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Competência para julgamento de recurso contra decisão de Juizado Especial Estadual, no pretenso exercício de jurisdição federal

Competência para julgamento de recurso contra decisão de Juizado Especial Estadual, no pretenso exercício de jurisdição federal

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Diz a Súmula 55 do STJ:

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL NÃO E COMPETENTE PARA JULGAR RECURSO DE DECISÃO PROFERIDA POR JUIZ ESTADUAL NÃO INVESTIDO DE JURISDIÇÃO FEDERAL.

O alcance desse édito, conquanto gere perplexidade, é o de que o Tribunal Regional Federal não é competente para julgar recurso de decisão proferida por Juiz estadual, quando não investido de jurisdição federal, embora atuando sob pretexto dessa investidura.

Isto é, o Juiz estadual, quando julga causa de competência federal, sem jurisdição para tanto, não se sujeita ao controle da Justiça Federal.

Em última análise, quer dizer que se deixa à Justiça Estadual decidir acerca da competência da Justiça Federal – salvo a hipótese de recurso especial, que acaba remetendo a questão à Corte Superior uniformizadora do Direito Federal (além, é claro, do ainda mais restrito recurso extraordinário).

Trata-se de orientação diametralmente oposta a nosso ordenamento jurídico-processual, no entendimento que, nos demais casos, vem esposando o E. Superior Tribunal de Justiça.

É o que se colhe, para ilustrar, destas duas outra Súmulas do E. STJ:

Súmula 3

COMPETE AO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DIRIMIR CONFLITO DE COMPETENCIA VERIFICADO, NA RESPECTIVA REGIÃO, ENTRE JUIZ FEDERAL E JUIZ ESTADUAL INVESTIDO DE JURISDIÇÃO FEDERAL.

Súmula 150

COMPETE A JUSTIÇA FEDERAL DECIDIR SOBRE A EXISTENCIA DE INTERESSE JURIDICO QUE JUSTIFIQUE A PRESENÇA, NO PROCESSO, DA UNIÃO, SUAS AUTARQUIAS OU EMPRESAS PUBLICAS.

Pretendemos sustentar que, sobre a necessidade de revisão da orientação perfilhada na Súmula 55/STJ, por primeiro transcrita, avulta o imperativo de não aplicar esse entendimento sumulado, quando se cuida de Juiz Estadual de Juizado Especial.

Deveras, cumpre observar que, tratando-se de Juiz de Juizado Especial, a competência recursal, contra suas decisões, bem assim para impetração de mandado de segurança contra essa autoridade, recai sobre as Turmas Recursais correspondentes (STJ: ROMS 10334/RJ - DJ DATA:30/10/2000; ROMS 10164/DF - DJ DATA:05/03/2001; ROMS 9500/RO - DJ DATA:27/11/2000).

Daí, subtrai-se a questão do controle do Tribunal de Justiça e do próprio Superior Tribunal de Justiça.

De fato, contra decisão de Turma Recursal, não cabe recurso ou ação de impugnação perante o Tribunal de Justiça, nem deste, ou daquela, para o Superior Tribunal de Justiça. Nem mesmo recurso ordinário em mandado de segurança (STJ: ROMS 12392/MG - DJ DATA:18/03/2002; ROMS 13295/BA - DJ DATA:04/02/2002; AGRRCL 948/RS - DJ DATA:19/11/2001; AGA 347549/SP - DJ DATA:04/06/2001).

Então, quando se está ante exercício de jurisdição federal, da qual não investido o Juiz Estadual do Juizado Especial, a situação não poderia ser corrigida, nos termos da Súmula 55/STJ, nem pelo Tribunal Regional Federal, nem pelo Tribunal de Justiça, nem mesmo, repita-se, pelo Superior Tribunal de Justiça.

Nem se argumente com a possibilidade de controle pelo Supremo Tribunal Federal, a qual, sobre revelar-se mais angusta (restrita à questão constitucional), mostra-se bastante severa no que tange à eventual concessão de medida cautelar, o que pode permitir o andamento do feito até configuração de situação irreversível, em prejuízo da Entidade Federal.

De outra parte, é certo que o entendimento sumular em epígrafe deixa pouca margem de atuação para o Tribunal estadual, já que, ou reconhece haver, efetivamente, o exercício de competência federal, pelo juiz de primeiro grau, e remete o feito ao Tribunal Federal; ou nega que o juiz a quo esteja investido de competência federal, e então remete os autos ao juiz federal competente. Mas isso pressupõe atuação rigorosamente técnica da Corte estadual, ou, no caso sob exame, da Turma Recursal.

Assim, mostra-se imprescindível não se aplicar o entendimento versado na transcrita Súmula 55 do STJ, quando se trata de decisão de Juiz Estadual de Juizado Especial.

Note-se que a recente Lei dos Juizados Especiais Federais não se aplica no juízo estadual (Lei 10.259, de 12.7.2001, art. 20).

É de se perguntar: como coibir eventual não aplicação dessa vedação, por parte de Juízo Estadual de Juizado Especial?

Destarte, mostra-se razoável admitir, inclusive, que o juiz estadual, ainda que oficiando em Juizado Especial, permanece investido da delegação constitucional prevista no art. 109, § 3º, da Constituição, afastando-se, então, a Súmula 55/STJ, de modo a permitir aplicação do § 4º do mesmo art. 109 da Lei Maior.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOURA, Leonardo Jubé de. Competência para julgamento de recurso contra decisão de Juizado Especial Estadual, no pretenso exercício de jurisdição federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 57, 1 jul. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2950. Acesso em: 3 maio 2024.