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Teoria das formas de governo

Teoria das formas de governo

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Vários filósofos ao longo da história buscaram desenvolver teorias e ideias acerca das formas de Governo e de Estado. Confrontemos alguns destes pensadores - mergulhando, sobretudo, nos pensamentos de Bobbio - e conheçamos um pouco mais sobre este modelos construídos num passado bem destoante do panorama atual.

SUMÁRIO: Introdução ..1. Maquiavel ..2. Bodin ..3. Thomas Hobbes.. 4. Giambattista Vicco ..5. Montesquieu ..6. Intervalo: O Despotismo ..7. Hegeu ..Conclusão ..Referência Bibliográfica ..


 Introdução

Os capitulos discorridos adiante, tratam-se das formas de governo e as funções dos Estados, segundo a visão de Bobbio, baseando-se nas obras clássicas, conforme discutidas em seu livro, sendo esse, bibliografia básica para este trabalho. Dessa forma, busca-se interpor as ideias dos autores e salientar os pensamentos de Bobbio, para que seja possível ressaltar quais os posicionamentos dos governos e os modelos idealizados para a instituição: que é objeto de estudo desta pesquisa, o Estado.


1. Maquiavel

Para Norberto Bobbio, Maquiavel substituiu a tripartição clássica aristotélica polibiana pela bipartição, que consiste em duas representações:o principado e a república, na primeira o poder fica concentrado somente nas mãos de uma pessoa, enquanto que na segunda, o poder está ligado à assembleia ou colegiado (correspondente a aristocracia e a democracia). As teorias das formas de governo formuladas pelos gregos não saíram de suas cabeças, mas sim da observação da constituição das cidades helênicas, como visto em Platão e Aristóteles, explicando que as bases de estudos foram a "república romana" e não as "póleis". Nas obras maquiavelistas, não há lugar para "Estados intermediários", decorrente de sua instabilidade por não definirem se futuramente transformaram-se em repúblicas, principados ou em outras tipologias de governo.

Em "O Príncipe", é apresentado a diferença entre o principado hereditário, baseado na lei constitucional de sucessão ao trono, e os principados novos, quando ocorre a troca de dinastias. A obra também apresenta as quatro características fundamentais para o "Príncipe" conquistar o poder, sendo elas a "virtú", baseando-se na ação do "Príncipe" para alcançar seus objetivos sem levar em consideração os meios utilizados (geralmente os principados duradouros devem-se a essa característica); a fortuna, que concerne no aproveitamento do curso dos acontecimentos para dominar a região; a violência e principalmente o consentimento dos cidadãos. A concepção de "per scalascera", baseava-se na tirania, em que o governador não aceitavasair do poder; porém atualmente não existem muitos tiranos "clássicos", os quais foram substituídos pelos chefes carismáticos, figuras políticas presente no século XX com o fascismo na Itália de Mussolini,com o nazismo na Alemanha de Hitler e com o primeiro presidente da república popular brasileira, Getúlio Vargas.

A bondade ou a maldade estão presente apenas na obtenção dos resultados em que os meios são desconsiderados, como visto em uma das célebres frases do filósofo italiano: "Penso que depende da crueldade bem ou mal empregada". A importância da constituição deve-se ao estabelecimento da ordem, tanto que Esparta recebeu a ordem de um legislador; já Roma, a construiu de forma gradual e natural. O governo misto surgiu com a resolução de problemas e de conflitos de interesses antagônicos, fatores que explicam o sucesso desta forma de governo com o passar do tempo (ex.:Roma adotou o poder monárquico, o aristocrático e o popular, instaurado após as reivindicações plebeias, representado pelos tribunos da plebe). Para Maquiavel existem três tipos de governo, desses surgiram outros três que totalizaram seis:a monarquia que transformou-se em oligarquia, a aristocracia virou despotismo e a república tornou-se em democracia, entretanto esses desdobramentos tornaram, na visão do autor, alguns governos perniciosos.


2. Bodin

As obras de Aristóteles apresentam semelhanças formais com as obras de Bodin, entretanto, não há um assunto em que Bodin deixou de dar suas opniões. O autor apresenta "suma potestas" da soberania , que consiste no poder absoluto,(esse termo em latim não significa o poder ilimitado na acepção da palavra, apenas diz que o soberano era o único que não estava sujeito as leis criadas por ele; e acima dele só estava a vontade de Deus) e a perpetuidade. Quantoàs leis naturais o "Príncipe" não podia revogar as leis das quais afetariam as estruturas do reino e também recebia restrições quantos as leis que regulavam as relações entre particulares.

A divisão da sociedade concerne em duas esferas, a pública, responsável por tentar amenizar as desigualdades, o que resultou no direito público e a privada que cuidava das relações entre "iguais", os quais o rei não interfere nos negócios entre particulares, como visto acima, resultando no direito privado. Bodin realizou uma crítica aos governos mistos, decorrente do chamado "rodízio" de poderes resultando no enfraquecimento e na perda da estabilidade do Estado. Esparta e Roma, na visão do filósofo são exemplos de governos mistos, porém para Bodin nestes regimes uma parte do governo sempre se sobrepõe a outra, e se não fosse assim ocorreria a precipitação ou desintegração do reinos citados. O autor defendia a hipóteses de haver uma diferença entre formas de Estado e formas de como governar um Estado; além de citar a existência de três formas de formas de Estado, basicamente: a monarquia, a aristocracia e a república.

O Estado monárquico-democrático consiste na concessão à participação de todas as assembleias pelo rei (como em Atenas), o Estado monárquico-aristocrático, era baseado na restrição quanto à participação da aristocracia (como no principado de Roma), esses são exemplos de Estados "não-mistos"; já a aristocracia pode ter um governo democrático, se houver a distribuição igualitária a todos súditos ou preferir por um governo aristcrático, cuja distribuição ocorrerá apenas entre os nobres; em que Rosseau aprimora os conceitos na obra "Contrato social", em que o autor critica a ideia de" governo misto" por acreditar que a divisão concerne no governo e não no Estado. Por fim Bodin, relata que a monarquia pode ser governada de forma despótica (através do assenhoramento de seus súditos), tirânica (se houver desrespeito quanto às leis naturais e divinas) ou real; a aristocracia pode ser legítima, despótica ou tirânica; quanto a democracia o livro não apresenta nenhuma tipologia de governo.


3. Thomas Hobbes

Muitas das obras de Thomas Hobbes foram dedicadas a tentar descobrir porque os indivíduos desrespeitavam as regras e os ordenamentos jurídicos, por isso iniciou os estudos sobre as formas de governo.O filósofo é um dos mais importantes e responsável pela compreensão da mecânica do Estado Moderno, e como Bodin, ele não aceitou as teses que caracterizaram as formas de governo, como a distinção entre formas boas e más. Baseado no julgamento subjetivo de cada indivíduo e o "governo misto" que concerne na organização dos Estados, a fim de que o poder soberano não seja dividido.

Na visão de Hobbes, o Estado só deve interferir na vida privada, usando sua força para garantir o sistema de propriedade individual, para evitar o "ius in omnia" em que ninguém teria direito a nada, já que todos são donos de tudo. Para o autor a guerra só era considerada "justa" quando acontece a vitória, tanto que as decisões do tribunal são voltadas somente aos países vitoriosos. Os Estados surgem através de um pacto entre civil a fim de proteger e evitar o emprego da força particular, para garantir a paz da "Nação", em que os indivíduos abdicaram de seu direito natural e submeteram-se ao poder do monarca, o mesmo acontece com os derrotados os quais renunciam a liberdade em troca de suas vidas, denominado de "pacto subiectionis".

Esses Estados são considerados mais organizados quando o poder soberano não era dividido, fato que ocorreu no século XVII, com a realização da guerra civil inglesa, entre o rei e o parlamento, em que houve consequentemente o enfraquecimento do Estado.Hobbes relata que o inconveniente dos Estados "mistos", concerne nas consequências não esperadas por ele e Bodin, para o filósofo inglês o "Estado genuinamente misto não é estável, e o Estado genuinamente estável, não é misto".


4. Giambattista Vico

A teoria de Vico possui dois princípios primordiais: Ser uma teoria histórica e cíclica. A teoria tradicional das três formas de governo é explicada por Vico principalmente para mostrar o curso histórico percorrido pelas comunidades, desde a barbárie até a civilização. Para atribuirmos um “sentido” à história é necessário enxergarmos a “direção” a qual os homens dessas épocas moviam-se, e, para isso, é preciso analisar as várias etapas do movimento histórico e entender as razões da passagem de uma etapa para a outra, bem como a finalidade desse movimento geral.

As categorias com as quais Vico procura abranger o movimento histórico são a aristocracia, a democracia e a monarquia. Um ponto fundamental de sua concepção histórica é o de que logo que a humanidade deixou a fase pré-estatal (“estado da natureza”, segundo os jusnaturalistas), a primeira forma de Estado a surgir foi a república aristocrática, seguida pela república popular e por fim a monarquia. O mundo histórico no qual Vico se baseava e do qual deduziu princípios e leis é a história de Roma. É a partir da reflexão sobre a história romana que Vico derivou a lei de sucessão dos Estados.

Adotando-se o período antigo dos reis de Roma, como a formação de uma república aristocrática, a mesma estende-se até a concessão dos direitos públicos à plebe, de onde surgiu uma república popular, a qual por fim, devido às desordens provocadas pelas facções e pelas guerras civis, termina em uma monarquia, liderada por Augusto. Mas a sucessão das três formas de governo descrita acima não passa de uma parte da história universal. O que chamou a atenção de Vico e o levou às especulações tratadas em sua obra, foi a indagação sobre os “tempos obscuros”, tempo esse antes das histórias narradas e escritas. A tese de Vico diz que o homem em seu estado primitivo era um homem no “estado bestial”, a característica desse estado é a ausência de qualquer relação social, qualquer forma de vida em comum e até mesmo ausência da vida familiar.

Nesse estado, como se pode ver, o homem é totalmente solitário (monástico), sendo ele mesmo o responsável por conseguir seu alimento e praticar sua própria defesa. Segundo Vico, a humanidade não passou diretamente do “estado bestial” para o das repúblicas. Entre essas duas fases, existiu uma fase intermediária, que não é mais “pré-histórica”, mas que também não é “estatal”. Essa fase foi denominada “fase das famílias”, na qual surgiram as primeiras formas de vida social. Para explicar o surgimento desta fase, Vico se utiliza da religião, indicando que o homem começa a indagar sobre questões da vida, começa a levar suas mulheres para possuí-las nos interiores das cavernas, criando assim uma relação mais estável e duradoura com elas, o matrimônio.

Vico denomina essa primeira fase da humanidade como “estado de natureza”, portanto, para ele, trata-se de um estado social, embora representado por essa forma primitiva e natural de vida em sociedade, que é a família. Esse não é o estado primitivo da humanidade, e sim aquele em que o homem, deixando a fase bestial, inicia a vida em sociedade, mesmo sem um Estado definido. É importante ressaltar que “família” para Vico não é o mesmo que nós entendemos hoje, pois, na família de Vico estão também os descendentes e servos.

A passagem da fase das famílias para a primeira forma de organização estatal (república aristocrática) deu-se devido à rebelião de escravos. A revolta dos escravos obriga os chefes de família a se unirem para se defender e conservar seu domínio, formando assim a república aristocrática, com essa primeira forma de Estado formada, dá-se início a forma mais complexa e completa de autoridade que Vico denomina de “autoridade civil”. Na república aristocrática, a desigualdade social justifica o domínio dos patrícios sobre os plebeus. O que justifica a passagem da república aristocrática para a popular deu-se pelo mesmo motivo que a passagem das famílias isoladas à das famílias unidas: A revolta dos oprimidos e sua luta pelo reconhecimento.

O fim da república popular para a terceira forma de Estado, a Monarquia, ocorreu graças aos motivos clássicos que acabam com as democracias: degeneração da liberdade individual e do antagonismo criativo na contenda destrutiva das facções, com a guerra civil. Para Vico, a monarquia não surge contra as liberdades populares, mas para protegê-las do faccionismo. Vico vê a monarquia não como uma forma alternativa de Estado, com relação à república popular, mas sim como a própria república popular protegida contra seus males.

Vico também dividiu essas três fases de governo baseando-se numa tradição egípcia. Essa divisão era feita em “Era dos Deuses”, “Era dos Heróis” e “Era dos Homens”. A “Era dos Deuses” diz respeito à fase das famílias, onde surgiu o sentido religioso e a subordinação do homem primitivo. A “Era dos heróis” diz respeito à fase das repúblicas aristocráticas, tem esse nome devido ao governo de homens fortes, rudes e violentos. E por fim, a “Era dos Homens” que corresponde a tanto da república popular como da monarquia. Sobre a direção da história, a visão de Vico é uma visão progressiva (oposta a platônica, por exemplo). Na concepção de Vico, o homem se eleva gradualmente do estado bestial até a melhor forma de governo. Para Vico, quando o curso da história chega ao fim, ou seja, a monarquia é adotada como forma de governo, a humanidade ingressaria em uma fase de decadência tão grave que seria necessário começar todo o ciclo novamente. Portanto, sua visão é progressiva e cíclica.


5 - Montesquieu

Assim como Vico, Montesquieu também propõe o problema de saber se existem leis gerais que precedem a formação e o desenvolvimento da sociedade humana de modo geral e das sociedades em particular. Porém, em contraposição a Vico, Montesquieu tem uma visão mais ampla: Vico foca no mundo clássico, só em partes leva em conta o mundo medieval e o mundo moderno, sempre com ênfase nos Estados europeus. Na visão de Montesquieu, entram os Estados extra-europeus, tanto que uma categoria essencial da sua construção conceitual, o despotismo, foi elaborada para explicar a natureza dos governos que não pertencem ao mundo europeu.

Mas a diferença fundamental entre os dois autores é outra: Vico é sobretudo temporal, por isso que suas ideias foram apresentadas como uma filosofia da história, já Montesquieu é espacial/geográfica, razão pela qual definimos sua teoria como uma “teoria geral da sociedade”. Montesquieu se interessa pela explicação da variedade das sociedades humanas e seus respectivos governos, não só no tempo como também no espaço.

O interesse principal de Montesquieu é a descoberta das leis que regem o movimento e as formas das sociedades humanas, para assim poder elaborar uma teoria da sociedade. Da definição de “lei” de Montesquieu podemos extrair:

1)-Todos os seres do universo (inclusive Deus) são governados por leis.

2)- Tem-se uma lei sempre que há relações necessárias entre dois seres.

Dessas duas afirmativas, Montesquieu extrai uma consequência: o mundo não é governado por “cega fatalidade”. Segundo Montesquieu, o homem é um ser difícil de ser governado devido à sua inteligência, que o leva não só a observar as leis da natureza, bem como as que impôs a si mesmo. Devido a inclinação do homem em desrespeitar as leis naturais, foram criadas as “leis positivas”, as quais foram implantadas nas sociedades pela autoridade e à qual se responsabiliza pela coesão do grupo, essas leis divergem de povo para povo de acordo com seus diferentes modos de organização social.

A relação entre as leis naturais e as leis positivas é a que existe entre um principio geral e suas aplicações práticas. A lei natural se limita a enunciar um princípio, como exemplo, manter as promessas; as leis positivas estabelecem como deve ser feita a promessa para que seja válida a sanção imposta aos que não a mantiver para tornar mais provável sua execução. Montesquieu divide as leis positivas em três modalidades: As que regulam as relações entre governantes e governados dentro de um grupo (Direito público); as que regulam as relações entre grupos independentes (Direito internacional); as que regulam o relacionamento dos governado entre si (Direito civil). Para Montesquieu, a multiplicidade das leis tem uma razão, que podem ser encontradas desde que os métodos de estudos sejam tão rigorosos quanto o dos físicos.

Resumindo as conclusões a que chega pelo exame da enorme quantidade de dados, dados esses extraídos da filosofia política, as narrativas históricas e os relatos de viajantes, Montesquieu afirma que a causa dessa variação de leis são de três categorias: “Físicas” ou “naturais” (como clima e a fertilidade); “econômico-sociais” (como o modo de subsistência); e espirituais (as religiões). O que muda em Montesquieu é o conteúdo da tipologia, que não corresponde mais nem à classificação tradicional (a tripartição), nem à tipologia maquiavélica (a bipartição entre principados e repúblicas).

Para ele, há três formas de governo: o Republicano, no qual todo o povo (democracia), ou parte dele (aristocracia), detém o poder; o Monárquico, aquele no qual apenas uma pessoa governa, de acordo com leis fixas; o Despótico, onde um só arrasta tudo e todos de acordo com sua vontade, sem leis ou freios. Com isso, vemos que a tipologia de Montesquieu segue a dos antigos, sendo tríplice, porém com uma divergência: sua tripartição chega com acréscimo de uma forma de governo, o despotismo, o qual é uma forma de governo definida como uma forma de tirania, onde apenas uma pessoa governo, sem nenhuma restrição. Em suma, a terceira forma de governo de Montesquieu corresponde a uma das formas más ou corrompidas.

Para Montesquieu, cada tipo de governo é baseado em um princípio: a virtude cívica, para a república; a honra, para a monarquia; o medo, para o despotismo. Por virtude, Montesquieu não quer dizer apenas da virtude moral, mas a atitude que vincula intimamente o indivíduo a tudo que participa, resumidamente, era classificado como “amor da pátria e da igualdade”. Por “honra” entende-se aquele sentimento que nos leva a executar uma boa ação exclusivamente pelo desejo de ter (ou manter) uma boa reputação. E quanto ao “medo”, é o princípio predominante no despotismo, pois como ele a virtude é desnecessária, e a honra se torna perigosa.


6. Intervalo: O Despotismo

O despotismo é citado desde Aristóteles, porém não se pode deixar de observar que somente na obra de Montesquieu (“O Espírito das leis”) ele se torna fundamental para a análise das sociedades políticas, o despotismo é estudado ali em todos os seus aspectos. Enquanto Aristóteles fez do despotismo uma espécie de “gênero” da monarquia, Montesquieu explica por que se deve considerá-lo uma forma de governo diversa tanto da monarquia quanto da república. O critério de diferenciação é a “distribuição de poderes”, que existe nas monarquias, mas não nos regimes despóticos.

Uma prova da amplitude e da autonomia da categoria do despotismo, no sistema de Montesquieu, pode ser encontrada também na observação de que ela é descrita em seus vários aspectos, enquanto nos outros autores precedentes o critério que o caracteriza é sobretudo o político. Montesquieu explicita em sua obra alguns elementos que favorecem a implantação do despotismo: A escravidão política; o clima (calor); tipo de terreno (é  mais fácil estabelecer o despotismo em terras férteis); extensão territorial (o despotismo é necessário nos Estados muito extensos); a índole dos habitantes (quando são moles e preguiçosos); o tipo de leis (não as escritas, mas as naturais); a religião (o governo despótico se encaixa melhor na religião maometana), entre outros.

O elemento de continuidade entre Montesquieu e os clássicos, com respeito à categoria do despotismo, é a delimitação histórica e geográfica dessa forma de governo. Montesquieu se refere a “aquela parte do mundo onde o despotismo, vamos dizer, surge naturalmente – A Ásia”. A identificação do despotismo com o despotismo “oriental” é definida por Montesquieu em todos os seus particulares, e por assim dizer, consagrada. Helvécio se detém na comparação dos governos livres com os despóticos, mas no momento em que enfrenta esse contraste, explica logo que, ao falar em despotismo, refere-se a “aquele desejo desenfreado de poder arbitrário, que se encontra no Oriente”.

Baseando-se nas observações de Montesquieu sobre as relações entre despotismo e religião, Nicolas Antoine Boulanger propõe uma interpretação teocrática do despotismo: a origem de todos os males da sociedade reside no governo teocrático, que tem produzido no Oriente os governos despóticos. A comparação entre sociedades policêntricas, como as que existem na Europa, caracterizadas pela forte tensão entre a sociedade e o Estado, e as Sociedades monocêntricas, existentes no Oriente, marcadas pelo predomínio do Estado sobre a sociedade, seria não um conceito polêmico, mas uma realidade histórica, conforme Wittfogel retoma com alguns temas tradicionais: o caráter total, absoluto, do poder despótico; o terror como instrumento de domínio e, correlatamente, a sujeição total do súdito ao soberano; sua longa duração e, por fim, o vínculo entre o regime despótico e teocracia.


7. Hegel

A visão de Hegel sobre as formas de governo possui aspectos tanto históricos (assim como Vico) quanto geográficos ou espaciais (assim como Montesquieu). Em sua obra “Lições de Filosofia da História”, Hegel dedica um capítulo de introdução à “base geográfica da história mundial”, onde explica que a história do mundo passou por três fazes caracterizadas por três tipos de bases geográficas: o “altiplano”, paisagem típica da Ásia Central, onde tem origem as nações nômades; a “planície fluvial”, que diz respeito a região dos rios Tigres e Eufrates, até o Nilo, onde as terras são férteis; a “zona costeira”, que são as zonas de portos, onde desenvolvese o comércio.

As atividades pastoril, agrícola e comercial representam as três fases do desenvolvimento econômico e também correspondem a três regiões diferentes da Terra, o que confirma a tese de Montesquieu sobre a importância da natureza do solo como elemento de diferenciação social. Esse fato mostra que a evolução das sociedades ocorre não só em determinado período de tempo e restrito a um certo espaço, mas sim através de um deslocamento de área em área.

Em outras palavras, uma mudança no tempo implica também em uma mudança no espaço, e Hegel acreditava que o sentido deste deslocamento seria Oriente-Ocidente, ou seja, a América “é o país do futuro”. Para Hegel, as formas de governo historicamente relevantes são as mesmas de Montesquieu: O despotismo, uma forma de reino patriarcal; a república, uma forma de Estado livre, embora essa liberdade seja particularística; e a monarquia, na qual o rei governa. Porém, Hegel não refaz uma simples repassagem da tipologia de Montesquieu, a novidade em Hegel é o critério utilizado para distinguir essas três formas.

Com efeito, as três formas de governo correspondem a três tipos de sociedade: a primeira é primitiva, indiferenciada e inarticulada, onde as esferas particulares que compõe uma sociedade (ordens, classes ou grupos) não surgiram a partir da indistinta unidade inicial; na segunda, surgem as esferas particulares, que ainda não chegam a ser autônomas com relação à totalidade. Há unidade e diferenciação. Na terceira, a unidade se recompõe mediante as articulações das suas diferentes partes.

Quando Hegel analisa sistematicamente as diversas épocas da história universal, ele às divide não mais em três, porém em quatro partes: o mundo oriental, o mundo helênico, o mundo romano e o mundo germânico. Essa divisão ocorre devido à divisão do mundo antigo em grego e romano, pois a era imperial não pode de forma alguma ser colocada de lado, devido à teoria de Hegel ser contínua e tudo estar rigorosamente ligado ao tempo e ao espaço. Quando Hegel introduz a “era imperial” em seu tempo histórico, ele a interpreta como a transição entre o fim do mundo antigo e o início do mundo moderno.

Entende-se que a forma de governo é a estrutura política de uma sociedade bem determinada, cada sociedade possui sua própria constituição, e não pode ter outra. Hegel critica duramente a visão iluminista de que uma constituição perfeita pode ser imposta a diversos povos, dizendo que tentar implantar uma constituição em uma sociedade é a mesma coisa que tentar escolher “a alma” dessa sociedade.

Hegel chama o mundo oriental de “era infantil da história”, pois nessa fase (despotismo), o homem ingressa pela primeira vez na história, porém essa fase não apresenta um verdadeiro desenvolvimento histórico, pois para Hegel é uma fase de duração constante, sem alterações substanciais. Antes dessa fase, o homem era “pré-histórico”, e sua representação eram os africanos. Portanto, a história realmente só tem início já no mundo do Ocidente.


Conclusão

A partir da leitura da teoria de Vico, percebemos que se trata de uma teoria histórica e cíclica, na qual mesmo começa a construí-la desde o tempo “pré- histórico” do homem. A princípio, o homem é um ser “bestial” e solitário, sendo ele o mesmo o responsável pelo seu alimento, segurança e bem estar, sem nenhum tipo de vida social. Após essa fase bestial, o homem passou para a “fase das famílias”, onde começaram a surgir às primeiras formas de vida em sociedade, fundamentalmente a família. Posteriormente a “fase das famílias”, surgiu a primeira forma de governo estatal, a república aristocrática, que se deu devido a junção das famílias para se defenderem das rebeliões de escravos.

A passagem para a república popular deu-se basicamente pelo mesmo motivo da “fase das famílias” para a república aristocrática: A luta dos oprimidos por poder e direitos. E, por fim, a passagem para a terceira forma de governo de Vico, a monarquia (considerada pelo mesmo como a forma ideal de governo), deu-se devido às guerras civis e a criação de facções. Na visão de Vico, o homem evolui progressivamente desde o estado bestial até a melhor forma de governo, porém quando a atinge, a humanidade cairia em decadência, sendo necessário todo o processo ser feito novamente.

Quanto a Montesquieu, trata-se de uma teoria espaço/geográfica, na qual o autor se interessa principalmente na descoberta de leis que regem o movimento e as formas das sociedades humanas. Montesquieu identifica três tipos de leis: “Naturais”, “econômico-sociais” e “espirituais”. A teoria de Montesquieu é uma teoria tríplice, porém diverge da dos antigos devido à introdução de uma nova forma de governo, o Despotismo, que é uma espécie de tirania, onde apenas uma pessoa governa, sem nenhum tipo de restrição ou interferência, baseando-se sempre no princípio do terror.

Sobre Hegel, vemos que foi um filósofo no qual baseou sua teoria sobre as formas de governo tanto em aspectos históricos quanto espaciais ou geográficos. Os seus aspectos espaciais/geográficos são o “altiplano” (pastoril), as “planícies fluviais” (agricultura) e as “zonas costeiras” (comércio). Quanto aos aspectos históricos, Hegel introduz uma quarta era em sua tipologia: a “Era Imperial”, a qual representa a passagem do mundo antigo para o moderno. Ficando, portanto, a fase histórica divida em mundo oriental, mundo helênico, mundo romano e mundo germânico, sendo considerados os homens antes dessas fases como “pré-histórico”, no caso, os africanos. Para Hegel, a constituição forma a “alma” da sociedade, e por isso não pode ser imposta a mesma para todas.


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

Bobbio, Noberto. Teoria das Formas de Governo



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