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Seguridade Social, um sistema deficitário. Será?

Seguridade Social, um sistema deficitário. Será?

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Será que o Sistema de Seguridade Social do Brasil é realmente deficitário como o Governo afirma categoricamente?

1 – Introdução

O artigo tem por objetivo averiguar a procedência das divulgações do “déficit” da Previdência Social à sociedade brasileira através das mídias. 

Desde os anos noventa, corriqueiramente eu ouvia meu pai e a impressa falando sobre o “déficit” da previdência social em tom alarmista, entretanto não conseguia entender do que se tratava. Com o passar dos anos fui compreendendo as palavras proferidas na minha infância acerca do tema, bem como me interessei em aprofundar os conhecimentos e saber se realmente esse “déficit” existia. Assim, acabei descobrindo que o discurso oficial do “déficit” previdenciário baseia-se em interpretação equivocada da titularidade e da distribuição dos recursos provenientes da arrecadação das contribuições previstas no art. 195 da Constituição Federal.


2 – O Sistema

A evolução socioeconômica faz com que as desigualdades se acentuem entre os membros da mesma comunidade e da comunidade internacional. A pobreza não é um problema apenas individual, mas, sim, social.

A concentração da maior parte da renda nas mãos de poucos leva à miséria da maioria, que se ressente da falta dos bens necessários para sobreviver com dignidade. No entanto, o homem sempre se preocupou em garantir seu sustento e o de sua família em situações de carência econômica, enfermidades e da capacidade de trabalho, de redução ou perda de renda.

Dessas situações o homem não consegue sair apenas com o seu esforço individual, necessitando do amparo do Estado para prevenir e remediar suas necessidades. Todos esses fatores levaram à busca de instrumentos de proteção contra as necessidades sociais, com reflexos na ordem jurídica.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, promulgada em 5 de outubro de 1988, é a lei fundamental e suprema do Brasil, servindo de parâmetro de validade a todas as demais espécies normativas, situando-se no topo do ordenamento jurídico. Para darmos início ao estudo é salutar que analisemos o art. 195 do referido ordenamento:

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: 

[...]

II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201;

III - sobre a receita de concursos de prognósticos.

IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar;

[...]

§ 2º - A proposta de orçamento da seguridade social será elaborada de forma integrada pelos órgãos responsáveis pela saúde, previdência social e assistência social, tendo em vista as metas e prioridades estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias, assegurada a cada área a gestão de seus recursos.

[...]

O parágrafo 2º do referido artigo nos deixa claro, tal como o sol do meio dia, que não existe orçamento público para o custeio único da previdência social de forma isolada, o mesmo demonstra que o orçamento será para o custeio da Seguridade Social, conceito este que envolve a Saúde, Previdência Social e Assistência Social. Para melhor entendimento e compreensão do assunto, vou demonstrar de forma mais objetiva:

SEGURIDADE SOCIAL É:

Saúde (SUS)

Previdência Social (INSS)

Assistência Social (LOAS, BOLSA FAMÍLIA, ETC.)

Com base no quadro acima fica mais claro a análise do orçamento da seguridade social onde todo os recursos federais são destinados para o custeio integral da seguridade social do Brasil e não isoladamente para saúde, previdência social e assistência social.

Certo dia um amigo e professor (Emerson Lemes) me mostrou o seguinte raciocínio:

- Imaginamos que em uma casa tenha a Pai (único provedor do sustento da família), a mãe, o filho e a filha. Sendo o pai o único provedor, teria como afirmar que a mãe, o filho ou a filha obteve um déficit ou superávit no mês?

Sendo assim, só se poderia falar em déficit da previdência social se os recursos fossem aplicados separadamente, porque, em orçamentos, não existe déficit, existe estimativa de receita e previsão de despesa. Quando se fala em déficit, o governo está manipulando informações para induzir a sociedade contra a própria proteção social. Esse déficit não existe! É um artifício marketeiro, utilizado para colocar a população contra a Previdência, e, daí, partir para a privatização.

O governo já privatizou algumas empresas públicas utilizando-se de manobras corruptas e desonestas com a própria sociedade, isso, buscando benefícios próprios dos governantes que detinham o poder. O risco de privatização da previdência social é real e grande, cabe a população tomar conhecimento de causa e lutar para que isso não aconteça evitando maiores dissabores financeiros ao dinheiro do povo que poderia ser revertido em benefícios de grande proveito.

Por falta de informações mais detalhadas, a sociedade na grande maioria, acaba se tornando refém das manipulações do governo que afirma a dificuldade financeira da previdência social, acontece que o único objetivo dessa manipulação é causar insegurança na população e despertar um interesse maior na contratação de planos de aposentadoria privada. O gigante precisa acordar, esse é a realidade!


3 – Previdência Social em Números

Hipoteticamente, considerando que exista orçamento fiscal somente para a Previdência Social, fato que poderia existir e explicar o famoso déficit financeiro do INSS, vamos apresentar informações contábeis extraídas do Balancete Analítico de Receitas e Despesas, elaborado pela Coordenação-Geral de Orçamento, Finanças e Contabilidade do INSS e divulgados no anuário estatístico da Previdência Social de 2012 conforme quadro resumo abaixo:

DESCRIÇÃO

2010

2011

2012

(+) Total Receitas

285.813.222

318.312.410

362.676.308

(-) Total Despesas

(282.521.299)

(313.196.807)

(354.842.784)

Resultado

3.291.923

5.115.603

7.833.524

Onde está o Déficit? Os números expressos acima foram divulgados pelo próprio INSS através de seu anuário estatístico onde é possível visualizar que contabilmente não podemos afirmar que houve um “Déficit” previdenciário.

É oportuno e importantíssimo destacar que no somatório das despesas apresentados pela Previdência Social constam valores referente aos benefícios de assistência social, ou seja, esses benefícios deveriam ter suas despesas previstas de modo segregado das despesas da Previdência Social, isso é mais um ponto que mostra a falácia do governo quanto ao momento difícil que vive o sistema previdenciário brasileiro. Os benefícios assistências não poderiam ser pagos com as receitas da Previdência Social. Veja como deveria ficar os números apresentados no anuário:

DESCRIÇÃO

2010

2011

2012

(+) Total Receitas

285.813.222

318.312.410

362.676.308

(-) Total Despesas

(282.521.299)

(313.196.807)

(354.842.784)

(+) Benefícios Assistenciais

22.233.234

22.783.773

30.321.521

Resultado

25.525.157

27.899.376

38.155.045

Levando em consideração os números apresentados no Anuário destacamos que o valor acumulado da receita total do INSS, em 2012, foi de R$ 362,7 bilhões, o que correspondeu a um aumento de 13,9% em relação ao ano anterior. As principais rubricas de receita foram: contribuição de empresas; contribuição de segurados e contribuição para o Finsocial, cujas participações atingiram, respectivamente, 28,5%, 14,7% e 10,8% da receita total.

Em 2012, o valor da despesa total do INSS foi de R$ 354,8 bilhões, o que significou um aumento de 13,0% em relação ao ano anterior. As rubricas com maior participação nas despesas foram a aposentadoria por tempo de contribuição, aposentadorias por idade e pensão por morte previdenciária cujas participações foram de 23,8%, 21,6% e 21,3%, respectivamente.


4 – Conclusão

Assim disse o então presidente da ANFIP (Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil), Álvaro Sólon de França, quando anunciou o superávit de 78 bilhões da Seguridade Social em 2012, que inclui o pilar da Saúde, Previdência Social e Assistência Social:

“Não há que se falar em falta de recursos para a Seguridade Social. Recursos há, se estão sendo aplicados ou se estão constituindo superávit primário, aí é outra discussão que precisa ser enfrentada”.

A divulgação de informações pela mídia, quando estampados nas manchetes o tema “Déficit do INSS Aumenta”, contribui para criar um clima de incerteza quanto à situação real do equilíbrio previdenciário. Entretanto, contabilmente falando, os dados publicados pelo próprio INSS demonstram que o sistema previdenciário está perfeitamente equilibrado em termos econômico-financeiros e atuariais.

Devemos lembrar que o Orçamento da Seguridade Social (OSS) é levado em consideração os três pilares: Saúde, Previdência Social e Assistência Social, ou seja, mesmo que o INSS (Previdência Social) contabilizasse as despesas maiores que as receitas, existiria orçamento para o sistema em completo dando suporte para seu equilíbrio saudável.

Particularmente, acredito que as informações sobre o déficit do sistema previdenciário brasileiro têm um único objetivo o qual é gerar a incerteza do segurado quanto ao recebimento de sua aposentadoria no futuro gerando assim uma necessidade desse segurado contratar um plano de providencia privada, gerando mais receitas aos bancos e empresas gestoras deste serviço e consequentemente aumentando a arrecadação tributária aos cofres públicos, dinheiro este que sabemos que não é aplicado de maneira justa em prol do contribuinte. Isto é Brasil!


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PRADO, Bruno Henrique do. Seguridade Social, um sistema deficitário. Será? . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4090, 12 set. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31594. Acesso em: 18 abr. 2024.