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Não existe crime de feminicídio

Não existe crime de feminicídio

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Breves considerações sobre a mais recente alteração no Código Penal.

NÃO EXISTE CRIME DE FEMINICÍDIO

Sancionada a lei que alterou o código penal com escopo de criar uma nova qualificadora ao crime de homicídio: o feminicídio.

A alteração foi realizada no § 2º do Código Penal, in verbis:

§ 2º: Se o homicídio é cometido:

VI – contra a mulher por razões de gênero:

RAZÕES DE GÊNERO

A própria lei também define objetivamente o que seja “razões de gênero”:

§ 2º-A. Considera-se que a há razões de gênero quando o crime envolve:

I – violência doméstica e familiar;

II – menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

A MAJORANTE FEMINICISTA

Foi também criada uma nova majorante ao homicídio:

§ 7º A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado:

I – durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto;

II – contra pessoa menor de 14 (quatorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência;

III – na presença de descendente ou de ascendente da vítima.”

HEDIONDEZ DA QUALIFICADORA FEMINICISTA

Determinou-se também alteração na Lei nº 8.072, que passou a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 1º...I – homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º. I, II, III, IV, V e VI)”;

VALIDADE

A alteração estrará em vigor na data de sua publicação.

O CRIME DE FEMINICÍDIO

Tecnicamente é um erro grosseiro repetir a linguagem da imprensa afirmando “que foi criado um crime de feminicídio”, em realidade, o crime continua sendo de homicídio, o feminicídio é uma qualificadora do crime de homicídio.

VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IQUALDADE

O tema tratamento penal e processual penal desigual entre homens e mulheres foi debatido na ação declaratória de constitucionalidade (ADC 19) e na ação de inconstitucionalidade (Adin 4424), nas duas ações, o STF considerou constitucionais todos os dispositivos da lei 11.340/2006 que estabelecem o tratamento jurídico diferenciado.

Nos votos, houve destaque para posição da Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha:

“O princípio jurídico da igualdade refaz-se na sociedade e rebaliza conceitos, reelabora-se ativamente, para igualar iguais desigualados por ato ou com a permissão da lei. O que se pretende, então, é que a 'igualdade perante a lei' signifique 'igualdade por meio da lei', vale dizer, que seja a lei o instrumento criador das igualdades possíveis e necessárias ao florescimento das relações justas e equilibradas entre as pessoas. (…) O que se pretende, pois, é que a lei desiguale iguais, assim tidos sob um enfoque que, todavia, traz consequências desigualadoras mais fundas e perversas. Enquanto antes buscava-se que a lei não criasse ou permitisse desigualdades, agora pretende-se que a lei cumpra a função de promover igualações onde seja possível e com os instrumentos de que ela disponha, inclusive desigualando em alguns aspectos para que o resultado seja o equilíbrio justo e a igualdade material e não meramente formal. (…)”.

“Ao comportamento negativo do Estado, passa-se, então, a reivindicar um comportamento positivo. O Estado não pode criar legalidades discriminatórias e desigualadoras, nem pode deixar de criar situações de igualação para depurar as desigualdades que se estabeleceram na realidade social em detrimento das condições iguais de dignidade humana que impeçam o exercício livre e igual das oportunidades, as quais, se não existirem legalmente, deverão ser criadas pelo Direito. Somente então se terá a efetividade do princípio jurídico da igualdade materialmente assegurado.” [1]

ESTATÍSTICA ALARMANTE

No Brasil, entre 2001 a 2011, estima-se que ocorreram mais de 50 mil assassinatos de mulheres: ou seja, em média, 5.664 mortes de mulheres por causas violentas a cada ano, 472 a cada mês, 15,52 a cada dia, ou uma morte a cada 1h30. Os dados foram divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em uma pesquisa inédita, que reforçou as recomendações realizadas em julho pela CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) que avaliou a situação da violência contra mulheres no Brasil.


[1] (ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. O Princípio Constitucional da Igualdade. Belo Horizonte: Editora Lê, 1990, p. 39 e 41 )


Autor

  • Francisco Dirceu Barros

    Procurador Geral de Justiça do Estado de Pernambuco, Promotor de Justiça Criminal e Eleitoral durante 18 anos, Mestre em Direito, Especialista em Direito Penal e Processo Penal, ex-Professor universitário, Professor da EJE (Escola Judiciária Eleitoral) no curso de pós-graduação em Direito Eleitoral, Professor de dois cursos de pós-graduação em Direito Penal e Processo Penal, com vasta experiência em cursos preparatórios aos concursos do Ministério Público e Magistratura, lecionando as disciplinas de Direito Eleitoral, Direito Penal, Processo Penal, Legislação Especial e Direito Constitucional. Ex-comentarista da Rádio Justiça – STF, Colunista da Revista Prática Consulex, seção “Casos Práticos”. Colunista do Bloq AD (Atualidades do Direito). Membro do CNPG (Conselho Nacional dos Procuradores Gerais do Ministério Público). Colaborador da Revista Jurídica Jus Navigandi. Colaborador da Revista Jurídica Jus Brasil. Colaborador da Revista Síntese de Penal e Processo Penal. Autor de diversos artigos em revistas especializadas. Escritor com 70 (setenta) livros lançados, entre eles: Direito Eleitoral, 14ª edição, Editora Método. Direito Penal - Parte Geral, prefácio: Fernando da Costa Tourinho Filho. Direito Penal – Parte Especial, prefácios de José Henrique Pierangeli, Rogério Greco e Júlio Fabbrini Mirabete. Direito Penal Interpretado pelo STF/STJ, 2ª Edição, Editora JH Mizuno. Recursos Eleitorais, 2ª Edição, Editora JH Mizuno. Direito Eleitoral Criminal, 1ª Edição, Tomos I e II. Editora Juruá, Manual do Júri-Teoria e Prática, 4ª Edição, Editora JH Mizuno. Manual de Prática Eleitoral, Editora JH Mizuno, Tratado Doutrinário de Direito Penal, Editora JH Mizuno. Participou da coordenação do livro “Acordo de Não Persecução Penal”, editora Juspodivm.

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