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Do auxílio reclusão

Do auxílio reclusão

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Expõem-se diversas críticas ao regime jurídico atual do auxílio reclusão, abordando questões referentes ao critério de concessão, causa de suspensão e presunção de dependência econômica.

INTRODUÇÃO

O benefício previdenciário de auxílio-reclusão possui escassa produção doutrinária, fato esse que provavelmente ocorre pela pequena expressão econômica do benefício.

Inicialmente foi analisado o conceito de Ordem Social e a inserção da Seguridade Social como um de seus objetivos.

Nesta esteira, estudou-se o conceito de Seguridade Social e seus princípios informativos.

O capítulo terceiro cuida da evolução histórica e legislativa do benefício, enfocando os aspectos nos quais se evidencia o aumento da proteção social e outros nos quais se demonstra a franca involução do benefício.

No capítulo quarto, analisaremos o benefício em face do ordenamento jurídico atual, explicitando todos os requisitos do auxílio-reclusão sob o enfoque da doutrina e da jurisprudência.

No último capítulo, trataremos da análise da regra matriz e sua aplicação ao benefício auxílio-reclusão, enfocando todos os seus critérios, sob o antecedente e o conseqüente normativo.

Procuramos dar enfoque principalmente quanto às principais discussões na jurisprudência a respeito deste benefício, visando contribuir para fomentar o debate jurídico, sem, obviamente, ter a pretensão de esgotar o tema.


 

AUXÍLIO RECLUSÃO

CAPÍTULO I - DA ORDEM SOCIAL

A Constituição da República ao tratar da ordem social, declara que esta tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça social.

Conforme adverte JOSÉ AFONSO DA SILVA, “neste particular, a ordem social se harmoniza com a ordem econômica, já que esta se funda também na valorização do trabalho e tem como fim (objetivo) assegurar a todos a existência digna, conforme os ditamente da justiça social...”. 1

A ordem social, juntamente com o título dos direitos e garantias fundamentais, forma o núcleo básico do regime democrático.

A seguridade social, como instrumento de concretização da democracia e como fundamento de uma sociedade justa e solidária, vem tratada por nossa Carta Magna dentro do título da Ordem Social.

LUÍS ANDRÉ MARTINS afirma que “a existência de um modelo de seguridade social se apresenta pela indicação de ordenamento jurídico que demonstre preocupação com o atendimento das necessidades dos indivíduos. Esse procedimento se afirma com a previsão de projetos amplos, que visem evitar a interrupção ou a renda de ingresso dos cidadãos, por meio de benefícios mantidos pelo Estado que, nestas hipóteses, mantenham a renda da pessoa, assegurando um nível mínimo para a sobrevivência humana”. 2

Ao tratar dos direitos sociais, MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, ensina que “como as liberdades públicas, os direitos sociais são direitos subjetivos. Entretanto, não são meros poderes de agir – como é típico das liberdades públicas de modo geral – mas sim poderes de agir. São direitos “de crédito”.

Conclui o autor que “há, sem dúvida, direitos sociais que são antes poderes de agir. (...) Mas assim mesmo quando a eles se referem, as Constituições tendem a encará-los pelo prisma do dever do Estado, portanto, como poderes de exigir prestação concreta por parte deste”. 3

Daí é correto se dizer que o direito à Seguridade Social pode ser visto como um direito subjetivo público.


CAPÍTULO II - A SEGURIDADE SOCIAL

2.1. Conceito

“A preocupação com o dia de amanhã nasce com a própria humanidade. Ao escolher um local para se abrigar ou guardar o alimento para o dia seguinte, os primeiros homens já estavam se precavendo para a situação de dificuldade pela falta de recursos ou impossibilidade de trabalho. Era, porém, um sistema rudimentar da autopreservação, baseado na poupança” 4.

Segundo vaticina o art. 1º da Lei de Organização e Custeio da Seguridade Social, “A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade destinadas a assegurar o direito relativo à saúde, à previdência social e à assistência social”.

A Seguridade Social, inserida no título VIII da Constituição da República, tem como base o primado do trabalho e como objetivos o bem-estar e a justiça social.

Miguel Horvath Junior afirma que “sob a ótica do critério finalístico através da seguridade social o Estado fica obrigado a garantir que nenhum de seus cidadãos fique sem ter satisfeitas suas necessidades sociais mínimas. Não se trata apenas da necessidade de o Estado fornecer prestações econômicas aos cidadãos, mas também, do fornecimento de meios para que o indivíduo consiga suplantar a adversidades, quer seja prestando assistência social ou por meio da prestação de assistência sanitária”.

Com efeito, vaticina o art. 194 da Constituição da República: “A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinados a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”.

Dessa forma, a seguridade social é um instrumento de política social cuja finalidade é a prevenção dos riscos sociais e eliminação das necessidades sociais que atingem os atores sociais.

Tal sistema protetivo, no entanto, no mundo fenomênico, não é amplo e irrestrito, embora sua finalidade seja a proteção de todas as contingências sociais desfavoráveis. Sofrem limitações e condicionamentos, decorrentes da evolução social, selecionando aquelas pessoas que necessitam de maior proteção, dentro das possibilidades financeiras do sistema de seguridade social e dentre estas distribuindo as prestaço, dentro das possibilidades financeiras do sistema de seguridade social e dentre estas distribuindo as prestaões de acordo com suas necessidades.

2.2. Princípios Constitucionais da Seguridade Social

Conforme ensina Celso Antonio Bandeira de Mello, “princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico normativo.” 5

Por seu lado, J.J. CANOTILHO, assevera que princípios são normas que exigem a realização de algo, da melhor forma possível, de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas. 6

Todos os princípios da Seguridade Social decorrem do valor constitucional da solidariedade, sem o qual não é possível estabelecer-se os alicerces do Sistema de Seguridade Social.

WAGNER BALERA, enfatiza que “o elemento motor da seguridade social é a solidariedade que, nessa instituição, adquire profunda conotação jurídica. É curial que sejam mais solidários os que enfrentam os mesmos problemas e dificuldades porque mais de perto sentem os seus efeitos”. 7

ALMANSA PASTOR ensina que o princípio da solidariedade, como princípio fundamental da relação jurídica de seguridade social “devem cumprir, como todo princípio básico de relação jurídica, uma dupla função endógena e exógena. A primeira, endógena, atuando como o interior da relação, como aglutinante e veículo de coesão dos elementos relacionais. Constitui algo assim como o substrato capaz de entrelaçar as relações jurídicas instrumentais contidas. A segunda, exógena, reduto frente ao exterior, individualiza e distingue especificamente a relação jurídica frente a outras de contornos similares”. 8

Ensina o mesmo autor que a solidariedade permite ser classificada em atenção a múltiplos critérios:

a) Em relação ao tipo de interação: cabe uma solidariedade direta, com determinação concreta das partes interativas e uma solidariedade indireta, na qual a interação se realiza com desconhecimento mútuo e indeterminação das partes;

b) Em relação aos sujeitos: interpessoal, que relaciona duas ou mais pessoas entre si o em relação a todos os membros de um determinado grupo e intergrupal, em que a solidariedade se coletiviza e se refere a dois ou mais grupos;

c) Em relação à motivação da fonte: se classifica em ética ou moral, imposta pela ciência ou princípios morais e normativa ou jurídica, estabelecida coercitivamente pelo Direito;

d) Em relação à extensão material: se classifica em total, se abarca todos os valores das partes em interação e parcial ou especial, se compreende algum valor concreto e determinado (econômico, político, religioso etc.);

e) Em relação ao âmbito que se desenvolve, permite tanta variedade quanto os grupos sejam detectáveis, desde a solidariedade familiar até a solidariedade nacional ou universal.

Manoel Alonso Olea, afirma que a sistemática de redistribuição de renda “fazem da Seguridade Social um sistema poderoso e eficaz de solidariedade social”. O mesmo autor faz um elenco dos processos de redistribuição de renda, classificando-os quanto à sua operatividade em três modos distintos:

“a) redistribuindo os recursos de cada um, bem como os de sua família ao largo de sua vida, de forma que durante sua atividade consiga prover-se para o período de inatividade futura;

b) redistribuindo os recursos entre aqueles que os têm, em um período determinado, e os que não os têm, no mesmo período, ou seja, do empregado ao desempregado, do sano ao enfermo;

c) redistribuindo os recursos (nesse caso, típico dos chamados sistemas de repartição, nos quais o dinheiro que entre hoje sai hoje mesmo para atender ao financiamento dos encargos presentes) aos indivíduos das gerações presentes para atender às necessidades de gerações passadas, esperando-se que os recursos das gerações futuras atendam, quando chegar o momento, às necessidades das gerações atuais”. 9

O art. 194, parágrafo único e o art. 195, § 5º da Constituição da República, relacionam os princípios imanentes à saúde, assistência e previdência social, a saber:

2.2.1. Universalidade da cobertura e do atendimento.

Conforme ensina IONAS DEDA GONÇALVES, “Esse princípio representada a própria idéia de Seguridade Social, tal como concebida no Relatório Beveridge, que defendia um sistema que protegesse o cidadão do berço ao túmulo, contra todas as situações de necessidade social. É um vir a ser, um ideal, uma meta do Sistema, que deverá ser perseguida pelo legislador. Tem dupla dimensão: subjetiva e objetiva. A dimensão subjetiva refere-se à universalidade do atendimento. O sistema deve ser acessível a todos que se encontrem em situação de necessidade. A universalidade da cobertura representa o aspecto objetivo: todas as situações provocadoras de necessidade social, que de alguma forma afetem a dignidade da pessoa humana, o bem-estar e a justiça sociais, devem estar cobertas pelo Sistema, na forma da lei”. 10

2.2.2. Uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais.

A seguridade social deve alcançar todas as pessoas residentes no Brasil.

WAGNER BALERA afirma que “a discriminação a que se achava sujeita a população rural apenas agravava a questão social.

É certo que ela se prendia a um estágio da proteção social.

Mas, ninguém pode negar que, entre outras conseqüências nefastas, essa discriminação excluiu, por largo tempo, o trabalhador rural de qualquer tipo de proteção social. ”11

A cobertura constitui na previsão de atendimento, enquanto está é a concretização dele.

2.2.3. Seletividade e Distributividade.

Segundo MIRIAN VASCONCELOS FIAUX HOVATH, “a diretriz da seletividade permite a realização, de legítima estimativa acerca do tipo de prestações que, em conjunto concretizem as finalidades da Ordem Social. Interessante observar que a seletividade não é incompatível com o ideal da universalidade da cobertura. A seletividade deve ser entendida como adaptação à busca da universalidade, na medida em que deve ser observada na montagem e evolução do sistema de seguridade social a capacidade econômica do estado”. 12

WAGNER BALERA, assevera que “a seletividade, fixando o rol de prestações, e a distributividade, definindo o grau de proteção devido a cada um, são corolários da isonomia em tema de seguridade social”. 13

Para o autor, “a distributividade consiste na identificação daqueles bens que, mais do que por um direito próprio do indivíduo, são devidos por serem comuns, como sabiamente expressa São Tomás de Aquino”. 14

Portanto, por este princípio, a lei deverá regular as prestações e os serviços segundo a possibilidade do sistema de seguridade.

Cabe ao legislador selecionar as prestações e também os beneficiários de modo a possibilitar ou a aumentar a distribuição dos serviços e benefícios sociais. Assim, uma vez que não é possível estender os benefícios a todos os contribuintes, a Constituição admite que a lei eleja quais aqueles que serão contemplados com a proteção, fazendo a distribuição da proteção social, uma vez que nem todos possuem o mesmo grau de necessidade.

2.2.4. Irredutibilidade do valor dos benefícios

O princípio da irredutibilidade do valor dos benefícios tem por escopo a manutenção do poder real de compra, evitando-se que o poder de comporá do cidadão fique comprometido em decorrência da inflação.

Este princípio pode ser visto sob duas vertentes. A primeira é que a expressão pecuniária do benefício não pode ser diminuída, salvo nas hipóteses legais que se permite dedução de parcelas dos benefícios para fazer frente às obrigações legais ou contratuais do beneficiário, tais como, o desconto de pensão alimentícia, a consignação de valores pagos indevidamente pelo INSS e o desconto para pagamento de empréstimo consignado. A segunda vertente é a recomposição patrimonial do valor do benefício, ou seja, o restabelecimento do valor de compra do benefício.

O Supremo Tribunal Federal fixou entendimento segundo o qual não pode haver redução do valor nominal do benefício, mas a ausência de correção do valor não implica ofensa ao princípio.

Não conjugamos desse entendimento, uma vez que a adoção desse posicionamento poderá dar ensejo às perdas reais do poder de compra do benefício.

2.2.5. Equidade na forma de participação no custeio

Este princípio é uma das facetas do valor constitucional da isonomia e por ele mede-se a justa proporção entre as quotas com que cada um dos sujeitos obrigados a custear o sistema se seguridade social deve contribuir para seu equilíbrio.

Sua finalidade é a busca do ideal de justiça, segundo a capacidade contributiva e o equilíbrio entre os participantes do sistema. Significa também que todos os membros da sociedade devem participar do financiamento do sistema de seguridade, de acordo com sua capacidade contributiva, a luz do que vaticina o art. 145, § 1º, da Constituição.

2.2.6. Diversidade da base de financiamento

Considerando a progressividade existente no princípio da equidade na forma de participação no custeio, a Constituição traz a lume o princípio da diversidade na base de financiamento, justamente para que todos os atores sociais e o Estado contribuam para o sistema.

Diz o art. 195, da Carta Magna que “A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:

a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;

b) a receita ou o faturamento;

c) o lucro;

II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201;

III - sobre a receita de concursos de prognósticos;

IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar.

Ademais disso, a lei poderá instituir outras fontes de custeio destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, nos termos do que vaticina o parágrafo 4º do citado art. 195.

Essas novas fontes de custeio devem ser criadas por meio de lei complementar e não podem ter o mesmo fato gerador ou base de cálculo de tributos já existentes.

2.2.7. Caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartide, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do governo nos órgãos colegiados.

Considerando a solidariedade imanente ao sistema de seguridade social, e os fundamentos democráticos do Estado Brasileiro, a gestão e composição dos órgãos deve se dar de forma igual para todos os membros.

A participação da sociedade concretiza-se com a instituição dos Conselhos Nacionais de Previdência e Assistência Social e da Saúde.

Conforme lembra MIRIAM VASCONCELOS FIAUX HORVATH, “em um Estado Democrático este princípio ganha relevo especial. A participação de toda sociedade leva a uma aproximação maior entre Governo e a comunidade. Assim, a discussão das necessidades sociais sai do campo abstrato. Ninguém melhor que o representante da comunidade, que vive na comunidade para dizer quais são as necessidades concretas, quais são os reais anseios que devem ser atendidos pelo Poder Público”. 15

2.2.8. Princípio da Contrapartida

A par dos princípios constantes do elenco do caput art. 194 da Constituição da República, o art. 195, em seu parágrafo 5º, traz a regra da contrapartida, que dispõe que Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.

O professor Wagner Balera, entende que se trata de um princípio virtual e em sua obra A Seguridade Social na Constituição de 1988, escreve que: “Impondo regra de conduta ao legislador, a Lei das Leis garante um permanente equilíbrio financeiro ao esquema protetivo que nela se acha concebido”.

O mesmo autor ensina, ainda, que “a regra da contrapartida, grafada pela primeira vez na Emenda nº 1, de 17 de outubro de 1969, faz parte do ideário básico sem o qual seria de todo inconcebível qualquer sistema de proteção que tivesse buscado inspiração no modelo alemão do seguro social. Por conseguinte, sempre esteve, implicitamente pelo menos, presente em nosso direito constitucional positivo.

Ninguém poderia supor que o ordenamento jurídico autorizasse o descompasso entre metas a serem atingidas e recursos disponíveis. Tal anomalia acabaria desnaturando o modelo que, mesmo em trânsito para a forma superior da seguridade, não se pode furtar à estrita conotação que deve existir entre receita e despesa, elementar para que qualquer seguro seja seguro.

Dir-se-ia, pois, que a fórmula da contrapartida é limitação constitucional contra os abusos que o Poder Legislativo, seduzido pela demagogia (notadamente nos anos eleitorais), viesse a cometer, mediante a criação de prestações que não tivessem previsão das respectivas receitas de cobertura.”

Trata-se de norma de garantia de sustentação econômica do sistema, sem a qual as atuais e futuras gerações ficariam ao desamparo social.


CAPÍTULO III - EVOLUÇÃO HISTÓRICA E LEGISLATIVA

Segundo MIRIAM VASCONCELOS FIAUX HORVATH, “o Mongeral Previdência Privada criado pelo Decreto da Regência em 10 de janeiro de 1835 como Montepio Geral de Economia dos Servidores do Estado foi a primeira iniciativa oficial para estabelecer a previdência no Brasil. Segundo consta de estudo de reconstrução histórica feito por Fernando Mota, citado por Manuel Soares Povoas, a Mongeral efetuou o primeiro pagamento de auxílio-reclusão no país” 16.

A primeira vez que o benefício de auxílio-reclusão foi previsto na legislação previdenciária brasileira, ocorreu em 1933, pelo Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos, criado por meio do decreto nº 22.872/33.

Com efeito, previa o art. 63 do citado Decreto:

Art. 63. O associado que não tendo família houver sido demitido do serviço da empresa, por falta grave, ou condenado por sentença definitiva que resulte perda do emprego, e preencher todas as condições exigidas neste decreto para a aposentadoria, poderá requerê-la, mas esta só lhe será concedida com metade das vantagens pecuniárias a que teria direito se não houvesse incorrido em penalidade.

Parágrafo único. Caso o associado esteja cumprido pena de prisão, e tiver família sob sua exclusiva dependência econômica, a importância da aposentadoria a que se refere este artigo será paga ao representante legal de sua família, enquanto perdurar a situação de encarcerado.

Com a regulamentação do Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Bancários – IAPB, criado pelo Decreto nº 54 de 1934, o benefício mais uma vez foi aclamado, ainda que se restringisse a uma parcela pequena da população. Dizia o art. 67 do Decreto nº 54/34:

Art. 67. Caso o associado esteja preso, por motivo de processo ou em cumprimento de pena, e tenha beneficiário sob sua exclusiva dependência econômica, achando-se seus vencimentos suspensos, será concedida aos seus beneficiários, enquanto perdurar essa situação, pensão correspondente à metade da aposentadoria por invalidez a que teria direito, na ocasião da prisão.

A Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS), Lei nº 3.807/1960, que ampliou o leque de segurados da previdência no Brasil, previa o benefício de auxílio-reclusão em seu art. 43:

Art. 43. Aos beneficiários do segurado detento ou recluso, que não perceba qualquer espécie de remuneração da empresa e que houver realizado no mínimo 12 (doze) contribuições mensais, a previdência social prestará auxílio-reclusão na forma dos arts. 37, 38, 39 e 40 desta Lei.

§ 1º O processo de auxílio-reclusão será instruído com certidão do despacho da prisão preventiva ou sentença condenatória.

§ 2º O pagamento da pensão será mantido enquanto durar a reclusão ou detenção do segurado, o que será comprovado por meio de atestados trimestrais firmados por autoridade competente.

Nesta época, o benefício era pago ao seguinte conjunto de segurados:

I - a esposa, o marido inválido, os filhos de qualquer condição quando inválidos ou menores de 18 (dezoito) anos, as filhas solteiras de qualquer condição, quando inválidas ou menores de 21 (vinte e um) anos;

II - o pai inválido e a mãe;

III - os irmãos inválidos ou menores de 18 (dezoito) anos e as irmãs solteiras, quando inválidas ou menores de 21 (vinte e um) anos.

O segurado podia designar uma pessoa que viva sob sua dependência econômica, inclusive a filha ou irmã maior, solteira, viúva ou desquitada.

A pessoa designada apenas fazia jus à prestação do benefício na falta dos dependentes enumerados no item I e se por motivo de idade, condições de saúde ou encargos domésticos, não pudessem angariar meios para o seu sustento.

Nesta época, a existência de dependentes de quaisquer das classes excluía do direito à prestação todos os outros das classes subseqüentes e a pessoa designada excluía os das classes II e III.

Mediante declaração escrita do segurado, os dependentes da classe II poderiam concorrer com a esposa ou o marido inválido, ou com a pessoa designada, salvo se existirem filhos com direito à prestação.

Desde esta época, a dependência econômica das pessoas da classe I era presumida e a das demais deveria ser comprovada, não tendo direito à prestação o cônjuge desquitado, ao qual não tenha sido assegurada a percepção de alimentos nem a mulher que se encontrasse na situação prevista no artigo 231 do Código Civil.

Para percepção do benefício era necessário o período de carência mínimo equivalente a 12 (doze) meses de contribuição.

O valor do benefício correspondia a 50% do valor da aposentadoria que o segurado percebia ou que teria direito, havendo um acréscimo de 10%, por beneficiário, até o máximo de cinco dependentes.

O valor mínimo da pensão não poderia ser inferior a 50% da aposentadoria.

Posteriormente, com a edição da Consolidação das Leis da Previdência Social, criada pelo Decreto nº 77.077, de 24 de janeiro de 1976, o benefício de auxílio-reclusão passou a ter a seguinte conformação, nos termos do art. 63:

Art. 63. O auxílio-reclusão será devido, após 12 (doze) contribuições mensais e nas condições dos artigos 56 a 59, aos dependentes do segurado detento ou recluso que não perceba qualquer espécie de remuneração da empresa.

§ 1º - O requerimento de auxílio-reclusão será instruído com certidão do despacho de prisão preventiva ou da sentença condenatória.

§ 2º - O pagamento será mantido enquanto durar a reclusão ou detenção do segurado, o que será comprovado por meio de atestados trimestrais de autoridade competente.

Para a percepção do benefício pelos dependentes, o segurado deveria ter vertido para o sistema ao menos 12 contribuições, nos mesmos termos do que dispunha a Lei Orgânica da Previdência Social de 1960.

Igualmente, como na LOPS/60, o valor do benefício correspondia a 50% do valor da aposentadoria que o segurado percebia ou que teria direito, havendo um acréscimo de 10%, por beneficiário, até o máximo de cinco dependentes.

Quanto aos beneficiários a CLPS de 1976 trazia o seguinte elenco:

I - a esposa, o marido inválido, a companheira mantida há mais de 5 (cinco) anos, os filhos de qualquer condição menores de 18 (dezoito) anos ou inválidos e as filhas solteiras de qualquer condição menores de 21 (vinte e um) anos ou inválidas;

II - a pessoa designada, que, se do sexo masculino, só poderá ser menor de 18 (dezoito) anos ou maior de 60 (sessenta) anos, ou inválida;

III - o pai inválido e a mãe;

IV - os irmãos de qualquer condição menores de 18 (dezoito) anos ou inválidos e as irmãs solteiras de qualquer condição menores de 21 (vinte e um) anos ou inválidas.

Equiparavam-se aos filhos, nas condições do item I, mediante declaração escrita do segurado, o enteado, o menor que, por determinação judicial, se ache sob sua guarda, menor que se ache sob sua tutela e não possua bens suficientes para o próprio sustento e educação.

Caso inexistisse esposa, ou marido inválido, com direito às prestações, a pessoa designada poderia, mediante declaração escrita do segurado, concorrer com os filhos deste.

Se o segurado não fosse civilmente casado, era considerada tacitamente designada a pessoa com quem ele se tenha casado segundo rito religioso.

O segurado podia, mediante declaração escrita, fazer com que os dependentes da classe III concorressem com esposa, a companheira ou o marido inválido, ou com a pessoa designada, salvo se existissem filhos com direito às prestações.

O segurado podia ainda, designar companheira que viva na sua dependência econômica, mesmo não exclusiva, quando a vida em comum ultrapasse 5 (cinco) anos.

A companheira designada concorria com os filhos menores havidos em comum com o segurado, salvo se houvesse expressa manifestação deste em contrário.

A existência de dependente de qualquer das classes dos itens I e II excluía do direito às prestações os das classes subseqüentes.

A dependência econômica das pessoas da classe I era presumida e a das demais deve ser comprovada.

Não fazia jus às prestações o cônjuge desquitado sem direito a alimentos, nem o que voluntariamente tenha abandonado o lar há mais de 5 (cinco) anos, ou que, mesmo por tempo inferior, o tenha abandonado e a ele se recusasse a voltar, desde que essa situação houvesse sido reconhecida por sentença judicial transitada em julgado.

Posteriormente, com a nova edição da Consolidação das Leis da Previdência Social pelo Decreto nº 89.312 - de 24 de janeiro de 1984, o benefício não sofreu qualquer alteração, a teor do art. 45, que dispunha:

Art. 45. O auxílio-reclusão é devido, após 12 (doze) contribuições mensais e nas condições dos artigos 47 a 52, aos dependentes do segurado detento ou recluso que não recebe qualquer remuneração da empresa.

§ 1º O requerimento do auxílio-reclusão deve ser instruído com certidão do despacho da prisão preventiva ou da sentença condenatória.

§ 2º O pagamento é mantido durante a detenção ou reclusão do segurado, comprovada por meio de atestado trimestral de autoridade competente.

O valor do benefício e devido ao conjunto dos dependentes era constituído de uma parcela familiar de 50% (cinqüenta por cento) do valor da aposentadoria que ele recebia ou a que teria direito se na data do seu falecimento estivesse aposentado, mais tantas parcelas de 10% (dez por cento) do valor da mesma aposentadoria quantos forem os seus dependentes, até o máximo de 5 (cinco).

O cônjuge que, embora desquitado, separado judicialmente ou divorciado, estivesse recebendo alimentos, tinha direito ao valor da pensão alimentícia judicialmente arbitrada, e somente o restante era destinado à companheira ou ao dependente designado.

Os beneficiários eram:

I - a esposa, o marido inválido, a companheira mantida há mais de 5 (cinco) anos, o filho de qualquer condição menor de 18 (dezoito) anos ou inválido e a filha solteira de qualquer condição menor de 21 (vinte e um) anos ou inválida;

II - a pessoa designada, que, se do sexo masculino, só pode ser menor de 18 (dezoito) anos ou maior de 60 (sessenta) anos, ou inválida;

III - o pai inválido e a mãe;

IV - o irmão de qualquer condição menor de 18 (dezoito) anos ou inválido e a irmã solteira de qualquer condição menor de 21 (vinte e um) anos ou inválida.

Equiparavam-se a filho, nas condições do item I, mediante declaração escrita do segurado, o enteado; o menor que, por determinação judicial, se acha sob sua guarda; o menor que se acha sob sua tutela e não possui bens suficientes para o próprio sustento e educação.

Caso inexistisse esposa ou marido inválido com direito às prestações, a pessoa designada podia, mediante declaração escrita do segurado, concorrer com os filhos deste.

Se o segurado não fosse civilmente casado, era considerada tacitamente designada a pessoa com quem ele se casou segundo rito religioso, presumindo-se feita a declaração de designação de dependentes.

Mediante declaração escrita do segurado, os dependentes do item III podiam concorrer com a esposa, a companheira ou o marido inválido, ou a pessoa designada, salvo se existisse filho com direito às prestações, caso em que cabia àqueles dependentes, desde que vivessem na dependência econômica do segurado e não fossem filiados a outro regime previdenciário.

O marido ou companheiro desempregado era considerado dependente da esposa ou companheira segurada, para efeito de assistência médica.

O segurado podia ainda designar a companheira que vivia sob sua dependência econômica, mesmo não exclusiva, desde que a vida em comum ultrapassasse cinco anos.

A companheira designada concorria com os filhos menores havidos em comum com o segurado, salvo se existisse expressa manifestação deste em contrário.

Não fazia jus às prestações o cônjuge desquitado, separado judicialmente ou divorciado sem direito a alimentos, nem o que voluntariamente abandonou o lar há mais de 5 anos ou que, mesmo por tempo inferior, o abandonou e a ele se recusa a voltar, desde que essa situação tivesse sido reconhecida por sentença judicial transitada em julgado.

A existência de dependentes das classes I e II excluía do direito às prestações os das classes seguintes e a dependência econômica das pessoas da classe I era presumida e a das demais devia ser provada.

O benefício de auxílio-reclusão veio a ter assento constitucional primeiramente na Constituição da República de 1988, que em sua redação primitiva assim dispunha:

Art. 201. Os planos de previdência social, mediante contribuição, atenderão, nos termos da lei, a:

I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte, incluídos os resultantes de acidentes do trabalho, velhice e reclusão;

Com base no ordenamento constitucional então vigente, adveio a Lei 8.213/1991, que tratou o benefício da seguinte forma:

Art. 80. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.

Parágrafo único. O requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo recolhimento à prisão, sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação de declaração de permanência na condição de presidiário.

Na redação original da Lei 8.213/1991, eram considerados dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

II - os pais;

III - o irmão, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

IV - a pessoa designada, menor de 21 (vinte e um) anos ou maior de 60(sessenta) anos ou inválida.

Equiparavam-se a filho, nas condições do item I, mediante declaração do segurado: o enteado; o menor que, por determinação judicial, esteja sob a sua guarda; e o menor que esteja sob sua tutela e não possua condições suficientes para o próprio sustento e educação.      

A lei 9.032/95 deu nova redação ao art. 16 da Lei 8.213/91, promovendo alterações quanto os dependentes da classe I e III e excluiu os dependentes da classe IV. Com efeito, passando os itens I e III a contar com a seguinte redação:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

(...)

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

Na redação original da Lei 8.213/91, equiparavam-se a filho, mediante declaração do segurado: o enteado; o menor que, por determinação judicial, esteja sob a sua guarda; e o menor que esteja sob sua tutela e não possua condições suficientes para o próprio sustento e educação.

Posteriormente, a Lei 9.528/97, imprimiu nova redação ao § 2º, do art. 16 da Lei 8.213, que passou a contar com a seguinte redação:

§ 2º. O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.

A atual legislação considera companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.

A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes e a dependência econômica das pessoas da classe I é presumida, devendo as das demais ser comprovada.

O valor do benefício, nos termos do que disciplinava o art. 75, em sua redação original era de:

Art. 75. O valor mensal da pensão por morte será:

a) constituído de uma parcela, relativa à família, de 80% (oitenta por cento) do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou a que teria direito, se estivesse aposentado na data do seu falecimento, mais tantas parcelas de 10% (dez por cento) do valor da mesma aposentadoria quantos forem os seus dependentes, até o máximo de 2 (duas).

 b) 100% (cem por cento) do salário-de-benefício ou do salário-de-contribuição vigente no dia do acidente, o que for mais vantajoso, caso o falecimento seja conseqüência de acidente do trabalho.

A lei 9.032/95, deu nova redação ao art. 75, promovendo alterações no valor do benefício, que passou a ter a seguinte conformação:

Art. 75. O valor mensal da pensão por morte, inclusive a decorrente de acidente do trabalho, consistirá numa renda mensal correspondente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício, observado o disposto na Seção III, especialmente no art. 33 desta lei.

Posteriormente, a Lei 9528/97, promoveu nova modificação ao art. 75:

Art. 75. O valor mensal da pensão por morte será de cem por cento do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data de seu falecimento, observado o disposto no art. 33 desta lei.

A reforma constitucional ocorrida em 1998, que resultou na promulgação da Emenda Constitucional nº 20 de 16 de dezembro de 1998, alterou a disciplina jurídica do benefício. O artigo 201 da Constituição da República passou a contar com a seguinte redação:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:

(...)

IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;

O art. 13 desta Emenda Constitucional, entendeu como segurados de baixa renda aqueles que:

Art. 13 - Até que a lei discipline o acesso ao salário-família e auxílio-reclusão para os servidores, segurados e seus dependentes, esses benefícios serão concedidos apenas àqueles que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais), que, até a publicação da lei, serão corrigidos pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social.

Atualmente, por força da Portaria MPS nº 822 de 12 de maio de 2005, esse valor foi atualizado para R$ 623,44.

A última alteração sofrida no benefício foi aquela imposta pela lei 10.666/2003, que assim dispôs:

 Art. 2º O exercício de atividade remunerada do segurado recluso em cumprimento de pena em regime fechado ou semi-aberto que contribuir na condição de contribuinte individual ou facultativo não acarreta a perda do direito ao recebimento do auxílio-reclusão para seus dependentes.

 § 1º O segurado recluso não terá direito aos benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria durante a percepção, pelos dependentes, do auxílio-reclusão, ainda que, nessa condição, contribua como contribuinte individual ou facultativo, permitida a opção, desde que manifestada, também, pelos dependentes, ao benefício mais vantajoso.

§ 2º Em caso de morte do segurado recluso que contribuir na forma do § 1º, o valor da pensão por morte devida a seus dependentes será obtido mediante a realização de cálculo, com base nos novos tempos de contribuição e salários-de-contribuição correspondentes, neles incluídas as contribuições recolhidas enquanto recluso, facultada a opção pelo valor do auxílio-reclusão.

Conclui-se da exposição acima que o benefício de auxílio-reclusão passou por inúmeras modificações, que resultaram em evolução e involução da proteção social.

A Lei Orgânica da Previdência Social de 1960, passou a garantir o benefício a uma maior gama de trabalhadores e seus dependentes, independentemente da categoria profissional.

A Consolidação das Leis da Previdência Social de 1977, ampliou o rol de beneficiários, embora mantivesse as demais características do benefício.

Por sua vez, a Consolidação das Leis da Previdência Social de 1984, promoveu tímida modificação no benefício, pois se diferenciou do regime anterior apenas pelo fato de ter incluído o marido desempregado da segurada empregada para fins de assistência médica.

Percebe-se que houve significativa evolução quando a Lei 8.213/91 deixou de exigir o requisito da carência, e aumentou o coeficiente do valor do benefício para 80%.

No entanto, esse texto legal impôs significativa redução nos beneficiários do auxílio-reclusão.

A Lei 9.032/95 aumentou o coeficiente do benefício para 100%, mas imprimiu nova redução no número de benefícios.

Por seu lado, a Lei 9.528/97, diminuiu o número de beneficiários, ao excluir o menor sob guarda.

A Emenda Constitucional nº 20/98, foi o texto que mais retrocesso impôs ao sistema protetivo da Seguridade Social, ao garantir o benefício de auxílio-reclusão apenas aos dependentes do segurado de baixa renda.

Por fim, a Lei 10.666/03 ampliou as garantias sociais, ao disciplinar que o exercício de atividade remunerada pelo segurado não retira de seus dependentes o direito ao benefício de auxílio-reclusão, além do que, imprimiu tratamento mais vantajoso no caso de conversão do benefício em pensão por morte.


CAPÍTULO IV - O BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-RECLUSÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO ATUAL

 

4.1. Conceito

No contexto legislativo atual o auxílio-reclusão pode ser conceituado como o benefício de prestação continuada substituto do rendimento do trabalhador ou aposentado, devido ao conjunto de dependentes do segurado de baixa renda recolhido à prisão.

Partindo-se da análise deste conceito, extraem-se seus elementos de definição.

O primeiro ponto a ser enfocado é que o auxílio reclusão é um benefício de prestação continuada devido exclusivamente aos dependentes do segurado.

A finalidade do benefício é a proteção social à família e o móvel de sua existência. Conforme lembra Wagner Balera, citando Pierre Laroque: “não se pode conceber uma seguridade social do indivíduo que não seja uma seguridade social familiar”.17

Seu fundamento remoto está no art. 5º, XLV, da Constituição da República que preleciona que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado”.

Em um verdadeiro sistema de seguridade social não é admissível que uns arquem com as conseqüências dos atos ilícitos de outros.

Se foi a própria sociedade, através de seus representantes, que elegeu quais seriam as condutas humanas antijurídicas e definiu a pena pela prática de tal conduta, ofende ao Estado Democrático de Direito que essa pena ou mesmo seus efeitos recaiam sobre pessoas que em nada contribuíram para a conduta socialmente reprovável.

Portanto, para que se evite a situação de necessidade social, caracterizada pelo desamparo dos que dependiam economicamente daquele segurado recolhido à prisão, justifica-se a existência do benefício.

Apesar do nome “auxílio-reclusão”, o benefício não é devido apenas para aquelas situações nas quais se impôs pena de reclusão. Também é devido em caso de penas de detenção, prisão simples, imposição medida de segurança ou internação, prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente.

A lei, também, não distingue entre prisão provisória e definitiva, penal ou administrativa.

Quanto ao regime de cumprimento da pena, considera-se para o deferimento do benefício aquela cumprida em regime:

a) fechado: aquele sujeito à execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média; ou

b) semi-aberto: aquele sujeito à execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar.

Portanto, não se defere prestação a quem esteja em livramento condicional ou cumpra sua pena em regime aberto, assim entendido aquele cuja execução da pena seja em casa de albergado ou estabelecimento adequado.

4.2. Beneficiários

Têm direito a essa prestação os dependentes de qualquer das espécies de segurados da Previdência Social. A prestação, tal qual a pensão por morte, é devida, em caráter de exclusividade, aos dependentes, pois não faria sentido conceder benefício previdenciário, em razão de cometimento de crimes, a quem se encontra preso, pois assim, se estaria premiando aquele que se comporta em desconformidade com as regras de conduta social.

Segundo estabelece o Plano de Benefícios da Previdência Social, nos termos do que vaticina o art. 16 da Lei 8.212/91:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;       

II - os pais;

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

§ 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.

§ 2º .O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.       

§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada mantém união estável com o segurado, ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.

§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.

Por força da análise deste artigo, têm-se quais são os beneficiários da prestação previdenciária de auxílio-reclusão.

A legislação estabeleceu três classes de dependentes, sobrepostas de forma hierárquica.

Os dependentes de uma mesma classe concorrem entre si em igualdade de condições e excluem do direito às prestações os das classes seguintes.

Na classe I, a legislação abarca o cônjuge, o companheiro e o filho menor de 21 anos, não emancipado ou inválido. São equiparados a filho o enteado e o menor tutelado.

Por cônjuge, deve ser entendida a união matrimonial de pessoas do sexo oposto, na forma da lei civil. A atual lei de benefícios não faz distinção quanto ao sexo, como acontecia no ordenamento até então vigente e que não havia sido recepcionado pela Constituição da República de 1988.

No regime anterior, o cônjuge varão somente tinha direito à prestação se fosse inválido. Na sistemática atual, marido e mulher podem ser dependentes um do outro, desde que sejam segurados da Previdência Social.

Companheiro, segundo a definição legal, é a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o §3º do art. 226 da Constituição Federal, que dispõe que “para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.

Conforme adverte IONAS DEDA GONÇALVES, “uma leitura precipitada desse conjunto de dispositivos poderia levar à conclusão de que apenas as situações de união entre pessoas sem impedimento para o matrimônio sejam consideradas. Não se pode tomar essa assertiva como absoluta, pois assim estariam excluídas hipóteses, muito comuns, de pessoas que se separam de fato e constituem nova família, sem desfazimento formal do vínculo anterior. Nesse caso, a jurisprudência do extinto TFR, cristalizada no enunciado 159 de sua Súmula, firmou o entendimento de que cônjuge e companheira concorrem em condições de igualdade, se ambas preenchem os requisitos para a concessão de benefício previdenciário”.18

A jurisprudência tem ampliado significativamente o rol de dependentes do Regime Geral de Previdência Social.

Com efeito, por força da Ação Civil Pública nº 2000.71.00.009347-0, que tramitou perante a 3ª Vara Previdenciária de Porto Alegre/RS, o INSS se viu compelido a conceder o benefício também ao companheiro ou companheira homossexual, em que pese a Constituição da República, em seu art. 226, fruto do constituinte originário, ter reconhecido apenas a união entre homem e mulher.

Não obstante isso, até mesmo atendendo a critérios de isonomia, o INSS integrou referida decisão no âmbito interno, sendo certo que é possível, a percepção do benefícios pelo companheiro ou companheira homossexual mediante requerimento administrativo.

Esse posicionamento é salutar, tendo em vista que a finalidade, tanto da norma constitucional, como da legislação previdenciária é a proteção à família, e o processo de mutação constitucional acabou por definir que o conceito de família deve ter uma interpretação muito mais abrangente do que a literalidade do texto constitucional.

Ainda se inserem como dependentes da classe I, os filhos.

Por força do comando do art. 227, §6º, da Carta Magna, atualmente não mais existem diferenças entre filhos, cabendo tratamento isonômico entre todas as espécies de filhos conceituadas pelo revogado Código Civil de 1916.

Para que possam ser considerados dependentes, os filhos devem ser menores de 21 anos, não importando a redução da maioridade civil imposta pela edição do novo Código Civil.

Existem ainda, algumas decisões judiciais garantindo o direito ao filho menor de 24 anos, desde que esteja matriculado em curso de nível superior ou escola técnica de segundo grau, de ser considerado como dependente. Nesse sentido:

TRF 2ª REGIÃO - AC 197037 - SEXTA TURMA - Data da decisão: 26/06/2002 - DJU DATA:21/03/2003 – REL. JUIZ ANDRE FONTES – M.V.

PENSÃO POR MORTE. FILHO MAIOR DE IDADE. ESTUDANTE UNIVERSITÁRIO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. CARÁTER ALIMENTAR.

I - Filho de segurado da previdência social faz jus à pensão por morte até os vinte e quatro anos de idade, desde que comprovado o seu ingresso em universidade à época em que completou a maioridade e a dependência econômica, a fim de assegurar a verdadeira finalidade alimentar do benefício, a qual engloba a garantia à educação.

II – Devido à natureza alimentar, não há argumento que justifique conferir à pensão por morte uma aplicação diversa da que é atribuída aos alimentos advindos da relação de parentesco, regulada pelo Direito Civil, sendo certo que nesta seara vigora o entendimento segundo o qual o alimentando faz jus a permanecer nesta condição até os 24 (vinte e quatro) anos de idade se estiver cursando faculdade.

III – É preciso considerar o caráter assecuratório do beneficio, para o qual o segurado contribuiu durante toda a sua vida com vistas a garantir, no caso de seu falecimento, o sustento e o pleno desenvolvimento profissional de seus descendentes que, se vivo fosse, manteria com o resultado de seu trabalho, por meio do salário ou da correspondente pensão.

IV – Recurso provido.

Essa discussão surgiu em razão de que a legislação do Imposto de Renda permite que sejam considerados como dependentes os filhos até 24 anos desde que esteja matriculado em curso de nível superior ou escola técnica de segundo grau (art. 77, § 2º, do Decreto nº 3.000/99) e a partir daí, alguns magistrados passaram a entender que o escopo protetivo da legislação previdenciária deveria alcançar também as pessoas nessa condição.

No nosso entender, não age com acerto essa corrente, uma vez que ainda que a discussão tenha sentido na legislação tributária, no campo previdenciário não é assim, uma vez que fere o princípio da tipicidade além de estender o benefício sem indicar a respectiva fonte de custeio, em afronta a regra da contrapartida. Nesse sentido:

TRF 1ª REGIÃO - AG 01000111175 - PRIMEIRA TURMA - Data da decisão: 10/06/2003 - DJ DATA: 23/06/2003 PAGINA: 111 – REL. DESEMBARGADOR FEDERAL EUSTAQUIO SILVEIRA – V.U.

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. PENSÃO TEMPORÁRIA. FILHA MAIOR DE 21 ANOS. RECEBIMENTO DA PENSÃO ATÉ A CONCLUSÃO DO CURSO SUPERIOR. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. REFORMA DA DECISÃO.

1. Em caráter excepcional, poderá ser concedida a tutela antecipada, inaudita altera pars, se presentes os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, bem como a prova inequívoca e a verossimilhança a alegação, em decisão devidamente fundamentada (Agravo Regimental no Agravo Regimental na Medida Cautelar 2000/0020613-0, Relator Min. Paulo Gallotti, Segunda Turma, DJ I de11/09/2000, pg. 231, RSTJ, Vol. 135, p. 198).

2. O provimento jurisdicional que está sujeito ao duplo grau de jurisdição é a sentença (art. 475 do CPC).

3. Dispondo a Lei nº 8.112/90 que a maioridade de filho, aos 21 (vinte e um) anos de idade, acarreta perda da qualidade de beneficiário (art. 222, IV), não encontra guarida no texto legal o pedido de continuidade do recebimento de pensão temporária após o atingimento da idade limite prevista na lei, ainda que seja o beneficiário estudante universitário.

4. Ausente a verossimilhança da alegação, há de ser indeferido o pedido de antecipação de tutela.

5. Agravo de instrumento provido.

Além disso, essa corrente jurisprudencial não se apercebeu que agindo dessa forma atenda contra o princípio da igualdade, pois o benefício não pode ser concedido a pessoas que estão na mesma situação jurídica: ser menor de 24 anos de idade.

O fator de discrímen utilizado, qual seja, estar matriculado em curso de nível superior ou escola técnica de segundo grau, não guarda qualquer razoabilidade, proporcionalidade ou coerência, com o direito a ser garantido, qual seja, a proteção familiar dos filhos do segurado recolhido ao cárcere.

Também não são considerados dependentes os filhos emancipados.

A emancipação pode ser de três espécies (artigo 5.º, parágrafo único, do Código Civil): voluntária, judicial e legal.

a) Emancipação voluntária

Aquela decorrente da vontade dos pais. A idade mínima para a emancipação é 16 anos. Antes da vigência do atual sistema, a emancipação voluntária só poderia acontecer a partir dos 18 anos, porém hoje, por questão teleológica, a emancipação voluntária cai automaticamente para 16 anos.

A concessão da emancipação é feita pelos pais, ou de qualquer deles na falta do outro, como já era previsto pela própria Lei de Registros Públicos.

A emancipação só pode ocorrer por escritura pública, através de um ato unilateral dos pais reconhecendo que o filho tem maturidade necessária para reger sua vida e seus bens. O atual sistema é mais rígido que o anterior que autorizava a emancipação por escritura particular. O inciso I, do parágrafo único, do artigo 5.º foi expresso ao exigir o instrumento público. A escritura é irretratável e irrevogável para não gerar insegurança jurídica.

Hoje a jurisprudência é tranqüila no sentido de que os pais que emancipam os filhos por sua vontade não se eximem da responsabilidade por eles.

b) Emancipação judicial

É aquela decretada pelo juiz. O menor sob tutela só poderá ser emancipado por ordem judicial, tendo em vista que o tutor não pode emancipar o tutelado. O procedimento é regido pelos artigos 1103 e seguintes do Código de Processo Civil com participação do Ministério Público em todas as fases. A sentença que conceder a emancipação será devidamente registrada (artigo 89 da Lei 6.015/73).

c) Emancipação legal

Decorre de certos fatos previstos na lei (exemplos: casamento, estabelecimento do menor com economia própria, recebimento do diploma de curso superior etc.).

Qualquer que seja a idade, o casamento emancipa os menores. É um ato previsto em lei, que culmina na emancipação. No caso de casamento nulo, os efeitos da emancipação não serão válidos, voltando os menores à condição de incapazes. O casamento nulo putativo, para o cônjuge de boa-fé também produz uma emancipação válida.

Se inválidos os filhos, de qualquer idade, farão jus ao benefício. No entanto, a incapacidade deve ser verificada anteriormente ao filho completar 21 anos de idade.

Além disso, paira discussão na jurisprudência sobre o direito ao benefício do menor sobre guarda.

Tal discussão surgiu em nossos Tribunais uma vez que antes da Medida Provisória nº 1.523/96, reeditada até a conversão na Lei 9.528/97, que alterou a redação do § 2º do art. 16 da Lei 8.213/91, também o menor sob guarda, por determinação judicial, era previsto como equiparado a filho. Com a omissão dessa figura na nova redação do dispositivo legal, o INSS passou a entender que o menor sob guarda não mais podia ser enquadrado como dependente do segurado.

Nos termos do que vaticina o art. §2º do art. 16 supra mencionado, tais dependentes possuem posição privilegiada sobre os demais e são qualificados pela doutrina como preferenciais.

Sua dependência econômica é presumida, salvo quanto ao enteado e ao menor tutelado, que devem comprová-la.

Neste ponto, se estabeleceu séria controvérsia doutrinária a respeito da presunção de dependência econômica dos dependentes da classe I.

Para MIGUEL HORVATH JÚNIOR, “Só se poderia falar em presunção relativa se a prova da inocorrência de dependência econômica fosse causa de perda da qualidade de dependente, o que não ocorre no nosso sistema legislativo. A atual previsão legislativa que presume a dependência econômica na classe 1 sofre críticas. Melhor seria a lei exigir de todos os dependentes comprovação da dependência econômica, suprindo a presunção de dependência. Isso evitaria sérias distorções como, por exemplo, aquela em que o segurado falece deixando cônjuge em plena possibilidade de auto-sustento e pais que dependiam economicamente dele. Neste caso, conquanto o cônjuge sobrevivente não dependesse economicamente do segurado falecido é ele que tem direito à pensão por morte em detrimento dos pais do “de cujos”.19

No entanto, a questão pode ser analisada sobre outro prisma.

A lei, ao presumir a dependência, em nenhum momento estabeleceu que esta se dá de forma absoluta. Ao contrário, é lícito ao INSS, caso disponha de elementos para tanto, demonstrar a inexistência de dependência entre os dependentes da classe I e o segurado. Nesse sentido é a lição do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

“Impossibilidade da viúva em gozo de aposentadoria por invalidez perceber cumulativamente pensão por morte, pois nesse caso não se verifica a dependência econômica em relação ao cônjuge falecido”.(REesp.194300/GO, 5ª T., Rel. Min.Félix Fischer, DJU 2.8.1999, p.00210).

A classe II e III, contempla, respectivamente os pais e os irmãos não emancipados, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido.

A dependência desses deve ser comprovada, sob pena do benefício ser indeferido.

Não é necessário que essa dependência seja absoluta, mas o auxílio financeiro prestado pelo segurado aos dependentes dessas classes, deve ser determinante para sua sobrevivência e deve ocorrer de forma habitual.

A prova da dependência econômica dos dependentes e de vínculo do companheiro, conforme o caso, é feita na forma do Regulamento da Previdência Social, que em seu art. 22, §3º, estabelece a necessidade de reunião de no mínimo três dos seguintes documentos:

I - certidão de nascimento de filho havido em comum;

II - certidão de casamento religioso;

III - declaração do imposto de renda do segurado, em que conste o interessado como seu dependente;

IV - disposições testamentárias;

V - anotação constante na Carteira Profissional e/ou na Carteira de trabalho e Previdência Social, feita pelo órgão competente;

VI - declaração especial feita perante tabelião;

VII - prova de mesmo domicílio;

VIII - prova de encargos domésticos evidentes e existência de sociedade ou comunhão nos atos da vida civil;

IX - procuração ou fiança reciprocamente outorgada;

X - conta bancária conjunta;

XI - registro em associação de qualquer natureza, onde conste o interessado como dependente do segurado;

XII - anotação constante de ficha ou livro de registro de empregados;

XIII - apólice de seguro da qual conste o segurado como instituidor do seguro e a pessoa interessada como sua beneficiária;

XIV - ficha de tratamento em instituição de assistência médica, da qual conste o segurado como responsável;

XV - escritura de compra e venda de imóvel pelo segurado em nome de dependente;

XVI - declaração de não emancipação do dependente menor de vinte e um anos; ou

XVII - quaisquer outros que possam levar à convicção do fato a comprovar.

Por força do inciso XVII, percebe-se que a enumeração trazida pelo texto regulamentar é meramente exemplificativa.

Além disso, a jurisprudência vem considerando abusiva a imposição pelo regulamento de que o dependente deve apresentar três documentos, considerando essa exigência como uma prova tarifada sem qualquer previsibilidade legal, o que ofenderia o princípio da legalidade.

Por outro lado, há entendimento de que a prova meramente testemunhal não basta para provar a relação de dependência, sendo necessário, ao menos, início de prova material.

Regra que a nosso ver, não se coaduna com o sistema protetivo da família, é aquela imposta pelo § 1º, do art. 16 da Lei 8.213/91, que dispõe que a existência de dependente de qualquer das classes exclui do direito às prestações os das classes seguintes.

Se a finalidade protetiva é amparar aqueles familiares que dependiam economicamente do segurado, não se mostra razoável, que aqueles que se encontram na mesma situação de desamparo, sejam excluídos da proteção social por regra legal que se afasta de critérios de igualdade.

4.3. Os limites impostos pela emenda constitucional nº 20/98

A partir da promulgação da Emenda Constitucional nº 20 de 16 de dezembro de 1998, para que seus dependentes façam jus ao benefício, o segurado deve ser classificado como de baixa renda, ou seja, não pode ser renda mensal superior a R$ 360,00 (esse valor sofre atualização periódica atendendo a critérios fixados pelo Ministério da Previdência Social), valor reajustado sempre na mesma data e proporção do reajustamento geral dos benefícios da Previdência Social.

Entendemos que o critério estabelecido pela EC/20, ao determinar que somente aos dependentes do segurado de baixa renda, utilizando-se como único fator a renda do segurado agiu de forma desproporcional.

Agindo assim, passou a tratar pessoas que se encontram em situação desigual de forma igualitária.

A renda não pode, para se definir a dependência econômica, ser utilizado como elemento isolado de definição de critérios de seletividade e distributividade. O grau de necessidade não é definido apenas por um único critério.

Devem ser utilizados outros critérios: número de dependentes, nível de renda do núcleo familiar, idade dos dependentes, capacidade física e para o trabalho de cada membro da família etc.

No entanto, a discussão na jurisprudência não se pautou exatamente por esses critérios.

A corrente que entende que os critérios de seletividade e distributividade impostos pela Emenda Constitucional nº 20/98 são inconstitucionais, se pautam pela argumentação de que o auxílio-reclusão tem por objetivo atender às necessidades dos dependentes que, em face da pena imposta ao segurado por ato criminoso, se vêem desamparados materialmente. Assim, pouco importa se o segurado percebia mais ou menos do que o valor estabelecido na regra transitória, pois o recolhimento do segurado empregado à prisão suprimiu toda a renda destina ao custeio da subsistência dos dependentes; tanto os dependentes do segurado que percebia salário-mínimo, como daquele que auferia vultuoso salário, ficam, pela eliminação da fonte de custeio de suas necessidades, ao desamparo. Nesse sentido: TRF 4ª Região, AG nº 2000.04.01.077754-4, rel. Juiz Carlos de Castro Lugon, 6ª T., DJU de 19/06/2001.

Por seu lado, a corrente que entende ser constitucional a Emenda, se pauta pela argumentação de que é juridicamente possível ao legislador constituinte estabelecer critérios de seletividade e distributividade, como forma de atender ao princípio da isonomia.

Argumentam ainda, que não há ofensa a cláusula pétrea, pois o constituinte originário permitia que se desse tratamento diferenciado para os dependentes do segurado de baixa renda, uma vez que o dispunha o art. 201, II, da redação original da Constituição, que os planos de previdência social deveriam promover “ajuda à manutenção dos dependentes dos segurados de baixa renda”.

Quanto a essa corrente, colacionamos o seguinte julgado:

“CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. LIMITAÇÃO IMPOSTA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 20/98. POSSIBILIDADE.

1- A CONSTITUIÇÃO FEDERAL NO ARTIGO 201, IV, AO INSTITUIR O AUXÍLIO-RECLUSÃO,PRESCREVE QUE ESTE SERÁ DESTINADO AOS SEGURADOS DE BAIXA RENDA, DEIXANDO À LEI DELIMITAR A FRONTEIRA DA REMUNERAÇÃO MÍNIMA CAPAZ DE CONFERIR DIREITO AO BENEFÍCIO.

2 - A EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 20/98, ART. 13, DECLARA QUE ENQUANTO NÃO HOUVER LEI REGULANDO O ASSUNTO, O AUXÍLIO-RECLUSÃO DEPENDERÁ DE OBSERVAÇÃO DE LIMITE DE RENDA BRUTA MENSAL NÃO SUPERIOR A R$ 360,00 (TREZENTOS E SESSENTA REAIS), VALOR ATUALIZADO PELOS MESMOS ÍNDICES APLICADOS AOS BENEFÍCIOS DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL, ATUALMENTE CORRESPONDENTE A R$ 429,00 (QUATROCENTOS E VINTE E NOVE REAIS).

3- HIPÓTESE EM QUE NÃO RESTOU COMPROVADO O QUANTUM PERCEBIDO PELO SEGURADO.

4- AGRAVO IMPROVIDO. REGIMENTAL PREJUDICADO”. (Processo 200005000558918, Agravo de Instrumento 33407, 4ª T, Relator Desembargador Federal Luiz Alberto Gurgel de Faria, Decisão UNÂNIME , DJ 25/02/2002, pág.1715 )

Não obstante isso, a jurisprudência ainda considera que o critério da renda a ser levado em conta é o dos dependentes e não do segurado, nos termos do art. 13 da Emenda Constitucional nº 20 de 16 de dezembro de 1998.

O argumento dessa corrente é no sentido de que a limitação imposta jamais poderia se dirigir à renda auferida pelo próprio segurado, já que este não é o beneficiário do auxílio-reclusão, mas seu dependente.

Entendem que a contingência atinge o segurado (risco reclusão), mas reflete diretamente para seus dependentes, que ficarão privados do sustento, enquanto que o segurado passará a ter sua subsistência garantida pelo Estado.

4.4. Requisitos para percepção e manutenção do benefício

A lei 8.213/91, em seu art. 80, determina que o auxílio-reclusão seja concedido nas mesmas condições da pensão por morte. Essas condições se referem aos beneficiários, à data de início e ao cálculo da prestação.

Os dependentes do segurado de baixa renda devem instruir o pedido de auxílio-reclusão acompanhado da certidão de recolhimento à prisão, emitida pela autoridade carcerária, que deve ser renovada a cada três meses a teor do art. 117, § 1º, do Decreto 3.048/1999.

A data de início é a do recolhimento à prisão, quando requerida a prestação em até 30 dias contados desse fato.

Após esse prazo, o benefício será devido a partir da data de entrada do requerimento administrativo, salvo se dentre os dependentes do segurado existirem menores impúberes ou incapazes, situação na qual o benefício é devido desde o recolhimento à prisão, tendo em vista que não corre prescrição contra pessoas nessas situações.

Para que seus dependentes tenham direito ao auxílio-reclusão, o segurado preso não pode estar recebendo remuneração da empresa, nem auxílio-doença ou aposentadoria. Se sofrer acidente ou doença durante a prisão, não poderá cumular auxílio-doença ou aposentadoria com auxílio-reclusão, mas poderá optar pelo benefício mais vantajoso, conforme alteração promovida pela Lei 10.666/03, in verbis:

Art. 2º O exercício de atividade remunerada do segurado recluso em cumprimento de pena em regime fechado ou semi-aberto que contribuir na condição de contribuinte individual ou facultativo não acarreta a perda do direito ao recebimento do auxílio-reclusão para seus dependentes.

§ 1º O segurado recluso não terá direito aos benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria durante a percepção, pelos dependentes, do auxílio-reclusão, ainda que, nessa condição, contribua como contribuinte individual ou facultativo, permitida a opção, desde que manifestada, também, pelos dependentes, ao benefício mais vantajoso.

O Código Penal, em seu art. 39, que cuida do trabalho do preso, estabeleceu, antes da vigência da Lei 10.666/03 que:

Art. 39 - O trabalho do preso será sempre remunerado, sendo-lhe garantidos os benefícios da Previdência Social.

Portanto, se o preso exercesse trabalho dentro do presídio ou em colônia agrícola, teria direito aos benefícios da Previdência Social, inclusive sendo dever de seu empregador (União, Estados, Municípios e Distrito Federal, conforme a quem caiba a administração da unidade prisional), arcar com o recolhimento das contribuições previdenciárias.

Vale observar que o preso deve ter condição de segurado no momento da ocorrência do fato gerador da prestação, ou seja, no momento de seu recolhimento à prisão.

Na hipótese do segurado fugir da prisão, o benefício é suspenso, somente sendo reativado quando de sua recaptura, desde que nesse lapso de tempo não tenha perdido sua qualidade de segurado.

Caso exerça alguma atividade vinculada ao RGPS ou contribua para o sistema enquanto estiver foragido, manterá seu vínculo, interrompendo a contagem do prazo do período de graça.

Havendo morte do segurado durante o recebimento do auxílio-reclusão por seus dependentes, a prestação é convertida em pensão por morte. Caso tenha havido contribuição do segurado recluso, em razão da atividade remunerada desenvolvida durante a prisão, os salários-de-contribuição correspondente são considerados no cálculo da pensão por morte, resguardada sempre a opção pela simples conversão do auxílio-reclusão, se seu valor for mais favorável, conforme dispõe o art. 2º, §2º da Lei 10.666/2003, in verbis:

§ 2º Em caso de morte do segurado recluso que contribuir na forma do § 1º, o valor da pensão por morte devida a seus dependentes será obtido mediante a realização de cálculo, com base nos novos tempos de contribuição e salários-de-contribuição correspondentes, neles incluídas as contribuições recolhidas enquanto recluso, facultada a opção pelo valor do auxílio-reclusão.

Vale lembrar a advertência de IONAS DEDA GONÇALVES: “É importante prestar atenção na seguinte situação, que pode gerar confusão: se o detido, quando foi recolhido à prisão, mantinha sua qualidade de segurado, mas seus dependentes não tinham direito ao auxílio-reclusão (porque não era segurado de baixa renda), conserva seus direitos perante a Previdência, pois encontra-se no período de graça, até 12 meses após o livramento. Se falece, adoece ou se invalida durante a prisão, ele ou seus dependentes têm direito às respectivas prestações previdenciárias, desde que cumpridos os demais requisitos exigidos, pois ainda mantinha sua qualidade de segurado”.20

4.5. Do valor do benefício

O valor equivale ao de aposentadoria por invalidez, a que o segurado teria direito no momento do recolhimento à prisão.

A jurisprudência, após o advento da Lei 9.032/1995, que elevou o coeficiente de cálculo do valor do benefício de pensão por morte e auxílio-reclusão, passou a entender que os benefícios concedidos anteriormente à sua vigência, deveriam ser reajustados, de acordo com a nova legislação, em razão do princípio da aplicação imediata da nova lei.

Por seu lado, a corrente que entende que não se pode fazer a aplicação imediata da lei a fatos ocorridos anteriormente à sua vigência, argumenta que a questão cinge-se a saber se uma Lei posterior ao ato da concessão do benefício pode alterar o percentual dessa concessão, com efeitos nas prestações mensais a serem pagas após a sua publicação, sem ofender o princípio constitucional da irretroatividade das leis, consubstanciado no art. 5°, XXXVI, da Carta Magna.

A solução jurídica da questão que fundamenta a demanda resolve-se, simplesmente, ao se encontrar o evento que deve ser considerado para que se subsuma o caso a uma ou outra lei de regência.

A questão passa, assim, pelo regime jurídico que rege a aplicação das leis no tempo.

O princípio que rege a aplicação da lei no tempo estabelece que, em regra, a lei possui eficácia imediata, regendo as relações jurídicas a que se referem desde o momento em que recebem execução até àquele em que cessa a sua virtude normativa.

Pautado no brocardo latino tempus regit actum, mencionado princípio estabelece que, em tese, a lei não pode alcançar fatos ocorridos em período anterior ao início de sua vigência, nem aplicada àqueles ocorridos após a sua revogação.

No entanto, poderão existir situações em que uma mesma relação jurídica possa, aparentemente, ser regulada por diplomas legais diversos, dando azo a um conflito aparente de normas.

Como bem doutrina Roberto de Ruggiero21, para que se verifique o conflito de leis no tempo, é preciso que a vida de uma relação jurídica se prolongue tanto que apanhe dois momentos diversos, dois momentos em que sucessivamente vigorem normas de conteúdos substancialmente diversos.

A fim de dirimir tais conflitos aparentes, primeiramente, baseado no sentimento universal e com inspiração em fontes romanas (“leges et constitutiones futuris certum est dare formam negotiis, non ad facta praeterita revocari”), formulou-se o princípio da irretroatividade da lei, segundo o qual a lei sempre dispõe para as relações futuras e não tem efeitos retroativos.

No entanto, na prática, mencionado princípio não se mostrou suficiente para a resolução dos conflitos concretos.

Dessa forma, desenvolvendo a teoria da irretroatividade da lei, Lassalle formulou o princípio do respeito ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada.

Tal princípio foi posteriormente abraçado e complementado por Gabba, estabelecendo que a proibição geral da retroatividade da lei se deve limitar ao direito adquirido e aos seus derivados: o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.

Em sua obra Teoria da Irretroatividade das Leis, Gabba observa que o grande problema de retroatividade das leis está em que se não firam os direitos que se constituíram graças ao império da lei antiga e em sua plena conformidade.

Propõe assim, que o critério da retroatividade ou irretroatividade da lei não seja encontrado na própria natureza da norma jurídica, como pretendia Savigny, mas sim na situação jurídica que se constituiu à sombra da lei anterior, elaborando a noção de direito adquirido.

Entre nós, na atualidade, preceitua o artigo 5°, inciso XXXVI, da Constituição Federal:

“Art. 5°. (...) XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.”

Assim, a norma constitucional não impede a aplicação retroativa da lei, sendo esta, em tese, admitida, desde que não prejudique o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.

Tem-se, assim, que, instaurada a relação jurídica, deve a mesma reger-se pela lei à época vigente, segundo o princípio tempus regit actum, sendo inoperante, para esta relação que já se concretizou, todas as alterações legislativas posteriores relacionadas ao cálculo da prestação inicial, sejam elas menos ou mais benéficas para o sujeito ativo, a menos que, evidentemente, a lei posterior contenha previsão de aplicação a situações fáticas pretéritas, circunstância inocorrente na hipótese.

A corrente doutrinária e jurisprudencial, defende ainda que não se pode invocar, nessa situação, o princípio da aplicação imediata da lei.

De fato, como bem destaca Washington de Barros Monteiro22, entre a retroatividade e irretroatividade da lei, existe situação intermediária, a da aplicabilidade imediata da lei nova, porém, limitada às situações que embora nascidas sob a vigência da lei antiga, ainda não se aperfeiçoaram; não se consumaram.

Além disso, defendem que o magistrado não pode atuar como legislador positivo.

Sua atuação deve limitar-se ao afastamento de normas legais incompatíveis com o ordenamento superior, de sede constitucional, ou seja, como legislador negativo. Pois bem: caso afastada uma norma por inconstitucionalidade, esta norma não teria gerado efeitos. Dentre esses efeitos que se afastam, está a revogação do ordenamento anterior, que seja consigo incompatível ou que tenha sido expressamente revogado. Ou seja: declarada a inconstitucionalidade da norma, retorna-se ao regramento anterior, posto que o próprio efeito de revogação deste ordenamento anterior se desfaz.

Ora, está dentro do espaço de conformidade do legislador a ampliação ou não dos direitos garantidos pela norma constitucional, é certo que não poderá restringi-los, mas a sua ampliação é discricionariedade do legislador, não cabendo ao Juiz, sob pena de invasão da atribuição legislativa e desrespeito ao princípio democrático a inclusão de novos direitos.

Pondera LORD DEVELIN que: “A partir do momento em que o juiz se transforma em legislador, mina a idéia fundamental da separação dos poderes, trazendo a ameaça talvez mortal à legitimação democrática da função jurisdicional, e definitivamente conduzindo, mais cedo ou mais tarde ao estado totalitário”.23

Por fim, defendem que a majoração do coeficiente dos benefícios concedidos anteriormente à lei 9.032/95, pela aplicação imediata desta, ofende o princípio da necessidade de prévia fonte de custeio.

Conclui essa corrente que não existe lacuna ou omissão da lei a ser suprida por analogia, sendo o silêncio da norma intencional, indicando claramente que não há a possibilidade de majoração do percentual dos benefícios concedidos sob a égide da lei pretérita.

4.6. Da extinção do benefício

A prestação do benefício de auxílio-reclusão extingue-se:

a) individualmente, nas mesmas condições da pensão por morte;

b) quando extinguir-se a cota-parte do último dependente com direito ao benefício, por eventos de idade, morte, ou cessação da invalidez;

c) com o livramento do segurado;

d) com sua fuga por prazo superior ao do período de graça;

e) com a morte do segurado;

f) com a opção por aposentadoria adquirida no período de prisão.


CAPÍTULO V - A REGRA MATRIZ DO BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-RECLUSÃO

5.1. Antecedente

5.1.1. critério material

O critério material da hipótese de incidência normativa é a condição de privação de liberdade. O segurado deve estar preso.

Somado a isso, o critério material da norma geral e abstrata ao auxílio-reclusão, é integrado pelos seguintes elementos: a baixa renda do segurado e a não percepção de remuneração da empresa, aposentadoria ou auxílio-doença.

Cabe a ressalva de que o critério material acima descrito sofreu alguns temperamentos impostos pela Lei 10.666 de 8 de maio de 2003, que em seu art. 2º dispõe:

Art. 2º O exercício de atividade remunerada do segurado recluso em cumprimento de pena em regime fechado ou semi-aberto que contribuir na condição de contribuinte individual ou facultativo não acarreta a perda do direito ao recebimento do auxílio-reclusão para seus dependentes.

§ 1º O segurado recluso não terá direito aos benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria durante a percepção, pelos dependentes, do auxílio-reclusão, ainda que, nessa condição, contribua como contribuinte individual ou facultativo, permitida a opção, desde que manifestada, também, pelos dependentes, ao benefício mais vantajoso.

§ 2º Em caso de morte do segurado recluso que contribuir na forma do § 1º, o valor da pensão por morte devida a seus dependentes será obtido mediante a realização de cálculo, com base nos novos tempos de contribuição e salários-de-contribuição correspondentes, neles incluídas as contribuições recolhidas enquanto recluso, facultada a opção pelo valor do auxílio-reclusão.

A norma protetiva é ampla e abarca qualquer tipo de prisão ou pena privativa de liberdade, seja cautelar ou definitiva, inclusive a medida de internação decorrente de medida de segurança e da internação prevista no art. 121 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Cabe ressaltar, no entanto, que o benefício somente é devido ao segurado que estiver submetido aos regimes de cumprimento de pena fechado ou semi-aberto ou situações assemelhadas.

Não é devido o auxílio-reclusão ao dependente do segurado em quaisquer hipóteses de não cumprimento da pena, como o livramento condicional ou em caso de imposição do regime aberto de cumprimento da pena privativa de liberdade.

O benefício é devido enquanto durar a privação de liberdade do segurado.

Ocorre a suspensão do benefício nas seguintes hipóteses:

1.em caso de fuga;

b) recebimento de auxílio-doença no período de privação de liberdade;

c) deixar de apresentar trimestralmente atestado de prisão firmado por autoridade competente;

d) livramento condicional, cumprimento da pena em regime aberto, enquanto perdurarem tais situações.

Para FEIJÓ COIMBRA, a suspensão do benefício em razão da fuga, não se coaduna com o sistema protetivo da família. Com efeito, assevera o autor:

“Não vemos justiça na disposição legal, parecendo-nos, ao revés, que se conflitam as duas disposições. Se a prestação é, induvidosamente, estabelecida intuitu familiae, e se tem como elemento material da hipótese de incidência legal a ordem judicial de detenção ou de reclusão, o fato de ter-se evadido o segurado, de estar foragido, em nada altera os termos da questão, nem melhora a situação de seus dependentes, os titulares da prestação de que se cuida”.24

A finalidade da norma, no entanto, é evitar que a os dependentes passem a receber o benefício por prazo indeterminado.

Deve-se criticar esse posicionamento legal.

A justificativa da existência do benefício é justamente a proteção à família que fica desamparada em razão da retribuição estatal pela prática de ato antijurídico por parte do segurado, evitando-se que os efeitos da pena passem do condenado e atinja seus familiares ou pessoas de quem são dependentes.

De outro prisma, cabe a Estado zelar pela segurança do recluso e evitar que este fuja do estabelecimento prisional.

A suspensão do benefício, gera aos dependentes uma “punição” por atos ilícitos praticados por terceiros, o que não se coaduna com o sistema protetivo da seguridade social.

Com efeito, uma vez que o benefício de auxílio-reclusão é devido exclusivamente aos dependentes e por esse motivo, a esses cabe um direito subjetivo público frente ao Estado, não faz sentido a norma que sanciona esses dependentes pela fuga do segurado, que é um ato ilícito por parte do recluso.

Por outro lado, os dependentes são sancionados pelo Estado que se omitiu no dever de evitar que o preso se evadisse do estabelecimento prisional. E ainda, poderão ter o benefício cassado caso haja a perda da qualidade do segurado durante o período de fuga.

É uma situação injusta que praticamente impõe os efeitos da pena a pessoas distintas do condenado, em afronta ao art. 5º, da Carta Magna, que vaticina em seu inciso XLV, que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido”.

Em caso de recaptura do foragido, o benefício é restabelecido, desde que o condenado ainda mantenha a qualidade de segurado.

5.1.2. critério espacial

O critério espacial reflete o âmbito de incidência da norma jurídica, sendo certo que para o auxílio-reclusão é o território brasileiro.

É possível a ocorrência de extraterritorialidade da norma, naquelas situações em que o segurado cumpra pena fora do país, ou esteja a serviço do Brasil no exterior, porém mantendo a qualidade de segurado perante a legislação previdenciária brasileira.

5.1.3. critério temporal

Pelo critério temporal se define o momento em que o benefício passa a ser devido.

Este momento ocorre, no benefício de auxílio-reclusão, no instante em que o segurado é recolhido à prisão, se o requerimento for feito até trinta dias deste evento. Ultrapassado esse prazo, o benefício será devido a partir da data de entrada do requerimento administrativo.

O benefício também somente é devido após a data do requerimento administrativo se o nascimento ou reconhecimento de filho ocorrer após a prisão ou ainda, em caso de matrimônio, se este também for realizado após a prisão do segurado.

Aos menores impúberes ou aos incapazes dependentes do segurado recluso, o benefício é devido desde a data do efetivo recolhimento à prisão do segurado, ainda que o requerimento administrativo tenha ocorrido após os trinta dias da reclusão, tendo em vista que não corre prescrição contra menores.

5.2. CONSEQUENTE

5.2.1. critério pessoal

Pelo critério pessoal são identificados os sujeitos ativo e passivo da relação jurídica do benefício de auxílio-reclusão.

O sujeito ativo é do benefício de auxílio-reclusão são, exclusivamente, os dependentes do segurado recluso.

O sujeito passivo é o Instituto Nacional do Seguro Social.

5.2.2. critério quantitativo

Pelo critério quantitativo é definido o valor da prestação previdenciária devida pelo sujeito passivo ao sujeito ativo.

A base de cálculo é o salário-de-benefício. Este é definido pela média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondente a 80% de todo o período contributivo para os segurados vinculados ao sistema previdenciário após a vigência da Lei nº 9.786/99 ou correspondente a 80% dos maiores salários de contribuição apurados a partir da competência julho/94 para os segurados vinculados anteriormente àquela lei.

A alíquota é de 100% do salário-de-benefício que o segurado recebia ou daquele que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data em que foi recolhido à prisão.

Para os dependentes do segurado especial, o valor do auxílio-reclusão será de um salário mínimo.

Conforme dito alhures, a Emenda Constitucional nº 20 de 16 de dezembro de 1998, alterou o critério para concessão do benefício, restringindo-o apenas aos segurados de baixa renda e art. 13 da referida Emenda classificou como sendo de baixa renda o segurado que tenha salário de contribuição igual ou inferior a R$ 360,00 (valor sujeito à atualização segundo critérios do Ministério da Previdência Social).

A prisão ocorrida anteriormente à promulgação desta emenda não impunha tal limitação ao recebimento do benefício e portanto, o benefício é devido ainda que os dependentes tenham feito requerimento após 16 de dezembro de 1998.


CONCLUSÕES

O benefício de auxílio-reclusão, ao longo dos anos e acompanhando a evolução da sociedade, sofreu evoluções quanto ao seu alcance protetivo. No entanto, a Emenda Constitucional nº 20 de 16 de dezembro de 1998, impôs drástica limitação, ao benefício, garantindo-o apenas aos dependentes do segurado de baixa renda.

Essa limitação é objeto de controvérsias tanto na doutrina quanto na jurisprudência. Nosso posicionamento, no entanto, se coloca à parte da discussão ocorrida, tendo em vista que entendemos que é lícito à emenda constitucional definir novos critérios de seletividade e distributividade mas, no entanto, tais critérios devem se pautar pelos critérios da proporcionalidade e razoabilidade, o que não ocorre com a limitação imposta pela emenda, uma vez que a utilização única e exclusivamente do critério da renda não se coaduna com tais princípios.

No ordenamento jurídico atual, o benefício comporta outras discussões importantes, tais como a aplicação do novo coeficiente de cálculo da renda mensal inicial, que a Lei 9.032/95 fixou em 100%, aos benefícios concedidos anteriormente à entrada em vigor desse diploma legal.

Buscou-se abordar também a questão da fuga do segurado recluso como causa de suspensão do benefício a seus beneficiários, situação a qual entendemos injusta, uma vez que pune os dependentes por ato ilícito praticado pelo preso e por ato omissivo do Estado que deixa de cumprir seu dever de manter preso aquele que agiu em desacordo com as regras sociais.

Quanto à regra de que a existência de dependentes de uma das classes exclui o direito dos dependentes da demais classe, enfatizamos que tal essa previsão no ordenamento jurídico não se coaduna com o sistema de proteção à família, que deve garantir o sustento de quem realmente necessite do benefício, evitando-se as presunções legais de dependência.

Na mesma linha, conclui-se que a presunção de dependência dos dependentes da primeira classe é relativa e não absoluta, como sustenta a maioria da doutrina, sendo lícito ao INSS fazer prova em contrário, desde que disponha de meios para tanto.

A questão da retirada do menor sob guarda do rol dos dependentes tem suscitado francos embates jurisprudenciais que, todavia, entendemos serem descabidos, tendo em vista que é possível à lei limitar o acesso aos benefícios previdenciários em atenção ao critério da seletividade.

A análise da regra matriz do benefício nos traz sua exata dimensão e a conformação perante o ordenamento jurídico vigente, inclusive quanto algumas peculiaridades desta prestação previdenciária.


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RUGGIERO, Roberto de. Instituições de Direito Civil, vol. 1, Ed. Bookseller.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional, 23ª ed., Malheiros, 2005.


Notas

1 José Afonso da SILVA, Curso de Direito Constitucional, p. 808.

2 Luís André MARTINS, Direito Previdenciário, p. 10.

3 Manoel Gonçalves Ferreira FILHO, Direitos Humanos Fundamentais, p. 49.

4 Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Júnior, Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social, p. 29.

5 Celso Antonio Bandeira de MELLO, Elementos de Direito Administrativo, p. 230.

6 José Joaquim Gomes CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, p. 1123.

7 Wagner BALERA, A Seguridade Social na Constituição de 1988, p. 45.

8 José Manuel Almansa PASTOR, Derecho de La Seguridad Social, p. 120.

9 Alonso Olea e PLAZA, Instituciones de seguridad social, p. 37.

10 Ionas Deda GONÇALVES, Direito Previdenciário, p. 15.

11 Wagner BALERA, Noções Preliminares de Direito Previdenciário, p. 84.

12 Miriam Vasconcelos Fiaux HORVATH, O auxílio-reclusão no direito brasileiro, p.27.

13 Wagner BALERA, Introdução ao Direito Previdenciário, p. 51.

14 Wagner BALERA, A seguridade social na Constituição de 1988, p. 39.

15 Miriam Vasconcelos Fiaux HORVATH, O auxílio-reclusão no direito brasileiro, p. 33.

16 Miriam Vasconcelos Fiaux HORVATH, O auxílio-reclusão no direito brasileiro, p 86.

17 Wagner BALERA, Da proteção Social à família, p. 213.

18 Ionas Deda GONÇALVES. Direito Previdenciário, p. 62

19 Miguel Horvath JUNIOR, Direito Previdenciário, p. 115.

20 Ionas Deda GONÇALVES. Direito Previdenciário, p. 186.

21 Roberto de Ruggiero, Instituições de Direito Civil, vol. 1, p. 221.

22,Washington de Barros MONTEIRO, Curso de Direito Civil, vol. 1, pg. 32.

23 Lord DEVELIN, Judge and Lawmakers, p.1 e s.

24 Feijó COIMBRA, Direito Previdenciário Brasileiro, p. 133.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CRUZ, Marcelo Cavaletti de Souza. Do auxílio reclusão. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3962, 7 maio 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/28181. Acesso em: 23 abr. 2024.