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A proteção patrimonial dos planos de benefícios da previdência complementar fechada

A proteção patrimonial dos planos de benefícios da previdência complementar fechada

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Abordam-se os riscos jurídicos na gestão dos regimes previdenciários, a necessidade da separação dos patrimônios dos sujeitos da relação jurídica de previdência complementar fechada, a natureza jurídica do patrimônio especial do plano de benefícios e sua proteção pela legislação.

I -Introdução:

A previdência complementar fechada no Brasil é um ramo do direito previdenciário que ainda nos dias atuais se apresenta como algo novo, em processo de descoberta pela doutrina tradicional e pela jurisprudência.

Não raras são as decisões judiciais que confundem os conceitos, a natureza jurídica das instituições, as relações intersubjetivas entre as pessoas físicas e jurídicas envolvidas e o papel do Estado na regulação e fiscalização desse regime previdenciário.

Para alguns doutrinadores a previdência complementar sequer estaria inserida no sistema de Previdência Social, embora atualmente tal afirmação não mais se justifique diante da previsão da matéria no art. 202 da Constituição Federal, que faz parte da Seção III da Previdência Social, Capítulo II da Seguridade Social e Título VIII da Ordem Social, a partir da nova redação da Emenda Constitucional nº 20/1998.

Mas a previdência complementar não é fenômeno novo no Brasil.

As primeiras entidades privadas destinadas à proteção social dos trabalhadores datam do século XIX, quando em 1835 foi criado o Montepio Geral de Economia dos Servidores do Estado – MONGERAL.

No direito infraconstitucional existe regulamentação da matéria desde o ano de 1977, com a Lei nº 6.435/77, posteriormente revogada pela Lei Complementar nº 109/2001.

A ausência de desenvolvimento do estudo científico da matéria, o que até pouco tempo também permeava o direito previdenciário como um todo, pois sequer existia disciplina própria obrigatória nas grades curriculares das faculdades de direito, muitas vezes deve-se ao fato da abordagem multidisciplinar do tema, exigindo do profissional a busca por conhecimentos não somente jurídicos, mas também nas áreas de finanças, atuária e contabilidade, o que aumenta o grau de dificuldade para o domínio da matéria.

Outro ponto fundamental para a incorreta compreensão da relação jurídica de previdência complementar é a tradição brasileira dos serviços previdenciários estar associada a um agir do Estado, em que este seria o provedor exclusivo das necessidades sociais da população, respondendo pelo custeio dos serviços e prestações previdenciárias, mesmo que, eventualmente, não existam recursos disponíveis no fundo previdenciário.

Não que se deva afastar qualquer obrigação do Estado em relação ao seu corpo social. Sempre boa a lembrança de que os objetivos de nossa República previstos na Constituição Federal estão associados à erradicação da pobreza e ao bem-estar e desenvolvimento sociais[1], sendo um dever constitucional do Estado a criação de políticas e ações destinadas a minorar os riscos sociais da população menos favorecida economicamente.

Ocorre que um Estado que tem como fundamento os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, protegendo a propriedade privada e estimulando a livre concorrência, deve também prover as condições necessárias para garantir o planejamento previdenciário de seus cidadãos, oportunizando o crescimento da qualidade de vida do segurado e de sua família.

A mudança do quadro social do Brasil nos últimos tempos, com estabilidade financeira e aumento do nível de renda da população, tem intensificado a importância da previdência complementar para a sociedade, considerando que o modelo de Estado Social (welfare state) não mais tem suportado custear sequer as necessidades mais prementes da população, como emprego, saúde, educação e segurança pública.

Essa é uma realidade mundial.

Vários países da Europa, a exemplo daqueles que integram a zona do Euro (França, Espanha, Portugal, Grécia, para ficar apenas naqueles que estão nos noticiários recentes), tem sofrido com os altos custos para a manutenção das ações sociais do Estado, o que tem exigido desses países alterar a estrutura jurídica dos seus sistemas previdenciários, seja para excluir benefícios previstos pela legislação, seja para incluir no cálculo desses benefícios um fator de proporcionalidade entre o tempo de contribuição/idade do segurado e o valor do benefício pago, ou para implementar regimes previdenciários públicos ou privados que adotem o modelo financeiro de capitalização, em substituição ao modelo de repartição, este último com altos custos sociais para sua manutenção[2].

A participação de entidades privadas na prestação de serviços previdenciários faz parte dessa evolução em busca da ampliação da proteção social dos cidadãos.

É sempre bom realçar que a participação de pessoas jurídicas de direito privado na execução dos serviços de previdência não descaracteriza o seu caráter social, considerando que esse modelo de atuação paralela de entes públicos e privados está presente em outros serviços essenciais à população, como a saúde, educação e assistência social, serviços estes que historicamente são aceitos como socialmente úteis à coletividade, de interesse público, atuando o Estado ora como agente promotor do segmento econômico, realizando atividades de fomento (concessão de isenções ou imunidades tributárias, repasse de dinheiro público para a execução de atividades de interesse público[3], etc.), ora como agente regulador e fiscalizador do sistema, nos termos do art. 174 da carta constitucional (como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado).

Ao lado dos regimes previdenciários públicos e obrigatórios, atualmente vocacionados à proteção previdenciária social básica, limitado até determinado montante pecuniário, vem crescendo a cultura da administração privada de recursos financeiros destinados a ampliar o âmbito de proteção previdenciária dos cidadãos, onde o limite do nível de proteção social é a capacidade financeira de poupança de cada integrante do corpo social.

E esse quadro de ampliação da proteção previdenciária é um movimento sem retorno. As necessidades humanas são ilimitadas. À medida que o nível social e econômico das pessoas se amplia, também se descortinam para o homem e sua família outras necessidades que o inspiram a realizar projetos pessoais e o respectivo planejamento financeiro.

Para fazer valer essa necessidade da máxima proteção social, a legislação brasileira põe à disposição dos cidadãos um sistema previdenciário de caráter paralelo, em que coexistem sistemas públicos e privados, complementares e não excludentes entre si.

A seguir, em breve resumo, o sistema previdenciário brasileiro é composto por dois subsistemas[4], os quais se desdobram em regimes previdenciários:

  • Subsistema previdenciário público, composto por: Regime Geral de Previdência Social, destinado a todos os trabalhadores que exercem atividade remunerada, correspondendo a um regime público, administrado por ente estatal (INSS) e obrigatório, aplicável independentemente do concurso da vontade do trabalhador, utilizando o regime financeiro de repartição simples (pacto solidário intergeracional); Regimes Próprios de Previdência Social, destinados aos servidores públicos efetivos da União, Estados, Municípios e Distrito Federal, também com características de um regime público e obrigatório, administrado por órgão ou entidade vinculada à pessoa política estatal, utilizando o regime de repartição simples.
  • Subsistema previdenciário privado: Regime de Previdência Complementar Fechado é um regime previdenciário privado, pois administrado por pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos (fundações privadas[5]) denominadas Entidades Fechadas de Previdência Complementar – EFPC[6] e regido por normas do direito civil, embora o contrato sofra forte regulação do Estado; de caráter facultativo, já que os possíveis participantes não são obrigados a aderir aos planos de benefícios oferecidos pelos empregadores (patrocinadores dos planos), pelas associações e cooperativas (instituidores dos planos, nos planos oferecidos aos associados ou membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial) ou pelo ente público ao qual o servidor público encontra-se vinculado (previdência complementar do servidor público). Este regime adota o regime financeiro de capitalização, em que as contribuições vertidas pelos participantes e pelos patrocinadores do plano são convertidas em ativos que, somados aos rendimentos obtidos pela aplicação desses ativos no mercado financeiro ou em razão da valorização do bem adquirido, integram os recursos que serão destinados para o pagamento dos benefícios contratados. A fonte normativa primária é o art. 202 da Constituição Federal e as Leis Complementares nº 108/2001 e nº 109/2001, editadas na mesma data (29/05/2001); Regime de Previdência Complementar Aberto, com as mesmas características descritas nos planos das EFPC, com o diferencial de que os planos são oferecidos a quaisquer pessoas físicas, indistintamente, e administrados por entidades de direito privado denominadas Entidades Abertas de Previdência Complementar – EAPC, constituídas na forma de sociedades anônimas com fins lucrativos, as quais possuem autorização da Administração Pública Federal para operar planos de benefícios previdenciários, sem a necessidade da existência de prévio vínculo jurídico entre o pretenso participante do plano e a entidade aberta. As normas básicas que regulamentam o subsistema de previdência complementar aberta constam na Lei Complementar nº 109/2001 e no Decreto-lei nº 73/66.

E dentro dessa perspectiva quadripartite das técnicas de proteção previdenciária é que deve ser entendido o sistema previdenciário brasileiro.


II - Os riscos na gestão dos regimes previdenciários:

O principal desafio de todo sistema previdenciário, seja qual for o tratamento jurídico dado aos modelos previdenciários adotados, é garantir que todos os benefícios e serviços previstos por lei ou contrato, e prometidos aos segurados e seus dependentes, sejam efetivamente fornecidos aos seus beneficiários.

A credibilidade do sistema previdenciário perante a sociedade é diretamente proporcional ao efetivo cumprimento das regras estabelecidas na lei ou no contrato previdenciário.

E como toda relação jurídica de longo prazo várias são as vicissitudes que podem incidir sobre as regras postas, que põem sob ameaça o cumprimento dos direitos subjetivos previdenciários dos cidadãos – são os riscos da proteção previdenciária.

Os riscos podem ser interpretados como o nível de incerteza associado a um acontecimento (evento) previsível ou não previsível[7].

Merece transcrição a análise do tema por Flávio Martins Rodrigues:

O tema, de imediato, remete a saber o que, afinal, é risco sob uma perspectiva de índole mais geral e também com o foco jurídico. A palavra “risco” se origina da expressão italiana riscare (essa, de sua vez, derivada do baixo latim risicu, riscu) que significa ousar, ou seja, ter uma atitude (comissiva ou omissiva) capaz de colocar-se em perigo. Essa dimensão da expressão demonstrou-se limitada, pois os riscos não derivam de atos ousados, muitos riscos são suportados em função de fatos externos, que não se pode controlar.

(...)

Como se disse, temos tido a oportunidade de refletir sobre esse tema, sobretudo com suas vinculações com os regimes de previdência. É curioso, porque as prestações previdenciárias compõem regimes voltados para atender as pessoas em situações de “risco social”. Assim, por exemplo, quando não se pode trabalhar em função de um acidente (percebe-se o auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez) ou de idade avançada (percebe-se a aposentadoria por idade), as prestações previdenciárias atuam como “seguradoras” desses riscos. Deve-se perceber que os regimes previdenciais também suportam riscos, que precisam ser aferidos e controlados.

Deve-se perceber que o risco não é um destino traçado pelos deuses, mas uma dimensão que pode ser medida, com alguma dose de acerto[8]. (...)

Na previdência complementar não é diferente. Os riscos incidentes sobre o contrato previdenciário são de diversas ordens e matizes, e põem sob ameaça a sustentabilidade financeira do plano de benefícios, sendo possível destacar como os principais entraves para o cumprimento das obrigações de natureza previdenciária:

  • riscos jurídicos: são os riscos derivados da tributação, riscos judiciais (prestação jurisdicional), riscos decorrentes da própria legislação, etc.
  • riscos econômicos: associados às alterações nos índices da economia dos países, níveis de emprego, renda, inflação, câmbio, produção, exportação e importação, etc.
  • riscos atuariais: relacionados ao cálculo matemático prévio realizado para dimensionar o montante necessário para o custeio dos benefícios e serviços previdenciários.
  • riscos demográficos: ligados aos fatores de crescimento populacional, natalidade, mortalidade, envelhecimento e migração populacional[9].

O Dicionário de Termos e Conceitos mais usados no Regime de Previdência Complementar elaborado pelo Ministério da Previdência Social[10] traz alguns conceitos de riscos que expõem o contrato previdenciário, entre os quais:

  • RISCO BIOMÉTRICO. Consiste na probabilidade passível de cálculo atuarial de perda ou ganho numa decisão de investimento ou de desvio em relação à meta atuarial.
  • RISCO DE CONTRAPARTE. Risco de um devedor ou tomador deixar de cumprir os termos de qualquer contrato com a entidade ou de outra forma deixar de cumprir o que foi acordado.
  • RISCO DE CRÉDITO. Associado à possibilidade de inadimplência por parte do agente devedor em uma operação de crédito.
  • RISCO DE LIQUIDEZ. Risco de perda resultante da falta de recursos necessários ao cumprimento de uma ou mais obrigações da entidade em função do descasamento de atribuições e aplicações.
  • RISCO DE MERCADO. Risco de que o valor de um instrumento financeiro ou de uma carteira de instrumentos financeiros se altere, em função da volatilidade das variáveis existentes no mercado, causada por fatores adversos, políticos ou outros.
  • RISCO LEGAL. Possibilidade de perdas decorrentes da inobservância de disposições legais, estatutárias e regulamentares e de procedimentos necessários à formalização de operações desenvolvidas, bem como da insolvência da contraparte em negócios realizados.
  • RISCO OPERACIONAL. Risco de perda resultante de falhas de processos internos, de pessoas ou de sistemas inadequados, ou ainda da ocorrência de eventos externos.

A presença dessas situações de risco no contrato previdenciário impõe como desafio a constante realização de estudos técnicos e a elaboração de instrumento jurídicos de proteção patrimonial dos recursos destinados ao pagamento dos benefícios, para prevenir sua ocorrência ou, no caso de resultado financeiro deficitário, a promoção de medidas visando readequar o montante de recursos garantidores disponíveis a níveis de integral cobertura dos compromissos previdenciários assumidos pelo plano.

Contornar esses riscos, superando quaisquer obstáculos que repercutam negativamente para o cumprimento das cláusulas do contrato previdenciário, é o objetivo que se busca em todo sistema de previdência complementar.

O importante é a presença constante nas EFPC da cultura da prevenção de riscos, há muito enraizada na iniciativa privada, criando instrumentos de controle interno baseado em informações atuariais, financeiras e contábeis que contribuam com o processo decisório da entidade na área de investimentos, sendo também relevante a atuação preventiva das instituições de controle externo, como a Superintendência Nacional de Previdência Complementar – Previc[11], autarquia que fiscaliza o regime fechado de previdência complementar.

No que interessa ao presente estudo, o patrimônio dos planos de benefícios de previdência complementar são submetidos a uma série de riscos jurídicos, cabendo destaque aqueles relacionados a decisões judiciais equivocadas que põem em risco a solvência financeira dos planos.


III -A necessidade da separação dos patrimônios dos sujeitos da relação jurídica de previdência complementar fechada:

Importa, neste momento, para o fim do desenvolvimento deste trabalho, tecer algumas considerações sobre o risco jurídico da utilização dos recursos que compõem as reservas de poupança individual dos participantes para a satisfação de outras obrigações, sejam aquelas contraídas pela EFPC que administra o plano de benefícios, sejam obrigações outras contraídas pelos participantes, assistidos, patrocinadores ou por outro plano de benefícios administrado pelo mesmo fundo de pensão.

É o que a doutrina especializada tem chamado de independência patrimonial dos planos de benefícios[12][13] ou, como preferimos, por representar um objeto de análise mais abrangente, de proteção ou blindagem patrimonial dos planos de benefícios, que envolve, além da separação patrimonial, a efetiva proteção legal dos recursos financeiros destinando-os a sua finalidade contratual.

O professor Wagner Balera tingiu com cores fortes a necessidade da preservação da destinação específica dos recursos financeiros vertidos aos planos de benefícios:

Em consonância com os aspectos que se entrelaçam, devem, os recursos alocados ao plano, a um só tempo, garantir a renda que cumpra a sua finalidade institucional e, também, proporcionar equilíbrio financeiro ao patrimônio coletivo.

Disso decorre que a importância vertida para o plano pertence, concomitantemente, à coletividade dos participantes e a cada pessoa individualmente considerada, nos termos contratuais, constituindo verdadeiro bem comum[14].

A doutrina clássica, representada por Orlando Gomes, já de há muito reconhece a possibilidade da existência de um patrimônio especial afetado a uma finalidade específica e sobre o qual se estabelecerão relações jurídicas.

A tese da unidade do patrimônio confunde duas noções distintas: a de patrimônio e a de personalidade. O patrimônio seria a aptidão para ter direitos e contrair obrigações, tornando-se, assim, um conceito inútil.

Contra esse subjetivismo, nascido de preocupações lógicas, levanta-se a doutrina moderna, que justifica a coesão dos elementos integrantes de uma universalidade de direito pela sua destinação comum. O vínculo é objetivo. Patrimônio será, desse modo, o conjunto de bens coesos pela afetação a fim econômico determinado. Quebra-se o princípio da unidade e indivisibilidade do patrimônio, admitindo-se um patrimônio geral e patrimônios especiais.

No patrimônio geral, os elementos unem-se pela relação subjetiva comum com a pessoa. No patrimônio especial, a unidade resulta objetivamente da unidade do fim para o qual a pessoa destacou, do seu patrimônio geral, uma parte dos bens que o compõem, como o dote e o espólio.

A ideia de afetação explica a possibilidade da existência de patrimônios especiais. Consiste numa restrição pela qual determinados bens se dispõem, para servir a fim desejado, limitando-se, por este modo, a ação dos credores[15].

No âmbito das fundações esse conceito de afetação patrimonial é algo inerente, considerando a própria expressão do Código Civil (art. 62) que “para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la”.

Não é necessário que o patrimônio seja designado no ato da instituição da fundação, mas deve haver a promessa da destinação em momento futuro, como leciona Pontes de Miranda[16]:

5. Patrimônio. A dotação de bens somente é pressuposto quanto à segurança de que esses bens podem ser aumentados e bastariam à mantença da fundação, ou quanto a virem a pertencer, com segurança, à fundação. Essa a razão por que o pressuposto está satisfeito se há promessa, que as circunstâncias tenham por promessa de adimplemento seguro.

No caso específico das fundações criadas para administrar os planos de benefícios de previdência complementar fechada, a maior parte dos recursos vertidos pelos patrocinadores e participantes é direcionado para a constituição das reservas matemáticas para pagamento de benefícios, sendo destinada apenas uma pequena parcela para o custeio do funcionamento administrativo da pessoa jurídica.

Para o custeio de outras despesas, que não as despesas de natureza previdenciária, são destinados recursos que compõem o Plano de Gestão Administrativa - PGA. Esses recursos do PGA, embora não afetados ao pagamento de benefícios, não são atualmente registrados contabilmente como patrimônio da fundação (EFPC), embora esta seja, no nosso entender, a medida mais adequada sob o aspecto formal e jurídico, considerando que não existe fundação, conforme dizer do próprio Código Civil, sem patrimônio que garanta o seu funcionamento.

Assim, podemos, em resumo, identificar na estruturação da previdência complementar, um patrimônio das entidades fechadas, formado pelo PGA e/ou demais receitas e despesas não afetadas ao pagamento dos benefícios, e o patrimônio especial pertencente ao plano de benefícios que, ao final e ao cabo, pertencem individualmente aos participantes e assistidos na proporção dos valores vertidos às contas individuais.

E essa individualização patrimonial das reservas matemáticas deve ser considerada independentemente de como se mantém estruturados os benefícios ofertados (benefício definido, contribuição definida, contribuição variável ou outras formas criadas pela legislação), já que o titular final do direito de propriedade, ou seja, quem possui personalidade jurídica para ser sujeito de direitos e obrigações em relação às prestações previdenciárias, é a pessoa física (participante, beneficiário ou assistido) e não o plano de benefícios, que é uma universalidade de direito criada para congregar subjetivamente os interesses de várias pessoas físicas que se encontram ligadas a uma relação jurídica comum (plano de benefícios), disciplinada pelo regulamento.

No estágio atual da previdência complementar busca-se solidificar a proteção dos recursos das reservas individuais para que estas não fiquem suscetíveis a decisões judiciais ou administrativas que venham a realizar atos de constrição patrimonial para pagamento de dívidas de outra natureza.

Elencamos as seguintes situações hipotéticas que podem repercutir negativamente no equilíbrio financeiro do contrato previdenciário:

  • a utilização da reserva de poupança individual dos participantes para pagamento de valores pleiteados por outros participantes do mesmo ou de plano de benefícios diverso administrado pela mesma entidade;
  • a utilização da reserva de poupança individual dos participantes para pagamento de dívidas contraídas pela entidade fechada; e
  • a utilização da reserva de poupança individual dos participantes para pagamento de dívidas contraídas pelo patrocinador.

Em todas as situações descritas parte dos recursos afetados ao pagamento dos benefícios serão direcionados ao adimplemento de obrigação de natureza diversa, reduzindo a reserva matemática individual do participante e, por consequência, o valor da futura renda mensal prevista no plano de benefícios.

Entendamos melhor a estruturação da relação jurídica de previdência complementar fechada.

A atividade de previdência complementar fechada é um serviço privado de interesse público[17].

O conceito de relação jurídica de previdência complementar gira em torno do conceito de plano de benefícios, por ser este o ponto central por onde gravitam os direitos subjetivos dos destinatários da proteção social. Um grupamento social pode ser destinatário da proteção previdenciária complementar prescindindo da criação, por iniciativa própria ou de seu empregador ou associação, de uma pessoa jurídica (EFPC), utilizando-se de uma entidade em funcionamento, mas jamais prescindirá da existência do plano de benefícios.

Plano de benefícios é o patrimônio jurídico coletivo formado pelas reservas matemáticas individuais dos destinatários da proteção social, e valores direcionados a custear o funcionamento da pessoa jurídica responsável pela gestão dos recursos financeiros, onde estarão dispostos os direitos e obrigações da coletividade tutelada em relação ao plano. A validade jurídica do plano de benefícios dependerá de prévia aprovação do seu regulamento pelo órgão supervisor e fiscalizador da previdência complementar fechada, atualmente a Superintendência Nacional de Previdência Complementar – Previc, criada pela Lei nº 12.154/2009.

A administração desse patrimônio compete a uma pessoa jurídica denominada Entidade Fechada de Previdência Complementar - EFPC, criada sob a forma de fundação civil sem fins lucrativos, que recebe licença do Estado para atuar no segmento econômico de previdência privada. Essas pessoas jurídicas podem ser criadas por empresas ou por entes estatais (fundos de pensão patrocinados), aos seus empregados ou servidores públicos[18], ou por associações e cooperativas (fundos de pensão instituídos, sem patrocínio ou aporte de recursos pelo instituidor), para os associados ou membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial.

Os participantes são os destinatários da proteção social e que figuram como parte na relação contratual. São os segurados, utilizando-se da expressão do Regime Geral de Previdência Social - RGPS. Se estiverem em gozo de benefício são denominados de assistidos. No contrato previdenciário também podem figurar os beneficiários (dependentes), que são aqueles indicados pelos participantes como destinatários da proteção social, em relação a riscos sociais que geralmente afetam o sustento da família do participante (ex: óbito e a concessão da pensão por morte). Não é demais a lembrança que, por não possuírem vinculação com o RGPS[19], o regulamento do plano de benefícios poderá não prever prestações aos beneficiários, mas apenas aos próprios participantes enquanto estiverem em vida (ex: benefício de aposentadoria).

O patrocinador é aquele que, além de promover a criação da EFPC, vincula-se ao plano de benefício por ela administrado, realizando aportes financeiros direcionados aos seus empregados. Nada impede que o patrocinador realize aportes financeiros em EFPC já existente e criada por outras pessoas jurídicas, celebrando com essa entidade fechada convênio de adesão para patrocínio de plano de benefícios específico para seus empregados.

Instituidores são aqueles que criam as entidades fechadas para que esta ofereça plano de benefícios para seus associados (ex: OABPrev), sem possuir obrigação contratual contributiva para o plano de benefícios.

O liame jurídico entre a EFPC e o patrocinador do plano de benefícios estará disciplinado no Convênio de Adesão, que é o instrumento jurídico que detalhará os direitos e obrigações do patrocinador em relação a cada plano administrado pela entidade fechada.

Uma EFPC poderá administrar um ou vários planos de benefícios, quando passa a denominar entidade de plano comum ou de multiplano, respectivamente. Neste último caso, nas entidades multiplano, os patrimônios de cada plano de benefícios permanecerão contabilmente segregados, sendo possível visualizar a individualização da poupança ou reserva individual de cada participante em relação ao plano de benefícios[20].

A EFPC será conhecida como singular, quando estiver vinculada a apenas um patrocinador ou instituidor; e como multipatrocinadas, quando congregarem mais de um patrocinador ou instituidor. Essa a dicção do art. 34 da LC 109/2001.

Já a relação jurídica entre a EFPC e os participantes em relação ao plano de benefícios estará disciplinada no regulamento. Neste instrumento jurídico estarão dispostos os direitos e obrigações das partes em relação ao plano de benefícios, os requisitos para concessão dos benefícios e a forma como os recursos serão vertidos e capitalizados no fundo. O regulamento nada mais é que um contrato previdenciário, regido pelo direito privado, mas cujo conteúdo sofrerá forte dirigismo (poder regulatório) do Estado, inclusive quanto à presença de cláusulas obrigatórias para preservar os interesses dos participantes e assistidos, a exemplo das cláusulas exigidas pelo art. 14 da LC 109/2001 (benefício proporcional diferido, portabilidade, resgate e autopatrocínio)[21].

Sob uma outra perspectiva, podemos dizer que a relação jurídica de previdência complementar é triangular[22] (participantes, patrocinadores e EFPC) e composta por uma relação jurídica prestacional (pagamento de benefícios) e uma relação jurídica de custeio (arrecadação de recursos financeiros), disciplinadas no Regulamento. A relação jurídica de patrocínio é disciplinada no Convênio de Adesão.


IV -Definição da natureza jurídica do patrimônio especial do plano de benefícios e sua proteção pela legislação:

Um sistema de proteção social será considerado exitoso se forem cumpridas integralmente as obrigações previstas em lei ou no contrato previdenciário.

No âmbito da previdência complementar o que garantirá o pagamento desses benefícios, com a concretização do princípio do pacta sunt servanda, é o planejamento atuarial e a boa gestão dos recursos que integram o plano de benefícios, com a criação de mecanismos legais e contratuais que garantam o cumprimento dos compromissos previdenciários assumidos pelo fundo de pensão.

De nada adiantaria a boa gestão dos planos de benefícios se não existisse um marco legal adequado para incentivar o crescimento da atividade de previdência complementar.

Para a segurança jurídica do sistema de previdência complementar é indispensável a existência de ambiente normativo que proteja os recursos garantidores destinados ao pagamento dos benefícios contratados.

A proteção patrimonial dos planos de benefícios deve ser realizada sobre os recursos contabilizados em nome de cada participante, afastando qualquer tentativa de destinação patrimonial para adimplemento de outras obrigações, de qualquer natureza que seja, a não ser para o pagamento das prestações contratadas.

Como visto, a relação jurídica de previdência complementar envolve a participação de pessoas físicas e jurídicas distintas, bem como um patrimônio jurídico afetado a um fim específico, destinado ao pagamento das prestações previstas no contrato previdenciário. O patrimônio do plano de benefícios é composto pelas reservas matemáticas pertencentes individualmente aos participantes e assistidos, na medida das contribuições vertidas por estes e pelos patrocinadores, deduzidas as despesas administrativas para manutenção do plano.

Parte dos recursos vertidos ao plano de benefícios é destinada à formação do patrimônio da EFPC, compondo o Plano de Gestão Administrativa – PGA, para custeio das despesas administrativas, separado do custeio das despesas previdenciárias. Das contribuições vertidas a legislação permite que até 1% do montante dos recursos garantidores do plano de benefícios, existentes no último dia do exercício a que se referir, sejam recolhidos à entidade fechada a título de taxa de administração e até 9% (nove por cento), percentual incidente sobre a soma das contribuições e dos benefícios dos planos no exercício a que se referir, a título de taxa de carregamento.

Segundo a Resolução CGPC nº 29/2009, as despesas administrativas envolvem os gastos realizados pela EFPC na administração de seus planos de benefícios e as despesas de investimentos. Integram o PGA, como possíveis fontes de custeio administrativo, além da contribuição dos participantes, assistidos e dos patrocinadores e instituidores, outras receitas como o reembolso dos patrocinadores e instituidores, o resultado dos investimentos, as receitas administrativas, o fundo administrativo, a dotação inicial, e eventuais doações.

Sempre salutar a lembrança que as EFPC, por não possuírem finalidade lucrativa, devem mensurar as fontes de custeio administrativo na proporção do seu custo operacional, sem distribuição de eventuais excedentes para seus dirigentes, invertendo eventuais sobras de caixa para a redução dos custos de funcionamento dos planos de benefícios que administra.

No tocante a essa matéria, a legislação ainda é omissa em vários pontos. Primeiro, em relação à própria possibilidade das fundações criadas para administrar planos de benefícios poderem ter patrimônio próprio contabilizado, separado dos planos de benefícios que administra. Segundo, quais seriam os limites para a formação desse patrimônio da EFPC, evitando a destinação de montante considerável para a entidade que traduzisse em atividade lucrativa, ou destinando eventuais excessos financeiros para fins diversos que não para a redução do custeio de funcionamento da entidade. Terceiro ponto, a inexistência de regramento sobre qual seria a destinação de eventuais sobras financeiras nos casos em que a EFPC não mais administre planos de benefícios, como ocorre nos casos de extinção da pessoa jurídica pelo esgotamento do seu objetivo estatutário.

Alguns autores veem no patrimônio dos planos de benefícios um condomínio especial, a exemplo da estruturação jurídica dos fundos de investimento. Temos uma certa resistência em admitir a natureza condominial para essa universalidade de bens despersonalizada denominada plano de benefícios. É que, segundo o Código Civil e a doutrina[23], o condomínio pode ser formado em decorrência de lei ou da vontade das partes (condomínio necessário ou voluntário), presumindo a existência de um patrimônio comum e um patrimônio individual de cada condômino. Ocorre que há, por força de lei, limitações ao exercício dos direitos de propriedade (uso, gozo e disposição) no caso de condomínio, quando os condôminos não podem transferi-lo a terceiros sem a anuência dos demais condôminos (nenhum dos condôminos pode alterar a destinação da coisa comum, nem dar posse, uso ou gozo dela a estranhos, sem o consenso dos outros – parágrafo único, art. 1.314 do CC), o que não ocorre nos planos de benefícios em que é possível a destinação dos recursos em benefício de terceiros (beneficiários) e até mesmo realizar a movimentação das reservas matemáticas individuais para outro plano de benefício (portabilidade) ou alterar sua destinação mediante o resgate dos valores, independentemente do concurso da vontade dos demais participantes do plano. A questão é complexa e mereceria uma maior reflexão, fugindo do objetivo deste trabalho.

Definida a separação dos patrimônios da EFPC e do plano de benefícios (universalidade de bens que reúne os patrimônios individuais dos participantes e assistidos), passa-se a discorrer sobre o atual estágio de proteção legal desse patrimônio de afetação dos planos de benefícios.

A necessidade de proteção do patrimônio formado nos planos de benefícios de previdência complementar deriva da própria Constituição Federal ao descrever no art. 202 que o regime de previdência privada será baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, não possuindo tais reservas financeiras qualquer vinculação com o contrato de trabalho eventualmente vigente entre o participante e o patrocinador do plano de benefícios[24].

Nesse sentido, precedente do Superior Tribunal de Justiça - STJ:

PREVIDÊNCIA PRIVADA. RECURSO ESPECIAL. PLANO DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. ADESÃO FACULTATIVA. PAGAMENTO DE VERBA NÃO PREVISTA NO REGULAMENTO DO PLANO E SOBRE A QUAL INCIDIA CONTRIBUIÇÃO APENAS PARA A PREVIDÊNCIA OFICIAL. DESCABIMENTO, TENDO EM VISTA SER DESPESA NÃO ABRANGIDA PELO PLANO CONTRATADO E SEM A NECESSÁRIA E CORRESPONDENTE FONTE DE CUSTEIO.

1. As entidades de previdência privada administram os planos, mas não lhes pertence o patrimônio acumulado, que é constituído com o objetivo de assegurar o custeio das despesas comuns. Portanto, a concessão de verba não prevista no contrato de adesão, em prejuízo de terceiros, é providência vedada pelos artigos 3º, I, da Lei 6.435/77 e 3º, VI, da Lei Complementar 109/2001, que impõem ao Estado proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios.

2. De fato, em relação às verbas da denominada "gratificação de produtividade" recebidas pelos trabalhadores em atividade, incidia apenas contribuição para a previdência oficial, sendo certo que não há dependência da previdência privada, que constitui regime jurídico próprio, com regramento específico. Desse modo, como o sistema de capitalização constitui pilar do regime de previdência privada, evidentemente a eventual inobservância ao equilíbrio atuarial, em contrariedade ao pactuado, colocará em risco o interesse de terceiros.

3. A imposição, pelas instâncias ordinárias, da extensão da intitulada "gratificação de produtividade", sem que houvesse a sua previsão no contrato de adesão e, por conseguinte, fosse contemplada nos cálculos atuariais - efetuados por ocasião da instituição do plano de benefício -, resultou em violação aos artigos 3º, 40 e 43 da Lei 6.435/77.

4. Recurso especial provido. (STJ. 4ª turma. REsp 1006153 / SP. 2007/0268004-2. Relator: Ministro Luis Felipe Salomão. Decisão: 02/04/2013).

De nada adiantaria a legislação prever a separação patrimonial dos bens da EFPC e dos participantes se não houvesse na legislação limitações ao uso, gozo e disposição desse patrimônio de afetação para garantir que esses recursos financeiros sejam direcionados para o fim colimado na carta magna.

Surge como premissa necessária firmar o entendimento de que a proteção patrimonial deve envolver tanto os recursos vertidos pelo patrocinador e participante na fase de acumulação dos recursos (contribuições + rendimentos dos ativos financeiros), quando ainda não há benefício concedido, quanto na fase de gozo das prestações.

A LC nº 109/2001 padeceu de certa timidez ao prever apenas no art. 34[25] que, nas entidades multiplano, aquelas que administram plano ou conjunto de planos de benefícios para diversos grupos de participantes, existiria a independência patrimonial entre planos, quando sabemos que o risco jurídico da comunicação patrimonial não somente se encontra na assunção de obrigações de um plano de benefícios em relação a outro plano de benefícios, retirando parcela dos recursos da poupança individual de uma coletividade para um ou alguns participantes de outro plano, mas também em eventuais obrigações contraídas pela EFPC e demais pessoas físicas que compõem a relação jurídica previdenciária (participantes, assistidos e patrocinadores).

A mesma Lei, em outra passagem, prescreveu que (art. 22) “ao final de cada exercício, coincidente com o ano civil, as entidades fechadas deverão levantar as demonstrações contábeis e as avaliações atuariais de cada plano de benefícios, por pessoa jurídica ou profissional legalmente habilitado, devendo os resultados ser encaminhados ao órgão regulador e fiscalizador e divulgados aos participantes e aos assistidos”, o que evidencia que cada plano de benefícios é visualizado isoladamente para fins de registro contábil e avaliação atuarial. E não poderia ser diferente já que cada plano de benefícios possui características populacionais específicas que levarão a análises técnicas e atuariais diversas, que permitirá uma estruturação financeira aderente ao perfil dos participantes, permitindo um futuro financeiro sustentável ao plano.

Em relação a eventuais outros serviços prestados pela EFPC, quando autorizado pela legislação (vide art. 76 da LC 109/2001), também é indispensável que o patrimônio previdenciário seja mantido segregado dos recursos destinados ao custeio dos serviços assistenciais à saúde e dos programas assistenciais de natureza financeira.

Na tentativa de promover a separação patrimonial dos recursos pertencentes às pessoas físicas e jurídicas envolvidas na relação jurídica de previdência complementar foi criado o Cadastro Nacional de Planos de Benefícios – CNPB (Resolução CGPC nº 14/2004) que permitiu separar os planos de benefícios administrados pela EFPC e individualizar as reservas matemáticas pertencentes a cada participante e assistido em relação ao plano de benefício como um todo, promovendo-se uma separação patrimonial sob a perspectiva contábil e administrativa.

O art. 3º do referido ato normativo previu que “cada plano de benefícios possui independência patrimonial em relação aos demais planos de benefícios, bem como identidade própria quanto aos aspectos regulamentares, cadastrais, atuariais, contábeis e de investimentos, cujos recursos de um plano de benefícios não respondem por obrigações de outro plano de benefícios operado pela mesma EFPC”.

A criação do Cadastro Nacional de Planos de Benefícios das Entidades Fechadas de Previdência Complementar - CNPB foi um avanço sob o aspecto da gestão operacional dos recursos garantidores, já que permitiu uma melhor individualização de recursos de origem diversas, principalmente se considerado o crescente mercado de fundos multipatrocinados, em que uma única entidade fechada é responsável pela gestão de vários planos de benefícios oferecidos a empregados vinculados a diversos patrocinadores.

Outro aspecto importante e que reflete na proteção jurídica do patrimônio dos planos de benefícios é a impossibilidade da realização de constrição judicial sobre os recursos garantidores para o adimplemento de outras obrigações.

Enquanto no RGPS existe dispositivo expresso (art. 114 da Lei nº 8.213/91[26]) que garante a impenhorabilidade e indisponibilidade do benefício previdenciário, na previdência complementar, por ausência de previsão legal expressa em lei especial, tem sido utilizada a previsão geral do art. 649, IV do Código de Processo Civil que estabelece a impenhorabilidade dos proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios, prestações de natureza previdenciária.

CPC:

Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:

(...)

IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3o deste artigo; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

O código civil prescreve no art. 794, quando trata do seguro de pessoas, aplicável subsidiariamente à previdência complementar, que “no seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito”, criando regra específica de impenhorabilidade e afetação patrimonial no seguro privado.

Observa-se, assim, a existência de previsão legal que impede a constrição do patrimônio dos planos de benefícios, considerando que, em última análise, os valores poupados durante longo período a título de previdência complementar é destinado a garantir a manutenção da qualidade de vida do trabalhador, após acometido dos riscos sociais protegidos pelo contrato previdenciário.

Recentes decisões judiciais do STJ, órgão jurisdicional responsável pela uniformização da legislação infraconstitucional, têm reconhecido a impenhorabilidade sobre os recursos garantidores do plano de benefícios:

PROCESSO CIVIL. PENHORA. DEPÓSITO BANCÁRIO DECORRENTE DE PENSÃO. IMPOSSIBILIDADE.

Os depósitos bancários provenientes exclusivamente da pensão paga pelo INSS e da respectiva complementação pela entidade de previdência privada são a própria pensão, por isso mesmo que absolutamente impenhoráveis quando destinados ao sustento do devedor ou da sua família.

Recurso conhecido e provido. (STJ. 4ª turma. REsp 536760 / SP. 2003/0062329-9. Relator Ministro Cesar Asfor Rocha. Decisão: 07/10/2003).

DIREITO BANCÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CONTA-CORRENTE. PROVENTOS APOSENTADORIA. RETENÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DANO MORAL CONFIGURADO.

- Não se confunde o desconto em folha para pagamento de empréstimo garantido por margem salarial consignável, prática que encontra amparo em legislação específica, com a hipótese desses autos, onde houve desconto integral dos proventos de aposentadoria depositados em conta corrente, para a satisfação de mútuo comum.

- Os proventos advindos de aposentadoria privada de caráter complementar têm natureza remuneratória e se encontram expressamente abrangidos pela dicção do art. 649, IV, CPC, que assegura proteção a “vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal”.

- Não é lícito ao banco reter os proventos devidos ao devedor, a título de aposentadoria privada complementar, para satisfazer seu crédito. Cabe-lhe obter o pagamento da dívida em ação judicial. Se nem mesmo ao Judiciário é lícito penhorar salários, não será a instituição privada autorizada a fazê-lo.

- Ainda que expressamente ajustada, a retenção integral do salário de correntista com o propósito de honrar débito deste com a instituição bancária enseja a reparação moral. Precedentes.

Recurso Especial provido.

(STJ. 3ª turma. REsp 1012915 / PR. 2007/0288591-9. Relatora Ministra Nancy Andrighi. DJe 03/02/2009).

A distinção dos patrimônios das pessoas físicas e jurídicas também tem sido reconhecida pelo STJ, como se observa pela seguinte transcrição jurisprudencial:

PROCESSUAL CIVIL. ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR. INSTITUIÇÃO PATROCINADORA. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA. PATRIMÔNIO E PERSONALIDADE JURÍDICA. AUTONOMIA. QUESTÕES SUSCITADAS NO RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.

1. Não há litisconsórcio passivo necessário do fundo de previdência complementar com a instituição patrocinadora, em face da autonomia de patrimônio e de personalidade jurídica própria do ente previdenciário. Precedentes.

2. Aplica-se o óbice previsto na Súmula n. 282/STF quando as questões suscitadas no recurso especial não tenham sido debatidas no acórdão recorrido.

3. Agravo regimental desprovido.

(STJ. 4ª turma. AgRg no Ag 1030415 / SC. 2008/0064272-5. Ministro João Otávio de Noronha. Decisão: 06/08/2009).

PREVIDÊNCIA PRIVADA. RECURSO ESPECIAL. EXTENSÃO DE ISENÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS DA PREVIDÊNCIA PÚBLICA A BENEFICIÁRIOS DE PLANO DE PREVIDÊNCIA PRIVADAQUE, DESDE A ADESÃO DOS PARTICIPANTES, PREVIA A CONTRIBUIÇÃO. INVIABILIDADE. APLICAÇÃO AO REGIME DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR DO DISPOSTO NO ART. 1º DA LEI 7.485/86. IMPOSSIBILIDADE.PREVIDÊNCIA PÚBLICA E PRIVADA COMPLEMENTAR. VÍNCULOS JURÍDICOS DE NATUREZA DISTINTA. 1. O artigo 1º, da Lei 7.485/86, restringe seu comando normativo aos "aposentados e pensionistas do Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social- SINPAS", daí porque incabível a pretendida isenção de contribuição para o âmbito do sistema de previdência privada. 2. Embora as regras aplicáveis ao sistema de previdência social oficial possam, eventualmente, servir como instrumento de auxílio à resolução de questões relativas à previdência privada complementar, na verdade são regimes jurídicos diversos, com regramentos específicos, tanto de nível constitucional, quanto infraconstitucional. 3. As entidades de previdência privada fechada administram os planos, mas não são as detentoras de seu patrimônio, que é constituído com o objetivo de assegurar o custeio das despesas comuns, de sorte que a indevida isenção de contribuição, em prejuízo de terceiros, é providência vedada pelo artigo 3º, VI, da Lei Complementar 109/2001, que impõe ao Estado proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios. 4. Recurso especial improvido. (STJ. 4ª turma. RESP 200600200485 - 814465. Relator: Luis Felipe Salomão. Decisão: 17/05/2011).

Não obstante o enorme avanço jurisprudencial quanto ao conhecimento da matéria previdência complementar no âmbito da corte especial, algumas decisões judiciais do judiciário ainda põem em risco a sustentabilidade financeira dos planos de benefícios, o que vem a exigir uma constante vigilância das entidades para a proteção do patrimônio especial afetado ao pagamento dos benefícios previdenciários.


V -Conclusões:

À guisa de conclusão, as reservas matemáticas que pertencem aos participantes dos planos de benefícios formam um patrimônio especial de afetação, vinculado ao pagamento dos benefícios previdenciários, não podendo servir de garantia ao adimplemento de qualquer outra espécie de obrigação contratual ou extracontratual (dívidas trabalhistas, tributárias, civis, etc.), seja aquela contraída pela entidade que administra o plano, seja a contraída pelos demais participantes ou patrocinadores.

A legislação atual garante a proteção patrimonial dos planos de benefícios, embora existam iniciativas embrionárias para a criação de leis específicas destinadas a regulamentar a proteção do patrimônio especial dos planos de benefícios, com o fim de evitar interpretações jurídicas em sentido contrário.

A proteção patrimonial incide não somente sobre os recursos utilizados para pagamento dos benefícios previdenciários contratados (período de gozo), mas também sobre os recursos do período de acumulação das reservas matemáticas individuais, quando as contribuições são vertidas ao plano pelos participantes e patrocinadores.

Embora atualmente não haja definição normativa sobre a possibilidade da escrituração contábil de patrimônio pertencente às EFPC, não afetados ao pagamento de benefícios, entendemos que tal medida é indispensável para a defesa da tese da independência patrimonial dos planos de benefícios, aprimorando os mecanismos de proteção do patrimônio de afetação.


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VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. Volume V. 10ª ed. São Paulo. Atlas. 2010.


Notas

[1] Constituição Federal: Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

[2] O modelo financeiro de capitalização se caracteriza pela prévia constituição de reservas para o pagamento de benefícios futuros, com base em estudos atuariais previamente realizados. Já o modelo de repartição, utilizado pela previdência pública no Brasil (RGPS e RPPS), embora os custos das prestações sejam (ou devam ser) dimensionados com base em estudo atuarial, as despesas são quantificadas para o mesmo exercício financeiro ao qual se refere, não existindo poupança prévia. Os atuais contribuintes vertem valores ao fundo previdenciário para pagamento dos atuais beneficiários (solidariedade intergeracional), enquanto no modelo de capitalização as reservas são acumuladas para pagamento dos futuros beneficiários.

[3] Exemplo clássico das entidades que compõem o terceiro setor (Ex: Sistema S, ONGs, OSCIPs, etc.).

[4] Preferimos neste trabalho utilizar a denominação de “subsistemas”, em vez de “pilares”, como usualmente utilizado pela doutrina especializada de previdência complementar, por entender a ausência de rigor científico, bem como por inexistir uma uniformidade de critérios que justifiquem a adoção dessa expressão por aqueles que adotam tal nomenclatura. Alguns autores utilizam o primeiro pilar como sendo o nível assistencial não-contributivo, outros como sendo o regime público previdenciário. Outros separam (ou não) em “pilares” diferenciados a previdência complementar aberta da previdência complementar fechada. Entendemos que a utilização da expressão subsistema público e subsistema privado, reforça o sentido de unidade que deve se dar à Previdência Social brasileira, exigindo dos estudiosos um esforço metodológico para compreendê-la como um fenômeno integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da Sociedade (utilizando a expressão do art. 194 da CF).

[5] Embora a Lei Complementar nº 109/2001 trate no seu §1º, art. 31 que as entidades fechadas de previdência complementar serão constituídas sob a personalidade jurídica de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos, com o advento do Código Civil apenas é possível sua criação sob a forma de fundação, considerando que a natureza jurídica das sociedades passou a ter um tratamento no art. 981 do estatuto civil como sendo aquelas pessoas jurídicas que exercem atividade econômica (sociedades empresárias), o que contraria a ausência de finalidade lucrativa desses entes previdenciários. Então, consideremos que as entidades fechadas são constituídas como fundação de direito privado, sem fins lucrativos, com o traço diferencial de que a fiscalização e a supervisão não será exercida pelo Ministério Público como previsto no art. 66 do Código Civil, mas pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar – Previc, conforme art. 72 da Lei Complementar nº 109/2001 (compete privativamente ao órgão regulador e fiscalizador das entidades fechadas zelar pelas sociedades civis e fundações, como definido no art. 31 desta Lei Complementar, não se aplicando a estas o disposto nos arts. 26 e 30 do Código Civil e 1.200 a 1.204 do Código de Processo Civil e demais disposições em contrário). O artigo transcrito da LC 109/2001 fazia referência aos artigos do revogado Código Civil de 1916, razão pela qual deve o dispositivo ser interpretado segundo o novo panorama normativo do direito civil.

[6] No Brasil, essas EFPC também ficaram conhecidas como fundos de pensão, certamente sob a influência do pension funds do direito norte-americano.

[7] ASSAF NETO, Alexandre. Mercado Financeiro. 10ª Ed. São Paulo. Atlas. 2011. Página 238.

[8] RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar e os Riscos de Natureza Jurídica. In Revista de Previdência nº 9. Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Faculdade de Direito. Centro de Estudos e Pesquisas no Ensino do Direito (CEPED). Rio de Janeiro. Gramma. 2010. Páginas 95 a 114.

[9] Na verdade, esses riscos demográficos influenciam diretamente no cálculo atuarial elaborado em relação a cada plano de benefícios ou, no caso do subsistema público, os próprios regimes previdenciários. Exemplo ilustrativo é o do envelhecimento da população e sua repercussão nos regimes previdenciários que adotam o modelo financeiro de repartição. Nesses casos, com o passar do tempo, menor número de pessoas passará a contribuir para o sistema, o que exigirá, com o passar dos anos, um maior aporte no custeio pelo Estado.

[10] Acesso pelo endereço eletrônico http://www.mpas.gov.br/arquivos/office/3_111006-094552-172.pdf

[11] A Previc tem atuado na área de fiscalização com base na Supervisão Baseada em Riscos. A SBR “verifica a exposição a riscos e os controles sobre eles exercidos, atua de forma prudencial sobre as origens dos riscos e induz uma gestão proativa das entidades. A análise e avaliação das adversidades e das oportunidades, observadas em cenários futuros, contribuem para a formação de uma visão ampla do sistema de previdência complementar fechado e do ambiente em que este se insere, visando assim a estabilidade e a solidez do sistema” (in Guia Previc - Melhores Práticas em Fundos de Pensão). Acesso http://www.previdencia.gov.br/arquivos/office/3_101112-163932-055.pdf.

[12] TÔRRES, Maurício Corrêa Sette e FILHO, Ivan Jorge Bechara Filho. Independência Patrimonial dos Planos de Previdência Complementar. In Revista de Previdência nº 5. Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Faculdade de Direito. Centro de Estudos e Pesquisas no Ensino do Direito (CEPED). Rio de Janeiro. Gramma. 2006. Páginas 03 a 30.

[13] MESSINA, Independência Patrimonial dos planos de benefícios das entidades fechadas de previdência complementar: uma realidade! Fundos de Pensão – aspectos jurídicos fundamentais (Organizador: Adacir Reis). São Paulo. ABRAPP/ICSS/SINDAPP. 2009. Páginas 137 a 159.

[14] BALERA, Wagner. Sistema da seguridade social. 4ª edição. São Paulo. Ltr. 2006. Página 80.

[15] GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 11ª edição. Rio de Janeiro. Forense. 1995. Página 203.

[16] MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. Tomo I. Campinas. Bookseller. 2000. Página 528.

[17] PULINO, Daniel. Previdência Complementar - Natureza jurídico-constitucional e seu desenvolvimento pelas entidades fechadas. São Paulo. Conceito Editorial. 2011. Pg. 222.

[18] A criação de fundos de pensão para a concessão de benefícios de previdência complementar para os servidores públicos foi uma inovação da EC 20/98 que alterou o art. 40 da CF (§§ 14, 15 e 16) para prever a possibilidade das entidades públicas limitarem os benefícios concedidos aos seus servidores em valor equivalente ao valor-teto do salário-de-benefício pago pelo RGPS aos trabalhadores da iniciativa privada.

[19] A autonomia da previdência privada fechada em relação ao RGPS é apenas uma faculdade legal, o que não impede a presença no regulamento do plano de benefícios de exigência contratual que condicione a concessão do benefício complementar à concessão prévia do benefício pelo regime público previdenciário. Em uma situação específica essa relação de dependência se realiza obrigatoriamente, no caso previsto no art. 3º, II da LC 108/2001, a qual condiciona a concessão do benefício pela EFPC com patrocínio público a anterior concessão de benefício pelo regime de previdência ao qual o participante esteja filiado por intermédio de seu patrocinador, quando se tratar de plano na modalidade benefício definido, instituído depois da publicação da referida Lei Complementar.

[20] Esta é uma realidade que, na prática atual, apenas está sendo aplicada nos planos de benefícios com modelagem de contribuição definida, em que os valores das poupanças individuais são individualizados. Em relação aqueles planos de benefícios modelados como benefício definido, em razão da característica mutualista, em que os recursos são carreados para um fundo de socialização dos riscos, não é feita essa individualização das reservas, embora cremos seja possível, considerando que assim ocorre nas situações de saída do participante do plano no momento do resgate da sua reserva matemática.

[21]  Art. 14. Os planos de benefícios deverão prever os seguintes institutos, observadas as normas estabelecidas pelo órgão regulador e fiscalizador: I - benefício proporcional diferido, em razão da cessação do vínculo empregatício com o patrocinador ou associativo com o instituidor antes da aquisição do direito ao benefício pleno, a ser concedido quando cumpridos os requisitos de elegibilidade; II - portabilidade do direito acumulado pelo participante para outro plano; III - resgate da totalidade das contribuições vertidas ao plano pelo participante, descontadas as parcelas do custeio administrativo, na forma regulamentada; e IV - faculdade de o participante manter o valor de sua contribuição e a do patrocinador, no caso de perda parcial ou total da remuneração recebida, para assegurar a percepção dos benefícios nos níveis correspondentes àquela remuneração ou em outros definidos em normas regulamentares.

[22] CAZETTA, Luís Carlos. O regime jurídico das entidades fechadas. Porto Alegre. Sergio Fabris editora. 2006.

[23] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. Volume V. 10ª ed. São Paulo. Atlas. 2010. Página 339.

[24] Essa ausência de vinculação entre o contrato previdenciário e o contrato de trabalho em algumas situações é apenas parcial, já que a própria legislação em algumas situações exige que para a retirada ou transferência dos recursos (resgate, portabilidade e benefício proporcional diferido) haja a rescisão do vínculo laboral. Vide Resolução CGPC nº 06/2003.

[25]  Art. 34. As entidades fechadas podem ser qualificadas da seguinte forma, além de outras que possam ser definidas pelo órgão regulador e fiscalizador:

        I - de acordo com os planos que administram:

        a) de plano comum, quando administram plano ou conjunto de planos acessíveis ao universo de participantes; e

        b) com multiplano, quando administram plano ou conjunto de planos de benefícios para diversos grupos de participantes, com independência patrimonial;

        II - de acordo com seus patrocinadores ou instituidores:

        a) singulares, quando estiverem vinculadas a apenas um patrocinador ou instituidor; e

        b) multipatrocinadas, quando congregarem mais de um patrocinador ou instituidor.

[26] Lei nº 8.213/91: Art. 114. Salvo quanto a valor devido à Previdência Social e a desconto autorizado por esta Lei, ou derivado da obrigação de prestar alimentos reconhecida em sentença judicial, o benefício não pode ser objeto de penhora, arresto ou seqüestro, sendo nula de pleno direito a sua venda ou cessão, ou a constituição de qualquer ônus sobre ele, bem como a outorga de poderes irrevogáveis ou em causa própria para o seu recebimento.


Autor

  • Allan Luiz Oliveira Barros

    Allan Luiz Oliveira Barros. Procurador Federal da Advocacia-Geral da União. Atuou na Procuradoria Federal junto a Superintendência Nacional de Previdência Complementar - Previc. Membro da Câmara de Recursos da Previdência Complementar (CRPC). Mestrando em Direito e Políticas Públicas pela UNICEUB. Máster en Dirección y Gestión de Planes y Fondos de Pensiones pela Universidade de Alcalá, Espanha. Pós-Graduado em Direito Constitucional e Direito Previdenciário. Professor de Cursos de Pós-Graduação em Direito Previdenciário e da Escola da Advocacia-Geral da União. Editor do site www.allanbarros.com.br

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BARROS, Allan Luiz Oliveira. A proteção patrimonial dos planos de benefícios da previdência complementar fechada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3808, 4 dez. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25986. Acesso em: 27 abr. 2024.