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Da extinção do usufruto pelo não uso, ou não fruição, do bem em que o usufruto recai

Da extinção do usufruto pelo não uso, ou não fruição, do bem em que o usufruto recai

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O usufruto está expressamente tipificado nos artigos 1.390 e seguintes do Código Civil de 2002, podendo ser definido como o direito real em que o proprietário, permanecendo na posse indireta e com poder de disposição do bem, transfere a terceiro a faculdade de usar e extrair os frutos desse bem.

Nesse sentido, tendo em vista que o usufrutuário é o titular exclusivo dos poderes de uso e fruição do bem, se obriga a determinados deveres previstos nos artigos 1.400 e seguintes do Código Civil de 2002, sob pena até de extinção do usufruto.

No caso específico do usufruto sobre bens imóveis, o usufrutuário se obriga, por força do disposto no artigo 1.228 §1º do Código Civil de 2002, a exercer seu direito em consonância com a finalidade, social e econômica, a que se destina a propriedade.

Portanto, dentre as diversas formas previstas para a extinção do usufruto, como, por exemplo, a renúncia, morte do usufrutuário, extinção da pessoa jurídica, cessão do motivo que se origina, destruição da coisa ou inobservância das obrigações legais, destaca-se nesse estudo a extinção pelo não uso ou não fruição do bem, prevista no inciso VIII do artigo 1.410 do Código Civil de 2002 (in verbis), diante da ausência de estipulação de prazo mínimo para a extinção do usufruto nessa hipótese.

“Art. 1.410. O usufruto extingue-se, cancelando-se o registro no Cartório de Registro de Imóveis:

I - pela renúncia ou morte do usufrutuário;

II - pelo termo de sua duração;

III - pela extinção da pessoa jurídica, em favor de quem o usufruto foi constituído, ou, se ela perdurar, pelo decurso de trinta anos da data em que se começou a exercer;

IV - pela cessação do motivo de que se origina;

V - pela destruição da coisa, guardadas as disposições dos arts. 1.407, 1.408, 2ª parte, e 1.409;

VI - pela consolidação;

VII - por culpa do usufrutuário, quando aliena, deteriora, ou deixa arruinar os bens, não lhes acudindo com os reparos de conservação, ou quando, no usufruto de títulos de crédito, não dá às importâncias recebidas a aplicação prevista no parágrafo único do art. 1.395;

VIII - Pelo não uso, ou não fruição, da coisa em que o usufruto recai (arts. 1.390 e 1.399).”

Assim, a doutrina tem entendido pela aplicação, por analogia, do prazo de 10 (dez) anos, reconhecendo a incidência da regra geral de prescrição do artigo 205 do Código Civil de 2002, e o lapso temporal previsto para a extinção de servidões pelo mesmo motivo, conforme previsto no inciso III do artigo 1.389 do mesmo Codex.

Esse também é o entendimento do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, conforme exposto a seguir:

"EMENTA: EXTINÇÃO DE USUFRUTO - NÃO-USO OU NÃO-FRUIÇÃO DA COISA - PRAZO - OBRIGAÇÕES DO USUFRUTUÁRIO - USO E FRUIÇÃO DA COISA EFETIVADA PELO NU-PROPRIETÁRIO - EFEITO. A extinção do usufruto pelo não uso, ou não fruição da coisa, requer um lapso temporal razoável. Na vigência do Código Civil de 1916, a doutrina majoritária entendia que este lapso de tempo, tratando-se de imóvel, seria de 15 anos. Na vigência do atual Código Civil, a doutrina se manifesta pela aplicação do prazo decenário. As obrigações impostas ao usufrutuário, inseridas nos art. 1.403, CC, são previstas em face do benefício pelo uso ou da fruição da coisa. Em outras palavras, cabe a quem se beneficia pelo uso e fruição da coisa arcar com as despesas ordinárias de sua conservação, e pagar prestações e tributos devidos pela posse ou rendimento da coisa. Destarte, uma vez que foram os nus-proprietários que usaram e fruíram da coisa, a eles cabe arcar com as despesas ordinárias de conservação dos bens, bem como o pagamento das prestações e dos tributos devidos pela posse ou rendimento da coisa. Caso contrário, haverá enriquecimento sem causa dos nus-proprietários, às custas do empobrecimento dos usufrutuários." (TJMG. Processo n.: 1.0141.07.000002-3/001. Relator: MOTA E SILVA. Data da Publicação: 02/07/2007. Extraído do site www.tjmg.gov.br)”.

"EMENTA: APELAÇÃO CIVIL. USUFRUTO. EXTINÇÃO. AUSÊNCIA DE USO E GOZO. PRAZO. CESSÃO DO EXERCÍCIO DO USUFRUTO. PAI E FILHO COMO USUFRUTUÁRIO E NU-PROPRIETÁRIO. O usufruto pode extinguir-se por prescrição ou pelo não uso do direito, no prazo da prescrição da ação real do interesse do usufrutuário. A cessão, gratuita ou onerosa, do exercício do direito de usufruto é permitida, no caso, entre o pai e o filho como usufrutuário e nu-proprietário, e caracteriza justamente a cessão do exercício do usufruto do pai em favor do filho, não a ausência do exercício pelo titular do usufruto, assim não autorizando a pretensão do nu-proprietário à extinção do direito real de usufruto pelo seu não exercício. (Apelação Cível Nº 70016049421, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Cini Marchionatti, Julgado em 23/08/2006)".

Entretanto, em recente decisão do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1179259/MG, a Ministra Nancy Andrighi entende pela inaplicabilidade da analogia acima citada, ao expor que:

“A ausência de prazo específico, nesse contexto, deve ser interpretada como opção deliberada do legislador, e não como lacuna da lei.

Assim, se, de um lado, o Código Civil preferiu não atribuir prazo determinado para configuração da hipótese em exame e, de outro lado, as relações de direito real são pautadas pelo cumprimento da função social da propriedade (seu vetor axiológico), infere-se que a extinção do usufruto pelo não uso pode ser levada a efeito, independentemente de prazo certo, sempre que, diante das circunstâncias, se verificar o não atendimento de seus fins sociais.

É nesse sentido, igualmente, o teor do enunciado n. 252, aprovado na III Jornada de Direito Civil realizada pelo Centro de Estudo Judiciário do Conselho da Justiça Federal: "a extinção do usufruto pelo não-uso, de que trata o art. 1.410, inc. VIII, independe do prazo previsto no art. 1.389, inc. III".”

Ou seja, a ilustre Ministra Ministra Nancy Andrighi, no julgamento do Recurso Especial nº 1179259/MG, entende não ser admissível a incidência, por analogia, do prazo extintivo das servidões, pois a circunstância que é comum a ambos os institutos, extinção pelo não uso, não decorre, em cada hipótese, dos mesmos fundamentos.

Assim, a extinção do usufruto pela hipótese prevista no inciso VIII do artigo 1.410 do Código Civil de 2002, não está sujeita a um prazo mínimo especifico, e sim à obrigatoriedade do usufrutuário em exercer seu direito em consonância com a finalidade social a que se destina a propriedade.


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