

O delito previsto nesse artigo fora tacitamente revogado pelo artigo 62, inciso I da Lei 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais), que criou um delito mais específico do que este previsto no artigo 165 do Código Penal.

2.2.5.4 Alteração de local especialmente protegido

“Art. 166 - Alterar, sem licença da autoridade competente, o aspecto de local especialmente protegido por lei:

Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa”.

Assim como no delito anterior, o artigo 166 do Código Penal também foi revogado tacitamente pelo artigo 63 da Lei 9.605/98.

2.2.6 Da apropriação indébita

O Capítulo V do Título II do Código Penal dispõe sobre a apropriação indébita. Tal capítulo abrange os artigos 168 a 170 do referido Codex.

Assim dita o artigo 168, in verbis:

“Art. 168 - Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa”.

Como nos demais delitos até então estudados, o bem jurídico protegido por esse artigo é o patrimônio, ou seja, tutela-se o direito à propriedade[39].

O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, porém, esta deve ter a posse ou a detenção legítima da coisa alheia móvel. O sujeito passivo será o titular do direito patrimonial atingido pela ação tipificada[40].

Pode-se dizer que o crime de apropriação indébita caracteriza-se por uma quebra de confiança e por uma posterior mudança de comportamento por parte do sujeito ativo. Isto porque o proprietário (futuro ofendido), num primeiro momento, entrega voluntariamente a coisa móvel para o agente, confiando-lhe a detenção, entretanto, este inverte o ânimo da relação e passa a se comportar como dono da coisa. Aqui, observa-se que o dolo do agente é posterior.

A apropriação indébita simples, prevista no “caput” do artigo 168, divide-se em duas modalidades: a) propriamente dita e b) negativa de restituição.

A propriamente dita consuma-se com um ato de disposição do dono. Tal modalidade só pode ser realizada na forma comissiva.

A negativa de restituição ocorre quando o agente resolve ficar com a coisa para si e mesmo a vítima solicitando a restituição, esse se recusa a devolver a coisa.

A apropriação indébita é crime material, ou seja, haverá consumação somente com a ocorrência do resultado.

A admissão ou não da tentativa a tal delito é tema bastante controvertido na doutrina. Atualmente, entende-se que a tentativa será possível na apropriação indébita propriamente dita e será inadmissível quando tratar-se da negativa de restituição. 

A ação penal será pública incondicionada.

Nos delitos previstos neste capítulo V, o juiz poderá ocorrer a “apropriação indébita privilegiada”, hipótese em que o juiz poderá substituir a pena de reclusão pela de detenção, reduzi-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa, desde que o agente seja primário e seja de pequeno valor a coisa apropriada (art. 170 CP).

O delito em tela terá sua pena aumentada de um terço, quando o agente receber a coisa:

I - em depósito necessário;

II - na qualidade de tutor, curador, síndico, liquidatário, inventariante, testamenteiro ou depositário judicial;

III - em razão de ofício, emprego ou profissão

2.2.6.1 Apropriação indébita previdenciária

Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem deixar de:

I - recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público;

II - recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços;

III - pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social.

§ 2º É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara, confessa e efetua o pagamento das contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal. 

§ 3º É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de bons antecedentes, desde que:

I - tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da contribuição social previdenciária, inclusive acessórios; ou

II - o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais.

Nesta espécie de apropriação, tutela-se o patrimônio de todos aqueles que fazem parte do sistema de seguridade previdenciária que foi estabelecido por nossa Constituição Federal em seus artigos 194 e 195[41].

O sujeito ativo desse crime será o responsável tributário, ou seja, aquele que por lei está obrigado a repassar a contribuição ao INSS. O sujeito passivo será o Estado[42].

O tipo subjetivo é o dolo. Por tratar-se de crime omissivo, no qual não é possível o fracionamento da conduta, não se admite a tentativa.

A doutrina e a jurisprudência mais recentes entendem que somente os incisos I e III do parágrafo 1º do artigo 168A são os que poderão eventualmente ocorrer na prática. Já que a hipótese do inciso II é inconstitucional.

Da mesma forma, o parágrafo 2º do referido artigo é também inaplicável.

O parágrafo terceiro trata do perdão judicial e do privilégio, facultando ao juiz o poder de decidir sobre perdoar ou aplicar somente a pena pecuniária quando o agente for primário e possuir bons antecedentes.

A ação penal será pública incondicionada e a competência para processar e julgar o feito será da justiça comum Federal.

Por fim, convém mencionar que a Lei 11.941/2009, que alterou a legislação tributária federal relativa ao parcelamento ordinário de débitos tributários, estabeleceu que a punibilidade será extinta em qualquer momento do procedimento desde que seja efetuado o pagamento dos débitos.

2.2.6.2 Apropriação de coisa havida por erro, caso fortuito ou força da natureza

Art. 169 - Apropriar-se alguém de coisa alheia vinda ao seu poder por erro, caso fortuito ou força da natureza:

Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.

Parágrafo único - Na mesma pena incorre:

Apropriação de tesouro

I - quem acha tesouro em prédio alheio e se apropria, no todo ou em parte, da quota a que tem direito o proprietário do prédio;

Apropriação de coisa achada

II - quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria, total ou parcialmente, deixando de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor ou de entregá-la à autoridade competente, dentro no prazo de 15 (quinze) dias.

No “caput” do artigo 169 do Código Penal observa-se que há duas infrações penais: a) a apropriação indébita de coisa havida por erro e b) a apropriação indébita de coisa havida por caso fortuito ou força da natureza.

Para a ocorrência da primeira espécie (erro), é necessário que a vítima esteja em situação de erro, ou seja, embora ela espontaneamente entregue o bem a terceiro, há uma incorreta percepção da realidade. O erro pode referir-se à pessoa a quem a coisa é entregue, à coisa entregue ou à existência da obrigação ou parte dela[43].

Na apropriação indébita havida por caso fortuito ou por força da natureza, pressupõe-se a ocorrência de um acontecimento acidental e inevitável, sem a participação, inicial, do homem. Para a configuração desse delito, o agente deve saber que a coisa é alheia.

Trata-se de crime doloso e comum.

Tanto na hipótese do “caput” quanto na hipótese dos incisos I ou II do parágrafo único do artigo 169, a competência para processar e julgar o delito será do Juizado Especial Criminal haja vista que constituem infrações de menor potencial ofensivo cuja pena máxima não ultrapassa dois anos de reclusão ou detenção.

2.2.7 Do estelionato e outras fraudes
2.2.7.1 Do estelionato

O crime de estelionato está previsto no artigo 171 do Código Penal, in verbis:

Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.

Através de uma simples leitura do artigo 171 é possível conceituarmos o delito de estelionato. No estelionato a vantagem ilícita é obtida através de artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento que induza a vítima ou a mantenha em erro.

É importante mencionar que no estelionato o agente visa pessoa determinada. A indução ou manutenção em erro de número indeterminado de pessoas caracteriza crime contra economia popular e não estelionato.

O bem jurídico protegido é a inviolabilidade do patrimônio, diretamente e indiretamente tutela-se o interesse social e o interesse público de reprimir a fraude causadora de dano alheio[44].

Tanto o sujeito ativo quanto o sujeito passivo poderá ser qualquer pessoa, haja vista que se trata de crime comum.

Exige-se o dolo especifico. É crime material, que consuma-se no momento em que o agente obtém a vantagem ilícita em prejuízo alheio.

A ação penal será pública incondicionada e por tratar-se de crime plurissubsistente, admite-se a tentativa.

O estelionato será privilegiado nos termos do parágrafo 1º do artigo 171:

“§ 1º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a pena conforme o disposto no art. 155, § 2º”.

Quando o agente for primário e o prejuízo causado à vítima for de pequeno valor, o juiz poderá substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.

O parágrafo 2º do artigo em análise prevê mais seis figuras de estelionato, as quais descrevem situações mais específicas, porém terão as mesmas penas do “caput”. São elas:

Disposição de coisa alheia como própria

I - vende, permuta, dá em pagamento, em locação ou em garantia coisa alheia como própria;

Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria

II - vende, permuta, dá em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável, gravada de ônus ou litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em prestações, silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias;

Defraudação de penhor

III - defrauda, mediante alienação não consentida pelo credor ou por outro modo, a garantia pignoratícia, quando tem a posse do objeto empenhado;

Fraude na entrega de coisa

IV - defrauda substância, qualidade ou quantidade de coisa que deve entregar a alguém;

Fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro

V - destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria, ou lesa o próprio corpo ou a saúde, ou agrava as conseqüências da lesão ou doença, com o intuito de haver indenização ou valor de seguro;

Fraude no pagamento por meio de cheque

VI - emite cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra o pagamento.

Por fim, é importante mencionar que a pena no crime de estelionato será aumentada de um terço, se o crime for cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência (§3º).

2.2.7.2 Outras fraudes
2.2.7.2.1 Duplicata simulada

“Art. 172 - Emitir fatura, duplicata ou nota de venda que não corresponda à mercadoria vendida, em quantidade ou qualidade, ou ao serviço prestado.

Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa”.

O Código Penal em seu artigo 172 tipificou a conduta daquele que põe em circulação duplicata, fatura ou nota de venda que não corresponda à mercadoria vendida, divergindo na quantidade, qualidade ou no serviço prestado.

Aqui, além da tutela ao patrimônio particular, protege-se também a boa-fé que devem integrar as relações mercantis[45].

O sujeito ativo será aquele que emite fatura, duplicata ou nota de venda, enquanto que o sujeito passivo será o recebedor, aquele que desconta a duplicata, e o terceiro de boa-fé contra p qual é sacada a duplicata, emitida a fatura ou nota de venda[46].

O elemento subjetivo é o dolo. A tentativa é inadmissível, a ação penal é pública incondicionada e a consumação ocorre independentemente do prejuízo, consumando-se como a mera emissão da duplicata, fatura ou nota de venda.

Na mesma pena (dois a quatro anos de detenção e multa) incorrerá aquele que falsificar ou adulterar a escrituração do Livro de Registro de Duplicatas (parágrafo único do artigo 172).

2.2.7.2.2 Abuso de incapazes

Art. 173 - Abusar, em proveito próprio ou alheio, de necessidade, paixão ou inexperiência de menor, ou da alienação ou debilidade mental de outrem, induzindo qualquer deles à prática de ato suscetível de produzir efeito jurídico, em prejuízo próprio ou de terceiro:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.

O artigo 173 protege o patrimônio pertencente ao menor ou pessoa com debilidade (ou alienação) mental, impedindo abuso por parte de terceiro que vise o alcance de efeito jurídico, em proveito próprio ou alheio, que acarrete prejuízo à vítima incapaz[47].

O sujeito ativo poderá ser qualquer pessoa. Já o sujeito passivo será o menor, o alienado ou o débil mental.

Admite-se a tentativa e o elemento subjetivo, assim como nos crimes já estudados, é o dolo.

A consumação ocorrerá independentemente da obtenção do proveito almejado, por isso mesmo diz-se que o crime é formal.

A ação penal será pública incondicionada.

2.2.7.2.3 Induzimento à especulação

Art. 174 - Abusar, em proveito próprio ou alheio, da inexperiência ou da simplicidade ou inferioridade mental de outrem, induzindo-o à prática de jogo ou aposta, ou à especulação com títulos ou mercadorias, sabendo ou devendo saber que a operação é ruinosa:

Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.

Ao discorrer sobre esse delito, Rogério Sanches Cunha comenta: “tutela-se o patrimônio da pessoa ingênua, crédula ou de mentalidade inferior contra a ação do agente que abusa de sua condição para obter proveito próprio ou alheio. Se a norma visa a reprimir a prática de jogatina ou de especulação, não se pode olvidar que seu objetivo principal é de fato a proteção do patrimônio do indivíduo simplório ou pouco desenvolvido mentalmente”[48].

Diante disso, temos que o sujeito passivo será a pessoa simples, inexperiente ou com mentalidade inferior. O sujeito ativo, por sua vez, poderá ser qualquer pessoa.

Trata-se de crime doloso e formal. A ação penal também será pública incondicionada.

2.2.7.2.4 Fraude no comércio

Art. 175 - Enganar, no exercício de atividade comercial, o adquirente ou consumidor:

I - vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada;

II - entregando uma mercadoria por outra:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

§ 1º - Alterar em obra que lhe é encomendada a qualidade ou o peso de metal ou substituir, no mesmo caso, pedra verdadeira por falsa ou por outra de menor valor; vender pedra falsa por verdadeira; vender, como precioso, metal de ou outra qualidade:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.

§ 2º - É aplicável o disposto no art. 155, § 2º.

O crime previsto neste artigo 175 tem como objetividade jurídica a proteção do patrimônio, bem como da boa-fé que deve nortear as relações comerciais

O sujeito ativo somente poderá ser aquele que exerce algum tipo de atividade comercial, por isso temos que o crime é próprio. O sujeito passivo, por sua vez, poderá ser qualquer pessoa.

O núcleo do tipo é enganar, que significa ludibriar, iludir ou induzir em erro[49]. O engano pode ser dar através da venda ou entrega da mercadoria.

Trata-se de crime doloso, que admite a forma tentada. A ação penal será pública incondicionada.

O parágrafo 1º do artigo 175 prevê as hipóteses em que o delito será qualificado.

Quando o criminoso for primário e de pequeno valor a coisa, o juiz poderá substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuir a pena de um a dois terços ou aplicar somente a pena de multa (§2º).

2.2.7.2.5 Outras fraudes

Art. 176 - Tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel ou utilizar-se de meio de transporte sem dispor de recursos para efetuar o pagamento:

Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa.

Parágrafo único - Somente se procede mediante representação, e o juiz pode, conforme as circunstâncias, deixar de aplicar a pena.

O delito supracitado pune o agente que tomar refeição, alojar-se em hotel ou utilizar meio de transportes sem dispor de recursos para efetuar o pagamento.

O sujeito ativo dessa figura típica poderá ser qualquer pessoa, enquanto que o sujeito passivo será aquele que presta o serviço.

Admite-se a forma tentada. O elemento subjetivo é o dolo.

Nos termos do parágrafo único, a ação penal será pública condicionada à representação. É importante mencionar ainda que, dependendo do caso, o juiz poderá deixar de aplicar a pena e conceder o perdão judicial ao acusado.

2.2.7.2.6 Fraudes e abusos na fundação ou administração de sociedade por ações

Art. 177 - Promover a fundação de sociedade por ações, fazendo, em prospecto ou em comunicação ao público ou à assembléia, afirmação falsa sobre a constituição da sociedade, ou ocultando fraudulentamente fato a ela relativo:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa, se o fato não constitui crime contra a economia popular.

§ 1º - Incorrem na mesma pena, se o fato não constitui crime contra a economia popular:

I - o diretor, o gerente ou o fiscal de sociedade por ações, que, em prospecto, relatório, parecer, balanço ou comunicação ao público ou à assembléia, faz afirmação falsa sobre as condições econômicas da sociedade, ou oculta fraudulentamente, no todo ou em parte, fato a elas relativo;

II - o diretor, o gerente ou o fiscal que promove, por qualquer artifício, falsa cotação das ações ou de outros títulos da sociedade;

III - o diretor ou o gerente que toma empréstimo à sociedade ou usa, em proveito próprio ou de terceiro, dos bens ou haveres sociais, sem prévia autorização da assembléia geral;

IV - o diretor ou o gerente que compra ou vende, por conta da sociedade, ações por ela emitidas, salvo quando a lei o permite;

V - o diretor ou o gerente que, como garantia de crédito social, aceita em penhor ou em caução ações da própria sociedade;

VI - o diretor ou o gerente que, na falta de balanço, em desacordo com este, ou mediante balanço falso, distribui lucros ou dividendos fictícios;

VII - o diretor, o gerente ou o fiscal que, por interposta pessoa, ou conluiado com acionista, consegue a aprovação de conta ou parecer;

VIII - o liquidante, nos casos dos ns. I, II, III, IV, V e VII;

IX - o representante da sociedade anônima estrangeira, autorizada a funcionar no País, que pratica os atos mencionados nos ns. I e II, ou dá falsa informação ao Governo.

§ 2º - Incorre na pena de detenção, de seis meses a dois anos, e multa, o acionista que, a fim de obter vantagem para si ou para outrem, negocia o voto nas deliberações de assembléia geral.

O crime em questão tem como objetividade jurídica a tutela do patrimônio dos acionistas[50].

O sujeito passivo poderá ser qualquer pessoa. Por ser delito próprio, somente o sócio-fundador da sociedade por ações é que poderá ser o sujeito ativo.

Trata-se de crime doloso e formal, que admite a forma tentada.

2.2.7.2.7 Emissão irregular de conhecimento de depósito ou "warrant"

“Art. 178 - Emitir conhecimento de depósito ou warrant, em desacordo com disposição legal:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa”.

Além da tutela ao patrimônio, o delito em estudo tem também como objetividade jurídica a credibilidade comercial dos títulos de créditos.

O sujeito ativo é o emitente do conhecimento de depósito ou warrant e o sujeito passivo é o endossatário ou portador do conhecimento de depósito ou warrant[51].

O elemento subjetivo é o dolo, admite-se a tentativa e a consumação ocorre com a circulação dos títulos.

A ação penal é pública incondicionada.

2.2.7.2.8 Fraude à execução

Art. 179 - Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou simulando dívidas:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

Parágrafo único - Somente se procede mediante queixa.

Acerca do bem jurídico tutelado por esse tipo penal, Cezar Roberto Bittencourt comenta:

O bem jurídico protegido, nesse tipo penal, também é o patrimônio, mais especificamente contra manobras ardilosas ou fraudulentas de devedores que, na tentativa de inviabilizar a ação judicial de seus credores, procuram evitar a execução forçada[52].

Pode-se dizer que tal dispositivo visa garantir a administração da justiça, já que preza pelo cumprimento das decisões judiciais.

O sujeito ativo será sempre o devedor demandado judicialmente[53].  O sujeito passivo será o credor do direito que a execução visa garantir.

A fraude que trata esse artigo poderá ocorrer por meio de cinco formas distintas, quais sejam: 1) alienação, 2) desvio, 3) destruição, 4) danificação e 5) simulação de dívidas.

A consumação ocorre no momento em que o agente emprega a fraude e coloca-se em estado de insolvência, de modo a impossibilitar a execução. Admite-se a tentativa.

A ação penal será privada, nos termos do parágrafo único do artigo 179.

2.2.8 Da receptação

Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

A receptação é um crime que tem como objetividade jurídica o patrimônio. O sujeito ativo poderá ser qualquer pessoa, haja vista tratar-se de crime comum.

O sujeito passivo será o proprietário da coisa produto de crime.

O objeto material será a coisa móvel ou imóvel produto de crime. Assim, é pressuposto da receptação a ocorrência de um crime anterior, mesmo que não tenha sido objeto de inquérito policial ou processo crime.

Nos termos do parágrafo 4º: “A receptação é punível, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa”.

O “caput” do artigo 180 prevê duas modalidades de receptação simples: a própria e a imprópria.

A receptação simples dolosa própria está prevista na primeira parte do “caput” e é representada pelos verbos: adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar.

A receptação simples dolosa imprópria está prevista na segunda parte do “caput” e caracteriza-se pela influência para que terceiro de boa-fé adquira, receba ou oculte coisa que sabe ser produto de crime.[54]

O delito será qualificado quando a receptação ocorrer no exercício de atividade comercial, conforme preleciona o parágrafo 1º do artigo 180, in verbis:

Receptação qualificada

§ 1º - Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime:

Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa.

No caso da receptação qualificada, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercido em residência, equiparar-se-á à atividade comercial (§2º).

Assim como em outros delitos, o legislador também criou a figura privilegiada da receptação. A segunda parte do parágrafo 5º do artigo 180 possibilita ao juiz que no caso da receptação dolosa, sendo o criminoso primário e de pequeno valor a coisa, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa. 

2.2.8.1 Receptação culposa

O crime de receptação é o único crime contra o patrimônio no qual o legislador previu a modalidade culposa.

A receptação culposa, também conhecida como receptação negligente está descrita no parágrafo 3º do artigo 180 que dita:

§ 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso:

Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas.

Nesta modalidade de receptação o agente deveria presumir que a coisa que adquiriu ou recebeu era produto de crime em razão da natureza da coisa, da desproporção entre o valor e o preço ou em razão da condição em que a coisa foi oferecida.

A receptação negligente é infração de menor potencial ofensivo e por isso o processamento e julgamento do feito será de competência do Juizado Especial Criminal.

Em se tratando de receptação culposa, se o criminoso for primário, o juiz poderá, na análise do caso concreto, deixar de aplicar a pena (§5º, 1ª parte).

2.2.8.2 Causa de aumento de pena

A pena do “caput” do artigo 180 será aplicada em dobro quando o objeto do crime for bens ou instalações do patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista (§6º).


03: SANÇÃO PENAL

3.1 Do conceito de sanção penal

Conforme observado no capítulo anterior, ao estudar individualmente os crimes previstos no Título II do Código Penal, necessariamente cita-se as penas que deverão ser aplicadas ao infrator de cada delito.

A pena é uma espécie de sanção penal. A sanção penal é a consequência da prática de um delito, é retribuição estatal ao infrator da norma penal que tem como objetivo a manutenção da ordem social. É a realização do jus puniendi do Estado.

Luiz Flávio Gomes e Antonio García-Pablos de Molina distinguem os termos sanção e sanção penal. Para eles, sanção é um gênero ao qual pertencem: a) as penas; b) as medidas de segurança e c) as medidas alternativas (por exemplo: as medidas aplicadas como decorrência da transação penal, previstas na Lei dos Juizados Especiais – Lei 9.099/95, art. 76; medidas aplicadas ao usuário de drogas, por força do artigo 28 da Lei 11.343/2006 etc.)[55]. De modo que concluem que “toda medida alternativa é uma sanção, mas nem sempre ela conta com natureza penal. Daí a relevância de serem distinguidos os conceitos de sanção (gênero) e de sanção penal (espécie)”[56].

As medidas alternativas supracitadas não serão abordadas neste trabalho tendo em vista que estão previstas em leis esparsas e que o estudo delas desviaria do objetivo pretendido por este trabalho.

3.2 Das espécies de sanções penais

3.2.1 Das medidas de segurança

As medidas de segurança são tratadas no Título VI da Parte Geral do Código Penal.

A medida de segurança é uma espécie de sanção penal que tem caráter preventivo e terapêutico (curativo), que visa evitar que o autor de um fato havido como infração penal, inimputável ou semi-imputável, mostrando periculosidade, venha a cometer outro delito e receba tratamento adequado[57].

O Código Penal atual adotou o sistema vicariante na aplicação da medida de segurança, ou seja, o juiz não poderá aplicar cumulativamente a pena e a medida de segurança devendo optar por um ou outra.

As medidas de segurança poderão ser de duas espécies: 1) de internação em hospital de custódia ou tratamento psiquiátrico ou outro estabelecimento adequado; ou 2) de tratamento ambulatorial.

Para a aplicação da medida de segurança exigem-se os seguintes pressupostos: a) ocorrência de crime, b) inimputabilidade ou semi-imputabilidade do agente, e c) periculosidade.

A medida de segurança não possui um prazo máximo de duração, sendo esta por tempo indeterminado enquanto a periculosidade persistir. O prazo mínimo da medida de segurança será de um a três anos.

3.2.2 Da pena

Certo dicionário jurídico define pena como:

a sanção legal, punição ou cominação prevista em lei, que o Estado impõe àquele que infringe norma de direito. Punição legal da culpa apurada em processo judicial, nos limites da lei. Entre os caracteres da pena estão: a legalidade, que exige a prévia cominação legal para sua aplicação, não havendo crime nem pena sem lei que os defina; a pessoalidade, não passando a pena da pessoa do delinqüente, o que é preceito constitucional; e a proporcionalidade, que diz que a pena deve ser proporcional ao delito praticado, o que não impede que ela seja individualizada, levando o juiz em contra fatores subjetivos, como reincidência, a personalidade do réu etc.[58]

Guilherme de Souza Nucci define pena como “a sanção imposta pelo Estado, através da ação penal, ao criminoso, cuja finalidade é a retribuição ao delito perpetrado e a prevenção a novos crimes”[59].

Fernando Capez define pena como a “sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cuja a finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinqüente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade”[60].

As penas podem ser privativas de liberdade, restritivas de direito ou de multa (artigo 32 do Código Penal).

As penas privativas de liberdade podem ser: a) de reclusão – cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto; b) de detenção – cumprida em regime semiaberto ou aberto, salvo a hipótese de excepcional transferência para o regime fechado; ou c) prisão simples - prevista apenas para as contravenções penais e pode ser cumprida nos regimes semiaberto ou aberto (artigo 33 do Código Penal).

O que diferencia as espécies de regimes são os estabelecimentos em que se darão a execução da pena. Assim, no regime fechado a execução da pena se dá em estabelecimento de segurança máxima ou média, no regime semiaberto o sentenciado cumpre a pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar e, finalmente, no regime aberto o sentenciado cumpre a pena em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado, sendo certo que este trabalha fora durante o dia e à noite recolhe-se ao albergue.

As penas restritivas de direitos estão previstas no artigo 43 do Código Penal. Podem ser: 1) de prestação pecuniária, 2) de perda de bens e valores, 3) de prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas, 4) de interdição temporária de direitos, ou 5) de limitação de fim de semana.

As penas restritivas de direitos substituem as penas privativas de liberdade quando preenchidos os seguintes requisitos: a) que o crime seja culposo independentemente da quantidade de pena fixada ou que o crime seja doloso e a pena privativa de liberdade aplicada não ultrapasse quatro anos e desde que o delito tenha sido cometido sem o emprego de violência ou grave ameaça à pessoa; b) que o réu não seja reincidente em crime doloso[61]; e c) a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente para a prevenção e repressão do crime.

As penas restritivas de direitos tem a mesma duração que as penas restritivas de liberdade e estas não podem ser aplicadas cumulativamente, haja vista o seu caráter substitutivo, conforme já mencionado.

A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou à entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos.

A perda de bens e valores refere-se a bens ou títulos ou ações pertencentes ao condenado e que reverterão em favor do Fundo Penitenciário Nacional, tendo como montante o prejuízo causado ou o provento obtido pelo agente ou terceiro em razão da prática do crime.

A prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas consiste na atribuição ao condenado de tarefas gratuitas junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos ou outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais.

A interdição temporária de direitos consiste na: a) proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo; b) na proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependem de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público; c) na suspensão de autorização ou habilitação para dirigir veículo; e d) na proibição de frequentar determinados lugares.

A limitação de fim de semana consiste na obrigação de permanecer, aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado, onde poderão ser ministrados aos condenados cursos, palestras ou atribuídas atividades educativas.

Por fim, falta tratarmos da pena de multa. O próprio artigo 49 do Código Penal preleciona o conceito dessa espécie de pena:

“Art. 49. A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa”.

Feitas essas breves considerações gerias acerca do instituto da pena no direito penal, é de suma importância estudar-se a seguir as finalidades da sanção penal tendo em vista que essa abordagem será vital ao que se sucederá nos capítulos seguintes.

3.3 Das finalidades da sanção penal

Embora já diferenciadas as espécies de sanções penais, neste subitem trataremos das finalidades da sanção penal de modo geral, no entanto, se abstendo, mais especificamente, às finalidades da pena.

No tópico anterior, ao conceituar-se pena, foi mencionadas, ainda que superficialmente, as finalidades da sanção penal. Falou-se em retribuição ao delito, prevenção a novos crimes e promoção de readaptação social.

A doutrina comumente ensina que a finalidade da pena é explicada por três teorias: 1. Teorias absolutas ou retributivas da pena; 2. Teorias relativas; e 3. Teorias unificadoras ou ecléticas.

As teorias absolutas ou retributivas, como o próprio nome sugere, derivam do Estado absolutista. Num regime absolutista, impunham-se pena àquele que agia contra o soberano, de modo que o indivíduo ao rebelar-se contra este, era encarado como se estivesse também se rebelando contra o próprio Deus. A pena traduzia a ideia de ser um castigo pelo qual se expiava o mal (pecado) cometido[62].

O fundamento ideológico das teorias retributivas da pena baseia-se no reconhecimento do Estado como guardião da justiça terrena e como conjunto de ideias morais, na fé, na capacidade do homem para se autodeterminar e na ideia de que a missão do Estado perante os cidadãos deve limitar-se à proteção da liberdade individual. Nas teorias absolutas coexistem, portanto, ideias liberais, individualistas e idealistas[63]·.

Em suma, as teorias absolutistas transmitem a ideia que a finalidade da pena é punir o autor do delito. “A pena é a retribuição do mal injusto, praticado pelo criminoso, pelo mal justo previsto no ordenamento jurídico (punitur quia peccatum est)”[64].

Para as teorias preventivas ou relativas, a pena não visa a retribuição do mal cometido e sim a prevenção da prática de um novo delito. Diferentemente da teoria anterior, esta não se baseia na realização da justiça e sim na inibição da prática de novos crimes, ou seja, impõe-se pena ao delinquente a fim de que o mesmo não venha a reincidir no cometimento de outra infração penal.

A prevenção a que se referem as teorias relativas divide-se em: prevenção geral e prevenção especial. A prevenção geral é caracterizada pela intimidação dirigida à sociedade, assim, as pessoas não cometem crimes, pois tem medo de serem punidas. Já a prevenção especial dirige-se exclusivamente ao delinquente porque objetiva a readaptação e a segregação social deste como meio de impedi-lo de voltar a delinquir[65].

As teorias mistas, unificadoras, ecléticas, intermediárias ou conciliatórias da pena tentam agrupar um conceito único aos fins da pena. Esta corrente tenta reunir os aspectos mais destacados das teorias absolutas e relativas[66].

As teorias unificadoras aceitam a retribuição e o princípio da culpabilidade como critérios limitadores da intervenção da pena como sanção jurídico-penal. A pena não pode, pois, ir além da responsabilidade decorrente do fato praticado[67].

Por esta teoria, temos que a pena tem “a dupla função de punir o criminoso e prevenir a prática do crime, pela reeducação e pela intimidação coletiva (punitur quia peccatum est et ne peccetur)”[68].

Essas são as teorias mais comuns que tentam explicar as finalidades da pena. Desse modo, conclui-se que não é incorreto dizer que a pena possui finalidade retributiva, preventiva e ressocializadora, ainda que esta última seja considerada por muitos como um mito.

Tendo em vista o que se abordará futuramente neste trabalho, mister se faz dar um especial destaque à função ressocializadora da pena. A ressocialização é a reeducação do sentenciado, que possibilita ao mesmo a reinserção ao meio social de modo a não cometer mais delitos.

A própria lei de execuções penais (lei 7.210/84), em seu artigo 1º, já transmite essa ideia de ressocialização que a pena deve ter, nos seguintes termos:

“A execução da penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado” (grifos nossos)

A realidade, no entanto, é outra. Discorrendo sobre a questão do comportamento futuro do indivíduo que é sujeito a uma pena privativa de liberdade, Alessandro Baratta comenta: “antes de terem um efeito reeducativo sobre o delinqüente determinam, na maioria dos casos, uma consolidação da identidade desviante do condenado e o seu ingresso em uma verdadeira e própria carreira criminosa”.[69]

Em razão dos altos índices de reincidência no Brasil, a grande maioria da população não acredita nessa função ressocializadora das penas. A ideia de que o indivíduo que for condenado a uma pena de prisão em regime fechado e que permaneça num estabelecimento prisional por quatro anos e que após esse tempo o mesmo saia completamente regenerado ou reeducado é, infelizmente, uma grande utopia e algo muito distante da atual situação brasileira.

Falando a respeito dessa função da pena, Cezar Roberto Bittencourt Comenta: “Não se pode atribuir às disciplinas penais a responsabilidade exclusiva de conseguir a completa ressocialização do delinqüente, ignorando a existência de outros programas e meios de controle social de que o Estado e a sociedade devem dispor com objetivo ressocializador, como são a família, a escola, a Igreja etc.”[70].

Ainda que mínima e não exclusiva das disciplinas penais, a função ressocializadora da pena deve ser algo a ser perseguido pelo Estado e pela Justiça.


04: PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

4.1 Da definição de princípio

O termo princípio deriva do latim principium que, por sua vez, deriva das palavras primus e cipium que traduzem a idéia de primeiro e considerar. Assim, após uma análise etimológica da palavra pode-se dizer que princípio é aquilo que deve ser primeiramente considerado, são regras-mestras dentro do sistema positivo.[71]

Em geral, os dicionários definem princípio como o “preceito, regra, causa primária, proposição, começo ou origem”[72].  

Carlos Ari Sundfeld comenta que “os princípios são as idéias centrais de um sistema, ao qual dão sentido lógico, harmonioso, racional, permitindo a compreensão de seu modo de organizar-se”.[73]

Guilherme de Souza Nucci falando a respeito da importância e do significado da palavra princípio no âmbito jurídico comenta: “o conceito de princípio indica uma ordenação, que se irradia e imanta os sistemas de normas, servindo de base para a interpretação, integração, conhecimento e aplicação do direito positivo”[74].

Princípio é, por definição, o mandamento nuclear de um sistema, seu verdadeiro alicerce, sua causa primária, seu germe. Por isso mesmo, violar um princípio é muito mais gravoso do que agredir uma norma ou comando determinado, porquanto implica repúdio a todo um sistema. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais[75].

O trecho mencionado deixa bem clara a importância dos princípios no direito, seja ele penal, administrativo, tributário etc.

No direito penal há vários princípios básicos, dentre eles, destacam-se: o princípio da legalidade, o da intervenção mínima, da fragmentariedade, da humanidade, da lesividade, da culpabilidade, da taxatividade, da proporcionalidade, da anterioridade, da retroatividade da lei penal mais benéfica, da personalidade, da individualização da pena e o princípio da vedação da dupla punição pelo mesmo fato.

Conforme vem sendo salientado neste trabalho, interessa-nos o estudo do princípio da insignificância, de modo que, feita essas breves considerações acerca de princípios, pode-se passar à análise do princípio da insignificância.

4.2 Princípio da insignificância

A Constituição Federal logo em seu artigo 1º, inciso III, estabelece que a República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito, o qual tem como fundamento a dignidade da pessoa humana.

A descrição formal de um fato criminoso dentro de um Estado Democrático de Direito, tem de observar se o fato tem relevância e tutela os mais importantes interesses sociais, ou seja, aqueles identificáveis com os direitos humanos. Os direitos humanos e a dignidade da pessoa humana são fundamentais já que deles decorrem vários princípios penais.[76]

Embora nosso sistema jurídico careça de uma definição clara do que vem a ser a dignidade da pessoa humana, é possível tecer-se algumas conclusões a este respeito.

A palavra dignidade deriva do latim dignitas ou dignitatis. É definida como a “qualidade de quem é digno; nobreza; respeitabilidade”[77]. Pode ainda significar “o respeito que merece alguém ou alguma coisa”[78].

Logo, pode-se concluir que a dignidade da pessoa humana constitui um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, pelo qual subentende-se o respeito que deve ser prestado pelo Estado a todos os indivíduos presentes em seu território. O Estado deve criar meios que possibilitem uma vida digna a todos.

Num primeiro momento essas considerações acerca da dignidade da pessoa humana poderiam parecer desnecessárias haja vista que o tema desse subitem é o princípio da insignificância e não o conceito de dignidade da pessoa humana. Entretanto, tal introdução é essencial uma vez que o princípio da insignificância decorre da dignidade humana e já que é um princípio regente a todo ordenamento jurídico.

No que tange aos princípios penais específicos, o princípio da insignificância ou bagatela, encontra íntima relação com os princípios da fragmentariedade e da intervenção mínima.

O princípio da fragmentariedade trata-se de corolário do Princípio da Intervenção Mínima e do Princípio da Legalidade. Significa que o Direito Penal não deve sancionar todas as condutas lesivas aos bens jurídicos, mas tão-somente aquelas mais graves e danosas, incidentes sobre os bens mais relevantes.[79]

O princípio da intervenção mínima, por sua vez, estabelece que o direito penal só deve atuar na defesa dos bens jurídicos relevantes para os indivíduos e para a sociedade, bens imprescindíveis à convivência pacífica dos homens e que não podem ser protegidos de outra forma. É medida de orientação e limitação do poder punitivo estatal.[80] O princípio da insignificância é um princípio paralelo e corolário ao princípio da intervenção mínima.

O dicionário da língua portuguesa Michaelis descreve o termo bagatela como sendo:

“1. Coisa de pouco valor ou inútil. 2. Quantia insignificante, ninharia”[81].

Guilherme de Souza Nucci aduz que insignificante pode representar algo de valor diminuto ou desprezível, bem como algo de nenhum valor.[82]

O princípio da insignificância ou bagatela é um princípio penal limitador. Este princípio não está na dogmática jurídica, sendo certo que resulta da criação exclusivamente doutrinária e pretoriana[83].

Em nossa legislação pátria, entretanto, o princípio da bagatela encontra-se contemplado no Decreto-lei 1.001 de 21.10.1969 (Código Penal Militar), em seu artigo 240, §1º, que dita:

§ 1º Se o agente é primário e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou considerar a infração como disciplinar. Entende-se pequeno o valor que não exceda a um décimo da quantia mensal do mais alto salário mínimo do país.

Fernando Capez[84] explica que esse princípio originou-se no Direito Romano, sendo certo que deriva do brocardo minimis non curat praetor. Foi introduzido no sistema penal em 1964 por Claus Roxin.

No que tange à sua localização na teoria do delito e natureza jurídico-penal, há grande divergência doutrinária, existindo três correntes acerca do assunto que consideram o princípio da bagatela como: a) excludente de tipicidade; b) excludente de antijuridicidade; e c) excludente de culpabilidade.

4.2.1 Da natureza jurídico-penal do princípio da insignificância
4.2.1.1 O princípio da insignificância como excludente de tipicidade

A corrente que considera o princípio da insignificância como excludente de tipicidade é a mais difundida pela doutrina tradicional e é a que nos parece mais correta. Para os adeptos de tal teoria, consiste o princípio da insignificância na idéia de que o Direito Penal não deve se preocupar com bagatelas, do mesmo modo que não podem ser admitidos tipos incriminadores que descrevam condutas incapazes de lesar o bem jurídico, já que a tipicidade exige um mínimo de lesividade a esse[85].

Capez comenta que: “se a finalidade do tipo penal é tutelar um bem jurídico, sempre que a lesão for insignificante, a ponto de se tornar incapaz de lesar o interesse protegido, não haverá adequação típica”[86].

Corroborando com o entendimento de Fernando Capez, Carlos Vico Mañas também entende que o princípio da insignificância é causa de exclusão da tipicidade. Diz ele que o juízo de tipicidade, para que tenha efetiva significância e para que não atinja fatos que devam ser estranhos ao Direito Penal, por sua aceitação pela sociedade ou dano social irrelevante, deve entender o tipo, na sua concepção material, como algo dotado de conteúdo valorativo, e não apenas sob o seu aspecto formal, de cunho eminentemente diretivo. Para dar validade sistemática à irrefutável conclusão político-criminal de que o Direito Penal só deve ir até onde seja necessário para a proteção do bem jurídico, não se ocupando com bagatelas, é preciso considerar materialmente atípicas as condutas lesivas de inequívoca insignificância para a vida em sociedade. E arremata: a concepção material do tipo, em conseqüência, é o caminho cientificamente correto para que se possa obter a necessária descriminalização de condutas que, embora formalmente típicas, não mais são objeto de reprovação social nem produzem danos significativos aos bens jurídicos protegidos pelo Direito Penal[87].

Zaffaroni e Pirangeli entendem que a insignificância da afetação de bens jurídicos exclui a tipicidade, mas só pode ser estabelecida através da consideração conglobada da norma: toda a ordem normativa persegue uma finalidade; tem um sentido, que é a garantia jurídica para possibilitar uma coexistência que evite a guerra civil (a guerra de todos contra todos). A insignificância só pode surgir à luz da finalidade geral, que dá sentido à ordem normativa, e, portanto, à norma em particular, que indica que essa hipóteses estão excluídas de seu âmbito de proibição, o que não pode ser estabelecido à simples luz da sua consideração isolada. O princípio da insignificância, portanto, é causa de atipicidade conglobante[88].

4.2.1.2 O princípio da insignificância como excludente de antijuridicidade

Embora minoritária, há quem entenda que o princípio da bagatela exclui em verdade a antijuridicidade. Alberto da Silva Franco e Carlos Frederico Pereira são alguns dos defensores de tal entendimento.

Alberto Silva Franco ao vincular o princípio da insignificância à antijuridicidade material aduz que vivemos num Estado Democrático de Direito, ao qual deve ser atribuído sentido material, que “corporifica em si a proteção da liberdade pessoal e política dos cidadãos e a moderação e juridicidade de todo o exercício do Poder Público”[89]. Defende, também, que a lesão ao bem jurídico protegido deve ser relevante para que provoque a persecucção.

Carlos Frederico Pereira, por sua vez, ensina que “a insignificância no tipo indiciário se manifesta, como visto de regra na antijuridicidade material, pois é esta que contém o bem jurídico e exige a sua lesão e acima de tudo, que seja significante, sem o que não se poderá conceber a existência de crime”.[90]

4.2.1.3 O princípio da insignificância como excludente de culpabilidade

A terceira e última corrente acerca na natureza jurídico-penal do princípio da insignificância, o situa no campo da culpabilidade e o considera como uma eximente de pena.[91] Tal corrente é a menos aceita de todas.

Dentre os seus poucos seguidores, encontra-se Abel Cornejo que entende que o princípio da insignificância como excludente da culpabilidade é algo bem mais plausível do que excludente de antijuridicidade, pois erige-se como um limite à ingerência do Estado e uma justificação ética à aplicação da pena, sendo sua aplicação atribuição do juiz, que, no caso concreto, deverá determinar se se encontra diante de uma conduta penalmente insignificante ou, pelo contrário, a ação reveste-se de gravidade suficiente para constituir-se num ilícito penal. Desse modo, aduz que para delimitar o âmbito da aplicação do princípio da insignificância, deve o juiz ponderar sobre o conjunto de circunstâncias que rodeiam a ação, a fim de estabelecer se a finalidade abrange a produção de perigos ou lesões relevantes para o bem jurídico ou só afetações ínfimas. Assim, sustenta que a falta de proporcionalidade entre o fato penalmente insignificante e o castigo que deveria aplicar-se ao autor torna conveniente eximir de pena o agente, uma vez que encontra-se ausente a justificação ética da pena.[92]

4.2.3 Breves conclusões

Pelo que foi exposto, entendemos que o princípio da insignificância é aquele que permite infirmar a tipicidade de fato que, por sua inexpressividade, constituem ações de bagatela, despidas de reprovação, de modo a não merecerem valoração da norma penal, exsurgindo, pois, como irrelevantes[93].

O princípio da insignificância se ajusta à equidade e à correta interpretação do direito. Por equidade, acolhe-se um sentimento de justiça, inspirado nos valores vigentes na sociedade, liberando-se o agente cuja ação, por sua inexpressividade, não chega a atentar contra os valores tutelados pelo Direito Penal. Por interpretação correta do direito, exige-se uma hermenêutica mais condizente do direito, que não pode ater-se a critérios inflexíveis de exegese, sob pena de desvirtuar o sentido da própria norma e conduzir a graves injustiças[94].

Em suma, o princípio da bagatela deve ser aplicado e interpretado junto com os demais princípios de direito penal, usando-se de razoabilidade e proporcionalidade, tendo em vista que a finalidade é evitar que os autores de condutas penais irrelevantes sejam severamente punidos sem necessidade. O reconhecimento de fato penalmente insignificante gera a atipicidade da conduta e, em conseqüência, a isenção de pena, já que falta um dos elementos do fato típico. Todavia, a gradação qualitativa e quantitativa do injusto, permite que o fato criminoso insignificante seja excluído da tipicidade penal, mas possa receber tratamento adequado – se necessário – como ilícito civil, administrativo etc., quando assim o exigirem preceitos legais ou regulamentares extrapenais[95]

Todavia haja um clamor constante por parte da sociedade no que tange à realização da justiça, pode-se dizer que essa ao considerar irrelevante determinado fato criminoso, retira a reprovabilidade da conduta, de modo que não mais persistem as razões para a aplicação das penalidades legais.

Porém, quais são os critérios que devem estar presentes na conduta do agente para que esta possa ser considerada como insignificante?

4.2.4 Critérios para aplicação do princípio da insignificância

A aplicação do princípio da insignificância no direito penal, não só no que diz respeito aos crimes contra o patrimônio, depende da análise da situação concreta, ou seja, está relacionado ao caso prático não havendo uma formula genérica ou previsão legal que determine, por exemplo, que os fatos “x”, “y” ou “z” realizados da maneira “a”, “b” ou “c” serão obrigatoriamente tidos como insignificantes.

Conforme dito anteriormente, diante da inexistência de regras legais expressas, os operadores do direito debatem sobre quais seriam os requisitos mínimos para que pudesse ser aplicado o princípio da bagatela.

De maneira geral, as propostas de criação de tais requisitos giram em torno das seguintes considerações: 1) o valor do bem jurídico em termos concretos, 2) a lesão ao bem jurídico em visão global, e 3) a consideração particular aos bens jurídicos materiais de expressivo valor social[96]. No entanto, não se chega à unanimidade de aceitação de tais requisitos.

Tentando dirimir a questão, o Supremo Tribunal Federal[97] criou requisitos que devem ser observados na hora da aplicação do princípio da bagatela. O Supremo decidiu que o princípio da insignificância não deve ser aplicado tomando-se por base tão somente o valor do bem jurídico, mas também deve-se observar os seguintes requisitos:

1.            Mínima ofensividade da conduta do agente;

2.            Nenhuma periculosidade social da ação;

3.            Reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e

4.            Inexpressividade da lesão jurídica provocada.

Conforme observado, para aplicação do princípio da insignificância não basta, apenas, o valor do bem ofendido. Inclusive, chama-se atenção ao fato de que o valor do bem ofendido é relativo, pois há julgados em que se considerou como ínfimas as quantias de 18, 20, 45, 80 ou 267 reais.

Por fim, convém salientar que nos delitos patrimoniais a insignificância não leva em conta a capacidade econômica da vítima[98].

Agora que já se sabe no que consiste o princípio da bagatela e quais são os fatores que permitem sua aplicação, ver-se-á no próximo capitulo quais dos delitos contra o patrimônio vistos anteriormente admitem, ainda que só teoricamente, a aplicação do princípio da insignificância.


05: O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E SUA APLICAÇÃO NOS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO DO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO

5.1 Introdução

Neste capítulo ver-se-á casos concretos em que a Justiça brasileira optou por aplicar o princípio da insignificância nos crimes contra o patrimônio, retirando a tipicidade das condutas praticadas pelos agentes.

Verificar-se-á que a maioria dos julgados decorrem de tribunais superiores (STJ ou STF) o que revela certo conservadorismo (legalista ou formalista) por parte dos juízes de primeira instância, bem como por parte dos tribunais estaduais. Tomaremos por base o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e confrontaremos suas decisões acerca da aplicabilidade do princípio da insignificância às decisões dos tribunais superiores.

É necessário salientar que embora se pretenda demonstrar a aplicação concreta do princípio da insignificância em todos os crimes patrimoniais, desde já chama-se a atenção ao fato que nem todos os crimes permitem a aplicação desse princípio em razão da sua própria natureza.

Ademais, tem-se o problema da evolução da sociedade e a conseqüente desatualização do Código Penal em relação a alguns crimes. Há crimes que raramente ocorrem, crimes esses em relação aos quais são difíceis de se encontrar julgados, quanto mais encontrar a aplicação do princípio da insignificância nesses.

A respeito dessa desatualização das leis penais Guilherme de Souza Nucci comenta: 

A bagatela expõe duas facetas do sistema normativo: a desatualização das leis e o descompasso entre teoria e prática. Ilustrando, prevê-se como infração penal, demandando ação penal pública incondicionada, o furto (art. 155, CP). O bem jurídico tutelado é o patrimônio. A desatualização do Código Penal é inconteste, visto ser um bem de natural disposição, passível de renúncia e doação, motivo pelo qual jamais poderia sustentar o cabimento de ação pública incondicionada, obrigando a atuação do Ministério Público, ainda que desacreditada pela vítima. O descompasso emerge na exata medida em que os casos concretos identificam investidas contra o patrimônio alheio, merecedoras de eventual reparação na esfera civil, mas sem fornecer qualquer toque de legitimação para a interferência do Direito Penal[99].

O estudo da aplicação prática do princípio da insignificância neste momento será feita capítulo a capítulo do Título II do Código Penal, e não artigo por artigo como fora feito no capítulo 2 deste trabalho em razão das dificuldades acima aduzidas. Traremos a matéria jurisprudencial pertinente e eventualmente as questões doutrinárias que envolvem o tema.

5.2 Da aplicação do princípio da insignificância aos crimes contra o patrimônio do Código Penal: possibilidade teórica de aplicação do princípio e aplicação prática do princípio de acordo com a jurisprudência pátria

5.2.1 O princípio da insignificância no furto

A aplicação do princípio da bagatela ou insignificância no delito de furto simples é perfeitamente possível.

Rogério Greco comenta: “em regra, pode-se aplicar o princípio da insignificância quando os bens tiverem valor de troca, ficando impossibilitado o seu raciocínio, também como regra, quando os bens tiverem valor de uso, ou seja, um valor afetivo, sentimental”[100].

Inicialmente mister se faz mencionar que o Tribunal de Justiça de São Paulo possui caráter extremamente conservador, sendo certo que, conforme se verificará, tem optado, na maioria dos casos, pela inaplicabilidade do princípio da insignificância, chegando, inclusive, a reformar decisões proferidas em primeiro grau, nas quais o magistrado reconheceu a insignificância em casos de furto simples, como se demonstra:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - FURTO - Subtração de brinquedo avaliado em R$ 15,00 (quinze reais). Inaplicabilidade do princípio da insignificância nesse momento processual. Necessidade de produção de provas, tendo em vista que a bagatela não pode ser reconhecida observando-se apenas o valor da "res furtiva" - RECEBIMENTO DA DENÚNCIA – RECURSO PROVIDO. (Recurso em Sentido Estrito nº 990.10.133448-8. Voto nº 2437. Relator Camilo Lellis. TJSP. 15ª Câmara de Direito Criminal. 24/03/2011)

Diferentemente, o Superior Tribunal de Justiça tem aplicado amplamente o princípio da insignificância em casos de furto simples:

HABEAS CORPUS. CRIME DE FURTO SIMPLES (CAPUT DO ART. 155 DO CP). OBJETO DO DELITO: CINCO PEÇAS DE ROUPAS USADAS. ALEGADA INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA PENAL. ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA, POR SE TRATAR DE UM INDIFERENTE PENAL. PROCEDÊNCIA DA ALEGAÇÃO. ORDEM CONCEDIDA. 1. O furto de cinco peças de roupas usadas, nas circunstâncias do caso, não agride materialmente a norma que se extrai do art. 155 do Código Penal. Peças de roupas usadas que foram restituídas integralmente à vítima, sendo certo que o acusado não praticou nenhum ato de violência. 2. Para que se dê a incidência da norma penal não basta a mera adequação formal do fato empírico ao tipo legal. É preciso que a conduta delituosa se contraponha, em substância, ao tipo em causa. Necessário que a vítima experimente efetivo desfalque em seu patrimônio, ora maior, ora menor, ora pequeno, mas sempre um real prejuízo material. Não a subtração de algo que já estava logicamente destinado a descarte, pela exaustão do seu uso pessoal e valor pecuniário ínfimo. Pena de se provocar a desnecessária mobilização de u'a máquina custosa, delicada e ao mesmo tempo complexa como é o aparato de poder em que o Judiciário consiste. Poder que não é de ser acionado para, afinal, não ter o que substancialmente tutelar. 3. A inexpressividade financeira dos objetos subtraídos pelo acusado (menos de cem reais) salta aos olhos. A revelar muito mais uma extrema carência material do ora paciente do que uma firme intenção e menos ainda toda uma crônica de vida delituosa. Paciente que, nos termos da proposta de suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei nº 9.099/95), não se apresenta com nenhuma condenação anterior e preenche, em linha de princípio, os requisitos do art. 77 do Código Penal (I - o condenado não seja reincidente em crime doloso; II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício). 4. Desfalque praticamente nulo no patrimônio da suposta vítima, que, por isso mesmo, nenhum sentimento de impunidade experimentará com o reconhecimento da atipicidade da conduta do agente. 5. Habeas corpus deferido para determinar o trancamento da ação penal, na linha do parecer ministerial público. (HC 92411- Rel. Carlos Britto. STF. 1ª Turma, 12.02.2008.Descrição:- Acórdãos citados: HC 84424, HC 88393, HC 92463. Número de páginas: 12 Análise: 12/06/2008, IMC. Revisão: 12/06/2008, JBM. Revisão: 19/09/2008, RCO. DSC_PROCEDENCIA_GEOGRAFICA: RS - RIO GRANDE DO SUL)

DIREITO PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE FURTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INCIDÊNCIA NO CASO. ORDEM CONCEDIDA. 1. A questão de direito tratada neste writ, consoante a tese exposta pela impetrante na petição inicial, é a suposta atipicidade da conduta realizada pelo paciente com base no princípio da insignificância. 2. Considero, na linha do pensamento jurisprudencial mais atualizado que, não ocorrendo ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma penal, por ser mínima (ou nenhuma) a lesão, há de ser reconhecida a excludente de atipicidade representada pela aplicação do princípio da insignificância. O comportamento passa a ser considerado irrelevante sob a perspectiva do Direito Penal diante da ausência de ofensa ao bem jurídico protegido. 3. Como já analisou o Min. Celso de Mello, o princípio da insignificância tem como vetores a mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada (HC 84.412/SP). 4. No presente caso, considero que tais vetores se fazem simultaneamente presentes. Consoante o critério da tipicidade material (e não apenas formal), excluem-se os fatos e comportamentos reconhecidos como de bagatela, nos quais têm perfeita aplicação o princípio da insignificância. O critério da tipicidade material deverá levar em consideração a importância do bem jurídico possivelmente atingido no caso concreto. 5. Habeas corpus concedido. (HC 96688- Rel. Ellen Gracie. STF- 2ª Turma, 12.05.2009.Descrição: Acórdãos citados: HC 83526, HC 84412, RHC 89624. Número de páginas: 9. Análise: 02/06/2009, MLM. ..DSC_PROCEDENCIA_GEOGRAFICA: RS - RIO GRANDE DO SUL)

O Tribunal de Justiça Paulista, mesmo em decisões recentes, não vem admitindo a aplicação do princípio da insignificância nos casos de furto qualificado, mesmo quando a coisa furtada for de pequeno valor e a qualificadora for decorrente do concurso de agentes. Colaciona-se trechos da apelação nº 0019792-37.2009.8.26.0482, na qual a 5ª Câmara de Direito Criminal daquele tribunal adotou tal posicionamento:

Furto qualificado. Provas evidenciando a autoria e a materialidade do delito. Apreensão da “res” em poder do corréu. Confissão policial do acusado corroborada pela prova colhida. Conduta típica. Impossibilidade de aplicação do princípio da insignificância. Condenação bem decretada. Qualificadora do concurso de agentes demonstrada pela prova oral. Reconhecimento do privilégio. Aplicação apenas de multa. Apelo improvido.

(...) Apelação Criminal interposta contra sentença que condenou GUILHERME ALMEIDA RIBEIRO DE OLIVEIRA à pena de 10 dias-multa (valor unitário mínimo), como incurso no artigo 155, parágrafo 4.º, inciso IV, do C. Penal. Sustenta o recorrente que, condenado pela subtração de barras de chocolate avaliadas em R$ 17,16, de rigor a aplicação do princípio da insignificância (...)

(...)Não há se falar em atipicidade da conduta. Não é caso de aplicação do princípio da insignificância, porque os bens subtraídos tinham valor econômico. (...)

(...) A qualificadora do concurso de agentes restou amplamente demonstrada pela prova oral. A pena não comporta reparo.(...)

A ementa dessa apelação foi assim proferida:

ACORDAM, em 5ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. (Apelação nº 0019792-37.2009.8.26.0482.Voto n.º : 15.973. Relator: PINHEIRO FRANCO. TJSP. 5ª Câmara de Direito Criminal. V.U. 05/05/2011)

A sexta câmara de direito criminal do TJSP, em decisão proferida no dia 05 de maio de 2011, negou a aplicação da insignificância ao caso de furto qualificado justificando que tal princípio não tem previsão legal, sendo certo que o relator assim se manifestou:

FURTO QUALIFICADO Sentença confirmada por seus próprios fundamentos, nos termos do art. 252, do R.I. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – Não albergado pela legislação pátria. Estado de Necessidade Situação famélica não comprovada. Apelo desprovido. (Apelação nº 990.10.326048-1. Voto nº 20.092. Relator: Ericson Maranho. TJSP. 6ª Câmara de Direito Criminal, 05/05/2011, V.U.) (grifos nossos)

A quinta turma do Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, vem admitindo a aplicação do princípio bagatelar, ainda quando se tratar de algumas espécies de furto qualificado, consumado ou tentado como se verifica nos seguintes julgados:

HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO DE SUCATA AVALIADA EM R$ 89,00. RES FURTIVA DE PEQUENO VALOR. CRIME DE BAGATELA. QUESTÃO NÃO SUBMETIDA À APRECIAÇÃO DO TRIBUNAL A QUO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA AFASTADA EM VIRTUDE DO AMPLO EFEITO DEVOLUTIVO DA APELAÇÃO. APLICABILIDADE, IN CASU, DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DO WRIT. ORDEM CONCEDIDA, NO ENTANTO, PARA ABSOLVER O PACIENTE COM FULCRO NO ART. 386, III DO CPP. 1. O princípio da insignificância, que está diretamente ligado aos postulados da fragmentariedade e intervenção mínima do Estado em matéria penal, tem sido acolhido pelo magistério doutrinário e jurisprudencial tanto desta Corte, quanto do colendo Supremo Tribunal Federal, como causa supra-legal de exclusão de tipicidade. Vale dizer, uma conduta que se subsuma perfeitamente ao modelo abstrato previsto na legislação penal pode vir a ser considerada atípica por força deste postulado. 2. Entretanto, é imprescindível que a aplicação do referido princípio se dê de forma prudente e criteriosa, razão pela qual é necessária a presença de certos elementos, tais como (I) a mínima ofensividade da conduta do agente; (II) a ausência total de periculosidade social da ação; (III) o ínfimo grau de reprovabilidade do comportamento e (IV) a inexpressividade da lesão jurídica ocasionada, consoante já assentado pelo colendo Pretório Excelso (HC 84.412/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 19.04.04). 3. No caso em apreço, o furto de sucata avaliada em R$ 89,00, além do pequeno valor, não afetou de forma expressiva o patrimônio da vítima, razão pela qual incide na espécie o princípio da insignificância. Precedentes. 4. Ordem concedida, para, aplicando o princípio da insignificância, absolver o ora paciente, com fulcro no art. 386, inciso III do CPP, em que pese o parecer ministerial em sentido contrário. (HC 200902463274-HC - HABEAS CORPUS – 157592 – Rel. Napoleão Nunes Maia Filho. STJ – Quinta Turma. Fonte:DJE DATA:13/12/2010. Data da Decisão: 21/10/2010)

HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. RES FURTIVA: VÁRIOS GÊNEROS ALIMENTÍCIOS, 1 LIQUIDIFICADOR E 1 PANELA DE PRESSÃO AVALIADOS EM R$ 45,00. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. PARECER DO MPF PELA CONCESSÃO DO WRIT. ORDEM CONCEDIDA, PARA, APLICANDO O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA, ABSOLVER O PACIENTE, COM FULCRO NO ART. 386, III DO CPP. 1. O princípio da insignificância, que está diretamente ligado aos postulados da fragmentariedade e intervenção mínima do Estado em matéria penal, tem sido acolhido pelo magistério doutrinário e jurisprudencial tanto desta Corte, quanto do colendo Supremo Tribunal Federal, como causa supra-legal de exclusão de tipicidade. Vale dizer, uma conduta que se subsuma perfeitamente ao modelo abstrato previsto na legislação penal pode vir a ser considerada atípica por força deste postulado. 2. Verificada a excludente de aplicação da pena, por motivo de política criminal, é imprescindível que a sua aplicação se dê de forma prudente e criteriosa, razão pela qual é necessária a presença de certos elementos, tais como (1) a mínima ofensividade da conduta do agente; (2) a ausência total de periculosidade social da ação; (3) o ínfimo grau de reprovabilidade do comportamento e (4) a inexpressividade da lesão jurídica ocasionada, consoante já assentado pelo colendo Pretório Excelso (HC 84.412/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 19.04.2004). 3. Tem-se que o valor dos bens furtados pelo paciente, além de ser ínfimo, não afetou de forma expressiva o patrimônio da vítima, razão pela qual incide na espécie o princípio da insignificância, reconhecendo-se a inexistência do crime de furto pela exclusão da tipicidade material. 4. Ordem concedida, para, aplicando o princípio da insignificância, absolver o paciente, com fulcro no art. 386, III do CPP, em consonância com o parecer ministerial. (HC 200902209443-HC - HABEAS CORPUS – 153198. Rel. Napoleão Nunes Maia Filho. STJ- Quinta Turma- Fonte:DJE DATA:13/12/2010.Data da Decisão: 21/10/2010)

HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO. RES FURTIVA: 3 SHAMPOOS, 3 DESODORANTES, 3 PACOTES DE CHOCOLATE GRANULADO, 3 LATAS DE LEITE CONDENSADO, 1 BOLO DE BANANA E 7 PASTEIS AVALIADOS EM R$ 69,46. PRÁTICA DE OUTROS PEQUENOS FURTOS. POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DO WRIT. ORDEM CONCEDIDA, PORÉM, PARA, APLICANDO O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA, RESTABELECER A DECISÃO DE 1o. GRAU QUE ABSOLVEU SUMARIAMENTE AS PACIENTES. 1. O princípio da insignificância, que está diretamente ligado aos postulados da fragmentariedade e intervenção mínima do Estado em matéria penal, tem sido acolhido pelo magistério doutrinário e jurisprudencial tanto desta Corte, quanto do colendo Supremo Tribunal Federal, como causa supra-legal de exclusão de tipicidade. Vale dizer, uma conduta que se subsuma perfeitamente ao modelo abstrato previsto na legislação penal pode vir a ser considerada atípica por força deste postulado. 2. Verificada a excludente de aplicação da pena, por motivo de política criminal, é imprescindível que a sua aplicação se dê de forma prudente e criteriosa, razão pela qual é necessária a presença de certos elementos, tais como (1) a mínima ofensividade da conduta do agente; (2) a ausência total de periculosidade social da ação; (3) o ínfimo grau de reprovabilidade do comportamento e (4) a inexpressividade da lesão jurídica ocasionada, consoante já assentado pelo colendo Pretório Excelso (HC 84.412/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 19.04.2004). 3. Tem-se que o valor dos bens furtados pelas pacientes, além de ser ínfimo, não afetou de forma expressiva o patrimônio da vítima, razão pela qual incide na espécie o princípio da insignificância, reconhecendo-se a inexistência do crime de furto pela exclusão da tipicidade material. 4. Entende esta Corte Superior de Justiça que a habitualidade na prática de furto não impede a aplicação do princípio da insignificância, pois os fatos devem ser considerados de forma objetiva (HC 120.972/MS, Rel. Min. NILSON NAVES, Dje 23.11.2009). Ressalva do ponto de vista do relator. 5. Ordem concedida para, aplicando o princípio da insignificância, restabelecer a decisão que absolveu sumariamente as pacientes, em que pese o parecer ministerial em sentido contrário. (HC 201000981250- HABEAS CORPUS – 174603. Rel. Napoleão Nunes Maia Filho. STJ. Quinta Turma. Fonte: DJE DATA:13/12/2010.Data da Decisão: 21/10/2010)

HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. FURTO QUALIFICADO PELO CONCURSO DE PESSOAS (ART. 155, § 4o., IV DO CPB.). SUBTRAÇÃO DE TRÊS POTES DE CREME E UM DE GELÉIA REAL, AVALIADOS EM R$ 60,00. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PARECER DO MPF PELO NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. ORDEM CONCEDIDA, NO ENTANTO, PARA DECLARAR ATÍPICA A CONDUTA PRATICADA, COM O CONSEQUENTE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. 1. Considerando-se que a tutela penal deve se aplicar somente quando ofendidos bens mais relevantes e necessários à sociedade, posto que é a última dentre todas as medidas protetoras a ser aplicada, cabe ao intérprete da lei penal delimitar o âmbito de abrangência dos tipos penais abstratamente positivados no ordenamento jurídico, de modo a excluir de sua proteção aqueles fatos provocadores de ínfima lesão ao bem jurídico por ele tutelado, nos quais têm aplicação o princípio da insignificância. 2. Desta feita, verificada a necessidade e utilidade da medida de política criminal, é imprescindível que sua aplicação se dê de forma prudente e criteriosa, razão pela qual é necessária a presença de certos elementos, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente; (b) a ausência total de periculosidade social da ação; (c) o ínfimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica ocasionada, consoante já assentado pelo colendo Pretório Excelso (HC 84.412/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 19.04.2004); nesse sentido, afirma-se que a existência de circunstância qualificadora não impede a incidência do princípio da insignificância. 3. No caso em apreço, mostra-se de todo aplicável o postulado permissivo, visto que evidenciado o pequeno valor do bem subtraído - três potes de creme e um de geléia real, avaliados em R$ 60,00. 4. Parecer do MPF pelo não conhecimento do writ. 5. Ordem concedida, no entanto, para declarar atípica a conduta praticada, com o consequente trancamento da Ação Penal. (HC 201001479150 - HABEAS CORPUS – 181936. Rel. Napoleão Nunes Maia Filho. STJ. Quinta Turma. Fonte DJE DATA 06/12/2010. Data da decisão: 04/11/2010)

Conforme brevemente demonstrado, preenchidos os requisitos mencionados no item 4.2.1, a aplicação do princípio da insignificância no furto seria possível ainda quando se tratasse de furto qualificado, entretanto, a aplicação da bagatela ainda encontra certa resistência por parte de alguns tribunais.

5.2.2 O princípio da insignificância no roubo e na extorsão

A doutrina majoritária entende que é impossível a incidência do princípio da insignificância nos crimes de roubo e extorsão.

Ambos os delitos são crimes complexos que tutelam não só o patrimônio, mas também a integridade física, a saúde e a liberdade individual do cidadão.

Essas características retiram por si só os requisitos para aplicação do princípio da insignificância, de modo que o valor inexpressivo do bem subtraído ou da vantagem econômica obtida ou almejada torna-se indiferente na hora de aplicação do princípio já que a violência, o constrangimento ou a ameaça excluem todos os demais requisitos tratados no capítulo anterior.

Guilherme de Souza Nucci destaca tal particularidade comentando: “Não se aplica o princípio da insignificância, pois é crime complexo, que protege outros bens além do patrimônio, de forma que a violência ou a grave ameaça não podem ser consideradas de menor relevância, configuradora do delito de bagatela”[101].

Cediço é o entendimento nos Tribunais:

Roubo qualificado pelo emprego de arma e concurso de agentes. Materialidade e autoria comprovadas. Prova segura. “Res furtiva” e arma utilizada no delito apreendidas no veículo ocupado pelos réus poucos minutos após a subtração. Condenação mantida. Crime consumado. Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. Acréscimo único pelos maus antecedentes e pela reincidência. Desrespeito ao critério trifásico de fixação das penas. Correção pelo Tribunal. Possibilidade. Ausência de certidão cartorária nos autos. Acréscimo pela reincidência afastado. Majoração mal fundamentada pelo reconhecimento de duas qualificadoras. Adequação para três oitavos. Regime inicial fechado. Recursos parcialmente providos. (Apelação com revisão nº 990.10.474524-1. Voto nº 7502. Relator Luís Carlos de Souza Lourenço. TJSP, 5ª Câmara de Direito Criminal. 28/05/2011. V.U)

HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL. CRIME DE ROUBO. CONCURSO DE PESSOAS. EMPREGO DE ARMA DE BRINQUEDO. CAUSA DE AUMENTO. NÃO-OCORRÊNCIA. SÚMULA CANCELADA. MAUS ANTECEDENTES. PROCESSOS SEM O TRÂNSITO EM JULGADO. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. IMPOSSIBILIDADE. ATENUANTE DA MENORIDADE. UTILIZAÇÃO NO CÁLCULO DA PENA. ILEGALIDADE NÃO EVIDENCIADA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. DELITO COMPLEXO. PLURALIDADE DE BENS JURÍDICOS OFENDIDOS. 1. A inclusão da majorante prevista no art. 157, § 2º, inciso I, do Código Penal diverge da posição adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, porquanto o uso de arma de brinquedo no crime de roubo não mais configura causa especial de aumento da pena. 2. Inquéritos policiais ou ações penais em andamento (inclusive, sentenças não transitadas em julgado) não podem ser levados em consideração para fixação da pena-base, em respeito ao princípio constitucional do estado presumido de inocência. Precedentes. 3. A alegação de ilegalidade na pena, em razão do não reconhecimento da atenuante da menoridade, não se sustenta, uma vez que foi devidamente considerada para o cálculo da pena. 4. Não há como aplicar, aos crimes de roubo, o princípio da insignificância - causa supralegal de exclusão de ilicitude -, pois, tratando-se de delito complexo, em que há ofensa a bens jurídicos diversos (o patrimônio e a integridade da pessoa), é inviável a afirmação do desinteresse estatal à sua repressão. Precedentes. 5. Ordem parcialmente concedida para, mantida a condenação imposta, reformar o acórdão impugnado, excluindo da condenação o acréscimo da pena-base pelos maus antecedentes, bem como a causa de aumento do emprego de arma.(HC 200702745937 - HC - HABEAS CORPUS – 94956. Rel. Laurita Vaz. STJ- Quinta Turma. DJE data 17/11/2008. Por maioria de votos.)

DIREITO PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO QUALIFICADO TENTADO. WRIT CONTRA DECISÃO EM APELAÇÃO CRIMINAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. INOCORRÊNCIA. REQUISITOS PARA CONFIGURAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO PREENCHIMENTO. MÍNIMA OFENSIVIDADE DA CONDUTA DO AGENTE E NENHUMA PERICULOSIDADE SOCIAL DA AÇÃO. INOCORRÊNCIA. NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES. DOSIMETRIA DA REPRIMENDA. CONSIDERADA A MOTIVAÇÃO PRÓPRIA DO DELITO PARA AGRAVAR A PENA-BASE. IMPOSSIBILIDADE. INVERSÃO DAS FASES NA DOSIMETRIA SEM REFLEXOS NO QUANTITATIVO FINAL. CORREÇÃO POSSÍVEL. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. O habeas corpus impetrado em face de decisão de apelação criminal tem toda a matéria devolvida à análise, não existindo a possibilidade de ocorrência de supressão de instância. 2. São requisitos para a incidência do princípio da insignificância a mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada. (Lição do Excelso Supremo Tribunal Federal no HC nº 84.412/SP, Relator Ministro Celso de Mello, in DJ 19/11/2004). 3. O princípio da insignificância não pode ter a finalidade de afrontar critérios axiológicos elementares, pois poderia, erroneamente, ser utilizado como hipótese supra-legal de perdão judicial calcado em exegese ideologicamente classista ou, então, emocional. 4. As decisões judiciais devem ser cuidadosamente fundamentadas, principalmente na dosimetria da pena, em que se concede ao Juiz um maior arbítrio, de modo que se permita às partes o exame do exercício de tal poder. 5. A motivação própria do crime não deve ser considerada, nem se pode dizer que o réu não a teve, pois todo delito tem uma motivação, cabendo ao Juiz buscá-la na prova dos autos. 6. O método trifásico deve ser rigorosamente obedecido, posto que resulta de disposição legal, mas se é feita inversão das suas fases e ela resulta em favor do réu, sem recurso da acusação, deve ser mantida. 7. Caso a inversão das fases da dosimetria da pena seja indiferente ao resultado final, é possível sua correção na nova fixação da reprimenda, sem que ocorra reformatio in pejus. 8. Ordem parcialmente concedida para reduzir a pena e corrigir a inversão das fases na sua dosimetria, observando-se, em todos os casos, os critérios fixados no presente voto. (HC 200802058773 - HC - HABEAS CORPUS – 115828. Rel. Jane Silva (desembargadora convocada do TJ/MG). STJ- Sexta turma. DJE data 10/11/2008. Data da decisão: 21/10/2008.Voto unânime)

Por serem crimes da mesma espécie, eis que os fundamentos aplicados ao roubo no que tange a impossibilidade da incidência do princípio da insignificância servem também para o crime de extorsão.

Há quem discorde do que fora até então exposto e reconhece a possibilidade de incidência do princípio da insignificância no crime de roubo e extorsão. A idéia dessa corrente é basicamente a seguinte: o delito de roubo tutela o patrimônio e a integridade pessoal e não o patrimônio ou a liberdade pessoal, de modo que, desconsiderado o patrimônio, por sua insignificância material, resta averiguar a lesão ao outro bem tutelado. Restando algum delito, tais como constrangimento ilegal, ameaça ou lesão corporal, pune-se o agente por esse delito remanescente. Não sendo a conduta residual asseverável, reconhece-se a atipicidade da conduta[102].

Haja vista que a jurisprudência e a doutrina majoritária não reconhece a aplicação do princípio da insignificância nos casos de roubo ou extorsão simples, desnecessário é falar sobre sua aplicação nas hipóteses qualificadas.

5.2.3 O princípio da insignificância na usurpação

É neste capítulo que se encontra grande dificuldade em achar julgados e decisões que tratem dos crimes ali descritos (arts. 161 e 162 do Código Penal).

Em que pese a jurisprudência ser silente no que se refere à aplicação do princípio da insignificância nos delitos desta natureza, tenho que a aplicação de tal princípio é impossível face a valoração que a propriedade imobiliária e os animais semoventes geralmente possuem, não podendo, dessa forma, serem considerados como bagatela ou bens de valor ínfimo.

5.2.4 O princípio da insignificância no dano

Assim como no caso de furto, quando preenchidos os requisitos estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal, não haverá óbice à aplicação do princípio da bagatela nos delitos de dano.

Os casos que eventualmente poderão levantar dúvidas quanto a aplicação o não do princípio diz respeito aos casos de dano qualificado.

O Tribunal de Justiça de São Paulo, à exemplo dos crimes anteriores, tem proferido decisões que reconhecem a impossibilidade da bagatela quando se tratar de dano qualificado. Neste sentido:

PROCESSO PENAL. Denúncia rejeitada pela decisão recorrida. Crime de dano qualificado - artigo 163, parágrafo único, III, do CP. Tese de falta de justa causa para o prosseguimento da ação penal devido ao ínfimo valor do bem subtraído, bem como do princípio da insignificância. Inadmissibilidade. Materialidade do delito comprovada desde logo, havendo veementes indícios de autoria. Ao contrário do alegado, houve tipicidade da conduta. Requisitos legais do artigo 41 do CPP preenchidos. Decisão recorrida reformada. RECURSO PROVIDO.

Vistos. Cuida-se de RECURSO EM SENTIDO ESTRITO interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, sendo recorrido SANDRO DONIZETE DE MORAES, qualificado nos autos, contra a r. decisão de fls. 55/58, que REJEITOU A DENÚNCIA, nos termos do artigo 365, inciso III, do CPP, aplicando o princípio da insignificância (fls. 60/61).

Nas razões recursais de fls. 65/68, a Justiça Pública busca a reforma da r. decisão alegando, em suma, que a conduta do réu, denunciado pela prática do crime de dano qualificado (praticado contra o patrimônio público), não enseja a aplicação do princípio da insignificância, sob pena de gerar inconcebível impunidade. Quer o provimento do recurso para o fim de recebimento da denúncia apresentada. (...)

(...) Consta da denúncia que, no dia 21 de maio de 2008, por volta das 11h06min, nas dependências do Mercado Municipal, centro da cidade de Tatuí, SANDRO DONIZETE DE MORAES, destruiu coisa alheia consistente em quinze tijolos confeccionados com cerâmica,pertencentes ao patrimônio da Prefeitura Municipal de Tatuí.

(...) Os prejuízos suportados pela Prefeitura Municipal pertinentes à reposição dos tijolos destruídos pelo acusado foram avaliados em R$ 4,20, conforme auto de avaliação. (...)

(...) Há indícios de autoria, eis que o acusado foi preso em flagrante delito, pelos guardas municipais durante a prática criminosa (fls. 2/7). A materialidade restou demonstrada pelo boletim de ocorrência e pelo laudo de constatação do dano e de avaliação indireta (fls. 9/10 e 47/49). Ademais, a tese esposada na r. decisão como fundamento para a rejeição da denúncia, de atipicidade do fato em razão da insignificância da res não merece prosperar. Isto porque se imputa ao réu uma conduta típica, não havendo na legislação pátria qualquer excludente de tipicidade em razão do pequeno valor do bem. (...)(RECURSO EM SENTIDO ESTRITO N. 990.09.297063-1. Voto nº 15.691. Relator Eduardo Braga. TJSP. 4ª Câmara de Direito Criminal. 18/01/2011. V.U.)  (grifos nossos)

O Superior Tribunal de Justiça e outros Tribunais vem reconhecendo a incidência do princípio da insignificância inclusive nos delitos de dano qualificado que tem as entidades de direito público interno como vítimas, conforme se verifica nos seguintes julgados:

Habeas Corpus". Direito Penal. Preso que destrói, inutiliza ou deteriora os obstáculos materiais à consecução da fuga. Crime de dano. Tipicidade subjetiva. Elemento subjetivo do injusto. "Animus nocendi". Desvalor do resultado. Princípio da insignificância. Configura-se admissível a absolvição em sede de "habeas corpus", se reconhecida a atipicidade subjetiva da conduta, desde que prescindível a incursão no conjunto fático-probatório, o que ocorre quando da própria narração da denúncia, bem como da incontrovérsia quanto ao fato, puder se formar o juízo racional de convicção motivada. Não configura o crime de dano a conduta do preso que destrói, inutiliza ou deteriora os obstáculos materiais à consecução da fuga, porque ausente o elemento subjetivo do injusto, o fim especial de agir, ou seja, o propósito de causar prejuízo ao titular do objeto material do crime - "animus nocendi". Precedentes da Quinta e Sexta Turmas. O injusto penal, como fato típico e ilícito, exige a congruência do desvalor da ação e do desvalor do resultado. O desvalor do resultado consiste na lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico protegido. Inexistindo o desvalor do resultado, porque ausente ou ínfima a lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico protegido, o que se evidencia no dano ao Estado avaliado em R$10,00 (dez reais), não há injusto penal, não há tipicidade. Aplicação do princípio da insignificância. O resultado do "habeas corpus" aproveita ao co-réu quando fundado em motivos que não sejam de caráter exclusivamente pessoal (CPP, artigo 580). Ordem concedida, para absolver o paciente, estendendo-a ao co-réu. (HC 200201610606 - HC - HABEAS CORPUS – 25657. Rel. Paulo Medina. STJ. Sexta Turma. DJ data 23/08/2004 PG 00276, por unanimidade, data da decisão 04/12/2003)

PENAL. CRIME DE DANO. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. DOLO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. 1. O preso que faz buraco na parede do ergástulo para evadir-se deseja livre e conscientemente produzir a avaria. O dolo é manifesto, configurando o crime do art. 163, parágrafo único, III, do Código Penal. Seu objetivo final - a fuga - não elide a prática criminosa. 2. No delito em debate, não se tolera o prosseguimento da persecução penal quando o estrago é de pequena monta. Verificando-se ter sido irrelevantemente atingido o bem jurídico tutelado pela norma em comento - qual seja, o patrimônio - impõe-se a aplicação do princípio da insignificância jurídica. (RSE 200170020018703.Rel. Elcio Pinheiro de Castro. TRF4 – Oitava turma. DJ 24/10/2001 p. 439, por unanimidade, data da decisão 15/10/2001)

PENAL. CRIME DE DANO. ATIPICIDADE. CONFIGURAÇÃO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. 1. Verificado ter sido irrelevantemente atingido o bem jurídico tutelado pela norma em comento - qual seja, o patrimônio - impõe-se a aplicação do princípio da insignificância jurídica. 2. In casu, foi danificada uma vidraça do edifício-sede do Instituto Nacional do Seguro Social, com valor de mercado de R$ 80,00, sendo a conduta materialmente atípica. (ACR 200871030005490. Rel. Elcio Pinheiro de Castro. TRF4 – oitava turma. D.E. 24/06/2009. Por unanimidade.  Data da decisão 17/06/2009)

HABEAS CORPUS – CRIME DE DANO – ART. 163, PARÁGRAFO ÚNICO, III DO CP - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – APLICABILIDADE – TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. I – Hipótese em que o delito imputado tem como bem jurídico protegido o patrimônio e, ainda que tenha como sujeito passivo o ente público, está sujeito ao princípio da insignificância, ao contrário dos delitos em que o bem jurídico protegido é a fé pública ou a administração pública em seu aspecto moral; II – Ordem concedida.(HC 201002010036302 - HC - HABEAS CORPUS – 6992. Rel. Des. Fed. Messod Azulay Neto. TRF2- segunda turma especializada. E-DJF2R – data 11/05/2010, página 63. Por unanimidade. Data da decisão 04/05/2010)

Por fim, Rogério Greco comenta que será perfeitamente admissível a aplicação do princípio da insignificância também no crime do artigo 164 do Código Penal quando da introdução ou abandono de animal em propriedade alheia resulta prejuízo irrisório à vítima.[103]

5.2.5 O princípio da insignificância na apropriação indébita

Pode-se dizer que em comparação aos demais delitos constantes do Título II do Código Penal, a apropriação indébita é um dos crimes de menor gravidade já que esta ocorre sem qualquer tipo de violência ou ameaça, mesmo em suas figuras qualificadas.

Por esse motivo, Rogério Greco ao tratar da apropriação indébita aduz que “será possível o raciocínio correspondente ao princípio da insignificância se a apropriação disser respeito a coisa alheia móvel de valor irrisório, afastando-se, pois, a tipicidade material, inserida no contexto da tipicidade conglobante e, conseqüentemente, a tipicidade penal”.[104]

Dentre os casos pesquisados na jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo, pareceu-nos que, dentre os crimes contra o patrimônio, é no delito de apropriação indébita que o princípio da insignificância tem maior reconhecimento perante aquele tribunal.É certo que o tribunal paulista já reconheceu a insignificância em crimes de apropriação indébita de R$ 70,00[105] ou R$ 100,00[106].

Diferente não é a jurisprudência do STJ, o já reconheceu inclusive a incidência da bagatela nos crimes de apropriação indébita previdenciária:

Apropriação indébita (pequeno valor). Princípio da insignificância (adoção). Crime (não constituição). 1. A melhor das compreensões penais recomenda não seja mesmo o ordenamento jurídico penal destinado a questões pequenas – coisas quase sem préstimo ou valor. Já foi escrito: "Onde bastem os meios do direito civil ou do direito público, o direito penal deve retirar-se." 2. É insignificante, dúvida não há, a apropriação indébita de um aparelho celular usado, nem sequer mais existente no mercado, avaliado em duzentos reais. 3. A insignificância, é claro, mexe com a tipicidade, donde a conclusão de que fatos dessa natureza evidentemente não constituem crime. 4. Recurso especial ao qual se negou provimento. (RESP 200700267050 - RESP - RECURSO ESPECIAL – 922475. Rel. Nilson Naves. STJ – sexta turma. DJE data 16/11/2009. Data da decisão 13/08/2009)

RECURSO ESPECIAL. PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE RELÓGIO DE PULSO AVALIADO EM SETENTA REAIS. CRIME DE BAGATELA. APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL IMPROVIDA. 1. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o princípio da insignificância tem como vetores a mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada. 2. Hipótese de apropriação indébita de um relógio de pulso, avaliado em R$ 70,00 (setenta reais). 3. O fato de existirem circunstâncias de caráter pessoal desfavoráveis, tais como maus antecedentes criminais ou reincidência, não são óbices, por si sós, ao reconhecimento do princípio da insignificância. 4. Recurso especial improvido. (RESP 200802546366 - RESP - RECURSO ESPECIAL – 1102105. Rel. Jorge Mussi. STJ. Quinta turma. DJE Data: 03/08/2009. Data da decisão: 02/06/2009)

RECURSO ESPECIAL. PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA.. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INCIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL. TEORIA CONSTITUCIONALISTA DO DELITO. INEXPRESSIVA LESÃO AO BEM JURÍDICO TUTELADO. MAUS ANTECEDENTES E PERSONALIDADE DO AGENTE. CIRCUNSTÂNCIAS DE CARÁTER PESSOAL. NÃO-INFLUÊNCIA NA ANÁLISE DA INSIGNIFICÂNCIA PENAL. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. 1. O princípio da insignificância surge como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal que, de acordo com a dogmática moderna, não deve ser considerado apenas em seu aspecto formal, de subsunção do fato à norma, mas, primordialmente, em seu conteúdo material, de cunho valorativo, no sentido da sua efetiva lesividade ao bem jurídico tutelado pela norma penal, consagrando os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima. 2. Indiscutível a sua relevância, na medida em que exclui da incidência da norma penal aquelas condutas cujo desvalor da ação e/ou do resultado (dependendo do tipo de injusto a ser considerado) impliquem uma ínfima afetação ao bem jurídico. 3. A apropriação indébita de uma escada, avaliada em R$ 50,00, a qual foi restituída à vítima, embora se amolde à definição jurídica do crime, não ultrapassa o exame da tipicidade material, mostrando-se desproporcional a imposição de pena privativa de liberdade, uma vez que a ofensividade da conduta se mostrou mínima; não houve nenhuma periculosidade social da ação; a reprovabilidade do comportamento foi de grau reduzido e a lesão ao bem jurídico se revelou inexpressiva. 4. As circunstâncias de caráter pessoal do agente, tais como a reincidência, os maus antecedentes e a personalidade do agente, não têm influência na análise da insignificância penal. 5. Recurso especial improvido.(RESP 200602387274. RESP - RECURSO ESPECIAL – 898392. Rel. Arnaldo Esteves Lima. STJ – quinta turma. DJE data: 09/03/2009. Data da decisão: 05/02/2009)

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS (ART. 168-A DO CÓDIGO PENAL). PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ART. 20 DA LEI 10.522/2002. APLICABILIDADE. 1. Com o julgamento pela Terceira Seção do Recurso Especial Repetitivo n.º 1.112.748/TO (Relator Ministro Felix Fischer, DJe de 5/10/2009), restou pacificado nesta Corte o entendimento de que o princípio da insignificância no crime de descaminho incide quando o débito tributário não ultrapasse o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), consoante o disposto no art. 20 da Lei 10.522/2002. 2. A Lei nº 11.457/2007 que criou a Secretaria da Receita Federal do Brasil considerou como dívida ativa da União os débitos decorrentes das contribuições previdenciárias. Diante disso, entende-se viável, sempre que o valor do débito não for superior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), a aplicação do princípio da insignificância também no crime de apropriação indébita previdenciária. 3. In casu, verifica-se que o valor da contribuição previdenciária não recolhida é de R$ 1.799,87 (um mil, setecentos e noventa e nove reais e oitenta e sete centavos), razão pela qual está caracterizado na esfera penal a irrelevância da conduta. 4. Recurso especial a que se nega provimento. (RESP 200900970925 - RESP - RECURSO ESPECIAL – 1125462. Rel. Jorge Mussi. STJ – quinta turma. DJE data: 17/12/2010. Data da decisão 07/12/2010)

5.2.6 O princípio da insignificância no estelionato e outras fraudes

O capítulo VI, do Titulo II, do Código Penal, que trata do estelionato e de outras fraudes, possui nove espécies de delitos diferentes, sendo certo que não há a previsão alguma de estelionato ou qualquer outra fraude cometida com emprego de violência ou ameaça.

Esta característica concede aos crimes previstos neste capítulo VI a possibilidade ou legalidade na aplicação do princípio da insignificância desde que preenchidos os requisitos mencionados no item 2 do capítulo anterior da presente monografia.

Comumente a doutrina aborda somente o princípio da insignificância ao tratar do delito do artigo 176 do Código Penal, admitindo que será perfeitamente possível a aplicação do princípio da insignificância às hipóteses previstas pelo tipo penal do art. 176, afastando-se, pois, com a sua adoção, a tipicidade material, avaliada em sede de tipicidade conglobante.[107]

Entretanto, a jurisprudência reconhece a incidência do princípio da bagatela em outros delitos do Capítulo VI, do Código Penal:

HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE ESTELIONATO PERPETRADO CONTRA O TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INCIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL. TEORIA CONSTITUCIONALISTA DO DELITO. 1. Reconhece-se a aplicação do princípio da insignificância quando verificadas "(a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada" (HC 84.412/SP, Ministro Celso de Mello, Supremo Tribunal Federal, DJ de 19/11/2004). 2. No caso, observa-se que a conduta permaneceu no campo da tentativa de efetivar-se um engodo contra o Tribunal de Contas, com o objetivo de auferir vantagem de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais). 3. Muito embora a farsa tenha se dado contra a União, tal circunstância não tem o condão de modificar o raciocínio que se deva ter quanto à necessidade da existência de ao menos um dano – ainda que potencial – mínimo, que justifique a intervenção penal. Deve ser ressaltado que, na hipótese, a farsa foi logo debelada pela atitude de quem deveria tomar as providências que tomou, sendo de rigor o reconhecimento da atipicidade da conduta. 3. Ordem concedida a fim para considerar o fato como materialmente atípico. (HC 200902437869 - HC - HABEAS CORPUS – 157037. Rel. HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE). STJ. Sexta turma. DJE data 11/10/2010. Data da decisão 22/06/2010)

HABEAS CORPUS. ESTELIONATO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. 1. O Supremo Tribunal Federal estabeleceu requisitos à incidência do princípio da insignificância que são a mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada (HC nº 84.412/SP, Min. Celso de Mello, publicado no DJ de 19/11/2004). 2. Para fins de aplicação de tal princípio, o estelionato praticado deve ser de valor ínfimo e não ser capaz de gerar prejuízo ao patrimônio da vítima, como ocorre no caso dos autos, em que o valor do prejuízo causado à vítima é de R$ 50,00 (cinquenta reais), não revelando a atitude do paciente lesividade suficiente para justificar a condenação. 3. Ordem concedida.(HC 200901128145 - HC - HABEAS CORPUS – 139015. Rel. Og Fernandes. STJ. Sexta Turma. DJE data 26/10/2009. Data da decisão: 06/10/2009.)

Aqui, faz-se uma ressalva em relação ao Tribunal de Justiça de São Paulo quanto à aplicação do princípio da insignificância no crime de estelionato (em seu sentido amplo), uma vez que se verificou certa discórdia em relação às Câmaras Criminais daquele tribunal. A 5ª Câmara de Direito Criminal, por exemplo, não reconheceu a insignificância no caso de uma tentativa de estelionato no valor de R$ 38,00[108], enquanto que a 12ª Câmara de Direito Criminal já reconheceu a insignificância num caso de estelionato consumado no valor de R$ 47,00[109]. 

5.2.7 O princípio da insignificância na receptação

Aqui se chega, finalmente, no último capítulo do Título II, do Código Penal que descreve o delito de receptação.

O TJSP praticamente não aplica o princípio da insignificância no crime de receptação, isto porque os bens receptados, em sua grande maioria, não possuem valor ínfimo, batendo de frente com um dos requisitos necessários para a aplicação do princípio bagatelar.

Entretanto, como na maioria dos delitos contra o patrimônio, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça já reconheceu a incidência do princípio da insignificância na receptação, conforme se verifica através dos seguintes julgados:

RECURSO ESPECIAL. PENAL. RECEPTAÇÃO DE FIOS DE COBRE AVALIADOS EM R$ 63,00 (SESSENTA E TRÊS REAIS). CRIME DE BAGATELA. CONDIÇÕES PESSOAIS DESFAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL IMPROVIDA. 1. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o princípio da insignificância tem como vetores a mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada. 2. Hipótese de receptação de uma sacola contendo 09 (nove) quilos de fios de cobre, avaliados infimamente, os quais foram restituídos à vítima. 3. Recurso especial improvido. (RESP 200900685670 - RESP - RECURSO ESPECIAL – 1113489. Rel. Jorge Mussi. STJ. Quinta turma. DJE data 03/08/2009. Data da decisão: 23/06/2009)

HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CRIME DE RECEPTAÇÃO. OBJETO DE VALOR REDUZIDO. DEVOLUÇÃO ESPONTÂNEA À VÍTIMA. REQUISITOS DO CRIME DE BAGATELA PREENCHIDOS NO CASO CONCRETO. ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA. ORDEM CONCEDIDA. 1. A incidência do princípio da insignificância depende da presença de quatro requisitos, a serem demonstrados no caso concreto: a) mínima ofensividade da conduta do paciente; b) ausência de periculosidade social da ação; c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. 2. A via estreita do habeas corpus não admite um profundo revolvimento de provas nem o sopesamento das mesmas. A aplicação do princípio da insignificância só será permitida se os autos revelarem claramente a presença dos requisitos mencionados. 3. No caso, a receptação de um walk man, avaliado em R$ 94,00, e o posterior comparecimento do paciente perante à autoridade policial para devolver o bem ao seu dono, preenchem todos os requisitos do crime de bagatela, razão pela qual a conduta deve ser considerada materialmente atípica. 4. Ordem concedida para determinar o trancamento da ação penal de origem. (HC 91920. STF. Rel Joaquim Barbosa. Votação unânime, 2ª turma, 09/02/2010).

HABEAS CORPUS. RECEPTAÇÃO. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INCIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL. TEORIA CONSTITUCIONALISTA DO DELITO. INEXPRESSIVA LESÃO AO BEM JURÍDICO TUTELADO. 1. Reconhece-se a aplicação do princípio da insignificância quando verificadas "(a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada" (HC 84.412/SP, Ministro Celso de Mello, Supremo Tribunal Federal, DJ de 19/11/2004). 2. No caso, não há como deixar de reconhecer a mínima ofensividade do comportamento da paciente, que adquiriu, sabendo ser produto de crime, 5 (cinco) cadeiras, globalmente avaliadas em R$ 75,00 (setenta e cinco reais), sendo de rigor o reconhecimento da atipicidade da conduta. 3. Segundo a jurisprudência consolidada nesta Corte e também no Supremo Tribunal, a existência de condições pessoais desfavoráveis, tais como maus antecedentes, reincidência ou ações penais em curso, não impedem a aplicação do princípio da insignificância. 4. Ordem concedida a fim de, aplicando o princípio da insignificância, absolver a paciente do crime de que cuida a Ação Penal nº 576.01.2006.044782-5 (1ª Vara Criminal da Comarca de São José do Rio Preto/SP). (HC 200901416608 - HC - HABEAS CORPUS – 142586. Rel. Og Fernandes. STJ – Sexta turma. DJE data: 01/07/2010 RMDPP VOL: 36 PG:120. Data da decisão 10/06/2010)

Pelo o que foi sucintamente exposto neste capítulo, vemos que o princípio da insignificância poderá ser aplicado aos crimes contra o patrimônio, desde que observados e preenchidos os requisitos de mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada.


06: A DISCRICIONARIEDADE DO DELEGADO DE POLÍCIA E A POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO IMEDIATA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA FACE A ATUAL SITUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO BRASILEIRO

6.1 Considerações acerca do Poder Judiciário Brasileiro e a Polícia Judiciária tomando-se como base o Estado de São Paulo

Nos capítulos anteriores vimos todas as questões mais relevantes relacionadas à aplicação do princípio da insignificância aos crimes contra o patrimônio do Código Penal Brasileiro.

Neste capítulo, analisar-se-á a possibilidade ou não da aplicação imediata do princípio da bagatela pela própria autoridade policial, aduzindo que tal idéia poderia ser um meio de desafogar um pouco o Poder Judiciário, bem como de evitar gastos desnecessários e também uma forma de realizar a Justiça de maneira mais célere.

As questões que talvez possam surgir são: Mas será que tal atitude é realmente necessária? Qual é a verdadeira situação em que se encontram a Polícia Judiciária e o Poder Judiciário?

Responder a essas questões de maneira precisa e geral, de forma a compreender e especificar todas as regiões do país é uma tarefa dificílima. Porém, apenas para ilustrar e também limitar o objeto deste item, tomar-se-á por base o Estado de São Paulo, analisando-se alguns dados referentes à polícia judiciária civil do Estado e à Justiça Estadual, a fim de que possamos atingir a finalidade ora pretendida.

Segundo dados da Secretária de Segurança Pública de São Paulo[110], somente no último trimestre de 2010, foram elaborados mais de 633.249 boletins de ocorrência, 44.994 termos circunstanciados e 86.118 inquéritos policiais. Foram registrados 273.286 crimes contra o patrimônio sendo que destes, 129.259 referem-se a furtos outros que não os de veículos.

Alguns talvez aduzam que nem todos esses inquéritos ou termos circunstanciados virarão uma ação penal no futuro, entretanto, se considerarmos que apenas metade desses números serão os que se tornarão um processo e ao somarmos esse número ao de feitos que já estão em andamento nos tribunais, o número a que se chegará é exorbitante. Destaca-se, mais uma vez, que os números acima mencionados dizem respeito somente ao último trimestre de 2010.

Se a situação na polícia judiciária civil do Estado de São Paulo é calamitosa, quanto mais a situação do Poder Judiciário Paulista. De acordo com as informações do site “Justiça em números”, do Conselho Nacional de Justiça, em 2009, o Judiciário Paulista registrou 534.284 novos casos. Na época, haviam 770.232 casos criminais pendentes de conhecimento.

Em segundo grau, a situação também não era diferente. O Tribunal de Justiça de São Paulo, no mesmo ano, registrou 145.117 casos novos criminais. Naquele ano, haviam 105.228 casos pendentes de julgamento no Tribunal. A taxa de congestionamento em segunda instância chegava a 64,7%.

Como era de se esperar, com um número tão grande de processos, os gastos também são exageradamente altos. A despesa total da Justiça Paulista em 2009 foram de exatos R$ 4.795.975.135. O Judiciário Paulista arrecadou com recolhimentos diversos R$ 1.317.360.458, quantia esta que representa apenas 27% da despesa total da Justiça.

Estima-se que a cada novo processo que a Justiça recebe são gastos, em média, R$ 600,00.[111]

Necessário se faz também trazer alguns dados da Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo - SAP, já que os números supracitados da Polícia Judiciária e do Poder Judiciário implicam diretamente na situação carcerária do Estado.

Em 1999 havia 53.177 pessoas presas em 62 unidades coordenadas pela SAP. Em 2009, o número de presos era de 130.814, número este que representa um aumento de 180%[112].   

Dados divulgados em 2010 pelo Conselho Nacional de Justiça colocam o Brasil no ranking do terceiro país com maior população carcerária do mundo, ou seja, 494.598 presos. Com esse número o Brasil só fica atrás dos Estados Unidos e da China.[113]

Atualmente, no Estado de São Paulo há 167.713 presos (homens e mulheres) para as atuais 104.053 vagas divididas entre os 319 estabelecimentos prisionais existentes no estado, ou seja, há um déficit de mais de 63 mil vagas. Dentre os presos, somente 37% destes são presos provisórios.[114]

Num primeiro momento, esse aumento da população carcerária poderia indicar algo positivo no sentido de demonstrar que a justiça está sendo feita e que se tem punido efetivamente os delinqüentes. Essa afirmação é um tanto que perigosa. O aumento da população carcerária pode indicar, de fato, um maior número de condenações judiciais, no entanto, a questão é outra: manter mais pessoas em cárcere tem dado resultados?

Em 2008, o índice de reincidência no Estado de São Paulo era de 58%[115], ou seja, mais da metade das pessoas que eram condenadas, tornavam a praticar crimes. Esse índice revela, seguramente, que o Estado não estava conseguindo cumprir as finalidades pretendidas com a prisão.

Note-se que o preço de manutenção de uma pessoa na cadeia varia entre 1000,00 e 1.500,00 reais[116].

Há de se ressaltar que nem todas as pessoas que se encontram presas, já foram condenadas. Aqui não se pretende criar qualquer tipo de ideologia no sentido de desqualificar o cárcere como sanção penal. A intenção, nesse momento, é apenas a de analisar os dados e discutir se tais números não poderiam ser menores caso o princípio da insignificância fosse aplicado em fases anteriores ao processo ou ainda no início deste.

6.2 A discricionariedade da autoridade policial e a possibilidade de aplicação imediata do princípio da insignificância

Através da breve análise realizada no item anterior percebe-se o verdadeiro caos em que se encontram o Poder Judiciário e a Polícia Judiciária. A pergunta que se faz é: será que o delegado de polícia pode aplicar imediatamente o princípio da insignificância, deixando de elaborar um termo circunstanciado ou um inquérito policial, resolvendo a questão prontamente e evitando a elaboração do processo?

Antes de responder a questão suscitada, convém esclarecer alguns pontos pertinentes ao título desse item, já que estes são essenciais para a solução daquela.

Autoridade policial é o agente do Poder Executivo encarregado de manter ou de restaurar a ordem e segurança públicas e reprimir atos que atentem contra a propriedade e os bons costumes.[117] Essa autoridade é o delegado de polícia, civil ou federal, que além das funções mencionadas, também possui a função de instaurar e conduzir o inquérito policial e o termo circunstanciado, que são procedimentos administrativos que visam a colheita de provas para que possam servir de base para a propositura da ação penal.

Embora os livros tradicionalmente indiquem a discricionariedade como característica do inquérito policial, tenho que tal característica ou poder é, em verdade, do delegado de polícia.

A discricionariedade do delegado de polícia consiste no poder de determinar as diligências investigatórias a serem realizadas no curso do inquérito, ou seja, o delegado de polícia conduz as investigações da forma que melhor lhe aprouver. A autoridade policial pode atender ou não aos requerimentos patrocinados pelo indiciado ou pela própria vítima, fazendo um juízo de conveniência e oportunidade quanto à relevância daquilo que lhe foi solicitado[118].

A discricionariedade abrange também a liberdade que a autoridade policial tem em instaurar ou não o procedimento administrativo ao deparar-se com um fato trazido pelos seus subordinados, outros policiais ou mesmo pelo próprio ofendido. Essa liberdade, não existirá quando o juiz ou o representante do Ministério Público requisitar a instauração de inquérito policial.

Pode-se chegar a tal conclusão através do seguinte trecho da decisão proferida pelo Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo:

A determinação da lavratura do auto de prisão em flagrante pelo delegado de polícia não se constitui em um ato automático, a ser por ele praticado diante da simples notícia do ilícito penal pelo condutor. Em face do sistema processual vigente, o Delegado de Polícia tem o poder de decidir da oportunidade ou não de lavrar o flagrante.[119]

Se a autoridade policial pode decidir sobre a lavratura ou não do auto de prisão em flagrante, porque ela não poderia decidir sobre a instauração ou não do inquérito policial ou sobre elaboração ou não do termo circunstanciado?

Ademais, é sabido que à autoridade policial compete a verificação da ocorrência ou não de crime. Verifica-se a materialidade delitiva e tenta-se obter a autoria ou ao menos aos indícios de autoria.

Como dito alhures, o princípio da insignificância retira a tipicidade da conduta delituosa do agente. A tipicidade é um dos elementos do fato típico e ao retirar-se esta, o fato típico resta descaracterizado, ou seja, não ocorre.

Dessa forma, analisando somente as funções e os poderes do delegado de polícia, bem como os elementos constitutivos do crime em seu conceito analítico, tem-se que é legal a aplicação do princípio da insignificância pela a autoridade policial quando esta verificar, no caso concreto, a insignificância do crime segundo os parâmetros estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal.

Tal solução mostra-se inclusive plausível frente aos dados trazidos no item anterior haja vista que constituiria numa economia significativa ao Estado e também numa forma de realização da justiça de maneira mais célere. Em palavras simples, a adoção imediata do princípio da insignificância pela autoridade policial é uma das formas de realizar o princípio preconizado por todos os ramos direito, qual seja o da economia e celeridade processual.

A fim de que o ato seja pautado de legalidade e seriedade, defendo, pessoalmente, que ao aplicar o princípio da insignificância a autoridade policial deva redigir um documento simples que contenha os dados principais do agente e um pequeno resumo dos fatos apenas para controle interno e externo de outros órgãos da segurança pública. Acredito, ainda, que esta simples documentação evitaria o benefício reiterado do princípio da insignificância por pessoas que reiteradas vezes poderiam cometer delitos insignificantes, agindo com má-fé, bem como minimizaria eventuais ocorrências de corrupção.


CONCLUSÃO

No decorrer deste trabalho foi visto que o direito penal visa proteger aqueles bens jurídicos de maior relevância. Tratou-se de todos os crimes contra o patrimônio, oportunidade em que foram analisadas as peculiaridades de cada um deles.

Foi defendido e abordado que o direito penal, devido à sua própria importância, não deve preocupar-se com ninharias ou delitos insignificantes, irrelevantes ou ínfimos.

Os julgados trazidos ao trabalho serviram para mostrar que, embora não consagrado expressamente na Constituição Federal ou no Código Penal ou mesmo no Código de Processo Penal, o princípio da insignificância vem sendo aplicado e conseqüentemente reconhecido como legítimo pelos tribunais nacionais.

Ademais, ao destacar-se a importância dos princípios, de maneira geral, na constituição de um estado e a relação existente entre o princípio da bagatela e o princípio da dignidade da pessoa humana, ficou evidente que a simples argumentação de ausência de previsão no ordenamento jurídico não é suficiente para obstar a aplicação do princípio da insignificância.

Chegou-se à conclusão que o princípio da insignificância retira a tipicidade da conduta, tipicidade esta que pode ser tanto a conglobante, segundo os ensinamentos de Zaffaroni, ou a material. A não verificação da tipicidade, que é um dos elementos do fato típico, acaba por desqualificar todo o fato criminoso insurgindo na inocorrência de delito. 

Admitimos que o princípio da insignificância nem sempre poderá ser aplicado a todos os crimes contra o patrimônio em razão da própria gravidade do delito, bem como em razão do bem jurídico tutelado.

Através do parâmetro criado pelo Supremo Tribunal Federal, conclui-se que o princípio da bagatela somente será aplicado quando houver a mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada.

Infelizmente, observou-se que para ver reconhecido o princípio da insignificância é necessário, na maior parte das vezes, recorrer-se ao Superior Tribunal de Justiça ou ao Supremo Tribunal Federal, o que pode demorar anos haja vista os dados revelados no capítulo 6.

Outro problema que observamos foi a ausência de unidade do Tribunal de Justiça de São Paulo, ou seja, notamos que há divergência por parte de algumas câmaras criminais no que tange à aplicação do princípio da insignificância. Ao nosso modo de ver, essa divergência tão discrepante acaba resultando em insegurança jurídica já que o interessado ficará à mercê da sorte, haja vista que o reconhecimento da insignificância dependerá em muito da câmara que receberá seu recurso e não no preenchimento efetivo dos requisitos estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal.

Felizmente, não poderíamos deixar de comentar, também, que as câmaras criminais mais novas do tribunal paulista parecem que têm visto o princípio da insignificância com mais receptividade, seguindo, portanto, a tendência do Superior Tribunal de Justiça.

Algo que particularmente chama-nos a atenção foi o fato de que o princípio da insignificância fora admitido em casos de crimes qualificados e em casos em que o agente era reincidente. Isto revela uma maior abrangência desse princípio mesmo nos casos em que a maioria da população não aceitaria como válido em razão da própria cultura de criar pré-conceitos dos outros. Acreditamos que tais decisões creditam o Poder Judiciário como órgão realizador do ideal de justiça, já que foram analisados os elementos objetivos dos delitos, bem como a situação individual de cada caso concreto.

No último capítulo, foi feito um “apelo” no sentido de se aplicar o princípio da insignificância já no momento em que o delegado toma conhecimento do fato ocorrido. Sustentou-se a legalidade de tal atitude e indiretamente pretendeu-se reconhecer a aplicação imediata do princípio da insignificância pela autoridade policial como um meio de diminuir o número de processos em andamento no país e um modo do Estado economizar com gastos desnecessários.

É claro que não se pode elevar o princípio da insignificância ao ponto de considerá-lo como o solucionador de todos os problemas que o Judiciário enfrenta, longe disso é a nossa intenção.

Pretendeu-se traçar algumas idéias que levassem o leitor ao raciocínio, de modo que ele mesmo pudesse tecer algumas conclusões. Foram vistos os gastos que envolvem a manutenção de uma pessoa encarcerada e os gastos bilionários da Justiça com processos. Pergunta-se: será que alguns desses gastos não poderiam ser evitados? Fora o tempo que demanda para um recurso chegar até as instâncias superiores, na maioria das vezes o inquérito policial ou a ação penal logo que é ajuizada já saiu bem mais caro para o Estado do que o próprio patrimônio violado quando da prática delituosa.

Sem levarmos em conta a questão econômica da aplicação do princípio da insignificância, há ainda a questão da finalidade da pena. No capítulo três discorremos sobre a sanção penal e lá foi abordado que a pena tem a função ressocializadora, retributiva e preventiva. Com base no índice de reincidência existente somente do Estado de São Paulo dá para se ter uma idéia que o cárcere não consegue atingir nenhuma das finalidades da pena, assim deve-se refletir: seria justo manter alguém preso, ainda que somente até a prolação da sentença de primeiro grau, por ter cometido um delito insignificante, sujeitando-o aos malefícios da prisão e o expondo ao contato com os mais diversos criminosos?

Conforme mencionado no capítulo 4, a aplicação do princípio da insignificância do âmbito criminal não impede que o agente seja punido em outras esferas do direito. Tenho que essa afirmação é a solução para aqueles que possam achar que a aplicação do princípio da insignificância é uma forma de impunidade.

Por fim, concluímos que o princípio da insignificância não é uma forma de impunidade e sim uma forma de realização da justiça, isto devido a ele estar intimamente relacionado com o princípio da dignidade da pessoa humana e também ao fato da aplicação desse princípio contribuir para a realização de outros princípios, tais como o da celeridade e economia processual.


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ABSTRACT: The law is defined as the set of legal rules governing life in society. Such standards should be viewed in a broader sense, the concept should also include the ideas of principles, customs etc.. The principles are currently high on the practical application of the law in general. Although many of them are not expressly provided for in the Constitution or the law, increasingly have the need to apply them in order to more closely what we call "justice." An ideal justice that pleases everyone is a utopia, however, the conjunction of the purpose of the law with the purpose of business laws and the adequacy of principles can lead to good results in the judiciary and indirectly to society as a whole . Nowadays there is much talk of the principle of insignificance and its application in criminal law, especially in relation to crimes against patrimony as they are the most common crimes and end up reaching the most diverse sections of society. The objective of this research is to define in what the principle of insignificance, which is its legal-criminal, what are the requirements to apply it and what crimes against patrimony referred to the Brazilian Penal Code that permit their implementation. The survey was conducted through the confrontation of doctrine with recent decisions issued by courts patriotics, focusing on the state of São Paulo. At the end of the study, it was found that the judiciary in São Paulo is a state of chaos and that the penalty, the way it is done in Brazil, just not reaching its goals, given that the principle of insignificance in patrimony crimes of the penal code when certain conditions observed in our view, could improve the situation a little of the judiciary and even advocated this principle before the procedure.

Key-words: Principle. Insignificance. Crimes. Patrimony.


 Notas

[1] Dicionário técnico jurídico/ organização Deocleciano Torrieri Guimarães; - 5.ed.rev.e atual. São Paulo: Rideel, 2004. Página:123.

[2]  Ibid., p.123.

[3]  Tratado de Direito Penal, Cezar Roberto Bitencourt, pag. 308.

[4]  Hans Wenzel. Derecho Penal alemán, P.G., Santiago, Ed. Juridica de Chile, 1970, trad.de Bustos Ramírez e Yánez Pérez,p.462,apud Luiz Regis Prado. Bem jurídico-penal e Constituição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, p.36.

[5]  Muñoz Conde, F. Introducción Al Derecho Penal, Barcelona, Bosch, 1975, p. 48, apud Luiz Regis Prado. Bem jurídico-penal e Constituição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, p.36.

[6]  Aníbal Bruno, Direito Penal, vol. I, Rio, Forense, 1967, p.31, apud Luiz Regis Prado. Bem jurídico-penal e Constituição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, p.38.

[7]  Princípios básicos de Direito Penal, Francisco de Assis de Toledo, p. 16.

[8]  Luiz Regis Prado, Bem jurídico-penal e Constituição, p. 83.

[9]  Ibid.,p.83.

[10] Muñoz Conde, F. Introducción al Derecho Penal, Barcelona, Bosch, 1975, p. 34, apud Luiz Regis Prado. Bem jurídico-penal e Constituição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, p.36.

[11]  Luiz Regis Prado, Bem jurídico-penal e Constituição, p. 40/41.

[12]  Decreto-lei 3.914, de 09 de dezembro de 1941.

[13]   Cezar Roberto Bitencourt, Tratado de Direito Penal, p. 250.

[14]   Ibid.

[15]  Guilherme de Souza Nucci, Manual de Direito Penal, p. 181.

[16]  Damásio de Jesus, Direito Penal 12ªed., p. 228, São Paulo, Saraiva, 1988 apud Cezar Roberto Bitencourt, Tratado de Direito Penal: parte geral 1, 15ed.rev.atual.e ampl., São Paulo: Saraiva, 2010.

[17] Sergio Salomão Shecaria e Alceu Corrêa Junior, Teoria da pena, p. 155, São Paulo: RT, 2002 apud Guilherme de Souza Nucci, Manual de direito penal: parte geral:parte especial-4.ed.rev.,atual.e ampl.2.tir.,São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p.214.

[18]  Luiz Flávio Gomes e Antonio García-Pablos de Molina, Direito Penal v.2, p. 228/238.

[19]  Luiz Flávio Gomes e Antonio García-Pablos de Molina, Direito Penal v.2, p. 236/237.

[20] Zaffaroni, Eugenio Raul; Alagia, Alejandro e Slokar, Alejandro. Derecho penal: parte general. Buenos Aires: Ediar, 2001, p. 461 e ss. apud Luiz Flávio Gomes e Antonio García-Pablos de Molina, Direito Penal volume 2, 2.tir., São Paulo: Editora Revista dos tribunais, 2007, p. 237.

[21]  Ibid., p. 237.

[22]  Dicionário técnico jurídico/ organização Deocleciano Torrieri Guimarães; - 5.ed.rev.e atual. São Paulo: Rideel, 2004. Página:420.

[23]  Celso Delmanto, Código Penal Comentado, p. 336.

[24]  Guilherme de Souza Nucci, Manual de Direito Penal, p. 682.

[25]  Celso Delmanto, Código Penal Comentado, p. 340.

[26]  Celso Delmanto, Código Penal Comentado, p. 341/342.

[27]  Fernando Capez, Curso de Direito Penal: Parte Especial v.2, p. 416.

[28]  Guilherme de Souza Nucci, Manual de Direito Penal: parte geral:parte especial, p. 698.

[29]  Ibid., p. 699.

[30]  Fernando Capez, Curso de Direto Penal: parte especial, vol.2, p. 442.

[31]  Cezar Roberto Bitencourt, Tratado de Direito penal: parte especial, vol.3, p. 113.

[32]  Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha, Direito Penal, v.3, Parte Especial, p. 137.

[33]  Cezar Roberto Bitencourt, Tratado de Direito Penal: parte especial, vol.3, p. 130.

[34]  Michaelis, Dicionário escolar da língua portuguesa, p.889.

[35]  Rogério Sanches Cunha, Direito Penal:parte especial v.3, p. 140.

[36]  Cezar Roberto Bitencourt, Tratado de Direito Penal vol. 3, p. 156.

[37]  Rogério Sanches Cunha, Direito Penal: parte especial vol. 3, p. 145.

[38]  Rogério Sanches Cunha, Direito penal: parte especial vol. 3, p. 147.

[39]  Fernando Capez, Curso de Direito Penal: parte especial, vol.2, p. 488.

[40]  Cezar Roberto Bittencourt, Tratado de Direito Penal: parte especial vol.3, p. 197.

[41]  Rogério Sanches Cunha, Direito Penal: parte especial vol. 3, p. 152.

[42]  Ibid., p. 152.

[43]  Fernando Capez, Curso de Direito Penal: parte especial vol. 2, p. 512/513.

[44]  José Maria Rodriguez Devesa, Derecgo Penal español;Parte especial, 9.ed., Madrid, Artes Gráficas Carasa,1983,p. 477 apud Cezar Roberto Bittencourt, Tratado de Direito Penal:parte especial, volume 3, 5.ed.rev.e atual.-São Paulo:Saraiva, 2009,p. 228.

[45]  Rogério Sanches Cunha, Direito Penal, parte especial vol.3, p. 167.

[46]  Celso Delmanto, Código Penal Comentado, p. 171.

[47]  Rogério Sanches Cunha, Direito Penal:parte especial, vol. 3, p. 170.

[48]  Rogério Sanches Cunha, Direito Penal:parte especial, vol. 3, p. 172.

[49]  Ricardo Antonio Andreucci, Manual de Direito Penal vol. 2, p. 133.

[50]  Ricardo Antonio Andreucci, Manual de Direito Penal vol. 2, p. 135.

[51]  Ibid., p. 136.

[52]  Cezar Roberto Bittencourt, Tratado de direito penal, parte especial, vol. 3, p. 300.

[53]  Ibid., p. 300.

[54]  Ricardo Antonio Andreucci, Manual de direito penal vol.2, p. 139.

[55] Direito Penal, Parte Geral, vol.2, Luiz Flávio Gomes e Antonio Garcia-Pablos de Molina, página 654.

[56]  Ibid., p. 654.

[57]  Guilherme de Souza Nucci, Manual de Direito Penal, p. 541.

[58]  Deocleciano Torrieri Guimarães, Dicionário Técnico Jurídico, p. 421/422.

[59]  Manual de Direito Penal, Guilherme de Souza Nucci, página 368.

[60]  Fernando Capez, Curso de Direito Penal: parte geral, vol.1, p. 358/359.

[61]  Excepcionalmente admite a substituição da pena ao réu reincidente, desde que o juiz verifique a presença de dois requisitos: ser a medida recomendável no caso concreto em face da condenação anterior e que a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime (§3º do art. 44 CP).

[62]  Cezar Roberto Bittencourt, Tratado de direito penal, parte geral, vol.1, p. 99.

[63] Jescheck, H. H. Tratado de Derecho Penal. Trad. Mir Puig e Muñoz Conde. Barcelona, Bosch, 1981.v.1, p.96 apud Cezar Roberto Bittencourt, Tratado de Direito Penal, parte geral, vol. 1, 15 ed.rev., atual. e ampl. São Paulo, Saraiva, 2010, p. 100/101.

[64]  Fernando Capez, Curso de Direito Penal, parte geral, vol.1, p. 359.

[65]  Ibid., p. 359.

[66]  Cezar Roberto Bittencourt, Tratado de Direito Penal, parte geral, vol.1, p. 112.

[67]  Ibid., p.112.

[68]  Fernando Capez, Curso de Direito Penal, parte geral, vol. 1, p. 359.

[69] Barrata, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do Direito penal. Introdução à sociologia do Direito penal. Tradução Juarez Cirino dos Santos. 3.ed. Rio de Janeiro:Revan, 2002, p.41. apud Marcelo Gonçalves Saliba, Justiça restaurativa e paradigma punitivo. Curitiba: Juruá, 2009, p. 64/65.

[70]  Cezar Roberto Bittencourt, Tratado de Direito Penal, vol. 1, p. 143.

[71]  Luiz Alberto David Araújo, Curso de direito constitucional, p. 66.

[72]  Deocleciano Torrieri Guimarães, Dicionário Técnico Jurídico, p. 439.

[73]  Carlos Ari Sundfeld, Fundamentos de direito público.São Paulo, Malheiros Ed., 1992, p. 137 apud Luiz Alberto David Araújo, Vidal Serrano Junior, Curso de direito constitucional. 12 ed.rev.e atual.-São Paulo:Saraiva, 2008 p. 66. 

[74]  Guilherme de Souza Nucci, Manual de Direito Penal: parte geral:parte especial, p. 70.

[75]  Mello, Celso Antonio Bandeira de. Elementos de direito administrativo. São Paulo:RT, 1988, p.230. apud José Henrique Guaracy Rebêlo. Princípio da insignificância:interpretação jurisprudencial. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p.12.

[76]  Marcelo Gonlaves Saliba, Justiça restaurativa e paradigma punitivo, p. 103/104.

[77]  Grande Enciclopédia Larousse Cultural, Editora Nova Cultural, 1998, vol. 8, p. 1907.

[78]  Ibid, p. 1907.

[79]  José Henrique Guaracy Rebêlo, Princípio da insignificância, interpretação jurisprudencial, p. 22.

[80]   José Henrique Guaracy Rebêlo. Princípio da insignificância, interpretação jurisprudencial, p. 18/19.

[81]  Michaelis, Dicionário escolar da língua portuguesa, p. 102.

[82]   Guilherme de Souza Nucci, Princípios constitucionais e processuais penais, p. 170.

[83]  José Henrique Guaracy Rebêlo, Princípio da insignificância: interpretação jurisprudencial, p. 33.

[84]  Fernando Capez, Curso de Direito Penal: parte geral, vol.1, p. 10/13.

[85]  Op.cit,,p.11.

[86]  Ibid., p. 11.

[87]  Manã, Carlos Vico. O princípio da insignificância como excludente da tipicidade no direito penal. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 53/54 apud José Henrique Guaracy Rebêlo. Princípio da insignificância: interpretação jurisprudencial. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 34.

[88]  Zafaroni, Eugênio Raúl; Pierangeli, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. São Paulo:RT, 1997, p. 564/565 apud José Henrique Guaracy Rebêlo. Princípio da insignificância: interpretação jurisprudencial. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 35

[89]  TACrim-SP, Apel. 283.949, Rel. Silva Franco, 23.11.1981 apud SILVA, Ivan Luiz da, Princípio da insignificância no direito penal, p. 160.

[90]  Pereira, Carlos Frederico de O., O conceito de bem jurídico e o princípio da insignificância. Revista do Ministério Público Militar. Brasília: MPM, ano X, n. 13,1991, p. 50 apud Ivan Luiz da Silva, Princípio da insignificância no direito penal, p. 160.

[91]  Ivan Luiz da Silva, Princípio da insignificância no direito penal, p. 162.

[92]  Cornejo, Abel. Teoría de la insignificância. Buenos Aires: Ad Hoc, 1997, p. 70 e 72 apud Ivan Luiz da SIlva, Princípio da insignificância no direito penal, p. 162/163.

[93]  Ackel Filho, Diomar. O princípio da insignificância no direito penal. Julgados do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo.ano 22, 2º trimestre, abr./jun.1988, v.94, p. 73 apud José Henrique Guaracy Rebêlo. Princípio da insignificância: interpretação jurisprudencial. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 35

[94]  Ackel Filho, Diomar. O princípio da insignificância no direito penal. Julgados do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo.ano 22, 2º trimestre, abr./jun.1988, v.94, p. 73/74 apud José Henrique Guaracy Rebêlo. Princípio da insignificância: interpretação jurisprudencial. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 37.

[95]  Francisco de Assis Toledo, Princípios Básicos de Direito Penal, p. 134.

[96]   Guilherme de Souza Nucci, Princípios constitucionais penais e processuais penais, p. 171/174.

[97]   STF, 1ª Turma, HC 94439/RS, Rel. Min. Menezes Direito, j. 03/03/2009

[98]   Fernando Capez, Curso de direito penal: parte geral, vol. 1, p. 13.

[99]   Guilherme de Souza Nucci, Princípios constitucionais penais e processuais penais, p. 170.

[100]  Rogério Greco, Curso de direito penal:parte especial, vol.III, p. 14.

[101] Guilherme de Souza Nucci, Manual de Direito Penal:parte geral e especial, p. 703.

[102] Eliezer Siqueira de Sousa Júnior, A aplicação do princípio da insignificância no roubo é possível?

[103] Rogério Greco, Curso de direito penal: parte especial, vol. III, p. 184.

[104] Ibid., p. 203.

[105] Habeas Corpus n° 990.10.366306-3. Voto n° 20.494. Relator Antônio Manssur. TJSP. 11ª Câmara de Direito Criminal. 06/10/2010. Por maioria de votos

[106] Apelação-reclusão nº 990.10.343499-4. Relator Antônio Manssur. TJSP. 11ª Câmara de Direito Criminal. 17/11/2010. Por maioria de votos.

[107] Rogério Greco, Curso de Direito Penal: parte especial, vol. III. P. 304.

[108] Habeas Corpus nº 0027119-53.2011.8.26.0000. Voto nº 16.278. Relator Pinheiro Franco. TJSP. 5ª Câmara de Direito Criminal. 14/04/2011. V.U.

[109] APELAÇÃO N° 0091132-47.2007.8.26.0050 (990.09.230485-2). Voto nº 17.780. Relator: Viço Mañas. TJSP. 12ª Câmara de Direito Criminal. 02/03/2011.

[110] Dados disponíveis em: http://www.ssp.sp.gov.br/estatistica/plantrim/2010-04.htm

[111] Estimativa realizada a partir dos dados divulgados em: http://www.hojeemdia.com.br/cmlink/hoje-em-dia/minas/cada-processo-judicial-em-minas-custa-r-1-395-1.176337

[112] Dados disponíveis em: http://www.pco.org.br/conoticias/ler_materia.php?mat=14720

[113] Dados divulgados em 29/09/2010 no site: www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100929/not_imp6 1877,0.php

[114] Dados disponíveis em: http://www.cnj.jus.br/Presidios_IE/pages/jsp/index.jsp

[115] Dados disponíveis em: <https://jus.com.br/artigos/11001>

[116]http://www.direito2.com.br/stj/2005/nov/25/presidente_do_stj_critica_custo_elevado_com_preso_em_palestra

[117] Deocleciano Torrieri Guimarães, Dicionário Técnico Jurídico, p. 110.

[118] Nestor Távora, Curso de direito processual penal, p. 75.

[119] RT 679/351


Autor

  • Aline Albuquerque Ferreira

    Delegada de Polícia do Estado de São Paulo. Ex-Advogada. Pós-graduada em Direito Penal pela Escola Superior do Ministério Público. Pós- graduanda em Direito Público. Possui graduação em direito pela Universidade Paulista (2011). Aprovada no IV Exame da Ordem. Tem experiência em direito, com ênfase em direito penal e direito do consumidor.Foi estagiária concursada do Ministério Público Estadual (área criminal) e Ministério Público Federal (área: tributária, constitucional). Foi estagiária da magistratura estadual de São Paulo na área criminal, estagiária na vara das execuções criminais de São Paulo e Vara das Execuções Fiscais.

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FERREIRA, Aline Albuquerque. A aplicação do princípio da insignificância nos crimes contra o patrimônio do Código Penal Brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3263, 7 jun. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21947. Acesso em: 23 abr. 2024.