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A constitucionalização do novo Código de Processo Civil

A constitucionalização do novo Código de Processo Civil

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O processo deixou de ser um conjunto de atos em busca da solução do litígio e passou a ser um ato de cooperativismo judicial, conforme assegurado pelo art. 6º do NCPC, o qual deixa claro o dever de colaboração entre as partes.

1. INTRODUÇÃO

O novo Código de Processo Civil (NCPC) foi uma grande inovação para o ramo processual civil, uma vez que o código anterior esteve em vigência desde 1973, ou seja, mais de uma década antes da atual carta magna.

Tamanhas foram as evoluções trazidas pelo novo código. Este ganhou uma parte introdutória em seus primeiros artigos, a qual visa positivar a constitucionalização do processo.

As novidades trazidas por esses artigos estão presentes em grande parte do NCPC, porém o presente trabalho visa discorrer acerca da audiência de mediação ou conciliatória, assim como as mudanças e novidades dentro do direito probatório.

Com o surgimento da constitucionalização do novo código, surgiram também dentro do processo, direitos e garantias fundamentais; as quais tornaram o direito probatório, assim como o Direito Processual como um todo, uma grande cooperativa. Assim, mudaram a visão que era suscitada pelo código de 1973 sobre o estado-juiz, trazendo o Estado Democrático de Direito para o Processo Civil.


2. UMA BREVE INTRODUÇÃO AO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

O surgimento do novo código é uma grande marca de evolução para o Processo Civil como um todo. Devemos considerar que o código anterior foi promulgado em 1973, ou seja, mais 40 anos atrás e, inclusive, anos antes da Constituição Federal vigente, a qual nasceu em 1988.

O novo Código de Processo Civil conta com uma nova reestruturação, este agora divide-se em: Parte geral, Parte especial e Livro complementar.

Outra grande inovação é que conforme citamos anteriormente, o NCPC é a primeira legislação processual civil a surgir após a carta magna. Sendo assim, é primeira a atrelar-se a ela.

Tão logo, em sua parte geral, o mesmo já faz transparecer os reflexos desse fenômeno de “neoconstitucionalismo” ao positivar princípios como o da igualdade, o da razoável duração do processo, o da publicidade e do dever de cooperação.

Nas palavras de Gonçalves:

Há hoje uma priorização de certos aspectos do processo, para os quais o sistema tradicional não dava solução. Os casos mais evidentes são os relacionados ao acesso a justiça e a lentidão dos processos, bem como a distribuição dos ônus decorrentes da solução do conflito. (Gonçalves, P. 45)

Podemos então dizer que com o surgimento do NCPC, o Processo Civil evoluiu deixando de ser um ramo do direito o qual buscava tão somente a solução do litigio de forma meramente “processual” através de um aglomerado de atos processuais; e passou a busca-lo de forma “constitucional” e ver o processo como uma cooperativa entre as partes visando as garantias fundamentais asseguradas pela carta Magna através de um processo de constitucionalização.


3. A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Uma grande novidade no Novo Código de Processo Civil se deu logo em seu art. 1º, o qual subordina as leis processuais civis a carta magna. Dispõe este art. que: Processo Civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.

Conforme sabemos, no ordenamento jurídico existe uma hierarquia de normas e o topo dessa pirâmide hierárquica é ocupado pela Constituição Federal. Aassim a partir do surgimento do novo código de Processo Civil, entende-se que as leis que regem Processo Civil devem ser examinadas sob sua ótica.

Atualmente, tanto a doutrina quanto a jurisprudência entendem que as normas que regem o Processo Civil, devem assegurar os direitos fundamentais estabelecidos pela Carta Magna vigente.

 “A doutrina atual costuma dizer que o Processo Civil “constitucionalizou-se” isto é, o processo deve ser examinado, estudado e compreendido a luz da constituição.” (Donizetti, p: 29)

Esta constitucionalização do Processo Civil pode ser chamada de “modelo constitucional do processo”. Vejamos o que diz Donizetti ao explicar o que é “modelo constitucional”:

O modelo constitucional do processo nada mais é, portanto, do que o resultado da interpretação das leis processuais a partir da necessidade de que o direito fundamental a um processo justo (tutela jurisdicional efetiva, célere e adequada) seja respeitado, consoante aos princípios e garantias constitucionais processuais. (Donizetti, p.30)

Isto significa que o julgador deverá interpretar as leis processuais civis sempre a luz dos direitos e garantias fundamentais assegurados pela constituição a fim de garantir um processo mais justo.

Tamanha é a importância desta constitucionalização do Processo Civil, que o novo código positivou algumas garantias fundamentais já em seus primeiros artigos.


4. ALGUNS PRINCÍPIOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

4.1  PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

Apesar de não estar positivado dentre os artigos do NCPC este princípio encontra fundamentação no art. 5 LIV da Constituição Federal, acerca deste princípio explica Gonçalves:

Desse princípio derivam todos os demais. A constituição preserva a liberdade e os bens, garantindo que o seu titular não os perca por atos não jurisdicionais do Estado. Além disso o judiciário deve observar as garantias inerentes ao Estado de direito, bem como deve respeitar a lei, assegurando a cada um o que é seu (Gonçalves, p. 65)

Ainda sobre este mesmo princípio, Donizetti salienta que “o devido processo legal é o princípio que garante o processo regido por garantias mínimas de meio e resultado, ou seja, com emprego de técnicas adequadas e conducentes a tutela pretendida” (Donizetti, p. 36)

4.2. PRINCÍPIO DA AÇÃO E PRINCÍPIO DO IMPULSO OFICIAL

Este princípio que vem disposto no art. 2º do NCPC dispõe que “o processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei.” Assim como sabemos, e conforme dispõe o próprio artigo do atual código de Processo Civil, a jurisdição é inerte a menos que seja provocada por uma das partes.

4.3. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE

                 Este princípio, além de disposto no art. 5º, XXV da Constituição Federal, agora vem positivado no art. 3º do NCPC da seguinte maneira: “não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito”. Este princípio basicamente consiste em dizer que uma vez invocada a jurisdição, não pode se abster do seu papel de julgar a lide, conforme explica Donizetti:

A indeclinabilidade ou inafastabilidade traduz a garantia de ingresso em juízo e consequentemente analise da pretensão formulada; isto é, o órgão jurisdicional constitucionalmente investido de jurisdição, uma vez provocado não pode delegar ou recusar-se a exercer a função de dirimir litígios.

4.4. PRINCÍPIO DA DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO E DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO

O art. 5º inciso LXXVIII acrescentado a Constituição Federal através da ementa constitucional nº 45/2004 e positivado pelo art. 4º do Novo CPC o qual estabelece que: “as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.”

Neste mesmo dispositivo, o legislador positivou o princípio da primazia de mérito, que se dá conforme explica Donizetti: “o julgador deve sempre que possível priorizar o julgamento do mérito superando ou viabilizando a correção dos vícios do processo e, consequentemente, aproveitando todos os atos do processo.” (Donizetti, p.40)

Ainda acerca do art. 4º do Novo Código de Processo Civil Gonçalves diz que “o dispositivo revela a preocupação geral do legislador com um dos entreves mais problemáticos ao funcionamento da justiça: a demora no julgamento dos processos.” (Gonçalves, p. 71).

Alguns outros artigos do NCPC traduzem este princípio, são eles: art. 6º; art. 282 e parágrafos; art. 317; art. 352; art. 488; art. 932 parágrafos único e 1.028 § 3.

4.5. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ PROCESSUAL

A boa-fé processual agora vem norteada no art.5º do Código de Processo Civil e este é claro “aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé.”

Quando falamos em boa-fé processual, falamos da boa-fé objetiva; ou seja, uma norma de conduta social e legal de lisura e honestidade.

A boa-fé processual também deve orientar a atuação jurisdicional. Isto é, tanto o juiz quanto as partes devem atuar conforme os princípios éticos de forma a propiciar a rápida e efetiva solução da lide. (Donizetti, p. 41)

4.6. PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO

O art. 6º do NCPC trouxe uma grande inovação para o Processo Civil, o princípio da cooperação (ou da colaboração). Este artigo estabelece que: “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”.

Constitui o desdobramento do princípio da boa-fé e da lealdade processual. Mas vai além ao exigir, não propriamente que as partes que as partes concordem ou ajudem uma a outra – já que não se pode esquecer que existe um litigio entre elas -, mas que colaborem para que o processo evolua adequadamente” (Gonçalves, p. 95)

Neves salienta que: “Aspecto interessante é a indicação expressa de que a cooperação entre as partes é voltada para a obtenção de uma decisão de mérito justa, efetiva e proferida em tempo razoável”.  (Neves, p. 310)

Assim, este princípio estabelece que todas as partes passem a colaborar dentro de seus limites de atuação no processo, a fim de que o processo possa fluir de maneira mais célere e justa.

Não somente o juiz deve colaborar para a tutela efetiva célere e adequada, mas todos aqueles que atuam no processo (juiz, partes, oficial de justiça, advogados, ministério público, etc.) tem o dever de colaborar. (Donizetti, p.42)

A partir desta mudança processual civil Donizetti ainda esclarece que agora “O processo deve, pois, ser um diálogo entre as partes e juiz, e não necessariamente um combate ou um jogo de impulso egoístico”. (Donizetti, p.42)

Afim de facilitar o entendimento deste dispositivo, a doutrina estabelece alguns dos deveres que deveriam ser recíprocos:

a) Dever de esclarecimento: “consiste na obrigação do juiz de esclarecer às partes eventuais dúvidas sobre suas alegações, pedidos ou posições em juízo”. (Donizetti, p. 43)

b) Dever de consulta: “Representa a obrigação de o juiz ouvir previamente as partes sobre as questões de fato ou de direito que possam influenciar o julgamento da causa”. (Donizetti, p. 43)

Este dever recebeu disposição própria no art. 10 do NCPC que afirma que “O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício. ”

c) Dever de prevenção: Cabe ao juiz apontar as partes possíveis defeitos que possam ser sanados, a exemplo do art. 321 do NCPC:

O juiz, ao verificar que a petição inicial. não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado. (BRASIL, 2015)

d) Dever de auxilio: Este dever é bastante presente no que diz respeito as provas, ele trata da obrigação do magistrado em ajudar a parte a superar dificuldades, como por exemplo de ônus.

Diversas são as hipóteses onde este princípio se faz presente dentro do NCPC, mais tarde, porém, veremos sua importância dentro do direito probatório.


5. PRINCÍPIO DA IGUALDADE OU DA ISONOMIA

Este princípio assegurado pela carta magna e, então, positivado na nova legislação processual civil, garante as partes o igual tratamento ao longo do processo.

Dispõe o art. 7º do NCPC acerca da isonomia processual que: “É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório”.

Donizetti salienta que: “é importante observar que a isonomia entre as partes significa igualdade real, uma vez que os sujeitos processuais em sua maioria são diferentes e devem ser respeitados em suas diferenças.” (P. 44)

5.1. Princípio do contraditório

 Disposto ao decorrer dos arts. 7, 9 e 10 do NCPC, o princípio do contraditório é um dos direitos fundamentais mais importantes da Constituição Federal; disposto no inciso LV do art. 5º, ele garante o direito de ambas as partes de ser previamente ouvida em juízo.

Outros princípios estão dispostos ao longo do NCPC, o art. 8º por exemplo discorre acerca de alguns: “ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.”

Todos estes princípios supracitados, assim como alguns outros, já eram garantias constitucionais dispostas na carta magna e agora encontram-se dispostos também no Código de Processo Civil em sua parte geral.


6. A AUDIÊNCIA CONCILIATÓRIA: UMA INOVAÇÃO PROCESSUAL

Para muitos, uma das grandes inovações do Novo Código de Processo Civil é a introdução da audiência conciliatória ou de mediação.

Neves por outro lado, chama a atenção para o fato de que apesar das peculiaridades, a audiência de conciliação se parece com a audiência preliminar do antigo código. Em suas palavras: “A audiência de conciliação do procedimento sumário é um ato processual complexo, tendo conteúdo semelhante ao da audiência preliminar prevista pelo art. 331 do CPC/1973.”

Positivada no art. 334 do NCPC, Donizetti explica sua finalidade da seguinte maneira:

                 O seu efeito é prático reside na possibilidade de composição entre as partes sem necessidade de previa apresentação de resposta pelo réu, o que, sem dúvida incentiva o diálogo e aumenta as chances de uma solução amigável, porquanto na maioria das vezes a peça de defesa apenas acirra os ânimos e instiga o prolongamento do litigio.

Ou seja, a audiência de conciliação é mais um exemplo da neoconstitucionalidade do Novo Código em busca de cooperação e acima de tudo de celeridade processual.

Algumas das maiores críticas acerca deste dispositivo, trata da necessidade da concordância de ambas as partes para que esta audiência deixe de se realizar. Encontra-se disposta no §4º, inc. I do referido dispositivo: “§ 4o A audiência não será realizada: I - se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual”.

Desta forma, leva-se em conta que se uma das partes não comparecer à audiência de conciliação, a mesma sofrera sansão conforme dispõe o §8º do mesmo dispositivo.


7. O DIREITO PROBATÓRIO NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Conforme explicamos anteriormente, o Processo Civil passou por importantes mudanças, mas a maior delas foi sua constitucionalização que trouxe para dentro do Direito Processual Civil os direitos e garantias anteriormente assegurados pela Constituição Federal; traduzindo assim, para o Processo Civil o significado de Estado democrático de direito. É a partir daí que devemos passar a interpretar o direito probatório.

O primeiro art. no livro referente a “provas” dentro do Novo Código de Processo Civil é o art. 369 e este reproduz o que dizia o art. 332 do código de 1973. Porém no que diz respeito aos sujeitos do processo, estes não são mais somente o juiz e as partes; uma vez que o enunciado nº 50 do fórum permanente de processualistas civis deixou claro no art. 369; art. 370, caput que: “os destinatários da prova são aqueles que dela poderão fazer uso, sejam juízes, partes ou demais interessados, não sendo a única função influir eficazmente na convicção do juiz”.

É nessa premissa que o art. 6º do código de Processo Civil, que trata do princípio da cooperação (ou da colaboração) o qual discorremos previamente, positiva deveres de colaboração entre as partes. Isto é, todos aqueles interessados no processo a fim de facilitar a resolução da lide e garantir um processo de fato célere e justo.

Vejamos que fica claro que por ser do interesse de todos os envolvidos que isso ocorra, o processo deixa de ser um aglomerado de atos processuais e passa a acontecer como uma grande cooperativa em que cada um age com interesse próprio e dentro de seus deveres processuais; porém em busca de um mesmo objetivo, colaborando assim, dentro do possível.

Esta inovação se fez bastante clara dentro do direito probatório. Com o surgimento deste dever de colaboração, vários dispositivos referentes a produção de prova foram remodelados.

“O art. 369 assegura, em harmonia com o ‘modelo constitucional do direito processual civil’, o ‘princípio da atipicidade da prova’, constante do art. 332 do CPC de 1973.”. (Bueno, p.271)

 O art. 370 do NCPC não se difere do código de 1973 ao dizer que “caberá ao juiz de oficio ou a requerimento das partes, determinar as provas necessárias ao julgamento de mérito” dando ao juiz a liberdade de requerer provas ex officio caso considere necessário, sem perder sua imparcialidade.

Para Luís Antônio Longo: “O artigo 370 reafirma a existência de poderes instrutórios. Tais poderes coadunam com a ideia de Estado Democrático de Direito”.

Porém, o parágrafo único deste mesmo dispositivo traz uma inovação, vejamos o que dispõe: “O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias.” (Grifo nosso)

Deste paragrafo extraímos que agora não basta o juiz indeferir as diligências que considerar inúteis ou meramente protelatórias, mas deverá fazê-lo em decisão fundamentada.

Luís Antônio Longo explica que: “O indeferimento de diligências inúteis ou protelatórias deve ser fundamentado. A fundamentação é exigida tento em vista a redação do artigo 11 do novo CPC que, em consonância com o inciso IX do artigo 93 da Constituição Federal”.

Dessa forma, percebe-se que esta inovação é mais um reflexo da constitucionalização sofrida pelo Novo Código de Processo Civil.

O art. 371 excluiu de seu texto a expressão “o juiz apreciará livremente a prova”, acerca desta alteração Longo deixa claro que:

                 O fato da redação do novo artigo ter suprimido a expressão “o juiz apreciará livremente a prova” não significa que o novel diploma legal abandonou este sistema de apreciação de provas consagrada no Código de 1973. A indicação de um standart mínimo pelo parágrafo primeiro do artigo 489, do novo CPC reforça a garantia constitucional da motivação das decisões judiciais (art.93,IX da CF). (Longo, P.308)

Porém, nem todos os doutrinadores compartilham do mesmo ponto de vista de Longo, e a mera retirada desta expressão vem causando uma certa divergência doutrinaria. Para alguns, o Principio do Livre Convencimento foi também excluído do NCPC.

                 Longo destaca ainda que, segundo Lúcio Delfino e Ziel Ferreira Lopes:

                 Sob o Estado Democrático de Direito, a decisão pública não pode depender em nada da vontade pessoal do juiz. Juiz decide; não escolhe, por mais que a isto se acople um raciocínio adjudicador – justificação ornamental, não estruturante à decisão. (Longo, P.308)

O art. 372 é um dispositivo totalmente novo, não existe qualquer dispositivo correspondente ao mesmo no código de 1973; isso porque a prova emprestada da qual trata este artigo é mais uma das grandes inovações do novo código.

Este dispositivo, diz que: “O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório.”

A positivação da possiblidade da utilização da prova emprestada é outro reflexo da busca de um CPC mais “constitucionalizado”, pois a objetividade deste artigo seria a economia processual, a razoável duração do processo, pois utiliza-se a prova emprestada com o intuito de dar efetividade às atividades processuais, podendo assim o juiz admitir as provas colhidas para outro processo.

Ainda, acerca da prova emprestada, dispõe o Enunciado 52 do fórum permanente:

“Para a utilização da prova emprestada, faz-se necessária a observância do contraditório no processo de origem, assim como no processo de destino, considerando-se que, neste último, a prova mantenha a sua natureza originária.”

O ônus da prova vem disposto no art., 373, este artigo passou por algumas inovações bastante significativas se comparado ao artigo 333 do código de 1973, sendo este um dos dispositivos referentes ao direito probatório que mais sofreu reflexos da constitucionalização do NCPC e do art. 6º do mesmo, que diz respeito a cooperação dentre os sujeitos processuais.

“Regra geral, ao autor cabe provar os fatos constitutivos de seu direito e ao réu incube provar os fatos impeditivos, modificativos e extintivos do direito do autor.” (Donizetti, p.566)

Porém, no § 1º esta visão estática que era característica do código de 1973 é quebrada e passa a adicionar a possibilidade da distribuição dinâmica do ônus da prova, sobre esta novidade explica Donizetti:

                 A distribuição dinâmica do ônus decorre dos princípios da lealdade, da igualdade, da boa-fé e do princípio da cooperação entre os sujeitos do processo e também com o órgão jurisdicional. De todo modo, deve o juiz aplicar esta nova regra com cautela de forma a afastar injustiças, mas sem prejudicar demasiadamente a produção probatória para uma das partes.

O § 3º traz ainda a possibilidade de as partes convencionarem entre si acerca da distribuição do ônus probatório; e seus incisos dispõe sobre as ocasiões aonde está distribuição não é permitida.

Já o § 4º por sua vez salienta que a convenção de que trata o § 3º não pode ser realizada antes ou durante o processo. Daí a necessidade de se atentar a qual o momento ideal para a inversão do ônus da prova. Donizetti atenta para o entendimento do STJ:

                 Segundo o STJ, a inversão do ônus da prova é regra de instrução (ou de procedimento), devendo a decisão judicial que determiná-la ser proferida preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurar à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo a reabertura de oportunidade para manifestar-se nos autos. EREsp 422.778-SP, Rel. Originário Min. João Otávio de Noronha, Rel. Para o acórdão Min. Maria Isabel Gallotti (art. 52, IV, b, do RISTJ), julgados em 29/2/2012. (Donizetti p.567)

O art. 374 por sua vez abrange os fatos que não dependem de prova, e não alterou a redação do art. 334 do CPC/73.

O art. 375 manteve em parte o que diz o art. 335 do CPC/73, este dispositivo dispõe que: “O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial.”

Se comparado ao art. 335 do código de 1973, veremos que o novo dispositivo excluiu parte do texto que diz: “em falta de normas jurídicas particulares”. Para Donizetti, esta alteração provocou um “verdadeiro retrocesso na legislação, porquanto abriu espaço para o julgador proferir suas decisões utilizando-se das regras de experiência de caráter não subsidiário” (Donizetti, p.568) 

Enquanto para alguns, como Longo, o texto do dispositivo reproduz o anterior. Isto é, a alteração não passa de uma mudança meramente textual.

O art. 376 que dispõe acerca do direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário manteve o texto do dispositivo anterior.

O art. 338 do CPC/73 dispunha sobre a carta precatória e a carta rogatória, enquanto o caput do art. 377 incluiu em seu texto o auxílio direto para suspensão do processo.

     O art. 378 reproduz o art. 339 do CPC/73 ao dizer que “ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade.”

     O art. 379 assegura o direito constitucional de não se constituir prova contra si mesmo. Sendo ele mais um dos dispositivos que sofrem influência da constitucionalização do Código de const, pois tal afirmação encontra respaldo na Constituição Federal vide art. 5º LVI e LXIII.  Outra inovação encontra-se no inciso II deste mesmo dispositivo, o qual dispõe novamente acerca do dever de colaboração, ao dizer que se deve “colaborar com o juízo na realização de inspeção judicial que for considerada necessária”.

     O art. 380 trata dos deveres colaborativos de terceiros e mantem o texto do art. 341 do CPC/73, porém inova ao atribuir poderes ao juiz em caso de descumprimento deste dever colaborativo ao positivar que: “poderá o juiz, em caso de descumprimento, determinar, além da imposição de multa, outras medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias”.

     Concluindo, no que se trata do direito probatório podemos ver grandes reflexos do fenômeno de neoconstitucionalismo sofrido pelo NCPC, pois podemos ver a busca de um processo mais célere e com colaboração entre as partes como um todo. Assim conforme estabelece o art. 6º da nova legislação em atos, como por exemplo a distribuição dinâmica do ônus da prova e ainda a inclusão e positivação de direitos constitucionais como se dá no art. 379.


8. CONCLUSÃO

     O Direito Processual Civil atingiu sem dúvida alguma seu maior marco desde o seu surgimento. Com a promulgação do atual Código de Processo Civil, o Direito Processual Civil passou a visar as garantias constitucionais e atrelar-se a constituição em busca de tais garantias.

     Conforme salientamos ainda, 3

     Importante ainda é atentar-se que, no que concerne ao direito probatório a partir do Enunciado 50 do Fórum Permanente de Processualistas Civis, o destinatário da prova não é mais tão somente o juiz, mas agora todos os interessados na solução do litígio, devendo eles colaborarem para a rápida solução da discussão.

     Outra inovação de suma importância no que se refere ao direito probatório trazida por esse dever de cooperação, é a inversão dinâmica do ônus da prova que permite que este seja atribuído conforme a possibilidade de obtenção da parte, e ainda se permite que as partes convencionem esta distribuição entre si, exceto em casos em que a lei disponha do contrário.

Assim fica claro que pode se falar na existência de uma cooperativa de trabalho “na qual todos os sujeitos processuais devam atuar em viés interdependente e auxiliar, com responsabilidade na construção dos pronunciamentos judiciais e em sua efetivação” (Longo, p. 306)


REFERÊNCIAS

CURIA, Luis Roberto; CESPEDES, Lívia; ROCHA, Fabiana Dias. Códigos de processo civil comparados. Obra coletiva de autoria da editora Saraiva. São Paulo: Saraiva, 2015.

Donizetti, Elpidio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 19. ed. Revisada e São Paulo: Atlas, 2016.

Enunciados do Forum Permanente de Processualistas Civis Disponível em: http://portalprocessual.com/wp-content/uploads/2015/06/Carta-de-Vit%C3%B3ria.pdf visitado em 19 de setembro de 2016.

Gonçalves, Marcus Vinicius Rios; Lenza, Pedro. Direito processual civil esquematizado. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

Neves, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil – Volume único. 8ª ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2016.

OAB. Novo código de processo civil anotado. Porto Alegre: OAB RS, 2015.

Novo CPC [64]: CPC 2015, artigos 374 a 380. Disponível em: visitado em 20 de setembro de 2016.



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