Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/59402
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Processo administrativo tributário paulista

Processo administrativo tributário paulista

Publicado em . Elaborado em .

A análise da Lei Estadual nº 13.457/2009 e das alterações levadas a efeito pela Lei Estadual nº 16.498/2017 tem por objetivo efetuar uma reflexão da tendência do direito processual no Brasil e os reflexos no processo administrativo tributário.

Com o advento do novo Código de Processo Civil Brasileiro, pode-se constatar que as normas que regem o Direito Processual Civil consagram a aplicação dos direitos e garantias fundamentais, bem como a força normativa da Constituição Federal. Não pairam dúvidas de que os princípios constitucionais são normas que ocupam o topo do ordenamento jurídico e, por essa razão, devem nortear, também, o Processo Administrativo Tributário e a atuação do julgador, tanto no âmbito Judicial como no Administrativo, mesmo quando não positivados nas normas infraconstitucionais.

Nesse contexto, deve se ter em mente que o Julgador Administrativo ao analisar um processo não pode e não deve desprestigiar princípios como: boa-fé, duração razoável do processo, eficiência, contraditório, ampla defesa, cronologia e primazia do mérito. 

As alterações promovidas pela Lei nº 16.498/2017, no Processo Administrativo Tributário Paulista, Lei nº 13.457/09, vêm ao encontro desses anseios, positivando vários desses princípios, vejamos:

 a) da boa-fé (§ 1º do artigo 2º) – deve orientar a atuação no âmbito do processo administrativo, ou seja, tanto das partes, Fazenda Pública e Contribuintes, como do Julgador, que devem se pautar conforme os princípios éticos, procurando promover uma solução rápida e efetiva das controvérsias;

 b) da duração razoável do processo (§ 2º do artigo 2º) – estabelece o prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias para proferir decisão administrativa, a contar do protocolo de petições, impugnações, defesas ou recursos administrativos; em verdadeira homenagem ao disposto no inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal. Há de se observar o ATO TIT 02/2010 que normatiza o prazo de 30 (trinta) dias para decisões de primeira Instância, ou seja, no âmbito das Delegacias Tributárias de Julgamentos. As regras não são excludentes.

Elpídio Donizetti, ao enfrentar o tema no CPC, leciona: “Processo devido é o processo tempestivo, capaz de oferecer, a tempo e modo, a tutela jurisdicional adequada ao caso concreto”[1];

 c) da eficiência (inserção dos artigos 10-A, 10-B) – ao prescrever que o órgão de julgamento, ao pronunciar a nulidade, declarará que atos são atingidos e ordenará as providências necessárias a fim de que sejam repetidos ou retificados. Bem como, que o erro de forma acarretará unicamente a anulação dos atos que não puderam ser aproveitados, desde que não resulte em prejuízo à defesa de qualquer parte. Pode-se, ainda, extrair desses dois artigos a manifestação da primazia do mérito e do contraditório (§2º do artigo 10-A). Assim como, a celeridade (inciso LXXVIII, do Art. 5º da CF/88) ao prescrever no § 1º do art. 10-B que o ato não será repetido nem sua falta será suprida quando não prejudicar a parte;

d) do contraditório e da ampla defesa (art.19 e §§ 1º e 2º) – antes das alterações promovidas, o contraditório e a ampla defesa já se encontravam positivados no texto legal. Nada obstante, as alterações que se deram reforçaram os princípios basilares do Estado Democrático de Direito, fazendo com que as partes participem ativamente da construção da solução, ou seja, o destinatário se reconhecendo como copartícipe na construção da norma individual e concreta (Habermas);

 e) da cronologia – Os juízes e o órgão de julgamento deverão, preferencialmente, obedecer à ordem cronológica para relatar e proferir acórdão - (art. 68-A). Percebe-se que o Processo Administrativo Tributário trilhou o mesmo caminho do Código de Processo Civil, embora a norma não se apresente de forma imperativa, quando proclama preferencialmente, constitui uma realidade a ser observada, exigindo do órgão de julgamento para a sua não aplicação uma das justificativas prescritas no parágrafo único;

f) da primazia do mérito – (§ 2º do artigo 10-A) – como salientado no item “c “ – a exemplo do Código de Processo Civil, o legislador Bandeirante consagrou o chamado princípio da primazia do julgamento do mérito, devendo o Julgador Administrativo, sempre que possível, priorizá-lo, superando ou viabilizando a correção dos vícios processuais e aproveitando os atos já praticados quando não prejudicarem as partes.

Outras alterações dão sinais de que o Processo Administrativo Tributário vem se aprimorando para ocupar o seu lugar de destaque na sociedade, constituindo-se o meio pelo qual se controla a formação da norma individual e concreta da exigência tributária. A cláusula do devido processo legal, expressa no art. 5º, LIV, da Constituição, deve ser entendida na abrangência de sua noção conceitual, não só sob o aspecto meramente formal, que impõe restrições de caráter ritual à atuação do Poder Público, mas, sobretudo, em sua dimensão material, que atua como decisivo obstáculo à edição de atos administrativos de conteúdo arbitrário ou ilegais[2].

Fato relevante é a função da jurisprudência, nesse aspecto, o Código de Processo Civil labora no sentido da valorização da uniformização da interpretação da legislação constitucional e infraconstitucional, em face da obrigatoriedade das súmulas vinculantes e dos precedentes nos Tribunais Superiores, evitando que contendas envolvendo casos análogos sejam decididas de forma totalmente distintas.

Em sentido amplo, “precedente é a decisão judicial tomada à luz de um caso concreto, cujo núcleo essencial pode servir como diretriz para o julgamento posterior de casos análogos”[3].

Necessário, nesse momento, trazer as lições do Prof. Elpídio Donizetti, que contêm esclarecimento quanto à aplicação dos precedentes:  “No sistema do Civil Law, apesar de haver preponderância das leis, também há espaço para os precedentes judiciais. A diferença é que no Civil law, de regra, o precedente tem a função de orientar a interpretação da lei, mas não obriga o julgador a adotar o mesmo fundamento da decisão anteriormente proferida e que tenha como pano de fundo situação jurídica semelhante. Contudo, cada vez mais, o sistema jurídico brasileiro assimila a teoria do stare decisis ou, em bom Português, o sistema da força obrigatória dos precedentes”.[4]

Portanto, há ainda um caminho a ser trilhado para que a aplicação de precedentes judiciais e administrativos (inclusive os do próprio Tribunal Administrativo de Impostos e Taxas) seja admitida e incorporada no Processo Administrativo Tributário.

Nada obstante, encontramos sinais promissores ao se analisar o prescrito no parágrafo único do artigo 57-A - “Os recursos voluntários, de ofício, ordinários e especiais, pedidos de retificação ou reformas de julgado que versem sobre o tema a ser enfrentado na sessão temática ficarão suspensos por deliberação do Presidente do Tribunal de Impostos e Taxas”.

A pergunta que não quer calar: As decisões proferidas em sessões temáticas serão vinculantes? O disposto no item 1 do parágrafo único do artigo 68-A sinaliza nesse sentido ao estabelecer as exceções ao princípio da cronologia - “o julgamento de processos em bloco para aplicação de tese jurídica firmada em julgamento em sessões temáticas”; e também o conteúdo do § 10 do artigo 49, pois determina que não será admitido recurso especial que contrarie decisão tomada em sessão temática da Câmara Superior do Tribunal.

O importante é constatar o avanço já obtido com a implementação do processo eletrônico e, agora, com o aprimoramento procedimental do Processo Administrativo Tributário. O Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo é um órgão colegiado, paritário e independente, suas decisões devem ser uniformes e servir de parâmetro para busca da legalidade concreta, no sentido propugnado pelo Prof. Eurico de Santi[5]. A Câmara Superior, nesse contexto, assume função extremamente importante na uniformização da jurisprudência conforme prescrito no artigo 49.

Em que pese o fato de os avanços serem dignos de homenagem e aplausos, sentimos a falta da inclusão de um prazo máximo para cumprimento das diligências determinadas pelos órgãos de julgamento. Mas oportunidades não faltarão.


nOTAS

[1] - Curso Didático de Direito Processual Civil – 20ª edição – Editoras GEN/Atlas – 2016, pág.38.

[2] - A respeito, confira o julgado – STF, ADI-MC 1.063/DF, Tribunal Pleno, j. 18.05.1994, DJ 27.04.2001, da lavra do Ministro Celso de Mello.

[3] - DIDIER, Fredie; OLIVEIRA, Rafael; BRAGA, Paula. Curso de direito processual civil. Salvador: JusPodivm, 2013. P.385

[4] - Curso Didático de Direito Processual Civil – 20ª edição – Editoras GEN/Atlas – 2016, pág.19.

[5] - Kafka, Alienação e Deformidades da Legalidade – Exercício do Controle Social Ruma à Cidadania Fiscal, Fiscosoft Editora Ltda. e Editora Revista dos Tribunais Ltda. 2014.


Autor

  • Baltazar Garcia de Oliveira

    Bacharel em Ciências Econômicas, Ciências Contábeis e Direito. Especialização em Direito Tributário pelo IBET. Ex- Delegado Tributário de Julgamento de Campinas e Ex Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo. Especialista em ICMS, ITCMD, IPVA e outros tributos indiretos.

    Textos publicados pelo autor

    Fale com o autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

, Baltazar Garcia de Oliveira. Processo administrativo tributário paulista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5147, 4 ago. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/59402. Acesso em: 27 abr. 2024.