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Responsabilidade civil na alienação parental

Responsabilidade civil na alienação parental

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A alienação parental é vista como um abuso do poder familiar, que pode deixar sequelas intensamente graves no filho e danos irreparáveis na relação deste com o genitor.

“Os covardes nunca tentaram. Os fracos ficaram no meio do caminho. E somente os fortes venceram”.

(Autor desconhecido)

RESUMO:O objeto do presente trabalho é analisar a aplicabilidade do instituto da responsabilidade civil nos casos de alienação parental. Tal prática vem sendo constatada com frequência em muitas famílias, a maioria das vezes decorrentes da separação ou divórcio dos pais ou até mesmo do rompimento com um membro da família, por exemplo, os avós. Tal prática sempre existiu, mas ultimamente vem ganhando uma devida atenção, principalmente na mídia. A alienação parental ocorre quando um dos genitores, a mãe ou o pai de uma criança, a treina para romper os laços afetivos com o outro genitor, fazendo com que a criança passe a odiá-lo, criando fortes sentimentos de ansiedade, desprezo, e temor em relação ao outro progenitor, sem que houvesse qualquer motivo que justificasse tal conduta. A reiterada prática da conduta por parte do alienador faz com que a criança passe a acreditar numa mentira, e, com o passar do tempo, se faz desnecessário que o alienante continue alienando a consciência do alienado, pois o próprio já descontruiu a imagem do outro genitor, considerando-o como uma pessoa que só quer o seu mal. A grande polêmica acerca do referido tema diz respeito ao instituto da responsabilidade civil nos casos de alienação parental. A corrente majoritária entende que o genitor alienador ou alienante deve ser responsabilizado civilmente pelos danos que ocasionar ao outro, ficando sujeito até mesmo a perder a guarda da criança. Observa-se que a prática de alienação é muito comum em nossa sociedade, portanto, torna-se necessário uma maior atenção para essa temática, haja vista que tal atitude constitui uma forma grave de maus-tratos e abuso contra a criança. A Lei nº 12.318/2010 aborda o tema da alienação parental, que, no seu art. 6º assegura o direito de responsabilizar civilmente o alienante, trazendo, no seu bojo, mecanismos que possam proteger as vítimas de tal conduta, garantindo o direito de ressarcimento pelas condutas experimentadas decorrentes de tal alienação que sofrera.

Palavras-Chaves: Alienação Parental. Responsabilidade Civil. Guarda. Lei nº 12.318/2010.

SUMÁRIO:1 INTRODUÇÃO ..2 PREMISSAS GERAIS DA RESPONSABILIDADE CIVIL ..2.1 CONCEITO .2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA .2.3 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL .2.3.1 Responsabilidade contratual .2.3.2 Responsabilidade extracontratual .2.3.3 Responsabilidade objetiva .2.3.4 Responsabilidade subjetiva .2.4 ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL .2.4.1 Conduta Humana .2.4.2 Dano .2.4.3 Nexo causal ..2.4.4 Elemento subjetivo: dolo e culpa .3 DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE .3.1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA .3.2 DIREITOS FUNDAMENTAIS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE .3.2.1 Princípio da Afetividade no Estatuto da Criança e Adolescente .3.2.2 Princípio da prioridade absoluta e da proteção integral da criança e do Adolescente .3.2.3 Princípio da paternidade responsável .3.3 DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA .3.4 PODER FAMILIAR .4 DA ALIENAÇÃO PARENTAL ..4.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO ..4.2 ALIENAÇÃO PARENTAL .4.2 INOVAÇÕES DA LEI 12.318/2010 .5 RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL NA ALIENAÇÃO PARENTAL .5.1 ELEMENTOS PARA CARACTERIZAÇÃO DA RESPONSABILIDADE .5.2 ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO E JURISPRUDÊNCIAL .CONSIDERAÇÕES FINAIS .REFERÊNCIAS .


1 INTRODUÇÃO

Hodiernamente, no seio da sociedade brasileira, têm ocorrido muitas dissoluções de união conjugal, seja casamento ou união estável. Em grande parte da dissolução dessas uniões, há crianças e adolescentes envolvidos, razão pela qual surge outra questão de suma importância: a guarda do menor. O judiciário brasileiro tem concedido, em regra, a guarda unilateral a um dos cônjuges ou companheiros, conforme o atendimento do princípio do melhor interesse do menor.

Assim, em virtude do desafeto desenvolvido entre os pais no decorrer do processo de separação, a criança ou adolescente acabar por sofrer direta e/ou indiretamente por conta dessa aversão entre os pais. O sofrimento indireto se caracteriza pelo próprio estado sentimental e psicológico do menor por presenciar um momento de discussão, conflito e separação de seus genitores. Já o sofrimento direto, podemos assim dizer, se dá por parte da criação de uma imagem errônea e distorcida feita por um dos cônjuges ou companheiros em detrimento do outro.

A essa forma de interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, promovida ou induzida por um dos genitores, ou por qualquer pessoa que esteja com a criança ou adolescente sob sua guarda ou proteção, para que repudie o genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este, dá-se o nome de alienação parental.

Visando à efetivação do princípio da proteção integral da criança e do adolescente, em 27 de agosto de 2010 entrou em vigor a Lei nº 12.318/2010, que dispõe acerca da alienação parental. Podemos entender, também, que o surgimento desta lei se deu como forma de proteger o genitor, alvo dessa interferência psicológica, que durante muito tempo vinha sofrendo frustração do alienador, sem que houvesse legislação específica para que o caso pudesse ser enquadrado.

Diante do exposto, podemos verificar a importância do tema, que é multidisciplinar, situando-se, portanto, acima do mero positivismo jurídico, partindo para uma concretização de efeitos antropológicos que repercutem não só na esfera jurídica, mas em todo meio social.

Entretanto, em que pese o caráter protetivo da criança e do adolescente, este trabalho tem por objetivo o estudo da situação imposta ao genitor, vítima da alienação parental, levando em conta a análise da possibilidade jurídica de reparação de danos morais, a ele, em face da parte alienadora.

Essa discussão transcende a seara do direito de família, do direito da criança e do adolescente, adentrando as fronteiras do direito civil, em especial o ramo da responsabilidade civil, bem como tocando em pontos dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988.

Em verdade, é notória a complexidade do tema por tratar-se de um ponto que tangencia ramos do direito, que são regidos por princípios e fundamentos diferentes, calcados em conceitos e finalidades diversas.

Assim, a missão deste projeto é analisar até onde há a incidência da responsabilização civil do direito familiar, em especial a cobertura de danos decorrentes da alienação parental, tais como as atitudes tomadas com fundamentação na Lei nº 12.318, de 27 de agosto de 2010.

Em suma, para que o trabalho alcance seu objetivo e proporcione uma compreensão facilitada, do seu todo, é imprescindível uma abordagem inicial sobre a alienação parental, sob à luz da Lei 12.318/2010. Faz-se necessária, também, uma breve explanação acerca dos principais institutos da responsabilidade civil, para então passar para análise da incidência da responsabilização civil na alienação parental.

A metodologia a ser utilizada será a pesquisa bibliográfica, através da leitura de livros, artigos científicos, e buscas em sites jurídicos confiáveis, que versem sobre os seguintes temas: alienação parental, incidência da responsabilidade civil nos demais ramos do direito, em especial no direito da família e direito da criança do adolescente, bem como a responsabilização civil do alienador.

O objetivo geral do estudo é analisar a aplicabilidade do instituto da responsabilidade civil nos casos de alienação parental. Como objetivos específicos têm-se: estudar a alienação parental, analisando seu conceito, o aspecto social em que foi desenvolvido, e, as peculiaridades injetadas no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei nº 12.318 de 27 de Agosto de 2010; suscitar a aplicação da responsabilidade civil no direito de família, no direito da criança e do adolescente, analisar-se a possibilidade de responsabilizar civilmente o alienador, bem como verificar os possíveis elementos que devem ali estar presentes.

O presente estudo está estruturado em cinco capítulos, ordenados de forma coesa, seguidos, por último, das considerações finais.

O primeiro capítulo é a Introdução. O segundo versa sobre as premissas gerais da responsabilidade civil. Tal expressão tem vastos conceitos, podendo ser aplicada de várias formas, onde a natureza jurídica consiste em determinar a essência de determinado ramo, ato, coisa ou ente, do ponto de vista jurídico, para que dessa forma possa haver uma classificação dentro do universo de institutos existentes no Direito.

O terceiro capítulo fala sobre o direito da criança e do adolescente, que a partir da Constituição Federal de 1988, e da Lei nº 8.069/90, foram concretizados os novos direitos da população infanto-juvenil, passando as crianças e adolescentes a serem considerados sujeitos de direitos, ressalvada sua condição peculiar de pessoas em desenvolvimento.

O quarto capítulo aborda a alienação parental, responsável por causar graves danos ao referido bem-estar dos membros da relação familiar. Por ela, o genitor alienador, através de algumas práticas, é culpado por quebrar o vínculo afetivo entre o outro pai e o filho, além de macular a imagem deste primeiro.

O quinto capítulo trata da responsabilização civil da alienação parental no processo da alienação parental. O genitor, inconformado com a separação amorosa, utiliza o filho como arma, numa disputa com o ex-companheiro, a fim de desmoralizá-lo e afastá-lo de qualquer relacionamento afetivo saudável com o filho, sem levar em conta que está a violar direitos fundamentais tanto do outro como da própria prole.

Dessa forma, a alienação é vista como um abuso do poder familiar que deixa sequelas intensamente graves e danos irreparáveis, pois o tempo perdido não volta mais e a falta de convívio gera dois indivíduos que não mais se conhecem, e que, por isso, terão dificuldade para criar um novo elo afetivo tão forte quanto o de pai e filho.

No final, vêm as considerações finais e as referências utilizadas no decurso deste estudo.


2 PREMISSAS GERAIS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

2.1 CONCEITO

A noção de responsabilidade é muito antiga. Ela provém do latim respondere, que dá a ideia de segurança ou garantia de restituição de um bem sacrificado. A palavra se tornou mais usual somente no século XIX (GUIMARÃES, 2011).

A responsabilidade civil consiste na obrigação que um indivíduo que provocou dano a outrem assumir as consequências jurídicas do ato que praticou, com a finalidade de reparar o prejuízo que causou, restaurando o equilíbrio, retornando ao status quo anterior.

Configura-se como uma maneira de garantir à pessoa prejudicada que será restituído o seu prejuízo, a fim de que se retorne, na medida do possível, à situação anterior ao acontecimento do dano (GONÇALVES, 2011).

A responsabilidade civil é discutida nas suas variadas perspectivas. Mas, de maneira ampla, esta expressão tanto pode designar a situação jurídica através da qual um cidadão se vê frente ao dever de indenizar outrem, quanto o próprio compromisso de que originou a situação.

Também se pode descrever o instituto jurídico formado pelo conjunto de regras e princípios que regem o conteúdo e o cumprimento de tal obrigação. Já, em sentido estrito, trata-se, exclusivamente, da obrigação de indenizar, advindo de fato lesivo imputável a determinado cidadão.

Todavia, frente à constatação contemporânea de que a responsabilidade civil não seria capaz de solucionar todos os impasses advindos do progresso das relações sociais, a responsabilidade objetiva surgiu, tendo como base a teoria do risco, ditando que todo dano tem que ser reparado.

Perante este inovador tipo de responsabilidade, restou incontestável uma maior simplicidade no que diz respeito ao ressarcimento do dano causado, haja vista a dispensa da análise concreta da culpa.

Através da Responsabilidade Civil nasce o direito, a reparação, proporcionando ao ofendido o direito de ressarcimento através de ação para retirar do patrimônio da ofensora quantia suficiente para repor as perdas sofridas, que pode ser material ou moral.

As doutrinas que versam sobre responsabilidade civil não revelam grandes dificuldades no tocante à sua conceituação. Trata-se, pois, da obrigação que todo sujeito de direitos tem de ressarcir, economicamente, os danos que sejam por ele causados a outrem. Noutras palavras, a responsabilidade civil visa “o ressarcimento dos prejuízos acarretados ao lesado, tanto em seu patrimônio, como em componentes de sua pessoa, ou de sua personalidade, ocasionando a reconstituição ou a reparação de sua situação às custas do ofensor” (BANDEIRA DE MELO, 2008).

Para Bitar (2011, p.389), “a responsabilidade civil é princípio fundamental da justiça, do Estado de Direito”. Diante de uma lesão de direitos, caberá indenização, mormente para evitar o enriquecimento sem causa daquele que provocou o dano. Nos termos do art. 927 do Código Civil, “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

Na opinião de Sílvio de Salvo Venosa, a responsabilidade civil ‘‘encerra a noção pela qual se atribui a um sujeito o dever de assumir as consequências de um evento ou uma ação’’ (VENOSA, 2009, p.66).

Já Dias (2010, p.233) ressalta que a responsabilidade civil é:

A situação de quem, tendo violado uma norma qualquer, se vê exposta às consequências desagradáveis decorrentes dessa violação, traduzidas em medidas que a autoridade encarregada de velar pela observação do preceito lhe imponha, providencias essas que podem, ou não, estar previstas.

Apesar de a palavra responsabilidade encerrar, quase sempre, uma ideia de obrigação, esta não pode ser confundida com aquela, vez que responsabilidade consiste em uma espécie de obrigação secundária decorrente de obrigação primária não cumprida.

Nesse contexto, é plausível reconhecer que responsabilidade indica a circunstância toda especial daquele indivíduo que, por qualquer motivo, deva responder pelo prejuízo de um evento danoso.

2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Anteriormente à responsabilidade civil, a justiça era exercida pelos particulares, de modo que o jus puniendi era realizado de forma arbitrária e nos moldes injustos da ausência de lei. Sendo assim, a responsabilidade era exercida nos moldes da justiça privada, ou seja, a vingança privada realizada pelas mãos da própria vítima, denominada popularmente como a justiça feita com as próprias mãos (DINIZ, 2011).

Segundo Gonçalves (2011, p.122), “a lei de Talião baseada no ‘olho por olho, dente por dente’ era a base para reparação dos prejuízos sofridos”. Nesse ponto, o Estado tinha como função intervir somente para evitar excessos, e, quando isso ocorresse, a ele cabia a função de declarar que a vítima tinha o direito de aplicar a pena de talião.

Naquela época não era necessário comprovar a culpa, aplicando-se assim a responsabilidade objetiva, a qual se presumia a culpa. “Em caso de acordo entre as partes, a Lei das XII Tábuas aplicou a pena de Talião, nos casos em que tal acordo gerasse algum tipo de dano” (GONÇALVES, 2011, p.122). Com o passar do tempo, o que se mudou foi o pensamento social, onde foi percebida a eficácia da reparação pecuniária. Assim, começou-se a perceber que a correta reparação ao dano causado, a um determinado indivíduo, seria aquele advindo do patrimônio do autor do dano.

Com o surgimento da reparação em espécie, esta ideia foi se solidificando, cada vez mais, e permanece no Direito Brasileiro até os dias de hoje. A posteriori, assume o Estado a função de guardião, criador e aplicador do próprio direito, passando-se assim a responsabilizar os agentes, somente por culpa, no prejuízo causado. O Estado, como tutelador das normas que regem a sociedade, passa a exigir dos seus cidadãos a renúncia nos critérios de vingança e passa-se para as punições pecuniárias e ausentes do ideal antigo de “olho por olho, dente por dente”.

No passado não havia uma linha limitadora entre a responsabilidade civil e penal. Sendo assim, a reparação era dada na mesma sintonia para ambos os institutos jurídicos. Para Diniz (2011, p.89) “essa composição permaneceu no direito romano com o caráter de pena privada e como reparação, visto que não havia nítida distinção entre responsabilidade civil e penal.” Na Idade Média firmaram o pensamento de dolo e culpa, separando-se os conceitos na responsabilidade civil da penal.

No século XX, surge a ideia de ética, em que os questionamentos, dúvidas, investigações, juntamente com determinadas ciências, como a Sociologia, Filosofia, passa-se a existir uma nova concepção moderna, composta por dois polos distintos da responsabilidade. A extremidade objetiva, fundamentada no risco criado pelo agente, e a subjetiva, substanciada na ideia de culpa.

Nesse norte, a obrigação de indenizar não se funda somente na culpa(responsabilidade subjetiva), mas também no risco (responsabilidade objetiva), onde toda pessoa que aproveita dos riscos motivados por determinada atividade deve obrigatoriamente responder pelos danos causados.

2.3 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL

Oriunda pela autotutela (vingança privada), a responsabilidade civil evoluiu para categoria de punição pecuniária ao dano causado. Desse modo a responsabilidade é dividida em: subjetiva, objetiva, contratual e extracontratual, que serão abordadas nesse tópico.

2.3.1 Responsabilidade contratual

A responsabilidade civil contratual, que visa a evitar o inadimplemento de qualquer obrigação, é uma responsabilidade que está estabelecida pela vontade dos contratantes, onde ambas as partes possuem obrigações, porém, quando violada gera a responsabilidade contratual (TARTUCE, 2010). Atualmente a responsabilidade contratual não vem expressa no ordenamento jurídico, mas traz a obrigação das partes contratantes, a cumpri-lo de modo a evitar que uma das partes fique inadimplente.

Na Responsabilidade Contratual, também chamada de negocial, o credor só está obrigado a demonstrar que a prestação foi descumprida. O devedor só não será condenado a reparar o dano se provar a ocorrência de alguma das excludentes admitidas na lei: culpa exclusiva da vitima, caso fortuito ou força maior (CAVALIERI FILHO, 2010).

Desta forma, se houver um contrato, deve existir um vinculo de obrigação entre as partes, e este, se for descumprido, surge à obrigação indenizatória. Todavia, se este contrato não for cumprido por força maior ou caso fortuito, ou culpa exclusiva da vitima, não há como se falar em indenização.

Pois não há como evitar um caso fortuito, que geralmente decorre de fato ou ato alheio à vontade das partes, e já os de força maior, que são advindos da natureza, que não tem possibilidade de evitar ou impedir que tal prejuízo ocorra. Nos casos em que a vítima provocou, com exclusiva culpa, não há como ressarci-la (GRINOVER, 2011).

Na responsabilidade contratual é necessário provar o ônus da prova. Este é de quem alega, ou seja, do autor, cabendo a ele alegar os efeitos jurídicos que pretende. No caso em que se inverte o ônus da prova é quando o autor não esclarece fato que poderia prejudicar ele próprio.

2.3.2 Responsabilidade extracontratual

A ideia de responsabilidade civil está relacionada à noção de não prejudicar outro. A responsabilidade pode ser definida como a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar o dano causado a outrem em razão de sua ação ou omissão.

Dever jurídico, em que se coloca a pessoa, seja em virtude de contrato, seja em face de fato ou omissão, que lhe seja imputado, para satisfazer a prestação convencionada ou para suportar as sanções legais, que lhe são impostas. “Onde quer, portanto, que haja obrigação de fazer, dar ou não fazer alguma coisa, de ressarcir danos, de suportar sanções legais ou penalidades, há a responsabilidade, em virtude da qual se exige a satisfação ou o cumprimento da obrigação ou da sanção” (SILVA, 2010, p. 642).

Entende-se como responsabilidade extracontratual aquela que resulta da violação de um dever geral de abstenção, contraposto a um direito absoluto. Todo aquele que comete um dano a outrem tem o dever de reparar esse dano. No que diz respeito à responsabilidade extracontratual, pode-se delimitar que o agente não tem vínculo contratual com a vítima, contudo, existe o vínculo legal.

Por conta de um descumprimento do dever legal, o agente passa a ter responsabilidades de ação ou omissão, com nexo de casualidade, culpa ou dolo. De acordo com o artigo 186 do Código Civil “(…) Aquele por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito” (BRASIL, 2009).

Existem, portanto, elementos essenciais para definir a responsabilidade extracontratual, referindo-se a qualquer pessoa, que, por ação ou omissão, venha causar dano a outrem; à ação (voluntária e consciente, não se considerando ação o ato meramente reflexo ou inconsciente) ou omissão (consiste na abstenção da ação devida) do pressuposto da responsabilidade extracontratual, podendo existir através de ato próprio, como denominam os artigos 939, 940 e 953, no qual o agente responde pelos seus próprios atos.

2.3.3 Responsabilidade objetiva

A responsabilidade objetiva prescinde da ideia de culpa para se caracterizar. Isto é, a lei atribui, a determinadas pessoas e determinadas situações, a reparação de um dano cometido mesmo sem culpa.

Na Responsabilidade Civil Objetiva, calcada na Teoria do Risco, caracterizada como exceção, há uma simplificação dos requisitos necessários para ocasionar a reparação do dano. Faz-se necessária a prova de apenas três elementos: fato, dano e nexo-causal. A culpa seria um elemento estranho (como regra a pessoa tem que provar a culpa; porém, na responsabilidade objetiva, esta não é discutida). A responsabilidade civil objetiva não se confunde, por exemplo, com a responsabilidade civil por culpa presumida, que é uma subcategoria da responsabilidade civil subjetiva (GRINOVER, 2011).

Em se tratando da Responsabilidade Civil Subjetiva com Culpa Presumida, matéria presente no Cód. Civil de 1916, a culpa também era discutida, porém, havia a presunção da mesma. O autor só deveria provar três requisitos: Fato, dano e nexo-causal. Quanto à culpa, ocorreria a inversão do ônus da prova. O réu tem o direito de ingressar na demanda e provar que não tem culpa no caso em questão. No Código Civil de 2002, todas as hipóteses de responsabilidade civil por culpa presumida passaram a serem hipóteses de responsabilidade civil objetiva.

2.3.4 Responsabilidade subjetiva

No direito brasileiro, a responsabilidade civil subjetiva tem como pressuposto a culpa, isto é, ninguém poderá sofrer juízo de reprovação sem que tenha agido com culpa. Cabe ao Estado coibir o ilícito, impondo aos seus cidadãos deveres jurídicos com o objetivo de preservar o bem-estar social. A falta de observância desses deveres jurídicos, mediante uma conduta voluntária, acarreta um ilícito ocasionando um dano para alguém que deverá ser reparado, na maioria das vezes, por transgredir a norma imposta através de uma sanção (DIAS, 2010).

Com essa indagação é possível observar uma sequência de deveres jurídicos, isto é, a existência de um dever jurídico primário, que é uma norma de conduta imposta pelo Estado, e outro dever jurídico secundário, onde acarretará uma sanção imposta pela violação da norma estabelecida. Com isso, temos uma distinção entre obrigação e responsabilidade. Ora, esse dever pode apresentar a preexistência de uma relação jurídica obrigacional, ou seja, um dever oriundo de um contrato, ou pode ter a causa geradora por uma obrigação imposta por preceito geral ou pela lei.

Assim, tem-se segundo Diniz (2011, p.77):

Se pré-existe um vínculo obrigacional, e o dever de indenizar é consequência do inadimplemento, temos a responsabilidade contratual, também chamada de ilícito contratual ou relativo; se esse dever surge em virtude de lesão a direito subjetivo, sem que entre o ofensor e a vítima preexista qualquer relação jurídica que o possibilite, temos a responsabilidade extracontratual, também conhecida de ilícito aquiliano ou absoluto.

Quando ocorre a violação de um dever jurídico através de uma conduta consciente, ou seja, por dolo ou culpa, e, em consequência disso ocorra um dano a terceiros, temos os pressupostos da responsabilidade civil subjetiva que podem ser identificados no art. 186 do Código Civil de 2002: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito” (FARIA; ROSENVALD, 2008, p.56).

Com o advento do Código Civil de 2002, a teoria da culpa permanece sendo, em regra geral acolhida como princípio da responsabilidade civil. A essência da responsabilidade subjetiva está pautada na conduta do agente que ocasiona prejuízo à vítima. Nesse sentido, a teoria da culpa não acarretará efeito indenizatório quando determinada ação ou omissão humana estiver isenta de dolo ou culpa, isto é, na ausência de culpa, não haverá responsabilidade civil.

Dessa forma, para que haja o ressarcimento, segundo a teoria subjetiva da responsabilidade civil, será necessária a comprovação do nexo causal, que seria o liame entre a conduta culposa do agente e o dano sofrido pela vítima.

2.4 ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

2.4.1 Conduta Humana

A conduta humana e a culpa podem ser fundidas como um só elemento subjetivo da responsabilidade civil. Para fins didáticos, preferimos dividi-las. Assim sendo, a conduta humana pode ser causada por uma ação ou por uma omissão voluntária ou por negligência, imprudência ou imperícia, modelos jurídicos que caracterizam o dolo ou a culpa, respectivamente.

2.3.2 Dano

O dolo constitui uma violação intenciona do dever jurídico com o objetivo de prejudicar outrem. Trata-se da ação ou omissão voluntária mencionada no art. 186 do CC. Em suma, reprise-se que, presente o dolo, a indenização a ser paga pelo agente deve ser integral.

Existem três elementos que caracterizam a culpa: a) a conduta voluntária com resultado involuntário; b) a previsão ou previsibilidade; e c) a falta de cuidado, cautela, diligência e atenção. Deve-se retirar da culpa o elemento intencional, que está presente no dolo. Em uma visão subjetiva, a culpa é relacionada com os seguintes modelos jurídicos: imprudência, imperícia e negligência (FIÚZA, 2014).

2.3.3 Nexo causal

A responsabilidade civil não pode existir sem a relação da causalidade entre o dano e a ação que a provocou (DINIZ, 2011, p. 107). O vínculo entre o prejuízo e a ação designa-se “nexo causal”. Vale dizer, não basta a prática de um ato ilícito ou ainda a ocorrência de um evento danoso, mas que entre estes exista a necessária relação de causa e efeito, um liame em que o ato ilícito seja a causa do dano e que o prejuízo sofrido pela vítima seja resultado.

Em relação às condutas omissivas, estas adquirem relevância causal quando é imposto ao agente um determinado comportamento, um dever jurídico de agir. Como exemplo, temos a responsabilidade civil do Estado por morte de detento causada por rebelião, reconhecida a responsabilidade objetiva em razão da omissão dos seus agentes no cuidado e vigilância dos presidiários.

2.3.4 Elemento subjetivo: dolo e culpa

Nossa legislação civil admite a regra geral de que o dever de ressarcir pela prática do ato ilícito decorre da culpa, ou seja, da reprovabilidade da conduta do agente. Diz Diniz (2011, p. 39) “o comportamento do agente será reprovado quando, diante circunstâncias concretas do caso, se entender que ele poderia ter agido de modo diferente”. Portanto o ato ilícito qualifica-se pela culpa. Não havendo culpa, não haverá, em regra, qualquer responsabilidade.

Na responsabilidade civil a culpa se caracteriza quando o causador do dano não tinha intenção de provocá-lo, mas por imprudência, negligência, ou imperícia causa dano e deve repará-lo. Quando está comprovada a presença de um dos três elementos fica caracterizada a culpa do agente, surgindo o dever de reparação, pois mesmo sem intenção o agente causou dano.


3 DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

3.1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Para tratar sobre a evolução dos direitos jurídicos da criança e do adolescente, é necessário conceituar quem seriam os detentores deste direito, ou seja, o sujeito passivo do polo, cuja obrigação cabe ao Estado, a Sociedade e a Família de assegurá-la em todos os seus aspectos.

A Convenção Internacional dos Direitos da Criança de 1989, em seu artigo 1º, aduz expressamente que “para efeitos da presente Convenção considera-se como criança todo ser humano com menos de dezoito anos de idade1”. Observa-se que a referida convenção não faz uma distinção exata entre criança e adolescente, apenas limita a idade máxima de quem seriam os sujeitos considerados crianças. Diferentemente, o ECA, em seu artigo 2º, faz essa distinção técnica entre criança e adolescente, que é de grande relevância para o estudo e aplicação do direito. In verbis:

Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescentes entre doze e dezoito anos de idade. Parágrafo único: Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade.

Sendo assim, é importante ressaltar que apesar de tanto a criança como o adolescente gozarem dos mesmos direitos, pois ambos se encontram em condições especiais de pessoas em desenvolvimento, o tratamento de suas situações difere, quando incorrem em atos de conduta descritos nos delitos ou contravenções de leis penais, sendo a criança infratora sujeita às medidas de proteção, enquanto o adolescente infrator pode ser submetido a medidas sócios educativas, consoante artigos 110 e 112 do ECA respectivamente.

Igualmente, o parágrafo único do artigo 2º, do ECA, aduz que somente, e excepcionalmente será aplicado o referido estatuto aos maiores de 18 (dezoito) anos, e menores de 21 (vinte e um) anos, quando o ato infracional cometido pelo adolescente tenha ocorrido anteriormente aos 18 (dezoito) anos completos. A este respeito, esclarecedoras são as palavras de Cury (2010, p.99):

Considera-se inserido no regime do ECA aquele agente que, ao tempo do fato, tinha menos de 18 anos de idade. O autor de ato infracional está sujeito à aplicação daquelas medidas mesmo depois de completar a maioridade penal, desde que o fato haja sido cometido durante a menoridade (art. 104 e seu parágrafo único do ECA). Isso supõe, em consequência, que as medidas socioeducativas constituem uma das exceções previstas pelo artigo 2º, parágrafo único do ECA, e este dispositivo determina a renúncia a qualquer medida quando o agente complete 21 anos (artigo 121, § 5º).

Após este breve conceito, sobre os detentores do direito regido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, e a possibilidade excepcional do alcance para aqueles que já possuem a maioridade penal, passará a análise da evolução jurídica e os aspectos históricos do surgimento e evolução destes direitos.

Ao longo da história, que será tratado neste momento, passará a análise sobre o tratamento dado à criança e ao adolescente, passando da era em que apenas era tratado como uma “res”, mais especificamente servos de uma autoridade paterna, até o momento em que passaram a ser consideradas sujeitas de direitos e, subsidiariamente destinatárias da doutrina da proteção integral.

Esses sujeitos de direitos, nem sempre “existiram”, ao menos não para o direito, conceitualmente, haja vista que as categorias referentes à criança e ao adolescente foram construídas, histórica e socialmente, conforme a época e a sociedade. Entretanto, como leciona Amin (2009, p.45) “não podemos olvidar que o presente é produto da soma de erros e acertos vividos no passado. Conhecê-lo é um importante instrumento para melhor compreendermos o presente e construirmos o futuro”.

a) Idade antiga

Inicialmente os vínculos familiares eram estabelecidos em decorrência dos vínculos religiosos, ou seja, pelo culto da religião e não necessariamente pelo vínculo consanguíneo e muito menos pela ideia de afetividade. O poder familiar, em latim “pater familiae” era um fundamento utilizado em Roma, tendo como base o poder exercido pelo chefe de família, a quem também competia os deveres religiosos.

Portanto, o pai era considerado uma autoridade familiar, e, ao mesmo tempo, uma autoridade religiosa. A sociedade familiar, por sua vez, era considerada uma associação religiosa, pois, as regras eram ditadas por esta, ou seja, a religião era quem estabelecia o direito.

Ainda na Roma Antiga, o “pater familiae” era absoluto. Para tanto, o chefe de família gozava de poderes sobre todos, especialmente sobre os filhos, até o momento considerados objetos de relações jurídicas, sob o qual detinha o direito de “proprietário”. Esses poderes eram estabelecidos segundo a Lei das Doze Tábuas (VENOSA, 2009), que atribuía ao chefe da família, entre outros, o poder sobre a vida e a morte de seus descendentes.

Na Grécia Antiga era explícito o tratamento de inferioridade aplicado às crianças, apesar da dificuldade de padronizar o tratamento dado a elas, já que cada Cidade-Estado se apresentava de determinada forma, mas como regra geral apenas as crianças saudáveis e fortes poderiam vir a crescer e a se desenvolver. Caso viessem a apresentar alguma deformidade ou fraqueza deveriam ser sacrificadas logo após o nascimento.

No sistema social grego, os únicos indivíduos capazes de alcançar o título de cidadão eram os filhos homens. Em Esparta, em razões das guerras e conquistas militares que marcaram a civilização, a criança, ao nascer, era minuciosamente observada por um grupo de anciãos. Caso ela não apresentasse uma boa saúde ou tivesse algum problema físico, era invariavelmente lançada do cume do monte Taigeto (TARTUCE, 2010). Se fossem considerados saudáveis, os meninos, quando atingiam a puberdade, eram separados de suas famílias para ingressar em um rígido sistema de educação, passando o “patrimônio” do pai para o Estado. Por sua vez, as filhas mulheres eram preparadas apenas para ocuparem as atividades domésticas, do culto ao lar.

Diferentemente de Esparta, Atenas tinha por base de que sua Cidade-Estado se fortaleceria à medida que cada menino desenvolve-se suas melhores aptidões individuais. Assim, o ateniense ingressava aos 6 (seis) anos na escola, ficando sob a guarda de um pedagogo, e, ao atingir seus 18 (dezoito) anos, o mesmo atuaria no serviço militar.

Outros povos como Lombardos e Visigodos proibiam o infanticídio. Os Frísios restringiram o direito do pai sobre a vida dos filhos. O povo Hebreu, por sua vez, proibia o aborto ou o sacrifício dos filhos, apesar de permitirem a venda como escravos. Em um segundo momento, ainda que indiretamente, é valido relatar sobre a importante contribuição romana que distinguiu os menores impúberes e púberes, o que se refletiu em um abrandamento nas sanções pela prática de ilícitos de menores, distinguidos anteriormente (MONTEIRO; SILVA, 2012)..

b) Idade Média

Enraíza-se o conceito da dignidade da pessoa humana, que passa a merecer proteção desde a concepção até a menoridade civil. Tal proteção estava diretamente ligada a influencia do Cristianismo sobre os sistemas jurídicos da época. De tal modo, contribuindo e atenuando a severidade de tratamentos desumanos contra os menores, tratados até então.

Pode-se resumir essa época com a seguinte frase: “Deus falava, a igreja traduzia e o monarca cumpria a determinação divina6”. Se na Roma Antiga, as relações familiares entre o chefe de família e os filhos eram absolutas, do primeiro em relação ao segundo, o Cristianismo reviu essas relações humanas “patrimoniais”, aonde os filhos enquadram-se na condição de gigantes morais, em parâmetro de igualdade no trato de homens maiores. Contudo, havia o dever de respeito, explicitada no quarto mandamento do catolicismo: “honrar pai e mãe” (MONTEIRO; SILVA, 2012).

As proteções aos menores naquela época decorriam de diversos concílios, onde a Igreja previa e aplicava penas corporais e espirituais para os pais que abandonavam ou expunham os filhos. No entanto, não foram as instituições eclesiásticas as que mais se destacaram no cumprimento do dever social de assistência à proteção dos menores.

Destaca-se entre elas, a autoridade do príncipe, nos reinados alemães, que tinha feições tutelares em relação aos infantes abandonados, evocando a proteção do pai e não de proprietário. O imperador Justiniano, em seu Código, disciplinou a organização de estabelecimentos destinados a asilar e criar órfãos e recém-nascidos expostos. No ano de 787, Arciprete Dateu, de Milão, fundou uma instituição exclusivamente destinada a infantes expostos e menores abandonados (BARBOSA, 2013).

Entretanto, é possível observar que, naquela época, não existia uma preocupação da sociedade ou da própria família em filtrar determinados assuntos, ou ainda, em esconder qualquer segredo da criança, ou seja, não existia o sentimento de vergonha. Por derradeiro, todos conviviam em um único mundo, no qual a criança era exposta a ver e ouvir, seja pelo costume ou convívio. Para melhor esclarecer esse momento histórico, Postman (2009, p.67) aduz:

A infância ingressava no mundo dos adultos sem absolutamente nenhuma transição. Ela era considerada um adulto em miniatura, pois executava as mesmas atividades dos mais velhos. Era como se não existisse, pois não lhe era atribuído uma significação social. Não havia separação entre adulto e infância.

Tem-se ainda, segundo doutrina traçada no Concílio de Trento, a filiação natural ou ilegítima, que deveria permanecer à margem do Direito. Assim, os filhos nascidos fora do manto sagrado do matrimônio eram discriminados pois, sendo a família a base de toda a sociedade, indiretamente a criança espúria atentava contra essa instituição sagrada, já que era prova viva do modelo de violação moral determinada à época.

c) Idade Moderna

É nesse momento histórico que o Estado assume a sua função e toma como suas as responsabilidades sociais, como a de fornecer meios e serviços assistenciais a crianças abandonadas e o amparo a que fazem jus, quando privadas de sua condição familiar.

Nessa sociedade, a educação torna-se um dos pontos importantes na vida da criança, à medida que ela prorroga a duração da infância. Os pais não se contentavam mais em pôr filhos no mundo, em estabelecer apenas alguns deles, desinteressando-se os outros. A infância passa a ser, a partir de então, a invenção mais humanitária da modernidade como estrutura social e como condição psicológica, e chegou refinada e fortalecida aos nossos dias (BARBOSA, 2013).

Surge assim, a necessidade de se educar a criança em vista dos afazeres, das atividades, das atribuições e responsabilidades dos adultos. Ser criança é preparar-se para ser adulto, é desejar aquilo que não se tem. A infância passou a ser vista como propedêutica da vida adulta, existindo em função dos adultos9. A concepção Lockeana, traz basicamente a ideia de que a criança, no momento do seu nascimento, é um papel em branco, uma “tábula rasa”, totalmente vazia de ideias, que precisa ser preenchido o mais cedo possível, pois as primeiras impressões são inexoravelmente importantes para a formação. 4

A metáfora lockeana da mente como folha em branco descreve precisamente a conexão entre infância e material impresso. [...] De fato, a tábula rasa vê a criança como um livro inadequadamente escrito que se encaminha para a maturidade à medida que as páginas são preenchidas. Não há nada natural ou biológico neste processo. É um processo de desenvolvimento simbólico: sequencial, segmentado, linguístico. Para Locke e a maioria dos pensadores do Século XVIII, analfabetismo e infância eram inseparáveis, sendo a idade adulta definida como competência linguística plena (COELHO, 2009).

No entanto, até o Século XVII a escolarização foi monopólio do sexo masculino. Às meninas eram destinados os ensinamentos domésticos, e até mesmo as de famílias nobres eram semianalfabetas. Ainda no Século XVII surgiram os castigos, a punição física, os espancamentos com chicotes, ferros e paus, com o pretexto de que as crianças precisavam ser afastadas de más influências, bem como deveriam ser moldadas conforme o desejo dos adultos. Nesse sentido, entre 1730 e 1779, metade das pessoas que morreram em Londres tinha menos de cinco anos de idade.

3.2 DIREITOS FUNDAMENTAIS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

A Constituição Federal de 1988 trouxe, no seu texto, dispositivos que conferem uma série de direitos fundamentais a crianças e adolescentes até então não instituídos. E a Emenda nº 65 de 2010 apenas acrescentou a palavra “jovem” ao texto original do artigo 227 que dispõe o seguinte:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Por serem direitos fundamentais, dispostos na nossa Constituição, eles são considerados como cláusulas pétreas, e, assim, não podem ser suprimidos do ordenamento jurídico.

Sobre direito fundamental Martins Neto (2008, p. 88) acrescenta,

Ora, num Estado Democrático de Direito, onde prevalece a democracia, é precisamente a anexação de uma cláusula pétrea a um dado direito subjetivo o que melhor certifica a sua fundamentalidade, porque assim, ao declará-lo intocável e pondo-o a salvo inclusive de ocasionais maiorias parlamentares, que o poder constituinte originário o reconhece como um bem sem o qual não é possível viver em hipótese alguma.

Os direitos fundamentais devem ser protegidos de qualquer possível abalo jurídico, possibilitando, dessa forma, o reconhecimento da condição de cidadão que no entendimento de Veronese (2009, p. 131) é, por definição,

todo aquele que tem seus direitos fundamentais protegidos e aplicados, ou seja, aquele que tem condições de atender a todas as suas necessidades básicas, sem as quais seria impossível viver, desenvolver-se e atualizar suas potencialidades enquanto ser humano, isto posto, pode-se dizer que cidadão é quem tem plenas condições de manter a sua própria dignidade. Esses direitos são protegidos pelos princípios, aportando-se o Principio da Afetividade, a Prioridade Absoluta bem como ao Principio à Proteção Integral à Criança e ao Adolescente, que são a base de justiça no ordenamento jurídico, uma vez que “os princípios funcionam também como fonte de legitimação [...] quanto mais o magistrado procura torná-los eficazes, mais legítima será a decisão; por outro lado, carecerá de legitimidade a decisão que desrespeitar esses princípios constitucionais.

Com base nessas considerações, conclui-se que os princípios tem uma imensa importância jurídica pela sua própria acepção, sendo fundamentais para a proteção dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes.

3.2.1 Princípio da Afetividade no Estatuto da Criança e Adolescente

Esse princípio não possui previsão legal em nosso ordenamento jurídico, mas não é considerado como subsidiário. Sua concepção foi extraída de princípios como o da dignidade da pessoa humana e da proteção integral que foram consagrados pela Constituição. Ele tem como base os anseios como amor, dedicação, ternura e carinho, sendo um dos princípios mais importantes, criado pela doutrina e utilizado nas decisões dos Tribunais brasileiros.

Para melhor compreender o acima disposto, Gama (2008, p. 82) faz as seguintes considerações: “tal princípio, também considerado como o da prevalência do elemento anímico da affectio nas relações familiares, pode ser extraído da interpretação sistemática e teológica dos arts. 226, §§ 3° e 6°, 227, caput e § 1°, ambos da Constituição Federal.” E Dias (2010, p. 61 e 62) acrescenta que a Constituição assegurou proteção para a afetividade, embora não o tenha disposto expressamente em seu texto constitucional.

Enfatizando o dito anteriormente, complementa Rossot (2009, p. 08),

o afeto, sentimento esse que invadiu e passou a fazer parte da vida dos seres humanos, nada mais é do que uma troca recíproca entre os sujeitos de cuidados e de atenção, buscando apenas o bem da outra pessoa, ou seja, é a forma de expressar sentimentos e emoções.

Esclarece Lôbo (2008, p. 09) que a afetividade na psicopatologia é o “estado psíquico global com que a pessoa se apresenta e vive em relação às outras pessoas e aos objetos”. Conforme já dito, a Constituição não contempla expressamente o referido princípio, mas ele decorre de outros princípios, o que ocorre também com o disposto no artigo 3º da Lei 8.069⁄90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), movido pela Declaração Universal dos Direitos da Criança, da qual o Brasil é signatário, in verbis:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se, a eles, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

O Código Civil de 2002, em seu artigo 1.638, inciso II, também contempla o presente Princípio da Afetividade ao dispor que “perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou mãe que deixar o filho em abandono.” A falta de afeto em relação à prole configura o abandono, que vai além do aspecto material, atingindo também a esfera moral. Esse abandono afetivo é caracterizado pela carência dos filhos de amor, ternura, dedicação e carinho dos pais. Representa uma privação de convivência destes com os pais, ou seja, uma forma de omissão inaceitável que prejudica o desenvolvimento dos filhos.

3.2.2 Princípio da prioridade absoluta e da proteção integral da criança e do adolescente

O Estatuto da Criança e do Adolescente juntamente com a Constituição Federal traçaram diretrizes no nosso ordenamento jurídico que visam à proteção e ao bem estar da criança e do adolescente. Conforme nos ensina Cury (2010, p. 17): “A Constituição de 1988, pela primeira vez na história brasileira, aborda a questão da criança como prioridade absoluta, e a sua proteção é dever da família, da sociedade e do Estado. [...] proclamou a doutrina da proteção integral”.

Como se pode visualizar, mais uma vez, no disposto no art. 227 da Constituição que frisa que o Estado, a sociedade e a família tem o dever de assegurar com “absoluta prioridade” os interesses da criança, adolescente e jovem, sendo, portanto, esse artigo uma garantia aos direitos fundamentais destes e de onde podemos extrair o principio da prioridade absoluta.

O Estatuto da Criança e do Adolescente também retrata o referido princípio, in verbis:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Para Amaral e Silva (2010, p. 67) o melhor interesse constitui diretriz hermenêutica de novo modelo.

É o que se extrai do contexto do Estatuto, principalmente de suas disposições preliminares. Bem por isso, o artigo 1º explicitou dispor a lei sobre proteção integral. Portanto, suas normas não podem ser interpretadas em prejuízo dos destinatários dessa proteção, que é total, completa. Acrescenta o artigo 3º que “a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais da pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral”. O artigo 5º, diz que “nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”

O autor continua e acrescenta o seu entendimento sobre o artigo 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente:

Ao se referir aos fins sociais, o Estatuto explicitou a opção pela exegese teleológica, ou seja, a da proteção integral, com prevalência do melhor interesse. Não mais um “melhor interesse” subjetivamente estabelecido, o que poderia conduzir ao arbítrio, mas um superior interesse baseado em normas objetivas, finalísticas, voltadas à proteção integral. Os fins sociais do Estatuto, consubstanciados na promoção e defesa dos direitos, constituem diretriz para que o superior interesse seja mesmo o da criança e do adolescente e não mais um duvidoso e suposto melhor interesse, a critério subjetivo do intérprete.

Leite (2009) ressalta que se pode perceber que a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente consolidaram uma proteção jurídica especial aos menores, lhes assegurando prioridade absoluta e proteção ao seu melhor interesse, e, assim, podemos dizer que “se o século XX foi das mulheres, o século XXI será indiscutivelmente das crianças.”

3.2.3 Princípio da paternidade responsável

. Entende-se que o casal é livre para planejar a sua família, entretanto, ao optar por gerar uma criança, este passa a ter deveres em relação à criação, à educação dos filhos. Em suma, ambos os genitores, através do poder familiar, devem zelar pelo desenvolvimento saudável do menor, cuidando e o orientando moral, social, educacional e espiritualmente. Dessa forma, o legislador originário se preocupou em conferir aos pais o pleno exercício da paternidade responsável e, ao Estado, o dever de propiciar os meios para a concretização do intento dos genitores.

3.3 DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA

A norma se baseia em orientações maiores para sustentar o Direito de Família, haja vista que tal instituto tornou-se mais evidente com o advento da Constituição Federal de 1988, a “Constituição Cidadã”. Ressalta-se que os princípios relativos ao Direito de Família, contidos no bojo de nossa Constituição, estão compreendidos como possuidores de força normativa e não meros ornamentos supletivos, pois a constitucionalização dos direitos humanos fundamentais, por parte do legislador constituinte, não significa mera enunciação formal de princípios, mas a plena positivação de direitos, em que qualquer indivíduo é parte responsável por exigir a efetiva solidificação da democracia.

Moraes (2008, p.23), nos ensina que:

O fundamento jurídico, bem como sociológico do direito à convivência familiar é parte e condição de elemento indispensável ao pleno desenvolvimento da pessoa humana e à consolidação da própria cidadania. Assim sendo, os Direitos Humanos fundamentais tornam-se imprescindíveis a todos, no sentido de eleger o respeito à dignidade da pessoa humana, resguardar a limitação do poder do Estado lutando contra possíveis ilegalidades e abusos cometidos e primar pelo pleno desenvolvimento da pessoa humana.

O direito de ser criado e educado no seio de uma família, natural ou substituta, constitui verdadeiro direito humano fundamental da criança e do adolescente. Neste sentido, a Constituição Federal, bem como o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, reforça este direito como um dos aspectos do direito à liberdade, quando institui e protege o direito à convivência familiar.

Entende-se que é esta convivência no seio da família que irá preparar, principalmente no âmbito psicológico, os jovens para as adversidades vindouras e evitará a saída destes mesmos jovens às ruas, contribuindo para não se perder os vínculos e as referências familiares, pois a consequência, como se tem notado, são crianças e adolescentes que passam a viver em situação de abandono, seja material ou mesmo afetivo, ficando à mercê de criminosos que os recrutam cada vez mais cedo.

Deduz-se que, quando o direito à convivência familiar é negado, ou em outras palavras não é efetivado, tanto pelo Estado, ou mesmo pela sociedade como um todo, há o início de uma gama de outros problemas aos quais as crianças e adolescentes ficam sujeitos, quais sejam: uso de drogas, fome, desabrigo, violência física e sexual, bem como iniciam a prática de atos infracionais, dentre tantos outros problemas.

O direito à convivência familiar é a base da formação da criança e do adolescente. A nossa legislação assevera que a criação e educação devem se dar no seio da família. É na família que a criança e o adolescente, enquanto seres em formação, garantem sua formação moral e educacional (MORAES, 2008). É nesse momento que recebem as primeiras manifestações de afeto, carinho e amor, seja em uma família natural, também chamada de biológica, ou ainda em uma família substituta. O importante é que este ambiente seja harmonioso, onde o jovem tenha garantido sua sobrevivência e seu desenvolvimento saudável.

Entende-se que a doutrina da proteção integral à família é o principal dispositivo de garantia dos direitos humanos fundamentais da criança e do adolescente, devendo primar sempre pela possibilidade de permanecerem no convívio de suas famílias naturais (biológicas). Não sendo possível, deverá verificar a possibilidade de colocar esta criança ou adolescente em uma família substituta, por meio de uma das possibilidades existentes em nosso ordenamento, lembrando que esta é medida de exceção.

3.4 PODER FAMILIAR

O Poder Familiar assim como o Direito das Famílias passou por alterações no curso da História, acompanhando a evolução da família. No Direito Romano, o Poder Familiar era representado pelo pater; o pai era o chefe da família e tinha o direito absoluto sobre a organização familiar, seu poder era ilimitado e figurava como escopo para reforçar a autoridade. Assim sendo, o Pátrio Poder era exercido apenas pelo genitor; era um poder que se equivalia ao de propriedade, incluía a esposa, os filhos, os escravos e os que assim se assemelhavam (DIAS, 2011, p. 22).

O poder familiar e a guarda são Institutos distintos, com suas funções devidamente diferenciadas. Estando os pais no pleno exercício do poder familiar, mesmo quando a guarda está devidamente regulada para um dos genitores, operar-se-á a restrição do poder familiar nos casos excepcionais de suspensão, extinção e perda, após processo competente.

Sobre o aludido assunto, têm-se, pois, os ensinamentos deRizzardo (2007, p.122):

Nos primórdios do direito, o poder familiar nada mais significava que o conjunto de prerrogativas conferidas ao pai sobre o filho. No direito Romano, ocupava aquele a posição de chefe absoluto sobre a pessoa de seus filhos, com tantos poderes, a ponto de ser lhe permitido a eliminação da vida do filho. Dizia que o pater tinha o direito sobre a vida e a morte do filho.

Nos ensinamentos de Rodrigues (2009, p.77), o pátrio poder é representado por um conjunto de prerrogativas,

[...] conferidas ao pater, na qualidade de chefe de organização familiar, e sobre a pessoa de seus filhos. Trata-se de um direito absoluto, praticamente ilimitado, cujo escopo é efetivamente reformar a família paterna, a fim de consolidar a família romana, célula base da sociedade, que nela encontra o seu principal alicerce.

Assim, pode-se dizer que o poder familiar tem fundamento político e religioso e que lhe dá uma visão maior dos exageros. O pater, além de ser o sacerdote do culto, como se viu na história do direito das famílias, é o chefe da família. Desta feita, os romanos eram vistos de forma grotesca e cruel, uma vez que podiam dispor totalmente de seus filhos. Com o passar do tempo, Justiniano proibiu o direito do pai de expor os filhos, de tal forma que extinguiu o poder paterno, partindo do momento em que o filho fosse capaz de prover suas necessidades (DINIZ, 2011, p.45).

Neste sentido, ensina Monteiro (2009, p.23) “com o tempo restringiram-se os poderes outorgados ao chefe da família. Assim, sob o aspecto pessoal, reduziu-se o absolutismo opressivo dos pais a simples direito de correção”. Nos dias modernos, o poder familiar não se caracteriza mais na figura do pater, e sim na pessoa dos pais que, assim, possuem um conjunto de direitos e deveres inerentes, para a proteção dos filhos e de seus bens, enquanto não forem emancipados.

Essa evolução pode ser destacada a partir do Código Civil de 1916, que no seu artigo 380, e parágrafo único, garantia ao pai o pátrio poderdo filho menor, como vemos:

Art. 380. Durante o casamento compete o pátrio poder aos pais,exercendo-o o marido com a colaboração da mulher. Na falta ou 44 impedimento de um dos progenitores, passará o outro a exercê-locom exclusividade.

Parágrafo único: Divergindo os progenitores quanto ao exercício do pátrio poder, prevalecerá a decisão do pai, ressalvado à mãe o direito de recorrer ao juiz para solução da divergência.

Foi com o advento da Lei nº. 4.121, de 27 de agosto de 196248, que se atribuiu à mãe a condição de colaboradora no exercício do pátrio poder com o pai. Logo após veio a Lei nº. 6.515, de 26 de dezembro de 1977, que, em seu artigo 27, aponta que o pai e a mãe são os titulares das responsabilidades parentais, mesmo depois de não viverem mais como um casal, e da guarda ser atribuída a apenas um deles. Tendo como base o Decreto-Lei nº.3.200/4149 e do artigo 381 do CC/16.

Em face dessas mudanças, a CF/88 veio afastar ainda mais a desigualdade entre os sexos, ou seja, entre pai e mãe. Não tendo mais vigência o termo colaboração utilizado anteriormente, o que prevalece agora é uma presença conjunta e igualitária na relação entre pais e filhos, como se vê noart. 226, no seu § 5º, a seguir:

Art. 226. A família, base da sociedade tem especial proteção do Estado.

[...]

§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

Também a Lei nº. 8.069/9050, Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) solidifica essa relação de igualdade entre os pais, configurada no seu artigo 21:

Art. 21. O Pátrio poder será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a Legislação Civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso dediscordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência.

Após tantas alterações, afasta-se de vez a submissão da mulher perante o homem, bem como se atribui a ambos os genitores a responsabilidade do exercício do pátrio poder, independentemente de estarem maritalmente unidos.

Diante destes fatos, o CC, além de adotar tais alterações, modificou a figura do pátrio poder em poder familiar, dispondo em seu art. 1.631:

Art. 1.631. Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, ooutro o exercerá com exclusividade.

Parágrafo único. Divergindo os pais quanto ao exercício do poder familiar, é assegurado a qualquer deles recorrer ao juiz para solução do desacordo.

Assim, nota-se claramente que o CC possibilitou tanto ao pai quanto à mãe serem detentores do poder familiar, enquanto o CC/16 possibilitava apenas ao pai o pátrio poder.

O Poder Familiar decorre de uma necessidade natural, de modo que, constituída a família, com o surgimento dos filhos, aparece o dever de alimentar, isto é, a obrigação de assisti-los, criá-los e educá-los, até que os mesmos tornem-se adultos (DINIZ, 2011). Até a CF/88, a autoridade paterna era proeminente em relação ao Poder Familiar, o pai tinha o exercício do poder, sendo que a mãe só poderia exercê-lo na sua falta ou impedimento.

A partir de 1988, com o advento do artigo 226 da CF/88, anteriormente citado, que deu base aos princípios do Direito das Famílias, o homem e a mulher equiparam-se nos deveres e direitos da sociedade conjugal, refletindo, também, no poder familiar.

O Pátrio Poder, previsto no CC/16, também mudou no atual CC para Poder Familiar, tendo em vista que, na época da vigência do Código anterior, quem exercia o poder sobre os filhos era o pai. Como esta situação mudou, sendo hoje a responsabilidade sobre os filhos de ambos os genitores, viu-se o legislador obrigado a modificar tal denominação.

Gonçalves (2011, p.77) descreve que “o poder familiar não tem mais o caráter absoluto de que se revestia o direito romano. Por isso, já se cogitou chamá-lo de ”pátrio-dever”, por atribuir aos pais mais deveres do que direitos”.

Assim, conceitualmente, pode-se trazer o entendimento de Lisboa no que se refere que o poder familiar é ”uma autorização e um dever legal para que uma pessoa exerça as atividades de administração dos bens e de se assegurar o desenvolvimento do direito biopsíquico do filho incapaz, pouco importando a origem da filiação” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010, p.55)

Nesse sentido, Carvalho (2005, p.71) dispõe que o poder familiar “é o conjunto de direitos e deveres que a lei concede ao pai, ou à mãe, sobre a pessoa e bens dos filhos, até a maioridade, ou emancipação destes, e de deveres emrelação ao filho”.

a) Dos direitos e dos deveres

O Poder Familiar traz consigo uma carga considerável de deveres e poderes concernentes à pessoa e aos bens dos filhos. Santos Neto (2008, p.31) afirma que “a organização familiar foi, sem dúvida, a primeira forma de organização humana e, desde que estabelecida, trouxe inerente, por imposição da própria natureza, a existência de poderes e deveres dos pais em relação aos filhos”.

Nesse mesmo sentido importante trazer os ensinamentos de Bittencourt (2009, p.145) onde dispõe que:

Pode ser, em sua quantidade e expressão, o conjunto de deveres bem superior ao conjunto de direitos, não se há de substituir, como se faz muitas vezes, o conjunto do pátrio poder pelo de pátrio dever. A ideia, sem dúvida, é de pátrio poder, no complexo de direitos e deveres.

No mesmo sentido, o art. 229 da CF/88, vem estabelecer que os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, sendo que, o art. 1.634 do CC estabelece esses direitos e deveres.

Assim, os pais têm os deveres, em contrapartida, eles possuem direitos, tais como o respeito, obediência e de tê-los consigo, preparando assim seus filhos para a vida em sociedade, tudo em virtude do poder familiar.

Neste sentido, importante trazer os ensinamentos de Venosa (2009, p.33):

Cabe aos pais, primordialmente, dirigir a criação e educação dos filhos, para proporcionar-lhes a sobrevivência. Compete aos pais tornar seus filhos úteis à sociedade. A atitude dos pais é fundamental para a formação da criança. Faltando com esse dever, o progenitor faltoso, submete-se a reprimendas de ordem civil e criminar, respondendo pelos crimes de abandono material, moral e intelectual (arts. 224 a 245 do Código Penal). Entre a responsabilidade da criação, temos que lembrar que cumpre.

A Declaração Universal de Direitos Humanos traz os princípios que norteiam os direitos e as liberdades das crianças, sendo repetido tal entendimento pelo art. 19 do ECA:

Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.

Nogueira (2010, p.80) “assevera que o ideal para o menor é ser criado no seio da família natural, ainda que esta seja pobre ou carente de recursos materiais”.

b) Extinção do poder familiar

A extinção do Poder Familiar é a forma mais complexa, verificável por razões decorrentes da própria natureza, independentemente da vontade dos pais, ou não concorrendo eles para os eventos que a determinam.

Segundo o Código Civil (art.1.635) a extinção é a interrupção definitiva do poder familiar, são hipóteses exclusivas: morte dos pais ou do filho; emancipação do filho; maioridade do filho; adoção do filho, por terceiros; perda em virtude de decisão judicial.

A morte de um dos pais faz concentrar, no sobrevivente, o poder familiar. A emancipação dá-se por concessão dos pais, mediante instrumento público, dispensando-se homologação judicial, se o filho contar mais de 16 anos. Dentre essas causas de cessação do poder familiar, devemos analisar o instituto da adoção, vez que esta, além de extinguir o pater famílias dos genitores carnais, transfere-o ao adotante, de maneira irrevogável e definitiva.

Carvalho (2010, p.88) conceitua a extinção como uma cessação. Toda extinção é uma cessação, mas nem toda a cessação é uma extinção. Exatamente por terem etimologias distintas, não podem ser considerados sinônimos tais vocábulos. Extinção provém do verbo extinguir e, gerador do substantivo existinctio e significa apagamento, morte, desaparecimento.

O CC prescreve, em seu artigo 1.635, as formas pelas quais se extingue o poder familiar. No caso do primeiro inciso, tem-se, pois, que esclarecer que “o falecimento de um dos progenitores somente faz cessar o encargo quanto ao que falecer, perdurando com o outro. Unicamente com a morte dos dois pais, ou do filho, dá-se à extinção, impondo-se, então, que se nomeie tutor ou curador” (TARTUCE, 2010, p.125).

Já no segundo inciso, tem-se a extinção pela emancipação, que, conforme Rodrigues “é a aquisição da capacidade civil antes da idade legal. É ela concedida pelo pai, pelo Juiz ou pela Lei, naqueles casos, por igual, libertando-se do pátrio poder, por dispensar a proteção que o legislador concede aos imaturos”.

Ademais, no terceiro inciso estabelece que a maioridade extingue-se o poder familiar segundo:

Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar: I - pela morte dos pais ou do filho; II - pela emancipação, nos termos do art. 5º, parágrafo único; III - pela maioridade; IV - pela adoção; V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638, maneira normal de extinção do poder familiar. Quanto à adoção, quarto inciso, independente de qual seja a modalidade, também extingue o poder familiar da família original. Na verdade é uma transferência do pátrio poder.

Por último, tal modalidade é aquela que conclui por um dos fatos graves descritos no artigo 1.638 do CC, que se mostram incompatíveis com o poder familiar. Sendo que a perda poderá ocorrer para ambos os detentores do poder família.

c) Suspensão

A suspensão do poder familiar pode ser requerida pelo Ministério Público ou por algum parente. Tem sua previsão legal descrita no artigo 1637, o qual afirma que os pais podem ser suspensos do poder familiar, no caso de agirem com abuso, faltarem com os deveres inerentes ou arruinarem os bens dos filhos. Se o pai ou a mãe abusar de seu poder, faltando aos seus deveres ou arruinando os bens do filho Constitui modalidade de medidas de menor gravidade do que a da extinção.

Rodrigues (2009, p.61) ressalta que:

Ademais, a suspensão pode se referir apenas ao filho vitimado e não a toda prole; bem como abranger somente algumas das prerrogativas do pátrio poder; (...) assim, se o pai cuida mal do patrimônio de um filho que recebeu deixa testamentária, mas por outro lado educa este e os outros com muita proficiência, pode o juiz suspendê-lo do pátrio poder no que diz respeito à administração dos bens desse filho, permitindo que conserve intocado o pátrio poder que concerne aos outros poderes e aos outros filhos.

As razões que motivam a suspensão do poder familiar, segundo Carvalho (2010, p.77):

Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I - castigar imoderadamente o filho; II - deixar o filho em abandono; III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes; IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

Em principio, parte-se de uma realidade: os pais, por seu comportamento, prejudicam os filhos, tanto nos interesses pessoais como nos materiais, com o que não pode compactuar o Estado. Usam mal de sua função, embora a autoridade queexercem, desleixando ou omitindo-se nos cuidados aos filhos, na sua educação e formação; não lhe dando a necessária assistência; procedendo inconvenientemente; arruinando seus bens e olvidando-se na gerência de suas economias.

A menor gravidade dessa modalidade está no fato dela ser temporária, ao contrário da extinção ou da perda, que é definitiva. Tratando-se de modalidade de obrigação inerente ao poder familiar, tratar-se-á, agora dos princípios do direito de família, adotados pelo poder familiar.

O poder familiar, devido às suas características, é importante instituto jurídico, tanto que há diversos direitos e deveres dos pais explícitos e implícitos na Constituição Federal. Ainda, verifica-se que os filhos possuem, em todos os artigos explanados, proteção especial, já que, enquanto menores, necessitam de um maior apoio dos pais.

As causas de extinção e suspensão demonstram a importância no cumprimento dos deveres entabulados aos pais no tocante a criação e educação dos filhos, cuidados estes, que friso, são direitos constitucionais dos mesmos.


4 DA ALIENAÇÃO PARENTAL

4.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO

Desde os primórdios da saga da Humanidade, na Terra, os homens perceberam que só sobreviveriam se estivessem integrados com os demais seres de sua espécie (ALMEIDA JUNIOR, 2010). Dessa forma, surgiram as primeiras formas de comunidade, onde existia uma interdependência, ou seja, as pessoas que viviam juntas dependiam umas das outras. Por consequência dessa interdependência, houve a união entre seres do sexo oposto, homens e mulheres começaram a se unir, dando origem à ideia de família.

Com isto, não demorou muito para ocorrer o surgimento dos direitos advindos dessa união, originando, preliminarmente, aspectos relativos ao Direito. A ideia de família foi visualizada pela primeira vez na antiguidade, onde o Direito regulamentou sua criação e formação do vinculo conjugal, tornando a ideia de família mais sólida, mas ocorria a mudança de parceiros de acordo com o uso da forma (GRINOVER, 2011).

Com a idealização do Cristianismo tudo mudou de figura, pois nessa época era vedada a dissolução do vínculo conjugal, ou seja, o casal tinha de permanecer casado, mesmo contra a sua vontade, pois ali não estava somente inserido seus próprios e isolados direitos, estava conjuntamente com eles abrangendo os direitos da sociedade que condenava tal ruptura (ALMEIDA JUNIOR, 2010).

Nos dias atuais, a realidade depara-se com a modificação do conceito de família, que está distante de ser a que está prevista no nosso ordenamento jurídico pátrio, que preconiza que a família é a base da sociedade e merece proteção especial do Estado, ou seja, o conceito de família não é somente aquele restrito ao modelo convencional que está incutido na sociedade, a união de homem e mulher, unidos pelo casamento e com seus filhos (DINIZ, 2011).

As mudanças na estrutura política contribuirão - e muito - na idealização da família, que, através delas, adquiriu função instrumental para melhor realização e visualização dos interesses afetivos entre seus integrantes.

Vivemos uma época onde ocorreu a regulamentação da Lei do Divórcio, ocasionada pela evolução, pois com a evolução da sociedade muitos casais não conseguiram mais manter seus relacionamentos, o que veio a obedecer à tendência natural e aos costumes da época, fazendo cair por terra o ideal de família indissolúvel, desobrigando os casais a permanecerem casados sem ser de sua real e sincera vontade (DINIZ, 2011).

Surgindo, consequentemente, com a regulamentação da Lei de Divórcio, conflitos esses decorrentes dos divórcios e das insatisfações dos genitores, com a estipulação da guarda, isto fez com que fosse cada vez mais crescente o número de crianças e adolescentes submetidos à Alienação Parental, casos estes que iam de possíveis abusos sexuais a histórias escabrosas inventadas pelos genitores que possuíam a guarda, para afastar o filho do outro genitor que não a possuía.

Isso ocorre, pois vivemos em uma sociedade que passa por uma inversão de valores e gênero, com a mulher passando a dominar setores do mercado de trabalho antes ocupados por homens, tornando normal, a cada dia mais, a existência do homem do lar, ou seja, os homens passam a ficarem mais próximos dos filhos.

Essa figura do homem do lar torna-o mais vulnerável, pois diante de uma dissolução conjugal, o Judiciário muitas vezes dará a guarda para a genitora, pois existe aquela figura da criança e do adolescente ter o contato direto com ela, mas isso não se enquadra mais nos dias de hoje, pois as mulheres dominam a cada dia que passa o mercado de trabalho, ficando a genitora em uma situação extrema, pois, ao passo que cuida financeiramente do lar, também tem de dar atenção e carinho aos seus filhos.

Assim, muitas vezes por não conseguirem dominar o lado emocional, em conflito com o profissional, por consequência não lidam bem com a dissolução do vínculo afetivo que tinha com o parceiro, sendo cada vez mais comuns casos de alienação parental quando as mães ficam com a guarda dos filhos (CAVALIERI FILHO, 2010).

Com o aumento do número de divórcios, aumentaram, consequentemente, os casos de abuso do poder familiar, pois os genitores, inconformados com a ruptura do vínculo conjugal, disputavam pela guarda dos filhos judicialmente, mexendo com o emocional e com o íntimo desses filhos, com cada genitor passando a manipular a cabeça dos filhos contra o outro genitor, para assim poder lograr êxito ao requerer a guarda, pois muitas vezes a opinião dos filhos tem grande importância para que seja delimitada esta ação, onde o julgador investigará através de estudos sociais e psicológicos, qual genitor tem mais condições de zelar pela guarda dos filhos (VENOSA, 2009).

4.2 ALIENAÇÃO PARENTAL

A alienação parental é um assunto que era pouco conhecido e discutido, visto que sempre existiu certa reluta de falar sobre o tema, que, de certa forma, amedrontava e ainda amedronta a sociedade. Com a promulgação da Lei 12.318 de, 26 de agosto de 2010, ocorreram mudanças relevantes no cenário jurídico nacional, mais notadamente no ramo do Direito de Família, basicamente pelos efeitos catastróficos que essa prática ocasiona, muitas vezes trazendo danos irreparáveis para as crianças e adolescentes vítimas dessa ação abominável.

A alienação parental consiste em um genitor, na maior parte das vezes o que se encontra com a guarda da criança ou do adolescente, em tentar macular a imagem do outro, criando uma situação e um ambiente hostil de convivência entre o genitor e o filho, promovendo um distanciamento entre eles até se tornarem estranhos, ou seja, é um distúrbio psicológico causado muitas vezes pelo parente próximo, que possui a guarda ou o dever de cuidar e zelar (ALMEIDA JÚNIOR, 2010).

Assim, ocorre sua incidência de forma mais comum com o término do vínculo conjugal de maneira litigiosa, ou seja, não amigável. Com isto, a regulamentação da guarda torna-se necessária, que, na maioria das vezes, apenas um dos genitores fica com a guarda exclusiva da criança ou do adolescente, pela impossibilidade de consenso entre os genitores. Por conta disso, dá-se início ao afastamento do filho pelo detentor da guarda, com a intenção de se vingar diretamente do ex-companheiro com a ruptura dos laços entre genitor e filho (ALMEIDA JÚNIOR, 2010).

Essa atuação consiste em distanciar o genitor que se encontra fora do ambiente de convivência cotidiana da criança ou o adolescente. Geralmente acontece por motivos banais, tais como falsas alegações, difamação e até mesmo fatos inverídicos. Essas intenções têm como finalidade específica causar um brusco distanciamento entre o filho e seu genitor, que, de forma inconsciente utiliza-se do filho como instrumento de vingança, advindas de assuntos inacabados, que deveriam ser resolvidos de forma consensual pelo casal.

Dessa forma, progressivamente, o filho não deseja mais a companhia do genitor, negando-se a encontrá-lo, ou até mesmo passar o fim de semana em sua residência. Passando a repudiá-lo, o filho torna-se estranho, não conseguindo nem mesmo manter um diálogo com o genitor, pois se sente intimidado pelo genitor que possui a sua guarda, criando, assim, um ambiente totalmente desfavorável para o outro genitor que fica sem saber o que fazer, haja vista que não consegue nem ao menos ter um contato pessoal, nem intelectual com seu filho (CABRAL, 2009).

Tal conduta praticada pelo genitor que detém a guarda do filho gera diversas consequências negativas, sendo muitas vezes de difícil reversão ou irreversíveis, comumente aparecendo na adolescência, pois o filho sem referência familiar torna-se um adolescente revoltado, podendo, na fase adulta, se tornar um usuário de drogas, ou até mesmo um criminoso, apresentando distúrbios comportamentais diversos (CABRAL, 2009).

4.2 INOVAÇÕES DA LEI 12.318/2010

A Lei nº. 12.318, sancionada em 26 de agosto de 2010, pelo Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, visa conter a denominada Alienação Parental. A nova norma veio para punir os pais e mães que tentam colocar seusfilhos contra ex-maridos e ex-esposas, dificultando a convivência e causando prejuízos ao menor.

De acordo com o Projeto, aprovado pelo Senado, a ação do juiz poderá coibir isto de várias formas, sendo as mais comuns: advertência ou multa para o alienador, ampliação do regime de visitas favorecendo o genitor alienado, determinar o acompanhamento psicológico monitorando, alterar ou inverter a guarda, determinar a fixação cautelar do domicilio da criança ou adolescente. A suspensão ou perda do poder familiar, também ocorrerá quando houver caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar.

A motivação do projeto para criação da lei, foi de natureza preventiva, afastando a situação prática absurda de se ter que aguardar a implementação de eminente prejuízo à criança para se permitir a intervenção. A Alienação Parental se expressa no âmbito jurídico como uma forma de violência contra a criança ou adolescente, praticada geralmente, pelo guardião.

Dias (2011, p.17) em sua obra diz:

A Lei 12.318/10, que define a alienação parental chegou em boa hora, ela define a Alienação parental como a interferência na formação psicológica da criança ou adolescente, aduzida por seus genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a autoridade, guarda ou vigilância, para que repudie genitor ou que causa prejuízos ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

Tal Lei, havendo indícios de sua prática, prevê a realização de processo autônomo, com tramitação prioritária e a realização de pericia psicológica, cabendo ao juiz determinar medidas provisórias necessárias para a preservação daintegridade psicológica da criança ou adolescente.

A Lei indica que a prática da alienação parental fere o direito da criança e do adolescente de conviver de forma saudável com a família, prejudicando assim a relação de afeto com o genitor, constituiu abuso moral contra a criança ou oadolescente.

A Lei veio pra nortear o juiz, como ele pode agir para reverter à alienação parental, e também deixar mais claro esse procedimento. A existência de definição jurídica da alienação parental permite ao juiz, em casos mais simples, identificá-la com razoável segurança, para daí inferir efeitos jurídicos com agilidade, inclusive a adoção de medidas emergenciais para a proteção a criança ou adolescente, restringindo se necessário, o exercício abusivo de autoridade parental.

Sobre isto assim falou o autor da Lei Deputado Regis de Oliveira, do PSC de São Paulo: “Ele pode tomar providências, por exemplo, para afastar do convívio da mãe ou do pai essa pessoa; ele pode mudar a guarda; pode mudar o direito devisita; pode impedir a visita; ao final como última solução, ele destitui ou suspende o exercício do poder parental.” O objeto de lei: proteção à criança, dando instrumentos hábeis para o juiz tomar as medidas cabíveis. (BRASIL, 2015)

No artigo 6º, caput e incisos, a referida Lei enumera os meios punitivos de conduta de Alienação Parental. Ao realizar uma interpretação extensiva do referido artigo, observa-se que ele estabelece, em seu caput, que os meios de sanção serãoutilizados de forma cumulativa ou não, o que quer dizer que é dado ao juiz a possibilidade de aplicar um ou mais meios de punição.

Seguindo a Lei, sempre que for detectado o indício da alienação parental, o juiz ordenará que seja realizada uma perícia psicológica da criança ou adolescente, ouvindo, para isto, o Ministério Público. Realizada a perícia, o resultado desta deverá ser apresentado no prazo de 90 dias, juntamente com eventuais medidas provisionais necessárias para preservar a identidade psicológica da criança. Tal perícia traz efetivamente maior segurança ao magistrado para tomar uma decisão.

O referido artigo penaliza o alienador com multa. Tal dispositivo dá ao magistrado uma dinâmica diferente ao processo, efetivando a segurança jurídica. A multa pode ser um meio de constrangimento indireto ao alienador e um modelo decoerção. É através desse mecanismo que o descumpridor, alienador da ordem judicial, se intimidará, porque terá seu patrimônio afetado.

O artigo 10º que previa até dois anos de detenção para quem fizesse falsa denúncia que prejudicasse a convivência de um filho com o pai ou a mãe, foi vetado pelo Presidente, que argumentou que a Lei já prevê punições suficientes e apena seria prejudicial à própria criança ou adolescente. O artigo 9º também foi vetado. Este permitia que as partes acordassem por meio de um mediador para depois homologarem na Justiça. A justificativa do Governo é que a Constituiçãoconsidera a convivência familiar um direito indisponível da criança e do adolescente, por esse motivo, portanto, não caberia nenhuma negociação extrajudicial.

É importante observar que, no artigo 10 vetado, seria uma forma de punição que, se tivesse continuado, amedrontaria com mais eficácia o alienador. O artigo nove dizia que os genitores poderiam usar de outras formas como a conciliação para resolverem seus conflitos, sem terem que apelar para a justiça comum que já está com uma enorme demanda. O meio mais severo de punição disponível pelo Judiciário seria a alteração da guarda, ou até mesmo a suspensão da autoridade parental.

A alteração ou suspensão do poder familiar, como meio de punição ao alienador, apenas deverá ser aceita nos casos mais extremos, isto depois de ter sido verificado todas as alternativas possíveis para a solução do conflito. O magistrado, optando por tal medida, está contribuindo com a sanidade física e psicológica da criança ou adolescente.

Porém, tal decisão deve ser monitorada e acompanhada por equipe de profissionais habilitados para tal situação. O inciso V do referido artigo, requer cautela ao ser usado, pois ele prevê a aplicação da guarda compartilhada e muitas vezes torna-se inviável tal modelo de guarda. Diante de tal caso, cabe o genitor alienado fazer valer seus direitos, como o de visita, entre todos os que lhe caibam, uma vez que a separação entre os cônjuges apenas extingue a relação entre o casal e não com os filhos.

Um aspecto que merece atenção são as medidas de urgência, pois a grande demora durante um processo judicial causa preocupação, sendo que muitas vezes o alienador usa dessa situação para continuar com a prática da Alienação Parental. É importante lembrar que o art. 6º possui caráter de preservação do bem-estar psíquico do menor e não de caráter punitivo. O texto da Lei garantiu medidas de cautela, preservando assim o direito da criança e adolescente. Esta Lei é de grande valia para o Estado Democrático de Direito, quando se fala em resguardar os direitos da criança e do adolescente.

A Lei 8.069/90 criou o Estatuto da Criança e do Adolescente com o objetivo de detalhar direitos assegurados e proteger o menor e fazer cumprir a lei através dos meios legais. Por outro lado, a Lei n. 12.318 vem complementar o Estatuto da Criança e do Adolescente no que se refere à alienação parental. Afinal, no Estatuto da Criança e do Adolescente não se tinha uma definição quanto a punições para a conduta alienadora, portanto, o ordenamento jurídico brasileiro não primava os direitos da criança sob o aspecto da Alienação Parental.


5 RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL NA ALIENAÇÃO PARENTAL

A designação responsabilidade parental acolhe os direitos e obrigações, relativamente aos cuidados concernentes à criança e ao adolescente,assim como em relação a todos os integrantes da entidade familiar.

A responsabilidade parental não apresenta grandes questões jurídicas trazidas à apreciação do Judiciário, enquanto exercida na constância do casamento e da união estável. De um modo geral, as dificuldades são contornadas, criando-se um sistema de retroalimentação, que, bem ou mal, mantém definidos os papéisdos integrantes da família (NOGUEIRA, 2010, p.81).

Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas em10 de dezembro de 1948. As pessoas denominadas “titulares da responsabilidade parental”, na maioria das vezes incumbem aos pais da criança e do adolescente, sendo que nos casos de extinção ou destituição do poder familiar pode ser nomeado um tutor para representá-la, podendo ser um familiar, um terceiro ou uma instituição.

Nos casos em que os pais estejam divorciados ou separados existe a necessidade de se decidir qual dos genitores passará a exercer esta responsabilidade, sendo esta questão solucionada através da regulamentação da guarda e das visitas. Importante trazer os entendimentos de Barbosa (2013, p.99) que em matéria publicada, na Internet, descreveu:

No índice de assuntos da obra referida, de Carbonnier, aparece à palavra guarda e, em seguida, entre parênteses, a seguinte ressalva: palavra banida.

[...]

Trata-se de uma nova visão da responsabilidade parental, decorrente da Convenção da ONU de 1.989, que veio atualizar a proteção dos filhos menores. A partir daquela convenção, ao invés de filho menor o termo correto passa a ser criança e adolescente, acolhido pelo ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente.

A substancial diferença contida neste novo enfoque é que o menor era antes tratado como criatura sofredora e passiva. Já a criança e o adolescente, ou os chamados filhos do divórcio, receberam um papel ativo, passando a serem reconhecidos os direitos à pessoa dos filhos menores, sendo que toda a orientação jurídica intrínseca deve atender o superior interesse da criança, no qual se manifesta na abrangente oportunidade de aumentar o desenvolvimento das potencialidades da pessoa humana, qual seja alcançar a tão almejada felicidade.

5.1 ELEMENTOS PARA CARACTERIZAÇÃO DA RESPONSABILIDADE

Para um trabalho mais efetivo no combate ao surgimento da Síndrome de Alienação Parental, se faz necessário com urgência que o Poder Judiciário conte com o apoio de uma equipe multidisciplinar, auxiliando no diagnóstico e julgamento dos casos.

Para Dias (2011), os atributos que auxiliam a suplantar esta Síndrome são aquelas que ajudam a sobrepujar algum outro tipo de prejuízo ou confusão emocional. Dentre elas podemos referir:

Equilíbrio emocional; amor incondicional aos filhos; suporte financeiro; assistência jurídica e psicológica; diagnóstico precoce da SAP; assertividade para tomada de decisões; capacidade para respeitar acordos e decisões; empatia; resiliência; visão de futuro; criatividade; e esperança (DIAS, 2011, p.69).

Segundo Fonseca (2009), a conduta alienante “(...) quando ainda não deu lugar à instalação da Síndrome é reversível e permite – com o concurso de terapia e auxílio do Poder Judiciário, o restabelecimento das relações com o genitor preterido”.

Essa patologia afeta mais os meninos, pois são os que mais sofrem com a ausência paterna, em idade que varia entre oito e 11 anos. Crianças mais velhas tendem a opor maior resistência à pressão do genitor alienante, já que têm um pouco mais de independência e de vontade própria (FONSECA, 2009).

Partindo da possibilidade de dar suporte psicossocial às crianças procedentes de lares desfeitos e provavelmente com sequelas psicológicas, se faz necessário criar novos direcionamentos e perspectivas para o destino delas.

Trindade (2010) explica: “De fato, a Síndrome de Alienação Parental exige uma abordagem terapêutica especifica para cada uma das pessoas envolvidas, havendo a necessidade de atendimento da criança, do alienador” (TRINDADE, 2010, p.23).

Para Dias (2011, p.31), uma das alternativas capazes de sanar o impasse de crianças vítimas de SAP, é “estabelecer um novo lar para elas, equilíbrio emocional, amor, suporte financeiro, e assistência jurídica e psicológica”

Para Souza (2010, p.67) as consequências da SAP são:

Com decorrência, a criança passa a revelar sintomas diversos: portadora de doenças psicossomáticas, ansiosa, deprimida, nervosa e, principalmente, agressiva, depressão crônica, transtornos de identidade, comportamento hostil, desorganização mental e, ás vezes, o suicídio, a tendência ao alcoolismo e ao uso de drogas.

Segundo alguns autores nacionais, o diagnóstico da SAP, e o da alienação parental, poderão ser feitos através da realização de perícia psicológica. Nessa esteira, Dias (2011) destaca a importância do trabalho de psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais que, com seus laudos e pareceres, irão auxiliar o julgador. Contudo, não se encontra uma descrição exata de como, ou quais instrumentos (testes, por exemplo) os profissionais utilizariam para esse fim.

Na análise da autora percebe-se nitidamente que o tratamento da SAP requer perícia de uma equipe multidisciplinar voltada para o tratamento da criança ou adolescente.

Porém, se observa que a Síndrome da Alienação Parental não deve ser confundida com a mera alienação parental. Assim, enquanto a síndrome refere-se à conduta do filho que se recusa terminante e obstinadamente a ter contato com um dos progenitores, que já sofre as mazelas oriundas daquele rompimento, a alienação parental relaciona-se com o processo desencadeado pelo progenitor que intenta arredar o outro genitor da vida do filho (FONSECA, 2009).

Uma atitude às vezes usada para que haja a alienação parental é a mudança de cidade, estado ou país, apesar deste último só ser permitido com a autorização do genitor não guardião. Em muitos casos observa-se, infelizmente, quando o guardião não consegue instalar a alienação parental, casos de assassinatos tanto do não guardião e, em alguns casos, dos próprios filhos.

Muitos juízes, ao julgar a lide, tentam solucionar o problema determinando a guarda compartilhada. Dias (2011, p.45) defende que “reaproximar pais e filhos, vítimas da alienação parental, seria a melhor forma de solucionar a síndrome”. Esta reaproximação é importante para que o alienador não continue exercendo de forma abusiva o seu poder sobre a criança, mesmo que esta reaproximação seja um dos desafios do Judiciário na atualidade.

Partindo da probabilidade de restabelecimento imediato do convívio da criança com o outro genitor, tal medida tem grande probabilidade de ter êxito na superação da crise. Para Freitas (2009, p.20) “a guarda compartilhada é a melhor forma de reduzir ou eliminar os efeitos da alienação parental”. Afinal, aos menores deve ser concedido o direito de conviver com os genitores de forma mais ampla e efetiva ao convívio paterno-filial. Para Grisard Filho (2011, p.19) “a guarda compartilhada permite a aproximação dos filhos sem conotação de posse, e fornece as bases fundamentais para um convívio socialmente aceito”.

5.2 ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO E JURISPRUDENCIAL

É comum observar a Síndrome da Alienação Parental presente nas causas de pedido de guarda ou de divórcio. Entretanto, a aplicação da lei anda continua sendo muito tímida no Judiciário, por conta de em certos casos ser difícil identificar na prática o ato da alienação parental.

O agravo de instrumento N 70060267127, da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, trata de um recurso interposto na ação de declaração de alienação parental no qual foi indeferido o pedido de liminar de regularização de visitas a filha menor, de Rodrigo V.M e Fernanda R.C. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA LFBS Nº 70060267127 (Nº CNJ: 0219275-53.2014.8.21.7000) 2014/Cível agravo de instrumento. Ação de reconhecimento de alienação parental. Visitas.

Muito mais do que a discrepância entre a numeração do feito, constante na ata de audiência e na inicial da dissolução de união estável que ensejou o acordo, o indeferimento liminar deve-se ao fato de que a menina não mantém contato com o pai há aproximadamente um ano. Assim, considerando o longo lapso temporal e que ela tem apenas 6 anos de idade, recomenda-se que outros elementos de prova venham aos autos para eventual alteração da decisão, como o estudo social já determinado.

NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME O julgado exposto traz consigo uma das formas primárias de alienação parental. Ocorre que o pedido de liminar do pai da criança encontra-se amparado e acordado entre as partes nos autos da ação de reconhecimento de união estável que foi transitado na 1 ª Vara de Família da Comarca de Florianópolis/SC. Entretanto, tem a agravada, mãe da criança impossibilitado os encontros do genitor com a sua filha, conduta que tem sido praticada de forma conjunta pelo seu atual companheiro.

É visível a prática de alienação parental, já que a filha tem direito a convivência natural e harmônica com o seu pai, não podendo ser negado a troca de afeto e o aprendizado que naturalmente será herdado na companhia do seu genitor. O pedido de liminar do genitor não foi concedido, pois o agravado relata que há mais de um ano não encontra a sua filha, sendo assim, já que se trata de uma criança de apenas 6 anos de idade, esta sendo a parte mais atingida com o ato de alienação parental, é fundamental que tenha que ser respeitado o seu espaço e o seu entendimento sobre tudo que está acontecendo em sua volta. Dessa forma, para assegurar o bem-estar da criança, é necessária que ocorra de forma cautelosa a reaproximação do genitor com a filha. Afinal, a falta da figura paterna pode causar um prejuízo futuro para o desenvolvimento da criança.

O segundo julgado apresenta em seu conteúdo uma das piores formas de estratégia a ser utilizada pelo genitor guardião, a falsa denúncia da prática do abuso sexual praticada pelo outro genitor que não possui a guarda. O Tribunal de Justiça do RS, no agravo de instrumento de N 70058505587, da Sétima Câmara Civil, traz em seu teor o assunto abordado, no que diz respeito à alteração de guarda entre os pais da criança.

O genitor sustenta que seja deferida em caráter de urgência a reversão da guarda em seu favor, pois a genitora detentora da guarda da criança tem praticado a alienação parental, pois esta tem dado falso testemunho de que o filho do ex-casal sofreu abuso sexual por parte do pai. Entretanto, no que diz respeito à alteração de guarda, tem que ser feita de forma ponderada, apensa, sendo justificada apresentada e provada uma situação fatídica do risco.

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SFVC Nº 70058505587 (Nº CNJ: 0043121-83.2014.8.21.7000) 2014/Cível ALTERAÇÃO DE GUARDA. ALIENAÇÃO PARENTAL. DISPUTA ENTRE OS PAIS DA CRIANÇA.

1. As alterações de guarda devem ser evitadas tanto quanto possível, pois em regra, são prejudiciais à criança, que tem modificada a sua rotina de vida e os seus referenciais, causando-lhe transtornos de ordem emocional.

2. Deve sempre prevalecer o interesse da infante acima de todos os demais, sendo que, no caso em tela, estando aprazada audiência para data próxima onde os fatos serão mais esclarecidos e a pretensão de alteração de guarda ou de ampliação das visitas será reexaminada, fica mantida, por ora, a guarda pela genitora e a visitação anteriormente estabelecida, até que aportemos aos autos elementos de convicção que desaconselhem a guarda materna ou recomendem os pleitos do genitor.

Recurso desprovido. nº 70058505587, Comarca de Porto Alegre:

"NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME."

É notória a preocupação do Judiciário com a criança e o seu bem-estar, não podendo assim, afastá-la da genitora, pois essa é uma medida drástica, que só deverá ser efetivada se esta resistir a uma conduta diversa da que está tendo.Dentre os entendimentos aqui expostos, é importante destacar a importância da convivência dos filhos com ambos os genitores, devendo ser os casos que dizem respeito a essa pratica julgados de forma cautelosa.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscou-se, com o presente trabalho, analisar a aplicabilidade do instituto da responsabilidade civil nos casos de alienação parental. Tal prática nos ronda há muito tempo, mas nos últimos anos ganhou maior destaque.

No ano de 2010, foi promulgada uma lei federal, que protege as crianças e adolescentes alienados desta prática, a chamada “Lei de Alienação Parental”. Apesar disso, não é muito comum vermos a aplicação desta lei, tendo em vista ser difícil constatar a prática de Alienação Parental.

Atualmente, é muito comum os casais se separem, e, consequentemente, surge a dúvida: Quem ficará com a guarda do filho? Na maioria dos casos, quem fica com a guarda, geralmente, é a mãe, mas nada impede do pai ser o guardião da criança.

O problema não é definir quem ficará com a guarda do filho, mas sim, após o divórcio, como ficará a convivência entre esta família rompida. É neste momento que surge a figura da alienação parental. Na maioria das situações o ex-cônjuge, quando não aceita o divórcio, tenta fazer de tudo para afastar de vez o filho do outro genitor, criando falsas ideias, denegrindo a imagem dele, sem qualquer motivo relevante, apenas pelo fato de querer romper definitivamente o vínculo entre pai/mãe e filho.

Para que alguém seja responsabilizado civilmente, é preciso que sejam preenchidos os elementos da Responsabilidade Civil: Conduta, Dano, Nexo causal e Culpa. Na Alienação Parental, todos estes elementos estão presentes.A conduta do alienante de implantar mentiras na cabeça da criança, com a finalidade de afastá-la do outro genitor, configura um ato ilícito, pois fere todos os padrões de Justiça.

O dano está mais que claro, chega a ser gritante, tendo em vista o sofrimento, a dor da perda, causada pelo alienante ao alienado (tanto criança quanto o genitor), sem falar nas sequelas que tal prática pode acarretar.

Com relação ao nexo causal, o mesmo se encontra presente, tendo em vista que o alienador usa a criança para a prática da alienação. Em virtude disso, acaba causando um sofrimento, um abalo psicológico por ela experimentado.

Os objetivos propostos na realização do trabalho foram alcançados, visto que era tratar sobre a responsabilidade civil da Alienação Parental.

Diante disso, pode-se concluir que a alteração da Lei 12318/10 trouxe o conceito de Alienação Parental não apenas como simples interferência prejudicial para a formação psíquica da criança e do adolescente, induzida por um dos pais, mas também por todos que fazem parte do círculo familiar, ou tenham contato com a criança ou adolescente, durante sua criação, bem como com aqueles que tenham o infante sob sua autoridade, vigilância ou guarda.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FONTENELE, João Veridiano Fontenele Filho. Responsabilidade civil na alienação parental. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5245, 10 nov. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60738. Acesso em: 24 abr. 2024.