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O devido processo legal como princípio constitucional do processo administrativo

O devido processo legal como princípio constitucional do processo administrativo

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O artigo analisa o princípio constitucional processual do devido processo legal inserido no processo administrativo, como elemento fundamental para a manutenção de um Estado fundado nos pilares da democracia e da igualdade.

RESUMO: O presente artigo tem por objetivo analisar o princípio constitucional processual do devido processo legal inserido no processo administrativo considerando-se fundamental para a manutenção de um Estado fundado nos pilares da democracia e da igualdade.


Palavras-chave: processo, administração, devido processo legal.


             A história demonstra de forma irrefutável que a estruturação do Estado e a percepção deste como ente legitimado a dizer o direito, as regras de convivência impõem ao indivíduo a necessidade de compreender–se como cidadão e sabedor de que se de um lado emergem obrigações para com o Estado, de outro emergem direitos a serem conquistados e pleiteados. Essa relação mantida entre Estado e indivíduo gera o paradoxo que segundo Silveira (1999,p.134) se estabelece através de um círculo vicioso. Refere o autor que:

             (...) o povo precisa se educar politicamente para conhecer o Estado, a fim de melhor controla-lo. Por sua vez, o Estado deverá estimular a educação do povo a fim de que este, exercendo o controle sobre seus diversos poderes, assegure sua existência e forma de governo. Ou seja, para ter a vida tranqüila e duradoura, o próprio estado necessita de controle popular.

             Esse processo paradoxal reflete diretamente sobre a efetivação da cidadania (1) e manutenção dos princípios da democracia e liberdade sendo o processo o meio hábil a esta promoção.

             O processo tornou-se instrumento fundamental para o exercício da cidadania, pois através dele se concretiza a atividade jurisdicional e administrativa. Refere Pacheco (1990,p260) que " el processo satisface al mismo tiempo, el interés individual comprometido en el litigio, y el interés social de asegurar la efectividade del Derecho(...). Assume perante os cidadãos o papel garantidor da satisfação de interesses legítimos, interesses não apenas perante o próprio indivíduo mas perante a coletividade, garantidor da realização do direito e da justiça na manutenção do Estado enquanto ente político.

             Descabe, todavia, a noção de processo "como meio secundário de exercício de direitos, a exemplo do que ocorria no século passado ou como mero instituto dotado de regras e fundamentos, o processo na atualidade representa a efetividade do direito, da justiça e das garantias constitucionais" (Grunwald, 2002, p.99)". Instrumento si, mas a serviço da cidadania apregoada nos Estados Democráticos de Direito.

             A estruturação em poderes harmônicos e independentes faz com que cada um dos poderes possuía atividades típicas e atípicas e nestas encontra-se inserido o processo, cada qual com suas peculiaridades visando a perfectibilização de suas funções, funções estas definidas no texto constitucional. O Poder Legislativo, em sua função geradora de lei, através do processo legislativo e o Poder Judiciário e o Executivo em sua função aplicadora da lei, através do processo judicial e administrativo (2), imbuídos da noção de que o processo representará a realização do próprio estado.

             Neste sentido assevera Di Pietro(1993, p.394),

             Pode-se falar em processo num sentido muito amplo, de modo a abranger os instrumentos de que se utilizam os três poderes do Estado_ Judiciário, Legislativo e Executivo para a consecução de seus fins. Cada qual desempenhando funções diversas, se utiliza de processo próprio, cuja fonte criadora é a própria Constituição.

             Nesta relação Estado-cidadão-processo, a Constituição Federal vigente passa a atuar como fonte legitimadora das instituições jurídicas incluindo no rol de garantias individuais os princípios processuais (3) que permitem a realização da democracia em sociedade e a ampla participação político-jurisdicional. Rosas (4), neste sentido, refere que "da Constituição Federal nasceram as regras fundamentais da diretriz processual, sem as quais o legislador ordinário não teria condições de delimitar seu campo legislativo". Os princípios constitucionais processuais assumem por conseqüência a missão de respaldar a liberdade, a segurança, a isonomia do cidadão.

             O poder exercido pelo Poder Judiciário, órgão a quem a constituição respaldada pelo desejo do cidadão, incumbiu a tarefa de dizer o direito, nos momentos em que a harmonia social se vê ameaçada desestruturado ao o próprio estado democrático de direito, é vital para a manutenção do ordenamento jurídico e da legalidade concedida pelo próprio estado e neste contexto a Constituição garante ao cidadoa inúmeros direitos e em "especial quanto a regular tramitação de um processo judicial através dos princípios constitucionais processuais n, garantia imprescritível e não-decadenciável(Grunwald, 2002,p.104)", princípios estendidos ao processo administrativo desde a edição da Lei nr.9.874, publicada em 1999, regulamentadora do processo administrativo em âmbito federal.

             A Lei nr.9.784/99 (5) tem o condão de garantir à Administração Pública bem como ao cidadão a garantia da isonomia apregoada constitucionalmente bem como a efetividade de um processo justo impedindo-se a legalização de arbitrariedades sob o auspício de não existir norma que oriente os agentes públicos. Concede ao processo administrativo, garantias constitucionais processuais fundadas nas bases de um Estado Democrático de Direito: democracia, igualdade, liberdade.

             Os princípios processuais assumem, nesse contexto, papel relevante no sentido de garantir não apenas a todos que requeiram ao Estado, a prestação jurisdicional, a obtenham de forma igualitária representando a possibilidade de uma perfeita dialética processual concretizando o que dizia já Carnelutti apud Alvim(2002, p.145), "Paz com Justiça"; estabelecendo os padrões éticos sobre os quais desenvolve-se a atividade processual que assume a finalidade de efetivar os preceitos estabelecidos pela Constituição Federal vigente mas também de obterem a igualdade perante a própria atuação administrativa do Estado; disciplinando situações jurídicas específicas na concretização de uma idéia de direito: paz e justiça; idéias adotadas pela Constituição e norteadoras do Estado Democrático de Direito.

             Pretende-se, sim, por ora demonstrar que somente da correta percepção e aplicação dos princípios constitucionais processuais evitar-se-ão lesões a direitos subjetivos em face das arbitrariedades e discricionariedades legalizadas, dentre o que concede-se destaque ao princípio do devido processo legal.

             O surgimento do devido processo legal tem origens na cultura anglosaxônica, tendo como marco a Magna Carta Libertatum, no ano de 1215, tendo caráter político. Resultou a carta de pressões por parte da nobreza e do clero britânico sobre o rei da Inglaterra, então, João Sem Terra (6).Os senhores feudais, receosos dos julgamentos provenientes da Cora, que então se demonstrava sensivelmente instável e despótico, e, tendo como objetivo garantir, em específico, a mantença de seus privilégios e prerrogativas, entre as quais a prerrogativa de serem julgados por um Tribunal embasado pelas leis da terra, marcham sobre Londres em 24 de maio de 1215 recusando lealdade ao rei. Face às pressões sofridas o rei decide assegurar as demandas dos senhores feudais apresentando um documento denominado Articles of the Barons que veio, posteriormente, dar origem a Carta Magna selada por João Sem terra ainda no ano de 1215 no mês de junho.

             Neste sentido, assevera Friede (1995,p.71), citando Theodoro Junior que:

             (...) manifestado primitivamente como reação da nobreza contra os julgamentos de organismos da coroa que se preocupavam apenas em satisfazer a vontade indiscutível do monarca, o princípio se instalou na velha Inglaterra de João Sem terra, como uma exigência de que todos os senhores feudais tinham direito de ser julgados por um Tribunal formado entre seus pares e segundo as leis da terra (7).

             Posteriormente passou a simbolizar uma garantia a todos os súditos do rei (8), garantia inclusive contra os abusos do próprio rei. Frise-se que o pacto então firmado pelo rei estabelecia-se entre ele e os nobres da Inglaterra, não direcionava-se ao povo em si, no entanto, o pacto obteve repercussão mais ampla que o esperado, espalhando-se seu conteúdo, anos mais tarde, por todo o mundo.

             King John of England agreed, in 1215, to the demands of his barons and authorized tha handwritten copies of magna carta be prepared on parchment, affixed with his seal, and publicy read throughout the realm. Thus he bound not only himself but his ´´heirs, for ever´´ to grant ´´ to all freemen of our kingdom´´ the rigths and liberties the great charter described. With magna Carta, King Jhon placed himself and England´´s future sovereigns and magistrates within the rule of law (9).

             Assevere-se, ainda, que à época não se conhecia a expressão, devido processo legal, mas sim a denominação law of land (10), a Lei da Terra, querendo simbolizar o uso da lei do país, da nação. No dispositivo 39 (11) da Lei da Terra tinha-se a seguinte disposição, aqui traduzida: "Nenhum homem livre será detido ou preso ou tirado de sua terra ou posto fora da lei ou exilado ou, de qualquer outro modo destruído, nem lhe imporemos nossa autoridade pela força ou enviaremos contra ele nossos agentes, senão pelo julgamento legal de seus pares ou pela lei da terra". Restringia-se, desta forma, a atitudes arbitrárias do rei limitando seus direitos devendo observar as leis então vigentes em seu atuar político (12).

             Relata Pacheco(1990,p.134) que:

             La Carta Magna consagra la libertad personal y el derecho de propriedad, algunas garantias personales y ciertas limitaciones al establecimiento de las cargas tributarias. Ella estabelece, además, procedimientos concretos para asegurar la observancia de uma especie de comisión fiscalizadora compuesta de 25 barones del reino. Si se produjere culaquiera infracción a la paz, a las libertades y a la seguridad y éstas no fueren reparadas oportunamente, los barones podían embargar los castillos, bienes y posesiones reales y adoptar las medidas necesarias para reparar satisfactoriamente el agravio.

             Em 1354, na Inglaterra, o Rei Henrique III, filho de João Sem Terra, marcou a evolução da humanidade reafirmando a Magna Carta (13) através do Statute of Westminster of the Liberties of London. A carta de liberdades trouxe em seu texto, pela primeira vez a expressão due process of law em seu dispositivo simbolizando direito concedido ao indivíduo de ter um processo ordenado em substituição ao termo per legem terrae.

             Referia o Statute of Westminster que (14). "Nenhum homem de qualquer camada social ou condição, pode ser retirado de sua terra ou propriedade, nem conduzido, nem preso, nem deserdado, nem condenado a morte, sem que isto resulte de um devido processo legal". Resguardava, deste modo, em seus termos, todo e qualquer cidadão de arbitrariedades, embasada na necessidade de um processo justo e ordenado.

             A Bill of Rights, ou a Declaração de Direitos, de 1689, considerada como o principal documento constitucional da história da Inglaterra reiterou a necessidade de conceder-se garantias individuais aos cidadãos, que segundo Pacheco(1990,p.157):

             (...) fortaleció las atribuiciones legislativas del parlamento frente a la Corona y proclamó la libertad de las elecciones de los parlamentares. Ao mismo tiempo, consignó algunas garantías individuales, como el derecho de peticiópn, la proscripción de penas crueles o inusitadas y el resguardo del patrimonio personal contra las multas excesivas, las exacciones y las confiscaciones.

             Em 1956 Winston Churchil reafirmou a relevância da Magna Carta para a estruturação do país com base em garantias concedidas a seus cidadãos declarando que: "(...) here is a which is above the king and which even he must not break. This reaffirmation of a supreme law and its expression in a general charter is the great work of Magna Carta; and this alone justifies the respect in which men have held it (15)."

             No direito norte americano o princípio do due process of law, antes mesmo de ser constitucionalizado, já se fazia presente nas Constituições de alguns Estados americanos tais como do Estado da Virgínia (16), de Maryland (17) e Carolina do Norte (18) mantendo a garantia assegurada pela Magna Carta e pela Lei de Eduardo III, muito embora, somente a Constituição de Maryland tenha feito menção expressa ao trinômio de valoração vida, liberdade e propriedade, seguida da Constituição da Carolina do Norte; e posteriormente pelas Constituições dos Estados de Vermont, Massachusetts e New Hampshire. Posteriormente, em 1787, o due process of law foi incorporado ao sistema americano de forma uniforme através da Constituição Federal Americana, pelas emendas 5ª e 14ª com os seguintes dizeres: "(...) no person shall be (...) deprived of life, liberty or property, without due process of law (19)".

             Consolidou-se, desta forma, a garantia constitucional de um processo ordenado, garantia característica de países democráticos com o intuito de resguardar seu cidadão de arbitrariedades que possam advir de seus próprios governantes.

             Tal a relevância do princípio como forma de assegurar todo e qualquer indivíduo o direito de um processo justo e isonômico que também encontrou, o due process of law, guarida no artigo 8º da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, nos seguintes termos:

             Art.8º Toda pessoa tem direito, em condições de plenas igualdade, de ser ouvida publicamente e com justiça por um tribunal independente e imparcial, para a determinação de seus direitos e obrigações ou para o exame de qualquer acusação contra ela em matéria penal (20)

             No Brasil, muito embora, como bem ressalva Silva(2000,p.109), " as exigências básicas para a observância de um ´´devido processo legal´´ tenham acompanhado, invariavelmente, a história de nossas instituições processuais" pois que todas as Constituições anteriores reconheciam a normatividade constitucional como princípio implícito, somente com a Constituição de 1988 é que emerge expressamente o instituto do devido processo legal, como "veículo de justiça e dos direitos fundamentais (21)", que passa a simbolizar não apenas um instrumento de defesa contra atitudes arbitrárias mas também um fator propulsor da democracia. Como bem assevera Lima(1990,p.185), o devido processo legal "proporciona forma e matéria ao Estado Democrático de Direito brasileiro, inclusive no que pertine ao seu acréscimo democrático, que agrega noções de justiça, igualdade jurídica e respeito aos direitos fundamentais".

             No contexto histórico vivenciado o devido processo legal passa a adquirir um duplo significado, primeiramente de legitimador da atuação do Estado, não apenas no aspecto jurisdicional mas também administrativo, e, por outra banda como uma resposta negativa a possibilidade de retorno do regime anteriormente vivenciado, a ditadura; demonstrando os legisladores a intenção de prover a nação de um sistema eficiente de proteção contra promoção de atos contrários aos princípios fundamentadores de um Estado Democrático de Direito.

             Nesse desiderato dispõe a Constituição Federal, vigente, dentre as garantias concedidas aos cidadãos, que:

             Art.5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes :

             LIV _ ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. (22)

             Da garantia constitucional de acesso a justiça de forma igualitária e ordenada,direcionada ao processo civil e processo penal, passou-se a conceder a garantia da promoção de atos administrativos fundados em preceitos isonômicos.


A Bipartição do Devido Processo Legal

             De uma forma genérica como já acentuado, o due process of law tem como objetivo primordial resguardar o trinômio vida-liberdade-propriedade, no entanto, não apenas sob a ótica do direito processual, mas inclusive do próprio direito material, muito embora suas origens na Carta Magna tenham se concretizado no âmbito processual.

             O caráter processualístico conferido ao princípio cede lugar para outras análises as quais repercutem diretamente em todos os ramos do direito material, transpõe a esfera individualista para a esfera coletiva bipartindo-se em substative due process e procedural due process, atingindo seu escopo não somente político, mas social e ético.

             O substantive due process, de cunho não privatístico, e, como resultado da análise da Suprema Corte Americana (23) acerca de atos normativos que tenham o condão de ferir os direitos individuais, posiciona-se como obstáculo ao surgimento de leis injustas emanadas do próprio Estado, de modo a assegurar o cidadão contra a criação de leis que venham a ferir mortalmente seus direitos fundamentais (24). Neste sentido assevera Ramos Junior (25) ao afirmar que "a luta do cidadão contra os abusos do Poder Governamental através de instrumentos específicos tem sido encarada como manifestação do devido processo legal em sua acepção material ou substancial"; tendo, por conseguinte, o fim protetivo contra manifestações atentatórias e arbitrárias dos legisladores ao anseio de justiça.

             Nery Junior(1999, p.37), ressalta o surgimento necessário do substantive due process referindo que decorre do instituto a "imperatividade de o legislativo produzir leis que satisfaçam o interesse público" referindo ainda que dessa imperatividade resulta o princípio da razoabilidade das leis, no sentido, de que toda lei que não demonstrar razoabilidade, interesse público, é contrária ao direito devendo, desta forma, ser controlada pelo Poder Judiciário (26).

             Discorre Lima (27) a respeito a limitação das atividades desenvolvidas pelo Legislador no seguinte sentido:

             As idéias fundamentas eram as seguintes: o produto legislativo teria de estabelecer uma relação razoável com o fim legitimamente pretendido, caso contrário a Corte o declararia nulo; e, os poderes do Estado não poderiam chegar ao ponto de limitar a liberdade do cidadão, em especial as liberdades de contrato e de comércio, já identificadas como liberdades protegidas pela cláusula do devido processo.

             A dimensão substantiva (28) significa em realidade o controle do Legislativo pelo Judiciário, tendo como fim invalidar os atos legislativos, as leis que interfiram nos direitos individuais assegurando a todo cidadão o bem estar e a segurança necessária para a convivência sob a proteção Estatal, como refere Lima(1999,p.113), "(...) existem limites além dos quais o Legislativo, como poder responsável pela criação das leis, não pode passar, sendo tarefa dos Tribunais verificar se tais fronteiras foram violadas", fronteiras estas cujos limites competiriam ao Poder Judiciário (29) através do substantive due process law, resguardando, por conseguinte, os direitos fundamentais outorgados pela Constituição aos cidadãos (30) concretizando o Estado Democrático de Direito não apenas em seu aspecto legal, formal mas também em seu aspecto material.

             Sob a ótica processual, o devido processo legal alcança significado mais restrito. O procedural due process passa a significar o direito Dos indivíduos de obterem garantias de caráter exclusivamente processual, tais como o direito ao conhecimento da acusação; o direito a julgamento célere; a ter decisão devidamente motivada; de não ser julgado por com base em provas obtidas por meios ilícitos, o direito de ser julgado por órgão competente, direito ao contraditório; a igualdade entre outros.

             O devido processo legal, passa então a simbolizar a obediência as normas processuais estipuladas em lei; é uma garantia constitucional concedida a todos os jurisdicionados-administrados assegurando um julgamento justo e igualitário, assegurando a expedição de atos administrativos devidamente motivados bem como a aplicação de sanções em que se tenha oferecido a dialeticidade necessária para caracterização da justiça. Decisões proferidas pelos tribunais já tem demonstrado essa posição no sistema brasileiro, qual seja, de defesa das garantias constitucionais processuais no sentido de concederem ao cidadão a efetividade de seus direitos (31).

             É insuficiente a Constituição garantir ao cidadão inúmeros direitos se não garantisse a eficácia destes, nesse desiderato, o princípio de devido processo legal ou, também, princípio do processo justo, garante a regularidade do processo, a forma pela qual o processo deverá tramitar, a forma pela qual deverão ser praticados os atos processuais e administrativos (32).

             Segundo Carvalho(19994,p.132) "o princípio do devido processo legal protege a liberdade em seu sentido amplo - liberdade de expressão, liberdade de ir e vir, liberdade de fazer e não fazer, de acordo coma lei, e os bens, também, em amplo sentido - bens corpóreos (propriedades, posses valores) e bens incorpóreos (direitos, ações, obras intelectuais, literárias, artísticas, sua imagem, seu conceito, sua expressão corporal etc...)

             Cabe ressaltar que o princípio do devido processo legal resguarda as partes de atos arbitrários das autoridades jurisdicionais e executivas, porém, há que se relembrar como ressalta Ruy Portanova (1999,p.78) que a tortura com objetivo de se obter a confissão do demandado já integrou o devido processo legal, e que somente a partir de 1988 é que foi estendido ao processo administrativo, muito embora, antes de sua explicitação já existisse um procedimento estruturado; numa demonstração de que tal princípio não é estático mas adapta-se ao período histórico-jurídico em que atua.

             O processo é composto de fases e atos processuais que devem ser rigorosamente seguidos viabilizando as partes a efetividade do processo (33) não somente em seu aspecto jurídico-procedimental mas também em seu escopo social, ético e econômico, razão pela qual pode-se afirmar que o princípio do devido processo legal enfeixa em si todos os demais princípios processuais de modo que o devido processo legal visa assegurar o cumprimento dos princípios constitucionais processuais inseridos nestas fases pois somente aí ter-se-á a efetivação de um Estado Democrático de Direito, no qual o povo não somente sujeita-se a imposição de decisões como participa ativamente destas.

             Toda atuação do Estado há de ser exercida em prol do público mediante o processo justo, mediante a segurança dos trâmites legais do processo impedindo-se, por conseguinte, decisões voluntaristas e arbitrárias efetivando o princípio constitucional da igualdade e a manutenção do Estado Democrático de Direito.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

             BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2002, p.10.

             CARVALHO,Luiz Airton. Princípios Processuais Constitucionais. Rio de Janeiro: Cartilha Jurídica, TRF/1ª Região, nr.28, 1994.

             FRIEDE, Reis. A garantia constitucional do devido processo legal. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 84, v.716, junho, p.71, 1995.

             GRUNWALD, Astried B. Os princípios constitucionais processuais como signo da efetividade do acesso a justiça no Estado Democrático de Direito. Dissertação de Mestrado, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Porto Alegre, RS, 2002.

             LIMA, Maria Rosynete Oliveira. Devido processo legal. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1999, p.187.

             NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p.31)

             PACHECO, Maximo. Teoria Del derecho. 4.ed. Santiago:Editorial Jurídica de Chile, 1990, p.260.

             RAMOS JUNIOR, Galdino Luiz. Princípios constitucionais do processo. Visão crítica. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000, p.19.)

             ROSAS,Roberto. Direito processual constitucional. Princípios constitucionais do processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p.13.

             SILVA,Ovídio A Baptista da Silva. Processo de conhecimento e procedimentos especiais. In: Da sentença liminar à nulidade de sentenças. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p.96)


NOTAS

             1 Em consonância com a Constituição Federal vigente a cidadania representa a base do Estado Democrático de Direito aliada ao princípio da soberania nacional, pluralismo político, livre iniciativa, respeito a dignidade humana e de valores sociais do trabalho.

             2 Entendendo-se, no presente, por processo administrativo, o instrumento legalmente hábil a promover a efetividade dos direitos e garantias asseguradas constitucionalmente inserindo-as no âmbito material e não apenas formal, em prol dos administrados e da própria administração.

             3 "Derivado do latim principium (origem, começo), em sentido jurídico, quer significar os requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de alguma coisa. E assim, revelam o conjunto de regras ou preceitos, que se fixaram para servir de norma a toda espécie de ação jurídica, traçando assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica"(Silva, De Plácido e. Vocabulário Jurídico.v.2. 1.ed. Rio de Janeiro: Forense,1989,p.447).Paulo Henrique dos Santos Lucon, refere que os princípios, na ciência jurídica, adquirem a função de " organizar o sistema e atuar como elo de ligação de todo o conhecimento jurídico com a finalidade de atingir resultados eleitos; por isso, são também normas jurídicas, mas de natureza anterior e hierarquicamente superior às normas comuns(ou normas não principais), servem de base axiológica e estruturante do conhecimento jurídico, sendo fontes de sua criação, aplicação e interpretação( Lucon,Paulo Henrique dos Santos. Garantia do tratamento paritário das partes.In: Cruz e Tucci, José Rogério.(Coord.) Garantias Constitucionais do processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999,p99.)

             4 Rosas, Roberto. Direito processual constitucional. Princípios constitucionais do processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p.13.

             5 O presente tem como objetivo analisar o princípio do devido processo legal assegurado constitucionalmente face a Lei 9874/99 de âmbito federal, sem querer no entanto afirmar que jamais existira norma regulamentadora de processo administrativos, eis que no Estado de São Paulo a Lei nr.10177/98 e no Estado de Sergipe a Lei Complementar nr. 33/96 já realizavam tal tarefa, porém, a nível estadual. A menção a Lei Federal tem como objetivo demonstrar a preocupação do legislador em ofertar a toda a nação normas gerais ao processo administrativo.

             6 "João Sem terra foi coroado na festa da Ascensão em 27 de maio de 1199 após ter sido escolhido por sufrágio e não por direito divino." (...) era um ato, em realidade, individual de certo número de poderosos magnatas feudais, suficientes para assegurar à Coroa o controle do tesouro e da administração do governo. Eleito dessa forma, o Rei assumia diversos compromissos com os seus sucessores" (Lima, Maria Rosynete Oliveira. Devido processo legal. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1999).

             7 A reação dos senhores feudais as instabilidades da coroa promoveu surgimento dos primeiros traços da instituição de juízes naturais em oposição ao que se conheceu, por exemplo, durante a ditadura militar, no Brasil, como tribunais de exceção. Iniciava-se modestamente a estruturação de um processo com base isonômicas.

             8 A versão original da carta magna fora redigida em latim tendo-se noticias de que a teria sido realizada pelo Arcebispo Stephen Langton.

             9Magna Carta. Disponível em: www.nara.gov/exhall/charters/magnacarta/magmain.html.> Acesso em: 28 abril,2002

             10 Somente com a assinatura da Carta de Liberdades de Londres é que se conheceu o termo due process of law.

             11 Art.39_ Magna Carta_ Nullus liber homo capiatur vel imprisonetur aut disseisietur de libero tenemento suo vel libertatibus, vel liberis consuetudinibus suis, aut utlagetur, aut exuletur, aut aliquo modo destruatur, nec super eo ibimus, nec super eum mittemus, nisi per legale judicium parium suorum, vel per legem terrae" (Nery Junior, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p.31)

             12 "(...) ao tempo da outorga da magna Carta, no ano de 1215, o poder do rei, além de limitado pela ´´lei da terra´´, sujeitava-se ao controle de uma comissão, composta de vinte e cinco senhores feudais. Eles tinham como missão, segundo o Capítulo 61 do referido documento, controlar a execução da Carta por parte do rei, e estavam autorizados a promover o uso da força contra a Coroa, caso ela se recusasse a observar as várias cláusulas do documento"( Lima, Maria Rosynete Oliveira. Devido processo legal. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1999, p.40)

             13 Em 1216 João Sem Terra faleceu tendo deixado o trono a seu filho Henrique II que embora ainda criança reafirmou a Carta Magna, representando a primeira vez em que a carta foi reafirmada. Posteriormente veio a ser reafirmada inúmeras vezes inclusive em sob o mesmo reinado a cada crise política enfrentada pelo monarca. Em 1225 foi reafirmada por Henrique III reduzindo-se de 63 para 37 capítulos tendo a cláusula referente ao julgamento pela Lei da Terra passado do capítulo 39 para o 29. "Doze anos depois, o documento foi denominado Magna Carta, oficialmente, pela primeira vez"(Lima, Maria Rosynete Oliveira. Devido processo legal. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1999, p.36)

             14" That no man of what estate or condition that he be, shall be put out of land or tenement, nor taken, nor imprisioned, nor desinherited, nor put to death, without being brought in answer by due process os thelawe. "Westminster, Statute. Disponível em: http://www.edfac.usyd.edu.au/staff/souters/constitution/statute_westminster.html> Acesso em: 28 abril, 2002. {Texto traduzido: Ninguém deve ser condenado sem julgamento. Além disso, nenhum homem, de qualquer estado ou condição que seja, deve ser posto fora da terra ou propriedade, nem tomado ou aprisionado, nem deserdado, nem posto a morte, sem ser trazido a responder em um devido processo legal} (Tradução do autor)..

             15 Magna Carta. Disponível em: < htpp:// nara. gov/exhall/charters/ magnacarta/magmain.html> Acesso em: 28 de abril, 2002. Texto traduzido: " aqui está uma lei a qual está acima do rei e a qual ele nunca poderá quebrar. Esta reafirmação de uma lei suprema e sua declaração ao povo em geral é o grande serviço da Magna Carta, e isto sozinho justifica o respeito pelo qual os homens a detêm."

             16 Declaração de Direitos do Estado da Virgínia de 09 de setembro de 1776_ Seção 12_ " That every freeman for every injury done him in his goods, lands and persons, by any other person, ought to have justice and right for th injury done him freely whithout sale, fully without any denial, and speedily without delay, according to the law of the land".

             17 Declaração dos Direitos de Maryland, de 03 de novembro de 1776_ inciso XXI_ "(...) that no freeman ought to be taken, or imprisoned, or disseized of this freechold, liberties, or priviliges, or outlaed, or exiled, or in any manner destroyed, or deprived of his life, liberty, or property, but the judgement of his peers, or by the law of the land"

             18 Declaração de Direitos da Carolina do Norte, de 14 de dezembro de 1776_ (...) that no freeman ought to be taken, imprisioned, or disseized of his freechold, liberties, or priviliges, or outlaed, or exiled, or in any manner destroyed, or deprived of his life, liberty, or property, but by the judgement of his peers, or by the law of the land"

             19 Texto traduzido: "(...) nenhuma pessoa será privada de sua vida, liberdade ou propriedade, sem o devido processo legal"."Diz a Emenda V : ´´ ninguém será compelido em nenhum processo penal a ser testemunha contra si próprio, ou ser privado da vida, liberdade, ou propriedade, sem o devido processo legal´´; a Emenda XIV, por sua vez, fala em sua seção I que: ´´ nenhum Estado privará qualquer pessoa da vida, liberdade ou propriedade, sem o devido processo legal´´"( Maciel, Adhemar Ferreira. O devido processo legal e a Constituição Brasileira de 1988. Revista de Processo, São Paulo, n.85, p.175, jan./março1997.

             20 Declaração Universal dos Direitos do Homem. Disponível em:

             21 Lima, Maria Rosynete Oliveira. Devido processo legal. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1999, p.187.

             22 Brasil, Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2002, p.10.

             23 Nelson Nery Junior, acerca do substantive due process faz referências quanto a relação mantida entre o due process of law e os demais ramos do direito, como o direito administrativo, no tocante ao princípio da legalidade e o exercício do poder de polícia. Para tanto menciona que: " No direito administrativo, por exemplo, o princípio da legalidade nada mais é do que manifestação da cláusula substantive due process. Os administrativistas identificam o fenômeno do due process, muito embora sob outra roupagem, ora denominando-o de garantia da legalidade e dos administrados, ora vendo nele o postulado da legalidade. Já se identificou a garantia dos cidadãos contra os abusos do poder governamental, notadamente pelo exercício do poder de polícia, como sendo a manifestação do devido processo legal." Refere ainda, no tocante ao direito privado, " o princípio da autonomia da vontade de contratar" ou seja, de praticar negócios jurídicos, os quais são realizados livremente pelos pactuantes desde que não venham a ferir as normas de ordem pública ou que atentem contra os bons costumes. (Nery Junior, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p.37)

             24 Por direitos fundamentais, tem-se aqueles reconhecidos constitucionalmente e possuidores de valor tão especial para a liberdade individual na sociedade, que justificam o controle de constitucionalidade pelo Judiciário.

             25 Ramos Junior, Geraldo Luiz. Princípios constitucionais do processo. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000, p.17.

             26 Esta tendência já encontra ancoradouro no sistema brasileiro em diversas decisões jurisdicionais, tal como a proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.158-8 acerca da impugnação do art.9º parágrafo 2º da Lei 1897/89, que estendia a vantagem de 1/3 da remuneração a ser paga, por ocasião das férias, aos servidores inativos do Estado do Amazonas em que o Relator Min. Celso de Mello, refere que: "(...) Todos sabemos que a cláusula do devido processo legal - objeto de expressa programação pelo art.5º,LVI, da Constituição- deve ser entendida, na abrangência de sua noção conceitual, não só no aspecto meramente formal, que impõe restrições de caráter ritual à atuação do Poder Público, mas, sobretudo, em sua dimensão material, que atua como decisivo obstáculo à edição de atos legislativos de conteúdo arbitrário ou irrazoável. A essência do substantive due process of law reside na necessidade de proteger os direitos e as liberdades das pessoas contra qualquer modalidade de legislação que se revele opressiva ou, como no caso, destituída do necessário coeficinete de razoabilidade". Ainda na jurisprudência brasileira pode-se encontrar outras decisões como a proferida Supremo Tribunal Federal em 1995. " Ementa: Reforma Agrária. Imóvel rural situado no Pantanal Mato-Grosense. Desapropriação-sanção. ( CF, art.184).Possibilidade. Falta de notificação pessoal e prévia do proprietário rural quanto à realização da vistoria ( Lei nr.8.629/93,art. 2, parágrafo 2º).ofensa ao postulado do due process of law ( CF, art.5º, LIV). Nulidade radical da declaração expropriatória. Mandado de Segurança deferido. Reforma Agrária e Devido Processo Legal. O postulado constitucional do due process of law, em sua destinação jurídica, também está vocacionado à proteção da propriedade. Ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal. ( CF, art.5º, LVI). A União Federal- mesmo tratando-se de execução e implementação de programa de reforma agrária- não está dispensada da obrigação de respeitar, no desempenho de sua atividade de expropriação, por interesse social, os princípios constitucionais que, em tema de propriedade, protegem as pessoas contra a eventual expansão arbitrária do poder estatal. A cláusula de garantia dominial que emerge do sistema consagrado pela Constituição da república tem por objetivo impedir o injusto sacrifício do direito de propriedade". (STF, MS 22.164-0-SP. Rel.Min.Celso de Mello.Plenário. Decisão 30/10/95, DJ 1 de 17/11/95, p.39.206).

             27 Lima, op. cit., p.113.

             28 No tocante as garantias materiais que asseguram o livre e justo acesso `a justiça cita Ramos Junior passagem de reflexão do Ministro Celso de Mello Relator da Adin 1.158-8 no tocante a impugnação do art.9º da Lei 1.897/89 a qual estendia vantagem de 1/3 da remuneração a ser paga por ocasião das férias, aos servidores inativos do Estado do Amazonas: " (...) Todos sabemos que a cláusula do devido processo legal - objeto de expressa programação pelo art.5º, LIV, da Constituição - deve ser entendida, na abrangência de sua noção conceitual, não só no aspecto meramente formal, que impõe restrições de caráter ritual à atuação do Poder Público, mas, sobretudo, em sua dimensão material, que atua como decisivo obstáculo à edição de atos legislativos de conteúdo arbitrário ou irrazoável. A essência do substantive due process of law reside na necessidade de proteger os direitos e as liberdade das pessoas contra qualquer modalidade de legislação que se revele opressiva ou, como no caso, destituída do necessário coeficiente de razoabilidade" ( Ramos Junior, Galdino Luiz. Princípios constitucionais do processo. Visão crítica. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000, p.19.)

             29 No Brasil, tem-se diversos exemplos de respaldo ao devido processo legal substantivo, podendo, exemplificandi grattia, referir a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar em 1994 as ações diretas de inconstitucionalidade n.958-3-RJ e 966-4-DF referentes ao artigo 5º da Lei n. 8.713 de 01 de outubro de 1993 o qual limitava a indicação de candidatos à Presidência da República e à Vice-Presidência, no pleito eleitoral, aos partidos políticos que obtiveram um percentual determinado de votos no pleito anterior. Os partidos políticos, Partido da Reedificação da Ordem Nacional_ PRONA_ e Partido Social Cristão PSC levantaram-se contra a Lei argumentando que a Constituição Federal não previa tal restrição. Mas a decisão final foi proferida pelo Poder Judiciário ao considerar inconstitucional o referido artigo por considerar que impedia o direito de participação dos partidos na formação da vontade política da nação, direito então violado pelo legislador quando da publicação da referida lei.

             30 Alguns exemplos são citados por Lima para sintetizar o substative due process que embora ocorridos nos Estados Unidos demonstram claramente a fundamental atuação do princípio em defesa dos cidadãos; Refere a autora o caso " Buchanan V. Warley, em que a Suprema Corte anulou uma ordenança da cidade de Louisville, que impedia os negros de movimentares-se dentro das áreas onde residiam principalmente pessoas brancas, sob o fundamento de que a lei municipal violara o devido processo legal ao impor uma interferência desautorizada aos direitos de propriedade;" ou caso citado é o ocorrido entre "Meyer v. Nebraska, o qual versou sobre uma lei do estado do Nebraska, que proibia o ensino de outra língua, que não o inglês, em escolas públicas e particulares. Com base nessa medida legislativa, Meyer fora condenado por ensinar a língua alemã. A Suprema Corte julgou inconstitucional essa lei, por considerar que ela violava a liberdade dos pais de adotar suas próprias decisões educacionais." A decisão proferida pela Suprema Corte marcou a expansão do substantive due process of law para a área das liberdades civis.( Lima, Maria Rosynete Oliveira. Devido processo legal. Porto Alegre:Sergio Antonio Fabris, 1999,p.120.)

             31 AMPLA DEFESA_ Defensor nomeado que desempenha atividade meramente formal- Inobservância do princípio do contraditório em sua acepção material _ Exigência de defesa efetiva no processo penal_ Papel do magistrado na fiscalização do devido processo legal _ Nulidade declarada_ Inteligência do art. 5º, LIV e LV, da Constituição Federal. 1. Quando o advogado não se desincumbe do encargo não se forma o devido processo legal, mas um encadeamento de atos procedimentais, de sabor meramente formal. A falta da efetiva e necessária defesa do acusado ofende os princípios da ampla defesa e do devido processo legal insculpidos na Constituição da República em seu art.5º, incisos LIV e LV, que dão base ao procedimento contraditório que informa o processo penal. 2. Não basta que o advogado esteja presente e se manifeste. É necessário que ele faça de maneira a defender efetivamente o réu, contrapondo-se, em igualdade de condições, à acusação. Exige-se que a defesa técnica, por defensor constituído ou nomeado, se revele apta, em argumentos, a oferecer resistência à pretensão acusatória. 3. Para que se tenha materialmente uma defesa, garantidora da realização dos princípios maiores que informam o processo penal, é preciso que o defensor, no exercício de seu munus, garanta que o acusado influa no processo como um de seus modeladores, com o poder de criar situações processuais e reforçar sua perspectiva de sentença favorável. 4. Para se legitimar como agente público, no Estado Democrático, o juiz tem, sob este prisma, uma atividade de conteúdo fiscalizador da legalidade do exercício da pretensão punitiva estatal declarando a final que a sanção requerida é possível naqueles limites e verificando a cada instante se o desenvolvimento do devido processo legal confere com tais limites. Cabe-lhes, assim, também garantir que o réu tenha uma defesa efetiva, sem a qual não está preenchida a exigência do contraditório.[ sem grifo no original ] ( Apelação 953.575/1 - Ação Penal 1.077/92 3ª Vara Criminal de São Bernardo do Campo - 16ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo)

             32 Exempli gratia, pode-se citar a Lei n.8.629/93, a qual trata do procedimento a ser adotado na ocorrência de desapropriação. por parte do Estado sob pena de serem anulados os atos praticados. O mandado de segurança n.22.164-0-SP anulou a desapropriação de uma fazenda tendo-se em vista que não foi efetuada a notificação prévia do proprietário, anteriormente a realização da vistoria por parte do INCRA, procedimento exigido pela Lei.

             33 A efetividade do processo perpassa não apenas pela aplicação dos princípios-garantias previstos na Constituição Federal mas também em sua realização em tempo hábil, a morosidade processual rompe não apenas com a idéia de efetividade como com o próprio princípio da igualdade uma vez que a morosidade tende a ser percebida como vantagem ao demandado e por conseguinte desvantagem ao demandante rompendo com a isonomia pretendida entre as partes litigantes. Assevere-se, também, ao fato de que a inserção da ampla defesa no princípio do devido processo legal, no processo civil, acaba por promover o desequilíbrio entre as partes uma vez que impede a o juízo de verossimilhança nas ações em que se faz necessária a expedição de liminares, conforme refere Silva "o due processo of law, ao contrário do que ocorre na América do Norte, aqui exigirá ‘plenitude de defesa’, a impor a supressão dos juízos de verossimilhança; a cortar as liminares e a consagrar, portanto, a ordinariedade formal e a plenariedade da demanda. Enquanto no direito americano, o princípio de ‘devido processo legal’ nem de longe interfere com os juízos prima facie, permitindo e, mais do que isso, até estimulando a concessão de liminares, nosso ‘devido processo legal’, tal como está inscrito no texto constitucional, ao contrário, sugere que sua observância haverá de assegurar plenitude de defesa ao demandado".(Silva, Ovídio A Baptista da Silva. Processo de conhecimento e procedimentos especiais. In: Da sentença liminar à nulidade de sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p.99)


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OLIVEIRA, Robson Mattos de; GRUNWALD, Astried Brettas. O devido processo legal como princípio constitucional do processo administrativo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 289, 22 abr. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5118. Acesso em: 6 maio 2024.