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A responsabilidade civil das agências de turismo nas relações de consumo

A responsabilidade civil das agências de turismo nas relações de consumo

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A responsabilidade das agências de turismo engloba todos os serviços que o consumidor adquire por intermédio delas, mesmo sendo prestado por outra empresa, como serviço de transporte, hotel e outros.

Resumo: As relações de consumo ganharam amplitude com a edição do Código de Defesa do Consumidor, em 1990, e cada vez mais vem ganhando espaço no mundo jurídico com a familiarização da sociedade com seus direitos oriundos deste diploma legal. A responsabilidade dos fornecedores de produtos e serviços é objetiva. Ocorrendo violação a quaisquer dos deveres impostos ao fornecedor, este deverá ser responsabilizado com base nos artigos 12 a 25 do Código de Defesa do Consumidor. A responsabilidade, nas relações de consumo, também é solidária - artigo 7º, parágrafo único, 25, § 1º e 34, todos do Código Protetivo. Assim, quando há mais de um responsável pelo dano, todos responderão solidariamente pela reparação dos prejuízos, podendo exercer, posteriormente, o direito à ação regressiva. A responsabilidade das agências de turismo engloba todos os serviços que o consumidor adquire por intermédio delas, mesmo sendo prestado por outra empresa, como serviço de transporte, hotel e outros. O objetivo principal deste estudo é auxiliar na solução de conflitos referentes a esse tema, tendo em vista a vulnerabilidade do consumidor que procura uma agência de turismo, a fim de viajar com segurança, conforto e tranqüilidade, o que muitas vezes não ocorre, devendo ser a agência responsabilizada por todos os danos ocasionados ao consumidor. A metodologia aplicada será a dedutiva. O resultado esperado, ao término da monografia, será demonstrar que a agência de turismo deve ser responsabilizada por qualquer dano que o consumidor venha a sofrer em razão dos serviços prestados.

Palavras-chave: Fornecedor. Consumidor. Serviço. Relação de Consumo. Vulnerabilidade. Contrato de Turismo. Responsabilidade Civil. Agência de Turismo.

Sumário: INTRODUÇÃO; 1.RELAÇÃO DE CONSUMO EM GERAL, 1.1.Necessidade do Código de Defesa do Consumidor, 1.2.As relações de consumo e a Constituição Federal de 1988, 1.2.1.Principais princípios constitucionais aplicáveis, 1.2.1.1. Dignidade da pessoa humana, 1.2.1.2 Isonomia, 1.2.1.3 Soberania, 1.3.Conceito de consumidor, 1.3.1.Os consumidores equiparados, 1.3.1.1. A coletividade de pessoas, 1.3.1.2. As vítimas do evento, 1.3.1.3. Os expostos às práticas comerciais e contratuais, 1.4.Conceito de fornecedor, 1.4.1. Produto, 1.4.2. Serviço, 1..5.Princípios gerais trazidos pelo Código de Defesa do Consumidor, 1.5.1 Boa-fé objetiva, 1.5.2. Vulnerabilidade, 1.5.3. Transparência das relações de consumo, 1.5.4. Garantia de adequação; 2.DIREITOS BÁSICOS, 2.1. Proteção à saúde e a segurança , 2.2. Educação para o consumo, livre escolha e igualdade nas contratações, 2.3. Informação, 2.4. Publicidade enganosa e abusiva, 2.5. Proteção contratual, 2.6. Acesso à justiça, 2.7. Inversão do ônus da prova, 2.8. Prevenção e reparação de danos; 3.RESPONSABILIDADE CIVIL NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, 3.1. Responsabilidade pelo fato do serviço – acidente de consumo, 3.2. Responsabilidade por vício do serviço, 3.3. Dano moral no vício do serviço, 3.4. Excludentes de responsabilidade, 3.5O papel das agências de turismo, 3.5.1. Tendência atual do STJ, 3.6. O direito de regresso, 3.7. Projeto de Lei nº 5.120-C/01 em trâmite no Congresso Nacional; CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS.


INTRODUÇÃO

As relações de consumo são regidas pela Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 – Código de Defesa do Consumidor. A necessidade de um código para regulamentar a relação entre fornecedores de produtos e serviços e os consumidores fundamenta-se na fragilidade e vulnerabilidade do consumidor.

No caso específico das agências de turismo, como fornecedoras do serviço "pacote turístico", a questão gira em torno de ser a agência responsável pelos danos ocasionados pelos defeitos dos serviços intermediados, como hotéis, empresa aérea, tours e restaurantes, sendo considerados verdadeiros prepostos dela, na forma do artigo 34 do Código de Defesa do Consumidor.

O consumidor, muitas vezes, vê-se impossibilitado de exigir o ressarcimento de seus danos diretamente dos prepostos, uma vez que a prestação do serviço geralmente se dá em local distante de sua residência, sendo imprescindível, desse modo, a responsabilização da agência para o efetivo amparo do consumidor/turista.

A problemática se dá, então, na responsabilização do fornecedor e na proteção adequada e eficaz do consumidor lesado.

A pesquisa do tema em questão é de extrema relevância, por se tratar de um novo direito que deve ser cada vez mais difundido e posto em prática, pois envolve uma coletividade de consumidores que, muitas vezes, tem seus direitos lesados e não vêem a efetiva reparação a que tem direto.

O objetivo geral da pesquisa é analisar e discutir a responsabilidade civil objetiva das agências de turismo, ao venderem pacotes fechados, no caso de ocorrer lesão ao direito do consumidor. Como objetivos específicos, serão verificadas a) a relação de consumo entre a agência de viagem e o turista/consumidor; b) a responsabilidade civil nas relações de consumo; e c) a possibilidade de responsabilização das agências de turismo ante o dano causado por prepostos por ela contratados ou autorizados e verificação do posicionamento majoritário a respeito do assunto.

Dividiu-se, para tanto, o presente trabalho em três capítulos.

O primeiro capítulo aborda as relações de consumo em geral, visando expor o surgimento e a necessidade de um Código Protetivo do Consumidor e sua estreita relação com a Constituição Federal de 1988 bem como os conceitos de consumidor e fornecedor, juntamente com os principais princípios trazidos pelo código, como a boa-fé objetiva, a vulnerabilidade, a transparência e a garantia de adequação.

O segundo capítulo trata dos direitos básicos do consumidor, instituídos pelo art. 6º do Código, como a proteção à saúde e à segurança; a educação para o consumo; a livre escolha e igualdade nas contratações; o direito à informação; a garantia contra a publicidade enganosa e abusiva; a proteção contratual; o acesso à justiça; a inversão do ônus da prova em favor do consumidor; e a efetiva prevenção e reparação de danos oriundos das relações de consumo.

Por fim, o terceiro capítulo versa sobre a responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor, englobando a responsabilidade pelo fato do serviço – acidente de consumo; a responsabilidade por vício do serviço; as excludentes de responsabilidade; o papel das agências de turismo; a tendência atual do STJ; o direito de regresso; e o projeto de Lei nº 5.120-C/01, em trâmite no Congresso Nacional que visa à isenção de responsabilidade das agências de turismo diante do consumidor lesado.


1. RELAÇÃO DE CONSUMO EM GERAL

1.1. Necessidade do Código de Defesa do Consumidor

Com a Revolução Industrial, a produção foi massificada e a relação fornecedor-consumidor tornou-se impessoal. São grandes redes de produção em massa necessitando de regras específicas para defender o consumidor vulnerável que não teve acesso à verificação da fabricação dos produtos e se vê cada vez mais impossibilitado de fazer valer seus direitos.

O surgimento da tutela do consumidor nasceu naturalmente da evolução das relações de consumo, que desigualaram os dois pólos dessa relação.

Pode-se mesmo afirmar que a proteção do consumidor é conseqüência direta das modificações havidas nos últimos tempos nas relações de consumo, representando reação ao avanço rápido do fenômeno, que deixou o consumidor desprotegido ante as novas situações decorrentes do desenvolvimento (ALMEIDA, 2000, p. 3).

No Brasil, a primeira indicação indireta à proteção ao consumidor foi pelo Decreto nº 22.626/1933, que reprimia a usura. Posteriormente, na Constituição de 1934, elencava-se a proteção à economia popular; em seguida, surgiu a legislação dos crimes contra a economia popular datada de 1938; sobrevindo, em 1951, a hoje chamada Lei da Economia Popular. Em 1962, criou-se o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), pela Lei de Repressão ao Abuso do Poder. Especificamente, de 1971 a 1973, o Deputado Nina Ribeiro proferiu os primeiros discursos sobre a necessidade de proteção específica ao consumidor. E, em 1978, foi criado o Procon de São Paulo – primeiro órgão de defesa do consumidor. Na esfera Federal, foi criado, em 1985, o Conselho Nacional de Defesa do Consumidor (hoje extinto e substituído pelo SNDE – Sistema Nacional de Defesa do Consumidor) e a Lei da Ação Civil Pública de responsabilidade por danos causados ao consumidor (ALMEIDA, 2000, p. 10/11).

Nesta trilha de preocupações é que se encontra a Resolução nº 39/248 da Organização das Nações Unidas, aprovada em sessão plenária de 9-4-1985, inspirada, a seu turno, em famosa declaração dos direitos internacionais do consumidor feita pelo saudoso presidente John Kennedy, em 15-3-1962, data em que, se comemora o ‘dia internacional do consumidor’ (FILOMENO, 1999, p. 23).

Apesar de toda a evolução que surgia no mundo contemporâneo, inclusive com a edição da Lei nº 7.347/85 – Lei da Ação Civil Pública, conforme bem salienta Rizzatto Nunes (2000, p. 71),

[...] era necessário que tivéssemos uma lei capaz de dar conta das relações jurídicas materiais que haviam surgido e estavam em pleno vigor, porém sem um suporte legal que lhes explicitasse o conteúdo e que impedisse os abusos que vinham sendo praticados. [...] o regime privatista do Código Civil é inoperante em questões ligadas à sociedade de massa, como da mesma forma o é o sistema das ações judiciais individuais do Código de Processo Civil.

Em 1988, com o advento da nossa carta magna, tivemos uma grande evolução, com a inserção de direitos do consumidor em várias partes do seu texto, inclusive como direito fundamental, em seu artigo 5º, inciso XXXII, que assegura o princípio da isonomia com a efetiva proteção ao consumidor vulnerável e como princípio geral da atividade econômica no artigo 170, inciso V.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...] V - defesa do consumidor; (BRASIL, 2001, p. 8-108).

Para garantir a efetiva aplicabilidade dos direitos do consumidor, o artigo 48 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias determina que será elaborado, em 120 dias, um Código de Defesa do Consumidor e, atendendo a esse mandamento constitucional, nasce, em 1990, a Lei nº 8.078 para regular a matéria.

Com a codificação promulgada em 1990, conferiu-se ao direito do consumidor a sua autonomia, e, simultaneamente, promoveu-se uma reformulação evolutiva no direito positivo, ao serem resgatadas as pessoas e suas funções do processo econômico para a ordem jurídica.

Isso porque o "consumidor" como categoria e o "consumo" como função haviam sido relegados ao esquecimento pelas ordens jurídicas clássicas, em virtude da generalização promovida pela doutrina e legislação a ponto de desnaturar as pessoas e a sua efetiva participação no ciclo econômico (DONATO, 1994, p. 21).

Rizzatto Nunes (2000, p. 71) esclarece que:

Assim, consigne-se que, para interpretar adequadamente o CDC, é preciso ter em mente que as relações jurídicas estabelecidas são atreladas ao sistema de produção massificado, o que faz com que se deva privilegiar o coletivo e o difuso, bem como que se leve em consideração que as relações jurídicas são fixadas de antemão e unilateralmente por uma das partes – o fornecedor –, vinculando de uma só vez milhares de consumidores. Há um claro rompimento com o direito privado tradicional.

O Direito do Consumidor é um novo direito que surgiu para regular as relações entre consumidores e fornecedores ante as tendências advindas do desenvolvimento da sociedade, que torna as relações mais abstratas e impessoais, conseqüentemente, mais complexas e com problemas sociais de desigualdades.

1.2. As relações de consumo e a Constituição Federal de 1988

Pela hierarquia da Constituição Federal em nosso sistema jurídico, devemos partir da analise dos princípios constitucionais relacionados ao consumidor para somente depois estudarmos a relação de consumo propriamente dita.

"A rigor, como a figura do consumidor, em larga medida, equipara-se a do cidadão, todos os princípios e normas constitucionais de salvaguarda dos direitos do cidadão são também, simultaneamente, extensivos ao consumidor pessoa física" (RIZZATTO NUNES, 2000, p. 5).

1.2.1 Principais princípios constitucionais aplicáveis

Vários são os princípios constitucionais relacionados à defesa do consumidor, como a soberania, a dignidade da pessoa humana, a liberdade, a justiça, a solidariedade, a isonomia, o direito à vida, a intimidade, a vida privada, a honra e imagem, a informação, a eficiência, a publicidade entre outros (TRAJANO, 2004, não paginado). Alguns merecem um destaque especial dentro do presente trabalho. São eles:

1.2.1.1 Dignidade da pessoa humana

Trazido pela Constituição Federal pelo seu artigo 1º, inciso III, constitui-se como fundamento do Estado democrático de direito e, portanto, de todo ordenamento jurídico (TRAJANO, 2004, não paginado).

Princípio este considerado como basilar para muitos autores e de difícil definição, já que está relacionado com tantos outros princípios. Para se ter uma vida digna, é necessário saúde, educação, qualidade de vida, segurança, entre outros, mas, apesar dessa dificuldade de conceituação, a visualização de sua infração se torna clara quando nos deparamos com ela (TRAJANO, 2004, não paginado).

É ela, a dignidade, o último arcabouço da guarida dos direitos individuais e o primeiro fundamento de todo o sistema constitucional. A isonomia, como demonstraremos, servirá para gerar equilíbrio real, visando concretizar o direito à dignidade [...] (RIZZATTO NUNES, 2000, p.16).

Ao lado do direito à vida, o princípio da dignidade é um dos principais direitos da humanidade e o seu reconhecimento e efetivação se figuram imprescindíveis para a legitimidade de todo ordenamento jurídico, inclusive quando se trata de direito dos consumidores.

1.2.1.2 Isonomia

Este princípio é essencial para que se consiga atingir a justiça tão almejada pela coletividade, já que o desequilíbrio está instalado nos diversos ramos da sociedade, muito mais nas relações de consumo, gerando, então, uma necessidade de se criar um sistema jurídico para contrabalancear essa correlação entre consumidor/fornecedor, a fim de igualá-los (TRAJANO, 2004, não paginado).

Em relação ao assunto, vejamos o que diz a doutrina:

Assim, resumidamente, afere-se a adequação ou não ao princípio da isonomia verificando-se a harmonização dos seguintes elementos: a) discriminação; b) correlação lógica da discriminação com o tratamento jurídico atribuído em face da desigualdade; c) afinidade entre essa correlação e os valores protegidos no ordenamento constitucional (RIZZATTO NUNES, 2000, p.23).

Roberto Senize Lisboa (2001, p. 79) bem explana a isonomia quando diz que

A intervenção estatal nas relações jurídicas privadas é perfeitamente plausível diante deste quadro [de massificação negocial e advento dos contratos de adesão], a fim de se obter o reequilíbrio do vínculo de direito. A padronização dos contratos com cláusulas abusivas enseja a defesa coletiva da coletividades de aderentes, possibilitando-se desta forma que eles sejam beneficiados de igual maneira. O dirigismo econômico, porém, deve ser limitado, sob pena de cerceamento absoluto da liberdade e da responsabilidade. Confere-se assim, um tratamento desigual aos desiguais, na proporção de suas desigualdades, até se atingir o equilíbrio da equação econômica e jurídica da relação (princípio da isonomia).

Salienta ainda a doutrinadora Adriana Carvalho Pinto Vieira (2002, p. 61-63) que a vulnerabilidade do consumidor é reconhecida pelo princípio da isonomia, já que os consumidores devem ser tratados desigualmente, a fim de que se alcance a igualdade real, e afirma ser preciso ter consciência de que

[...] a igualdade que a Constituição protege não é mera suposição de que todos desfrutam das mesmas condições básicas, nivelando-se de modo absoluto. A correta interpretação deste princípio reconhece a desigualdade fundamental que existe entre os homens, consistindo a isonomia em tratá-los desigualmente, na medida em que se diferenciam. A igualdade deve ser proporcional.

Completando o pensamento, Rizzatto Nunes (2000, p.25) afirma que, pelo princípio da isonomia

[...] a Constituição reconhece a vulnerabilidade do consumidor. Isso porque, nas oportunidades em que a Carta Magna manda que o Estado regule as relações de consumo ou quando põe limites e parâmetros para a atividade econômica, não fala simplesmente em consumidor ou relação de consumo. O texto constitucional refere-se a "defesa do consumidor", o que pressupõe que este necessita mesmo de proteção [...]

O Código de Defesa do Consumidor surgiu exatamente para ajustar os desequilíbrios do mercado, sendo, portanto, o princípio constitucional da isonomia considerado basilar para as relações de consumo, haja vista ser necessário igualar os desiguais para efetivar o ideal de justiça almejado pelo Estado.

Sobre o princípio da Isonomia aplicado ao Código de Defesa do Consumidor, destacamos ainda o seguinte:

Veja-se que o espírito teleológico do CDC é igualar os desiguais, motivo pelo qual é tentado pela Lei Protetiva igualar o consumidor ao fornecedor profissional, pois eles, na relação de direito material, são naturalmente desiguais, exatamente por causa do elemento profissionalidade, que contém idéias de prevalência de conhecimentos técnicos, costume em realizar determinada atividade, reiteração, organização tendente à obtenção de um resultado finalístico lucrativo, etc (PEREIRA, 2003, p. 112).

O princípio da isonomia é a imagem dos valores da sociedade em geral, devendo o Estado buscar garantir a cada cidadão oportunidades iguais de ver seus direitos concretizados (TRAJANO, 2004, não paginado).

Já dizia Rui Barbosa:

A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente os desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do orgulho, ou da loucura. Tratar com desigualdade os iguais, ou a desiguais com igualdade, seria flagrante desigualdade, e não igualdade real.

Conclui-se, portanto, ser tal princípio imprescindível à todos o cidadãos já que só com a sua utilização poderemos ver a justiça concretizada.

1.2.1.3 Soberania

Este princípio fundamental trazido pela Carta Magna em seu artigo 1º, inciso I, e artigo 170, inciso I, além de implícito no artigo 4º, evidencia a supremacia do Estado e sua independência nacional deixando claro que independentemente da globalização, as condutas têm que ser permitidas pela Constituição, conseqüentemente os tratados possuem a mesma posição hierárquica de uma lei ordinária, e nenhum tratado ou nenhuma convenção internacional prevalecerá sobre o texto constitucional (RIZZATO NUNES, 2000, p. 9-15).

O STJ e a doutrina atual majoritária são no sentido de considerar hierarquicamente superior a ordem constitucional em relação aos tratados e convenções internacionais, sendo que o Código de Defesa do Consumidor se sobrepões a esses tratados e convenções – como é o caso do Pacto de Varsóvia – já que foi instituído por expressão da vontade constitucional e ser uma legislação de ordem pública e interesse social (SPODE, 2000, p. 141).

1.3.Conceito de consumidor

Analisaremos agora a figura do consumidor nas relações de consumo.

O conceito geral de consumidor é trazido pelo próprio Código (BRASIL, 2003, p. 9), em seu artigo 2º, "Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final".

Ao apreciar o tema, José Geraldo Brito Filomeno (1999, p. 32, grifos do autor) expõe que consumidor vem a ser

[...] qualquer pessoa, física que, isolada ou coletivamente, contrate para o consumo final, em benefício próprio ou de outrem, a aquisição ou a locação de bens como a prestação de serviços. Além disso, há que se equiparar o consumidor à coletividade que potencialmente esteja sujeita ou propensa à referida contratação. Caso contrário se deixaria a própria sorte, por exemplo, o público alvo de campanhas publicitárias enganosas ou abusivas,ou então sujeitoao consumo de produtos ou serviços perigosos ou nocivos à sua saúde e segurança.

Dentro da definição de consumidor, há divergências doutrinárias e jurisprudenciais com relação à pessoa jurídica como consumidora. Duas correntes teóricas existem a respeito do tema, a Finalista e a Maximalista.

Para os finalistas, incluindo José Geraldo Brito Filomeno e Cláudia Lima Marques, devem ser levados em conta, na definição de consumidor, a destinação final e a vulnerabilidade econômica, pois "Consumidor seria apenas aquele que adquire o bem para utilizá-lo em proveito próprio, satisfazendo a uma necessidade pessoal e não para revenda ou então para acrescentá-la a cadeia produtiva" (FILOMENO, 1999, p. 34).

Para entender melhor a distinção entre as teorias, devemos ter em mente a clara definição de destinatário final, segundo cada uma delas.

A doutrina finalista considera que

Destinatário final é aquele destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa jurídica ou física. Logo, segundo esta interpretação teleológica não basta ser destinatário fático do produto, retirá-lo da cadeia de produção, levá-lo para o escritório ou residência, é necessário ser destinatário final econômico do bem, não adquiri-lo para revenda, não adquiri-lo para uso profissional, pois o bem seria novamente um instrumento de produção cujo preço está incluído no preço final do profissional que o adquiriu (MARQUES, 1995, p. 100, grifos da autora).

Os Maximalistas, por sua vez, entendem "que se aplica o código, sem qualquer restrição, às pessoas jurídicas, ainda que fornecedoras de produtos e serviços" (FILOMENO, 1999, p. 34).

Para a teoria maximalista, o destinatário final seria

[...] o destinatário fático do produto, aquele que o retira do mercado e o utiliza, o consome, por exemplo, a fábrica de celulose que compra carros para o transporte dos visitantes, o advogado que compra uma máquina de escrever para seu escritório, ou mesmo o Estado quando adquire canetas para uso nas repartições e é, claro, a dona de casa que adquire produtos alimentícios para família (MARQUES, 1995, p. 102, grifo da autora).

Rizzatto Nunes (2000, p. 84) é adepto da teoria maximalista e expõe sua posição quando diz que

[ ...] a Lei n. 8.078 regula o pólo de consumo, isto é, pretende controlar os produtos e serviços oferecidos, postos à disposição, distribuídos e vendidos no mercado de consumo e que foram produzidos para ser vendidos, independente do uso que se vá dele fazer.

Reafirma ainda esse posicionamento, quando diz que o Código de Defesa do Consumidor

Regula também situações em que haja "destinatário final" que adquire produto ou serviço com finalidade de produção de outros produtos e serviços, desde que o produto ou serviço, uma vez adquiridos, sejam oferecidos regularmente no mercado de consumo, independente do uso e destino que o adquirente lhes vai dar (RIZZATTO NUNES, 2000, p. 87).

O mesmo autor (2000, p. 82-85) define claramente a diferença entre o que vem a ser bem de produção e bem de consumo quando fala que bens típicos de consumo são aqueles fabricados em série pelo fornecedor e distribuídos ao mercado de consumo para serem vendidos por meio de publicidade e exposição em lojas, ao alcance de qualquer pessoa, o que, sem dúvida, é regulado pelo Código de Defesa do Consumidor. Já bem típico de produção seria aquele que não foi fabricado em série e exposto no mercado de consumo, mas sim exposto à venda a determinada classe de pessoas que a utilizará apenas para a produção, e, em tais casos, o CDC não pode ser aplicado, por se tratar de uma relação comercial, geralmente de grande porte, em que o protecionismo do CDC seria um obstáculo. Quando um bem típico de consumo, oferecido regularmente no mercado – como um computador ou uma caneta – é utilizado como bem de produção simultaneamente, trata-se de uma relação de consumo em que a pessoa jurídica deve ser protegida.

Esse conceito de consumidor trazido pelo artigo segundo é considerado um conceito stricto sensu, veremos a seguir outros conceitos de consumidor.

1.3.1 Os consumidores equiparados

Segundo José Geraldo Brito Filomeno (1999, p. 32), o conceito de consumidor definido pela Lei 8.078/90 preocupa-se com a coletividade, ou mesmo com o grupo, a classe ou a categoria de consumidores relacionados a um determinado bem ou serviço, uma vez que é adequado prevenir-se do consumo de bens perigosos ou nocivos, por exemplo, de maneira a favorecer-se a mencionada coletividade de possíveis consumidores.

Cláudia Lima Marques (1995, p. 110) bem explana que

O ponto de partida desta extensão do campo de aplicação do CDC é a observação de que muitas pessoas, mesmo não sendo consumidores stricto sensu, podem ser atingidas ou prejudicadas pelas atividades dos fornecedores no mercado. Estas pessoas, grupos e mesmo profissionais podem intervir nas relações de consumo de outra forma a ocupar uma posição de vulnerabilidade. Mesmo não preenchendo características de um consumidor stricto sensu, a posição preponderante (Machtposition) do fornecedor e a posição de vulnerabilidade destas pessoas sensibilizaram o legislador e, agora, os aplicadores da lei.

Analisaremos cada uma das extensões do conceito de consumidor a seguir.

1.3.1.1 A coletividade de pessoas

Iniciando a análise da extensão da definição de consumidor, vejamos o que diz o parágrafo único do artigo 2º CDC (BRASIL, 2003, p. 9): "Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo".

De acordo com Rizzatto Nunes (2000, p. 88),

[...] a regra do parágrafo único em comento permite o enquadramento de universalidade ou conjunto de pessoas, mesmo que não se constituam em pessoa jurídica. Por exemplo, a massa falida pode configurar na relação de consumo como consumidora ao adquirir produtos, ou então o condomínio, quando contrata serviços.

O parágrafo único enquadra a defesa do consumidor nos denominados interesses coletivos. Para melhor entendimento do tema, devemos sempre interpretá-lo visando a tutela de suas pretensões conforme estabelecido no artigo 81 do CDC.

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum. (BRASIL, 2003, p. 41/42)

Vejamos a distinção feita por Maria Antonieta Zanardo Donato (1994, p. 167) entre a figura dos direitos difusos e coletivos:

De todo modo está praticamente encaminhado um critério de discriminação entre as duas figuras, no sentido de considerar-se difuso aquele que atinge número indeterminado de pessoas, ligadas por relação meramente factual, enquanto que seriam coletivos aqueloutros interesses pertencentes a um grupo ou categoria de pessoas determináveis, ligadas por uma mesma relação.

A mesma autora (1994, p. 175) salienta ainda que:

Será, pois, à partir do parágrafo único do art. 2º do CDC, que a proteção a todos os direitos que emanam das normas consignadas no CDC serão tutelados de forma coletiva, quer seja a pretensão a ser defendida caracterizada como difusa, coletiva ou individual homogênea.

Toshio Mukai (In BENJAMIN et. al, 1991, p. 8) chama a atenção para determinado ponto: "Note-se que a norma processual não obriga a existência de vínculos entre as pessoas que compõem a coletividade, por isso que devem ser indeterminados, no que também a Lei se coaduna com o conceito doutrinário de interesse difuso".

De acordo com José Geraldo Brito Filomeno (In GRINOVER et. al, 2001, p. 34-35, grifos do autor),

[...] o que se tem em mira no parágrafo único do art. 2º do Código do Consumidor é a universalidade, conjunto de consumidores de produtos e serviços, ou mesmo grupo, classe ou categoria deles, e desde que relacionados a um determinado produto ou serviço, perspectiva essa extremamente relevante e realista porquanto natural que se previna, por exemplo, o consumo de produtos ou serviços perigosos ou então nocivos, beneficiando-se assim, abstratamente, as referidas universalidades e categorias de potenciais consumidores. Ou, então, se já provocado o dano efetivo pelo consumo de tais produtos ou serviços, o que se pretende é conferir a universalidade ou grupo de consumidores os devidos instrumentos jurídicos-processuais para que possam obter a justa e mais completa possível reparação dos responsáveis[...]

Isso mostra que, ao conceituar consumidor, o legislador tentou abranger o maior número de pessoas que possa se ver lesado pelo fornecedor, para que todos tivessem garantias de ver reparados seus direitos.

1.3.1.2 As vítimas do evento

O Código de Defesa do Consumidor (BRASIL, 2003, p.16), por meio de seu artigo 17, traz um novo conceito de consumidor, vejamos: "Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento".

Esse é um conceito especial que visa proteger o consumidor dos acidentes de consumo, e a boa doutrina é clara ao salientar que:

Para fins de tutela contra os acidentes de consumo, consumidor é qualquer vítima, mesmo que jamais tenha contratado ou sequer conheça o sujeito responsável. É a regra do direito comparado. O Código de Defesa do Consumidor a acolhe. [...] Protege-se não só o consumidor direto, aquele que adquiriu o produto ou serviço, como ainda qualquer outra pessoa afetada pelo bem de consumo. Aí se inclui até o bystander, ou seja, o mero espectador que, casualmente, é atingido pelo defeito (MUKAI in BENJAMIN et. al, 1991, p. 80-81).

Num mesmo sentido, Maria Antonieta Zanardo Donato (1994, p. 195) leciona:

Mostra-se suficiente que a vítima, para que seja equiparada ao consumidor, tenha sido atingida em sua esfera jurídica pelos efeitos do acidente de consumo, interessado a perquirição que ora se almeja, o conhecimento de que a pessoa foi atingida em sua incolumidade físico-psíquica ou em sua incolumidade econômica.

De acordo com a doutrina majoritária, a destinação final é irrelevante no caso dos acidentes de consumo, já que o artigo não impõe essa restrição ao falar em "vitimas do evento", devendo então considerarmos todas aquelas que sofreram um acidente de consumo (MUKAI in BENJAMIN et. al, 1991, p. 81).

1.3.1.3 Os expostos às práticas comerciais e contratuais

Para completar o conceito de consumidor, o artigo 29 do Código de Defesa do Consumidor (BRASIL, 2003, p.22) fala sobre o conceito de consumidor equiparado, que é utilizado para todas as práticas comerciais e contratuais, a saber: "Art. 29. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas".

Com isso, fica evidente que não só aqueles que contrataram um determinado produto ou serviço estão resguardados pelo diploma legal, mas toda a coletividade de pessoas, bastando estarem expostas a tal situação para fins de proteção.

Cláudia Lima Marques (1995, p. 112, grifo da autora) ensina:

O art. 29 supera, portanto, os estritos limites da definição jurídica de consumidor para imprimir uma definição de política-legislativa! Parece-nos que, para harmonizar os interesses presentes no mercado de consumo, para reprimir eficazmente os abusos do poder econômico, para proteger os interesses econômicos dos consumidores-finais, o legislador concedeu um poderoso instrumento nas mãos daquelas pessoas (mesmo agentes econômicos) expostas às práticas abusivas. Estas, mesmo não sendo "consumidores stricto sensu", poderão utilizar das normas especiais do CDC, de seus princípios, de sua ética de responsabilidade social no mercado, de sua nova ordem pública, para combater as práticas comerciais abusivas!

Interessante a colocação de Rizzatto Nunes (2000, p. 89) a respeito do tema, quando fala que o artigo 29 não trata apenas de uma equiparação eventual, mas sim de uma norma, em que, havendo prática comercial, já se considera estar toda a coletividade exposta a ela, mesmo que não se identifique nenhum consumidor concretamente que almeje protestar contra tal prática.

Para melhor expressar o modo como o consumidor pode ser lesado, mesmo sem haver adquirido qualquer produto ou serviço, segue a seguinte doutrina:

Com o art. 29, o legislador optou em inserir no próprio código regulamentação a uma série de fenômenos do mercado que necessitam, senão fosse assim, de regulamentação específica. Para se entender, a contento, a extensão do art. 29, pode-se trabalhar sobre a publicidade, onde não há necessidade de qualquer aquisição ou utilização do produto ou serviço para ser acionado o código, bastando, para isso, que a própria publicidade se revista como enganosa, criando a potencialidade de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre o produto ou serviço. Da mesma forma que o disposto no parágrafo único do artigo 2º, as pessoas do art. 29 podem ser determinadas ou não (PEREIRA, 2003, p. 96).

Assim, o código tratou da proteção de todos quantos pudessem ser atingidos pelas relações de consumo, mesmo que dela não houvessem participado.

1.4.Conceito de fornecedor

O Código de Defesa do Consumidor (BRASIL, 2003, p. 9) também estabelece o que vem a ser fornecedor.

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Ao apreciar tal conceituação, José Geraldo Brito Filomeno (1999, p. 42) observa

[...] são compreendidos todos quantos propiciem a oferta de bens e serviços no mercado de consumo, de molde a tender às suas necessidades, pouco importando a que título, tendo relevância a distinção apenas, como se verá, quando se cuidar de responsabilidade de cada ‘fornecedor’ em caso de danos a consumidores, ou então para os próprios fornecedores na via regressiva e em cadeia das mesmas responsabilidades, eis que vital a solidariedade para a obtenção efetiva da proteção que se almeja daqueles mesmos consumidores.

Analisando o tema, e por toda a amplitude do conceito de fornecedor, fica mais fácil entendermos a grandeza desse conceito, ao definirmos as pessoas que não estão englobadas por ele. Seriam aqueles que desempenham negociações típicas de direito privado, sem profissionalidade, por acerto direto, e sem qualquer influência da publicidade como a compra e venda de imóvel entre pessoas físicas particulares (ALMEIDA, 2000, p. 40-41).

Eduardo Gabriel Saad (1999, p. 71), ao tratar dessa questão, assevera que:

A análise do conceito legal de fornecedor deixa patente sua abrangência e amplitude. É fornecedor (ou vendedor): a) o industrial que fabrica o produto; b) o comerciante que o põe em circulação e vende-o a clientela, mas só assumindo determinados riscos que logo mais serão estudados; c) aquele que exporta para outros países nossa produção ou aquele que importa do estrangeiro bens para vendê-los no território nacional; d) o prestador de serviços.

A doutrina tem trabalhado com três categorias de fornecedores, como alude Denari: a) o fornecedor real, compreendendo o fabricante, o produtor e o construtor; b) o fornecedor presumido, assim entendido o importador de produtos industrializados ou in natura; e c) o fornecedor aparente, ou seja, aquele que apõe seu nome ou sua marca no produto final (PEREIRA, 2003, p. 119).

Destaca-se, ainda, a análise referente ao assunto efetuada por Rizzatto Nunes:

Não há exclusão alguma do tipo de pessoa jurídica, já que o CDC é genérico e busca atingir todo e qualquer modelo. São fornecedores as pessoas jurídicas públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, com sede ou não no País, as sociedades anônimas, as por quota de responsabilidade limitada, as sociedades civis, com ou sem fins lucrativos, as fundações, as sociedades de economia mista, as empresas públicas, as autarquias, os órgãos da administração direta etc (RIZZATTO NUNES, 2000, p. 90).

O artigo traz, também, o que deve ser entendido como produtos e serviços, categorias de objetos de interesse, nas relações de consumo, que serão tratados a seguir.

1.4.1. Produto

Dispõe o § 1º do artigo 3º do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (BRASIL, 2003, p. 10) que "Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial".

Comentando tal conceito, Paulo Valério Dal Pai Moraes e Cláudio Bonatto (2001, p. 94) prelecionam:

A definição legal é bastante clara e auto-explicativa, sendo de salientar-se um dado fundamental, que é a ausência do requisito da remuneração, ao contrário do que ocorre com o serviço, para que o produto seja considerado como objeto de relação jurídica de consumo.

[...]

Assim, as amostras grátis colocadas no mercado de consumo responsabilizarão o agente econômico sempre que vierem a causar danos aos consumidores ou pessoas a eles equiparadas, nos chamados acidentes de consumo, previstos a partir do artigo 12 até o 17, inclusive, assunto este que será abordado posteriormente.

José Geraldo Brito Filomeno (In GRINOVER et. al, 2001, p. 44) afirma que "[...] até para efeitos práticos, dir-se-ia que, para fins do Código de Defesa do Consumidor, produto (entenda-se "bens") é qualquer objeto de interesse em dada relação de consumo, e destinado a satisfazer uma necessidade do adquirente, como destinatário final."

1.4.2. Serviço

O artigo 3º do CDC (BRASIL, 2003, p. 10), em seu § 2º, trata do conceito de serviços e dispõe: "Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista".

O conceito trazido pelo código deixa claro necessitar a prestação de serviços de remuneração. Sob tal obrigatoriedade, vale citar a seguinte lição de João Batista de Almeida (2003, p. 42) a respeito do tema:

[...] é importante ter sempre em mente que tal prestação será remunerada e não subordinada a vínculo trabalhista. Sendo gratuita, como ocorre, p. ex., com atos de camaradagem e os decorrentes de parentesco e vizinhança, os conhecidos favores, não será serviço a que a lei empresta tutela. Do mesmo modo, se o serviço é prestado por força de contrato de trabalho, mediante vínculo de subordinação e dependência econômica, estará fora da definição de serviço, tal como definido em lei, e, por isso mesmo, submetido à legislação pertinente (CLT).

Porém, se o serviço praticado tiver apenas aparência de gratuito, deve sim ser considerado parte das relações de consumo.

Cláudio Bonatto e Paulo Valério Dal Pae Moraes (2001, p. 97), comentando a respeito da necessidade de remuneração, acrescentam:

Esta, por sua vez, pode ser realizada de maneira direta ou indireta, vindo à tona, então, todas aquelas situações já aventadas anteriormente, quando o fornecedor realiza atos promocionais, aparentemente gratuitos, com objetivo de atrair clientela.

Por isso, é importante que, casuisticamente, seja feita a verificação relativamente a este aspecto, pois são múltiplas e variadas as maneiras de cobrar indiretamente, que o mercado de consumo moderno costuma criar.

Com isso, vê-se ter o Código englobado, no conceito de serviços, todos quantos forem prestados mediante remuneração, estando ela explícita ou implícita.

1.5. Princípios gerais trazidos pelo Código de Defesa do Consumidor

Os princípios básicos trazidos pelo Código (BRASIL, 2003, p. 10-11, grifo nosso) estão estatuídos no artigo 4º, quais sejam:

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

II - ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor:

a) por iniciativa direta;

b) por incentivos à criação e desenvolvimento de associações representativas;

c) pela presença do Estado no mercado de consumo;

d) pela garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho.

III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

IV - educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo;

V - incentivo à criação pelos fornecedores de meios eficientes de controle de qualidade e segurança de produtos e serviços, assim como de mecanismos alternativos de solução de conflitos de consumo;

VI - coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização indevida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais e signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumidores;

VII - racionalização e melhoria dos serviços públicos;

VIII - estudo constante das modificações do mercado de consumo.

Mesmo, em se tratando de normas programáticas, os princípios são a base de todo ordenamento jurídico e, como bem salientam Cláudio Bonatto e Paulo Valério Dal Pae Moraes (2001, p. 28),

[...] os princípios exercem uma função básica, qual seja a de serem os padrões teleológicos do sistema, com base nos quais poderá ser obtido o melhor significado das regras, como peças integrantes de uma engrenagem jurídica que é posta em ação pelas diretrizes maiores que dão movimento ao todo.

Para Arruda Alvim (1995, p. 42-43), pretende-se, com o artigo 4º,

[...] ter um alcance substancialmente mais longo do que apenas o regramento dos preceitos que norteiam o presente Código. Colima, em verdade, estabelecer parâmetros que devem nortear todo e qualquer ato de governo, seja de âmbito legislativo, como executivo e judiciário,quando do tratamento das "relações de consumo", expressão evidentemente mais ampla do que apenas "defesa do consumidor". Desta forma, parece pretender este art. 4º, desde já, estabelecer limitações a qualquer ato governamental futuro, que possa ser infringente nas relações de consumo – salvo ato legislativo federal, não inconstitucional, por estar limitado pelo art. 170, V, da Constituição Federal de 1988 – de modo a que fique restrito aos objetivos e princípios estabelecidos neste Capítulo II do Código do Consumidor, que compreende os princípios da Política Nacional das Relações de Consumo (art. 4º) e os instrumentos de sua execução (art. 5º).

Alguns destes princípios merecem especial destaque em relação à responsabilidade civil nas relações de consumo, como, a boa-fé objetiva, a vulnerabilidade, a transparência e a garantia de adequação.

1.5.1. Boa-fé objetiva

Princípio trazido pelo Código por meio do inciso III do artigo 4º, a boa-fé de que trata a defesa do consumidor é a objetiva e, de acordo com Roberto Senise Lisboa (2001, p. 104),

O princípio da boa-fé objetiva, como dever de conduta que razoavelmente se espera da pessoa em uma relação jurídica, impede a conduta abusiva e é contrário a não observância das normas jurídicas ou da equidade. A boa-fé objetiva é, nesses termos, o princípio orientador das condutas sociais estreitamente ligado ao princípio da razoabilidade, dele facilmente se deduzindo o comportamento que as partes devem pautar.

A boa-fé é fundada nos deveres de lealdade e confiança entre as partes e está estritamente ligado, à função social do contrato e à responsabilidade civil objetiva, que será objeto do capítulo final desta obra.

Cláudia Lima Marques (1995, p. 79-80) assim se manifesta:

Boa-fé objetiva significa, portanto, uma atuação "refletida", uma atuação refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento do objetivo contratual e a realização dos interesses das partes.

A verificação da presença da boa-fé ou não nos negócios jurídicos caberá aos juízes pela análise do caso concreto, já que o legislador não tem como definir em quais situações a pessoa está agindo ou não com boa-fé (TRAJANO, 2004, não paginado).

Como bem salienta Rizzatto Nunes (2000, p. 108), a função do princípio da boa fé é

[ ...] viabilizar os ditames constitucionais da ordem econômica, compatibilizando interesses aparentemente contraditórios, como a proteção do consumidor e o desenvolvimento econômico e tecnológico. Com isso, tem-se que a boa-fé não serve somente para a defesa do débil, mas sim como fundamento para orientar a interpretação garantidora da ordem econômica [ ...]

Trata-se de princípio que deve estar implícito em todas as relações jurídicas e, no caso específico das relações de consumo, deve ser analisada partindo-se do ponto que as partes devem agir da forma que legitimamente se espera na viabilização de seus interesses, e de maneira que não se lesem os direitos da outra parte ou de terceiros.

1.5.2. Vulnerabilidade

No Direito do Consumidor, a vulnerabilidade, disposta no artigo 4º, inciso I, da Lei nº 8.078/90 é presumida e conseqüência das práticas e cláusulas abusivas impostas pelos fornecedores que não observam os princípios das relações de consumo. Neste sentido:

Considera-se que o consumidor é a parte vulnerável na relação jurídica com o fornecedor pois sujeita-se às práticas do fornecimento de produtos e serviços no mercado de consumo (art. 4.º, I, da Lei 8.078/90). E, por essa razão, estabelece-se a regra da responsabilidade objetiva do fornecedor, que deve arcar com a reparação do dano patrimonial ou moral pelo simples fato de explorar uma atividade de risco no mercado de consumo (LISBOA, 2001, p. 83).

O mesmo autor (2001, p. 86) ainda salienta que, para ser considerado vulnerável,

[...] pouco importa a situação econômica ou classe social do consumidor, bem como seu grau de instrução ou mesmo se a aquisição do produto ou do serviço se deu para o exercício da atividade profissional do consumidor, ou não. A vulnerabilidade é qualidade indissociável do destinatário final do produto ou serviço [...]. É adjetivo que se encontra sempre ligado ao consumidor no sistema jurídico brasileiro, sem que qualquer ressalva tenha sido expressamente feita pelo legislador.

Arruda Alvim (1995, p. 45) salienta que a vulnerabilidade não admite prova em contrário, por não se tratar de mera presunção legal, é uma qualidade indissociável de todos os consumidores diante de seu conceito legal. Distingue ainda vulnerabilidade de hipossuficiência:

A vulnerabilidade do consumidor não se confunde com hipossuficiência que é característica restrita aos consumidores que além de presumivelmente vulneráveis, vêem-se agravados nessa situação por sua individual condição de carência cultural, material ou, como ocorre com freqüência, ambas.

Note-se que toda essa proteção, trazida pelo diploma legal em estudo, advém do histórico de violação de direitos sofridos até então pelos consumidores que não dispunham de meios adequados para contratar nas mesmas condições dos fornecedores, detentores do poder econômico.

Além da maior capacidade econômica do fornecedor, temos que ter em mente que

[ ...] quando se fala em "escolha" do consumidor, ela já nasce reduzida. O consumidor só pode optar por aquilo que existe e foi oferecido no mercado. E essa oferta foi decidida unilateralmente pelo fornecedor, visando seus interesses, que são, por evidente, a obtenção de lucro (RIZZATTO NUNES, 2000, p. 106).

Para Cláudia Lima Marques (1995, p. 105-107), são três os tipos de vulnerabilidade: a técnica que se caracteriza pela falta de conhecimentos específicos sobre o que se está adquirindo, podendo ser facilmente enganado em relação às características e utilidade, a jurídica ou científica onde faltam conhecimentos jurídicos, econômicos e contábeis ao consumidor, e a fática ou sócio-econômica individualizada pela posição de superioridade e monopólio do fornecedor.

Conclui-se, então, que todo consumidor pode ser considerado vulnerável, já que deve se sujeitar às práticas impostas pelos fornecedores, ficando à mercê destes.

1.5.3. Transparência das relações de consumo

O consumidor é alvo fácil no mercado de consumo, merecendo, portanto, ser tratado de forma a ter acesso a todos os meios claros de informação a respeito dos produtos e serviços que pretenda adquirir, a fim de que possa formar uma opinião consciente sobre o negócio que irá realizar ao comprar determinado bem ou serviço disponível no mercado de consumo.

Fábio Ulhoa Coelho (1994, p. 135) esclarece: "Para a ordem jurídica, o acesso à informação é pressuposto inafastável para o consumidor realizar suas escolhas, ao qual responde o fornecedor no sentido de franqueá-lo o mais largamente possível".

A transparência, nas relações de consumo, é imprescindível e somente pode ser atingida pela observância de medidas que importem no fornecimento de informações verdadeiras precisas e objetivas ao consumidor bem como ao fornecedor, por parte do destinatário final do produto ou serviço (LISBOA, 2001, p. 101).

Cláudia Lima Marques (1995, p. 206) define transparência como "informação clara e correta sobre o produto a ser vendido, sobre o contrato a ser firmado, significa lealdade e respeito nas relações entre fornecedor e consumidor, mesmo na fase pré-contratual, isto é, na fase negocial dos contratos de consumo".

O princípio da transparência se exprime pela obrigação de o fornecedor dar ao consumidor a oportunidade de conhecer os produtos e serviços oferecidos, além de gerar obrigação de conhecimento prévio do conteúdo dos contratos. A transparência tem estreita relação com o direito básico à informação (RIZZATTO NUNES, 2000, p. 105).

Para finalizar, destacamos a seguinte conclusão de Cláudia Lima Marques (1995, p. 208, grifos da autora):

Resumindo. Como reflexos do princípio da Transparência temos o novo dever de informar o consumidor, seja através da oferta, clara e correta (leia-se aqui publicidade ou qualquer outra informação suficiente, art. 30) sobre as qualidades do produto e as condições do contrato, sob pena do fornecedor responder pela falha da informação (art. 20), ou ser forçado a cumprir a oferta nos termos em que foi feita (art. 35); seja através do próprio texto do contrato, pois pelo art. 46, o contrato deve ser redigido de maneira clara, em especial os contratos pré-elaborados unilateralmente (art. 54, § 3.º), devendo o fornecedor "dar oportunidade ao consumidor" conhecer o conteúdo das obrigações que assume, sob pena do contrato por decisão judicial não obrigar o consumidor, mesmo se devidamente formalizado.

O princípio da transparência, nas relações de consumo, é complementado pelo direito básico à Informação, que será tratado no capítulo seguinte.

1.5.4. Garantia de adequação

No artigo 4º, inciso II, alínea "d", e inciso V da Lei nº 8.078/90, é trazido o princípio da garantia de adequação que consubstancia a plena qualidade e segurança dos produtos e serviços expostos aos consumidores no mercado de consumo.

Vejamos o que se leciona a respeito:

Deve o poder público proteger o consumidor adotando providências para que os produtos e serviços tenham padrões adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho.

Um produto tem todas essas qualidades quando satisfaz a uma necessidade ou desejo do consumidor. Existe uma perfeita correspondência entre a pretensão do consumidor e as anunciadas virtudes do produto ou do serviço.

No exercício dessa missão, o poder público além da arma da fiscalização e aplicação das normas do Código tem de aparelhar-se para proporcionar a seus agentes o apoio técnico e científico indispensável à exata constatação das características de um produto ou de um serviço de interesse do consumidor (SAAD, 1999, p. 137).

Cláudia Lima Marques (1995, p. 421, grifos da autora) traz importante contribuição ao afirmar que:

[...] o fim último da garantia de adequação instituída pelo CDC é o reequilíbrio da relação de consumo [...]

[...] a garantia no vício por inadequação visa satisfazer os interesses deste, forçando o cumprimento perfeito da prestação (conserto, art. 18, § 1.º, ou a substituição do produto, art. 18, § 1.º, I), ou o reequilíbrio entre as prestações efetuadas (abatimento proporcional do preço, art. 18, § 1.º, III) ou evitar maiores danos ao consumidor e ressarcir os eventualmente já sofridos (através da rescisão contratual, devolução da quantia paga e eventuais perdas e danos, art. 18, §1.º, II) [...].

Mas parece-nos que o fundamento, a origem primeira da garantia legal de adequação não é o contrato de consumo, mas a produção para o consumo, isto é, a participação do fornecedor na cadeia de produção de bens destinados ao consumidor e a confiança que qualquer produto colocado no mercado desperta legitimamente no consumidor, um dever legal, um novo ônus, com base na obrigatória boa-fé do fornecedor no mercado. Seria uma garantia implícita (no sentido literal de implied warranty), garantia natural do produto, garantia que o acompanharia desde seu nascimento, sua fabricação, mas que só poderia ser utilizado pelo consumidor; portanto, só após o contrato de consumo. Essa idéia de garantia como elemento próprio do produto poderia explicar porque todos os fornecedores são responsáveis por ela, e não só aquele que contratou com o consumidor.

A garantia de adequação é dever tanto dos fornecedores de produtos e serviços como do Estado que, de acordo com o próprio código, deve garantir a efetiva proteção dos consumidores. Nesse sentido:

A efetivação desse princípio diz respeito ao binômio segurança/qualidade, o que, em última análise, é o fim ideal colimado por todo sistema protetivo do consumidor, está a cargo do fornecedor que será oficialmente coadjuvado pelo Estado, a quem cabe o dever de fiscalização, que é uma faceta do "princípio do dever governamental" [...] (ARRUDA ALVIM, 1995, p. 47).

O fim que se pretende alcançar com a concretização desse princípio é dar aos consumidores toda a qualidade e segurança que se espera de um produto ou serviço a fim de que possa decidir pela aquisição ou não de acordo com seus interesses com garantia de ressarcimento em casos de vícios.


2. DIREITOS BÁSICOS

Os Direitos Básicos do Consumidor estão anotados no artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor e servem de alicerce para todo direito material que será trazido pelos artigos posteriores.

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

IX - (Vetado);

X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral (BRASIL, 2003, p. 12-13, grifo nosso).

José Geraldo Brito Filomeno (In GRINOVER et. al, 2001, p. 120) afirma ser o art. 6º do Código de Proteção e Defesa do Consumidor:

[...] uma síntese do que o intérprete irá encontrar nos dispositivos de Direito Material e Processual, já à partir do art. 8º, sem falar-se no art. 7º, de que também se cuidará neste passo, e que norteia igualmente o aplicador das normas de proteção e defesa do consumidor, ao tratar das fontes dos direitos do consumidor, fontes tais que igualmente refletem o seu caráter amplo, interdisciplinar e complexo.

A seguir serão abordados os direitos básicos mais relevantes para o estudo em tela.

2.1. Proteção à saúde e a segurança

O código traz a proteção à saúde e segurança dos consumidores como direito básico, no artigo 6º, inciso I, e dedica a primeira seção do Capítulo IV – artigo 8º a 10 – a ele.

Erigido à categoria de direito básico, o direito à proteção da vida, saúde e da segurança dos consumidores encontra-se tutelado em vários artigos do código, não só no que diz respeito à responsabilidade objetiva, estabelecida para a reparação dos danos (art. 12 e 14), mas também no que se refere às responsabilidades administrativa (art. 56) e penal (art. 63 a 65). Situa-se protegido, sobretudo, na própria Constituição da República, em seus arts, 5º, caput, e 196, caput, de modo genérico para todos, sem distinção de qualquer natureza (CARVALHO SILVA, 2002, p. 31).

De acordo com o disposto no artigo 8º CDC, para um produto poder ser exposto no mercado de consumo não deve acarretar riscos à saúde e segurança dos consumidores, com exceção daqueles normais e previsíveis acompanhados das devidas informações a seu respeito.

Entende-se como riscos normais e previsíveis, de acordo com Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin, aqueles em que a periculosidade é inerente (In GRINOVER et. al, 2001, p. 48, grifos do autor), vejamos:

A periculosidade integra a zona da expectativa legítima (periculosidade inerente) com o preenchimento de dois requisitos, um objetivo e outro subjetivo. Em primeiro lugar, exige-se que a existência da periculosidade esteja de acordo com o tipo específico de produto ou serviço (critério objetivo). Em segundo lugar, o consumidor deve estar total e perfeitamente apto a prevê-la, ou seja, o risco não o surpreende (critério subjetivo). Presentes esses dois requisitos, a periculosidade, embora dotada de capacidade para provocar acidentes de consumo, qualifica-se como inerente e, por isso mesmo, recebe tratamento benevolente do direito. Vale dizer: inexiste vício de qualidade por insegurança.

Caso um produto defeituoso acarrete dano à saúde ou à segurança dos consumidores deverá o fornecedor ser responsabilizado pelo fato do produto ou serviço ensejar a justa reparação.

E, de acordo com Zelmo Denari (In GRINOVER et. al, 2001, p. 143-144), a maior parte dos acidentes de consumo são causados pelo fornecimento de produtos ou serviços nocivos à saúde e segurança dos consumidores sujeito à sanção civil – responsabilidade do fornecedor em relação ao consumidor –, sanção administrativa – perante a administração pública –, e sanção penal – perante a justiça pública pela prática de ilícitos penais.

[...] a "segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos" (art. 6, I) abrange não somente os riscos contra a vida, saúde e integridade física do consumidor, mas diz também respeito ao patrimônio dos consumidores, ensejando-se afirmar que o conceito de direito à segurança possui abrangência mais ampla do que os conceitos de direito à vida ou direito à incolumidade física ou mesmo pisíquica, pois engloba além desses elementos pessoais conteúdo patrimonial (ARRUDA ALVIM, 1995, p. 61).

O fornecedor não pode colocar no mercado de consumo um produto ou serviço com alto grau de periculosidade – art. 10, caput, CDC – e, se após o ingresso no mercado tiver conhecimento de sua periculosidade, deverá efetuar o chamado Recall – artigo 10, § 1º, CDC – a fim de impedir que consumidores expostos ao produto ou serviço sofram danos após sua comercialização.

O mesmo dispositivo ainda determina:

[...] que o fornecedor, além de alertar os consumidores, através de anúncios publicitários, comunique o fato, imediatamente, às autoridades competentes.

Essa última prescrição normativa é de extrema utilidade. Tratando-se de produtos defeituosos sujeitos à vigilância sanitária ou qualquer outra forma de controle e fiscalização governamental, cumpre a autoridade administrativa aplicar as sanções administrativas previstas no Código de Defesa do Consumidor, podendo consistir na apreensão ou inutilização do produto, na cassação do registro, na proibição de fabricação, suspensão do fornecimento etc (DENARI in GRINOVER et. al, 2001, p. 152).

A respeito do tema Rizzatto Nunes (2000, p. 142-143) faz importante consideração sobre a questão da responsabilização do fornecedor no caso de o consumidor não ser encontrado:

Como a responsabilidade do fornecedor é objetiva, não se tem que argüir de sua atitude correta ou não em fazer o recall. Havendo dano, o fornecedor responde pela incidência das regras instituídas nos arts. 12 a 14. E, como lá está estabelecido, não há, no caso, excludente possível da responsabilização. A que mais se aproxima é a da demonstração da culpa exclusiva do consumidor (art. 12, §3º, III, e 14 §3º, II), e na hipótese ela não se verifica. Quando muito poder-se-ia falar em culpa concorrente do consumidor, caso ele receba o chamado e o negligencie. Mas, nesse caso, continua sendo o fornecedor sendo integralmente responsável.

Resumindo: para haver a efetiva proteção à saúde e segurança dos consumidores, é necessário que esses recebam a devida informação sobre os riscos de um produto ou serviço, que eles não sejam expostos a produtos perigosos ou nocivos exceto os inerentes, e ainda, no caso de exposição, ver sua retirada imediata do mercado de consumo com direito à indenização por eventuais danos sofridos.

2.2.Educação para o consumo, livre escolha e igualdade nas contratações

O direito à educação para o consumo, liberdade de escolha e igualdade, nas contratações, está disposto no artigo 6º, inciso II, do CDC e encontra-se estritamente ligado ao princípio da vulnerabilidade e isonomia tratados no primeiro capítulo do presente trabalho.

José Geraldo Brito Filomeno (2001, p. 124-125, grifos do autor) doutrina que a educação do consumidor:

[...] não tem apenas a finalidade de alertar os consumidores com relação a eventuais perigos representados à sua saúde, por exemplo, na aquisição de alimentos que podem indicar sua deteriorização, mas também para que se garanta ao consumidor liberdade de escolha e a almejada igualdade de contratação, informando-o previamente das condições contratuais, e para que ele não seja surpreendido posteriormente com alguma cláusula potestativa ou abusiva.

Com a educação para o consumo, objetiva-se preparar o consumidor para exercer seu direito de liberdade de escolha, pois, com conhecimentos acerca da fruição adequada dos bens e serviços, poderá escolher entre os vários produtos e serviços colocados no mercado de consumo (ALMEIDA, 2000, p. 49).

Rizzatto Nunes (2000, p. 113), ao comentar o artigo 6º, no que diz respeito à igualdade nas contratações, explana:

Pela norma instituída no inciso II em comento fica estabelecido que o fornecedor não pode diferenciar os consumidores entre si. Ele está obrigado a fornecer as mesmas condições a todos os consumidores. Admitir-se-á apenas que se estabeleçam certos privilégios aos consumidores que necessitam de proteção especial, como, por exemplo, idosos, gestantes e crianças, exatamente em respeito à aplicação concreta do princípio da isonomia.

O Estado deve auxiliar o consumidor nas relações de consumo, educando-o para que identifique e se habitue com os processos corretos de utilização dos produtos e serviços e com isso utilize adequadamente sua liberdade de escolha (SAAD, 1999, p. 160-161).

Cumpre destacar o ensinamento de Roberto Senize Lisboa (2001, p. 92):

A educação do consumidor constitui-se em necessidade básica da aprendizagem do sujeito de direito pois todos podem se encontrar, em dada relação jurídica, como destinatários finais de produtos e serviços. Para que o consumidor tenha uma melhor noção do alcance da medida a ser adotada em determinado caso concreto e obtenha o acesso adequado à justiça, faz-se imprescindível estimulá-lo a conhecer a natureza e os diversos mecanismos de consumo, bem como os direitos que ele possui diante da legislação vigente. E não é só. Deve ser melhor educado sobre os elementos que lhe poderão proporcionar a satisfação dos seus interesses.

O grau de liberdade de escolha do consumidor vai depender da existência de concorrência entre os fornecedores, garantida pela Constituição Federal pelo artigo 173, § 4º, e do conhecimento do produto ou serviço decorrente da educação e divulgação para o consumo. Assim o consumidor poderá fazer uma escolha consciente e não baseada no impulso estimulado pelos fornecedores por meio dos mecanismos de oferta e publicidade (CARVALHO SILVA, 2002, p. 32).

2.3.Informação

O direito de ser informado nasce na Constituição Federal com o artigo 5º, inciso XXXIII, e é ampliado pelo Código de Defesa do Consumidor.

Basicamente, o texto magno estabelece o dever de informar que têm os órgãos públicos. No que tange ao dever de informar das pessoas em geral e das pessoas jurídicas com natureza jurídica privada, é o Código de Defesa do Consumidor que estabelece tal obrigatoriedade ao fornecedor. Tento em vista que a lei n. 8.078/90 nasce, como vimos, das determinações constitucionais que obrigam a que seja feita a defesa do consumidor, implantada em meio a uma série de princípios, todos interpretados e aplicáveis de forma harmônica, não resta dúvida de que o dever de informar só podia ser imposto ao fornecedor (RIZZATTO NUNES, 2000, p. 50).

O direito à informação trazido pelo Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 6º, inciso III, é composto por uma adequada informação em língua portuguesa, com especificação da quantidade, das características, da composição, da qualidade, do preço, dos riscos sobre os diversos produtos e serviços expostos no mercado pelo fornecedor, dentre outros pontos relevantes para que ele possa ter assegurada sua liberdade de escolha de acordo com suas necessidades reais.

O artigo 31 do CDC também dispõe sobre a informação, lecionando a respeito Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (In GRINOVER et. al, 2001, p. 245) diz que:

[...] O art. 31 aplica-se, precipuamente, à oferta não publicitária. Cuida do dever de informar a cargo do fornecedor. O Código, como se sabe, dá grande ênfase ao aspecto preventivo da proteção do consumidor. E um dos mecanismos mais eficientes de prevenção é exatamente a informação preambular, a comunicação pré-contratual.

Não é qualquer modalidade informativa que se presta para atender os ditames do Código. A informação deve ser correta (verdadeira), clara (de fácil entendimento), precisa (sem prolixidade), ostensiva (de fácil percepção) e em língua portuguesa.

"Trata-se, repita-se, do dever de informar bem o público sobre todas as características importantes de produtos e serviços, para que aquele possa adquirir produtos, ou contratar serviços, sabendo exatamente o que deles poderá esperar" (FILOMENO in GRINOVER et. al, 2001, p. 125, grifo do autor).

João Batista de Almeida (2000, p. 106) salienta que:

Sendo a oferta o momento antecedente da conclusão do ato de consumo, deve ser precisa e transparente o suficiente para que o consumidor, devidamente informado, possa exercer seu direito de livre escolha. Assim as informações devem ser verdadeiras e corretas, guardando correlação fática com as características do produto e serviço, redigidas em linguagem clara, lançadas em lugar e forma visíveis. Além disso, devem ser escritas em língua portuguesa.. Devem incidir sobre os elementos que interessam ao consumidor para fazer a sua escolha [...].

A informação transmitida ao consumidor vincula o fornecedor e permite a ele exigir o cumprimento do que é anunciado, como proclama Cláudia Lima Marques (1995, p. 211, grifos da autora):

O art. 30, ao ampliar a noção de oferta e ao afirmar que as informações dadas integram o futuro contrato, revoluciona a idéia de invitatio ad offerendum. Agora qualquer informação ou publicidade veiculada que precisar, por exemplo, os elementos essenciais da compra e venda: res (objeto) e pretium (preço), será considerada como uma oferta vinculante, faltando apenas a aceitação (consensus) do consumidor ou consumidores em número indeterminado.

No caso específico das Agências de Turismo, conforme ensina Paulo Sérgio Feuz (2003, p. 77-85), deve ser informado, no pacote turístico, o hotel e, no caso de possibilidade de similares, quais se enquadram nessa modalidade, a fim de não agredir a expectativa do consumidor, o critério subjetivo impõe risco na relação consumerista. Outro dado essencial é o clima, na época do pacote, para que o consumidor não seja surpreendido pela falta de acesso a determinados atrativos turísticos em virtude dos fatores climáticos. Essas informações são importantes para o convencimento do consumidor e geram uma expectativa em relação à viagem que vinculam o fornecedor à oferta.

2.4.Publicidade enganosa e abusiva

A proteção contra a publicidade enganosa e abusiva é trazida, como direito básico, pelo artigo 6º, inciso IV, do Código Protetivo.

Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva (2002, p. 34) pondera:

A proteção do CDC contra publicidade enganosa e abusiva tem por fundamento a existência de um sistema industrial que se volta para a persuasão do consumidor, gerando necessidades e estimulando a demanda. A produção, que antes decorria da necessidade do comprador, passa hoje a determinar o consumo.

Esse direito está estritamente ligado ao direito à informação, pois a veiculação da publicidade deve ser realizada de maneira que o consumidor identifique-a como tal com facilidade, a fim de ver-se protegido de possíveis informações enganosas ou abusivas por parte do fornecedor interessado em sua oferta.

O anúncio publicitário não pode faltar com a verdade daquilo que anuncia, de forma alguma, quer seja por afirmação quer por omissão. Nem mesmo manipulando frases, sons e imagens para de maneira confusa ou ambígua iludir o destinatário do anúncio (RIZZATTO NUNES, 2000, p.58).

A publicidade pode ser enganosa por omissão ou comissão, e Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (In GRINOVER et. al, 2001, p. 288) preleciona a respeito:

Em linhas gerais, o novo sistema pode assim ser resumido: não se exige prova de enganosidade real, bastando a mera enganosidade potencial ("capacidade de indução ao erro"), é irrelevante a boa-fé do anunciante, não tendo importância o seu estado mental, uma vez que a enganosidade, para fins preventivos e reparatórios, é apreciada objetivamente; alegações ambíguas, parcialmente verdadeiras ou até literalmente verdadeiras podem ser enganosas; o silêncio – como ausência de informação positiva – pode ser enganoso; uma prática pode ser considerada normal e corriqueira para um determinado grupo de fornecedores e, nem por isso, deixar de ser enganosa; o standard de enganosidade não é fixo, variando de categoria a categoria de consumidores (por exemplo, crianças, idosos, doentes, rurícolas e indígenas são particularmente protegidos).

Quando o Código de Defesa do Consumidor fala em induzir em erro, significa aquele erro substancial, sem o qual o consumidor não viria a adquirir o produto ou serviço, relativo às qualidades essenciais (ARRUDA ALVIM, 1995, p. 207).

Bem explana Cláudia Lima Marques (1995, p. 260):

Note-se que o artigo 37 do CDC não se preocupa com a vontade daquele que faz veicular a mensagem publicitária. Não perquire da sua culpa ou dolo, proíbe apenas o resultado: que a publicidade induza o consumidor a formar esta falsa noção da realidade. Basta que a informação publicitária, por ser falsa, inteira ou parcialmente, ou por omitir dados importantes, leve o consumidor ao erro, para ser caracterizada como publicidade proibida, publicidade enganosa.

Nos contratos de turismo, a publicidade mais praticada pelas más empresas é a enganosa por omissão, deixando de informar característica essencial do serviço turístico, levando o consumidor a adquirir aquilo que não existe (FEUZ, 2003, p. 94).

A respeito da publicidade dos contratos de turismo, Rizzatto Nunes (2000, p. 432-433) afirma que

A propaganda de turismo, viagens, excursões deverá ser concebida de forma que se evitem desapontamentos para o consumidor. Portanto, no caso particular de excursões, o material publicitário – sejam anúncios, sejam folhetos e prospectos – deve fornecer dados precisos no tocante aos seguintes aspectos:

a) a firma ou organização responsável pela excursão;

b) o meio de transporte, nome da empresa transportadora, tipo ou classe de avião, dados sobre o navio ou outro meio de transporte;

c) destinos e itinerários;

d) a duração exata da excursão e o tempo de permanência em cada localidade;

e) o tipo e o padrão das acomodações de hotel e as refeições porventura incluídas no preço – pacote;

f) quaisquer benefícios incluídos, tais como passeios, ingressos de museus etc.;

g) o preço total da excursão – pelo menos em seus limites máximo e mínimo -, com indicação precisa do que está ou não incluído (translados de e para aeroportos e hotéis, carregadores, gorjetas etc.);

h) condições de cancelamento.

A publicidade abusiva, de acordo com o artigo 37, § 2º, do CDC, é aquela discriminatória, que incite a violência, o medo, induza a criança a comportamento prejudicial, dentre outros.

João Batista de Almeida (2000, p. 117) explica que a publicidade abusiva é distorcida, deturpada e violadora de valores éticos que a sociedade deve conservar e ainda corrompe a vontade do consumidor que pode ser levado a se comportar de forma prejudicial à sua saúde e segurança.

Para Fábio Ulhoa Coelho (1991, p. 161),

[...] em relação à abusiva, a motivação dirigida ao consumidor é obtida não através da apresentação como verdadeiras as idéias falsas, mas basicamente, pelo desrespeito aos valores incorporados pelas pessoas, em geral. A publicidade é um instrumento privilegiado de formação de comportamentos. Através dela, é possível criar, reforçar, transformar ou extinguir os valores e concepções dominantes na sociedade. Aliás, ela objetiva precisamente levar o destinatário da mensagem a uma mudança comportamental de que resulte pelo menos a simpatia para com o produto ou serviço promovido.

Enfim, o consumidor deve ser devidamente protegido da publicidade, seja ela enganosa – com potencialidade de induzir em erro – ou abusiva – quando atente aos valores humanos –, bem como de quaisquer outras práticas comerciais coercitivas ou desleais.

2.5. Proteção contratual

A proteção contratual se encontra no artigo 6º, incisos IV, segunda parte, e V do CDC e visa assegurar ao consumidor vulnerável a devida proteção contra métodos comerciais coercitivos ou desleais bem como contra práticas e cláusulas abusivas. Deve-se, então, dar maleabilidade ao pacta sunt servanda, interpretando as cláusulas contratuais de maneira a não prejudicar o consumidor, nem onerá-lo excessivamente.

Claudia Lima Marques (1995, p. 286) bem explana a respeito do tema:

Face a finalidade de proteção especial das normas do CDC, a interpretação dos contratos envolvendo consumidores e fornecedores deve guiar-se por seus princípios, em especial o princípio da boa-fé, da transparência, da proteção da confiança e das expectativas legítimas dos consumidores. Trata-se igualmente, de uma interpretação contextual, que procura o sentido e o alcance da vontade expressa no contrato também em seu contexto negocial, na finalidade normal (standard objetivo) desse tipo de contrato, nas expectativas normais para os consumidores neste tipo de negócio (standard objetivo), considerando igualmente os atos e informações anteriores a conclusão do negócio como juridicamente relevante, formando o "todo" a interpretar, a relação contratual a considerar.

Ainda a respeito da proteção contratual o Código de Defesa do Consumidor dedica o capítulo VI, composto pelos artigos. 46 a 54.

Especial destaque merece o artigo 51 do CDC, que declara nulas de pleno direito determinadas cláusulas contratuais abusivas. Sobre o tema, Nelson Nery Júnior (In GRINOVER et. al, 2001, p. 463) leciona:

Um dos direitos básicos do consumidor é o da proteção contra cláusulas abusivas impostas no fornecimento de produtos ou serviços (relação de consumo), conforme disposto no art. 6º, nº IV, do Código. O CDC enumerou uma série de cláusulas consideradas abusivas, dando-lhes o regime da nulidade de pleno direito (art. 51). Esse rol não é exaustivo, podendo o juiz, diante das circunstâncias do caso concreto, entender ser abusiva e, portanto, nula, determinada cláusula contratual.

Arruda Alvim (1995, p. 64-68) exemplifica as formas de proteção contratual trazidas pelo código: a) direito de alterar as cláusulas que registrem prestações desproporcionais; b) aplicação da teoria da imprevisão, rebus sic standibus, em caso de superveniência de onerosidade excessiva; c) garantia de adequação legalmente instituída, sendo a garantia contratual complementar a legal; d) informação e orçamento vinculam o fornecedor; e) cláusulas interpretadas em favor do consumidor, que não será obrigado se não tiver pleno conhecimento de seus termos; f) faculdade de desistência do negócio pelo prazo de 7 dias nas compras realizadas fora do estabelecimento comercial; e g) nulidade das cláusulas abusivas.

De acordo com entendimento de Alberto do Amaral Júnior (in BENJAMIN et. al, 1991, p. 193),

O controle das cláusulas contratuais abusivas, tal como instituído pelo Código de Defesa do Consumidor, em absoluto se choca com o princípio da liberdade contratual, pela simples razão de que este princípio não pode ser invocado pela parte que se encontra em condições de exercer o monopólio de produção das cláusulas contratuais, a ponto de tornar difícil ou mesmo impossível a liberdade contratual do aderente.

É de extrema importância deixar claro que a proteção contratual exercida pela nulidade de cláusulas abusivas não extingue o contrato, que continua em vigência a não ser que acarrete ônus excessivo às partes.

O princípio do inciso V do art. 6º volta como norma de declaração de nulidade da cláusula desproporcional no art. 51 (inciso IV e § 1º), mas a nulidade não significa que o contrato será extinto. Como o inciso V em comento garante a modificação, pelo princípio da conservação do contrato o magistrado que reconhecer a nulidade deve fazer a integração das demais cláusulas e do sentido estabelecido no contrato, em função do seu objetivo, no esforço de mantê-lo em vigor. [...] o princípio da conservação, que é implícito no princípio do inciso V do art. 6º, está explicitado no § 2º do art. 51 (RIZZATTO NUNES, 2000, p. 117).

Nos contratos de turismo, exemplo de abusividade de que deve o consumidor ser protegido, estão em cláusulas como as que excluem:

[...] a responsabilidade do vendedor do pacote (a agência de viagens), por defeito na prestação de um dos integrantes da rede de serviços, como a operadora, a transportadora ou o estabelecimento de hospedagem, haja vista todos serem solidariamente responsáveis pelo dano segundo o art. 12,14,18 e 20 do CDC.

Do mesmo modo, abusivas são as cláusulas isentando a operadora de responsabilidade em relação aos danos causados pelas terceiras pessoas que prestam efetivamente o serviço durante a execução do contrato. Isso porque é ela quem, conhecendo o mercado de consumo e os riscos aos quais o consumidor está exposto, organiza a viagem, escolhendo os meios de transporte, os transportadores, os hotéis, e os passeios (CARVALHO SILVA, 2003, p. 215).

Ainda em relação à abusividade nos contratos de turismo, merece proteção o consumidor que se depara, por exemplo, com cláusula que estabelece a "[...] perda total ou substancial do preço pago pelo pacote em caso de desistência do consumidor, se não ficar provado pelo fornecedor não ter tido tempo para substituir o desistente" (CARVALHO SILVA, 2003, p. 216).

A proteção contratual que é dada ao consumidor, por meio dos inúmeros dispositivos do código, vem do reconhecimento de sua vulnerabilidade e de que:

[...] o princípio maior da interpretação dos contratos de consumo está insculpido no art. 47 do CDC: "as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor". Isso quer significar que não apenas as cláusulas ambíguas dos contratos de adesão se interpretam em favor do aderente, contra o estipulador, mas o contrato de consumo como um todo, seja "contrato de comum acordo" (contrat de gré à gré), seja de adesão será interpretado de modo mais favorável ao consumidor (NERY JR in GRINOVER et. al, 2001, p. 480, grifos do autor).

A efetivação da proteção contratual funda-se em direitos e deveres impostos ao consumidor/fornecedor que relativizam os contratos e reconhecem a vulnerabilidade do consumidor.

2.6.Acesso à justiça

Por meio desse direito básico explicitado no artigo 6º, inciso VII, do CDC, anseia-se proporcionar ao consumidor a efetiva utilização de seus direitos positivados no Código de Defesa do Consumidor.

Numa tentativa de tornar efetivo e real o acesso do consumidor à justiça, há vários mecanismos que o Código de Defesa do Consumidor coloca à disposição do destinatário final, para a defesa dos seus direitos: a) a assistência judiciária integral e gratuita àqueles que não possuem condições econômicas para contratar um advogado; b) a Promotoria de Justiça do Consumidor, para a defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos dos consumidores (arts. 81, par. ún. e 82, I, da Lei 8.078/90, c/c o art. 5º, caput, da Lei 7.347/85); c) as delegacias de polícia especializadas nas investigações dos crimes contra as relações de consumo; d) o Juizado Especial de Pequenas Causas; e e) a concessão de estímulos à constituição e desenvolvimento das associações de defesa dos consumidores (art. 5º, caput, do Código de Defesa do Consumidor) (LISBOA, 2001, p. 92-93).

A facilitação do acesso à justiça pelo consumidor, pela criação de mecanismos processuais adequados, faz com que, além de resultados positivos nos litígios envolvendo relação de consumo, também coíba abusos por parte do fornecedor pela simples potencialidade do uso desses mecanismos eficientes em juízo (ARRUDA ALVIM, 1995, p. 50).

Com propriedade, Ada Pellegrini Grinover (2001, p. 719-720) leciona que a preocupação do legislador

[...] é com a efetividade do processo destinado à proteção do consumidor e com a facilitação de seu acesso à justiça. Isso demandava, de um lado, o fortalecimento da posição do consumidor em juízo – até agora pulverizada, isolada, enfraquecida perante a parte contrária que não é, como ele, um litigante meramente eventual – postulando um novo enfoque da par condicio e do equilíbrio das partes, que não fossem garantidos no plano meramente formal; e, de outro lado, exigia a criação de novas técnicas que, ampliando o arsenal de ações coletivas previstas no ordenamento, realmente representassem a desobstrução do acesso à justiça e o tratamento coletivo de pretensões individuais que isolada e fragmentariamente poucas condições teriam de adequada condução. Isso, sem jamais olvidar as garantias do "devido processo legal".

O acesso à justiça, juntamente com seus competentes instrumentos processuais, pela sua potencialidade de uso, deverão contribuir para a formação de uma sociedade mais bem preparada, consciente e participativa, em que serão empregados, na dissolução dos conflitos, meios informais e não oficiais de forma muito mais atuante e eficaz (WATANABE in GRINOVER et. al, 2001, p. 722).

Com a norma do artigo 6º, inciso VII, do CDC, associada a outras normas desse mesmo Código:

[...] verifica-se que a verdadeira intenção do legislador foi a de adiantar que os direitos do consumidor passam a ser defendidos em juízo, com muito mais eficácia, com inovações de ordem processual (ações coletivas, é a principal) e a legitimação de certas entidades para assumir a defesa dos interesses homogêneos, coletivos e difusos do consumidor perante a Justiça ou autoridades administrativas (SAAD, 1999, p. 176).

Vê-se, então, que por meio do acesso à justiça disponibilizado aos consumidores, as relações de consumo tendem a se tornarem mais justas com a coibição de abusos e garantia de direitos.

2.7. Inversão do ônus da prova

Para que o consumidor visse sua proteção efetivada, necessitava de regra que facilitasse sua defesa em juízo, surgiu daí a inversão do ônus da prova, já que quem dispõe dos meios técnicos e melhores condições de realização das provas é o fornecedor.

O consumidor

[...] por força de sua situação de hipossuficiência e fragilidade, via de regra enfrentava dificuldade invencível de realizar a prova de suas alegações contra o fornecedor, mormente em se considerando ser este o controlador dos meios de produção, com acesso e disposição sobre os elementos de provas que interessam à demanda. Assim, a regra do art. 333, I, do estatuto processual civil representava implacável obstáculo às pretensões judiciais dos consumidores, reduzindo-lhes, de um lado, as chances de vitória, e premiando, por outro lado, com a irresponsabilidade civil, o fornecedor (ALMEIDA, 2000, p. 103).

O Código de Defesa do Consumidor traz a inversão do ônus da prova decorrente de determinação judicial no artigo 6º, inciso VIII, nos casos de verossimilhança ou hipossuficiência; e decorrente de determinação legal nos artigos 12, § 3º, e 14, § 3º, quando fala que o fornecedor não será responsabilizado se provar determinadas situações; e, ainda, no artigo 38, há a determinação do ônus da prova da informação ou comunicação publicitária a quem as patrocina.

Discorrendo acerca da verossimilhança, Rizzatto Nunes (2000, p. 123) salienta:

É necessário que da narrativa decorra verossimilhança tal que naquele momento da leitura, desde logo, possa-se aferir forte conteúdo persuasivo. E, já que se trata de medida extrema, deve o juiz aguardar a peça de defesa para verificar o grau de verossimilhança na relação com os elementos trazidos pela contestação.

A hipossuficiencia difere da vulnerabilidade, conforme já tratado no 1º Capítulo, item 1.5.2, do presente trabalho.

Cumpre ainda esclarecer que deve ser o consumidor considerado hipossuficiente "quer em decorrência da dificuldade de provar à luz da falta de informações e de conhecimentos específicos acerca da produção, como em decorrência da dificuldade econômica" (NUNES JÚNIOR; SERRANO, 2003, p. 39-40).

Bem ilustra Roberto Senize Lisboa (2001, p. 95-96):

[...] deve-se observar que prevalece no processo civil moderno o princípio geral da verdade formal, o que possibilita o juiz o poder de proceder a inversão do ônus da prova pela mera constatação de que as alegações do autor possam ser verdadeiras, inclusive no que diz respeito à dificuldade de obtenção de informações técnicas sobre o produto e o serviço fornecidos.

O ônus da prova, por determinação legal, cabe para defeitos nos produtos e serviços e acidentes de consumo, conforme explicitado nos seguintes artigos do CDC (BRASIL, 2003, p. 15-16, grifo nosso):

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

[...]

§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:

I - que não colocou o produto no mercado;

II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;

[...]

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

[...]

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Também advindo de determinação legal, o ônus da prova na publicidade, de acordo com o art. 38 do CDC, também é obrigatoriamente do fornecedor e independe de discricionariedade do juiz. Alude a veracidade e a correção, conforme os princípios da veracidade, da não-abusividade, da identificação da mensagem publicitária e da transparência da fundamentação publicitária (BENJAMIN in GRINOVER et. al, 2001, p. 316).

Assim, desnecessária a declaração taxativa no despacho saneador de que caberá ao fornecedor o ônus da prova da veracidade ou correção da informação ou comunicação publicitária, pois havendo estabelecimento da lide processual, antecipadamente e independentemente de qualquer pronunciamento jurisdicional interlocutório ou definitivo, por norma legal cogente, está o fornecedor obrigado a provar a obrigação contida no art. 38 da Lei nº 8.078/90 (RADLOFF, 2002, p. 75).

Por fim, devemos sempre lembrar que o objetivo da inversão do ônus da prova é a facilitação da defesa do consumidor em juízo, mas não o isenta de comprovar a ocorrência dos danos e o nexo de causalidade com o produto ou serviço. Ao fornecedor compete a comprovação dos fatos impeditivos – culpa exclusiva do consumidor, fato exclusivo de terceiro, caso fortuito e força maior –, modificativos – culpa concorrente – e extintivos – prescrição – dos direitos do consumidor bem como dos fatos a que o juiz ou a lei lhe atribuir prova (SANSEVERINO, 2002, p. 328-329).

2.8.Prevenção e reparação de danos

Sempre que o consumidor sofrer lesão ou ameaça de direito caberá a devida prevenção e reparação do dano, de acordo com o direito básico instituído pelo inciso IV do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor.

"Quando se fala em prevenção de danos, fala-se certamente, em primeiro lugar, nas atitudes que as próprias empresas fornecedoras de produtos e serviços devem ter para que não venham a ocorrer danos ao consumidor ou terceiros [...]" (FILOMENO in GRINOVER et. al, 2001, p. 127).

Prevenção de danos significa também, de acordo com Rizzatto Nunes (2000, p. 119-120), "que está garantido ao consumidor o direito de ir a juízo requerer as medidas cautelares com pedido de liminar a fim de evitá-lo [o dano]. E, dando especificidade a esta garantia, a Lei 8.078 firmou regras processuais importantes nos arts. 83 e 84".

Todo o sistema processual criado pelo Código do Consumidor leva em seu bojo a finalidade de possibilitar uma efetiva atividade processual e conseqüente proteção judiciária às relações de consumo, de forma a tornar possível a concreta e efetiva realização de todos os direitos outorgados ao consumidor e a real reparação aos danos sofridos pelo consumidor, com disposições expressas referentes à defesa deste em juízo (ver arts. 81 a 89 e 91 a 102, principalmente). Regula ainda o Código, as ações para a defesa de interesses individuais homogêneos e quanto à responsabilidade do fornecedor (ver arts. 91 a 102), com normas expressas para a eficácia da sentença e especialmente a extensão subjetiva da coisa julgada com critério sempre benéfico para o consumidor, vítimas e sucessores (ver arts. 103 e 104) (ARRUDA ALVIM, 1995, p. 68).

O legislador preocupou-se em garantir ao consumidor proteção não só em relação à fruição dos produtos e serviços, mas ainda contra eventuais riscos provocados pelos fornecedores. Surgindo daí a responsabilidade objetiva que será tratada mais a fundo no capítulo seguinte.

Ocorrendo o dano, deve o consumidor receber reparação integral:

É necessário que o ofendido tenha a garantia legal de que ocorrerá a reparação do dano, conseqüência da segurança jurídica que deve existir na relação de consumo. Além disso, a responsabilidade civil impõe uma sanção ao causador do prejuízo, que deve ser estabelecida de modo a se desestimular a reiteração da conduta danosa. A responsabilidade civil acaba, assim, por se constituir no meio de se compelir o agente causador do dano a proceder a sua reparação (LISBOA, 2001, p. 113).

O dever de reparar o dano, nas relações de consumo, advém da responsabilidade civil objetiva, fundada na existência de dano e nexo de causalidade, ligando o dano à conduta geradora. Essa responsabilidade é imposta por lei, tendo caráter indisponível, o que torna nula qualquer cláusula que limite ou exonere a responsabilidade do fornecedor diante de danos (GOMES, 2001, p. 139).

Continuando a falar a respeito do tema, Marcelo Kokke Gomes (2001, p. 140) bem explana:

Consoante o salientado, a reparação dos danos ao consumidor será plena. Não obstante, grande valorização é dada à prevenção de danos, seja através da fiscalização governamental, seja por meio de incentivo de adoção de procedimentos técnicos que busquem a melhoria na qualidade. A prevenção de danos produz uma verdadeira economia social, gerando benefícios a todos, fornecedores, consumidores e sociedade.

No Código Protetivo, a responsabilidade do fornecedor não é nivelada da mesma maneira que no Código Civil. "Tenha culpa ou não; ignore ou não os vícios e defeitos do produto, responderá sempre pelos danos que o consumidor vier a sofrer" (SAAD, 1999, p. 431).


3. RESPONSABILIDADE CIVIL NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

A responsabilidade civil de que trata o Código de Defesa do Consumidor é a objetiva, de acordo com seu artigo 6º, que traz, entre os direitos básicos, o da obrigação de indenizar o consumidor pelos danos sofridos e o do dever de segurança, já explanados no capítulo anterior.

"[...] a responsabilidade estabelecida no CDC é objetiva, fundada no dever de segurança do fornecedor em relação aos produtos e serviços lançados no mercado de consumo, razão pela qual não seria também demasiado afirmar que, a partir dele, a responsabilidade objetiva, que era exceção em nosso direito, passou a ter um campo de incidência mais vasto do que a própria responsabilidade subjetiva" (CAVALIERI FILHO, 2003, p. 39).

Quando o fornecedor coloca no mercado de consumo um produto ou serviço, está sujeito à responsabilização objetiva, independentemente de culpa, por todos os danos que puderem vir a sofrer os consumidores, seja por fato – acidente de consumo – ou por vício, artigos 12/14 e 18/20 do CDC, respectivamente.

Marcelo Kokke Gomes (2001, p. 40) bem doutrina:

A teoria objetiva prescinde de culpa. O dever de reparação baseia-se no dano causado e em sua relação com a atividade desenvolvida pelo agente. As atividades são lícitas, a necessidade de sua existência faz com que sejam aceitos pela sociedade os danos que provocam, entretanto, as vítimas não devem ser deixadas ao léu. A prova de culpa do agente, na realidade, inviabilizaria a reparação do dano, aumentando mesmo os seus suplícios, [...] A teoria objetiva confere certeza à reparação do dano, atendendo ao próprio resultado danoso da ação e não da culpabilidade desta.

Cláudio Bonatto e Paulo Valério Dal Pai Moraes (2001, p. 115) explanam ter a responsabilidade dos fornecedores, baseada na ausência de culpa, introduzido uma nova fase na economia brasileira, já que os fornecedores terão que abranger, em suas previsões, esse novo elemento gerador de custos.

Na responsabilidade objetiva, o consumidor deve provar o dano e o nexo causal para ter seu direito assegurado.

A alteração da sistemática da responsabilização, retirando-se o requisito da prova de culpa, não implica dizer que a vítima nada tenha que provar. Ao contrário, cabe-lhe provar o dano e o nexo de causalidade entre este e o produto ou serviço. Lembre-se contudo que em relação a estes elementos o juiz pode inverter o ônus da prova quando ‘for verossímil a alegação’ ou quando o consumidor for ‘hipossuficiente’, sempre de acordo com ‘as regras ordinárias de experiência’ (art. 6º, VIII). Recorde-se, por último, que o consumidor não precisa provar o defeito (art. 12, §3º, II) (BENJAMIN in BENJAMIN et. al, 1991, p. 59).

Considerando que o presente trabalho trata da responsabilidade das agências de turismo, e o fato de essas prestarem ao consumidor um serviço, será delineada a responsabilidade oriunda de fato e vícios se atendo aos ocasionados pelos serviços expostos no mercado de consumo.

3.1. Responsabilidade pelo fato do serviço – acidente de consumo

A responsabilidade ocasionada por defeitos nos serviços é trazida pelo artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - o modo de seu fornecimento;

II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi fornecido. [...] (BRASIL, 2003, p. 16).

Ocorre defeito do serviço quando este possui um vício que o torne inadequado, e este vício gere outros danos ao patrimônio jurídico e moral do consumidor, como é o caso de um consumidor que não tem seu cartão aceito em algum estabelecimento por ter a fatura vencido, quando na verdade ela já foi paga, ou um alagamento na residência ocasionado por uma pia entupida consertada por encanador dias antes. O defeito vai além do serviço e atinge o patrimônio jurídico e/ou moral do consumidor (RIZZATTO NUNES, 2000, p. 180-183).

Podemos dizer que em casos de turismo, os defeitos previstos no art. 14 podem ocorrer desde acidentes no transporte, como, por exemplo, a queda de um avião, a batida de um transporte de turismo, intoxicação alimentar no restaurante do hotel e outros (FEUZ, 2003, p. 103).

O defeito do serviço pode ser de prestação – quando se manifesta no ato da prestação do serviço, um desvio do padrão de qualidade –, de concepção – surgido na formulação do serviço, na escolha de seus métodos e na fixação de seu conteúdo –, e de comercialização – no caso de informações insuficientes ou inadequadas (BENJAMIN in BENJAMIN et. al, 1991, p. 79).

Zelmo Denari (2001, p. 174), a respeito do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor afirma que "[...] além dos defeitos intrínsecos, o dispositivo responsabiliza os prestadores de serviço pelos defeitos extrínsecos quando os respectivos contratos de prestação de serviços ou os meios publicitários não prestam informações claras e precisas a respeito da fruição".

Quando se fala de responsabilidade objetiva do fornecedor em relação aos serviços,

Responsabilizam-se independentemente da apuração de culpa todos os fornecedores de serviços, quer imediatos como mediatos, solidariamente, pelos danos ocasionados aos consumidores em função de defeito na prestação do serviço ou por incompletude nas informações acerca da segurança na execução ou fruição (ARRUDA ALVIM, 1995, p. 137).

Quando o defeito é causado por informações insuficientes ou inadequadas sobre a fruição e os riscos dos serviços, temos como um ótimo exemplo o de uma pessoa que vai até uma agência de viagens e fecha um pacote com roteiro completo de viagens, incluindo passagens, categoria determinada de hotéis, visitas a museus e shows, excursões com transporte incluso etc. e, ao chegar ao destino, depara-se com categoria inferior de hotel, paga pelas visitas aos museus e shows, não consegue fazer as excursões por falta de reserva, paga mais cara a passagem de volta por falta de marcação com 72h de antecedência, da qual não fora avisado etc. Os prejuízos sofridos são imensos e evidentes, inclusive com pagamentos efetuados em dobro (RIZZATTO NUNES, 2000, p. 184-185).

Desse modo, o serviço será defeituoso quando não proporcionar a segurança que o consumidor legitimamente espera, em relação ao modo de seu fornecimento, ao resultado, aos riscos e à época em que foram fornecidos (ATHENIENSE, 2002, p. 56).

3.2.Responsabilidade por vício do serviço

O artigo 20 do Código de Defesa do Consumidor (BRASIL, 2003, p. 19) estabelece a responsabilidade do fornecedor pelos vícios dos serviços:

Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III - o abatimento proporcional do preço.

§ 1° A reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros devidamente capacitados, por conta e risco do fornecedor.

§ 2° São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade.

Em relação aos vícios de qualidade dos serviços por inadequação, o Código se restringiu a traçar linhas gerais a serem adaptadas ao caso concreto, sempre de acordo com os princípios da vulnerabilidade e da garantia de adequação (BENJAMIN in BENJAMIN et. al, 1991, p. 105), já tratados no 1º capítulo do presente trabalho.

A responsabilidade por vício de qualidade se impõe àquele que presta o serviço, não importando a sua culpa, de seus prepostos, de seus auxiliares ou representantes. O fornecedor responderá igualmente, em quaisquer dos casos, exemplo disso é o caso dos contratos de viagem turística executado por auxiliares (MARQUES, 1995, p. 417).

Rizzatto Nunes (2000, p. 271) explana a respeito da solidariedade:

Ainda que a norma [art. 20 do CDC] esteja tratando de fornecedor direto, isso não ilide a responsabilidade dos demais que indiretamente tenham participado da relação. Não só porque há normas expressas nesse sentido (art. 34 e §§ 1º e 2º do art. 25) mas também em especial pela necessária e legal solidariedade existente entre todos os partícipes do ciclo de produção que geraram o dano (cf. o parágrafo único do art. 7º), e, ainda mais, pelo fato de que, dependendo do tipo de serviço prestado, o fornecedor se utiliza necessariamente de serviços e produtos de terceiros.

Sérgio Cavalieri Filho (2003, p.496), num mesmo sentido, "[...] há responsabilidade solidária entre todos os fornecedores, [...] podendo o consumidor, à sua escolha, exercitar sua pretensão contra todos ou contra aquele que mais lhe for conveniente".

De acordo com o artigo em comento, há vício, no serviço prestado, quando houver diversidade em relação à oferta ou mensagem publicitária e sua execução, aludindo o dispositivo, inclusive, aos vícios de quantidade mesmo sem referência expressa (DENARI in GRINOVER et. al, 2001, p. 192).

De acordo com Roberto Senise Lisboa (2001, p. 213-214), os vícios de informações dos serviços podem ser pela diversidade entre a informação e o resultado, entre a publicidade e o serviço oferecido; ou pela omissão sobre a quantidade, a qualidade, os prazos de validade, o preço, a composição, a garantia, as origens e os riscos.

A respeito dos vícios de informação, Cláudia Lima Marques (1995, p. 419) salienta que

[...] esta novidade do CDC será especialmente utilizada em se tratando de contratos de viagem turística ou contratos denominados de ‘organização de viagens turísticas’, nos quais a oferta é feita pela agência de turismo e a prestação de serviços é executada por outras pessoas, consideradas juridicamente como seus ‘auxiliares’ no país ou na cidade para onde o consumidor se deslocou.

Quando ocorrer vício no serviço, o consumidor tem as alternativas do artigo 20, incisos I, II e III, à sua escolha e, além delas, poderão, ser devidas as perdas e danos, se devidamente provados, assim como o nexo de causalidade entre estes e o vício (ARRUDA ALVIM, 1995, p. 158).

Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (In BENJAMIN et. al, 1991, p. 107) bem salienta em relação às opções do consumidor e em relação às perdas e aos danos que

[...] qualquer que seja a opção escolhida, sempre tem direito a perdas e danos, desde que comprovados. Mesmo no abatimento proporcional do preço, já que tal pode se dar levando em consideração unicamente a depreciação do próprio bem de consumo (produto ou serviço). Não inibe esse raciocínio o fato de que só o inciso III prevê, expressamente, o pagamento de perdas e danos. É que o princípio, embora repetido no inciso III, tem assento também na parte geral do código (art. 6º, VI), informando, por conseguinte, toda a parte especial e servindo, em particular, para preencher as omissões do legislador.

Nas perdas e danos poderá estar incluído o dano moral, que será tratado a seguir.

3.3.Dano moral no vício do serviço

O dano moral é inegável, quando se trata de fato do serviço, já que, de modo geral, sempre será abalada a esfera psíquica do consumidor quando houver acidente de consumo.

Já, em relação ao dano moral, no vício dos serviços, há uma certa divergência doutrinaria e jurisprudencial, haja vista que nem sempre que o consumidor constata um vício na prestação de determinado serviço haverá dano extrapatrimonial, isso dependerá do caso concreto.

Simone Hegele Bolson (2002, p. 141) bem afirma que o vício do serviço – seja por inadequação ou por quantidade – pode ocasionar danos morais, autorizado pelo artigo 6º, inciso VI, do CDC:

O dano moral poderá advir dos vícios dos produtos ou serviços quando esses atingirem os direitos de personalidade do homem consumidor, conquanto a ocorrência de dano patrimonial seja a mais comum, justamente porque, a priori, os vícios dos produtos e serviços atingiram o bolso do consumidor (esfera econômica) [...]

Tem-se a caracterização do dano moral quando a pessoa vê seu íntimo abalado, quando lhe é causado algum tipo de aborrecimento, humilhação, vergonha etc. No caso específico dos contratos de turismo, há o dano moral quando o serviço não é prestado adequadamente, pois, mesmo não ocorrendo um acidente de consumo, ao agredir a expectativa legítima do consumidor, ele verá frustrado seu maior objetivo, ao realizar a viagem turística, que é o de lazer e diversão. Desse modo, deve o consumidor ser efetivamente reparado por danos morais sempre que houver vício ou defeito (FEUZ, 2003, p. 110-111).

Nesse sentido, vejamos as seguintes decisões do STJ, de 13 de agosto de 2001:

Recurso Especial n.º 304.738 – SP

RESPONSABILIDADE CIVIL. AGÊNCIA DE TURISMO. PACOTE TURÍSTICO. SERVIÇO PRESTADO COM DEFICIÊNCIA. DANO MORAL. CABIMENTO. PROVA. QUANTUM. RAZOABILIDADE. RECURSO PROVIDO.

I - A prova do dano moral se satisfaz, na espécie, com a demonstração do fato que o ensejou e pela experiência comum. Não há negar, no caso, o desconforto, o aborrecimento, o incômodo e os transtornos causados pela demora imprevista, pelo excessivo atraso na conclusão da viagem, pela substituição injustificada do transporte aéreo pelo terrestre e pela omissão da empresa de turismo nas providências, sequer diligenciando em avisar os parentes que haviam ido ao aeroporto para receber os ora recorrentes, segundo reconhecido nas instâncias ordinárias.

II – A indenização por danos morais, como se tem salientado, deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação enseje enriquecimento indevido, com manifestos abusos e exageros.

III - Certo é que o ocorrido não representou desconforto ou pertubação de maior monta. E que não se deve deferir a indenização por dano moral por qualquer contrariedade. Todavia, não menos certo igualmente é que não se pode deixar de atribuir à empresa-ré o mau serviço prestado, o descaso e a negligência com que se houve, em desrespeito ao direito dos que com ela contrataram

(BRASIL, 2004a, não paginado, grifo nosso).

Recurso Especial n.º 305.566 – DF

RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANSPORTE AÉREO. ATRASO EM VÔO INTERNACIONAL. AGÊNCIA DE TURISMO. FRETAMENTO. RESPONSABILIDADE DA EMPRESA AFRETADORA. DANO MORAL. CABIMENTO. QUANTUM. RAZOABILIDADE EM FACE DAS CIRCUNSTÂNCIAS ESPECIAIS DO CASO CONCRETO. PRECEDENTES. RECURSO PARCIALMENTE ACOLHIDO.

I – Nos termos da orientação das Turmas que compõem a Segunda Seção, a empresa afretadora responde pelo dano oriundo da deficiente prestação do serviço de transporte, incidindo o Código de Defesa do Consumidor.

II – Ausente prova de caso fortuito, força maior ou que foram tomadas as medidas necessárias para que não ocorresse o dano decorrente do atraso do vôo, cabível é o pedido de indenização por danos morais.

III – A indenização deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação enseje enriquecimento indevido, com manifestos abusos e exageros, devendo o arbitramento operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao porte financeiro das partes, orientando-se o julgador pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso.

(BRASIL, 2004b, não paginado, grifo nosso).

Tal entendimento foi trazido, também, por unanimidade, pela jurisprudência do STJ em RESP nº 328182/RS de 2002, relator Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, que versava sobre vício de qualidade, falta de informação, má execução dos serviços de traslado e hotel contratado através de agência de turismo:

Recurso Especial nº 328182/RS.

DIREITO DO CONSUMIDOR. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. VÍCIO DE QUALIDADE.ART. 20, CDC. VIAGEM TURÍSTICA. DANO MATERIAL E DANO MORAL. DISTINÇÃO. OPÇÃO DO CONSUMIDOR. ADEQUAÇÃO À REPARAÇÃO DO DANO. RECURSO DESACOLHIDO.

I - Na prestação de serviços de viagem turística, o desconforto, o abalo, o aborrecimento e a desproporção entre o lazer esperado e o obtido não se incluem entre os danos materiais, mas pertencem à esfera moral de cada um dos viajantes, devendo a esse título ser ressarcidos.

II - Os danos materiais, que sabidamente se distinguem dos morais, devem recompor estritamente o dispêndio do consumidor efetuado em razão da prestação de serviços deficiente, sem o caráter de punir o fornecedor.

III - O direito de opção mencionado no art. 20, I a III do Código de Defesa do Consumidor, relaciona-se com a suficiência da reparação do dano, não devendo afrontar nem a proporcionalidade entre a conduta do fornecedor e o dano causado, nem o princípio que veda o enriquecimento indevido

(BRASIL, 2004c, não paginado).

A ação foi proposta com intuito de ver ressarcidas despesas pela má execução dos serviços, já que o translado e o hotel não condiziam com o que fora contratado através da agência, o que acarretou gastos extraordinários.

3.4.Excludentes de responsabilidade

As excludentes de responsabilidade são as do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor (2003, p. 16):

§ 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Tais excludentes deverão ser utilizadas tanto quando se tratar de vício – artigo 20 CDC – ou defeito – artigo 14 CDC – dos serviços, apesar da localização.

De acordo com tal entendimento estão Roberto Senise Lisboa (2001, p. 265), que dá ao tópico de seu livro referente ao assunto o título "Excludentes de responsabilidade objetiva pelo fato e pelo vício"; Marcelo Kokke Gomes (2001, p. 197), que diz que deve ser conjugada a excludente de acordo com as peculiaridades específicas e com a responsabilidade – por vício ou por fato – à qual se relaciona; e Rizzatto Nunes (2000, p. 287), quando afirma que as excludentes aproveitam para o artigo 20, por analogia, aplicar "[...] uma vez que este não prevê as saídas para a proteção do direito do fornecedor. Mas, claro, elas são óbvias e decorrem da regra geral da responsabilidade objetiva estabelecida no CDC".

Em relação à adoção de novas técnicas, a prestação de serviços deve ocorrer de acordo com a devida segurança que validamente se espera. Se, na época em que foi fornecido, não estiver de acordo com os padrões de segurança, será considerado defeituoso. Diferentemente ocorre em relação à qualidade, que pode ser melhor ou pior sem tornar o produto defeituoso, desde que não influa negativamente no padrão de segurança legitimamente esperado (ARRUDA ALVIM, 1995, p. 138).

Rizzatto Nunes (2000, p. 192) considera que o § 2º do artigo 14 está deslocado, pois:

É regra que deveria estar no art. 20, uma vez que a hipótese aventada da ‘adoção de novas técnica’ em detrimento de serviço mais antigo pode apenas gerar vício. Ou, em outras palavras, a regra salvaguarda somente o vício eventual dos serviços executados com técnicas menos modernas. Defeito, conforme já comentamos, se ocorrer, independerá de ser a tecnologia mais ou menos moderna.

A norma somente poderia, como pode, excetuar problema por avanço tecnológico em caso de vício, não de defeito. Repita-se, com ou sem outro serviço executados com nova e melhor técnica, havendo acidente de consumo – e, assim, defeito –, haverá responsabilidade em indenizar.

Para que ocorra a excludente de responsabilidade disposta no artigo 14, § 3º, inciso I, do Código Protetivo, deve o fornecedor comprovar que seu serviço era dotado de toda segurança que legitimamente se espera e que não havia defeitos juridicamente relevantes. Só assim conseguirá romper o nexo de causalidade entre o serviço e o dano produzido (GOMES, 2001, p. 212).

Se o produto ou serviço não é defeituoso, e o ônus dessa prova é do fornecedor, não haverá também relação de causalidade entre o dano e a atividade do fornecedor. O dano terá ocorrido de outra causa não imputável ao fabricante do produto ou ao prestador do serviço. Há igualmente, aqui, uma presunção que milita contra o fornecedor, ao qual caberá ilidi-la (CAVALIERI FILHO, 2003, p. 484).

Para que haja exclusão de responsabilidade por culpa de terceiro ou do consumidor, deve ela ser exclusiva. Se tiver a mínima participação do fornecedor, a responsabilidade será inteiramente sua, mesmo que o consumidor participe culposamente na produção do dano (GOMES, 2001, p. 208-209).

Rizzatto Nunes (2000, p. 196-197) expõe, em relação à culpa exclusiva de terceiro, que

Se a pessoa que causou o dano pertencer ao ciclo de produção do serviço – porque serviço também tem seu ciclo de produção –, executado pelo prestador responsável, tal como seu empregado, seu preposto ou seu representante autônomo, ele continua respondendo. Essa hipótese, a par de passível de ser estabelecida por interpretação do sistema de responsabilidade estatuída, tem, conforme já observamos, correspondência na regra do art. 34 (‘O fornecedor do produto ou serviço é solidariamente responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos’), bem como naquelas outras também já apontadas do parágrafo único do art. 7º e nos §§ 1º e 2º do art. 25.

Alguns autores como Arruda Alvim, Thereza Alvim, Eduardo Alvim, James Marins, Cláudio Bonatto, Paulo Valério Dal Pae Moraes e Arystóbulo de Oliveira Freitas incluem, ainda, dentre as excludentes de responsabilidade, o caso fortuito e a força maior, uma vez que entendem não ser taxativo o rol de excludentes, dada a possibilidade de aplicação subsidiária do Código Civil (LISBOA, 2001, p. 269).

Zelmo Denari (In GRINOVER et. al, 2001, p. 171) considera o caso fortuito e a força maior como excludentes apenas quando se instalam após o ingresso formal no mercado de consumo:

[...] quando o caso fortuito ou força maior se manifesta após a introdução do produto [serviço] no mercado de consumo, ocorre uma ruptura do nexo de causalidade que liga o defeito ao evento danoso. Nem tem cabimento qualquer alusão ao defeito do produto [serviço], uma vez que aqueles acontecimentos, na maior parte das vezes imprevisíveis, criam obstáculos de tal monta que a boa vontade do fornecedor não pode suprir. Na verdade, diante do impacto do acontecimento, a vítima sequer pode alegar que o produto [serviço] se ressentia de defeito, vale dizer, fica afastada a responsabilidade do fornecedor pela inocorrência dos respectivos pressupostos.

Para a caracterização da força maior e do caso fortuito, deve haver a inevitabilidade e a imprevisibilidade como requisitos fundamentais de existência, a fim de não violar o princípio da responsabilidade civil objetiva (BONATO, DAL PAI MORAES, 2001, p. 122).

3.5. O papel das agências de turismo

A agência de turismo, como fornecedora do serviço "pacote turístico", deve ser considerada responsável pelos danos ocasionados pela má prestação de quaisquer um dos serviços contratados, já que é a intermediária da relação de consumo e o consumidor, ao contratar seus serviços, está aderindo a outros intermediados por ela.

Segundo Cláudia Lima Marques (1995, p. 126-127),

[...] a relação contratual do consumidor é com a agência de viagem, podendo exigir desta a qualidade e a adequação da prestação de todos os serviços que adquiriu no pacote turístico contratado, como se os outros fornecedores seus prepostos fossem. [...] tratando-se de um contrato de organização de viagens, responsabilizam a agência de viagens pela conduta de qualquer prestador de serviços envolvido na viagem turística, prestador este que é considerado um ‘auxiliar’ da agência(...) foi o reconhecimento pela jurisprudência de uma nova responsabilidade (própria e solidária) para as agências de viagens, as quais comercializam os chamados "pacotes turísticos" e passam por responsáveis pela atuação de toda uma cadeia de fornecedores por eles escolhidos e previamente contratados.

Um pacote turístico abrange uma cadeia de fornecedores, na qual um número indeterminado de agentes está vinculado a uma parte específica da prestação, compreende não só a viagem em si, mas hospedagem, alimentação, traslados, seguro, excursões e visitas etc. O consumidor adere a esse pacote que já está previamente constituído, decorrendo daí a total responsabilidade das agências de turismo (CABRAL, 2002, não paginado).

Dando suporte a tal entendimento, vale citar os seguintes artigos do Código Protetivo (BRASIL, 2003, p. 13-23, grifo nosso):

Art. 7° [...] Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.

Art. 23. A ignorância do fornecedor sobre os vícios de qualidade por inadequação dos produtos e serviços não o exime de responsabilidade.

Art. 25. É vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas seções anteriores.

§ 1° Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas seções anteriores.

Art. 34. O fornecedor do produto ou serviço é solidariamente responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos.

A responsabilidade das agências de turismo envolve a garantia de qualidade dos hotéis, do transporte e da alimentação oferecidos, e o consumidor que se sentir lesado em seus direitos e expectativas poderá ingressar em juízo contra a agência que vendeu o pacote turístico e, ainda, contra toda a cadeia de fornecedores envolvida, em demanda fundada em responsabilidade solidária e objetiva, de modo a reequilibrar os direitos do consumidor diante do fornecedor, no mercado de consumo (CARVALHO, 1999, não paginado).

Wander Marotta (2001, p. 221) bem explana a respeito:

[...] segundo a norma, tanto quem vende – intermedeia – quanto quem organiza – opera – a excursão é responsável pelo que vende; agentes outros do contrato são ou ‘prepostos’, stricto sensu, ou ‘representantes autônomos’, o que, no caso, é desimportante, visto que ignorar o fornecedor os defeitos do serviço ou produto de seu representante, ou ‘agente vinculado’, não lhe exclui a responsabilidade.

A solidariedade legal imposta pelo Código de Defesa do Consumidor a torna indivisível, devendo o consumidor ver seus danos – materiais ou morais – ressarcidos sem repartição de responsabilidade, não importando o ajuste celebrado, por tratar-se de um contrato de adesão, devendo a agência ser responsabilizada pela atuação dos outros fornecedores que representa (ATHENIENSE, 2001, p. 241).

Notadamente, pela posição dos doutrinadores exposta acima, cumpre à agência que vende o pacote turístico o risco pela eleição e pela qualidade do estabelecimento prestador dos serviços hoteleiros, de transporte, de alimentação, que sejam ofertados ao consumidor, até porque o risco da atividade econômica é do fornecedor, e não do consumidor.

E, ainda, segundo a Deliberação Normativa nº 161/85 (BRASIL, 2002, não paginado) da Embratur, em seu Anexo I, itens 1.2, 1.3 e 2.2:

1.2 A agência de turismo é diretamente responsável pelos atos de seus prepostos, inclusive os praticados por terceiros por eles contratados ou autorizados, ainda que na condição de autônomos, assim entendidas as pessoas físicas por ela credenciadas, tácita ou expressamente, limitada essa responsabilidade enquanto os autônomos ou prepostos estejam nos estritos limites de exercício do trabalho que lhes competir, por força da venda, contratação e execução do programa turístico operado pela agência. [...]

1.3 A agência de turismo é responsável: a) pelo transporte, hospedagem, refeições, translados, passeios locais e demais serviços turísticos, quando incluídos no programa da viagem ou excursão; b) pelo transporte e garantia das bagagens dos participantes [...]

2.2 Cumprir o programa de viagem ou excursão, na forma em que foi acordado, bem como nas condições previstas em qualquer oferta ou divulgação do programa de viagem ou excursão, especialmente as referentes: a) aos serviços oferecidos;

Os contratos de turismo fazem jus a peculiar zelo, seja pelo acepção social e econômica já alcançada, seja pelas características especiais que os revestem. É inerente a tais contratos a expectativa de realização plena de lazer, cultura, diversão e prazer, além da obrigação de resultado em virtude da transferência das preocupações da responsabilidade da organização da viagem e todos os eventos que a compõem, obrigando, assim, o fornecedor ao resultado útil e o consumidor somente ao pagamento de um valor (SPODE, 2000, p. 142).

Apesar de a doutrina majoritária e a jurisprudência se posicionarem no sentido de responsabilização dos agentes e operadores de turismo,

[...] conflitos nesse campo são inúmeros, não sendo infrequente a tentativa do operador de turismo de se exonerar de qualquer responsabilidade, derivada da má prestação ou inexecução dos serviços por ele próprio recomendados – como se o problema fosse sempre de terceiros: a empresa aérea que não embarcou o passageiro em virtude da prática de overbook (confirmação de reservas de assentos em número superior à lotação do avião) ou que permitiu o extravio das malas; o hotel que não honrou as reservas; os espetáculos que não puderam ser assistidos por ausência de confirmação nas reservas (TEPEDINO, 1998, p. 94).

Paulo R. Roque Khouri (2002, p. 180-181) tem uma posição diferente em relação à responsabilização das agências de turismo. Para ele, a responsabilização deve se dar somente àquele que introduziu o serviço no mercado, e não à prestadora do serviço de representação/intermediação. A agência deve responder apenas pelo fato de seu serviço e não pelo de outrem.

Tal posicionamento, a nosso sentir, não merece prosperar, pois fere os princípios basilares do Código Protetivo e dificulta o ressarcimento do consumidor lesado que se utilizou da agência de turismo a fim de garantir uma viagem tranqüila.

Por todo o exposto, deve-se concluir que tem a agência de turismo responsabilidade ante os consumidores que dela se utilizarem para contratar serviços, não tendo fundamento legal as inúmeras tentativas de exoneração de responsabilidade pelo fornecedor.

3.5.1. Tendência atual do STJ

Conforme demonstrado, a doutrina é clara com relação à responsabilização das agências de turismo, confirmando tal responsabilidade o Supremo Tribunal de Justiça assim tem decidido:

Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 512.271/RJ.

Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Indenização. Pacote turístico. Ingressos para evento esportivo. Código de Defesa do Consumidor. Prazo decadencial. Denunciação à lide. Precedentes da Corte.

1. O acórdão recorrido está em perfeita harmonia com o entendimento desta Corte no sentido de que "a ação de indenização pela falta de entrega dos ingressos para a final da Copa do Mundo, incluídos no pacote turístico comprado pelos autores, está subordinada ao prazo de cinco anos previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, e não ao do art. 26 do mesmo Código´´ (REsp nº 435.830-RJ, 3ª Turma, da minha relatoria, DJ de 10-03-03)" (fl. 533).

2. Inexistindo "qualquer avença devidamente instrumentalizada entre os denunciantes e denunciadas", não se admite a denunciação à lide.

3. As alegações da agravante no sentido de que a responsabilidade pela não-entrega dos ingressos seria de terceira empresa deverão ser feitas em sede própria, já que assegurado o direito de regresso. A argumentação de que existiria prova do contrato enseja reexame de matéria probatória, inviável em sede de recurso especial.

4. Agravo regimental desprovido

(BRASIL, 2004d, não paginado, grifo nosso).

O recurso em questão, interposto pela agência, foi rejeitado por unanimidade. Tratava-se de ação pelo não-fornecimento de ingressos para os jogos da segunda etapa da Copa do Mundo de 1998, conforme avençado entre o consumidor e a agência de turismo. O acórdão já ementado possuía a seguinte disposição: "Havendo pluralidade de prestações de serviços, são todos eles solidariamente responsáveis pelo cumprimento da avenca. Danos morais caracterizados, a exigirem a devida reparação [...]" (BRASIL, 2004d, não paginado).

Em Recurso Especial nº 435.830 – RJ, publicado no Diário Oficial da União, em 10/03/2003, não provido por unanimidade, o Ministro Carlos Alberto Menezes Direito salienta, em seu voto, com relação a falta de entrega de ingressos para o final da copa de 98:

Para o acórdão recorrido o contrato estabeleceu, efetivamente a entrega dos ingressos para a final, com ou sem o Brasil, não havendo falar em fato de terceiro porque a empresa assim considerada pela ré era a detentora da distribuição em nome da Confederação Brasileira de Futebol – CBF, havendo, no caso, a responsabilidade solidária da ré, nos termos do art. 25, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor

(BRASIL, 2004e, não paginado).

A Ministra Nancy Andrighi também estava de acordo com a responsabilização das agências de Turismo e negou provimento ao Recurso Especial nº 278.893 – DF – interposto por operadora de turismo que queria ver-se livre de responsabilidade perante o fornecedor.

Tratava-se de ação concernente a não-disponibilização de ingressos referentes ao jogo inaugural da copa de 98, entre o Brasil e a Escócia. E, conforme decisão já perpetrada pelo acórdão recorrido, "Responde a operadora de turismo pelo dano moral causado ao cliente que adquiriu pacote turístico visando assistir a abertura da Copa do mundo, na França, e se viu impedido de assistir ao jogo porque a ré não disponibilizou os ingressos" (BRASIL, 2004f, não paginado).

No Recurso Especial nº 291.384 – RJ, o Ministro Ruy Rosado de Aguiar decidiu:

RESPONSABILIDADE CIVIL. Agência de viagens. Código de Defesa do Consumidor. Incêndio em embarcação.

A operadora de viagens que organiza pacote turístico responde pelo dano decorrente do incêndio que consumiu a embarcação por ela contratada.

Passageiros que foram obrigados a se lançar ao mar, sem proteção de coletes salva-vidas, inexistentes no barco. Precedente (REsp 287.849/SP). Dano moral fixado em valor equivalente a 400 salários mínimos. Recurso não conhecido

(BRASIL, 2004g, não paginado).

O acórdão se referia a ação de danos morais e materiais para o ressarcimento de prejuízos ocasionados por naufrágio de embarcação, programada na viagem de turismo, em que os passageiros tiveram que se jogar ao mar sem qualquer proteção, como coletes salva-vidas, sendo resgatados por embarcação que passava pelo local. A agência tentou se esquivar da responsabilidade, alegando que a embarcação não pertencia a sua empresa, mas não obteve sucesso, já que, por unanimidade, os ministros decidiram pela responsabilidade solidária da agência de turismo.

Na decisão acima, o ministro traz como precedente o Recurso Especial nº 287.849 – SP, em que também é o relator, vejamos:

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Responsabilidade do fornecedor. Culpa concorrente da vítima. Hotel. Piscina. Agência de viagens.

- Responsabilidade do hotel, que não sinaliza convenientemente a profundidade da piscina, de acesso livre aos hóspedes. Art. 14 do CDC.

- A culpa concorrente da vítima permite a redução da condenação imposta ao fornecedor. Art. 12, § 2º, III, do CDC.

- A agência de viagens responde pelo dano pessoal que decorreu do mau serviço do hotel contratado por ela para a hospedagem durante o pacote de turismo.

Recursos conhecidos e providos em parte

(BRASIL, 2004h, não paginado, grifo nosso).

Nesse caso, o consumidor ficou tetraplégico quando bateu sua cabeça no piso da piscina do hotel, contratado pela agência de viagens, que se encontrava vazia, sem nenhum aviso, cobertura ou obstáculo.

No relatório do acórdão, o ministro dispõe:

Nem se argumente, como quis a empresa de turismo (fl.170 – 1º volume) que deveria ser excluída da relação processual, ou seja, que o autor seria carecedor em relação a ela. Foi ela que, tendo como objeto social a exploração do turismo (fl. 177 – 1º volume), escolheu mal o hotel, notadamente em se considerando que se tratava de excursão de jovens.

O Ministro Aldir passarinho Júnior votou de acordo com o relator:

Quanto a responsabilidade da agência, em função da explicitação de que se tratava de um pacote turístico, entendo que ela existe, porque há a responsabilidade pela culpa in iligendo. Se o pacote da agência compreende a prestação de serviços por terceiros, seja no transporte, seja no hotel, restaurantes, e outros que possam acontecer, a agencia tem, efetivamente, sua co-participação nessa prestação de serviço, ainda que o defeito dessa prestação, na hipótese dos autos, advenha da rede hoteleira, em função do acidente ocorrido na piscina.

Assim, por todo o exposto doutrinaria e jurisprudencialmente, tem-se a agência de turismo como responsável pelos acidentes e vícios dos serviços que intermedeia com a venda dos chamados pacotes turísticos.

3.6.O direito de regresso

O direito de regresso está disposto no artigo 13, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, in verbis: "Art. 13. [...] Parágrafo único. Aquele que efetivar o pagamento ao prejudicado poderá exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis, segundo sua participação na causação do evento danoso" (BRASIL, 2003, p. 16).

Sérgio Cavalieri Filho (2003, p. 494-495) demonstra ser o direito de regresso uma conseqüência natural da solidariedade existente entre os fornecedores e salienta:

O fato de ter o legislador, talvez por desatenção, inserido o dispositivo que trata do direito de regresso como parágrafo único do artigo que cuida da responsabilidade subsidiária do comerciante (art. 13) não deve levar ao entendimento de que a sua aplicação fica limitada aos casos de solidariedade entre o comerciante e o fabricante, produtor ou importador. Neste ponto há consenso entre todos os consumeristas do Código no sentido de ter sido infeliz a localização do dispositivo. Na realidade ele é aplicável a todo o caso de solidariedade, possibilitando ao devedor que satisfaz a obrigação voltar-se contra os coobrigados.

A norma do artigo 13 serve para todas as hipóteses em que um dos fornecedores co-responsáveis pagar ao consumidor a verba indenizatória, independentemente de se tratar de indenização referente a defeito ou vício (RIZZATTO NUNES, 2000, p. 177).

Como nem sempre quem paga causou o dano sozinho, ou nem sequer causou o dano, o código trouxe o direito de regresso, para que o fornecedor possa receber de volta aquilo que antecipou ao consumidor. Numa apropriada sub-rogação do crédito, vindo o antigo devedor a se tornar credor (BENJAMIN in BENJAMIN et. al, 1991, p. 75).

Sobre o tema, Roberto Senise Lisboa (2001, p. 240) explana:

A responsabilidade perante o consumidor é [...] solidária, por expressa disposição legal (art. 7.º, par. ún., da Lei 8.078/90), viabilizando-se em prol do fornecedor que proceder ao pagamento da indenização o direito de regresso em face dos demais fornecedores que participaram para o fato. [...] Sendo pertinente a ação de regresso, receberá o demandante a indenização do outro fornecedor, de acordo com o grau de sua participação para a ocorrência do dano em desfavor do consumidor.

O fornecedor que efetuar o ressarcimento ao consumidor tem direito a requerê-lo posteriormente dos verdadeiros responsáveis, integral ou parcialmente, de acordo com sua efetiva participação no evento danoso (GOMES, 2001, p. 81).

Cláudia Lima Marques (1995, p. 445, grifos da autora), com relação à responsabilidade dos fornecedores entre si, elucida:

A natureza da responsabilidade é então novamente subjetiva, nos moldes tradicionais, com toda dificuldade de prova que isso significa. Parece-nos que na inclusão da possibilidade de exercer o direito de regresso contra o verdadeiro causador do dano, em norma de ordem pública do CDC, afasta as estipulações contratuais entre fornecedores de renúncia à este direito. A ratio da norma do CDC, em uma das poucas passagens que invade o regime das relações comerciais entre os fornecedores, é assegurar que seu ideal de socialização de custos sociais da produção funcione[...].

Ainda sobre o tema, o Código veda a denunciação à lide: "Art. 88. Na hipótese do art. 13, parágrafo único, deste Código, a ação de regresso poderá ser ajuizada em processo autônomo, facultada a possibilidade de prosseguir-se nos mesmos autos, vedada a denunciação da lide" (BRASIL, 2003, p. 44).

O disposto no artigo 88 do CDC visa a economia processual, ao consentir ser a ação de regresso intentada nos mesmos autos, e ainda vedar o prolongamento do processo com ação paralela, ao proibir a denunciação da lide. Está também vedado o chamamento ao processo, mesmo sem expressa previsão, pois a norma pretende impedir a aglutinação de ações indiretas no mesmo feito (RIZZATTO NUNES, 2000, p. 178).

3.7. Projeto de Lei nº 5.120-C/01 em trâmite no Congresso Nacional

O Projeto de Lei nº 5.120-C/01, de autoria do deputado Alex Canziani, em trâmite no Congresso Nacional, visa impedir a responsabilização das agências de turismo, desrespeitando o Código de Defesa do Consumidor. Vejamos alguns artigos que ferem o Código Protetivo:

Art. 11. As relações contratuais entre as Agências de Turismo e os consumidores obedecem, naquilo que não conflite com esta Lei, ao disposto na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, e na legislação civil vigente e serão objeto de contratos escritos, contratos de adesão, de condições gerais ou de condições específicas para determinadas viagens.

Art. 13. A Agência de Viagens vendedora de serviços turísticos de terceiros, incluindo os comercializados pelas operadoras turísticas, é mera intermediária desses serviços e não responde pela sua prestação e execução.

Art. 14. Ressalvados os casos de comprovada força maior, razão técnica ou expressa responsabilidade legal de outras entidades, a Agência de Viagens e Turismo promotora e organizadora de serviços turísticos será a responsável pela prestação efetiva dos mencionados serviços, por sua liquidação junto aos prestadores dos serviços e pelo reembolso devido aos consumidores por serviços não prestados na forma e extensão contratadas, assegurado o correspondente direito de regresso contra seus contratados.

Art. 15. As Agências de Viagens e Turismo não respondem diretamente por atos e fatos decorrentes da participação de prestadores de serviços específicos cujas atividades estejam sujeitas a legislação especial ou tratados internacionais de que o Brasil seja signatário, ou dependam de autorização, permissão ou concessão.

Tal projeto viola a Carta Magna, em seu artigo 5º, inciso XXXII, que determina que o Estado promoverá a defesa do consumidor, pois isentará de responsabilidades a agência de turismo, pelo não-cumprimento ou pela má execução dos serviços intermediados por ela.

O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), com apoio da Associação Férias Vivas, está fazendo campanha contra o projeto e alertar os consumidores da supressão de suas garantias (IDEC, 2004, não paginado).

Luciana Rodrigues Atheniense (2002, p. 144-145) salienta que

O turista/consumidor lesado não pode ficar à mercê dos interesses de determinados grupos poderosos que, através de projetos e regulamentações internas, buscam esquivar-se de suas responsabilidades perante produtos/serviços que oferecem e prometem aos seus clientes. É inadmissível, portanto, deparar-se com ‘normas e projetos’ que podem frustrar a expectativa do turista/consumidor em ser ressarcido pelos seus direitos legítimos, ocasionados pela má execução dos serviços/produtos oferecidos e, sobretudo, prometidos pelas Agências de Viagem.

Esse projeto é uma tentativa de subtração da responsabilidade que o poder judiciário vem reconhecendo em prol do consumidor lesado. Essas decisões são uma conquista que devem ser preservadas. No caso de aprovação do projeto, a agência vai se ver livre da preocupação de eleger um serviço de transporte, de hotel etc., que possua qualidade e excelência, e, com isso, o consumidor vai ter suas garantias suprimidas (FÉRIAS VIVAS, 2004, não paginado).


CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Código de Defesa do Consumidor teve seu surgimento vinculado à massificação da sociedade e do grande poder exercido pelos fornecedores sobre os consumidores, que viam seus direitos podados pelo capitalismo exacerbado. Com isso, o sistema protetivo instaurou uma série de mecanismos com o fim de garantir o efetivo amparo ao consumidor, como a responsabilidade civil objetiva, que exige apenas prova do dano e do nexo causal, facilitando os meios de os consumidores comprovarem a violação de seus direitos em juízo.

A relação entre as agências de turismo e os turistas/consumidores dos seus serviços, chamados pacotes turísticos, é de consumo, conforme o disposto no Código Protetivo, e, como fornecedora, a agência possui o dever de ressarcir eventuais vícios ou danos ocasionados na prestação desses serviços, já que a responsabilidade imposta pelo código é objetiva, e todos os fornecedores da cadeia de consumo respondem solidariamente.

As agências de turismo são remuneradas, para prestarem ao consumidor um serviço, ofertam pacotes determinados e atraem os consumidores com a proposta de livrá-los das preocupações com a organização da viagem, ficando claro com isso tanto o interesse econômico das agências na prestação de tal serviço, quanto o do consumidor de transferir tais encargos – conseqüentemente a responsabilidade deve ser a solidária. Prova disso é a vasta doutrina e jurisprudência trazida neste trabalho.

Conforme demonstrado, a pesquisa alcançou seu objetivo de confirmar a responsabilização das agências sempre que os serviços ofertados ao consumidor se demonstrarem inadequados, em virtude da aplicação do princípio da solidariedade previsto no Código de Defesa do Consumidor.


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Abstract: The consumption relations had gained amplitude with the edition of the Consumer Defense Code in 1990 and its gaining more space in the legal world with the familiarization of the society to its deriving rights of this statute. The responsibility of the products suppliers and services is objective. Occurring breaking to any of the imposition duties to the supplier this will made responsible on the basis of the articles 12 to 25 of the Consumer Defense Code. The responsibility in the consumption relations is solidary - article 7º unique paragraph, 25 first paragraph and 34, all of the Protective Code. Thus, when there is more than one responsible for the damage, all will answer solidarily for the repairing of the damages being able to exert, later, the right to the third-party claim. The responsibility of the travel agencies is onall the services that the consumer acquires for intermediary of it, even being given for another company as service of transport, hotel, and others. The main objective of this study is assistant in the solution of referring conflicts to this subject, in view of the vulnerability of the consumer who looks a travel agency in order to travel with security, comfort and tranquillity, what many times do not occur, having to be the agency made responsible for all the damages caused to the consumer. The applied methodology will be the deductive one. The result waited to the ending of the monograph will be to demonstrate that the travel agency must be made responsible by any damage that the consumer comes to suffer in reason of the given services.

Key Words: Supplier. Consumer. Service. Consumption Relation. Vulnerability. Tourism Contract. Civil Liability. Travel Agency.


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REMOR, Priscilla de Oliveira. A responsabilidade civil das agências de turismo nas relações de consumo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 606, 27 fev. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6355. Acesso em: 23 abr. 2024.