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A dignidade humana no século XXI e a Defensoria Pública

A dignidade humana no século XXI e a Defensoria Pública

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A Defensoria Pública é o órgão público que por excelência concretiza a dignidade da pessoa humana e efetiva o acesso à justiça, pois, invariavelmente, dá voz aos oprimidos e os mais desfavorecidos.

Resumo:  O valor da dignidade humana não é absoluto, tendo em vista que não existe nada na ordem jurídica que assim o seja. De fato, para viver em sociedade há necessidade de que as relações sociais sejam permeadas por limites e restrições, sendo que o direito a que faz jus determinado cidadão acaba quando, na realidade, começa o do próximo. A dignidade humana deve ser o ponto central de qualquer interpretação do direito, na medida em que o antecede e o condiciona. Sendo assim, todo o entendimento que venha contrariar este valor supremo deve ser,necessariamente, rechaçado. Não é demais afirmar que a dignidade da pessoa humana se tornou a fonte legitimadora da atuação pública, devendo permear, igualmente, o comportamento em âmbito particular.A Defensoria Pública é o órgão público que por excelência concretiza a dignidade da pessoa humana e efetiva o acesso à justiça, pois, invariavelmente, dá voz aos oprimidos e os mais desfavorecidos. Não há que se falar em justiça social sem uma Defensoria Pública reconhecida e bem estruturada.O escopo maior desta Instituição é o de garantir a cidadania, que para Hanna Arendt, uma das filósofas politicas mais influentes do século passado, é o direito a ter direitos. O acesso à ordem jurídica justa ou mesmo à Instituição da Defensoria Pública nem sempre foi assegurado ao povo brasileiro. Houve um longo processo até chegar à situação atual, uma verdadeira conquista de todos. Atualmente, pode-se constatar que a Defensoria Pública desponta como a Instituição de relevante valor, na medida em que é essencial à função jurisdicional, o que implica afirmar que sua criação não está ao mero alvitre governamental. Ao revés, a implementaçãodesta Instituição, nas diversas entidades federativas é imposição constitucional, é dever, é obrigação, sendo que o governante que assim não procede estará, inegavelmente, violando a Constituição Federal.

Palavras-chave: dignidade da pessoa humana; valor fundante da ordem jurídica; Defensoria Pública; acesso à justiça. 

Sumário: 1. Introdução. 2. A dignidade humana e sua amplitude conceitual. 3. Esboço histórico. 4. A dignidade humana na Constituição Federal de 1988. 5. A dignidade humana no ordenamento jurídico e seu entendimento jurisprudencial. 6.Defensoria Pública: mecanismo irrenunciável de efetivação de dignidade humana e cidadania no Brasil.7. Esboço histórico e cenário atual. 8. A Defensoria Pública no ordenamento jurídico e seu entendimento jurisprudencial.9. Considerações finais.


1. Introdução

O presente trabalho tem por objetivo fazer uma análise profunda sobre o tema da dignidade humana, abordando, preliminarmente, sua amplitude conceitual e estabelecendo um esboço histórico deste valor e atributo inerente ao Homem, de sorte a convidar o leitor para um intenso debate sobre sua relatividade ou não.

Posteriormente, far-se-á um minucioso estudo sobre a relação da dignidade da pessoa humana com a Instituição que a ela está afeta naturalmente, órgão concretizador do direito ao acesso à justiça, qual seja, a Defensoria Pública.

A justificativa do presente trabalho vincula-se a enorme importância que se reveste o tema, tendo em vista que o valor da dignidade humana deve ser visto como basilar no ordenamento atual e seu conteúdo cinge-se para os valores de suprema importância, fundamentais, que se referem, invariavelmente, à pessoa humana. A dignidade humana deve ser o ponto central de qualquer interpretação do direito, na medida em que o antecede e o condiciona.

Por conseguinte, tem-se como objetivo geral transpassar ao leitor o conceito de dignidade da pessoa humana, sua grande importância para o ordenamento jurídico como um todo e, igualmente, à toda população e, finalmente, tecer distintas considerações sobre a Instituição da Defensoria Pública.

Por objetivos específicos, almeja-se fomentar o debate sobre a efetivação e a concretização da dignidade da pessoa humana através da Defensoria Pública, Instituição que por excelência está ligada ao acesso à justiça dos mais necessitados e desamparados pelo Poder Público Estatal.

No que diz respeito aos aspectos metodológicos, utilizou-se, na confecção deste artigo jurídico, a pesquisa bibliográfica através de ampla consulta à literatura nacional pertinente ao tema, como, por exemplo, livros, revistas jurídicas especializadas, publicações, assim como vasta pesquisa ao texto constitucional, legislação infraconstitucional e pesquisas em sítios na rede mundial de computadores. 


2. A dignidade humana e sua amplitude conceitual

O ato de atribuir uma definição conceitual precisa à dignidade humana é, sem dúvida, uma das tarefas mais árduas, haja vista a amplitude conceitual que a acompanha. Para cumprir tal mister, faz-se alusão à definição propalada pelo cultuado Prof. Rizzatto Nunes, a qual se mostra deveras salutar:

“A dignidade humana é um princípio construído pela história. Consagra um valor que visa proteger o ser humano contra tudo que lhe possa levar ao menoscabo.’’ [ 1 ]

Não obstante tratar-se de um princípio ou, ainda, um valor, certo é que desta simples assertiva já se depreende que a dignidade humana é algo que acompanha o próprio ser humano, algo que o diferencia dos outros seres viventes e algo que o protege seja de seus próprios pares, seja de circunstâncias adversas que venham por ventura venham infirmar tal qualidade.

Conforme preceitua a própria Carta Magna, em seu artigo 1º, inciso III, a dignidade da pessoa humana foi erigida a fundamento da República Federativa do Brasil, em outras palavras, trata-se de valor-fonte de todo o ordenamento jurídico, de sorte a centralizar e unificar todos os direitos fundamentais. Tal valor, que se mostra como fundamento e fim último da ordem política atual, intenta reconhecer que o homem não é um simples objeto ou meio, mas sim, pleno sujeito de direito ou crédito perante esta ordem. Nesse trilhar de ideias, frisa-se que é na dignidade humana que se repousa todas as premissas de fundamentação da ordem jurídica e toda a razão de existir do Direito.

Nesse contexto, pertinente se evidencia a seguinte indagação: é a dignidade humana um princípio de caráter absoluto? Por amor à brevidade, destaca-se neste trabalho, de pronto, que o valor da dignidade humana não é absoluto, tendo em vista que não existe nada na ordem jurídica que assim o seja. De fato, para viver em sociedade há necessidade de que as relações sociais sejam permeadas por limites e restrições, sendo que o direito a que faz jus determinado cidadão acaba quando, na realidade, começa o do próximo. Tal situação não está configurada apenas no que diz respeito à dignidade humana, mas em todo e qualquer direito que compõe o próprio ordenamento jurídico pátrio. Como bem reiterado pela Corte Máxima, não há direito absoluto em sede do texto constitucional, sendo assim, o direito a liberdade, o direito a propriedade, à vida e a própria dignidade humana podem e devem ser relativizados em determinadas situações.

O valor da dignidade humana deve ser visto como basilar no ordenamento atual, no entanto, esta qualidade não lhe atribui necessariamente o caráter de absoluto. Hodiernamente, vemos diversas situaçõesque são levadas à tutela jurisdicionalem que se entrechocam direitos fundamentais, a exemplo do que ocorre quando determinado demandante se vale da ação reparatória de danos morais, em que reputa ter sofrido abalo significativo em seus direitos da personalidade. Nesta balança da justiça, muitas vezes, se contrapõem direitos que são igualmente albergados pela ordem social, a título de exemplo cita-se o direito de informar e o direito à honra. No mais, vemos que o fato de determinado cidadão ser processado criminalmente e condenado a uma pena de reclusão, já se evidencia uma violação ao seu direito de liberdade em contraponto ao direito de punir do Estado.

De mais a mais, imprescindível que a análise da possibilidade de relativizar a dignidade humana seja feita no âmbito do exame do caso concreto, pois somente deste modo poderá apreender os exatos termos da ofensa de um determinado direito fundamental. Pelo caráter relativo da dignidade humana, remete-se ao que preceitua Sarlet:

“Parece-nos irrefutável que, na esfera das relações sociais, nos encontramos diuturnamente diante de situações nas quais a dignidade de uma determinada pessoa (e até mesmo de grupos de indivíduos) esteja sendo objeto de violação por parte de terceiros, de tal sorte que sempre se põe o problema – teórico e prático – de saber se é possível, com o escopo de proteger a dignidade de alguém, afetar a dignidade do ofensor, que, pela sua condição humana, é igualmente digno, mas que, ao mesmo tempo naquela circunstância, age de modo indigno e viola a dignidade dos seus semelhantes, ainda que tal comportamento não resulte – como já anunciado alhures – na perda da dignidade. Neste contexto, vale lembrar a lição do publicista germânico Brugger, que, ao discorrer justamente sobre esta temática, parte da premissa - que nos parece correta – de que a Lei Fundamental da Alemanha quando no seu artigo 1, inciso I, anunciou que a ‘dignidade do homem é intangível’, justamente tomou por referência a experiência de que esta dignidade é, de fato, violável e que por esta razão necessita ser respeitada, e protegida, especialmente pelo poder que, apesar de muitas vezes ser o agente ofensor, ainda acaba sendo a maior e mais efetiva instância de proteção da dignidade da pessoa humana.” [2]

Como já salientado, prefere-se denominar a dignidade humana como núcleo axiológico da constituição, atributo inerente à pessoa humana que independe de qualquer condição, requisito, nacionalidade, cor, sexo, religião ou posição social, entre outros. Entende-se indevido intitular a dignidade humana como um direito, tendo em vista que ela não é conferida pelo ordenamento jurídico, mas, sim, reconhecida e protegida.

No que tange à nomenclatura, opta-se por conceituar a dignidade humana como valor e não como postulado, princípio, tampouco regra. De fato, há diferenças entre estes três institutos apresentados, haja vista que o postulado referir-se a normas que orientam para a interpretação de outras normas, sendo também chamados de normas de segundo grau. Nesse sentido, a dignidade humana atuaria como um postulado, na medida em que auxilia a aplicação e concretização de outras normas, como, por exemplo, os direitos fundamentais do artigo 5º da Carta Constitucional de 1988 ou mesmo auxiliando na interpretação dos direito sociais, saúde, educação e seguridade social.

Em prosseguimento, aduz-se que a dignidade humana não se confunde com o princípio, eis que este representa uma diretriz de atuação dos órgãos públicos ou, ainda, dos agentes nas instâncias privadas para que se alcance uma vida plena e digna. Desse modo, o principio vai apontar para um caminho, um meio para que se alcance uma meta, qual seja a dignidade humana.

Por derradeiro, cumpre ressaltar que a dignidade também não se confunde com as regras, visto que estas são espécies do gênero norma jurídica, consubstanciando proposições normativas que se concretizam sob o uso da fórmula de Ronald Dworking, qual seja, tudo ou nada (allornothing). Decerto, se os fatos previstos pela norma ocorrerem, ela deverá ser obrigatoriamente aplicada, de sorte a produzir seus efeitos de forma imediata e automática. Opõe-se, necessariamente, à aplicação dos princípios, os quais se manifestam por meio da ponderação e admitem a aplicação em um determinado caso concreto de dois ou mais princípios. Já no que se refere à norma, a situação é diametralmente oposta, pois esta apenas não incidirá na hipótese fática quando não estiver mais em vigor, exsurgir outra mais específica ou for inválida.

Com vistas a por termo a definição de dignidade humana, valemo-nos, neste momento, de outra indagação assaz pertinente, isto é, qual o seu conteúdo. Tal assertiva faz-se necessária, na medida em que a dignidade humana transmudou-se em instrumento de retórica, sendo utilizada indiscriminadamente tanto em sede jurisprudencial, como doutrinária, como argumento de fundamentação ou legitimação de tudo, até mesmo para o cometimento de alguns crimes, dentre eles, a eutanásia.

Certamente, pode-se dizer com convicção que o conteúdo da dignidade humana cinge-se para os valores de suprema importância, fundamentais, que se referem, invariavelmente, à pessoa humana. A dignidade humana deve ser o ponto central de qualquer interpretação do direito, na medida em que o antecede e o condiciona. Sendo assim, todo o entendimento que venha contrariar este valor supremo deve ser, necessariamente, rechaçado, eis que causa um malferimento ao próprio texto constitucional, no que diz respeito ao seu conteúdo.

Não há como se negar que a dignidade humana é preceito a que todo ser humano é dotado, valor moral e espiritual ínsito ao ser humano e que desponta como o de maior importância no Estado Democrático de Direito. A formulação mais conhecida deste atributo humano deve-se a Immanuel Kant, em sua conhecida obra ”Fundamentação da Metafísica dos Costumes”, na qual enuncia que o homem deve ser visto não como meio ou objeto, mas como fim. Diante disto, pode-se constatar que há uma qualidade inerente ao homem que o diferencia dos demais seres que habitam o meio e, tal atributo se dá simplesmente por sua existência, não se fazendo necessário nenhum outro requisito.

A propósito, confira-se como Kant formulou este valor supremo:

”No reino dos fins, tudo tem um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a coisa que se acha acima de todo o preço, e por isso não admite qualquer equivalência, compreende uma dignidade.“

A dignidade humana pode ser vista no âmbito de sua matriz universalista, a qual se refere ao homem ter uma vida saudável, encerrando um valor absoluto ou, ainda, em sua matriz particularista, na qual se volta para posição ocupada na esfera pública, agregando um papel ativo do homem na sociedade e, portanto, um valor relativo. Nessa conjuntura, constata-se que a dignidade humana é conceito adequável à modernização da sociedade, bem como com sua realidade, devendo, por conseguinte, estar em consonância com a evolução e as tendências das expectativas humanas.

Nessa esteira, curial a definição do atributo da dignidade humana oferecida pelo Prof. Sarlet:

[...] temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que asseguram a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.”[3]

A dignidade humana vem estampada não apenas nas entrelinhas do texto da Carta Magna, mas, também, em todos os ramos jurídicos. A título de exemplo cita-se o direito civil, no que concerne ao direito de família, onde a dignidade humana faz com que o instituto da família seja visto como uma garantia plena de desenvolvimento assegurada a todos os seus membros, de sorte a que sejam realizados seus objetivos e metas e que, finalmente, prevaleça a união e o afeto entre todos os seus integrantes. Neste diapasão, precisas as palavras da Prof. Maria Helena Diniz:

’’[...] é preciso acatar as causas da transformação do direito de família, visto que são irreversíveis, procurando atenuar seus excessos, apontando soluções viáveis para que a prole possa ter pleno desenvolvimento educacional e para que os consortes ou conviventes tenham uma relação firme, que integre respeito, tolerância, diálogo, troca enriquecedora de experiência de vida etc.”[4]

No mais, exemplifica-se a presença da dignidade humana na seara trabalhista, mormente no que diz respeito à adoção de métodos de trabalho que preservem a saúde física e psíquica do trabalhador, que não haja assédio moral e, ainda, no próprio reconhecimento de diversos outros direitos. Na seara penal também está presente a dignidade humana, haja vista que o cidadão deve ser processado apenas sob os limites do devido processo legal e que não seja tangenciada a própria dignidade da pessoa humana, ao revés, esta deve ser privilegiada.  


3. Esboço Histórico

Sem dúvida, o marco histórico não só para o tema direitos humanos, como também no que corresponde à dignidade humana foi a Segunda Guerra Mundial e suas atrocidades, as quais impeliram, muitas vezes, uma visão reducionista de ser humano e até mesmo de um simples objeto desprovido de quaisquer qualidades e direitos.

Diante deste acontecimento que acarretou grandes consequências em toda a humanidade, o tema dignidade humana passou a ser o ponto central dos debates científicos, filosóficos e jurídicos, no sentido de reflexão e adoção de medidas para que todos repudiassem e se precavessem de novas barbáries e genocídios. Em decorrência, houve a constitucionalização do principio da dignidade humana, em primeiro lugar na Alemanha, palco da apavorante experiência do Nazifascismo, no qual teve origem a terrível possibilidade legal de seres humanos destituídos de dignidade de existência humana. Posteriormente, sob uma perspectiva axiológica, diversas outras Constituições trilharam o mesmo caminho, dentre elas, a do Brasil.

A dignidade humana, assim como os direitos fundamentais nãosão tema novo, pois, há indícios de que mesmo na antiguidade estes já repousavam no espírito humano. No entanto, no presente trabalho optou-se por fazer um recorte buscando somente estudar o período moderno iniciado com a tão conhecida Revolução Francesa dentre seus ideais de liberdade, igualdade e fraternidade.

Sendo a dignidade humana o atributo inerente à própria existência humana, que centraliza e ordena todos os direitos fundamentais, não há como não fazer menção à evolução histórica dos direitos humanos sem não abordá-la. Na realidade, o que difere os direitos humanos dos direitos fundamentais é só uma: a positivação, eis que os direitos fundamentais são aqueles reconhecidos na ordem interna.

No que diz respeito à evolução dos direitos humanos, há consenso apenas entre as três primeiras dimensões:

1)  1ª dimensão dos direitos humanos: compreende os direitos das liberdades, isto é, os direitos civis e políticos, resultado direto das revoluções liberais e da transição do Estado Despótico (Absolutista) para o Estado Liberal de Direito. A principal característica é que consubstanciam direitos negativos, que negam a intervenção estatal, impondo um non facere.Quanto ao principal marco histórico que deu ensejo a tal dimensão citam-se a Revolução Gloriosa, na Inglaterra, em 1688; a Revolução Francesa, de 1789; e a Independência dos estados Unidos. Quanto aos marcos teóricos, temos o Segundo Tratado sobre o governo, John Locke e, ainda, O Contrato Social, de Jean Jacques Rousseau. 

2) 2ª dimensão dos direitos humanos: referem-se aos direitos da igualdade, ou seja, os direitos sociais, econômicos e culturais, resultado da transposição do Estado Liberal para o Estado Social. Sua principal característica é de que se traduzem em direitos positivos, prestacionais, que exigem e obrigam o Estado a atuar positivamente, intervindo no domínio econômico e prestando políticas públicas de caráter social. No que diz respeito ao marco histórico pode-se citar a Revolução Mexicana, de 1910e a Revolução Russa de 1917, que conduziu à insurgência do Estado Socialista na Rússia e impactou profundamente o cenário político global. No que concerne aos marcos teóricos tem-se a “Encíclica RerumNovarum sobre a condição dos operários”, da Igreja Católica e, ainda o “Manifesto do Partido Comunista” de autoria conjunta de Karl Marx e Friederich Engels em 1848. Quanto aos acontecimentos jurídicos de relevo, tem-se a Constituição Mexicana de 1917, sendo a primeira a fazer menção expressa e a assegurar direitos sociais e, ainda, a Constituição Alemã de 1919, denominada como Constituição de Weimar.

3) 3ª dimensão dos direitos humanos: trata-se dos direitos de fraternidade ou solidariedade, quais sejam, os direitos difusos, coletivos, da humanidade, tendo como exemplos o direito do consumidor, proteção ao meio ambiente, ao desenvolvimento. São direitos que se referem não a uma determinada ação estatal, mas, tão somente, em razão de serem direitos reconhecidos ao homem por sua mera condição humana e nada mais. Um marco jurídico de significância foi, sem dúvida, a Declaração Universal de Direitos Humanos, texto fundante do Direito Internacional dos Direitos Humanos.

4) Outras dimensões: não há consenso sobre as novas dimensões, no entanto, entende-se que os novos direitos vêm somar-se aos já reconhecidos, aumentando o quadro de direitos e promovendo, também, uma releitura nos direitos anteriormente consagrados. 


4. A dignidade humana na Constituição Federal de 1988

Diante de uma simples análise, já se denota claramente que a Constituição Cidadã erigiu a dignidade humana a verdadeiro fundamento da República, senão, vejamos:

Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III – a dignidade da pessoa humana

Por fundamento, entenda-se o alicerce, base de um edifício, principal apoio, base, causa e motivo.

Destarte, segundo esta redação, este valor ou atributo humano seria um dos alicerces principais da República Federativa do Brasil. A despeito de o texto constitucional não definir precisamente esta locução normativa, decerto, possui uma densidade mínima de significado. Nesse sentido, assevera Celso Antônio Bandeira de Mello:

“[…] tem-se que aceitar logicamente, por uma irrefreável imposição racional, que mesmo que os conceitos versados na hipótese da norma ou em sua finalidade sejam vagos, fluidos ou imprecisos, ainda assim têm algum conteúdo determinável, isto é, certa densidade mínima, pois, se não o tivessem não seriam conceitos e as vozes que os designam sequer seriam palavras. (1992, p.28-29).”

De fato, a Carta da República não incluiu a dignidade da pessoa humana como sendo um direito a ser reconhecido, protegido e assegurado no rol do artigo 5º, o qual se refere aos direitos fundamentais. Ao revés, optou a Assembleia Nacional Constituinte por prever a dignidade humana de forma esparsa no texto da lei Maior, implicitamente em diversos dispositivos ou, ainda, de forma expressa nos artigos 1º, inciso III, 170, caput e 226, parágrafo 7º. 

Nesse momento, faz-se pertinente a seguinte indagação: qual a razão ou motivo que levou o legislador constituinte a inserir a dignidade humana entre os fundamentos da República e não entre o rol dos direitos fundamentais?

Segundo o posicionamento do eminente Prof. José Afonso da SiIva: .

“[…] a eminência da dignidade da pessoa humana é tal que é dotada ao mesmo tempo da natureza de valor supremo, princípio constitucional fundamental e geral que inspira a ordem jurídica. Mas a verdade é que a Constituição lhe dá mais do que isso, quando a põe como fundamento da República federativa do Brasil constituída em Estado Democrático de Direito. Se é fundamento é porque se constitui num valor supremo, num valor fundante da República, da Federação, do País, da Democracia e do Direito. Portanto, não é apenas um princípio da ordem jurídica, mas o é também da ordem política, social, econômica e cultural. Daí sua natureza de valor supremo, porque está na base de toda a vida nacional.”

Não é demais afirmar que a dignidade da pessoa humana se tornou a fonte legitimadora da atuação pública, devendo permear, igualmente, o comportamento em âmbito particular. As palavras precisas do renomado jurista alemão Peter Häberle mostram-se precisas, na medida em que aduz:

“Também o Estado constitucional há de fazer sua parte respeitando e protegendo; disso resulta a legitimidade do seu poder estatal. Dignidade humana, como fundamento do Estado constitucional e de seus “poderes”, necessita simultaneamente do – seu protetor – o poder estatal. […] Do art. 1º da LF [Constituição da Alemanha] podem resultar deveres, diretos de legislar. O dever de proteção possibilita a “defesa móvel e prospectiva” da dignidade humana e levanta questões a respeito dos limites da dignidade humana e a respeito dos instrumentos protetivos adequados.”

Desta maneira, a dignidade humana é considerada por diversos doutrinadores como fonte legitimadora do poder estatal num Estado Democrático de Direito, verdadeiro valor maior e fundante para todo o ordenamento jurídico, servindo de esteio principalmente para todo e qualquer ato do poder público, cujos mandamentos e atos apenas serão devidos se buscarem sua efetivação.

A despeito do caráter relativo da dignidade humana retromencionado, certo é que a Constituição Federal entende ser necessário que se dê concretude a um mínimo de dignidade, o qual se denomina mínimo existencial. No ordenamento jurídico pátrio, este mínimo existencial estaria ligado aos direitos assegurados nos artigos 5º e 6º da atual Constituição.

Tema de grande importância é o que se refere ao mínimo existencial, expressão que surgiu no Tribunal Federal Administrativo da Alemanha, em 1953, o qual foi incorporado pela Corte Suprema Alemã em momento posterior. Tal instituto foi trazido ao Brasil pelo tributarista Ricardo Torres.

Em apertada síntese, denomina-se mínimo existencial o conjunto de bens e utilidades indispensáveis a uma vida digna. Corresponde, certamente, ao mínimo que deve ser alcançado para que uma pessoa tenha uma vida digna, sendo, por conseguinte, um subgrupo menor dentro dos direitos sociais. Sua criação tem por escopo atribuir efetividade a esses direitos. A Lei Maior não é apenas uma Constituição semântica, mas, sim, uma Constituição normativa, cujas normas são obrigatórias, vinculantes e superiores a todas as outras.

Ainda no que se refere ao mínimo existencial, nota-se queo antigo Tribunal Alemão retirava a essência do mínmo existencial de três normas constitucionais, quais sejam, liberdade material, dignidade da pessoa humana é o principio do estado social. [5]

Alguns doutrinadores como, por exemplo, Ricardo Torres,afirmam que não haveria um conteúdo certo e preciso do que venha a ser mínmo existencial, sendo necessário, pois, a análise da necessidade de cada época e de cada sociedade. No entanto não nos parece que seja o entendimento que atribua maior efetividade ao mínimo existencial. Mesmo que não haja menção sobre um conteúdo determinado e universal, cada sociedade deve prever um mínimo de direitos, isto é, um núcleo de direitos que devem ser assegurados e inviolados, seja por ação estatal ou em âmbito privado. Proceder dessa forma é garantir não apenas a dignidade humana, mas, também, a existência de todos.

A Prof. da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Ana Paula de Barcellos, leciona que o mínimo existencial abrangeria no mínmo quatro direitos, dentre os quais, a educação, a saúde, a assistência aos desamparados e o acesso à justiça. Em contrapartida, outros doutrinadores não se restringem a estes quatro direitos, mas elencam, também, o direito moradia, não no que consubstancia um direito a ter uma casa dada pelo Estado, mas, sim, o direito a um abrigo onde as pessoas possam se proteger.

Tese digna de menção neste trabalho que vai de encontro à teoria do mínmo existencial é a reserva do possível. Tal expressão, também oriunda da Alemanha do ano de 1972, precisamente da Suprema Corte Alemã. Fato é que, nesta época, a Constituição Alemã não consagrava um rol de direitos sociais. Algumas pessoas se dirigiam ao Poder Judiciário a fim de que este assegurasse o acesso ao ensino superior. No entanto, a Suprema Corte consignava que não haveria possibilidade de o Estado fornecer vaga para todos, cabendo ao legislativo dar prioridade ou não de investimento necessário ao ensino superior consagrando, dessa forma, a teoria da reserva do possível do Estado.

Segundo Andreas Krell[6],o tema da reserva do possível não poderia ser trazido à realidade brasileira, pois prejudicaria sobremaneira a concretização dos direitos sociais. Já o jurista Daniel Sarmento entende que, exatamente em decorrência da limitação de recursos disponíveis pelo Estado (escassez de recursos frente à infinita demanda) será possível, sim, a utilização da teoria da reserva do possível.  

Finalmente, na concepção do renomado doutrinador Ingo Sarlet, a reserva do possível pode ser visualizada em três dimensões:

a) 1ª dimensão: Possibilidade fática – relaciona-se com a existência de recursos necessários para a satisfação dos direitos prestacionais. Deve-se analisar se o Estado possui recursos necessários para o atendimento dos direitos sociais e se dispõe de recursos para tratamento de determinado indivíduo ou de todos que necessitem. 

b) 2ª dimensão: Possibilidade jurídica – envolve a limitação do orçamento (princípio da legalidade do orçamento), bem como a análise das competências federativas. Caso os recursos orçamentários fossem destinados desrespeitando a proporcionalidade e razoabilidade, seria, plausível a intervenção do Judiciário sendo, pois, uma exceção a não intervenção do Judiciário. 

c) 3ª dimensão: Proporcionalidade da prestação e razoabilidade da exigência – a reserva do possível só deve ser admitida quando da existência de justo motivo, objetivamente aferível.


5. A dignidade humana no ordenamento jurídico e seu entendimento jurisprudencial

Como ressaltado neste trabalho, a dignidade humana não é tema meramente teórico ou abstrato circunscrito apenas ao âmbito doutrinário, mas, volta-se, igualmente, para diversas discussões jurisprudenciais, estando presente em diversas legislações esparsas.

A propósito, confira-se o artigo 5º, incisos XLVII e XLIX, da Constituição Federal de 88, respectivamente:

XLVII - não haverá penas:

a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;

b) de caráter perpétuo;

c) de trabalhos forçados;

d) de banimento;

e) cruéis;

XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;

Destes preceitos normativos, percebemos de forma nítida que o legislador constituinte de 88 teve por escopo, senão, proscrever, isto é, banir, abolir ou proibir determinados tipos de pena, considerados, inegavelmente, como atentatórios à dignidade da pessoa humana, o que, evidentemente, não se coadunaria com os valores propagados pelo texto constitucional.

Sendo assim, mesmo o criminoso condenado não pode ser destituído de sua personalidade ou de respeito. No mais, aquelas penas que impõem sofrimento extremado ao condenado também estão extintas. Como bem dispõem os incisos acima verificados, o respeito deve cingir-se à sua incolumidade física e mental, tencionando o Estado a trazer de volta à sociedade o condenado devidamente tratado e em melhores condições que as existentes quando entrou na prisão.

Nessa linha de raciocínio, confira-se a lei 8.009/90, a qual se refere à impenhorabilidade do bem de família. Nesse contexto, necessário mencionar sobre a teoria do patrimônio mínimo, cuja autoria se atribui ao cultuado doutrinador Luiz Edson Fachin. [7] Em termos objetivos, esta teoria preceitua que o homem passa a ser o epicentro de todo o direito privado, em franco detrimento ao patrimônio. Portanto, para que o ser humano viva com dignidade deve a ele ser assegurado um mínmo de patrimônio para que viva com dignidade. Nítida, portanto, é a relação entre a proteção do bem de família, isto é, sua impenhorabilidade e a teoria do patrimônio mínimo, tendo em vista que aquela constitui uma das vertentes desta.  

Ademais, cumpre fazer alusão ao julgamento de recurso especial, oriundo da 3ª Turma do Superior Tribunal, cuja relatoria se atribui à Ministra Nancy Andrighi, in verbis: [8]

“[...] Ocorre que, como visto acima, o sistema de proteção legal conferido às verbas de natureza alimentar impõe que, para manterem essa natureza, sejam aplicadas em caderneta de poupança, até o limite de 40 salários mínimos, o que permite ao titular e sua família uma subsistência digna por um prazo razoável de tempo. Valores mais expressivos, superiores aos 40 salários mínimos, não foram contemplados pela impenhorabilidade fixada pelo legislador, até para que possam, efetivamente, vir a ser objeto de constrição, impedindo que o devedor abuse do benefício legal, escudando-se na proteção conferida às verbas de natureza alimentar para se esquivar do cumprimento de suas obrigações, a despeito de possuir condição financeira para tanto. O que se quis assegurar com a impenhorabilidade de verbas alimentares foi a sobrevivência digna do devedor e não a manutenção de um padrão de vida acima das suas condições, às custas do devedor. Sendo assim, não se vislumbra na espécie a violação dos artigos. 620, 649, IV e X, do CPC e 3º da Lei nº 9.467/97.”

Neste caso, a relatora do recurso entendeu que o fim maior da impenhorabilidade das quantias de depósito em poupança é, simplesmente, propiciar um mínimo existencial ao devedor, tendo em vista o valor e atributo maior da dignidade da pessoa humana.

Por derradeiro, resta-nos trazer exemplos de casos concretos, a fim de analisar o entendimento jurisprudencial, no que concerne a aplicação do atributo da dignidade humana.

Em primeiro plano, insta esclarecer a questão da transfusão de sangue e da testemunha de Jeová. Sem dúvida, trata-se de tormentoso tema, haja vista que a própria Constituição Federal assegura amplamente tanto a liberdade de religião [9], como, também, o direito à vida. Fato é que os membros dessa religião não se subordinam a tal procedimento, com base em um trecho da bíblia. Sendo assim há um conflito entre a liberdade religiosa e o direito à vida. O primeiro entendimento cinge-se à ideia de que as testemunhas de Jeová podem recusar a transfusão diante da liberdade de crença e a dignidade da pessoa humana. De forma diametralmente oposta, a segunda corrente afirma que é possível e necessária a intervenção judicial para salvar a vida do paciente, mesmo que seja contra a sua vontade, haja vista que o direito maior do ordenamento pátrio é a vida e sem ela não é possível postular nenhum direito. Esta segunda corrente vem sendo mais aceitae, ainda reputada mais coerente, pois baseada nos termos da resolução 1021/80 do conselho federal de medicina (CFM) e nos termos do Código de Ética Médica.

Outro exemplo bastante significativo foi o apresentado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na área da saúde, resultando no ajuizamento da ADPF 54 [10]. No julgamento desta ação, prevaleceu o entendimento de que a antecipação terapêutica do parto do feto anencefálico não é aborto, não havendo em se falar em tipicidade de qualquer conduta criminosa. Fez-se necessária uma ponderação entre a dignidade da pessoal humana, a liberdade sexual e o direito à vida do feto. Restou como majoritário o entendimento de que deveria haver uma interpretação histórico evolutiva do código penal, de sorte a acrescentar a hipótese de aborto em casos de acrania, ao lado, evidentemente, do aborto terapêutico ou necessário e do aborto sentimental.

A esse respeito colacionamos o entendimento do eminente Ministro Marco Aurélio de Mello:

“[...] Aborto é crime contra a vida. Tutela-se a vida em potencial. No caso do anencéfalo, não existe vida possível. O feto anencéfalo é biologicamente vivo, por ser formado por células vivas, e juridicamente morto, não gozando de proteção estatal.”

Digno de nota é o exemplo bastante citado na doutrina do “arremesso de anões”. Trata-se de uma prática, da qual se valiam algumas pessoas que iam a determinado local e se divertiam arremessando os anões, que consentiam com tal prática e auferiam remuneração com esta. Neste diapasão, vem a lume a seguinte indagação: é possível a intervenção estatal de modo a proibir este fato? Não é melhor permitir estes eventos, em vez de deixar o anão em casa desempregado? Certo é que, no final deste episódio marcante, as autoridades proibiram-no com fundamento no princípio da dignidade humana, haja vista que o desrespeito a um anão quando arremessado não se restringe unicamente a sua pessoa, mas a todos os anões.

Inúmeras são as decisões que mencionam o valor da dignidade humana:

“[...]a dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos do Estado democrático de direito, ilumina a interpretação da lei ordinária” (STJ, HC 9.892-RJ, DJ 26.3.01, Rel. orig. Min. Hamilton Carvalhido, Rel. para ac. Min. Fontes de Alencar). “[...] fornecimento compulsório de medicamentos por parte do Poder Público (STJ, ROMS 11.183-PR, DJ 4.9.00, Rel. Min. José Delgado), a nulidade de cláusula contratual limitadora do tempo de internação hospitalar (TJSP, AC 110.772-4/4-00, ADV 40-01/636, nº 98859, Rel. Des. O. Breviglieri), a rejeição da prisão por dívida motivada pelo não pagamento de juros absurdos (STJ, HC 12547/DF, DJ 12.2.01, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar), o levantamento do FGTS para tratamento de familiar portador do vírus HIV (STJ, REsp. 249026-PR, DJ 26.06.00, Rel. Min. José Delgado) [...].”


6. Defensoria Pública: mecanismo irrenunciável de efetivação de dignidade humana e cidadania no Brasil.

A Defensoria Pública é o órgão público que por excelência concretiza a dignidade da pessoa humana e efetiva o acesso à justiça, pois, invariavelmente, dá voz aos oprimidos e desfavorecidos. Não há que se falar em justiça social sem uma Defensoria Pública reconhecida e bem estrutura.

Preliminarmente, faz-se necessário tecer considerações sobre a Instituição em apreço, suas atribuições, bem como sobre o acesso à justiça. Impende anotar que a esta Instituição, segundo o que dispõe a Constituição Federal, cabe a assistência jurídica integral e gratuita às pessoas necessitadas. Desse modo aduz a Lei Maior:

Artigo 5º Omissis

LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;

Por este dispositivo inscrito no rol do artigo 5º, vemos que a assistência jurídica integral e gratuita passa a ser verdadeiro direito público e subjetivode todas as pessoas necessitadas. Na medida em que o Estado se incumbiu de tutelar os conflitos existentes em sociedade, este, certamente, deve propiciar a existência de um órgão com autonomia e independência funcional para efetivar o acesso à justiça. É neste contexto que se evidencia o papel da Defensoria Pública.

O escopo maior desta Instituição é o de garantir a cidadania, que para Hanna Arendt, uma das filósofas politicas mais influentes do século passado, é o direito a ter direitos.

A Defensoria Pública é classificada com função essencial à justiça, o que nos remonta à ideia de que é este órgão uma estrutura institucional com que o Estado assegura o direito fundamental de assistência jurídica e judiciária aos necessitados, já consagrado e tradicional no Direito brasileiro.

O que deve ser enfatizado é que esta nobre Instituição tem por meta a transformação e emancipação social. Sua atuação não se circunscreve ao âmbito judiciário, mas, sim, à promoção da mediação de conflitos, a qual consiste em levar aos necessitados hipossuficientes ou organizacionais a educação em direitos, bem como orientação jurídica. As atribuições da Defensoria Pública interligam-se à noção de cidadania, eis que se denota claramente uma função pedagógica de como resolver os conflitos e como se relacionar de forma devida e pacífica em sociedade. Para que haja a participação dos cidadãos na vida do Estado através do voto ou a participação na fiscalização e resolução dos problemas do Estado é preciso que haja pleno conhecimento de seus direitos, é preciso que haja a Defensoria pública.

Desta forma, para que haja uma sociedade mais justa, fraterna e solidária, a Defensoria adota este posicionamento, qual seja, ter como foco a educação em direitos, para que dessa forma, seja concretizada a noção de cidadania. No mais, vale ressaltar que não basta levar a informação ao cidadão ou a qualquer habitante que esteja em território pátrio, mostra-se imprescindível a educação sobre os deveres.

No que diz respeito ao acesso à justiça, curial ressaltar que não deve tal expressão se limitar ao seu aspecto formal, no qual o Estado garanta que qualquer um possa buscar a tutela do Poder Judiciário diante de um conflito existente. Na atualidade, fala-se em acesso à ordem jurídica justa, efetiva e de qualidade, que não venha a destempo. 

Na importante obra de Mauro Cappelletti e Bryant Garth, Acesso à Justiça, chegou – se à conclusão de que o próprio acesso à justiça deve ser a) igualmente acessível a todos; b) que os resultados devem ser necessariamente efetivos. A relevância do acesso à justiça e determinada da seguinte forma:

“[...] o direito ao acesso efetivo tem sido progressivamente reconhecido como sendo de importância capital entre os novos direitos individuais e sociais, uma vez que a titularidade de direitos é destituída de sentido, na ausência de mecanismos para sua efetiva reivindicação. O acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar, os direitos de todos.”

O direito ao acesso à justiça passou por mudanças significativas desde o século passado, atualizando com os mencionados autores, os quais denominaram tal movimento de transformação como “as três ondas renovatórias do acesso à justiça”, dentre as quais, a assistência judiciária, a representação judicial dos interesses difusos e coletivos e o enfoque de efetividade do acesso à justiça. Cabe esclarecer que a Defensoria Pública encontra-se na primeira onda renovatória.

Neste passo, o acesso à justiça deve ser encarado com um divisor de águas, isto é uma ruptura de mais de duas décadas de regimes autoritários e despóticos, em que o cidadão não tinha voz e seus direitos estavam francamente reprimidos. Na realidade, tal cisão deu-se com o advento da Constituição Cidadã de 1988, assim chamada pelo deputado Ulisses Guimarães, tendo em vista a grande participação popular na confecção de seu texto.

Como cediço, não basta reconhecer o direito, mas deve-se, sim, efetivá- lo. Sendo assim, não é demais afirmar que é na Defensoria Pública que o indivíduo necessitado, seja ele cidadão ou não, encontrará proteção e a real oportunidade de alcançar os benefícios da justiça. É, pois, a luz no túnel de todos aqueles desamparados e a quem não tem a recorrer.

Grande parcela da população brasileira desconhece seus direitos e, por via reflexa, desconhece também o que venha a ser o acesso à justiça. Nem se fale dos inúmeros aspectos desfavoráveis da justiça que apenas corroboram uma situação que afasta cada vez mais o cidadão da tutela pública, seja no que corresponde à questão econômica, seja no que concerne ao tempo para outorgá-la.  

Certo é que o acesso à justiça deverá ser concretizado por meio de ações e políticas do Estado que visem a conscientizar a população de seus direitos. Fazem-se necessários investimentos de grande monta na Instituição da Defensoria Pública, pois, somente, dessa forma, haverá uma sociedade em que a igualdade não é semântica, isto é, fantasiosa, mas, sim uma igualdade real que implica em oportunidades iguaisa todos os semelhantes.

Os objetivos constitucionais estão previsto de forma expresso em seu artigo 3º, in verbis:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II - garantir o desenvolvimento nacional;

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Todos os objetivos, sem exceção, se comungam com o ideal maior da Defensoria Pública, qual seja, efetivar a igualdade substancial.

No que toca ao Defensor Público em si considerado, vale esclarecer que este não integra a advocacia pública ou privada, tem independência funcional no exercício de sua nobre função e, ainda, trata-se de um agente político. Segundo o que preceitua Hely Lopes Meirelles: [12]

agentes políticos são os componentes do governo nos seus primeiros escalões, investidos em cargos, funções, mandatos ou comissões, por nomeação, eleição, designação ou delegação para o exercício de atribuições constitucionais”.

Ainda sob o entendimento deste cultuado doutrinador, incluem-se nesta categoria de agente político os chefes do Poder Executivo Federal, Estadual e Municipal, membros do Poder Legislativo, da Magistratura, Ministério Público e todas as demais autoridades que atuam com independência funcional no desempenho de suas atribuições. Sendo assim, de rigor denominar o Defensor Público como agente político, mormente após a redação dada pela Emenda Constitucional n.º 45/04 que atribuiu expressamente à Defensoria Pública Estadual autonomia funcional, administrativa e iniciativa de sua proposta orçamentária. Insta salientar que a Defensoria Pública não pertence aos quadros do Poder Executivo, pelo menos não formalmente, entretanto, tem suas atividades custeadas por ele.

No que concerne às suas atribuições, estas podem se dividir em típicas ou atípicas. As primeiras se voltam, justamente, para a pessoa hipossuficiente economicamente, em consonância aos termos da Lei 1060/50. Quanto às segundas, tornam-se presentes no momento em que se vislumbra a hipossuficiência jurídica da parte, por exemplo, no patrocínio de causas em que o acusado não constitui advogado, nos casos de curatela à lide ou, ainda, no caso de hipossuficientes organizacionais, podendo citar os consumidores, idosos, crianças e adolescentes, mulheres vítimas de violência etc.


7. Esboço histórico e cenário atual.

O acesso à ordem jurídica justa ou mesmo à Instituição da Defensoria Pública nem sempre foi assegurado ao povo brasileiro. Houve um longo processo até chegar à situação atual, uma verdadeira conquista de todos.

Na realidade, as garantias individuais no direito brasileiro surgiram com a outorga da Constituição Imperial de 25 de março de 1824, na qual já se tratava dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros, sendo que seu texto, mais precisamente, em seu artigo 179, inciso I, assegurava que “Nenhum cidadão pode ser obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma cousa (sic), senão em virtude de Lei.”

Posteriormente, a Constituição da República de 24 de fevereiro de 1891 enunciava, pela primeira vez, o direito de os acusados terem a mais plena defesa, com todos os recursos e meios essenciais a ela (artigo 179, § 16).

Entretanto, no Brasil, a assistência judiciária só foi prevista constitucionalmente através da Constituição de 1934, a qual assegurava tal direito em seu artigo 113, nos exatos termos: “a União e os Estados concederão aos necessitados assistência judiciária, criando, para esse efeito, órgãos especiais, e assegurando a isenção de emolumentos, custas, taxas e selos”.

Em momento ulterior, o direito à assistência judiciária foi suprimido do texto da Constituição Polaca, isto é, a Constituição de 1937, sendo reinserido na Constituição de 1946, no artigo 141, § 35: “O poder público, na forma que a lei estabelecer, concederá assistência judiciária aos necessitados”, bem como na Constituição de 1967 (artigo 150, § 32) e na Emenda Constitucional nº 1/69.

Como assevera Pedro Lenza[13]:

Confrontando os textos, percebe-se uma clara distinção terminológica e distintiva entre a assistência judiciária prevista nas Constituições de 1934, 1946, 1967 e EC. N.º 1/69 a atual prescrição, muito mais ampla, da garantia de assistência jurídica, integral e gratuita.

Com efeito, a Constituição Cidadã foi muito garantista a conferir direito de tal envergadura, ainda mais na amplitude em que o fez.

A propósito, confira-se a lapidar doutrina de Barbosa Moreira [14]:

“A grande novidade trazida pela Carta de 1988 consiste em que, para ambas as ordens de providências, o campo de atuação já não se delimita em função do atributo ‘judiciário’, mas passa a compreender tudo o que seja jurídico. A mudança de adjetivo qualificador da ‘assistência’, reforçada pelo acréscimo integral, importa notável ampliação do universo que se quer cobrir. Os necessitados fazem jus agora à dispensa de pagamentos e à prestação de serviços não apenas na esfera judicial, mas em todo o campo dos atos jurídicos. Incluem-se também na franquia: a instauração e movimentação de processos administrativos, perante quaisquer órgãos públicos, em todos os níveis; os atos notariais e quaisquer outros de natureza jurídica, praticados extrajudicialmente; a prestação de serviços de consultoria, ou seja, de informação e aconselhamento em assuntos jurídicos.”

No que diz respeito ao cenário atual, na qual se encontra a Instituição em testilha, pode-se dizer que há um longo caminho a ser percorrido para que se alcance sua plenitude, eis que há notícia de Estados como Goiás e Paraná em que ainda estão dando os primeiros passos em sua implantação e, ainda, Estados que insistem em manter um convênio com a Ordem dos Advogados do Brasil, o qual é, por sinal, indevido e muito caro aos cofres públicos.

Outros entes federativos, como, por exemplo, o Rio Grande do Norte, insistem na contratação precária e temporária de agentes públicos para o exercício do múnus de Defensor Público. Nesse sentido, salutar o Informativo 524 do Pretório Excelso:

Contratação Temporária de Advogado e Exercício da Função de Defensor Público

Por vislumbrar ofensa ao princípio do concurso público (CF, art. 37, II), o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, para declarar a inconstitucionalidade da Lei 8.742/2005, do Estado do Rio Grande do Norte, que dispõe sobre a contratação temporária de advogados para o exercício da função de Defensor Público, no âmbito da Defensoria Pública do referido Estado-membro. Considerou-se que, em razão de desempenhar uma atividade estatal permanente e essencial à jurisdição, a Defensoria Pública não convive com a possibilidade de que seus agentes sejam recrutados em caráter precário. Asseverou-se ser preciso estruturá-la em cargos de provimento efetivo, cargos de carreira, haja vista que esse tipo complexo de estruturação é que garante a independência técnica das Defensorias, a se refletir na boa qualidade da assistência a que têm direito as classes mais necessitadas. Precedente citado: ADI 2229/ES (DJU de 25.6.2004).ADI 3700/RN, rel. Min. Carlos Britto, 15.10.2008. (ADI-3700).

Hodiernamente, percebe-se que a atividade do próprio Defensor Público não tem sido vista sob uma perspectiva reducionista, fato que pode ser comprovado pela Lei n.º 7.347 de 1985 [15], que ampliou significamente a possibilidade do Defensor Público atuar na tutela dos Direitos Difusos e Coletivos. Tal atitude deve ser prestigiada e reiterada por todos, haja vista ser o Defensor não apenas um advogado responsável por patrocinar as causas de hipossuficientes, mas, igualmente, um agente transformador social e distribuidor de cidadania.

Decerto, sem a presença do Defensor Público, grande parcela da população estaria, inegavelmente, fada à marginalização econômica, social e política. Destarte, a cada ano, a cada comemoração do Dia Nacional da Defensoria Pública é necessário que os seus quadros contem com uma quantidade maior de Defensor Público a serviço da população, tencionando reduzir as desigualdades e injustiças.

Não obstante a nítida importância que assume esta digna Instituição, seu grande valor e ideal, certo é que a realidade concreta que se verifica nas mais distantes e interioranas comarcas do país é vergonhosa.

De fato, faltam Defensores em todos os lugares do país, não se trata de um problema de abrangência regional. Conforme pesquisa inédita produzida pela Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep), em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) ficou constatado que a déficit de Defensores Públicos em 72% das comarcas brasileiras.

Segundo informações do sítio da ANADEP: [16]

“Ainda segundo o levantamento, a Defensoria Pública está presente em apenas 754 das 2.680 comarcas distribuídas em todo o País. Dos 8.489 cargos de defensor público criados no Brasil, apenas 5.054 estão providos (59,5%). Os estados que possuem déficit de até 100 defensores são Acre, Tocantins, Amapá, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Rondônia e Sergipe; os únicos que não apresentam carência, considerando o número de cargos providos, são Distrito Federal e Roraima. O total do déficit no País, segundo o estudo, é de 10.578 defensores.” 

Esta situação nos impele a constatar que os mais pobres no Brasil, simplesmente, não têm oportunidade, não têm voz ativa e que estão, de fato, desassistidos. A democracia estaria apenas em uma realidade que não condiz com o cenário atual do país.

Corroborando esta ideia, o atual Presidente do Supremo Tribunal Federal se manifestou da seguinte forma em recente congresso na Costa Rica:

“As pessoas são tratadas de forma diferente de acordo com seu status, cor de pele e o dinheiro que têm. Tudo isso tem um papel enorme no sistema judicial e especialmente na impunidade.”

Indo de encontro aos interesses da população carente e a necessária expansão da Defensoria Pública, o atual governo federal, no dia 20/12/2012, vetou o Projeto de Lei n.º 114/11, o qual consagrava a autonomia financeira desta Instituição. Tal medida mostra-se inconcebível, mormente sob a alegação de “contrariedade ao interesse público”, pois a dita autonomia poderia ampliar significamente a força motriz da Defensoria, dispensando assim um maior atendimento e de mais qualidade a toda população. É de se questionar qual interesse público está o presente governo a tutelar.

Não deve ser visto com bons olhos as atitudes demasiadamente protecionistas do atual governo, aptas a tutelar apenas seu interesse público secundário. Como cediço, foi dado tratamento constitucional ao direito à justiça e a Defensoria Pública, por sua vez, vem despontando no cenário contemporâneo como uma das mais relevantes Instituições Públicas, a qual se compromete, definitivamente, com uma sociedade mais justa, solidária e com a concretização da democracia.

Ademais, corroborando os argumentos retromencionados, vale mencionar que a Organização dos estados Americanos (OEA), em sua 41º Assembleia Geral, realizada no período de 5 a 7 de julho, aprovou a Resolução 2656, denominada “Garantias para acesso à justiça. O papel dos defensores oficiais.” Tal ato normativo editado, envolve o acesso à justiça como um direito a ser protegido e sindicável perante o Estado.

Por todas essas razões constata-se que a Defensoria Pública é muito importante na sociedade brasileira, principalmente pelo fato de existir tanta desigualdade social. Como se não bastasse, é instrumento democrático, uma função essencial à justiça, indispensável num país como o Brasil.

A Defensoria Pública está centrada na consecução do Estado Democrático de Direito, na busca incessante de novos mecanismos de aperfeiçoamento para um modelo de Estado, no qual se atinja o quanto antes o equilíbrio entre a liberdade e a plena igualdade entre os seres que habitam esta nação e, que, finalmente, assim, possa contribuir para um ideal de oportunidades de crescimento e progresso com saúde, segurança, educação e todos os demais direitos básicos inerentes a todos os seres humanos. 


8. A Defensoria Pública no ordenamento jurídico e seu entendimento jurisprudencial.

Como ressaltado neste trabalho, a Defensoria Pública é Instituição de relevante importância, cuja missão vai ao encontro dos mandamentos constitucionais e republicanos. Ela atua diretamente com aqueles que estão desamparados e marginalizados, que não têm, muitas vezes, o que comer, o que vestir ou, ainda, condições de pagar a tarifa de ônibus ou trem.

Atento a todas essas mazelas e situação de penúria, o legislador constituinte deu um passo importante ao elencar a Defensoria Pública como uma instituição essencial à função jurisdição do Estado. Nesse sentido, confira-se o artigo 134 da Carta da República:

Art. 134. A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV.

De igual forma, laborou com êxito o mesmo legislador constituinte ao deliberar e aprovar a emenda constitucional n.º 45/2004, denominada de “Reforma do Poder Judiciário”, a qual veio a prestigiar, valorizar e reconhecer a Instituição da Defensoria Pública, dando vistas a almejar uma Instituição forte, pujante, eficaz, apta a desempenhar plenamente suas atribuições e prestando um serviço jurídico de qualidade e excelência ao necessitado. A seguir, vejam-seos parágrafos do artigo 134 da Constituição Federal alterados pela emenda retromencionada:

§ 1º Lei Complementar organizará a Defensoria Pública da União e do Distrito Federal e dos Territórios e prescreverá normas gerais para sua organização nos Estados, em cargos de carreira, providos, na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais.

§ 2º Às Defensorias Públicas Estaduais são asseguradas autonomia funcional e administrativa e a iniciativa de sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias e subordinação ao disposto no art. 99, § 2º.

A legislação a que se refere o artigo 134 é a Lei Complementar 80/94 – Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública – que tem por escopo organizar a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos territórios, além de prescrever normas gerais para a organização das Defensorias Públicas nos Estados. Durante seus quase vinte anos de existência, este diploma normativo passou por significativas mudanças, a fim de robustecer a estrutura, garantia e prerrogativas dos Defensores Públicos. Nesse sentido, vide a edição da Lei Complementar 132/09.

Por estes dispositivos constitucionais, pode-se constatar que a Defensoria Pública desponta como Instituição de relevante valor, na medida em que é essencial à função jurisdicional, o que implica afirmar que sua criação e devida implementação não estão ao mero alvitre governamental, podendo criar ou extinguir pelo singelo argumento da conveniência e oportunidade. Ao revés, a criação desta Instituição nas diversas entidades federativas é imposição constitucional, é dever, é obrigação, sendo que o governante que assim não procedeestará, inegavelmente, violando a Constituição Federal.

Nessa esteira, Lembra-se que, mesmo diante dos ditames constitucionais, no que diz respeito à criação das Defensorias Públicas pelos Estados, certo é que o Estado de Santa Catarina até o ano de 2012 não havia criado esta Instituição em seus domínios. Para que tal fato ocorresse, foi imprescindível a representação encaminhada ao Procurado Geral da República, Roberto Gurgel, na qual foram refutadas as justificativas insólitas dadas pelo Governo Catarinense.

Por fim, o Supremo Tribunal federal, entendeu, por unanimidade, que o Estado Catarinense vinha reiteradamente desrespeitando a Constituição Federal por vinte e três anos, eis que dava preferência a um modelo caro e inefetivo em detrimento do que prega a Constituição.

O informativo n.º 658 do STF esclarece devidamente esta situação, motivo pelo qual se colaciona trecho pertinente:

Defensoria pública estadual e exercício por advogados cadastrados pela OAB-SC - 1

O Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em duas ações diretas, ajuizadas pela Associação Nacional dos Defensores Públicos da União - ANDPU e pela Associação Nacional dos Defensores Públicos - Anadep, para declarar, com eficácia diferida a partir de doze meses, a contar desta data, a inconstitucionalidade do art. 104 da Constituição do Estado de Santa Catarina e da Lei Complementar 155/97 dessa mesma unidade federada. Os dispositivos questionados autorizam e regulam a prestação de serviços de assistência judiciária pela seccional local da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, em substituição à defensoria pública. De início, em votação majoritária, rejeitou-se a preliminar de ilegitimidade ativa da primeira requerente. Aduziu-se que a propositura ulterior de ação direta pela Anadep supriria a alegada deficiência. Destacou-se que a Corte possuiria jurisprudência no sentido de que a ANDPU atenderia ao requisito da pertinência temática na defesa da instituição defensoria pública. Ademais, realçou-se que a Defensoria Pública da União preencheria a ausência de defensoria pública estadual nas localidades em que ainda não implementada. Vencido o Min. Marco Aurélio, que assentava a extinção do processo alusivo à ANDPU, porquanto se discutiria a criação desse órgão em âmbito estadual.

Defensoria pública estadual e exercício por advogados cadastrados pela OAB-SC – 3

O Min. Celso de Mello registrou que o Estado de Santa Catarina incorreria em dupla inconstitucionalidade: por ação — ao estabelecer essa regra na sua Constituição e ao editar legislação destinada a complementá-la —; e, por inércia — uma vez que decorridos mais de 22 anos sem que criada a defensoria pública naquela localidade. Por outro lado, no que concerne ao art. 27 da Lei 9.868/99, o Min. Ricardo Lewandowski explicitou que o STF não obrigaria que a entidade federativa legislasse, e sim modularia temporalmente, pro futuro, a presente decisão. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio, que pronunciava a inconstitucionalidade com eficácia extunc.

Alfim, conclui-se que o entendimento esposado pelo Colendo STF quando do julgamento das ADIs 3892/SC e 4270/SC transpassa a concepção de que a Constituição deve ser tratada com seriedade e seus mandamentos devem ser, necessariamente, concretizados.

No que tange às características da Defensoria Pública no plano constitucional, elencam-se: a) função essencial à jurisdição; b) Instituição incumbida de orientação jurídica e defesa, em todos os graus, dos necessitados; c) ingresso na carreira mediante aprovação em concurso público de provas e títulos; d) garantia da inamovibilidade; e) Autonomia funcional e administrativa e iniciativa da proposta orçamentária (Defensorias Públicas dos Estados); f) vedação da advocacia fora das atribuições institucionais.

Passa-se, neste momento, a apresentar importantes constatações acerca da Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública, qual seja, Lei Complementar 80/94.

Logo em seu introito, constatam-se, por meio do artigo 1º [17],notáveis pontos que distinguem a atual redação da anterior, isto é, a Defensoria Pública passou a ser contemplada como expressão e instrumento do regime democrático, promotora dos Direitos Humanos e defensora dos direitos individuais e coletivos. Sendo assim, curial ressaltar que as atribuições da Defensoria Pública estão em franca expansão, na medida em que a própria carreira evolui. 

No que corresponde aos princípios institucionais, o artigo 3º [18] aduz quais são os três princípios fundamentais da Defensoria Pública, quais sejam, unidade, indivisibilidade e independência funcional. A unidade, nas palavras de Marília Gonçalves Pimenta, é [19]:

“[...]um todo orgânico, sob uma mesma direção, mesmos fundamentos e mesmas finalidades. Permite aos membros da Defensoria Pública substituírem-se uns aos outros. Cada um deles é parte de um todo, sob a mesma direção, atuando pelos mesmos fundamentos e com as mesmas finalidades”.

Quanto à indivisibilidade, a Defensoria Pública atua como se fosse um todo orgânico, não estando sujeita à divisão, cisão ou fracionamentos. No que se refere à independência funcional, pode-se aduzir que está garantida ao Defensor Público a atuação conforme sua convicção jurídica e entendimento que detém do texto constitucional. Dessa forma, pode agir livremente perante todos os órgãos da administração, não havendo que se falar em hierarquia diante dos demais agentes do Estado, sejam quais forem.

Dentre as funções institucionais previstas no artigo 4º da Lei Complementar 80/98, enfatiza-se a prioridade em promover a solução extrajudicial dos litígios, fato que, per se, já demonstra que a Defensoria Pública não é apenas Instituição que se restringe à assistência judiciária, mas vai além, disseminando conhecimento de direitos e deveres aos necessitados pela via extrajudicial.

Avanço significativo para a Defensoria Pública foi a introdução do inciso XXI, o qual pretendeu refutar o atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça [20], que preconiza não haver condenação em honorários advocatícios quando o devedor é o próprio ente que custeia a Defensoria. No entanto, tal entendimento do Tribunal Cidadão não deve prevalecer, porque o próprio inciso XXI enuncia ser uma das funções institucionais a possibilidade de:

XXI - executar e receber as verbas sucumbenciais decorrentes de sua atuação, inclusive quando devidas por quaisquer entes públicos, destinando-as a fundos geridos pela Defensoria Pública e destinados, exclusivamente, ao aparelhamento da Defensoria Pública e à capacitação profissional de seus membros e servidores; (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009).

Questão interessante digna de nota é a que se refere à intimação pessoal e a contagem do prazo em dobro de prazos processuais. Ambas condizem com uma prerrogativa inerente ao cargo e as atribuições do Defensor Público. Situação contraposta é a do advogado particular que oficia em processo de justiça gratuita, sendo intimado pelas vias ordinárias e com prazos simples.

Entende-se por prerrogativa os mecanismos jurídicos que possibilitam a integral defesa dos direitos dos assistidos, estão ligadas à sua função ou cargo. Já as garantias se traduzem em salvaguarda do próprio Defensor Público, livre de interferências ou pressões de quem quer que seja. Por fim, privilégio é algo que diz respeito à individualidade da pessoa e fere frontalmente o principio da isonomia previsto na Lei Maior, não podendo ser republicanamente justificado.   

A prerrogativa da intimação pessoal faz-se imprescindível, haja vista que o quadro nacional de Defensores Públicos é escasso e, por conseguinte, insuficiente para atender toda a demanda que cresce a cada dia. De outro modo haveria a perda do prazo e, consequentemente, prejuízo ao assistido, o qual não teria sua pretensão tutelada. Necessário apontar, pois, que antes de se traduzir em um privilégio ou benefício, tal prerrogativa possibilita o acesso à justiça, sendo certo que sua inobservância acarreta nulidade dos atos processuais posteriores.

Desta feita, insta salientar que nesse sentido já se manifestou o Ínclito STJ, por meio de sua Quarta Turma, através da seguinte ementa de julgamento [21]:

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PROCEDIMENTO SUMÁRIO. DEFENSORIA PÚBLICA DO DISTRITO FEDERAL. PEDIDO DE VISTA E INTIMAÇÃO PESSOAL.PRERROGATIVAS DO DEFENSOR PÚBLICO. ART. 89 DA LC n. 80/1994. NEGATIVA DO JUÍZO. VIOLAÇÃO AO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. DECRETAÇÃO DA REVELIA NA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO. IMPOSSIBLIDADE.

1. Firme no propósito de concentrar os atos processuais, oprocedimento sumário prevê a necessidade de presença do réu naaudiência de conciliação para que, primeiro, seja tentada aautocomposição da demanda e, em caso de negativa, se prossiga com aapresentação de contestação, sob pena de decretação da revelia.

2. Na hipótese, o pedido de vista dos autos pela Defensoria Pública,antes da audiência inicial, nada mais foi do que tentar garantir -em sua plenitude - a assistência à recorrente, conferindo-lhe,dentro da paridade de armas, a maior possibilidade de contrabalançara desigualdade que afeta às partes, permitindo que ambos oslitigantes tenham no processo as mesmas oportunidades de tentarinfluir na decisão da causa. A Defensoria Pública é instituiçãoestatal criada com o escopo de prestar assistência jurídica integrale gratuita aos que comprovem a insuficiência de recursos, de funçãoímpar em nosso sistema e consagrada no art. 134 da Carta daRepública.

3. Nessa linha, ciente das consequências jurídicas da audiênciainicial do rito sumário, bem como da supressão de seu direito dedefesa pelo Juízo - a Defensoria Pública foi impedida de apreciar ascircunstâncias da demanda -, não se poderia exigir conduta diversada recorrente, estando justificada sua ausência, haja vista que, sem realmente poder efetivar a defesa técnica, violado estaria o contraditório, a ampla defesa e inevitavelmente seria tida como revel.

De mais a mais, é de fácil apreensão que a Instituição vem ganhando relevância em todos os meios, seja doutrinário, jurisprudencial ou nos meios de comunicação. Deste modo, vem o STF, reiteradamente, reconhecendo o valor desta digna Instituição, a exemplo do julgamento da ADI 4.163, quando o eminente Ministro Cezar Peluso, assim se manifestou:

“É dever constitucional de o Estado oferecer assistência jurídicagratuita aos que não disponham de meios para contratação de advogado, tendo sido a Defensoria Pública eleita, pela Carta Magna, como o único órgão estatal predestinado ao exercício ordinário dessa competência.

Daí, qualquer política pública que desvie pessoas ou verbas para outra entidade, com o mesmo objetivo, em prejuízo da Defensoria, insulta a Constituição da República. Não pode o Estado de São Paulo, sob o pálio de convênios firmados para responder a situações temporárias, furtar-se ao dever jurídico-constitucional de institucionalização plena e de respeito absoluto à autonomia da Defensoria Pública”.

De igual modo, exaltando a nobre Instituição, ora objeto deste trabalho, a Ministra Rosa Weber se posicionou:

“Sem a pretensão de ser exaustiva, é possível fazer uma breve mençãoaos seguintes precedentes desta Corte:

- ADI nº 4.246/PA, da relatoria do Ministro Ayres Britto, DJe de 30.8.11, onde se diz que "A Defensoria Pública é instituição concretizadora do mais democrático acesso às instâncias decisórias do País, tanto na esfera administrativa quanto judicial”, sendo “estruturada em cargos de carreira, providos por concurso público de provas e títulos”, estruturação essa que “opera como garantia da independência técnica dos seus agentes e condição da própria eficiência do seu mister de assistência a pessoas naturais 'necessitadas'";

- ADI nº 3.028, também da relatoria do eminente Ministro AyresBritto, DJe de 01.7.10: ali se diz que o Ministério Público, como a Defensoria, é instituição que exerce função essencial à jurisdição, está autorizado a receber o produto de taxa instituída sobre atividades notariais e de registro, pois "bem aparelhar o Ministério Público é servir ao designo constitucional de aperfeiçoar a própria jurisdição como atividade básica do Estado e função específica do Poder Judiciário";

- ADI nº 291, da relatoria do Ministro Joaquim Barbosa, DJe de 10.9.10, onde se diz que "A garantia da inamovibilidade é conferida pela Constituição apenas aos magistrados, aos membros do Ministério Público e aos membros da Defensoria Pública, não podendo ser estendida aos Procuradores do Estado";

- Recurso Extraordinário nº 599.620, Segunda Turma, Ministro Eros Grau, DJe de 20.11.09: "’[a] norma de autonomia inscrita no art. 134, § 2º, da Constituição Federal, pela EC 45/04 é de eficácia plena e aplicabilidade imediata, dado ser a Defensoria Pública um instrumento de efetivação dos direitos humanos";

- ADI nº 3.700, Ministro Ayres Britto, DJe de 06.3.09: “Por desempenhar, com exclusividade, um mister estatal genuíno e essencial à jurisdição, a Defensoria Pública não convive com a possibilidade de que seus agentes sejam recrutados em caráter precário";

- ADI nº 3.569, Ministro Sepúlveda Pertence, DJe de 11.5.07: "A EC 45/04 outorgou expressamente autonomia funcional e administrativa às defensorias públicas estaduais, além da iniciativa para a propositura de seus orçamentos (…): donde, ser inconstitucional a norma local que estabelece a vinculação da Defensoria Pública a Secretaria de Estado";

- ADI nº 3.643, Ministro Ayres Britto, DJe de 16.02.07: "É constitucional a destinação do produto da arrecadação da taxa de polícia sobre as atividades notariais e de registro, ora para tonificar a musculatura econômica desse ou daquele órgão do Poder Judiciário, ora para aportar recursos financeiros para a jurisdição em si mesma" - incluindo-se nesse contexto a destinação dos recursos arrecadados à Defensoria Pública estadual;

- ADI nº 3.043, Ministro Eros Grau, DJe de 27.10.06: "O § 1º do artigo 134 da Constituição do Brasil repudia o desempenho, pelos membros daDefensoria Pública, de atividades próprias da advocacia privada”; isso porque “Os §§ 1º e 2º do artigo 134 da Constituição do Brasil veiculam regras atinentes à estruturação das defensorias públicas, que o legislador ordinário não pode ignorar";

- ADI nº 2.903, Ministro Celso de Mello, DJe de 19.9.08: "a Defensoria não pode (e não deve) ser tratada de modo inconsequente pelo Poder Público, pois a proteção jurisdicional de milhões de pessoas - carentes e desassistidas -, que sofrem inaceitável processo de exclusão jurídica e social, depende da adequada organização e da efetiva institucionalização desse órgão do Estado";

- ADI nº 3.022, Ministro Joaquim Barbosa, DJe de 04.3.05: "Norma estadual que atribui à Defensoria Pública do estado a defesa judicial de servidores públicos estaduais processados civil ou criminalmente em razão do regular exercício do cargo extrapola o modelo da Constituição Federal (art. 134), o qualrestringe as atribuições da Defensoria Pública à assistência jurídica a que se refere o artigo 5º , LXXIV".


9. Considerações finais

Ante todo o exposto, o paradigma a ser seguido não é outro, senão, considerar a dignidade da pessoa humana como valor máximo ao presente ordenamento jurídico, que congrega atributos de suprema importância e fundamental a toda população.

Deste modo, a dignidade humana deve ser o ponto central de qualquer interpretação do direito, na medida em que o antecede e o condiciona, sendo que o entendimento adverso, que venha contrariar este valor supremo deve ser, necessariamente, rechaçado, seja ele proveniente do setor público ou privado.

Hodiernamente, não há como se negar que a dignidade humana é preceito a que todo ser humano é dotado, valor moral e espiritual ínsito ao ser humano e que desponta como o de maior importância no Estado Democrático de Direito. Cuida-se de uma qualidade inerente ao homem que o diferencia dos demais seres que habitam o meio e que se dá simplesmente por sua existência não se fazendo necessário nenhum outro requisito.

Ao longo deste trabalho, pode-se certificar que a dignidade da pessoa humana se tornou a fonte legitimadora do poder estatal em Estado Democrático de Direito, bem com de toda e qualquer atuação pública, devendo permear, igualmente, o comportamento em âmbito particular. É salutar ressaltar que ao qualificar a dignidade humana como fundamento republicano, a Lei Maior estabeleceu, dessa forma, um dever geral de tutela à personalidade, que tem como conteúdo garantir que o ser humano desenvolva plenamente todas as suas potencialidades, seus desdobramentos e projeções.

Nesse contexto, avulta-se a Defensoria Pública como órgão público que por excelência concretiza a dignidade da pessoa humana e efetiva o acesso à justiça, pois, invariavelmente, dá voz aos oprimidos e os mais desfavorecidos. Não há que se falar em justiça social sem uma Defensoria Pública reconhecida e bem estruturada.

Diante de um quadro social estarrecedor, no qual impera a mais terrível desigualdade social, econômica e política não é difícil constatar quea Defensoria Pública desponta como Instituição de relevante valor, na medida em que é essencial à função jurisdicional, o que implica afirmar que sua criação e implementação não estão ao mero alvitre governamental, podendo criar ou extinguir pelo singelo argumento da conveniência e oportunidade. Ao revés, a criação desta Instituição nas diversas entidades federativas é imposição constitucional, é dever, é obrigação, sendo que o governante que assim não procede estará, inegavelmente, violando a Constituição Federal.

Certo é que não é dado a ninguém a possibilidade de descumprir a Constituição Federal, então, faz-se necessário cumpri-la em nome da dignidade da pessoa humana, em nome do acesso à justiça, para que assim se dê vida à construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a qual todos nós almejamos.


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Notas Explicativas

[1] Frase da autoria de Luiz Antônio Rizzatto Nunes

[2] Ingo Sarlet se manifesta pelo caráter relativo da dignidade humana

[3] SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.p.62.

[4] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das sucessões. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p 18.

[5] O princípio do estado social é adotado no ordenamento brasileiro como estado democrático de direito.    

[6] KRELL, Andreas Joachim. Direitos Sociais e Controle Judicial no Brasil e na Alemanha: os (des)caminhos de um direito constitucional “comparado”. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris Editor, 2002.

[7] FACHIN, Luiz Édson. Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.

[8] Resp. 1330567 (2012/0129214-0 - 27/05/2013)

[9] Artigo 5º, inciso VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;

[10] Ação Declaratória de Preceito Fundamental

[11] FABRIS, Sergio Antônio (ed.). Acesso à Justiça. Tradução Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris, 2002, p. 11-12.

[12] MEIRELLES, Hely Lopes.Direito Administrativo Brasileiro - 36ª Ed.

[13] LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo: Saraiva,2009.

[14] MOREIRA, J. C. O direito à assistência jurídica: evolução no ordenamento brasileiro de nosso tempo, RePro 67/130 

[15] Lei que disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.

[16]Associação Paulista dos Defensores Públicos

[17] Artigo 1º A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal. (Redação dada pela Lei Complementar nº 132, de 2009).

[18] Art. 3º São princípios institucionais da Defensoria Pública a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional.

[19] PIMENTA, Marília Gonçalves. Direito Penal, Direitos Humanos e Defensoria Pública: Um encontro importante. Revista de Direito da Associação dos Defensores Públicos do Estado do Rio de Janeiro. 1:293, 2002.

[20] O atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca da matéria pode ser resumido pela edição da súmula 421: Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direitogpúblicoçàjqualhpertença. 


Abstract:The value of human dignity is not absolute, given that there is nothing in the law that so be it. In fact, to live in society is necessary that social relations are permeated by limits and restrictions, and the right to have certain unflattering citizen ends when, in fact, begins the next. The value of human dignity should be seen as fundamental in land today, however, this quality does not necessarily assign the character of absolute. Certainly, one can say with conviction that the content of human dignity is confined to values ??of supreme importance, fundamental, that refer invariably to the inviolability of the human person. Human dignity must be the focal point of any interpretation of law in that it precedes and conditions. Thus, all understanding that comes counteract this supreme value must necessarily be rejected. It is not too much to say that human dignity has become the source of legitimating public performance, should permeate also the behavior under particular. The Ombudsman is the public agency that embodies the quintessential human dignity and effective access to justice, as it invariably gives voice to the oppressed and underprivileged. There is no need to talk about social justice without a Public Defender recognized and well structured. The larger scope of this institution is to secure citizenship, to which Hannah Arendt, one of the most influential political philosophers of the last century, is the right to have rights. Access to legal or even just the Institution of Ombudsman was not always assured the Brazilian people. There was a long process to reach the current situation, a real win for all. Currently, it can be seen that the Ombudsman institution emerges as a relevant value, as it is essential to the judicial function, which implies claim that its creation and implementation are not due to the mere suggestion of government. The setback, the creation of this institution in the various federal entities is constitutional imposition, it is the duty, it is the obligation, and the ruler who shall not be so, undeniably, violating the Federal Constitution. 

Keywords: human dignity; founding value of the legal system; Public Defender; access to justice.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MENEZES, André Paulo Francisco Fasolino de. A dignidade humana no século XXI e a Defensoria Pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3723, 10 set. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25265. Acesso em: 24 abr. 2024.