O contrato de cartão de crédito à luz do Código de Defesa do Consumidor
O contrato de cartão de crédito à luz do Código de Defesa do Consumidor
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I - HISTÓRICO
O cartão de crédito é uma criação recente, assemelhando-se, preliminarmente, aos cartões de credenciamento ou relacionamento emitidos por hotéis na Europa a partir de 1914. Posteriormente, em 1920 passou a ser utilizado em postos de gasolina dos Estados Unidos da América.
Em 1950, Frank MacNamara e alguns executivos financeiros de Nova York entraram num restaurante para jantar e, ao ser apresentada a conta, verificaram que se encontravam sem dinheiro ou talão de cheques.
Diante disso e após alguma discussão, o proprietário do estabelecimento permitiu que MacNamara procedesse ao pagamento da conta em outro dia, mediante a aposição de sua assinatura na respectiva nota de serviços.
Em decorrência desse episódio, MacNamara idealizou a captura e transmissão de transações de venda e compra de bens e serviços à distancia e "concebeu a idéia do cartão de crédito", sendo emitido em 28 de fevereiro de 1950 o Diners Club, primeiro cartão multiuso aceito em 27 restaurantes no lugar de dinheiro ou cheque. Naquele primeiro ano, 200 pessoas tornaram-se titulares do aludido cartão de crédito.
Somente com a criação do Diners Club por esse grupo de amigos americanos, é que o cartão assumiu a característica de meio de pagamento para aquisição de bens ou produtos, ou ainda, contratação de prestação de serviços a prazo.
Em 1951, os portadores do Diners Club cresceram para 42 mil, movimentando mais de US$ 1 milhão em mais de 330 estabelecimentos comercias, dentre os quais, restaurantes, hotéis, night clubs e varejistas, demonstrando a rápida disseminação do cartão como meio de pagamento no mercado. Foi este crescimento que possibilitou o lançamento do cartão de crédito em outros países.
O primeiro Diners Club brasileiro foi emitido no ano de 1954, preliminarmente para um seleto grupo de restaurantes, não obstante foi somente em 1956 que ele começou a tomar corpo.
Em 1958, a agência de viagens American Express lançou um cartão semelhante e, desde então, inúmeras empresas surgiram com a mesma finalidade.
Em 1971 foi fundada a ABECS - Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços na cidade do Rio de Janeiro, porém em 1974 sua sede foi transferida para São Paulo, onde permanece até hoje.
Há onze anos, em 1990, o cartão passou a ser emitido para utilização em âmbito internacional, e a partir de 1994, com o Plano Real, é que se iniciou seu processo de consolidação no mercado, passando a ser efetivamente utilizado por mais de 22,2 milhões de portadores em mais de 480 mil estabelecimentos filiados.
Com isso, o cartão de crédito passou a constituir um "parceiro indispensável dos comerciantes, que encontram nele uma alta economia de custos de crediário, cobrança, faturamento e a impar e única garantia de pagamento".
Se antes eram considerados apenas como cartões de credenciamento, permitindo a utilização restrita em alguns estabelecimentos comerciais, hoje a maioria dos instrumentos de crédito é administrada por empresas coligadas a Bancos, ou pelas próprias Instituições Financeiras, como é o caso do Banco Brasileiro de Descontos (Bradesco), Banco do Brasil e Banco Real. São os chamados, na relação contratual, "emissores".
II - O CONTRATO NO DIREITO BRASILEIRO
Os contratos, ad latere à lei, aos atos ilícitos e
às declarações universais de vontade, constituem uma das mais importantes
fontes de obrigações da atualidade, especialmente no Direito Comercial,
caracterizado pela agilidade e pela onerosidade. Pode ser definido, segundo Waldirio Bulgarelli, "em
sentido amplo, como o negócio jurídico com origem num concurso de vontades,
que costuma também ser confundido com a convenção, e ainda como o conjunto de
normas, ou seja, o contrato normativo, em sentido estrito, o contrato pode ser
entendido como o acordo de vontades gerador de efeitos obrigacionais"
(Contratos Mercantis, pág. 56/57). Orlando Gomes subdivide o contrato em duas concepções
antagônicas em relação ao seu conteúdo, quais sejam, a subjetiva, na qual o
conteúdo é composto pelos direitos e obrigações das partes, e a objetiva,
para a qual o conteúdo do contrato é formado por preceitos. Na concepção
tradicional, o ilustre mestre afirma que contrato "é todo acordo de
vontades destinado a constituir uma relação jurídica de natureza patrimonial
e eficácia obrigacional" (Orlando Gomes, Contratos, pág. 12). Para que um contrato seja válido é necessário que haja
acordo de vontades, capacidade das partes, objeto lícito, determinado e
possível e forma prescrita ou não defesa em lei. Além disso, deve respeitar
os princípios da autonomia da vontade, que representa a liberdade das partes de
contratar da forma lhes convenha; da supremacia da ordem pública, que sujeita o
acordo firmado à lei e aos princípios da moral e da ordem pública; do
consensualismo, pelo qual o acordo de vontades é suficiente à perfeição do
contrato (Orlando Gomes, pág. 35); da obrigatoriedade, pelo qual o contrato faz
lei entre as partes, caracterizando a aplicação do pacta sunt servanda;
e o da boa-fé, uma vez que a interprestação literal do acordo não se resume
a simples apuração da intenção das partes, devendo as partes agir com
lealdade e confiança.
Função Econômica do Contrato
No contexto jurídico-econômico atual o contrato deixou de ser apenas uma autonomia provada para se transformar numa estrutura de conteúdo complexo e híbrido, com disposições voluntárias e compulsórias, nas quais a composição dos interesses reflete o antagonismo social entre as categorias a que pertencem os contratantes (Orlando Gomes, Contratos pág. 15).
Representando a atuação da liberdade do indivíduo, foi o contrato promovido ao principal propulsor da vida econômica do Estado, na medida em que todas as relações interpessoais são reguladas por uma enorme rede de contratos verbais ou escritos interligados. A função econômica do contrato está sediada, segundo a recente corrente doutrinária, na sua própria causa, que no caso de cartão de crédito é a concessão de crédito.
A importância do contrato enquanto fato econômico é tão grande que a sua disciplina jurídica constitui a estereotipação do regime a que se subordina a economia de qualquer comunidade (Orlando Gomes, Contratos, pág. 20). Cabe ao Direito, principalmente do Consumidor no que tange o cartão de crédito, tutelar a validade do contrato no todo ou em parte, resguardando o interesse do particular, ao não ser prejudicado, do emissor, que tem sua própria existência na relação contratual, e do Estado, que almeja uma maior circulação de riquezas.
Contrato de Adesão
Dentre os vários tipos de contratos, há se destacar o de adesão, que é, segundo o mestre Waldirio Bulgarelli, "aquele em que não há discussão livre, entre as partes, das cláusulas contratuais, posto que estas são redigidas e impostas por uma delas à outra que as aceita em bloco" (Contratos Mercantis, pág. 95/96), e "impresso atualmente pela empresa emissora, em geral absorvido pelos bancos" (Contratos Mercantis, pág. 669).
Representa, pois, negócio jurídico em que uma das partes apresenta um contrato formado por uma séria de cláusulas formadas antecipadamente de modo geral e abstrato, cabendo à outra parte aceitá-las em bloco, acarretando, neste caso, na aceitação do conteúdo normativo e obrigacional das futuras relações concretas. Distingue-se do contrato-tipo na medida em que neste as cláusulas gerais a serem aceitas podem ser discutidas entre as partes.
O contrato de adesão pode ser classificado como um negócio jurídico bilateral, apesar de manifestações contrárias a respeito que entendem ser unilateral, já que é formado pelo concurso de vontades manifestado pelas partes no real interesse e propósito em realizá-lo. Apesar disso, distingue-se dos demais contratos ao exibir-se à parte contratante como um conjunto que não admite negociações ou modificações quanto às cláusulas preestabelecidas unilateralmente.
Contrato de Cartão de Crédito
Durante a evolução do comércio, que decorreu das modificações sucedidas na economia e na sociedade através dos tempos, novas formas contratuais, como o factoring, a franchising, o leasing e o cartão de crédito, surgiram oriundas da necessidade e da conveniência mercantilistas e foram adaptadas à realidade e sujeitas às leis de cada nação.
As operações bancárias são espécies do gênero contratos bancários, vez representarem os negócios jurídicos firmados entre um particular e uma empresa autorizada a exercer atividades próprias dos bancos (Orlando Gomes, Contratos, pág. 323), e podem ser classificadas, como bem ensina Nelson Abrão (Abrão apud Fuhrer, 2000, p. 79), em essenciais, nas quais as Instituições Financeiras disponibilizam crédito, como no caso do cartão, e em acessórias, caracterizadas pela prestação de serviços.
No Brasil, a concepção de cartão de crédito que existe atualmente e que foi parametrizada pelo Banco Central é de ser um "serviço de intermediação que permite ao consumidor adquirir bens e serviços em estabelecimentos comerciais previamente credenciados mediante a comprovação de sua condição de usuário. Essa comprovação é geralmente realizada no ato da aquisição, com a apresentação do cartão ao estabelecimento comercial. O cartão é emitido pelo prestador do serviço de intermediação, chamado genericamente de administradora de cartão de crédito, que pode ser um banco. O estabelecimento comercial registra a transação com o uso de máquinas mecânicas ou informatizadas, fornecidas pela administradora do cartão de crédito, gerando um débito do usuário consumidor a favor da administradora e um crédito do fornecedor do bem ou serviço contra a administradora, de acordo com os contratos firmados entre essas partes. Periodicamente, a administradora do cartão de crédito emite e apresenta a fatura ao usuário-consumidor, com a relação e o valor das compras efetuadas".
O contrato de cartão de crédito apresentar-se-á como de adesão. Isto porque a organização da atividade bancária, em função da multiplicidade de clientes, impõe a necessidade de padronização das cláusulas contratuais mediante a utilização de formulário uniformes, previstas no contrato de adesão (Orlando Gomes, Contratos, Forense, Rio de janeiro, 1981, pág. 384). Apresentam-se, portanto, as cláusulas contratuais uniformes por razões de ordem econômica e prática, haja vista a necessidade do emissor manter a equivalência nas relações em que é parte (Enzo Roppo, O Contrato, Tradução de Ana Coimbra e M. Januário C. Gomes, Almedina, Coimbra, 1988, págs. 311-312), como também unilaterais, pois não podem ser discutidas pelo comitente, que se vê obrigado a aceitá-las em bloco. Esta situação acaba por caracterizar a massificação dos contratos, acarretando, por vezes, em prejuízo ao interessado em contratar o serviço de cartão de crédito ao ensejar as cláusulas contratuais em práticas abusivas.
Não obstante, todas as vezes que um contrato de adesão, como assim o é o de cartão de crédito, se tornar excessivamente oneroso ou quando apresentar cláusulas abusivas ou leoninas, o mesmo deve ser revisto em favor do consumidor, conforme dispõe o próprio Código de Defesa do Consumidor.
Se por um lado essa massificação permitiu às empresas emissoras de cartão de crédito redução de custos e eficiência de gestão, por outro tolheu em parte o princípio da liberdade de contratar, visto não existir entre os contratos significativa alteração favorável ao associado.
III - O CARTÃO DE CRÉDITO NA ATUALIDADE
O vertiginoso crescimento do número de cartões de crédito em circulação em tão pouco tempo ocorreu devido à praticidade fornecida aos associados ao disponibilizar crédito mediante uma contraprestação futura, e na sua concepção universal, "é um cartão de identificação do seu portador por ele próprio firmado para confirmá-la com a assinatura na nota de venda à vista do vendedor que a confere" (Orlando Gomes, contratos, pág. 474). Apenas no ano de 1999, houve um crescimento de 1,5 milhões de cartões de crédito, conforme informações da ABECS - Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços.
EVOLUÇÃO DE ÍNDICES DOS CARTÕES DE CRÉDITO (MÊS A
MÊS)
PERÍODO DE JANEIRO A DEZEMBRO DE 1999
1999 |
Nº. de Cartões (milhões) |
Var. (+/-) |
Nº. de |
Var. (+/-) |
Valor das (bilhões) |
Var. (+/-) |
JANEIRO |
22,1 |
. |
65,8 |
. |
3,5 |
. |
FEVEREIRO |
22,2 |
0,45 |
56,2 |
(14,59) |
3,2 |
(8,57) |
MARÇO |
22,3 |
0,45 |
61,9 |
10,14 |
3,4 |
6,25 |
ABRIL |
22,4 |
0,45 |
61,8 |
(0,16) |
3,4 |
0,00 |
MAIO |
22,4 |
0,00 |
67,7 |
9,55 |
3,8 |
11,76 |
JUNHO |
22,4 |
0,00 |
64,7 |
(4,43) |
3,6 |
(5,26) |
JULHO |
22,5 |
0,45 |
66 |
2,01 |
3,6 |
0,00 |
AGOSTO |
22,5 |
0,00 |
62,6 |
(5,15) |
3,4 |
(5,56) |
SETEMBRO |
22,5 |
0,00 |
58,9 |
(5,91) |
3,2 |
(5,88) |
OUTUBRO |
22,5 |
0,00 |
61,2 |
3,90 |
3,3 |
3,12 |
NOVEMBRO |
22,8 |
1,33 |
62 |
1,31 |
3,3 |
0,00 |
DEZEMBRO |
23,6 |
3,51 |
81 |
30,65 |
3,9 |
18,18 |
TOTAL |
23,6 |
. |
770 |
. |
41,6 |
. |
FONTE: ABECS
Significa dizer que o cartão de crédito adquiriu grande relevância jurídico-sócio-econômica, pois a cada dia aumenta mais a freqüência de sua utilização, garantindo até mesmo um certo status ao seu portador, acarretando em um futuro não muito distante até mesmo na substituição do papel moeda.
Isto porque vários são os beneficiados com a utilização do cartão de crédito, como o associado, que dispõe de um instrumento de crédito para pagamento que dispensa o transporte de dinheiro ou cheques, com seus riscos inerentes; a administradora ou departamento de administração dos bancos, que tem no cartão sua própria existência; ou ainda, o estabelecimento, que tem sua clientela aumentada e o pagamento garantido pela administradora ou banco, bem como o maior consumo de bens e serviços pelos clientes, que não precisam desembolsar o valor à vista.
Vale ressaltar que a transação procedida com cartão de crédito tem envolvimento de quatro partes: o associado, o emissor, o estabelecimento e a operadora.
Diante disso, verifica-se que há uma série de contratos interligados materialmente, apesar de separados formalmente, a saber, o associado com o emissor, o emissor com o agente processador, o agente processador com o estabelecimento, e o associado com o estabelecimento.
A relação entre o associado e o emissor se dá por meio de contrato de adesão, legalmente fulcrado no art. 54 do Código de Defesa do Consumidor. Não obstante o contrato possuir previsão legal, o maior índice de divergência encontra-se na aplicação das cláusulas contratuais, mormente aquelas ditas abusivas.
Os aspectos mais polêmicos do contrato de cartão de crédito são a possibilidade de protesto e execução da dívida, a existência da cláusula-mandato para emissão de cambial, o valor constante na fatura do cartão como prova de utilização, as conseqüências decorrentes do roubo, furto, perda ou extravio do cartão de crédito, a emissão de cartão de crédito sem solicitação, a incidência de encargos, juros e taxas nas transações realizadas, o pagamento dos honorários advocatícios, entre outros menos significantes.
Surge, então, o problema da aplicação do Código de Defesa do Consumidor, que tem por objetivo proteger os direitos dos consumidores face aos fornecedores, que na relação de consumo entre o associado e o emissor.
Isto porque tais direitos passaram a ser elemento importante de cidadania, influenciando a elaboração e regulamentação dos contratos. Com isso, há se analisar algumas das cláusulas verificadas nos contratos de cartão de crédito sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor, visando principalmente, a manutenção do princípio da boa-fé.
Também se faz necessário ressaltar que nem toda regulamentação contratual pré-formulada (contrato de adesão) deve ser entendida como abusiva, mais ainda quando se trata de cartão de crédito.
A matéria aqui abordada é muito recente, não possuindo regulamentação legal específica, o que acarreta inúmeras decisões controvérsias.
Se de um lado o consumidor não pode ser lesado em função de possíveis ilegalidades cometidas pelas Administradoras ou Bancos, não pode por outro o mesmo consumidor querer enriquecer ilicitamente às custas de outrem.
"É com este retrospecto que o setor de cartões de crédito se insere no cenário nacional e vem ganhando espaço como instrumento de pagamento e financiamento", gerando inúmeras relações de consumo, que devem ser reguladas e submetidas à legislação pátria.
IV - AS RELAÇÕES JURÍDICAS: ASSOCIADO, EMISSOR,
ESTABELECIMENTO, OPERADORA.
No magistério do mestre Waldirio Bulgarelli, "entre o
banco e o titular do cartão entende-se, entre nós, que há um contrato
inominado, misto, de abertura de crédito e de prestação de serviços", e
complementa que "no Brasil, intervém no contrato-tipo não o banco
diretamente, mas a chamada empresa emissora. Trata-se em regra de uma sociedade
jurídica autônoma, embora ligada e dependente, em termos de grupo, direta ou
indiretamente, dos bancos que patrocinam o cartão" (Contratos Mercantis,
pág. 678). Da utilização do cartão de crédito extraem-se quatro
relações jurídicas distintas, cada qual interligada entre si. A primeira, que
pode ser classificada como direta, estabelece-se entre o associado e a empresa
emissora do cartão de crédito. Nela, considerando o estipulado no contrato de
adesão, permanece o emissor responsável pelo pagamento das transações
procedidas com o cartão pelo associado, até o quantum do limite de
crédito contratado, pagando, para tanto, uma taxa anual para manutenção do
sistema creditício. A segunda relação é firmada entre o emissor e o
estabelecimento comercial (fornecedor de bem ou serviço). O Banco ou empresa
administradora do cartão de crédito, diretamente ou por meio de empresa
terceirizada, se responsabiliza pelo pagamento das despesas realizadas pelos
associados nas lojas credenciadas. Tal procedimento acaba por dificultar
sobremaneira a as eventuais reclamações feitas por associados relativas aos
produtos adquiridos, pois, como bem observa Nelson Abrão, "o portador não
pode se opor a que o emissor pague o fornecedor", não podendo ele também
"se recusar a reembolsar o emissor alegando as exceções que teria contra
o fornecedor" (curso de Direito Bancário, 1988, pg. 114). A outra relação jurídica decorrente do uso do cartão de
crédito é aquela entre o associado e o estabelecimento comercial, sendo que
esta não perde a sua característica essencial de compra e venda de bens ou
serviços apenas pelo fato do meio utilizado para pagamento ter sido o cartão
de crédito. Permanece, pois, como um contrato escrito ou verbal. Há, ainda, a relação eventualmente instituída entre o
emissor e uma empresa operadora ou, em se tratando de empresa não bancária,
financiadora. A operadora é responsável pela organização do sistema como
intermediária, devendo zelar pela captura, transmissão, processamento e
liquidação das transações procedidas com cartões de crédito, e a ela está
incumbida a função de filiar estabelecimentos comercias que comprometer-se-ão
a aceitar os cartões sem efetuar acréscimos nos preços. Em contraprestação,
receberá uma comissão dos estabelecimentos que pode variar entre 5 e 10% sobre
o valor da transação. Por sua vez, casos há em que o emissor não é uma
instituição financeira, restando impedido de concretizar financiamentos com
recursos próprios. Como decorrência, insere-se no sistema contratual do
cartão uma empresa financiadora, que fornecerá o crédito necessário para
manutenção da atividade econômica. Atualmente, apenas algumas poucas empresas
socorrem-se desse artifício para obter crédito, já que a maioria dos cartões
de crédito em circulação é do tipo bancários. Apesar do cartão de crédito ser, no entendimento de
Waldirio Bulgarelli, um negócio jurídico integrado por vários contratos,
estes se unificam "pela finalidade proposta: permitir que o consumidor
adquira de imediato, em determinados estabelecimentos comerciais ou de
serviços, os bens e serviços de que necessita (…), fazendo-se necessária
uma regulamentação abrangendo as ligações entre esses contratos, e
conferindo, assim, legislativamente, a unidade que vem sendo imperfeitamente
configurada pelos ajustes obrigacionais" (Contratos Mercantis, pág.
679/680). A Lei n. º 8.078, de 11 de setembro de 1990, mais conhecida
como Código de Defesa do Consumidor, é uma conquista recente, e não obstante
seus dez anos de vigência, já serviu de modelo para proteção do mercado
capitalista até mesmo em outros países, como a Holanda. Nasceu como projeto de lei a ser elaborado pelo Conselho de
Defesa do Consumidor, constituído antes da promulgação da Constituição de
1988, para amparar integralmente o consumidor dos malefícios advindos da
sociedade de consumo moderna, principalmente na relação estabelecida junto ao
fornecedor de produtos e serviços, já que este adquiriu, ao longo dos anos, o
posicionamento de parte mais forte. Tinha em vista o legislador, pois, ao elaborar o projeto de
lei que se tornaria a codificação das normas de consumo, contrabalançar a
relação estabelecida entre consumidor e fornecedor, cumprindo desta maneira o
previsto no art. 5º, XXXII, da Carta Magna: "o Estado promoverá, na forma
da lei, a defesa do consumidor". Até por isso, cuidou de definir o que é
consumidor (art. 2º), fornecedor (art. 3º), produto (art. 3º, § 1º) e
serviços (art. 3º, § 2º). Todavia, como tudo o que é novo, demorou algum tempo para
que os juristas apreendessem claramente o objetivo e o conteúdo do Código de
Defesa do Consumidor, e até hoje a maior dificuldade vem sendo quanto à sua
aplicabilidade ou não nos processos interpostos ante o Judiciário. Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor As relações entre usuários de cartão de crédito com as
empresas administradoras e instituições financeiras passaram a chamar a
atenção dos juristas brasileiros há pouco tempo, haja vista a rapidez com que
foi implementado na sociedade de consumo, bem como a maciça divulgação e
propaganda do produto e, conseqüentemente, a falta de regulamentação legal
ante os novos problemas que lhes estavam sendo apresentada. Isto porque a novidade trouxe consigo, como bem ilustrou o
mestre Waldirio Bulgarelli em sua obra Contratos Mercantis, "uma operação
que se efetiva através de assinatura pelo beneficiário de um impresso
contendo, em letras minúsculas, as condições do negócio, e que, portanto, é
um segmento importante do chamado direito do consumidor" (pág. 666). Fato é que o próprio Código de Defesa do Consumidor não
tratou de modo específico acerca do sistema de cartão de crédito e dos
eventuais problemas que poderiam sobrevir, existindo, por conseguinte, a
necessidade de uma regulamentação específica da matéria, já que a própria
jurisprudência não tem se mostrado em uníssono. Neste sentido, há se
ressaltar com louvor a iniciativa do Instituto dos Advogados do Brasil, que
elaborou um projeto de regulamentação acerca da matéria, visando proteger
principalmente o interesse do consumidor. Nos dias de hoje, a jurisprudência dominante é no sentido
de que o Código de Defesa do Consumidor é aplicável a todas as operações
bancárias, como comprova o entendimento unânime da Quarta Turma do Superior
Tribunal de Justiça ao julgar o recurso especial de um banco contra devedores
de financiamento de imóvel, em ação de revisão contratual fundada em
correções abusivas após a alteração da moeda para o Real. Logo em primeira instância foi decidida a aplicabilidade do
Código de Defesa do Consumidor no contrato sub examine, acarretando em
nulidade da cláusula que versava sobre a autorização irrevogável para o
débito das prestações mensais em conta corrente, redução da taxa de juros
para 12% ao ano e a multa, que era de 10% para 2%, manutenção da atualização
mensal pela caderneta de poupança, e aplicação de juros moratórios de 1% ao
ano. Em recurso dirigido ao Superior Tribunal de Justiça, que foi
acolhido em parte, o relator do processo, ministro Barros Monteiro, asseverou
que em se tratando "de mutuário que se dirigiu ao estabelecimento
bancário a fim de obter financiamento para aquisição de bem imóvel, na
qualidade, pois, de consumidor final, os bancos ficam submetidos ao Código de
Defesa do Consumidor, como prestadores de serviços". Apesar desse
posicionamento, o relator não se olvidou da jurisprudência consolidada pelo
Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal, de que a taxa de
juros de 12% ao ano limitada pela Lei de Usura não seria aplicável às
operações provenientes de instituições financeiras. Compartilhando do mesmo entendimento do eminente relator, o
ministro César Rocha salientou: "O CDC incide sobre todas as relações e
contratos pactuados pelas instituições financeiras e seus clientes, e não
apenas na parte relativa à expedição de talonários, fornecimento de extratos,
cobrança de contas, guarda de bens e outros serviços afins. As relações
existentes entre os clientes e o banco apresentam nítidos contornos de uma
relação de consumo". Depreende-se, portanto, que, em sendo o cartão de crédito
um produto quase em sua integridade bancário, salvo aqueles emitidos por
administradoras autônomas, as normas contidas no Código de Defesa do
Consumidor são aplicáveis em suas operações e regulamentações. Antes de analisar propriamente o Termo de Ajustamento e
Conduta firmado entre o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor da
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça e as Associadas da
ABECS – Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e
Serviços, necessário se faz um breve relato de alguns de seus antecedentes. Em 13 de março de 1998, a Secretaria de Direito Econômico,
na atribuição de suas funções legais, editou a Portaria SDE n. º 004, em
aditamento ao elenco do art. 51 da Lei n. º 8.078/90, e do art. 22 do Decreto
n. º 2.181/97, com o fim de orientar o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor
quanto à determinação de cláusulas abusivas relativas ao fornecimento de
produtos e serviços. Restaram nulas de pleno direito, dentre outras, as
cláusulas contratuais que estabeleciam cumulativamente a cobrança de comissão
de permanência e correção monetária e as que permitiam ao fornecedor emitir
títulos de crédito em branco ou livremente circuláveis por meio de endosso na
representação de toda e qualquer obrigação assumida pelo consumidor. No mês de junho do mesmo ano de 1998, a Secretaria de
Direito Econômico instaurou o Processo Administrativo n. º 08000.022668/96-44
contra várias empresas emissoras de cartões de crédito. Muitas foram as
alegações feitas pelo Órgão, dentre elas, remessa de cartões aos
consumidores sem prévia solicitação, existência nos contratos de cláusulas
mandatos, constatação de desvantagem excessiva, etc. Outro Processo Administrativo, desta vez de n. º
08012.006629/98-69, foi instaurado em 13 de outubro de 1998 pela Secretaria de
Direito Econômico contra algumas empresas emissoras de cartão de crédito.
Neste, fora declarada nula de pleno direito, com fulcro na Lei n. º 8.078/90
regulamentada pelo Decreto n. º 2.181/97, suspendendo seus efeitos, a cláusula
mandato, bem como as demais cláusulas que: Nesse contexto foi firmado o Termo de Compromisso de
Ajustamento de Conduta em 02 de Dezembro de 1998 entre o Departamento de
Proteção e Defesa do Consumidor da Secretaria de Direito Econômico do
Ministério da Justiça e as Associadas da ABECS – Associação Brasileira das
Empresas de Cartões de Crédito e Serviços, em decorrência da grande
quantidade de procedimentos administrativos oriundos de reclamações feitas
pelos associados no tocante ao comportamento na comercialização do cartão de
crédito e seus serviços, bem como à regulamentação prevista nos
Instrumentos de Contratos utilizados pelas Instituições Financeiras e
Administradoras. Teve por objeto manter, preservar, estabelecer e proteger as
relações de consumo relativas à emissão e uso de cartões de crédito,
porém, para melhor entendimento, preliminarmente faz-se indispensável tecer
algumas considerações. Independente da maneira com o qual o cartão de crédito é
adquirido, o associado, ao aderir ao respectivo contrato, não tem prévia
ciência das cláusulas que irão reger a relação junto ao emissor, uma vez
que o Contrato somente é encaminhado por ocasião da emissão do plástico. Por certo, muitas dessas reclamações seriam evitadas se o
emissor remetesse a cópia do contrato ao futuro associado no momento em que
houvesse a autorização expressa para emissão de cartão de crédito, o que
não é feito. Ainda, há vezes em que o cartão de crédito é emitido ao
associado sem que este tenha autorizado expressamente ou solicitado o produto em
decorrência de seu interesse. Esse comportamento, como também algumas cláusulas inseridas
nos Contratos de cartão de crédito, foi apontado pelo Departamento de
Proteção e Defesa do Consumidor, após análise dos procedimentos
administrativos, como abusivas, considerando disposições da Lei n. º 8.078,
de 11 de setembro de 1990, regulamentada pela Lei n. º 2.181, de 20 de março
de 1997. Diante disso, e permitindo a Secretaria de Direito Econômico
o ajustamento de conduta, haja vista a fase em que se encontravam os aludidos
procedimentos administrativos, restou firmado o Termo de Compromisso de
Ajustamento de Conduta. Nele, comprometeram-se as Associadas da ABECS a: Quanto a este último ponto, claro está que os emissores
deverão informar ao menos uma vez, que poderá ser na remessa do Contrato ou
nos extratos e faturas mensais, as denominações dos itens que compõem o custo
do financiamento, pois só assim o consumidor terá plena ciência do que
eventualmente lhe será cobrado, não podendo escusar-se posteriormente de falta
de conhecimento dos índices aplicados. VII - OS ASPECTOS POLÊMICOS DO CONTRATO DE CARTÃO DE
CRÉDITO
Ao revés de suas vantagens, que é fornecer crédito
imediato, facilitar as transações comercias, apresentar maior segurança em
relação ao porte de dinheiro ou cheque, a utilização inadequada do cartão
de crédito pode trazer alguns desconfortos ao seu titular, como a
responsabilidade por compras realizadas antes da data do comunicado da perda,
furto, roubo ou extravio do plástico ao Emissor; a cobrança de altas taxas de
encargos caso deseje financiar o saldo devedor remanescente; a apresentação da
fatura como prova de dívida líquida, certa e exigível. E tais inconvenientes têm que ser suportados se o titular
solicitou o cartão de crédito e autorizou sua emissão, pois caso contrário,
ainda estará recebendo um produto que não requisitou por não ser de seu
interesse e, mais, caso não proceda ao cancelamento tão logo lhe seja
possível, ainda arcará com o ônus da taxa de manutenção do cartão, isto
é, a anuidade. No direito de informação, legalmente previsto no artigo
5º, XIV, da Constituição Federal de 1998, e no intuito de defender o
instituto do crédito bancário, cuja solidez apresenta-se como pressuposto a
uma normal economia de mercado (CF, art. 192), é que a existência de bancos de
dados e de cadastros de consumidores, nos quais são relacionados os devedores
inadimplentes ou de duvidosa solvabilidade, encontra sua fundamentação. A legitimidade de sua origem vem, inclusive, abonada pelo
artigo 43 do Código do Defesa do Consumidor, assim como pela Lei n. º 9.507,
de 12/11/97, a saber, para este último: Art. 1º: VETADO Parágrafo Único.
Considera-se de caráter público todo registro ou banco de dados contendo
informações que sejam ou que possam ser transmitidas a terceiros ou que não
sejam de uso privativo do órgão ou entidade produtora ou depositária das
informações. Como bem ensina o mestre Humberto Theodoro Júnior,
"anotar, portanto, a conduta de certo cliente no cadastro do SERASA é
operação de rotina que jamais poderá ser vista como ato ilegal ou abusivo,
mesmo porque a atividade bancária tem, nos dados sigilosos do cadastro de seus
clientes, o principal instrumento de segurança da atividade creditícia que
desempenha. Na verdade, nenhum estabelecimento de crédito pode prescindir do
apoio de rigoroso controle cadastral sobre a idoneidade moral e patrimonial dos
seus mutuários, em virtude da própria natureza das operações que constituem
a essência de sua mercadoria".(Responsabilidade Civil, Ed. Aide, 4ª Ed.,
1997, vol. I). Não obstante, tal assentamento requer que certos cuidados
sejam adotados, mormente para que constrangimentos indevidos não recaiam sobre
o devedor. Para tanto, Eduardo Arruda Alvim sabiamente aduz que "os
arquivos que contenham dados sobre consumidores, só devem ser utilizados diante
de situações que, concretamente, o exijam, pelo fornecedor que o solicitar, e
não por qualquer pessoa" (Código do Consumidor Comentado, RT, 2ª Ed.). Uma vez incluído nas listas impeditivas dos Órgãos de
Proteção ao Crédito, pode o devedor requerer, por via cautelar ou de
antecipação de tutela, o cancelamento do registro ou que a instituição
financeira se abstenha de fazer tal inclusão. Este procedimento é muito comum
nas ações revisionais de contrato que versem sobre a existência de cláusulas
abusivas, a cobrança excessiva de juros ou a não observância de índices de
correção monetária supostamente adequados. Não há se olvidar, ainda, as
ações em que despesas são contestadas por terem sido concretizadas com
cartões perdidos, furtados, roubados ou extraviados. É neste momento que surge um impasse para o Judiciário,
qual seja, analisar se a discussão em juízo do quantum da dívida
contratualmente assumida apresenta-se como fator impeditivo do cadastramento do
devedor nos Órgãos de Proteção (ou Restrição) ao Crédito. Destarte, antes de qualquer consideração ser efetuada,
interessante se faz esclarecer quais são os principais Órgãos de Proteção
ao Crédito e suas funções. A mais requisitado pelas Instituições Financeiras e
Administradoras de Cartões de Crédito é a Serasa – Centralização de
Serviços de Bancos S/A. Trata-se de uma empresa de análises e informações
econômico-financeiras e cadastrais, cujo escopo primordial é apoiar decisões
de crédito e de negócios. Criada em 1968 pelos Bancos para centralizar informações,
possuindo o objetivo de racionalizar custos administrativos e obter incrementos
qualitativos de especialização, a Serasa, principalmente nesta última
década, estendeu sua atuação para todos os setores da economia. Em seu banco de dados há informações negativas (registros
de pendências financeiras) e positivas (registros sobre hábitos de pagamento)
coletadas em cartórios de protestos, distribuidores judiciais, juntas
comerciais, Banco Central, publicações oficiais, registros públicos,
Instituições Financeiras e outras empresas, sobre todos os consumidores com
alguma atividade econômica em todo território nacional, bem como de todas as
empresas legalmente constituídas no Brasil, o que atualmente perfaz cerca de
8,9 milhões, dentre as quais 5,3 milhões em atividade. A Serasa não torna público seu cadastro; tão somente os
fornece aos associados, conforme determinado em seu estatuto, quando
especificamente solicitados, visando com isso proteger o crédito bancário como
um bem em si mesmo, de valia inestimável numa economia exclusiva ou
predominantemente capitalista. Ad latere a Serasa, há o Serviço Nacional de Proteção
ao Crédito, popularmente conhecido como SPC, formado por um arquivo de dados
mantido pelas Câmaras de Dirigentes Lojistas, e cuja finalidade é, também,
facilitar e dar maior segurança às operações mercantis, de serviços e
financeiras. Quanto ao registro nas listas impeditivas dos Órgãos de
Proteção ao Crédito, inúmeros são os entendimentos da manutenção do nome
do devedor enquanto se mantiver pendente ação judicial, sendo que a grande
corrente jurisprudencial apresenta-se favorável à exclusão do registro
negativo, como o Superior Tribunal de Justiça, por meio de suas 3ª e 4ª
Turmas, que tem se manifestado a respeito: "... O que se dessume dos princípios constantes desses
lineamentos jurisprudenciais é que sem efetivo risco para o credor, a este não
convém o registro em comento, mormente quando a dívida de que cogita é objeto
de discussão em ações propostas pelo devedor, com a viabilidade do depósito
ou caução dos valores sub judice…" (trecho do Resp. n. º
161.151/SC – Min. Presidente Costa Leite e Min. Relator Waldemar ZVEITER,
votação unânime). A contrariu sensu, Athos Gusmão Carneiro menciona em seu
parecer que "a simples circunstância de o devedor haver proposto ação
revisional do contrato de financiamento, ou de haver em juízo nomeado bens à
penhora e embargado a execução, tais circunstâncias não afastam a licitude
da manutenção do nome do devedor nos cadastros da Serasa ou entidades
congênere". Diante dessa controvérsia, e no intuito de evitar
repercussões futuras, a Serasa faz constar atualmente em seus registros,
mediante a solicitação de seu associado, a informação de existência de
discussão judicial sobre aquele débito, desde que este esteja sendo, por
certo, nesta condição. Neste sentido, o SPC já previa no art. 19 de seu regulamento
nacional, baixado pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas, a não
inclusão ou a baixa do registro, "caso exista comprovado litígio
judicial, acionado pelo devedor, sobre a certeza da dívida (…)" (g.n.). Mais recentemente, o ilustríssimo juiz federal da 22ª Vara
Federal Cível de São Paulo, Dr. Luciano de Souza Godoy, decidiu em ação
civil pública movida pelo Ministério Público Federal contra a Serasa e o
Banco Central, que no tocante a pessoas físicas ou jurídicas domiciliadas em
qualquer parte do território nacional, a Serasa deverá, sob pena de
aplicação de multa para caso de descumprimento, excluir de seu banco de dados,
no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, todos os registros de débitos que
estejam sendo discutidos judicialmente quanto à existência ou extensão da
dívida; informar aos devedores já cadastrados, ou que venham a ser, acerca do
direito de requerer a suspensão do registro se discutirem a dívida em juízo;
e abster-se de incluir registros de débitos que estejam sendo discutidos
judicialmente, de qualquer forma e em qualquer instância, até o trânsito em
julgado da decisão final. Ao Banco Central foi incumbida a responsabilidade de
informar a todas as instituições financeiras da existência da ação e do
teor de sua decisão. O último entendimento a respeito da matéria veio da Segunda
Seção do Superior Tribunal de Justiça, constituída da Terceira e Quarta
Turmas, sendo que em ação movida por um comerciante contra a empresa
administradora American Express, na qual se contesta a incidência de
juros em dívida contraída em parte em dólar norte-americano com cartão de
crédito, concedeu o ministro Nilson Naves liminar em medida cautelar impedindo
a inclusão do nome do devedor no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e
Serasa, alegando o jurista que a negativação constituiria constrangimento e
ameaça, que são vedados pela Lei 8.078/90. Ainda que o mérito da medida cautelar ainda não tenha sido
apreciado pela Terceira Turma do STJ, o juízo de que nenhum devedor de cartão
de crédito pode ter o seu nome incluído na lista dos maus pagadores se a
dívida ainda estiver sendo discutida na Justiça já foi aceito pela maioria
dos magistrados. Há se concluir, diante das decisões vistas, que na verdade
o que tem originado o maior número de ações nas quais se discute a inclusão
indevida de devedores nos Órgãos de Proteção ao Crédito contra um Banco ou
Administradora de Cartão de Crédito não é propriamente a inclusão, mas a
sua causa. Por conseguinte, interessante seria que as Instituições
Financeiras ou Administradoras de Cartão de Crédito, antes de efetivarem o
registro negativo, comunicassem previamente ao devedor que seu nome está sendo
incluído nas listas impeditivas, guardando-se o comprovante da comunicação
pelo prazo de 20 (vinte) anos, assim como requeressem a exclusão do nome do
devedor dos Órgãos de Proteção ao Crédito em que foi incluído tão logo
haja comprovação da regularização do débito ou conhecimento de ação
judicial em trâmite discutindo o débito. Isto porque a inclusão gera para o devedor uma restrição
ao crédito e, quando indevida, pode tornar-se fonte para indenização por
danos morais, como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso
Especial n. º 51158-5 – ES, relator Ministro Ruy Rosado, in verbis: "RESPONSABILIDADE
CIVIL. BANCO. SPC. DANO MORAL E MATERIAL. PROVA. O banco que promove a indevida
inscrição do devedor no SPC e em outros bancos de dados responde pela
reparação do dano moral que decorre dessa inscrição. A existência de prova
de dano moral (extrapatrimonial) se satisfaz com a demonstração da existência
da inscrição irregular (…)" (DJU de 29/05/95, pág. 15520). Certamente, quando a restrição não for devida e tornar-se
constrangedora para o devedor, e este se socorrer de ação alegando danos
morais, "a indenização deve ser fixada em termos razoáveis, não se
justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento indevido,
considerando que se recomenda que o arbitramento deva operar-se com moderação,
proporcionalmente ao grau de culpa, ao porte empresarial das partes, às suas
atividades comerciais e, ainda, ao valor do negócio, orientando-se o juiz pelos
critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade,
valendo-se de sua experiência e do bom senso, atendo à realidade da vida,
notadamente à situação econômica atual e as peculiaridades de cada
caso", conforme sabiamente lecionado pelo Ministro Sálvio de Figueiredo
(DOU de 05/10/98, pág. 102). O que não se pode é permitir que as indenizações por
danos morais de transformem em uma fonte de enriquecimento sem causa, dando
ensejo a pagamentos milionários por situações que, além de descaracterizarem
a reparação do constrangimento, do sofrimento, da dor, apresentam-se deveras
desproporcionais. Nesta linha de sentido, conforme sabiamente leciona o
Eminente Desembargador Sérgio Cavalieri Filho, em sua obra Responsabilidade
Civil, "só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou
humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no
comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e
desequilíbrio em seu bem estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa,
irritação ou sensibilidade exarcebada estão fora da órbita do dano moral,
porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no
trabalho, no trânsito, entre amigos e até no ambiente familiar, tais
situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio
psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar
o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais
triviais aborrecimentos". A cláusula mandato inserida nos contratos de cartão de
crédito permite ao emissor, em nome do associado, por meio de procuração com
poderes especiais, negociar e obter crédito junto às instituições
financeiras, assinar contratos de financiamento, abrir conta e movimentar os
valores financiados, acertar prazos, juros e encargos da dívida, repactuar
taxas de juros, emitir títulos representativos do débito perante
instituições financeiras, ou, ainda, substabelecer, no todo ou em parte, o
mandato outorgado. Explica-se melhor: o emissor do cartão de crédito, quando
for empresa administradora não integrante do sistema financeiro nacional,
recorre à cláusula mandato para financiar os saldos devedores eventualmente
não liquidados na data do vencimento das faturas, ou quando o associado opta em
parcelar o débito oriundo da utilização do cartão de crédito. Tal
financiamento se faz necessário posto que, independentemente do recebimento do
saldo devido por cada associado, o emissor tem que efetuar o pagamento das
transações efetuadas por seus associados junto à rede de estabelecimentos
comerciais filiados. Essa operação, estritamente financeira, deve ser, posto que
não há outra forma, visualizada de forma global. Os financiamentos obtidos
pelo emissor são efetuados em grandes blocos, dependendo do montante a ser
financiado. A taxa de financiamento, portanto, é oscilante na medida em que,
quanto maior o volume tomado para recurso, melhor apresenta-se a taxa de
financiamento obtida. Portanto, os percentuais cobrados pelos emissores de cartões
de crédito são resultantes dos custos incidentes, como o de captação (juros,
comissões e tributos), de processamento (manutenção da conta cartão), ou
ainda de garantia (obtenção de linha de crédito junto às instituições
financeiras). Isto posto, nas situações de atraso do pagamento do saldo
devedor conseqüente da utilização do cartão de crédito são cobrados pelo
emissor encargos de financiamento nos moldes praticados pelo mercado, posto que,
como dito anteriormente, não há regulamentação específica sobre a matéria. O entendimento da validade da cláusula mandato foi aceita
pelo Judiciário Brasileiro até bem pouco tempo, e no que se refere à emissão
de nota promissória e letra de câmbio, há até mesmo a Súmula 6 editada pelo
Tribunal de Alçada do Paraná. A propósito, em razão de Termo de Ajustamento de Conduta
firmado entre a ABECS – Associação Brasileira das Empresas de Cartões de
Créditos e Serviços e o Departamento de Defesa do Consumidor da Secretaria de
Direito Econômico do Ministério da Justiça, a cláusula mandato foi
absolutamente mantida pelo Órgão, restando apenas aos emissores de cartão de
crédito a obrigação de divulgar pelo menos uma vez, aos titulares de cartão,
a denominação dos itens que compõem o custo de financiamento e a divulgação
mensal dos percentuais dos encargos de financiamento do mês em referência e os
previstos para o próximo mês. Assim sendo, o emissor faz, geralmente, constar
discriminados nas faturas mensais encaminhados aos associados os percentuais que
incidiram sobre o saldo devedor. Malgrado o exposto, o maior questionamento quanto à
cláusula mandato é que ela beneficiaria tão somente o mandatário,
inexistindo, pois, qualquer benefício para o mandante, não correspondendo,
conforme esclarece Carlos Alberto Etcheverry, "nos deveres das
administradoras em buscar as melhores taxas, necessariamente menores do que as
que seriam obtidas pelo próprio consumidor, em face da idoneidade e porte
econômico das mandatárias, e de prestar contas precisas do resultado de sua
diligência" . É justamente fundado neste raciocínio que, apesar do
acordado entre a Secretaria de Direito Econômico e a ABECS, o Superior Tribunal
de Justiça e demais Órgãos do Judiciário têm tomado suas decisões, no
sentido de aceitar os pedidos de nulidade da cláusula mandato e de
restituição dos valores cobrados indevidamente. Aliás, recentemente o Quarto Juizado Especial Cível da
Comarca de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, determinou que fosse devolvido a
um titular de cartão de crédito o que fora irregularmente cobrado, haja vista
a falta de comprovação de que o empréstimo havia sido contraído pelo emissor
com o escopo de financiar o saldo devedor do cartão de crédito. "Diante do que os
autos contêm e do que se pode inferir do comportamento processual da requerida,
a única conclusão possível é de que a administradora de cartões, ao menos
no período em que perdurou a relação negocial sob exame, nunca utilizou
capital de terceiros para cobrir os saldos devedores da requerente. Se não o fez, é porque,
evidentemente, utilizou recursos próprios. E não sendo instituição
financeira, como a própria ré salientou em sua resposta (fl. 37), está
impedida de cobrar taxa de juros superior a 12% ao ano. De qualquer forma,
estaria ainda assim exigindo taxa bem superior à que supostamente teria pago. O
demonstrativo de fl. 114 informa que a taxa de juros repassada na fatura com
vencimento em 08 de março de 1996, para pegar apenas um exemplo, foi de 12,26%
ao mês. Este saldo devedor poderia ter sido coberto, utilizando-se das linhas
de crédito contratadas, com custo não superior a 3,95% ao mês, que é a taxa
estipulada no contrato de fl. 132/134, com vigência de 02 de fevereiro a 04 de
março do referido ano…" (processo n.º 01196607970, 4º JEC de Porto
Alegre) Insta frisar que este entendimento somente deve ser mantido
quando se tratar o emissor de empresa administradora de cartão de crédito.
Aliás, no que tange as Instituições Financeiras, as mesmas já
providenciaram, sabiamente, a exclusão da cláusula mandato dos atuais
contratos de adesão, vez que os financiamentos são efetuados pelo próprio
Banco emissor do cartão. Na economia estabelecida atualmente no mundo em decorrência
do fenômeno da globalização rege o princípio do informalismo, motivo pelo
qual as empresas emissoras de cartões de crédito emitem mensalmente aos
associados, como meio de prova da dívida que está sendo cobrada, a fatura
mensal, que traz em si uma presunção juris tantum de veracidade. Neste sentido, julgou o eminente juiz da 2ª Vara Cível da
Comarca de Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, Dr. Murilo Magalhães Castro Filho,
na ação de prestação de contas n. º 36446: "Entabulou com o réu
contrato visando a utilização de cartão de crédito. Certamente sabia, de
antemão, que o não pagamento da integralidade da fatura, na data respectiva,
implicaria na incidência de juros e encargos sobre o saldo devedor,
conseqüência que, além de notória para aqueles que utilizam cartão de
crédito internacional, vem expressamente prevista no contrato. De outra banda, os extratos
enviados mensalmente ao autor são auto explicativos, com descrição minuciosa
das despesas efetuadas, do valor mínimo a ser pago, bem como da taxa de juros
que vigorará no período seguinte, caso o titular não pretenda resgatar a
integralidade da fatura. Assim, recebe o autor todas
as informações necessárias sendo descabida a pretensão de prestação de
contas relativas às quantias captadas pela administradora, para financiamento
das operações dos usuários do cartão, porquanto a taxa de juros é informada
previamente ao titular, que poderá decidir se utiliza ou não o crédito
colocado à sua disposição. Posto isto, diante da
evidente falta de interesse de agir, julgo extinto o processo, forte no art.
267, VI do CPC. (…)" Logo, se o titular do cartão não concordar com algum
lançamento aposto na fatura, cabe a ele provar onde ocorreu o erro e apontar o
valor correto. "A função primordial
do cartão de crédito, que é a de promover a expansão do crédito na economia
popular, ficaria gravemente comprometida se não se desse valor ´probante aos
extratos, faturas e outros documentos apresentados pela administradora do
cartão como demonstrativo do débito do usuário para elidi-los, é preciso
contra-prova idônea e robusta, não bastando impugnação vaga e genérica do
valor cobrado." (TJRJ, Ap. 8.638/95, 2ª Câmara Cível, in:Jurídica
On-Line. Loc. Cit.) No entanto, havendo dúvida fundamentada, o emissor tem,
considerando o art. 51, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor, que fazer
prova da dívida não apenas mostrando a fatura mensal, mas também apresentando
o comprovante de venda com a assinatura do titular do cartão, para que não
reste dúvida sobre a autoria da transação. Outros pontos controversos no sistema contratuais do cartão
de crédito são as cláusulas que dispõem acerca da responsabilidade de
transações contestadas e desconhecidas dos associados decorrente do uso
fraudulento do plástico, que nada mais é do que a representação física da
concessão de crédito. Este ocorre quando há a utilização do número gravado
no plástico para aquisição de bem ou serviço por terceiros estranhos à
relação jurídica, sem a autorização do associado, por meio de terminais
manuais ou eletrônicos, telefone, Correios ou Internet. A utilização indevida do plástico nos casos de perda,
roubo, furto ou extravio ocorre quando o associado perde ou tem seu instrumento
de crédito roubado, furtado ou extraviado, sem comunicar o fato imediatamente
à Administradora ou ao Banco. Nestes casos, entende a corrente tradicional que
a responsabilidade pelo pagamento das despesas é do titular, haja vista a
exigência do pressuposto da culpa prevista no art. 1523 do Código Civil para
responsabilização civil das pessoas jurídicas. Assim manifestou-se o 1º Colégio Recursal da Comarca de
São Paulo no processo n. º 5.747, ao julgar improcedente a ação em que a
autora contestava a realização de despesas por terceiros com cartão furtado,
fundamentando que "o cartão de crédito é meio de pagamento e cabe ao
usuário todo o cuidado na sua conservação, o que é da essência do sistema.
Não obstante, a autora em um local público culposamente deixou sua bolsa…
(que continha o cartão)… ausentando-se por alguns minutos (fls. 4) e
quando voltou constatou falta de vários objetos, mas não noticiou imediatamente
o fato à ré, omissão que representa um segundo fato culposo. Logo, foi
exclusivamente ela quem deu causa ao uso indevido por terceiro, nada podendo ser
feito em sentido contrário pela ré". Ressalte-se que a comunicação do
furto do cartão se deu mais de quarenta dias após o fato, impossibilitando que
o banco adotasse qualquer providência impeditiva das operações efetivadas. No Estado do Rio de Janeiro, também há decisão análoga,
como a proferida no processo n. º 00/20614-5, em que o emérito julgador
concluiu não assistir razão à autora, já que "incumbia a mesma, por
força do contrato celebrado com a ré, informar o furto de seu cartão de
crédito, a fim de que o réu adotasse as medidas protetivas de seu direito,
deixando de creditar as compras porventura realizadas por terceiros, estranhos
à relação jurídica formada entre as partes". E em Brasília, registre-se o entendimento do Douto Juízo da
2ª Vara do Juizado Especial Cível de Brasília / DF, em processo julgado pela
Excelentíssima Doutora Juíza de Direito SILVANA DA SILVA CHAVES, acerca de
nulidade de cobrança: "CARTÃO DE CRÉDITO.
EXTRAVIO. RESPONSABILIDADE PELO USO INDEVIDO. O TITULAR RESPONDE PELO USO
INDEVIDO SE NÃO COMUNICA IMEDIATAMENTE O FATO À EMPRESA EMISSORA. O PORTADOR
SÓ SE EXONERA A PARTIR DA COMUNICAÇÃO. (TJDF, APC N. º 0026530/91/DF, REG.
INT. PROC.: 59.533, Decisão: 24.08.92, 1ª Turma Cível, Rel.: Des. JOSÉ
JERONYMO BEZERRA DE SOUZA, Pub.: DJDF 16.09.92, p.: 28.646)." Isto porque até o exato momento do comunicado, não tem como
o emissor tomar ciência da perda, furto, roubo ou extravio do cartão de
crédito, inexistindo meios para aferir quem de fato encontra-se no
estabelecimento comercial requerendo autorização para concretizar despesa.
Assim entendeu o 1º Juizado Especial Cível de Defesa do Consumidor de Salvador
no processo n. º 02815/99: "é de sabença geral e notório que a guarda e
segurança do cartão de crédito é, em princípio tarefa de exclusividade do
seu legítimo possuidor, cumprindo-lhe proceder à comunicação de qualquer
fato que possa alterar a relação jurídica existente entre o portador e a
administradora, para o fim de salvaguardar interesses comuns que dizem respeito
não somente ao consumidor como também ao fornecedor de serviços". Nesta mesma linha de raciocínio, no processo 1877/99, a 2ª
Turma Recursal dos Juizados de Defesa do Consumidor de Salvador decidiu que
"não se pode atribuir culpa a Empresa Administradora de Cartões de
Crédito, por compras indevidamente realizadas com cartão furtado, se o titular
ou dependente portador, a quem cabe a guarda e a responsabilidade pelo uso
indevido do cartão na forma prevista no contrato, não comunica o furto
imediatamente após o evento, a empresa emissora, principalmente, ficando
provado que as transações comerciais ocorreram antes do conhecimento, por
parte da Administradora, da ocorrência do furto", concluindo que "a
responsabilidade pela conferência da assinatura do portador do cartão cabe ao
estabelecimento comercial onde se deu a transação e este deverá ser acionado
pela parte prejudicada". E para que não haja uma conclusão equivocada de que somente
os Juizados Especiais Cíveis julgam verificando o disposto nas cláusulas
contratuais, o Egrégio Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por decisão da
lavra de seu então desembargador Barbosa Moreira, hoje integrante do Colendo
Supremo Tribunal Federal, proclamou que: "Cartão de Crédito.
Extravio. Compras Efetuadas antes da comunicação do Fato à patrocinadora.
RESPONSABILIDADE DO TITULAR. Incidência de correção monetária. Cartão de
crédito extraviado que se utilizou indevidamente para diversas compras, nenhuma
das quais posterior à comunicação do fato pelo titular à patrocinadora.
Responsabilidade daquele pelo Pagamento do preço total dos negócios.
Correção monetária da dívida a partir do ajuizamento da inicial da ação de
cobrança" (RT 603/187). Insta frisar que a utilização fraudulenta do cartão
somente logra êxito se o estabelecimento comercial, que se beneficia do
agenciamento de clientes, for conivente, não cumprindo com sua obrigação
muitas vezes contratual de conferir com um documento legal de identificação a
autenticidade da assinatura aposta no documento legal da venda, que é o
comprovante de venda. Até por isso o Juizado Especial de Causas Cíveis do Foro
Regional de Santo Amaro, São Paulo, no processo n. º 2812/99, imputou a
responsabilidade da conferência pelas assinaturas apostas no comprovante de
venda aos estabelecimentos comerciais, in verbis: "Os dois
estabelecimentos comerciais deveriam, ao aceitar um pagamento mediante cartão
de crédito, tomar as cautelas necessárias, no sentido de identificar o
comprador e respectiva assinatura com documento oficial, motivo pelo qual devem
ressarcir a autora pelo prejuízo sofrido em razão de tal negligência". Não se trata de culpa concorrente, mas sim de culpa
exclusiva do estabelecimento que acolheu indevidamente o cartão de crédito
como meio de pagamento. Há, no entanto, uma corrente mais moderna fundamentada na
teoria do risco do empreendimento, responsabilizando o emissor pelos riscos
advindos das falhas do cartão de crédito, que pode "se deixar
roubar". Tal entendimento não deve prosperar, uma vez que leva em
consideração, ab initio, o "defeito" de possibilitar o roubo
ou a fraude do plástico, o que não é verdade, haja vista o complexo sistema
de segurança oferecido pelo emissor ao associado, desde que o mesmo cumpra seu
dever contratual de comunicar o fato tempestivamente. Depois, porque pretende
repassar a responsabilidade do titular pelos valores contestados ao emissor,
independente de culpa, tão e somente por este auferir grandes lucros
conseqüentes de sua atividade econômica. Além desses, outras ocasiões há em que o cartão pode ser
utilizado indevidamente por terceiros, como nos casos em que é roubado ou
extraviado antes de ser recepcionado pelo associado, encontrando-se em processo
de remessa, ou ainda, quando há a modificação ou a alteração no embosso do
plástico por quadrilhas especializadas. Neste último caso, a alteração
torna-se de fácil detectação quando a gravação no plástico for mal feita
ou o número do cartão estiver desalinhado. Não se pode olvidar dos cartões que são falsificados ou
fabricados a partir de um plástico em branco, podendo ser incluída a
codificação da tarja magnética, como vem sendo amplamente divulgado pela
mídia. Pode-se constatar a falsificação arranhando o plástico e/ou o
holograma da bandeira para tentar despregá-lo. Ainda, existe a possibilidade da gravação dos dados de um
associado reproduzidos na tarja magnética de um plástico legítimo de outro
associado. Esta fraude requer que o estabelecimento e o fraudador estejam em
conluio. Malgrado a proibição acordada no Termo de Compromisso de
Ajustamento de Conduta acerca de envio de cartões de crédito sem a prévia e
expressa solicitação, na prática o que se verifica é que a emissão
indiscriminada continua a ser realizada, sendo os plásticos remetidos sem
consentimento, em decorrência das metas comerciais estabelecidas pelas
Administradoras ou Bancos no tocante à produtividade e à captação de novos
clientes. Entrementes, não vislumbram os emissores estarem cometendo
qualquer infração, visto alegarem tratar-se de "amostra grátis". O
cartão de crédito é encaminhado ao associado em potencial para que o mesmo
verifique se há real interesse em permanecer com o plástico e beneficiar-se de
seus serviços, ou proceder ao respectivo cancelamento, sem que haja por
determinado período qualquer ônus, v.g., cobrança de anuidade. A questão, no entanto, torna-se controvérsia no momento em
que o suposto associado, sem fazer uso do cartão por não ser de seu interesse
e sem comunicar ao emissor seu desejo de cancelá-lo, é cobrado por taxas de
administração. Isto porque segundo o entendimento do Ministério Público do
Estado de São Paulo, quando os cartões são enviados a título de amostra
grátis, o consumidor fica desobrigado a pagar a anuidade, mensalidade ou
quaisquer outras despesas, devendo no período de isenção mínimo de 3 (três)
meses proceder tão somente aos pagamentos das compras por ele realizadas. Este
procedimento não é vetado pelo Código de Defesa do Consumidor, uma vez que
equivaleria a uma espécie de oferta de produto que somente seria aceito pelo
consumidor se ele utilizasse o cartão além do período que lhe foi concedido
para uso gratuito. A contrariu sensu, o Excelentíssimo Juiz de Direito da
1ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, Dr. Osvaldo Magalhães Júnior,
decidiu no Processo n. º 1247/99, que: "Não há que se falar em equiparação do fornecimento
de cartões de crédito com o fornecimento de amostras grátis, na medida em que
estas não resultam qualquer ônus para o consumidor, ao passo que os cartões,
após o período de seis meses, podem resultar ônus pela sua utilização, como
também situação de risco ao próprio consumidor, em virtude de eventual
extravio e/ou desbloqueio por terceiros de má-fé". Fato é que não se pode impedir que as Administradoras e
Bancos sejam proibidos de exercer suas atividades econômicas, já que este é
um direito previsto constitucionalmente no art. 5º, II. Não obstante, emitir
cartão sem a expressa anuência do consumidor, além de desrespeitar o
Compromisso firmado com a Secretaria de Defesa Econômica, que prevê multa de
500.000 (quinhentas mil) UFIR’s, fere frontalmente o inciso III do artigo 39
da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, in verbis: Art. 39 – É vedado ao
fornecedor de produtos ou serviços dentre outras práticas abusivas: III – enviar ou entregar
ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer
serviço; A solução mais coerente seria que as Administradoras e os
Bancos, antes de encaminhar um cartão de crédito, questionassem o consumidor
sobre o interesse em adquirir o produto, e obter formalmente sua expressão de
vontade favorável, evitando, com isso, futuros transtornos. Um dos aspectos mais polêmicos decorrentes da utilização
do cartão de crédito, e com certeza o de maior relevância para o mundo
jurídico é justamente a cobrança, pelo emissor, de encargos, juros e multa
contratual, incididos nas hipóteses em que o associado não efetuar o pagamento
integral da dívida ou decidir optar pelo seu parcelamento. Muitos são os entendimentos a respeito da matéria. Alguns
juristas e doutrinadores são completamente desfavoráveis à incidência dos
juros de mercado cobrados pelos emissores de cartão de crédito, como Régis
Fernandes de Oliveira, Edvaldo Brito, Eros Roberto Grau, Sergio Gischklow
Pereira, Araken de Assis, José Afonso da Silva, Nagib Slaib Filho e Luis
Roberto Barroso, desconsiderando o princípio do pacta sunt servanda.
Outros, destarte, preferem adotar uma linha mais tênue, tentando
freqüentemente estabelecer uma composição da dívida entre o emissor e o
associado. O interessante, no entanto, é que nenhum deles conseguiu encontrar
uma solução pacífica a respeito. No entanto, considerando qualquer dos posicionamentos, não
se pode esquecer de mencionar a celeuma gerada pelo Decreto n. º 22.626, de 07
de abril de 1933, mais comumente denominada Lei de Usura, no tocante à sua
aplicabilidade nas operações bancárias. O Excelentíssimo Juiz de Direito do Estado do Rio Grande do
Sul Sr. Pedro Luiz Pozza aduz que "no Brasil, com o advento da Lei n. º
4595/94, que dispõe em seu art. 4º, inciso IX, competir ao Conselho Monetário
Nacional limitar as taxas de juros e demais encargos cobrados pelas
instituições financeiras construiu-se orientação pretoriana no sentido de
que estariam essas, a partir de então, fora do alcance dos tentáculos do art.
1º do Decreto n. º 22626/33 – chamada Lei de Usura – consolidando-se tal
posição na Súmula n. º 596 do STF, que assim prescreve: ‘as disposições
do Decreto n. º 22626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros
encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou
privadas que integram o sistema financeiro nacional’". Esta orientação, segundo o Meritíssimo Juiz "foi o
principal motivo para que o legislador constituinte de 1988 incluísse, entre os
mandamentos constitucionais, norma semelhante à do art. 1º do Decreto n. º
22626/33". Destarte, em 06/10/88 foi aprovado o Parecer Normativo SR n.
º 70, da Consultoria Geral da República, "onde ficou estabelecido o
entendimento oficial da Administração Pública Federal, refletindo, em
conseqüência, junto ao Banco Central do Brasil, autarquia reguladora,
disciplinadora e fiscalizadora das instituições financeiras – que de
imediato expediu circular no sentido de ainda vigoraram as normas anteriores à
Constituição Federal de 1988 – de que a disposição constitucional,
limitadora da taxa de juros por elas cobradas, não era auto-aplicável,
carecendo da edição de lei complementar, nos termos do art. 192, caput, do
novo texto constitucional". Portanto, é função do próprio Banco Central do Brasil
autorizar, bem como fiscalizar as instituições financeiras que emitem cartões
de crédito, vez que apenas estas é que podem conceder financiamentos nos casos
em que há a opção do associado em financiar o saldo devedor da fatura.
Porém, esta atribuição não incide nas empresas administradoras de cartões
de crédito. Antes mesmo da decisão unânime da Quarta Turma do Superior
Tribunal de Justiça no que tange à aplicabilidade do Lei 8.078 de 1990 nas
operações de crédito bancário, vez tratarem-se de relações de consumo, já
sustentava o advogado Leandro Cardoso Lages que na maioria das vezes, o cliente
não recebe uma cópia do aludido contrato, e mesmo quando lhe é apresentado,
ele se encontra eivado de cláusulas em desacordo às normas estipuladas pelo
Código de Defesa do Consumidor, de difícil compreensão, e que não explicitam
de forma clara como os juros são aplicados, já que estes geralmente são
capitalizados, caracterizando o anatocismo, isto é, a cobrança de juros sobre
juros, aplicando-se o fator compensatório várias vezes sobre um único valor
de forma que o montante inicial sofra uma excessiva onerosidade, prática esta
vedada pela Lei de Usura em seu art. 4º: "É proibido contar juros dos
juros: esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos
saldos líquidos em conta corrente de ano a ano". Quanto a isto, já pregava o eminente Jurista José Afonso da
Silva a respeito dos juros limitados: ‘Está previsto no parágrafo terceiro
do artigo 192 que as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e
quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão
de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a cobrança
acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as
suas modalidades, nos termos que a lei determinar. Este dispositivo causou muita
celeuma e muita controvérsia quanto a sua aplicabilidade. Pronunciamo-nos, pela
imprensa, a favor de sua aplicabilidade imediata, porque se trata de uma norma
autônoma, não subordinada à lei prevista no caput do artigo. Todo parágrafo tecnicamente bem situado (e este não está,
porque contém autonomia de artigo) liga-se ao conteúdo do artigo, mas tem
autonomia normativa. Veja-se, por exemplo, o parágrafo primeiro do mesmo artigo
192. Ele disciplina o assunto que consta dos incisos I e II do artigo, mas suas
determinações, por si, são autônomas, pois uma vez outorgada qualquer
autorização, imediatamente ela fica sujeita às limitações impostas no
citado parágrafo. Se o texto em causa fosse inciso de artigo, embora com
normatividade formal autônoma, ficaria na dependência do que viesse a
estabelecer a lei complementar. Mas tendo sido organizado num parágrafo, com
normatividade autônoma, sem ferir a qualquer previsão legal ulterior, detém
eficácia plena e aplicabilidade imediata. Juros reais os economistas e
financistas sabem que são aqueles que constituem valores efetivos, e se
constituem sobre toda desvalorização da moeda. Revela ganho efetivo e não
simples modo de corrigir a desvalorização monetária. As cláusulas
contratuais que estipularem juros superiores são nulas. A cobrança acima dos
limites estabelecidos, diz o texto, será considerada como crime de usura,
punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei dispuser. Neste
particular, parece-nos que a velha Lei de Usura (Decreto 22.626/33) ainda está
em vigor." (Direito Constitucional Positivo, 6ª Edição, Editora LTR,
1190, páginas 694 e 695). E muito mais grave é a situação das empresas
administradoras não integrantes do sistema financeiro nacional, pois como bem
explica Fran Martins "De acordo com o que se vê das relações das partes
no contrato que dá lugar à emissão de um cartão de crédito não-bancário,
há uma prestação de serviços feita pelo emissor ao portador" (Cartões
de Crédito, Natureza Jurídica, Forense, Rio, 1976, pág. 87). Logo, a
relação entre a empresa administradora e o associado é de prestação de
serviço, ensejando a incidência do Decreto 22.626/33, uma vez que a Lei
4.595/67 afastou a incidência de juros legais tão somente sobre as operações
realizadas por instituições financeiras públicas ou privadas, o que implica
dizer que não houve alterações quanto às demais pessoas jurídicas (Recurso
Extraordinário n. 88.159/RJ). Malgrado o exposto, há se ressaltar o advento da Medida
Provisória n. º 1.963-17, publicada em 31 de março de 2000, que derrogou, no
que se refere às instituições financeiras, a norma da Lei de Usura. Por
conseguinte, a incidência de juros sobre juros se revestiu de licitude com o
art. 5º da referida Medida Provisória: "Nas operações realizadas pelas
instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a
capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano". Há se concluir, pois, que o assunto sub examine ainda
é deveras controverso, e tamanha é sua complexidade que o Tribunal de Justiça
do Estado do Rio de Janeiro entendeu serem os Juizados Especiais Cíveis
incompetentes para julgar ações que versem sobre anatocismo (DOU de 16/11/99).
Ainda assim, a maioria dos doutrinadores é favorável a limitação dos juros
constitucionais em 12% ao ano independente de se tratar de empresa
administradora ou de instituição financeira, aplicando-se a regra também aos
contratos de adesão das administradoras de cartões de crédito, principalmente
no tocante ao sistema rotativo. Com a edição da Emenda Constitucional n.º 40, de 29 de
maio de 2003, que alterou a redação do art. 192 da Constituição Federal para
"O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o
desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade,
em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será
regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a
participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram",
revogando todos os incisos, será necessário aguardar a edição de lei
complementar que discipline a matéria. Enquanto isso, a discussão está longe
de ter fins nos nossos tribunais. Há, nos contratos de adesão dos cartões de crédito,
cláusulas que imputam à responsabilidade do associado eventual gasto que o
emissor tenha, inclusive quanto aos honorários advocatícios, calculados sobre
o valor total da dívida, quando tiver que se socorrer de meios judiciais ou
serviços especiais de cobrança para receber seu crédito. Quanto a isto, manifestou-se em outubro de 1998 o
Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor da Secretaria de Direito
Econômico, em despacho do Diretor Sr. Nelson Faria Lins D’Albuquerque
Júnior, no seguinte sentido: "É claro que esta cobrança afronta o inciso XII do
art. 51 da Lei n. º 8.078/90, porquanto é nitidamente nula de pleno direito,
pois não há previsão contratual de igual monta contra o fornecedor. Inexiste
a responsabilidade do fornecedor por gastos do consumidor na busca de compeli-la
a adimplir os encargos assumidos. A cláusula, como está, transfere do mandante
– fornecedor – para o consumidor o pagamento da obrigação resultante do
contrato de mandato". Tal providência não surtiu muito efeito junto às
Administradoras ou Instituições financeiras emissoras de cartão de crédito,
que ainda insistem em manter em seus contratos cláusula imputando ao titular a
responsabilidade, nos casos de medidas judiciais ou serviços especializados de
cobrança, acerca das despesas de cobrança, custas judiciais e honorários
advocatícios calculados sobre o valor total da dívida.
V - O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
VI - O TERMO DE COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA
Negativação Indevida
Cláusula Mandato
Fatura como prova de relação de consumo
Roubo, furto, perda ou extravio de cartão de crédito
Emissão de cartão de crédito
Encargos, multas e juros
Honorários advocatícios
VIII - MEDIDAS DE SEGURANÇA
Outros problemas podem decorrer da má utilização do cartão pelo portador, ou por falha do emissor, sendo que para evitar que eles aconteçam, a ABECS – Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Créditos e Serviços sugere aos portadores de cartões alguns cuidados básicos a serem tomados.
Nenhum dado pessoal deve ser fornecido, em hipótese alguma, por telefone convencional ou celular, ainda que a pessoa com quem se está falando afirme ser da Administradora ou do Banco emissor do cartão.
A perda, furto, roubo ou extravio do cartão de crédito deve ser imediatamente comunicada ao Emissor (Administradora ou Banco), através da Central de Atendimento disponibilizada, com o escopo de proceder ao cancelamento do plástico. Feito isto, para reforçar a solicitação de cancelamento, deve o titular enviar o mesmo pedido por escrito.
Para tanto, considerando que há emissores de cartões que ainda não possuem Centrais de Atendimentos a Clientes em âmbito nacional, o Deputado Ronaldo Vasconcelos elaborou o Projeto de Lei n. º 3759 de 2000, que ainda se encontra em trâmite no Congresso, visando a manutenção obrigatória pelas empresas administradoras de cartões de crédito de atendimento pessoal para seus associados em todas as capitais do País e cidades com mais de 300.000 (trezentos mil) habitantes, sendo que eventual infração sujeita-se às penalidades do art. 56 do Código de Defesa do Consumidor.
O propósito do ilustríssimo Deputado manifesta-se de grande valia, porém sua aplicação apresenta-se completamente inviável, vez que o custo para manutenção de escritórios de atendimentos pessoais aos titulares de cartões em tantas localizadas tornar-se-ia vultuoso, onerando, desta forma, até mesmo o próprio associado, que acabaria tento que pagar uma taxa de manutenção maior.
As Centrais de Atendimento eletrônicas têm se mostrado eficiente na medida em que os problemas de associados estabelecidos em qualquer localidade do país podem ser sanados com um simples telefonema, muitas vezes até mesmo de telefones públicos, já que há Administradoras e Instituições Bancárias que disponibilizam o serviço de ligação gratuita, não existindo a real necessidade de instalar pessoal para atendimento ao público.
Outra orientação importante feita pela ABECS é quanto ao plástico ou à senha, que não devem, em hipótese alguma, ser emprestados a terceiros, ainda que conhecido, uma vez serem ambos pessoais e intransferíveis, e de responsabilidade exclusiva do associado. O código secreto ou senha representa a assinatura eletrônica de conhecimento único do associado, caracterizando a sua inequívoca manifestação de vontade e concordância com as operações realizadas, de vez que valerão como sua ordem pessoal.
O documento legal da transação (comprovante de venda) deve ser assinado pelo titular do cartão somente após a conferência dos dados lançados, como valor e data, e em seguida inutilizar o carbono existente entre as vias.
Inclusive, a própria ABECS, com base em seu Código de Ética, propôs uma auto-regulamentação do negócio do cartão de crédito explorado pelas Administradoras ou Instituições Financeiras emissoras de cartão de crédito.
Neste Código de Auto Regulamentação do Cartão de Crédito, é sugerido aos emissores zelar pela segurança integral do processo de envio dos cartões, garantindo que este empreendimento não venha a causar riscos, transtornos ou ônus financeiros ao cliente potencial; esclarecer o cliente de forma que ele fique ciente e consciente de sua escolha, sendo que para tanto deverá receber uma carta clara e explicativa dos benefícios do produto e do mecanismo de oferta e o contrato de emissão e utilização do cartão em tempo hábil para leitura e prévia aceitação das cláusulas.
Para que o cliente esteja certo de sua escolha, o emissor lhe oferecerá um período de carência mínimo, contados a partir da data de emissão do cartão, como período de experimentação, no qual não poderá haver cobrança de taxas, tarifas ou débitos automáticos em conta corrente, podendo o plástico ser cancelado por iniciativa do cliente a qualquer tempo ou destruído dentro do prazo de validade sem prévia comunicação ao emissor.
Caso o cliente verifique real interesse em permanecer com o cartão, poderá fazer uso do mesmo dentro do prazo de carência, procedimento este que implicará na adesão ao contrato. A decisão de cancelar o instrumento de crédito deverá ser imediatamente informada ao emissor.
Como medida de segurança, o emissor deverá encaminhar o cartão devidamente bloqueado, bastando para seu desbloqueio telefonema para a Central de Atendimento ou serviço similar, ocasião em que todos os dados cadastrais deverão ser confirmados.
Opcionalmente, poderá o emissor remeter correspondência ao cliente informando acerca da proximidade do término do período de experimentação gratuito, salientando que, em não ocorrendo o cancelamento, ser-lhe-á cobrada a taxa ou proporcional ao período a completar a anuidade ou será iniciado um período de doze meses de anuidade paga.
Feita a adesão e havendo contestação de despesa pelo associado sob alegação de utilização fraudulenta do cartão, garantirá o emissor o respectivo estorno para análise, podendo esta ser mais detalhada se necessário, desde que esta conduta não acarreta ônus de qualquer forma.
Permanecerá sob responsabilidade do emissor, que inclusive na forma da lei, qualquer atitude que implique restrição indevida ao crédito, culminando em constrangimentos morais de qualquer espécie.
No intuito de viabilizar o contato fácil e direto com o associado, o emissor disponibilizará UM canal de atendimento preparado para resolver eventuais restrições ou problemas decorrentes da utilização do cartão.
Visando a correta utilização do instrumento de crédito, recairá sobre o associado a responsabilidade de observar atentamente as normas contratuais aplicáveis após o desbloqueio, mesmo no período de carência, para que futuramente não alegue desconhecimento da regulamentação do cartão de crédito.
IX - PROJETOS DE LEI EM TRÂMITE PARA REGULAMENTAÇÃO DO
CARTÃO DE CRÉDITO
Na tentativa de criar uma regulamentação específica quanto
ao uso do cartão de crédito, alguns legisladores propuseram projetos de lei a
respeito. Abaixo, seguem alguns selecionados até novembro de 2000.
PROJETOS DE LEI NO CONGRESSO NACIONAL
SENADO E CÂMARA FEDERAL
RELAÇÃO GERAL – novembro /2000
Identificação |
Autor |
Ementa |
Status |
PL 11/99 |
Dep. Paulo Paim - PT/RS |
Identificação de proponente de adesão a sistema de cartão de crédito e assemelhados, a entrega de cartão. |
Comissões: Economia, Indústria e Comércio. Rel.: Antonio do Valle. Parecer favorável. Defesa do Cons. Meio Amb. Minor. Rel. Salatiel Carvalho. Parecer favorável. Constituição Justiça Red.: Relator |
PLC 13/95 |
Dep. João Fassarella – PT/MG |
Dispõe sobre a quebra de sigilo de instituições (inclusive administradoras de cartões de crédito) e a requisição de informações por órgãos do poder legislativo, nas condições que especifica. |
Anexo ao PLP 47/91. Vide tramitação abaixo. |
PLC 47/91 |
Dep. Francisco Dornelles – PPB/RJ |
Dispõe sobre o Sistema Financeiro Nacional. Artigo 20, § 5º e artigo 25: interessa aos cartões de crédito. |
Apenso ao PLP 200/89. Em tramitação na Comissão Especial. |
PLS 90/00 |
Sen. Gilvan Borges |
Dispõe sobre limites máximos de juros a serem cobrados por administradoras de cartões de crédito |
Comissões |
PLC 108/00 |
Dep. Pauderney Avelino |
Administradora equiparada à instituição financeira. Altera art. 17 da lei 4595/64 |
Comissões |
PL 200/89 |
Sen. Itamar Franco PMDB/MG |
Dispõe sobre requisitos dos cargos BACEN e Regulamenta art. 192, inciso V da CF. |
Apensos PLC47/91 e PLS198/89. Comissões Finanças Tributação. Rel.: Manoel Castro. Parecer favorável. Comissão Especial. Rel. Edinho Dez. |
PLP 220/98 |
Sen. Lúcio Alcântara – PSDB/CE |
Dispõe sobre o sigilo das operações e instituições financeiras e dá outras providências. Origem PLS 219/95. Só Poder Judiciário e Legislativo podem levantar o sigilo bancário. |
Comissões: Finanças e Tributação. Rel.: Luiz Carlos Hauly . Parecer favorável. Const. Justiça Redação. Rel. Ney Lopes. Parecer favorável ao substitutivo. |
PLS 268/99 |
Sen. Lúcio Alcântara – PSDB/CE |
Dispõe s/estruturação e os bancos de dados sobre pessoa e disciplina habeas data. Pl. 3494/00. |
Comissões: Defesa do Cons. Meio Amb. Min. Relator Arlindo Chinaglia. |
PL 654/99 |
Dep. Marçal Filho – PMDB/MS |
Estabelece que cartões de crédito contenham reprodução gráfica do rosto dos respectivos titulares. |
Comissões: Economia Indústria e Comércio. Rel.: Ana Catarina (PMDB/RN). Parecer favorável. Defesa Cons. Meio Ambiente Minorias. Rel. |
PL 1.070/95 |
Dep. Ildemar Kusler - PSDB/RO |
Dispõe sobre crimes oriundos da divulgação de material pornográfico através de computadores. (exceto os sítios que controlem acesso restrito a menores, através do número de cartão de crédito). |
Apensos PLS 1713/96, 4412/98. Comissões: Ciência Tecn. Com. Informática. Rel. Const. Justiça e de Redação. Rel. |
PL 1.299/91 |
Dep. Laire Rosado - PMDB/RO |
Proíbe estabelecer diferença de preço ou condições de pagamento entre operações a vista e as realizadas por meio de cartão de crédito. Acrescenta inciso ao artigo 39 da Lei nº 8078/90 (Código Consumidor). |
Apensado ao PL 1825/91. Comissões: Defesa Cons. Meio Amb. Minor. Rel.: Celso Russomano (PPB/SP) |
PL 1.331/99 |
Dep. Badu Picanço |
Considera indevida cobrança de valor, que não seja mora de 2%, juros legais e taxa legal. Indenização em dobro. Altera art. 42 – Código Consumidor. |
Comissões: Defesa Cons. Meio Amb. Minorias. Rel. Celso Russomano: Parecer favorável. Constituição Justiça Red. Rel.: |
PL 1.464/91 |
Dep. Eurides Brito - PTR/RO |
Proíbe estabelecer diferença de preço ou condições de pagamento entre operações a vista e as realizadas por meio de cartão de crédito. |
Apensado ao PL 1.299/91. Vide tramitação acima. |
PLS 1483/99 |
Dep. Dr. Hélio – PDT/SP |
Institui a fatura eletrônica e assinatura digital |
Comissão Especial. Rel.: Júlio Semeguini |
PL 1.778/96 |
Dep. Ary Kara – PPB/SP |
Dispõe sobre a aceitação de moeda nacional e cartão de crédito nacional no pagamento de compras de mercadorias efetuadas em lojas francas. |
Com.: Economia, Indústria Comércio. Rel, Dilson Sperafico. Parecer favorável. Const. Justiça Red.. Rel. Coriolano Sales: Parecer favorável. |
PL 1.825/91 |
Sen. Francisco Rollemberg –PFL/SE |
Substitui pena de detenção por indenização e multa Quando na reparação de produtos for utilizada peça ou componentes usados. Alteração dispositivos da lei 8.078/90 (Código Defesa do Consumidor) |
PLS 140/91. Apensos Pl. 1299/91, 1464/91 e 2977/97. Comissões: Defesa, Consumidor, Meio Ambiente e Minorias. Rel.: Celso Russomano - (PPB/SP). |
PL 2.417/91 |
Dep. Jackson Pereira – PSDB/CE |
Dispõe sobre as atividades, o registro e o funcionamento das agências de viagens e turismo e dá outras providências. (Eliminada referência a pagamento por cartão de crédito). |
Aprovado nas Comissões. Pronto para Plenário da Câmara dos Deputados. |
PL 2.667/96 |
Sen. Francelino Pereira. |
Estabelece limite para multa decorrente de inadimplemento de obrigação contratual: (Condomínio, aluguel, tarifas públicas, demais obrigações), não poderá ser superior a 2% do valor da prestação. |
PLS 172/96. Apensos PLs 2.727/97, 2.241/96, 2.291/96, 2428/96 e 2516/96.Comissões: Defesa do Consumidor, Meio Amb. e Min. Rel.: Expedito Junior (PFL-RO). Parecer favorável. Constituição Justiça Redação. Rel. Paulo Magalhães. |
PL 2.703/97 |
Dep. Antônio do Valle – PMDB/MG |
Dispõe sobre a abertura de créditos especiais e similares, por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito e estabelece a obrigatoriedade da aceitação e autorização expressa do correntista. |
Comissões: Defesa Consumidor Meio Amb. Min. Rel. Jaques Wagner. Parecer favorável. Finanças e Tributação. Rel.: Ricardo Berzoini. Parecer favorável. |
PL 2.977/97 |
Dep. Renato Johnsson – PSDB/PR |
Estabelece que o fornecedor de serviços e produtos remetidos ou entregues ao consumidor, sem solicitação prévia do mesmo, será responsável pelo ressarcimento, em dobro, de toda e qualquer despesa que, em função de tal prática, venha acarretar ao destinatário. |
Apenso ao PL 1.825/91. Vide tramitação acima. |
PL 4.345/98 |
Sem. Lúcio Alcântara PSDB/CE |
Institui a obrigatoriedade de as empresas operadoras de cartões de crédito oferecerem uma versão de cartão de crédito com foto digitalizada. Origem PLS 148/97: aprovado. |
Comissões: Economia. Indústria e Comércio. Rel.: Pedro Valadares (PSB/SE). Parecer favorável. Defesa Cons. Meio Amb. e Min. Rel.: Nelo Rodolfo. Parecer favorável. Const. Justiça Red. Rel: |
PL 4.818/98 |
Dep. Marcelo Teixeira – PMDB/CE |
Obriga administradora de cartão de crédito a oferecer modalidade de contrato na qual o VALOR DA VENDA EFETUADA PELO ESTABELECIMENTO CREDENCIADO lhe é pago em 24 horas. |
Comissões: Economia Indústria e Comércio. Rel.: Múcio de Sá. Parecer favorável foi substituído por parecer Dep. Ruben Medina.: rejeitado. Finanças Tributação. Rel. Anivaldo Vale: Parecer favorável. Const. Justiça Red. Rel.: |
FONTE: ABECS – Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços
CONCLUSÃO
A promulgação do Código de Defesa do Consumidor teve o escopo de proteger o consumidor, parte hipossuficiente, frente ao fornecedor, geralmente parte mais forte na relação, visando o equilíbrio contratual e garantindo direitos oriundos da economia moderna, como a liberdade de contratar.
A conscientização da existência do direito do consumidor é um importante elemento para que cada um exerça sua cidadania, buscando uma tentativa de solucionar seus problemas.
Por conta disso, ocorreram muitas modificações na elaboração e na aceitação de contratos, seja ele de que espécie for, sempre se observando os princípios da autonomia da vontade e da boa-fé.
Hoje, o contrato não faz mais lei entre as partes, vez que o fornecedor deve estar sempre zelando pelos valores morais que equilibram a relação contratual.
Apesar da tamanha importância adquirida no mundo jurídico, muitos ainda não constataram que os preceitos do Código de Defesa do Consumidor devem ser respeitados, e inobservam os procedimentos para manutenção de uma relação contratual transparente e válida.
Isto acontece até mesmo porque a Lei não pode estender seus braços e abraçar todos os problemas resultantes das relações de consumo, pois com a grande evolução tecnológica a que estamos sujeitos, divergências inéditas tendem a surgir a cada dia.
Não é por isso que todos os contratos, especificamente os de cartão de crédito, são ou apresentam cláusulas abusivas ou desfavoráveis ao consumidor. Deve-se ter uma análise muito atenta sob a égide da lei para que haja a nulidade de uma cláusula contratual, mesmo porque tal fato não implica o cancelamento do restante do contrato, permanecendo ativo o princípio da conservação do contrato individual.
Logo, não pode o consumidor, a qualquer aborrecimento ou dissabor, socorrer-se do Judiciário para ver sua pretensão, muitas vezes descabida e ilegal, satisfeita. Se efetivamente houve o dano, deve o fornecedor repará-lo; caso contrário, estaria o consumidor enriquecendo-se ilicitamente, como muito vem acontecendo nos casos de pedidos de indenizações por danos morais ou repetições de indébitos.
Desta forma constatamos a necessidade urgente de uma regulamentação apropriada ao sistema do cartão de crédito, mormente no que tange seu contrato, pois só assim ambas as partes, associado e emissor, estariam de fato seguros a manter uma relação clara e saudável.
O presente trabalho tentou apresentar algumas soluções paleativas, que provavelmente serão úteis por algum tempo, até que alguém esteja disposto a analisar o caso mais cuidadosamente, que é de extrema importância, já que a tendência é que o cartão de crédito adentre no meio sócio-econômico-jurídico substituindo outros meios de pagamento, como o dinheiro ou o cheque.
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ASSOCIAÇÃO DOS ADVOGADOS DE SÃO PAULO.Internet.
SUPERIOR TRIBUNAL FEDERAL.Internet.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE CARTÕES DE CRÉDITO E SERVIÇOS. Internet.
Informações sobre o texto
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)
BRUNNER, Thais. O contrato de cartão de crédito à luz do Código de Defesa do Consumidor. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 287, 20 abr. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5079. Acesso em: 25 abr. 2024.