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Jurisprudência comentada: STJ - 4ª Turma - Danos morais - Legitimidade "ad causam" - Noivo - Morte da nubente

Jurisprudência comentada: STJ - 4ª Turma - Danos morais - Legitimidade "ad causam" - Noivo - Morte da nubente

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Analisa-se aresto da 4ª Turma do STJ, em que foi negada ao noivo verba indenitária pleiteada em razão da morte de sua noiva.

EMENTA:Quarta Turma - DANOS MORAIS. LEGITIMIDADE AD CAUSAM. NOIVO. MORTE DA NUBENTE.

A Turma, ao prosseguir o julgamento, após voto-vista que acompanhou o relator, deu provimento ao recurso especial para restabelecer a sentença que extinguiu o processo sem julgamento do mérito, por considerar que o noivo não possui legitimidade ativa ad causam para pleitear indenização por danos morais em razão do falecimento de sua nubente. Inicialmente, destacou o Min. Relator que a controvérsia em exame – legitimidade para propor ação de reparação por danos extrapatrimoniais em decorrência da morte de ente querido – apesar de antiga, não está resolvida no âmbito jurisprudencial. Entretanto, alguns pontos vêm se firmando em recentes decisões judiciais. De fato, não há dúvida quanto à legitimidade ativa do cônjuge, do companheiro e dos parentes de primeiro grau do falecido. Da mesma forma, é uníssono que, em hipóteses excepcionais, o direito à indenização pode ser estendido às pessoas estranhas ao núcleo familiar, devendo o juiz avaliar se as particularidades de cada caso justificam o alargamento a outros sujeitos que nele se inserem. Nesse sentido, inclusive, a Turma já conferiu legitimidade ao sobrinho do falecido que integrava o núcleo familiar, bem como à sogra que fazia as vezes da mãe. Observou o Min. Relator que, diante da ausência de regra legal específica acerca do tema, caberia ao juiz a integração hermenêutica. Após um breve panorama acerca das origens do direito de herança e da ordem de vocação hereditária, e à vista de uma leitura sistemática de diversos dispositivos de lei que se assemelham com a questão em debate (art. 76 do CC/1916; arts. 12, 948, I, 1.829, todos do CC/2002 e art. 63 do CPP), sustentou-se que o espírito do ordenamento jurídico brasileiro afasta a legitimação daqueles que não fazem parte do núcleo familiar direto da vítima. Dessarte, concluiu-se que a legitimação para a propositura da ação por danos morais deve alinhar-se à ordem de vocação hereditária, com as devidas adaptações, porquanto o que se busca é a compensação exatamente de um interesse extrapatrimonial. Vale dizer, se é verdade que tanto na ordem de vocação hereditária quanto na indenização por dano moral em razão da morte, o fundamento axiológico são as legítimas afeições nutridas entre quem se foi e quem ficou, para proceder à indispensável limitação da cadeia de legitimados para a indenização, nada mais correto que conferir aos mesmos sujeitos o direito de herança e o direito de pleitear a compensação moral. Porém, a indenização deve ser considerada de modo global para o núcleo familiar, e não a cada um de seus membros, evitando-se a pulverização de ações de indenização. Segundo se afirmou, conferir a possibilidade de indenização a sujeitos não inseridos no núcleo familiar acarretaria a diluição indevida dos valores em prejuízo dos que efetivamente fazem jus à reparação. Acrescentou-se, ainda, o fato de ter havido a mitigação do princípio da reparação integral do dano, com o advento da norma prevista no art. 944, parágrafo único, do novo CC. O sistema de responsabilidade civil atual rechaça indenizações ilimitadas que alcançam valores que, a pretexto de reparar integralmente vítimas de ato ilícito, revelam nítida desproporção entre a conduta do agente e os resultados ordinariamente dela esperados. Assim, conceder legitimidade ampla e irrestrita a todos aqueles que, de alguma forma, suportaram a dor da perda de alguém significa impor ao obrigado um dever também ilimitado de reparar um dano cuja extensão será sempre desproporcional ao ato causador. Portanto, além de uma limitação quantitativa da condenação, é necessária a limitação subjetiva dos beneficiários nos termos do artigo supracitado. No voto-vista, registrou a Min. Maria Isabel Gallotti não considerar ser aplicável a ordem de vocação hereditária para o efeito de excluir o direito de indenização dos ascendentes quando também postulado por cônjuge e filhos, pois é sabido que não há dor maior do que a perda de um filho, uma vez que foge à ordem natural das coisas. Reservou-se, também, para apreciar quando se puser concretamente a questão referente à legitimidade de parentes colaterais para postular a indenização por dano moral em concorrência com cônjuge, ascendentes e descendentes. Precedentes citados: REsp 239.009-RJ, DJ 4/9/2000, e REsp 865.363-RJ, DJe 11/11/2010. REsp 1.076.160-AM, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 10/4/2012.

Acórdão ainda não disponível. Acesso em 26/04/12.

PRECEDENTES:

CIVILE PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ARTS. 13 E 131 DO CPC E 5º DO CCB. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 211-STJ. INCIDÊNCIA. ILEGITIMIDADEATIVA AFASTADA. SÚMULA N. 7/STJ. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. RESPONSABILIDADE RECONHECIDA PELO TRIBUNAL A QUO. MATÉRIA DE PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7-STJ. DESPESAS COM FUNERAL. FATO CERTO. MODICIDADE. DESNECESSIDADE DE PROVA. VALOR DO DANO MORAL MANTIDO. LIMITEDO PENSIONAMENTO DOS FILHOS. VINTE E CINCO ANOS. INDEPENDÊNCIA PRESUMIDA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. AUSÊNCIA. JUROS MORATÓRIOS. CÁLCULO.

I. "Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo" - Súmula n. 211/STJ.

II. Entendido pelo Tribunal a quo que o preposto da recorrente teve responsabilidade na configuração do dano indenizável, tal circunstância fática não tem como ser reavaliada em sede de recurso especial, ao teor da Súmula n. 7 do STJ.

III. Desnecessidade de comprovação das despesas de funeral para a obtenção do ressarcimento do causador do sinistro, em face da certeza do fato, da modicidade da verba quando dentro dos parâmetros previstos pela Previdência Social e da imperiosidade de se dar proteção e respeito à dignidade humana. Precedentes do STJ.

IV. A pensão é devida aos filhos do de cujus até a idade de vinte e cinco anos, quando presumida pela jurisprudência a independência econômica daquela em relação ao genitor falecido.

V."Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca" - Súmula n. 326/STJ.

VI. Juros moratórios devidos em 6% (seis por cento) ao ano, a partir da citação, observando-se o limite prescrito nos arts. 1.062e 1.063 do Código Civil/1916 até a entrada em vigor do novo Código, quando, então, submeter-se-á à regra contida no art. 406 deste último diploma, a qual, de acordo com precedente da Corte Especial, corresponde à Taxa Selic, ressalvando-se a não-incidência de correção monetária, pois é fator que já compõe a referida taxa.

REsp 865363/RJ, 4ª Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJe 11/11/2010.

STJ - Info. 460 - Quarta Turma - RESPONSABILIDADE. ACIDENTE AÉREO. LEGITIMIDADE. IRMÃO.

Os irmãos têm legitimidade ativa ad causam para pleitear indenização por danos morais decorrentes do falecimento de outro irmão, quanto mais no caso, em que ficou comprovado nas instâncias ordinárias haver fortes laços afetivos entre a vítima e a autora irmã. Anote-se estarem vivos os pais da vítima, os quais celebraram acordo com a companhia aérea ré. Assim, diante das peculiaridades do caso, a indenização foi reduzida para R$ 120 mil acrescidos de correção monetária a partir da data desse julgamento (Súm. N. 362-STJ), além de juros moratórios contados da citação. Por último, ressalte-se que a vítima pereceu em decorrência de conhecido acidente aéreo, o abalroamento de duas aeronaves. Precedentes citados: REsp 876.448-RJ, DJe 21/9/2010; AgRg no Ag 833.554-RJ, DJe 2/2/2009; AgRg no Ag 901.200-RJ, DJ 11/2/2008; REsp 596.102-RJ, DJ 27/3/2006, e REsp 254.318-RJ, DJ 7/5/2001.AgRg no Ag 1.316.179-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/12/2010.

SÍNTESE:

Consoante noticiam os precedentes que serviram de base para o julgamento do REsp 1.076.160-AM, o STJ vincula a legitimidade ativa ad causam para pleitear a reparação de danos morais à presunção relativa de potencialidade danosa da conduta do ofensor ao núcleo familiar direto da vítima. Sendo assim, para a turma julgadora, considerando o disposto no art. 944 do Código Civil, além de uma limitação quantitativa da condenação, deve haver uma limitação subjetiva dos respectivos beneficiários.

COMENTÁRIOS AO JULGADO:

Registro, desde já, minha opinião no sentido de que a Eg. Quarta Turma do STJ andou mal ao não considerar o noivo como sendo parte legítima para pleitear compensação por danos morais em razão da morte da noiva, decorrente de ato ilícito, uma vez que a dinâmica moderna da responsabilidade civil admite o chamado dano moral por ricochete, reflexo ou indireto (préjudice d'affection).

Nada obstante, para fins de exame em concurso público, o candidato deverá se orientar considerando o posicionamento do STJ sobre a matéria, já que as bancas examinadoras exigem do candidato o conhecimento da jurisprudência de nossos tribunais superiores.

De início, cumpre ratificar a posição do órgão julgador no que diz respeito à insolubilidade da questão no âmbito jurisprudencial. Só para se ter uma ideia da dimensão subjetiva e tormentosa revelada pela reparabilidade do dano extrapatrimonial, trago à baila recente julgado do TJMG, reconhecendo a existência de dano moral por morte de animal de estimação:

EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. MORTE. ANIMAL DE ESTIMAÇÃO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. O dano decorrente da morte de animal de estimação causada por terceiro é passível de indenização (Processo nº 1.0610.04.009.092/003 (1), Rel. Des. Generoso Filho, DJ 02/06/2009).

A pergunta que faço ao leitor é: como é possível que a Justiça reconheça a legitimidade de alguém para pleitear compensação contra aquele que causa morte de seu animal de estimação, mas negue legitimidade ao noivo para pedir indenização por ato ilícito que vem a causar a morte de sua noiva?

No que tange às relações afetivas, o atual contexto no qual o direito privado se encontra inserido é marcado exatamente pela afetividade, valor considerado por nossos tribunais superiores para fundamentar recentes decisões no campo do direito de família, como o reconhecimento das uniões homoafetivas, julgada pelo Pleno do STF, e, mais recentemente, em relação ao chamado abandono afetivo, julgado pela Terceira Turma do próprio STJ.

Como restou consignado no aresto em comento, a tendência da Quarta Turma do STJ é no sentido de considerar, mesmo tratando-se de dano moral por ricochete, que a respectiva compensação somente é devida em razão de ato ilícito que cause a morte de alguma das pessoas relacionadas no art. 1.829 do Código Civil, por entender que, nesse caso, é admissível uma presunção (juris tantum) de potencialidade danosa.

No mesmo sentido já decidiu a Segunda Turma daquele tribunal, ao apreciar o REsp 1.101.213-RJ, da relatoria do Min. Castro Meira, julgado em 02/04/2009. No caso, os avós pleiteavam indenização pela morte da neta, ocorrida nas dependências da escola municipal onde estudava. O insigne Ministro destacou em seu voto:

É inegável o abalo emocional sofrido por parentes da vítima em razão da morte tão prematura, absolutamente evitável e em local em que se espera proteção, dedicação e cuidado dispensados a crianças de tão pouca idade. O sofrimento pela morte de parente é disseminado pelo núcleo familiar, como em força centrífuga, atingindo cada um dos membros em gradações diversas, o que deve ser levado em conta pelo magistrado para fins de arbitramento do valor da reparação do dano moral. Assim, os avós são legitimados à propositura de ação de reparação por dano moral proveniente da morte da neta. A reparação, nesses casos, decorre de dano individual e particularmente sofrido pelos membros da família ligados imediatamente ao fato (art. 403 do CC/2002). Assim, considerando-se as circunstâncias do caso concreto e a finalidade da reparação, a condenação ao pagamento de danos morais no valor de R$ 114.000,00 para cada um dos pais, correspondendo à época a 300 salários mínimos, e de R$ 80.000,00 para cada um dos dois avós não é exorbitante nem desproporcional à ofensa sofrida pelos recorridos pela perda da filha e neta menor em tais circunstâncias (Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça nº 389)

Contudo, a nosso juízo, essa não deve ser a melhor interpretação, pois no campo da responsabilidade por dano extrapatrimonial essa presunção relativa deve conviver com a possibilidade de análise, caso a caso, justamente por envolver a necessária análise do grau de afetividade entre as pessoas sobre as quais a morte de outrem repercute.

É digno de aplausos, todavia, o argumento no sentido de que não se deve estender ilimitadamente a legitimidade para pleitear danos morais a todo que, de alguma forma, suportam a dor da perda de uma pessoa querida, sob pena de se impor ao ofensor uma obrigação igualmente ilimitada de reparação, o que, indubitavelmente, pode levá-lo à ruína.

Nesse sentido, deve-se atentar para o entendimento que prevalece na doutrina e na jurisprudência que, em relação à natureza jurídica da reparação do dano moral, a condenação cumpre duas funções: uma de caráter principal reparatório, cujo objetivo é lenir, amenizar, mitigar a dor sofrida pelo ofendido, e outro de caráter acessório, cuja finalidade é a de desestimular novas condutas ilícitas por parte do ofensor.

Todavia, como assevera Flávio Tartuce, “a indenização por danos morais não pode levar o ofensor, pessoa natural ou jurídica, à total ruína, não sendo esse o intuito da lei” (TARTUCE, Flávio. Direito Civil 2: Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 7ª ed. Revista e atualizada, São Paulo: Método, 2012, p. 408).

Especificamente em relação à situação de noivado, merece atenção a observação feita por Pablo Stolze Gagliano, acentuando que tal status “exige amadurecimento e responsabilidade”. Com vistas nessa afirmação, é bastante tranquilo concluir que passar de um simples namoro para uma promessa de casamento, como é o noivado, demonstra um grau mais elevado de afetividade entre os nubentes. Em nossa opinião, resta evidente que não existe razão para se negar compensação ao noivo que se vê despojado do convívio com a noiva, em razão de ato ilícito de terceiro que venha a causar a morte dela.

Sobre os aspectos subjetivos envolvendo a potencialidade danosa da morte prematura de pessoas de nossas relações, convido o leitor a conferir o ensaio de minha autoria, intitulado A compensação por dano moral em tutela antecipada no regime de responsabilidade civil objetiva, do qual passo a transcrever as reflexões abaixo:

Por mais que convivamos diariamente com a morte, sabedores de que esse fato jurídico é o marco final de nossa existência, conscientes de que o dia derradeiro chegará, invariavelmente, para todos, tal fenômeno sempre nos choca; a alguns em maior grau, sendo que outros, dotados de certa dose de resignação, ceticismo etc., são atingidos com diferida intensidade.

Inúmeras conjeturas são levantadas, de modo a justificar e buscar conforto diante da cessação da existência humana, especialmente em relação àquelas pessoas que nos são caras. Talvez isso se justifique em razão dos valores que o ser humano agrega à própria existência e à daqueles que o cercam, sendo justamente esses valores que são deixados por quem parte, como maior herança àqueles que permanecem vivos.

(...)

Com estas breves considerações, indaga-se: se a morte de uma pessoa, de forma natural, e em alguns casos até mesmo esperada, já é capaz de nos causar enorme abalo, diante da vindoura e permanente privação do convívio e do compartilhamento dos valores que aquela pessoa agregou à nossa existência, o que se dirá em relação àquelas mortes súbitas e violentas, consequentes de acidentes aéreos, de trânsito, aquelas causadas pela violência urbana, para as quais o Poder Público contribui diária e acintosamente através de suas omissões ou ações canhestras? (Revista da EMERJ, Rio de Janeiro, v. 14, n. 55, p. 41-54, jul.-set. 2011, pp. 41-42)

No mesmo texto, destaco a sempre valiosa lição de Yussef Said Cahali, que assim coloca a questão da morte:

Seria até mesmo afrontoso aos mais sublimes sentimentos humanos negar-se que a morte de um ente querido, familiar ou companheiro, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de fácil e objetiva percepção.

Por ser de senso comum, a verdade desta assertiva dispensa demonstração: a morte antecipada em razão do ato ilícito de um ser humano de nossas relações afetiva, mesmo nascituro, causa-nos um profundo sentimento de dor, de pesar, de frustração, de ausência, de saudade, de desestímulo, de irresignação.

São sentimentos justos e perfeitamente identificáveis da mesma forma que certos danos simplesmente patrimoniais, e que se revelam com maior ou menor intensidade, mas que existem.

No estágio atual de nosso direito, com a consagração definitiva, até constitucional, do princípio da reparabilidade do dano moral, não mais se questiona que esses sentimentos feridos pela dor moral comportam ser indenizados; não se trata de ressarcir o prejuízo material representado pela perda de um familiar economicamente proveitoso, mas de reparar a dor com bens de natureza distinta, de caráter compensatório e que, de alguma forma, servem como lenitivo (Revista da EMERJ, Rio de Janeiro, v. 14, n. 55, p. 41-54, jul.-set. 2011, pp. 45-46).

Com efeito, se compararmos o núcleo familiar direto da pessoa morta com outras pessoas que também compunham sua esfera de relações, pode-se até concordar que o dano repercute em graus diversos sobre essas pessoas, bem como seja possível presumir, relativamente, que aquelas pessoas sofrem sobremaneira em razão da perda de um ente querido, daí dizer que, nesses casos, o dano é in re ipsa.

Sem embargo, tratando-se de noivo, penso que, embora a ele não se aplique a presunção relativa no que toca às repercussões do ato danoso, é certo que a ele deverá ser aberta a oportunidade de comprovar que sofreu um dano em razão da morte da pessoa amada, o que, aliás, é a regra em nosso ordenamento jurídico. A não ser nos casos em que seja admissível a presunção de prejuízo (dano in re ipsa), quem alega ter sofrido um dano, deve prová-lo. A esse respeito, eis a lição de Flávio Tartuce1:

De início, quanto à necessidade ou não de prova, os danos morais podem ser classificados da seguinte forma:

  1. Dano moral provado ou dano moral subjetivo – constituindo regra geral, segundo o atual estágio da jurisprudência nacional, é aquele que necessita ser comprovado pelo autor da demanda, ônus que lhe cabe.

  2. Dano moral objetivo ou presumido (in re ipsa) – não necessita de prova, como nos casos de abalo de crédito ou abalo moral, protesto indevido de títulos, envio de nome de pessoa natural ou jurídica para o rol de inadimplentes (Serasa, SPC), morte de pessoa da família ou perda de órgão ou parte do corpo. Na última hipótese, há que se falar também em dano estético presumido (in re ipsa).

Destarte, soa inconvenientemente peremptória a extinção do processo, sem resolução do mérito, em relação ao noivo que pleiteia reparação moral, em razão da morte de sua noiva, decorrente de ato ilícito de outrem, sob pena de se esvaziar as diretrizes que orientam o instituto da responsabilidade civil, mormente se levarmos em consideração dois aspectos que cercam a lide examinada:

(ii) que o próprio órgão julgador reconhece que a “legitimidade para propor ação de reparação por danos extrapatrimoniais em decorrência da morte de ente querido – apesar de antiga, não está resolvida no âmbito jurisprudencial”.

Por fim, reforçamos: apesar de criticável, em razão da elevada carga de subjetividade que pesa sobre os valores envolvidos nesse tipo de análise, a decisão em comento deve ser considerada pelo estudioso para fins de solucionar eventual questão proposta pelas bancas examinadoras em concursos públicos, uma vez que o que se cobra é o conhecimento dos julgados por parte do candidato.

1 TARTUCE, Flávio. Direito Civil 2: Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 7ª ed. Revista e atualizada, São Paulo: Método, 2012, p. 391.


Autor

  • Vitor Guglinski

    Advogado. Professor de Direito do Consumidor do curso de pós-graduação em Direito da Universidade Cândido Mendes (RJ). Professor do curso de pós-graduação em Direito do Consumidor na Era Digital do Meu Curso (SP). Professor do Curso de pós-graduação em Direito do Consumidor da Escola Superior da Advocacia da OAB. Especialista em Direito do Consumidor. Membro do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon). Ex-assessor jurídico do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Autor colaborador da obra Código de Defesa do Consumidor - Doutrina e Jurisprudência para Utilização Profissional (Juspodivn). Coautor da obra Temas Actuales de Derecho del Consumidor (Normas Jurídicas - Peru). Coautor da obra Dano Temporal: O Tempo como Valor Jurídico (Empório do Direito). Coautor da obra Direito do Consumidor Contemporâneo (D'Plácido). Coautor de obras voltadas à preparação para concursos públicos (Juspodivn). Colaborador de diversos periódicos jurídicos. Colunista da Rádio Justiça do Supremo Tribunal Federal. Palestrante. Currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4246450P6

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GUGLINSKI, Vitor. Jurisprudência comentada: STJ - 4ª Turma - Danos morais - Legitimidade "ad causam" - Noivo - Morte da nubente . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4026, 10 jul. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/28707. Acesso em: 19 abr. 2024.