Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/28309
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Despesa fiscal: função e meios de controle

Despesa fiscal: função e meios de controle

Publicado em . Elaborado em .

3.1 Despesa Fiscal como Instrumento de Satisfação das Necessidades Públicas.

De início, cabe diferenciar necessidades públicas de políticas públicas, haja vista que este último termo tem sido utilizado para representar realidades diversas e, por vezes, conflitantes. Em Ronald Dworkin política pública seria uma espécie de padrão com o escopo de alcançar um objetivo, seja no âmbito social, econômico ou político de determinada comunidade.[1] Ou seja, o termo “políticas públicas”, hodiernamente, abrange um conjunto muito amplo de realidades que ao invés de facilitar a identificação destas, torna-se um termo retórico: pois ao representar tanto, acaba por nada dizer.

Cabe ressaltar posição esposada por Fábio Konder Comparato, in verbis:

A primeira distinção a ser feita, no que diz respeito à política como programa de ação, é de ordem negativa. Ela não é uma norma nem um ato, ou seja, ela não se distingue nitidamente dos atos da realidade jurídica, sobre as quais os juristas desenvolvem a maior parte de suas reflexões desde os primórdios da jurisprudência romana.[2] (negrito não consta do original)

Nessa linha, políticas públicas designariam realidades pré ou, mesmo, meta-jurídica, determinadas por tensões político-partidárias, anseios da população, pressão de grupos dominantes, lobby etc., com isso, não se que afastar sua relevância na compostura social, entretanto, sua inserção no direito, tendo em vista seu vazio significativo, ao invés de estabelecer um sólido parâmetro de controle, gera, isto sim, uma cizânia de significativo porte, por isso, no presente trabalho, tendo em vista sua pretensão jurídica, as “políticas públicas” não serão utilizadas como índices para as despesas fiscais.

Ademais, essa abertura semântica granjeada pela referida expressão gera um discurso retórico para além de qualquer contorno jurídico, cujo escopo é convencer e não resolver. Por isso, adotam-se, aqui, as necessidades públicas como parâmetro de aferição das despesas fiscais, pois, ainda que sejam determinadas por atos políticos – estes sujeitos a toda sorte, como: lobby, interesses de grupos dominantes, tensões sociais etc. - são positivadas pelo direito, ou seja são instituídas por meio de normas jurídicas, e esta, em direito, são os instrumentos abeis a instituir padrões de condutas, como bem coloca Lourival Vilanova:

Mas, se o direito conforma se dá de forma normativa ao social, a forma passa a integrar o fato social. E como a forma é normativa, é ela um índice para que a energia social possa seguir por ali. É como uma seta que aponta o caminho. (...) o direito é fator da dinâmica social. Com ele, acelera-se a mudança, canaliza-se o processo para fins previamente estabelecidos.[3]

Outrossim, se as políticas públicas são instrumentos estatais de execução de programas políticos baseados na intervenção na sociedade com a finalidade de assegurar igualdade de oportunidades aos cidadãos, tendo por escopo assegurar condições matérias de uma existência digna a todos os cidadãos[4], sem norma – estas advindas tanto de instrumentos normativos primários, como também secundários – seja qualquer a espécie exigida, se ela, os programas políticos de governo – de desenvolvimento econômico, social etc. – não passariam para o campo concreto, ou seja, nunca seriam realizados.[5]

Por isso, o presente trabalho se vale, ao invés da concepção de políticas públicas, do conceito de necessidade pública[6], haja vista que este advém do direito positivo, isto é, no âmbito jurídico, este é o conjunto de normas que determina a atuação estatal por meio da conduta de seus agentes em certa área com o escopo de prestar certo bem, tal atuação, portanto, é implementada por ações legislativas e executivas produtoras de normas para alcançar certos fins estatais. Decerto, sua origem advém de uma tomada de decisão do Estado sobre determinada área ou problema[7].

Por certo, há outros aspectos formadores das necessidades públicas[8], como por exemplo: o político, anseios sociais, greves, etc., mas estes são pré-jurídicos, com importância discutível para o estudioso do direito, haja vista que o objeto de estudo da ciência do direito é a norma jurídica.

Esta como um dos veículos condutores das alterações sociais, e, por conseguinte, o meio pelo qual o Estado de Direito manifesta sua vontade e suas forma de atuação, por isso, se políticas públicas são os meios de realização do interesse publico através da adoção de medidas hábeis a garantir a implementação e/ou realização de determinados objetivos, essa atuação é delineado pela norma jurídica que instituí as necessidades públicas. Pois, como anota Lourival Vilanova, “Ninguém governa com o Evangelho na mão, ou com o tratado de ciência política. Governa com norma, mediante elas.”[9]

E em síntese lapidar, arremata o Jurisfilósofo pernambucano: “altera-se o mundo físico mediante o trabalho e a tecnologia, que o potencia em resultados. E altera-se o mundo social mediante a linguagem das normas, uma classe da qual é a linguagem das normas do Direito.”[10]

Por isso, se “as políticas públicas funcionam como instrumentos de aglutinação de interesses em torno de objetivos comuns, que passam a estruturar uma coletividade de interesses”,[11] isso só é possível por meio da linguagem normativa, instrumento hábil a alterar a conduta humana, haja vista que por meio dela” o Estado dessacraliza a misericórdia, institucionalizando a assistência, como serviço público.”[12]

Portanto, pode-se afirmar que desde a formação jurídica do Estado, por meio da Constituição, se instituí comandos normativos que delineiam as formas de sua atuação, sem olvidar a área dessa ação. Essas linhas inicias possuem lacunas que são comatadas por meio de instrumentos infraconstitucionais, conforme a ideologia política predominante, isto é, “são geralmente projetadas nas plataformas eleitorais, chanceladas nas eleições e depois amadurecidas pelo poder político”[13] – essa forma de atuação direcionada para busca de fins específicos é o conceito jurídico, o qual positiva as chamadas “política pública”, transformando-as em necessidades públicas, as quais são satisfeitas por meio do serviço público..

Não se quer, com supramencionado, menoscabar ou mesmo desconsiderar outros aspectos no que concernem as políticas públicas, como o sociológico, o político, econômico etc., mas tão somente delimitar o objeto de estudo do presente item. Ademais, como é bem sabido, o corte metodológico é imprescindível em qualquer trabalho com pretensões cientificas.

Ante essas premissas, cabe inserir a despesa fiscal como instrumento de implementação de necessidades públicas, ou melhor, de que forma a despesa fiscal pode instrumentalizar/implementar tais necessidades.

Nesse diapasão, podem-se citar as isenções com finalidade de desenvolver determinada região. Imagine-se uma região pouco industrializada, verbi gratia, a região amazônica, a União com escopo de cumprir meta previamente traçada pelo constituinte – reduzir as desigualdades regionais – pode conceder uma isenção de IPI com o escopo de fomentar a industrialização dessa região.

Cabe enfatizar que essa espécie de despesa, para além de ser um meio regional de desenvolvimento, é um forte instrumento de dirigismo estatal em âmbito nacional, corroborando com tal assertiva, tem-se as isenções e reduções de alíquota do IPI utilizadas na crise de 2008 com o objetivo de manter o mercado brasileiro aquecido por meio do aumento do consumo interno, haja vista que grandes potências passam por uma recessão.

Outra forma comum na implementação de políticas públicas por meio de despesas fiscais é isenção de certas matérias-primas em produtos de primeira ordem, ou mesmo a concessão de subsídios, como acontece no programa farmácia popular[14], no qual o Estado subsidia medicamentos para tratamento de certas doenças como, por exemplo, com Enalapril para hipertensão e Metformina para diabetes, ou seja, ao invés de o Estado fornecer diretamente determinado medicamento, ele minimiza seu custo de produção para ampliar seu acesso as camadas mais pobres.

Cabe citar também um dos maiores expoentes de implementação de macro-objetivos por meio de gastos tributários: o Programa de Universidade para Todos[15] – o PROUNI – com esse programa a União busca uma ampliação ao acesso de pessoas de baixa renda ao ensino superior. No PROUNI, o governo federal concede isenções de quatro tributos[16]: imposto de renda das pessoas jurídicas, contribuição social sobre o lucro liquido, contribuição social para financiamento da seguridade social, instituída pela Lei Complementar nº 70/1991, e contribuição para o programa de integração social, instituída pela Lei Complementar nº 7/1970. as Instituições de ensino superior que concederem bolsas a estudantes previamente selecionados pelo Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM.

Ressalte-se que as bolsas concedidas pelo PROUNI ultrapassaram o número de vagas[17] oferecidas diretamente pelas universidades federais, ou seja, parte significativa do ensino superior que o Estado brasileiro disponibiliza é custeada por esse meio de despesa fiscal.

Com os exemplos supramencionados, fica evidente que a União se utiliza largamente de despesas fiscais com o escopo de satisfazer certas necessidades públicas. E essa amplitude de gastos realizados de forma mediata legitima a presente pesquisa, além de demonstrar uma realidade preocupante: o estudo incipiente de matéria tão relevante para o direito financeiro, que por razões ideológicas, só aparecem, salvo raras e preciosas exceções, como benesses estatais.

Não se pode olvidar, também, conforme o caso do Programa Universidade para Todos – PROUNI – que por meio dessa despesa o Estado vem trespassando parte de suas responsabilidades constitucionalmente assumidas à iniciativa privada. Ora, para além do pobre discurso liberal de Estado mínimo e não interventor balbuciado por medíocres pensadores, essa forma de prestação de serviço público não dispensa gastos públicos – como exaustivamente demonstrado no segundo capítulo, benefício fiscal é a dispensa de receita devida, e, por conseguinte, despesa pública – além de não garantir uma maior eficiência do serviço, carecendo, por isso, de fortes instrumentos de controle[18].

Outrossim, vê-se que a despesa fiscal é um instrumento de efetivação dos direitos fundamentais[19], na medida em que garante acesso bens tidos como de primeira ordem, medicamentos, educação etc., ou seja, ainda que indiretamente, por meio de despesas fiscais o Estado busca, em regra[20], meios para garantir os direitos tidos por fundamentais, sem, por certo, diferenciá-los em prestacionais ou não, pois, como visto alhures, na perspectiva estatal, todo direito requer um fazer[21].

Ressalte-se que os direitos fundamentais não possuem um núcleo irredutível, ao invés disso são conquistas históricas, e, por conseguinte, necessariamente, mutáveis. Isto é “os direitos do homem são direitos históricos, que emergem gradualmente das lutas que os homens travam por sua própria emancipação e das transformações das condições de vida que essas lutas produzem”.[22] Assim, cabe ao jurista vê-los a partir de um dado ordenamento jurídico, não como algo universal. Nessa linha é o escólio de Gomes Canotilho:

Os direitos fundamentais serão estudados enquanto jurídico-positivamente vigente numa ordem constitucional. Como iremos ver, o local exacto desta positivação é a constituição. A positivação de direitos fundamentais significa a incorporação na ordem jurídica positiva dos direitos considerados “naturais” e inalienáveis do individuo.[23]

Essa advertência é salutar, tendo em vista que pode-se dizer que a implementação das necessidades públicas está estritamente ligada aos direitos fundamentais, ou melhor, estes são necessidades de primeira ordem, as quais o Estado deve satisfazer tendo em vista seu fim instrumental. E vê-los – os direitos fundamentais – sob aspecto diverso implicaria na existência de necessidades imanentes ao ser humano, isto é, “para aqueles que perfilham filosofia de que existem necessidades intrínsecas do ser humano, o Estado não pode deixar de atender a alguns interesses básicos”[24]. Ora, a história oferece um sem número de exemplos que desabonam qualquer perspectiva imanente dos direitos individuais, como a escravidão, a desigualdade de gênero, a usurpação da propriedade etc.[25]

Do exposto, tem-se que os direitos fundamentais não são realidades prontas e acabadas, ao invés, são conquistas históricas que refletem diretamente no ato de escolha das necessidades públicas, estas, também, cambiantes, conforme o momento histórico, o lugar e seu respectivo povo. Nessa linha, as despesas fiscais, quando na satisfação de algumas necessidades públicas, cumprem papel de efetivação dos direitos fundamentais, como por exemplo, PROUNI e Farmácia Popular, que implementam educação e saúde respectivamente.

Ocorre que as despesas fiscais, por vezes, ao invés de satisfazerem objetivos constitucionais, agravam desigualdades, haja vista que podem causar interferência indevida na economia, acentuando desigualdades regionais, instrumentalizando a famigerada guerra fiscal – evento não nocivo a um dos valores mais caro ao constituinte: a Federação –, como também sua realização para satisfazer interesses outros que não os públicos, patrocinados, aqueles, por lobistas. Assim, a concessão de benefícios fiscais, além dos requisitos constitucionais e legais para sua realização, deve se conformar com todo ordenamento, em especial, com a isonomia, erigida como garantia fundamental pelo constituinte, um dos mandamentos nucleares sob o qual é forjado o Estado de Direito. Esta, a isonomia, é um parâmetro inafastável na concessão de “benefícios fiscais”, e por isso, o próximo item dela tratará.


3.2. Correlação da Realização de Despesas Fiscais (Concessão de Benefícios Fiscais) com o Princípio da Isonomia.

Como bem adverte Ricardo Lobo Torres, “A Igualdade é o mais importante dos princípios jurídicos e o que oferece a maior dificuldade de compreensão ao jurista e ao filósofo do direito.”[26]Em que pese a dificuldade para delimitar seu conteúdo semântico, sua compreensão é primordial no Estado Democrático de Direito. Pode-se dizer que ela é um dos valores que permeia todo o ordenamento pátrio.

Na CF/88, a cabeça do artigo 5º – primeiro artigo do título “Dos Direitos e Garantias Fundamentais – estabelece que todos “são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (...)”, e no inciso I do mesmo artigo o constituinte o reiterou, in verbis: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta constituição.”, tais preceitos estabelecem a chamada igualdade formal, que conforme Canotilho significa “Ser igual perante a lei não significa apenas aplicação igual da lei. A lei, ela própria, deve tratar por igual todos os cidadãos. O princípio da igualdade dirige-se ao próprio legislador, vinculando-o à criação de um direito igual para todos os cidadãos. ”[27]

Destarte, a lei não pode estabelecer privilégios ou perseguições, seu papel é de regulador da vida social, com o dever de tratar todos de forma equânime, este é seu conteúdo juridicizado pela constituição, e assimilado por todo o ordenamento jurídico.[28] Ainda que sejam inescusáveis essas proibições, com elas pouco se delimita o conteúdo jurídico do referido mandamento, isto é, para além da proibição de diferenciações odiosas, em que consiste, de fato, o princípio da igualdade?

Por certo, não é suficiente o aforismo atribuído a Aristóteles de que igualdade é tratar os iguais na medida de sua igualdade, visto que, em verdade, tal assertiva pouco diz, ou esclarece. Não se quer afastar sua validade, haja vista que, como observa Robert Alexy “A igualdade de todos em relação a todas as posições jurídicas não produziria apenas normas incompatíveis com sua finalidade, sem sentido e injustas; ela também eliminaria as condições para o exercício de competências,”[29] mas adotando-a, surgem os seguintes questionamentos: quem são os iguais? Qual a medida dessa igualdade? Ou seja, tal fórmula não pode ser tomada como chegada – fim -, mas sim como norte para delinear o conteúdo semântico da igualdade.[30]

Ressalte-se que a isonomia não possui um significado supra-positivo, ou mesmo um núcleo irredutível, absoluto[31], pois como se vê na obra de Platão a escravidão era aceita e o mesmo dividia a sociedade em castas, conforme sua célebre obra “A República”, mais recente, o mundo ocidental adotou a escravidão por questões raciais, com isso, fica claro que isonomia é um conceito sempre cambiante, e, por conseguinte, seus traços fundamentais estão instituídos no direito positivo.

Nesse diapasão, a igualdade - princípio estruturante do Estado Democrático -, de inicio, é vista sob o aspecto formal[32], na qual os homens nascem iguais e permanecem livres e iguais em direitos. Essa forma de igualdade é forjada sob a ideologia liberal-burguesa do século XVIII e é indissociavelmente ligada a concepção de liberdade.[33]

Essa igualdade formal vincula tanto o aplicador do direito - no sentido de que as leis devem ser aplicadas sem se olhar as pessoas, haja vista que todos são iguais perante ela – como também o legislador[34], ou seja, não só a aplicação da lei deve ser igual, mas também, na sua feitura, deve tratar por igual todos os cidadãos.

Não obstante, a igualdade formal não é suficiente, haja vista que o conceito de igualdade é relacional, e por isso, cambiante, ou seja, não há igualdade em si, os homens possuem diferenças inerentes a sua condição humana, estas são de forma variadas: diferenças físicas, de idade, de sexo, sociais, de aptidões etc. Por isso, deve-se, para além da concepção liberal, buscar um conceito substantivo de igualdade, o qual será de vital importância para o presente trabalho, visto que esse princípio é limite instransponível para a concessão legitima e constitucional dos benefícios tributários.

De fato, para falar em igualdade, carece se de ao menos dois seres (ou objeto, em sentido lato), pois ela é, necessariamente, relacional, isto é, precisa de comparação. Ressalte-se que só é possível falar em igualdade[35] na presença de diferenças, posto que na inexistência absoluta destas, tem-se a identidade: o mesmo ser ou objeto. Seguindo essa perspectiva relacional do conceito de igualdade, e tomando o precitado aforismo aristotélico como índice temático – tratar os iguais igualmente, na medida da sua igualdade – Alexy sugere que dois critérios sejam usados para aplicação do referido princípio: “Se houver uma razão suficiente para a permissibilidade de um tratamento desigual, então, o tratamento igual é obrigatório; se houver uma razão suficiente para o dever de um tratamento desigual, então, o tratamento desigual é obrigatório.”[36]

Assim, pode-se afirma que a isonomia é ligada ao discrímen que a legitima, ou seja, desde que se atente para a razão pela qual ele é legítimo e em outro caso não o é, ter-se-á como clara a compreensão da isonomia[37]. Com isso, afasta-se o mero “tratar os desiguais de forma desigual, na medida de sua desigualdade”, tendo em vista que não é o tratamento desigual em si que dá conteúdo a igualdade, este tem que ter por escopo aproximar as desigualdades, compensando-as, quando possível, haja vista que o preceito não pode instituir situações odiosas, muito pelo contrário, deve, isto sim, buscar uma compensação de desigualdade de oportunidades.

Portanto, para identificar a observância ou não da isonomia, conforme lapidar síntese de Celso Antônio, a igualdade tem que alcançar duplo objetivo, in verbis:

Tem-se que investigar, de um lado, aquilo que é adotado como critério discriminatório; do outro lado, cumpre verificar e há justificativa racional, isto é, fundamento lógico, para, à vista do traço desigualador acolhido, atribuir o específico tratamento jurídico construído em função da desigualdade proclamada. Finalmente, impende analisar se a correlação ou fundamento racional abstratamente existente é, in concreto, afinado com os valores prestigiados pelo sistema normativo constitucional. A dizer: se guarda ou não harmonia com eles.[38]

Com o exposto, fica evidente que toda atividade do Estado tem como uma de suas balizas a isonomia e, por conseguinte, ela – a isonomia – também delimita a concessão de benefícios tributários[39]. Por isso, toda norma concessiva deve tê-la como limite, e, necessariamente, como objetivo.

No que concerne ao aspecto limitativo da isonomia na realização de gastos fiscais, tem-se que, conforme antes esposado de forma genérica, ela atua como limitadora na elaboração de normas cujo escopo seja de instituir benefícios tributários, haja vista que a regra é a tributação. Inclusive, como mencionado no primeiro capítulo, pagar tributos consiste em dever fundamental[40].

Assim, no processo de elaboração de instrumentos normativos que concedem os referidos benefícios, deve ser observado se estes possuem como critério de justificação os valores prestigiados pelo constituinte, como erradicação da pobreza, redução das desigualdades regionais e sociais, desenvolvimento nacional, entre outros, explicita ou implicitamente positivados na Carta Magna brasileira.

Ademais, esse primeiro requisito, de compostura formal, tem o condão de racionalizar/limitar, com um aspecto objetivo, a dispensa de receita devida, haja vista que afasta o clientelismo e arbítrio no uso desse instrumento de justiça/fomento social.

Outrossim, além da observância em abstrato da conformação do benefício fiscal com a isonomia, deve-se, também, verificá-lo in concreto. Pois, como antes demonstrado, a escolha de um critério de discriminação deve ser adequado e racional no que concerne ao critério desigualador, ou seja, este vai ser o índice de aferição da legitimidade do tratamento diferenciado, pois não é demasiado lembrar que a regra é a tributação, que é indicativo de uma isonomia substancial na mediada em que o dever de pagar tributos representa a capacidade econômica do contribuinte.[41]

Com efeito, a despesa fiscal não pode albergar privilégios odiosos[42], nos quais ao invés do interesse público, prestigie o de pequenos grupos, haja vista que, quando se efetua a renúncia de receita, o Estado deve, sempre, buscar o interesse público, ainda que, em regra, também beneficie certos indivíduos de forma direta. Por isso, deve se buscar uma adequação material por meio de uma aferição em cada caso de concessão de cada benefício.

Nessa linha, tomando o Programa Universidade para Todos – PROUNI[43] – pode-se observar que o aspecto formal é obedecido, na medida em que, no preceito geral, assegura a todas instituições de nível superior da iniciativa privada que preencherem os requisitos a isenção de vários tributos[44]. Assim, como limite formal, é preenchido o critério, que nesse caso é o oferecimento de uma bolsa a cada 10 (dez) alunos pagantes regulamente matriculados.

No que concerne ao aspecto material, pode-se aferir se prestação do serviço público por parte de cada instituição atende a um nível mínimo, ou seja, se o ensino oferecido pelo Estado de forma mediata supre as carências educacionais da parcela da sociedade a qual se insere nos critérios do programa.

Outro aspecto que serve de índice para aferir a legitimidade, no caso em comento, é observar a população contemplada, posto que o referido programa utiliza a renda per capita como requisito de acesso ao PROUNI[45], combinada com o requisito de mérito, haja vista que é feita uma prova nacional cuja a nota, uma vez estando dentro da faixa econômica do programa, serve como meio de escolha dos candidatos.

Vê-se, pois, que a despesa fiscal é um forte instrumento para assegurar a igualdade, desde que para além de observar seu limite formal, o qual proíbe a descriminação por meio de legislação discriminatória, seja capaz de implementar estratégias promocionais, com o escopo de inserir grupos socialmente vulneráveis nos espaços sociais, ou seja, não é suficiente proibir a discriminação, quando o que se pretende é garantir a igualdade de fato[46].

A não observância do princípio da igualdade na renúncia de receitas[47] acentua as desigualdades e injustiças sociais, e, por conseguinte, se afasta dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. Por isso, conforme escólio de Manoel Cavalcante:

A isonomia assegura ao contribuinte que esteja em situação similar a igualdade de tratamento e, sendo assim, implica um direito de exigir do Estado que, por regra, se abstenha de criar discriminações, somente admitindo-se aquelas justificadas constitucionalmente pela capacidade contributiva ou extrafiscalidade que ficam sujeitas ao controle judicial.[48]

Portanto, na concessão de benefício tributário, este com feições de despesas para o ente público: despesa fiscal, deve se observar o princípio da isonomia, tanto no seu aspecto formal, como no material, pois tais receitas cessantes devem cumprir seu papel social, ou seja, atingir os objetivos fundamentais estabelecidos pelo constituinte. Assim, vê-se que o princípio da igualdade serve como parâmetro de controle das despesas fiscais (ou benefícios tributário, este sob a ótica do contribuinte), na medida em que balizará sua realização.


3.3. Formas de Controle das Despesas Fiscais (Benefícios Tributários).

No Estado de Direito, têm-se diversos meios de controle no afã de manter a atuação dos agentes públicos dentro dos preceitos normativos. Em relação às despesas fiscais não é diferente. Podem-se elencar as seguintes formas de controle: a legislativa, a realizada pelos tribunais de contas, a judicial e a realizada pela população. A seguir, serão tecidas notas breves sobre cada forma de controle.

A primeira forma de controle tratada será a legislativa[49]. Este controle pode ser dividido em dois momentos: o da feitura da lei (em seu sentido largo) que concede dado benefício e o de acompanhamento na implementação dos benefícios tributários. Na primeira hipótese, o legislador deve observar as sobre-normas que regulam o processo legislativo referente à concessão de benefícios tributários, além de aferirem a compatibilidade com os fins positivados na Constituição.

A outra maneira de controle efetuada pelo parlamento é o acompanhamento da implementação dos benefícios fiscais. Nesse controle, é verificado o impacto orçamentário gerado por dado benefício, se este está cumprindo com seus objetivos, além de comparar o que seria mais efetivo: gastar o recurso diretamente ou implementá-lo indiretamente por meio de despesa fiscal. Como exemplo dessa forma de atuação, tem-se a Proposta de Fiscalização e Controle nº 66[50], da lavra do Dep. Luiz Carlos Hauly, oriunda da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados. Esta proposta solicitava uma análise sobre o impacto das renúncias de receitas da União para os exercícios de 1997 a 2001 ao Tribunal de Contas da União.

O escopo da análise supramencionada era responder as seguintes perguntas: 1) Qual o montante da renúncia de receitas nos exercícios de 1997 a 2001, tanto em valores quanto em percentual do PIB e do total de receitas arrecadadas, incluídas as tributárias e as contribuições?; 2) Como tem se comportado tais renúncias em relação as previsões contidas nas leis orçamentárias?; 3) Em ralação à estimativa contida na lei orçamentária para 2003, como se encontra a mesma em relação ao executado até o momento da auditoria?; 4) A renúncia de receitas da União tende a manter-se em queda nos próximos anos, tornando possível maior alocação de recursos para outras prioridades como o aumento do salário mínimo?.

Das perguntas acima transcritas, vê-se que o parlamento possui vários parâmetros para aferir a legitimidade das receitas renunciadas, desde o seu impacto orçamentário até a eleição de outras prioridades, que poderiam ser implementadas com a cessação dessas renúncias, verbi gratia, o aumento do salário mínimo.

Assim, o parlamento tem uma função crucial no controle desse tipo de despesa, haja vista que, além de instituir as medidas legislativas, também faz um controle de legitimidade, e, por conseguinte, de escolha de prioridades. Ademais, como poder auscultador dos anseios sociais que é, deve, sempre, comparar a efetividade e eficiência dessa forma de gasto, isto é, mensurar se seria mais proveitoso a comunidade o gasto direto, ou essa forma indireta, no que concerne a concretização do interesse público.

Com a Constituição de 1988[51], os tribunais de contas ganharam um papel de relevo no que concerne ao controle do dinheiro público, por isso, ressalta-se, aqui, a relevância desse controle em relação às despesas fiscais, haja vista que deve haver um controle efetivo sobre os mecanismos de renúncia de receita, tanto no âmbito legal, quanto em relação à eficiência, economicidade, eficácia, e efetividade por meio de desse Órgão de controle externo com auditória operacional.[52]

Nesse diapasão, os tribunais de contas têm papel central como órgãos de controle na concessão de benefícios fiscais, haja vista que, conforme a dicção do parágrafo único do artigo. 70 da CF/88:

Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária

Com efeito, vê-se que atuação das cortes de contas são imprescindíveis para o controle, e, por conseguinte, para as correções na realização das despesas tributárias. Como demonstração dessa espécie de controle, cite-se o Acórdão nº 1.060/2005 – Tribunal de Contas da União – TCU – Plenário; relator Min. Valmir Campelo, no qual foi determinado à secretária da Receita Federal do Brasil que efetuasse certas correções em relação à confecção do demonstrativo de benefícios fiscais que compõe a lei orçamentária[53].

Outra forma de controle de despesas fiscais é a judicial, haja vista que, no Brasil, vigora o sistema de jurisdição única, de sorte que assiste exclusivamente ao Poder Judiciário decidir em definitivo qualquer controvérsia que envolva a interpretação/aplicação do direito no caso concreto, por isso, o Judiciário é legitimado, quando provocado, a exercer controle sobre a legalidade e adequação de benefícios fiscais.

Essa espécie de controle tem como principal característica ser, eminentemente, repressivo, haja vista que os órgãos judiciais não participam no processo de concessão dos benefícios tributários. Como fundamento desse controle tem-se a inafastabilidade da jurisdição[54]. Discorrendo sobre os benefícios fiscais, anota Manoel Cavalcante:

É certo que os benefícios fiscais refletem um modo de tratamento diferenciado para um determinado grupo ou categoria de contribuintes e isso tem provocado questionamentos judiciais acerca do fundamento da discriminação e sua pertinência com a isonomia tributária, especialmente para procurar estendê-los a outros contribuintes que estejam em situação igual ou semelhante.[55](negrito não consta no original)

Ponto tormentoso nesta espécie de controle é da possibilidade do poder judiciário estender benefícios fiscais a outros grupos/contribuintes não contemplados, mas em situação semelhante aos contemplados, sob o argumento de garantir a isonomia.

Em defesa da impossibilidade da concessão de benefícios tributários por meio de decisões judiciais, alega-se a separação dos poderes, isto é, se o judiciário estendesse certo benefício para outros contribuintes estaria agindo como legislador positivo, e, portanto, ferindo a partição dos poderes. Essa linha é predominante no Supremo Tribunal Federal[56][57].

Os adeptos da possibilidade de extensão de benefícios[58] amparam sua posição no princípio da igualdade. Nessa linha pode-se citar o Min. Gilmar Mendes, para quem seria possível uma atuação positiva, ou seja, o Judiciário poderia estender benefícios que em si não fossem inconstitucionais[59] para contribuintes não contemplados, mas em situação análoga.

Ademais, haveria uma autorização para atuação positiva do judiciário extraída da Carta Maior, quando estivessem em debate os direitos e garantias fundamentais, como é o caso da norma que impõe isonomia, e, especialmente, no caso da isonomia tributária.[60] Corroborando com esta linha, Marciano Seabra anota que:

Uma vez verificado que a arbitrariedade está não na própria existência do benefício fiscal, mas sim na vedação deste ser usufruído por determinadas categorias de indivíduos na mesma situação contemplados pela lei, a solução mais razoável parece mesmo a da extensão do benefício, sem que se possa falar em desempenho de papel de legislador positivo, pois então estará em jogo o ferimento de um direito fundamental cuja reparação não pode ficar à mercê de considerações formais.[61](negrito não consta do original)

Com a devida vênia, não parece acertado a ampliação de gastos tributários, rectius, benefícios fiscais por meio da atuação judicial, visto que a dispensa [62]de receitas repercute na feitura do orçamento – para além do argumento da reserva de lei -, e, por conseguinte, na satisfação das necessidades públicas, ou seja, atingem a satisfação de outros direitos fundamentais.

Outrossim, o aspecto formal não deve ser tratado como segundo plano, o ordenamento jurídico é formal, e esta, a forma, é uma garantia, além de ser um instrumento racionalizador do sistema de direito positivo. E, por isso, o Estado-Juiz teria como barreira o art. 14 da LRF, haja vista que não terá como preencher seu o suporte fático da referida norma por meio de uma decisão judicial.

Então, ante a concessão de benefícios fiscais, quando o judiciário for chamado a se manifestar, se eles tiverem caráter de privilegio (diferenciações odiosas, injustificadas) deve ser declarada sua nulidade, se não, não poderá o juiz estender o benefício sob pena de destruturar o sistema financeiro positivado pela constituição de 1988. Cabe frisar que, sempre, deve o juiz verificar se as renúncias de receitas obedeceram aos preceitos constitucionais e os do art. 14 da LRF; caso não haja adequação deverá declarar a nulidade da norma que estabelece o benefício.

Por último, tem-se a ação popular[63] como instrumento hábil para anular a realização de despesas fiscais quando lesiva ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ou seja, por meio dessa ação de status constitucional pode o qualquer cidadão provocar a atuação do judiciário com o escopo de aferir a legitimidade e a adequação de despesas fiscais, protegendo, assim, bens como patrimônio público, a moralidade administrativa, etc.

Sem a pretensão de esgotar as formas de controle em relação às despesas fiscais, foi feito um esboço sobre os meios de verificar a legitimidade e legalidade desse tipo de gasto, cujo escopo é abolir clientelismos e favorecimentos incompatíveis com o ordenamento jurídico pátrio, haja vista que esses recursos abdicados pelo Estado devem ser revertidos em proveito do interesse público, satisfazendo-o, ainda que de forma indireta. Isso só será possível com a intensificação da atuação dos órgãos de controle, bem como pela observância dos preceitos estabelecidos na Lei Complementar nº 101/2000, a qual, como já mostrado, traz requisitos racionalizadores e de ordem cogente no que concerne à renúncia de receita, ou seja, ela instrumentaliza a realização das despesas fiscais.


Notas

[1]DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. Tradução brasileira. São Paulo: Martins Fontes, 2002, pag. 36.

[2]COMPARATO, Fábio Konder. Ensaio sobre o juízo de constitucionalidade das políticas públicas, in Revista dos Tribunais, ano 86, vol. 737. São Paulo: RT, 1997, pag. 11.

[3]VILANOVA, Lourival. Fundamentos do Estado de Direito. In Doutrinas Essenciais: Direito Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, pag. 567.

[4]APPIO. Eduardo. Controle Judicial das Políticas Públicas no Brasil. Curitiba: Juruá, 2005, pag.136.

[5]Op. Cit. pag. 567.

[6]Como observa Régis Fernandes de Oliveira, “Quem define as necessidades públicas é a Constituição e as leis a que a complementam. A definição é jurídica e depende do momento histórico. Não existem necessidades indefinidas, etéreas e que ficam ao sabor dos literatos.” In Curso de Direito Financeiro. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, pag. 69.

[7]DOMIGUES, José Marcos. Tributação, Orçamento e Políticas Públicas. In Revista Tributária e de Finanças

Públicas 2011, nº 99. São Paulo: Revista dos Tribunais, pag. 193

[8] Pois como bem adverte Lourival Vilanova; “Nunca o direito, como sistema total, ou como sistemas parciais, produz matéria social. São os interesses, no sentido mais largo da palavra, são os interesses humanos que explicam as relações de família, são os fatos econômicos que se desdobram nos atos de comércio, nas relações produção, de consumo, de troca, são eles que condensam institucionalmente, na micro ou macroempresa, e são eles de onde procedem as motivações várias da conduta humana. Do plano desses fatos é que se parte para articular as teorias da personalidade, da relação jurídica, da responsabilidade objetiva ou subjetiva.” In VILANOVA, Lourival. Fundamentos do Estado de Direito. In Doutrinas Essenciais: Direito Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, pag. 569.

[9]Op. Cit., pag. 569.

[10]VILANOVA, Lourival. As Estruturas Lógicas e o Sistema de Direito Positivo. 4ª ed. São Paulo: Noeses, 2010, pag. 41.

[11]BUCCI, Maria Paula Dallari. Buscando um Conceito de Políticas Públicas para a Concretização dos Direitos Humanos. São Paulo: Pólis, 2001, pag. 15.

[12]Op. Cit. pag. 569.

[13]DOMIGUES, José Marcos. Tributação, Orçamento e Políticas Públicas. In Revista Tributária e de Finanças Públicas 2011, nº 99. São Paulo: Revista dos Tribunais, pag. 194.

[14]BRASIL. Decreto nº 5.090/2004.

Art. 1o Fica instituído o Programa "Farmácia Popular do Brasil", que visa a disponibilização de medicamentos, nos termos da Lei no 10.858, de 13 de abril de 2004, em municípios e regiões do território nacional.

[15]BRASIL. Lei nº 11.096/2005

Art. 1o Fica instituído, sob a gestão do Ministério da Educação, o Programa Universidade para Todos - PROUNI, destinado à concessão de bolsas de estudo integrais e bolsas de estudo parciais de 50% (cinqüenta por cento) ou de 25% (vinte e cinco por cento) para estudantes de cursos de graduação e seqüenciais de formação específica, em instituições privadas de ensino superior, com ou sem fins lucrativos.(...). Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/Lei/L11096.htm>. Consulta em 17 mar. 2012.

[16]Artigo 8º da Lei nº 11.096/2005.

[17]Conforme dados disponibilizados no sítio: www.mec.gov.br, no ano de 2012 foram oferecidas 108 mil vagas pelo sistema SISU, já o PROUNI em 2011 ofereceu 162 mil vagas no primeiro semestre e 92 mil no segundo.

[18]As formas de controle da realização da despesa fiscal serão desenvolvidas no último item do presente capítulo.

[19]Cabe enfatizar que o presente trabalho, como demonstrado no primeiro capítulo, não adota a separação dos direitos fundamentais em prestacionais e não prestacionais, haja vista que pelo aspecto financeiro todos têm custos para o Estado.

[20]Cabe ressaltar que é inolvidável que os benefícios fiscais (despesas fiscais) são instrumentos de fomento da economia, de desenvolvimento ambiental e urbanístico etc., mas, como cerne tem-se as necessidades públicas, estais entendidas como os bens que o Estado se comprometeu a oferecer.

[21]Como também já fora dito essa pretensa dicotomia entre direitos fundamentais é forjada sob uma perspectiva liberal, na qual quer sobrepor certos direitos a outros.

[22]BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campos, 1992, pag. 32.

[23]CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed. Coimbra: Almedina, 2003, pag.377.

[24]OLIVEIRA, Régis Fernandes. Curso de Direito Financeiro. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, pag. 68.

[25]Por todos, fazendo um escorço histórico sobre o aparecimento dos direitos fundamentais, LIMA NETO, Manoel Cavalcante de. Direitos Fundamentais dos Contribuintes. Recife: Nossa Livraria, 2005. pag. 53/58.

[26]TORRES, Ricardo Lobo. Os Direitos Humanos e a Tributação – imunidades e isenções. Rio de Janeiro: Renovar, 1995, pag. 260.

[27]CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed. Coimbra: Almedina, 2003, pag.563.

[28]MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3ª ed. 20ª tiragem. São Paulo: Malheiros Editores, 2011, pag.10.

[29]ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução: Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Editores Malheiros, 2008, pag. 396.

[30]Op. Cit. pag. 11.

[31]Bem observa Alexy que não existe uma igualdade ou uma desigualdade em relação a todos os aspectos (igualdade/desigualdade fática universal) entre indivíduos e situações humanas, e visto que uma igualdade (desigualdade) fática parcial em relação a algum aspecto não é suficiente para aplicação da fórmula aristotélica. Op. Cit. pag.400.

[32]Conforme anota Daniel Sarmento: “na leitura estritamente individualista, a igualdade jurídica é mera igualdade formal, como recusa a qualquer pretensão de utilização para fins redistributivos.” In Livres e Iguais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, pag. 63.

[33]CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed. Coimbra: Almedina, 2003, pag. 426.

[34]Discorrendo sobre o tema, Francisco Campos anota que “Assim, não poderá subsistir qualquer dúvida quanto ao destinatário da cláusula constitucional da igualdade perante a lei. O seu destinatário é, precisamente, e, em conseqüência, a legislação; por mais discricionários que possam ser os critérios de política legislativa, encontra no princípio da igualdade a primeira e mais fundamental de suas limitações.” In Direito Constitucional. Vol. II. São Paulo: Freitas Bastos, pag. 30.

[35] “Com esses pregadores da igualdade é que eu não quero ser misturado e nem confundido. Porque a justiça me fala assim: “Os homens não são iguais”. Não devem tampouco chegar a sê-lo”. In NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Assim Falava Zaratustra. Tradução: Ciro Mioranza. São Paulo: Escala, 2006, pag. 95.

[36]ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução: Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Editores Malheiros, 2008, pag. 421/422.

[37]MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3ª ed. 20ª tiragem. São Paulo: Malheiros Editores, 2011, pag.12.

[38]MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3ª ed. 20ª tiragem. São Paulo: Malheiros Editores, 2011, pag. 22.

[39] “Daí que o actual problema constitucional dos benefícios fiscais se localize na sua admissibilidade ou não, mas antes nos limites dentro dos quais podem ser admitidos, trata-se dos limites formais ou de limites materiais ou substanciais.” In NABAIS, José Casalta. O Dever Fundamental de Pagar Impostos. Coimbra: Almedina, 1998, pag. 640.

[40] O dever de pagar impostos apresenta-se como um dever fundamental que tem sua disciplina traçada na Constituição, num contraponto com os direitos que ela assegura. É curial que, para a consecução de seus objetivos institucionais, o Estado dependa de recursos a serem exigidos dos cidadãos. In Manoel Cavalcante de. Direitos Fundamentais dos Contribuintes. Recife: Nossa Livraria, 2005. pag. 30/31.

[41]LIMA NETO, Manoel Cavalcante. Direitos Fundamentais dos Contribuintes: Limitações ao Poder de Tributar. Recife: Nossa Livraria, 2005, pag. 192/193.

[42]Não é incomum ocorrer no Brasil à concessão de isenções e outros tratamentos tributários privilegiados no que concerne à tributação como resultado de pressões exercidas por grupos de interesses, que, por vezes, são financiadores de campanhas eleitorais, com escopo de favorecimento próprio.

[43]Institucionalizado pela Lei n° 11.096, de 13 de janeiro de 2005, que, como antes demonstrado, é destinado à concessão de bolsas de estudo integrais e parciais para cursos de graduação e seqüenciais de formação específica, em instituições privadas de ensino superior, com ou sem fins lucrativos, a estudantes que tenham cursado o ensino médio completo na rede pública de ensino ou em instituições privadas com bolsa integral; aos estudantes portadores de deficiência; e aos professores da rede pública de ensino, para determinados cursos destinados à formação do magistério da educação básica. Tal lei, ainda, prevê que a instituição de ensino superior, ao aderir ao PROUNI, adote um termo de adesão onde conste a cláusula da reserva de percentual de bolsas de estudo destinado à implementação de políticas afirmativas de acesso ao ensino superior de portadores de deficiência ou de auto-declarados indígenas e negros

[44] Nos termos do art. 8ª da Lei n° 11.096/2005 , as instituições de ensino que aderirem ao PROUNI ficam isentas de uma série de tributos federais, dentre eles: o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social e Contribuição para o Programa de Integração Social

[45]Os limites do presente trabalho não permitem uma discussão sobre a legitimidade desse trespasse da educação superior por meio do referido programa, mas cabe anotar que, embora ele – PROUNI – minimize a desigualdade de oportunidades no que concerne ao acesso à educação superior, pode gerar uma acentuada disparidade entre profissionais formados por estas instituições que aderem ao programa aos egressos de universidades propriamente públicas.

[46]PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. 2ª ed. São Paulo: Max Limonad, 2003, pag. 199.

[47] Cabe frisar que, por vezes, tais renúncias, quando não respeitam a isonomia, ofendem o próprio pacto federativo, na medida em que geram a famigerada guerra fiscal.

[48]LIMA NETO, Manoel Cavalcante. Direitos Fundamentais dos Contribuintes: Limitações ao Poder de Tributar. Recife: Nossa Livraria, 2005, pag. 199.

[49] Ressalte-se que este, como todas as outras formas de controle, é jurídico, haja vista que tem como parâmetro preceitos positivados no ordenamento jurídico. Tal advertência é cabível, haja vista que, em regra, cita-se esse controle como político.

[50]Acórdão nº 1.060/2005 – Tribunal de Contas da União – TCU - Plenário.

[51]BRASIL. CF/88.  Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.

[52] SOMAVILLA, Jaqueline Lara & LOBATO, Paulo Henrique Bese. A Concessão de anistias e incentivos fiscais e importância do controle da renúncia de receita pelo tribunal de contas. In Revista do Tribunal de Contas do Estado Minas Gerais. Jan/fev/mar 2009, v. 70- n.1 – ano XXVII, pag. 69.

[53] III - Propostas de Encaminhamento:

Diante de todo exposto, propõe-se ao Tribunal que formule deliberação no sentido de:

1 - Determinar à Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda:

incluir no demonstrativo de benefícios tributários para o ano de 2006 todos os benefícios tributários, contidos nos dispositivos legais a seguir descriminados, concedidos ao contribuinte por conta de normas concessivas de renúncia de receita, conforme estabelecido no § 6º do art. 150 da Constituição Federal (item 5.1);

1.1- art. 2º da Lei nº 10.996/2004;

1.2- § 4º do art. 2º, inciso I do § único do art. 25, inciso I do art. 50 e art. 91 da Lei nº 10.833/2003;

1.3- todos os incisos do art. 1º da Lei º 10.925/2004;

1.4- § 2º do art. 14º da Lei º 11.033/2004

1.5- incisos III e IV do art. 8º da Lei nº 11.096/2005.

[54] BRASIL. CF/88. Artigo 5º (...):

(...);

XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

[55] LIMA NETO, Manoel Cavalcante. Direitos Fundamentais dos Contribuintes: Limitações ao Poder de Tributar. Recife: Nossa Livraria, 2005, pag. 194.

[56] EMENTA: TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÃO DE CÂMBIO. IOF. ISENÇÃO. APLICAÇÃO CONDICIONADA À DATA DE EMISSÃO DA GUIA DE IMPORTAÇÃO. VIOLAÇÃO DA ISONOMIA. IMPOSSIBILIDADE DE O JUDICIÁRIO ATUAR COMO LEGISLADOR POSITIVO. ART. 6º DO DECRETO-LEI 2.434/1988. ARTS. 5º, CAPUT E I, 145, § 1º E 150, II DA CONSTITUIÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. Segundo orientação firmada por esta Corte, o Judiciário não pode atuar como Legislador Positivo. In AI 333040 AgR, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 07/12/2010, DJe-020 DIVULG 31-01-2011 PUBLIC 01-02-2011 EMENT VOL-02454-04 PP-00867. (negrito não consta no original)

[57] EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. ALÍQUOTAS DIFERENCIADAS. ISONOMIA. EQUIPARAÇÃO OU SUPRESSÃO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. 1. A declaração de inconstitucionalidade dos textos normativos que estabelecem distinção entre as alíquotas recolhidas, a título de contribuição social, das instituições financeiras e aquelas oriundas das empresas jurídicas em geral teria como conseqüência normativa ou a equiparação dos percentuais ou a sua supressão. Ambas as hipóteses devem ser afastadas, dado que o STF não pode atuar como legislador positivo nem conceder isenções tributárias. Daí a impossibilidade jurídica do pedido formulado no recurso extraordinário. Agravo regimental a que se nega provimento. (negrito não consta do original) In (AI 630997 AgR, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 24/04/2007, DJe-018 DIVULG 17-05-2007 PUBLIC 18-05-2007 DJ 18-05-2007 PP-00107 EMENT VOL-02276-37 PP-07547) (negrito não consta no original)

[58] O STF tem decisões que mitigam a reserva de lei em alguns casos, como, por exemplo: EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS E MILITARES. REVISÃO DE VENCIMENTOS. ISONOMIA. 1. O Pleno do STF, ao julgar o RMS nº 22.307/DF, DJ de 13.06.97, estendeu aos servidores públicos civis o reajuste de 28,86% concedido aos militares, com fundamento no inciso X do artigo 37 da Constituição nº 19/98. 2. Posteriormente, em embargos de declaração, admitiu-se a compensação do reajuste concedido a algumas categorias funcionais. Recurso provido.

[59] “Se o legislador conceder isenções ou quaisquer outros benefícios fiscais ou financeiros que não sejam razoáveis diante dos princípios da capacidade contributiva, da redistribuição de rendas, do desenvolvimento econômico, etc. terá praticado ato suscetível de anulação. Não cabe, absolutamente, cogita-seda extensão de privilégio odioso a terceiros, a pretexto de garantir a isonomia.” TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário: Os direitos humanos e a tributação: imunidades e isonomia. Vol. 3. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, pag. 369.

[60] LIMA NETO, Manoel Cavalcante. Direitos Fundamentais dos Contribuintes: Limitações ao Poder de Tributar. Recife: Nossa Livraria, 2005, pag. 197.

[61] GODOI, Marciano Seabra. Justiça, Igualdade e Direito Tributário. São Paulo: Dialética, pag. 229.

[62] BRASIL. CF/88

Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:

(...)

 § 6º - O projeto de lei orçamentária será acompanhado de demonstrativo regionalizado do efeito, sobre as receitas e despesas, decorrente de isenções, anistias, remissões, subsídios e benefícios de natureza financeira, tributária e creditícia.

[63] BRASIL. CF/88.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes

(...)

LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;


Autor


Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelo autor. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.