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Do descumprimento de exigências no processo administrativo de concessão de benefício previdenciário.

Falta de interesse de agir. Necessidade de extinção do processo sem resolução de mérito.

Do descumprimento de exigências no processo administrativo de concessão de benefício previdenciário. Falta de interesse de agir. Necessidade de extinção do processo sem resolução de mérito.

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Necessidade de extinção de processos nos quais os autores não cumprem as exigências administrativas e buscam diretamente o Poder Judiciário.

I- INTRODUÇÃO

Vários tem sido os casos que poderiam ser resolvidos ainda na via administrativa, mas que pelo não cumprimento de exigências administrativas pelo segurado acabam por desaguar diretamente na via judicial. No entanto o simples cumprimento de uma exigência administrativa evitaria mais uma demanda no já sobrecarregado Poder Judiciário.


II- DA FALTA DE INTERESSE DE AGIR. NÃO CUMPRIMENTO DE EXIGÊNCIAS NA VIA ADMINISTRATIVA.

Dispõe o art. 267, VI, do Código de Processo Civil que:

Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito:

VI- quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual.

Ensina Vicente Greco Filho[1] que:

O interesse processual é, portanto, a necessidade de se recorrer ao Judiciário para a obtenção do resultado pretendido, independentemente da legitimidade ou legalidade da pretensão. Para verificar-se se o autor tem interesse processual para a ação deve-se responder afirmativamente à seguinte indagação: para obter o que pretende o autor necessita da providência jurisdicional pleiteada?

Portanto o interesse de agir (condição para o regular exercício do direito de ação) verifica-se através da necessidade da tutela jurisdicional. A necessidade da tutela jurisdicional se evidencia pelo fato de não ter o demandante outro meio para obter aquilo que almeja, senão a via do Poder Judiciário.

No entanto o que se tem verificado em vários processos que tramitam hoje no Poder Judiciário é que a pretensão do segurado poderia ser obtida pelo simples cumprimento de uma exigência no processo administrativo de concessão de benefício previdenciário, como se observa no exemplo abaixo:

Foram apresentados formulários de enquadramento de atividades especiais ou profissionais, mas nenhum pode ser enquadrado. Importa-nos também registrar que efetuamos uma exigência ao requerente para que apresentasse os formulários corretos, consoante artigo 19, §5º do Decreto 3.048/99, artigo 273 e artigo 576, § 2º, da IN 45/2010, com fundamento no artigo 273, §2º da IN 45/2010 e o notificamos da necessidade através da carta de exigência de fl. 23, mais tais documentos não foram apresentados. Segurado apresentou formulários, porém não foram enquadrados visto que não apresentou a ficha de registro de empregados com as funções que exerceu nas empresas, conforme fl. 23.

Assim, não há para a autoridade administrativa outra posição a assumir que não indeferir o benefício, pois não pode analisar corretamente os pedidos do segurado pelo não cumprimento de exigências.

É muito oportuno justificar que não se afiguram tais exigências administrativas como desproporcionais, uma vez que nada mais significa do que instruir adequadamente o processo administrativo e garantir segurança na concessão dos benefícios previdenciários.

Para ilustrar a situação acima mencionada, cita-se trecho da sentença da juíza federal da quarta região, Dra. Luciane Merlin Cleve Kravetz, nos autos do processo n. 2008.70.00.004278-0, verbis:

O autor pediu ao INSS a concessão de pensão por morte, indeferida pela falta do cumprimento de exigência. O que se verifica, pelo exame do processo administrativo, é que houve a apresentação de início de prova material do exercício de atividade rural pela esposa do autor. Justamente por isto, já que os documentos não constituem prova plena, o INSS notificou o demandante para promover justificação administrativa. Não houve qualquer manifestação e, portanto, o benefício foi indeferido. Não é certo que o requerente, sem que atenda à exigência regular, adequada e válida da administração pública para comprovar o seu direito, acione diretamente o Judiciário. Não há necessidade do processo judicial, pois o direito pode-se demonstrar pela diligência determinada legitimamente pelo INSS. Falta, então, interesse processual, o que leva à extinção do processo sem o exame do mérito. Em síntese: não se caracteriza o interesse processual se o autor, intimado, deixa de cumprir providência razoável e necessária para demonstrar o preenchimento dos requisitos necessários ao reconhecimento de seu direito perante o INSS.

Portanto, nos casos em que o segurado não cumpre a exigência na via administrativa não há como contestar sua pretensão na via judicial, pois não é sequer possível dizer se possui ou não direito, vez que o mérito sequer foi analisado pela área administrativa.

Para finalizar, cumpre destacar que conforme decisão da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no RESP 1310042, o Judiciário não pode se transformar em agência do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS):

A pretensão nesses casos carece de qualquer elemento configurador de resistência pela autarquia previdenciária. Não há conflito. Não há lide. Não há, por conseguinte, interesse de agir nessas situações.

...

O Poder Judiciário é a via destinada à resolução dos conflitos, o que também indica que, enquanto não houver resistência do devedor, carece de ação aquele que judicializa sua pretensão.


III- CONCLUSÃO

Em conclusão, sempre que o Poder Judiciário verificar que o segurado não cumpriu exigências administrativas nos processos de concessão de benefício previdenciário, desde que regularmente notificado pela Autarquia, deve declarar a parte autora carecedora do direito de ação, extinguindo o processo sem resolução do mérito, por total falta de interesse de agir, nos termos dos arts. 3º[2] e 267, VI, do CPC.


[1] Direito Processual Civil Brasileiro, V. 1, 1993,  p. 80.

[2] Art. 3ª Para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade.


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