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O Ministério Público no Tribunal de Contas

O Ministério Público no Tribunal de Contas

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Sua atuação restringe-se ao Tribunal de Contas, porém, juntamente com essa Corte, ostenta posição fundamental de guardião do erário e dos interesses da coletividade por meio do exercício do controle externo da administração pública.

Resumo: O presente trabalho disserta sobre o Ministério Público atuante nas Cortes de Contas brasileiras. O Ministério Público especial, como é chamado pela doutrina, foi introduzido no ordenamento pátrio há muitos anos, e hoje é reconhecido como órgão de extração constitucional, ante o artigo 130 da Constituição Federal. Firmado está que é órgão diverso do parquet comum, assim como da Procuradoria-Geral do Estado. Sua atuação restringe-se ao Tribunal de Contas, porém, juntamente com essa Corte, ostenta posição fundamental de guardião do erário e dos interesses da coletividade por meio do exercício do controle externo da administração pública. Abordamos o posicionamento do Supremo Tribunal Federal no sentido de arredar do referido órgão as autonomias financeira e administrativa, ainda que as reconheça para o próprio Tribunal de Contas e Ministério Público ordinário. Concluímos, entretanto, que seria mister a plena independência do parquet especial, principalmente para dar maior liberdade ao membro da instituição quando do exercício de suas atribuições constitucionais. O presente trabalho constitui uma singela contribuição para a difusão dos debates e estudos acerca do tema, visando ao fortalecimento das instituições.


INTRODUÇÃO

Há muito em nosso ordenamento, o Ministério Público especial é um órgão atuante nas Cortes de Contas.

Essas Cortes são essenciais ao controle externo do dinheiro público, realizado pelo Poder Legislativo com seu auxílio.

Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, acirrada discussão sobreveio acerca da natureza jurídico-organizacional do parquet especial, até o Pretório Excelso se pronunciar à respeito (ADIN 789-1 do Distrito Federal).

Isso foi o que nos despertou empenho.

Em alguns pontos ao longo deste trabalho, nos referimos ao Tribunal de Contas de um modo abrangente, ou seja, de maneira a englobar tanto o Tribunal de Contas da União, quanto os dos Estados e Municípios. Tal posicionamento se deu em virtude da obrigatória observância, pelas unidades federadas, ao modelo ditado pela Constituição Federal – artigo 75.

Assim, assinalamos desde já, que as estruturas das Cortes brasileiras devem observar o paradigma estabelecido na Constituição Federal.

Cabe esclarecimento, ainda, acerca da nomenclatura utilizada: membros do Tribunal de Contas para os Ministros ou Conselheiros, estes últimos no plano estadual e municipal, por se tratar de órgão colegiado; e integrantes dos Tribunais de Contas aos Ministros, Conselheiros, membros do Ministério Público especial, servidores, Ministros-substitutos.

Quanto aos capítulos, no presente trabalho, procuramos expor inicialmente a base histórica, ante a tentativa de proporcionar uma melhor visão dos institutos – Ministérios Públicos (ordinário e especial) e Tribunais de Contas.

Após, passamos à análise do direito comparado, com os modelos clássicos dos Tribunais de Contas, baseada na brilhante tese do Prof. Gualazzi.

Ao analisar os principais aspectos do Tribunal de Contas na Carta Republicana de 1988, examinamos a instituição que abriga o Ministério Público especial e que possui lugar de suma importância na sociedade, ante sua atuante fiscalização financeira, contábil, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da Administração. Fiscalização essa que temos que reforçá-la cada vez mais, na intenção de construir uma sociedade mais democrática e com um melhor aproveitamento do dinheiro público.

Por fim, passamos ao capítulo do Ministério Público especial com seus principais pontos abordados, visando a uma maior compreensão do instituto.


1. ASPECTOS HISTÓRICOS

1.1. MINISTÉRIO PÚBLICO ORDINÁRIO

Antes de abordarmos a parte histórica do Tribunal de Contas e do Ministério Público especial, necessária uma rápida análise, porém relevante, do surgimento e evolução do Ministério Público ordinário.

Apesar de não ser pacífico entre os estudiosos, a origem do Ministério Público está no Egito antigo, há mais de 4.000 anos. Alguns mencionam que o surgimento deu-se em Roma, elevando a importância de suas instituições (os censores, os questores, o fisci advocatum, o defensor civitatis, os procuratores caesaris, o praetor fiscalis, os irenarcha, os praefectus urbis, os praesides os curiosi, os frumentarii e os stationarii) e desprezando completamente a origem egípcia.

No Egito, os procuradores do rei – magiai – exerciam funções parecidas às que desempenha o parquet de hoje. Eram, genericamente, "a língua e os olhos do rei", do Faraó. Suas funções, dentre outras, consistiam em castigar rebeldes, reprimir violentos, proteger os cidadãos, defender certas pessoas, perseguir criminosos, ouvir as palavras da acusação e participar de instruções a fim de se descobrir a verdade.

Outro registro do instituto vem dos Tribunais Babilônicos em 2.000 a.C. – Código de Hamurabi – em que um representante do rei chamado "redoudaiani" era uma espécie de Ministério Público.

Merece menção o período da Grécia clássica, onde teriam existido os temóstetas, responsáveis pelo exercício do direito de acusação, bem como os éforos que formavam um Tribunal idealizado para controlar os atos dos dois reis espartanos e dos gerontes. Todos estes institutos gregos, no geral, se responsabilizavam pela execução da lei e pelo exercício da acusação penal.

Mais adiante, com a Idade Média, na Europa Ocidental, nota-se a figura dos saions germânicos, que atuavam como funcionários fiscais, criados pelo "Imperador do Ocidente Carlos Magno". Defendiam os órfãos, o Erário e os interesses dos incapazes, acusavam os tutores impenitentes e criminosos, interviam na justiça e executavam sentenças. Ainda na Alemanha, existia a figura do Gemeiner Anklager, que, na omissão da vítima, exercia a função de acusador criminal. Os bailios e os senescais tinham a responsabilidade de defender os interesses dos senhores feudais em juízo e também são consideradas figuras com atividades análogas às do Ministério Público. 1

Parte da doutrina refuta algumas das instituições, principalmente a grega e a romana, pois seria pouco provável o surgimento de uma instituição nos moldes do Ministério Público.

Nessa esteira, até aqui, as origens apontadas remontam tão-somente uma proximidade com o Ministério Público; sua verdadeira raiz está na França com a Ordonnance de Felipe, o Belo, em 25 de março de 1303. Foi a "certidão de nascimento" do instituto, a primeira menção expressa num diploma legal – "procureur du roi (les gens du roi)".

Nessa época, os procuradores do rei eram funcionários incumbidos da tutela dos interesses gerais do Estado, seja como acusador público, criminal ou custus legis, um verdadeiro longa manus do soberano, dado o caráter absolutista do governo.

Tal ato da realeza foi uma reação aos senhores feudais, os quais arranhavam a sua soberania, e, através dele, o rei chamou para si o poder supremo, pôs-se acima de todos – "super omnia" – para poder atuar perante o Poder Judiciário.

Assim, deu-se origem à expressão parquet, conforme explicação de Tornaghi:

A fim de conceder prestígio e força a seus procuradores, os reis deixaram sempre clara a independência destes em relação aos juízes. O Ministério Público constitui-se em verdadeira magistratura diversa da dos julgadores. Até os sinais exteriores dessa proeminência foram resguardados; membros do Ministério Público não se dirigiam aos juízes do chão, mas de cima do mesmo estrado ("parquet") em que eram colocadas as cadeiras desses últimos e não se descobriam para lhes endereçar a palavra, embora tivessem de falar de pé (sendo por isso chamados "Magistrature debout", Magistratura de pé). (1976. Apud MACHADO, 1998, p. 14.)

Posteriormente à Ordonnance do Rei Felipe, outras vieram, ainda na fase da Monarquia Absolutista, a fim de ampliar o campo de atuação do Ministério Público. Dentre elas podemos destacar a Ordonnance Criminelle, editada em 10 de agosto de 1670 pelo Rei Luís XIV.

A Revolução Francesa, em 1789, com um caráter nitidamente descentralizador, e a conseqüente legiferação que a procedeu, fez com que o Ministério Público fosse incluído no âmbito do Poder Executivo, definindo-o como agente perante os Tribunais em que atuava.

Com essa inclusão, restou garantida sua independência em relação ao Parlamento e ao Poder Judiciário, inclusive vedando a possibilidade de censura e crítica por parte dos juízes às suas conclusões.

Finalizando a análise francesa, surge em 20 de abril de 1810 o "Cod d’Instruction Criminelle" onde se atribuiu ao Ministério Público uma melhor organização. Importante ressaltar que no referido país, até hoje, o instituto guarda um estreito vínculo com o Poder Executivo, devido à sujeição ao Ministro da Justiça, especialmente no âmbito disciplinar.

No Brasil, as primeiras referências vieram com as Ordenações Manuelinas de 1521, onde o promotor era o fiscalizador da lei e da sua execução.

Com o advento de um governo geral, em 1548, surge o primeiro texto nacional acerca do tema, datado em 09 de janeiro de 1609. O referido texto disciplinava a composição do Tribunal da Relação da Bahia e previa de forma expressa "o Promotor de Justiça".

O Código de Processo Criminal de 1832 foi o primeiro a dedicar tratamento sistemático e abrangente ao instituto. Após, é editado Decreto, em 11 de outubro de 1890, da autoria de Campos Sales, onde foi instituída a independência do parquet.

No âmbito constitucional, a primeira Carta Republicana quedou-se inerte. Já a de 1934 incluiu o Ministério Público nos artigos 95 a 98.

Com a Constituição de 1937 veio o retrocesso e a exclusão, constando, tão-somente, uma referência ao Procurador-Geral da República.

Posteriormente, tida como a mais democrática das constituições até então, a Carta de 1946 trouxe a independência funcional do Ministério Público com inúmeras disposições favoráveis.

A Constituição de 1967 inovou em dois pontos: subordinação do Ministério Público ao Poder Judiciário e regulamentação séria do concurso público para provimento das vagas de promotor – artigo 138, § 1°.

A Emenda Constitucional n° 1, de 17 de outubro de 1969, retirou algumas conquistas e o subordinou ao Poder Executivo, ante a instalação do governo militar. Porém, a Emenda Constitucional n° 07, de 13 de abril de 1977, inovou em outros pontos, como a organização por carreira do Ministério Público Estadual através de lei estadual.

Com o início da abertura para um regime democrático, foi promulgada a lei complementar n° 40, de 14 de dezembro de 1981, que traçou novo aspecto ao Ministério Público.

Por fim, a Constituição Federal de 1988 consagra o Ministério Público como uma instituição Republicana, tal qual como lançou Campos Sales, sem olvidar das leis orgânicas e demais normas esparsas que ampliam, e instrumentam, e regulam, e garantem o instituto.

E conclui Marco A. L. Caminha (2000):

Enfim, a análise histórica do Ministério Público revela que essa instituição, muda de função ao transitar da sociedade política para a sociedade civil, ou seja, desvincula-se do aparelho coercitivo do Estado (do aparato burocrático responsável pela dominação através da coerção) para integrar, no âmbito da sociedade civil, a parcela dos valores e interesses que compõem uma concepção democrática do mundo e que atuam no sentido da transformação da realidade (os sujeitos políticos coletivos que buscam a hegemonia democrática na batalha ideológica que se trava no seio e através da sociedade civil). Aquele Ministério Público que antes trabalhava exclusivamente na defesa dos interesses do Poder Público, sempre coincidentes com os interesses do seu titular (o Rei) e nem sempre com os do povo, hoje defende os interesses deste, quer sejam coincidentes ou não com os dos titulares do Poder (Administradores).

1.2. TRIBUNAL DE CONTAS

O surgimento do Tribunal de Contas data do ano de 1714, em Berlim, pelo Rei Frederico Guilherme I, da Prússia, denominado Controladoria Geral de Contas. Tal órgão surgiu para evitar o desperdício do dinheiro real e fornecer mais riquezas ao monarca 2.

Outro registro vem da França, em 16 de setembro de 1807, criado por Napoleão Bonaparte, que em pronunciamento constante nos Invalides, de Paris, disse: "Quero que mediante uma vigilância ativa seja punida a infidelidade e garantido o emprego legal dos dinheiros públicos" (Apud MARANHÃO, 1992, p. 327).

Outros países também o instituíram, como a Holanda, Bélgica, Itália, França, Portugal e quase todos os países do mundo civilizado. Porém, temos como modelos clássicos os Tribunais da França, Bélgica e Itália, que merecem análise em capítulo próprio.

No Brasil, no período colonial, ainda sendo uma forma de controle e não propriamente uma Corte de Contas, as Juntas das Fazendas das Capitanias e a Junta da Fazenda do Rio de Janeiro, jurisdicionadas a Portugal, iniciaram a história do Tribunal de Contas no Brasil.

Com D. João VI, foi instalado o Erário Régio em 1808, e criado o Conselho da Fazenda, com atribuição de acompanhar a execução da despesa pública.

Após a proclamação da independência do Brasil, em 1822, o Erário Régio foi transformado no Tesouro pela Constituição de 1824, prevendo-se, então, os primeiros orçamentos e balanços gerais.

Apesar do surgimento da Corte de Contas ter ocorrido após a República, a idéia de sua criação vem do Senado do Império, em 23 de junho de 1826, com um projeto apresentado por Felisberto Caldeira Brandt – Visconde de Barbacena, e de José Inácio Borges. Tal projeto foi combatido por Manoel Jacinto Nogueira da Gama – Conde e, logo depois, Marquês de Baependi.

Muito se discutiu em torno do tema. Para uns, as contas públicas deviam ser examinadas por um órgão independente, porém, outros refutavam esse entendimento, por entenderem que elas podiam continuar sendo controladas por aqueles mesmos que as realizavam. Dentre as personalidades que defendiam a criação da Corte, seja propondo projetos ou por outra forma, destacamos Manuel Alves Branco – Ministro da Fazenda, Pimenta Bueno, Visconde do Uruguai.

Com a queda do Império, a conseqüente proclamação da República e as reformas político-administrativas do Governo Provisório, foi possível tornar realidade, finalmente, o Tribunal de Contas da União.

O iminente jurista Rui Barbosa, à época Ministro da Fazenda, redigiu, em 7 de novembro de 1890, o Decreto nº 966-A, que criava o Tribunal de Contas da União, norteado pelos princípios da autonomia, fiscalização, julgamento, vigilância e energia.

Cabe ressaltar trechos da exposição de motivos do referido Decreto, que conceituava o Tribunal de Contas como sendo:

(...) corpo de magistratura intermediária à Administração e à Legislatura que, colocado em posição autônoma, com atribuições de revisão e julgamento, cercado de garantias contra quaisquer ameaças, possa exercer as suas funções vitais no organismo constitucional, sem risco de converter-se em instituição de ornato aparatoso e inútil.

E mais:

(...) convém levantar, entre o Poder que autoriza periodicamente a despesa e o Poder que cotidianamente a executa, um mediador independente, auxiliar de um e de outro, que, comunicando com a Legislatura, e intervindo na Administração, seja, não só o vigia, como a mão forte da primeira sobre a segunda, obstando a perpetração das infrações orçamentárias por um veto oportuno aos atos do Executivo, que direta ou indireta, próxima ou remotamente, discrepem da linha rigorosa das leis de finanças. (Apud COTIAS E SILVA, 1999, p. 36)

A Constituição de 1891, a primeira republicana, "instituiu" definitivamente o Tribunal de Contas da União, inscrevendo-o no seu artigo 89. Segundo os dizeres do próprio Rui Barbosa, em artigo publicado no jornal A Imprensa, de 10 de dezembro de 1900, no qual critica a Carta, na Constituição deveria constar "é mantido" em lugar de "é instituído", tendo em vista que o Tribunal era antecedente à Constituição. Vejamos um segmento do referido texto:

A República estava em maré de idéias generosas. Ia a Constituição reforçar o júri com a sanção Constitucional. Ia abolir constitucionalmente a pena de morte. Ia decretar, no pacto fundamental, a substituição da guerra pelo arbitramento. Natural era que lhe sorrisse também, como um atavio a mais para as galas de sua obra, a inovação fiscal destinada a coarctar os abusos do Governo contra o orçamento. Elevou-se, pois, no Tribunal de Contas. Dir-se-ia que se tomara por ele até de ciúmes. Quisera tê-lo criado, para não ter, nesse merecimento, rivais. Tal satisfação do amor próprio lhe não permitia o fato oficial da pré-existência dessa instituição. Tudo podem, porém, as Constituições. A de 1891 eliminou o fato, graças a uma pia mentira, declarando criar a instituição já criada. "É instituído", diz, "um Tribunal de Contas"; quando, se houvesse de ser veraz, como especialmente das Constituições se deve supor, teria que dizer, como a respeito do júri: "É mantido". (Apud MARANHÃO. 1992, p. 36)

Apesar da existência do Decreto nº 966-A, bem como da Constituição de 1891, o Tribunal de Contas somente foi instalado em 17 de janeiro de 1893, devido à atuação do Ministro da Fazenda do Governo Floriano Peixoto – Tenente Coronel Innocêncio Serzedello Corrêa.

Inicialmente, teve competência para o exame, revisão e julgamento de todas as operações relacionadas com a receita e a despesa da União. O mecanismo de fiscalização se fazia pelo sistema de registro prévio.

A Constituição de 1891, que institucionalizou o Tribunal, conferiu-lhe a competência para liquidar as contas da receita e despesa e verificar a sua legalidade antes de serem prestadas ao Congresso Nacional. 3

A partir daí, teve prosseguimento a história do Tribunal de Contas da União, ora dilatando seu campo de atuação, ora coibindo. Exemplo de restrição ocorreu logo em seguida à instalação do Tribunal pelos Decretos do próprio Governo Floriano Peixoto, que retiravam a competência para impugnar despesas consideradas ilegais, o que acarretou a demissão do Ministro Serzedello Corrêa, conforme sua carta de 27 de abril de 1893:

Esses decretos anulam o Tribunal, o reduzem a simples Ministério da Fazenda, tiram-lhe toda a independência e autonomia, deturpam os fins da instituição, e permitirão ao Governo a prática de todos os abusos e vós o sabeis - é preciso antes de tudo legislar para o futuro. Se a função do Tribunal no espírito da Constituição é apenas a de liquidar as contas e verificar a sua legalidade depois de feitas, o que eu contesto, eu vos declaro que esse Tribunal é mais um meio de aumentar o funcionalismo, de avolumar a despesa, sem vantagens para a moralidade da administração.

Se, porém, ele é um Tribunal de exação como já o queria Alves Branco e como têm a Itália e a França, precisamos resignarmo-nos a não gastar senão o que for autorizado em lei e gastar sempre bem, pois para os casos urgentes a lei estabelece o recurso.

Os governos nobilitam-se, Marechal, obedecendo a essa soberania suprema da lei e só dentro dela mantêm-se e são verdadeiramente independentes.

Pelo que venho de expor, não posso, pois Marechal, concordar e menos referendar os decretos a que acima me refiro e por isso rogo vos digneis de conceder-me a exoneração do cargo de Ministro da Fazenda, indicando-me sucessor. Tenente-Coronel Innocêncio Serzedello Corrêa 4

A Carta de 1934, promulgada na fase de retração do Tribunal, fase esta entre a Revolução de 1930 e o Estado Novo de 1937, trouxe avanços significativos, mas sua reduzida permanência no cenário brasileiro não permitiu que se operassem os efeitos almejados. Os avanços obtidos foram logo derrogados pela Carta de 1937, tendo o Tribunal de Contas quedado às margens, no esquecimento.

Entretanto, após 1945, com o fim da Era Vargas e a nova Constituição de 1946, o instituto retoma suas forças.

Vejamos, então, as Constituições de 1934 a 1946.

No texto supremo de 1934, o Tribunal de Contas era tido como "órgão de cooperação nas atividades governamentais" e possuía oito referências (artigos 99 a 102 e seus parágrafos).

Constitucionalizou a atividade judicante das contas dos responsáveis por dinheiros ou bens públicos e dilatou as competências da Carta anterior, ressalvando que muitas delas o Tribunal já vinha exercendo, ante às leis ordinárias já editadas. Podemos citar algumas, como por exemplo: proceder ao acompanhamento da execução orçamentária – diretamente ou por delegações; registro prévio de qualquer ato da administração pública de que resultasse obrigação de pagamento; manteve o registro dos contratos que interessassem à despesa ou à receita (caso houvesse recusa pelo Tribunal, a execução seria suspensa até pronunciamento do Poder Legislativo – sem o registro, os contratos não resultavam perfeitos e acabados); apresentação de parecer prévio sobre as contas do Presidente, para posterior encaminhamento à Câmara dos Deputados.

Após a Constituição de 1934, surgiram novas leis e decretos regulamentando as disposições, destacando-se o Decreto Legislativo nº 12, de 28 de dezembro de 1934 e a Lei nº 156, de 24 de dezembro de 1935, que se transformou na lei orgânica do Tribunal de Contas em face da nova Constituição (o corpo de Ministros passou a contar com sete membros e fixou-se em quatro o número de auditores, além de dois membros do Ministério Público: um procurador-geral e um adjunto).

A segunda Carta Republicana vigorou somente até 10 de novembro de 1937, com o advento de nova Constituição e o Estado Novo, por Getúlio Vargas.

A Constituição de 37, a "polaca", devido ao texto inspirado no regime fascista europeu polonês, com preponderância do Poder Executivo sobre os demais poderes da República, fez com que o Tribunal de Contas perdesse força, bem como o Congresso Nacional, que havia sido fechado pelo ditador.

O Tribunal de Contas encontrava-se no artigo 114 da Constituição:

Art. 114 - Para acompanhar, diretamente ou por delegações organizadas de acordo com a lei, a execução orçamentária, julgar das contas dos responsáveis por dinheiros ou bens públicos e da legalidade dos contratos celebrados pela União, é instituído um Tribunal de Contas, cujos membros serão nomeados pelo Presidente da República, com a aprovação do Conselho Federal. Aos Ministros do Tribunal de Contas são asseguradas as mesmas garantias que aos Ministros do Supremo Tribunal Federal.

Os Ministros continuaram a ser nomeados pelo Presidente, mas agora quem os aprovava era o Conselho Federal – vinculado ao Executivo.

Houve uma omissão quanto ao parecer prévio do Tribunal, ante às contas prestadas pelo Chefe do Poder Executivo. Ocorria que o Presidente as prestava, o Tribunal emitia parecer (não opinativo) e o próprio Presidente da República as aprovava por meio de decreto-lei.

O Decreto-lei nº 7, de 17 de novembro de 1937, dizia que o Tribunal de Contas continuaria a exercer, em caráter provisório, sua jurisdição e competências anteriores, com a recusa a registro devendo ser comunicada ao Presidente da República, e não mais ao Congresso Nacional. Assim, todas as demais atribuições do Tribunal foram mantidas, salvo a exceção mencionada no parágrafo anterior.

Ainda sob a égide na Carta de 1937, surge a nova lei orgânica do Tribunal de Contas, identificada pelo Decreto-lei nº 426, de 12 de maio de 1938, alterado pelo Decreto-lei de nº 475, de 8 de junho do mesmo ano.

Com o fim da Era Vargas e a chegada da Democracia, a promulgação da Constituição de 1946, que colocou o Tribunal de Contas como órgão auxiliar do Poder Legislativo (Capítulo II – Do Poder Legislativo, Seção VI – Do Orçamento – artigos 76 e 77), trouxe poucas inovações em matéria de competências da Corte de Contas. O que ocorreu foi uma reprodução do texto de 1934, restituindo as atribuições suprimidas pelo Estado Novo.

Art. 76 - O Tribunal de Contas tem a sua sede na Capital da República e jurisdição em todo o território nacional.

§ 1º - Os Ministros do Tribunal de Contas serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, e terão os mesmos direitos, garantias, prerrogativas e vencimentos dos Juízes do Tribunal Federal de Recursos.

§ 2º - O Tribunal de Contas exercerá, no que lhe diz respeito, as atribuições constantes do art. 97, e terá quadro próprio para o seu pessoal.

Art. 77 - Compete ao Tribunal de Contas:

I - acompanhar e fiscalizar diretamente, ou por delegações criadas em lei, a execução do orçamento;

II - julgar as contas dos responsáveis por dinheiros e outros bens públicos, e as dos administradores das entidades autárquicas;

III - julgar da legalidade dos contratos e das aposentadorias, reformas e pensões.

§ 1º - Os contratos que, por qualquer modo, interessarem à receita ou à despesa só se reputarão perfeitos depois de registrados pelo Tribunal de Contas. A recusa do registro suspenderá a execução do contrato até que se pronuncie o Congresso Nacional.

§ 2º - Será sujeito a registro no Tribunal de Contas, prévio ou posterior, conforme a lei o estabelecer, qualquer ato de Administração Pública de que resulte obrigação de pagamento pelo Tesouro nacional ou por conta deste.

§ 3º - Em qualquer caso, a recusa do registro por falta de saldo no crédito ou por imputação a crédito impróprio terá caráter proibitivo. Quando a recusa tiver outro fundamento, a despesa poderá efetuar-se, após despacho do Presidente da República, registro sob reserva do Tribunal de Contas e recurso ex officio para o Congresso Nacional.

§ 4º - O Tribunal de Contas dará parecer prévio, no prazo de sessenta dias, sobre as contas que o Presidente da República deverá prestar anualmente ao Congresso Nacional. Se elas não lhe forem enviadas no prazo da lei, comunicará o fato ao Congresso Nacional para os fins de direito, apresentando-lhe, num e noutro caso, minucioso relatório de exercício financeiro encerrado. (grifo nosso)

As inovações consubstanciam-se no julgamento das contas dos administradores das entidades autárquicas e julgamento da legalidade das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, as quais, até então, o Tribunal apenas examinava, sem olvidar do restabelecimento da prestação de contas do Presidente da República.

A Carta fez com que o Tribunal de Contas utilizasse todos os elementos dos sistemas clássicos, baseados nos exames prévio e posterior, veto absoluto e relativo com registro sob protesto, tudo dependendo da natureza dos atos jurídicos e fatos administrativos e seus aspectos. 5

Cabe ressaltar o surgimento de nova lei orgânica – n° 830, de 23 de setembro de 1949, que regulamentou o texto de 46. Ela definiu a Corte como órgão auxiliar do Poder Legislativo na fiscalização da administração financeira da União e principalmente na execução do orçamento.

O Tribunal de Contas passou a se constituir de nove Ministros e a exigência de bacharelado em direito deu lugar ao "comprovado saber, especialmente para o desempenho do cargo".

Além dessas modificações, podemos citar a divisão do Tribunal em câmaras, o concurso de provas e títulos para o cargo de auditor e a introdução do instituto da defesa oral no Tribunal.

Com o golpe militar, em 31 de março de 1964, a conseqüente promulgação da Constituição de 1967, o Decreto-lei n° 199, de 25 de fevereiro de 1967 (lei orgânica do Tribunal de Contas da União), e ainda, a Emenda Constitucional n° 1, de 17 de outubro de 1969, o Tribunal de Contas perdeu competências e teve suas atribuições suprimidas pelo regime autoritário.

Dentre as modificações, podemos citar: retirou-se o exame e julgamento prévio dos atos e contratos geradores de despesas, bem como o julgamento da legalidade das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ficando a cargo do Tribunal, tão-somente, a apreciação da legalidade para fins de registro, não dependendo do Tribunal para melhorias posteriores; concedeu-se a possibilidade de efetuar auditorias financeiras e orçamentárias sobre as contas dos três poderes, instaurando-se desde então os sistemas de controle externo (exercido pelo Congresso com o auxílio da Corte de Contas) e interno (exercido pelo Poder Executivo).

Merece destaque o dispositivo referente aos fundos de participação, outra inovação da Carta de 67. O texto fixou que a lei atribuiria à Corte a competência para efetuar o cálculo das cotas estaduais e municipais dos Fundos de Participação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, independente de autorização orçamentária ou de outra formalidade, devendo a entrega efetuar-se mensalmente por intermédio dos bancos oficiais. Porém, tal atividade durou até a edição do Decreto 1.805, de 01° de outubro de 1980.

Art 26 – (...)

§ 1º - A aplicação dos Fundos previstos neste artigo será regulada por lei, que cometerá ao Tribunal de Cantas da União o cálculo das cotas estaduais e municipais, independentemente de autorização orçamentária ou de qualquer outra formalidade, efetuando-se a entrega mensalmente, por intermédio dos estabelecimentos oficiais de crédito. (grifo nosso)

Quanto aos Municípios, a Carta trouxe a possibilidade de intervenção caso não seja prestada contas na forma da lei, bem como o parecer prévio sobre as contas do Prefeito, sem se olvidar de que a criação de Tribunais de Contas Municipais somente era permitida nas cidades com mais de dois milhões de habitantes e renda tributária superior a quinhentos milhões de cruzeiros.

A Emenda Constitucional n° 1 ampliou a competência das Cortes de Contas Estaduais, que exerciam o controle externo das Câmaras Municipais, sendo que tais Câmaras poderiam ser controladas por órgão estadual criado para tal fim.

Antes de adentrarmos na atual Constituição, cabe mencionar o primeiro regimento interno do Tribunal de Contas da União, disposto pela resolução administrativa n° 14, de 12 de dezembro de 1977, a qual consolidou diversas normas regimentais vigentes. Hoje, o regimento interno se traduz na resolução n° 155, de 04 de dezembro de 2002.

Finalmente, pela Constituição Federal de 1988, o Tribunal de Contas da União teve sua jurisdição e competências substancialmente ampliadas. Recebeu poderes para, no auxílio ao Congresso Nacional, exercer a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade e economicidade e a fiscalização da aplicação das subvenções e renúncia de receitas. O estudo do Tribunal de Contas ante a atual Carta merece capítulo próprio, onde exporemos as peculiaridades pertinentes.

1.3. MINISTÉRIO PÚBLICO ESPECIAL

Diferentemente do Ministério Público ordinário, o órgão atuante nas Cortes de Contas já possuía autonomia funcional desde a sua origem. Seu surgimento ocorreu após a criação do parquet comum, com a edição do Decreto n° 1.166, de 17 de outubro de 1892, cujo artigo 19 assim dispunha, inclusive atribuindo o direito de voto ao representante do Ministério Público: "Art. 19 – O pessoal do Tribunal de Contas compor-se-á de cinco membros, o Presidente e quatro Diretores, com voto deliberativo, um dos quais representará o Ministério Público."

E, ainda, com o Decreto n° 392, de 08 de outubro de 1896, que reorganizou o Tribunal de Contas no Brasil, a fim de lhe atribuir qualidade de órgão próprio, conforme artigo 81, agora, sem o direito a voto:

Artigo 81 – O representante do Ministério Público é o guarda da observância das leis fiscais e dos interesses da Fazenda perante o Tribunal de Contas. Conquanto representante dos interesses da Pública Administração, não é todavia delegado especial e limitado desta, antes tem personalidade própria e no interesse da lei, da Justiça e da Fazenda Pública tem inteira liberdade de ação. (grifo nosso)

Desde o início já se fazia a diferenciação. O Ministério Público da Corte de Contas possuía uma maior independência devido à necessidade de se obter isenção na apreciação das contas, já o parquet comum agia em defesa do Poder Executivo.

Com o passar dos anos, tal separação só se firmou. A legislação que seguiu manteve a instituição integrada à Corte, designando-a como guardiã da aplicação da lei e considerando-a quadro especializado nessa proteção.

As constituições que vieram não trataram do Ministério Público atuante na Corte de Contas. Somente com a Emenda Constitucional n° 1, de 17 de outubro de 1969, o instituto mereceu destaque, ainda que de maneira discreta:

Art 73 - O Tribunal de Contas tem sede na Capital da União e jurisdição em todo o território nacional.

(...)

§ 5º - O Tribunal de Contas, de ofício ou mediante provocação do Ministério Público ou das Auditorias Financeiras e Orçamentárias e demais órgãos auxiliares, se verificar a ilegalidade de qualquer despesa, inclusive as decorrentes de contratos, aposentadorias, reformas e pensões, deverá: (...)

Com a atual Constituição, promulgada em 05 de outubro de 1988, o Ministério Público especial encontrou assento constitucional, em especial nos artigos 73, §2°, inciso I e 130.

Art. 73 - O Tribunal de Contas da União, integrado por nove Ministros, tem sede no Distrito Federal, quadro próprio de pessoal e jurisdição em todo o território nacional, exercendo, no que couber, as atribuições previstas no art. 96.

(...)

§ 2º - Os Ministros do Tribunal de Contas da União serão escolhidos:

I - um terço pelo Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, sendo dois alternadamente dentre auditores e membros do Ministério Público junto ao Tribunal, indicados em lista tríplice pelo Tribunal, segundo os critérios de antiguidade e merecimento;"

(...)

Art. 130 - Aos membros do Ministério Público junto aos Tribunais de Contas aplicam-se as disposições desta Seção pertinentes a direitos, vedações e forma de investidura.

Citamos, ainda, as normas encontradas na lei orgânica do Tribunal de Contas da União – lei ordinária n° 8.443, de 16 de julho de 1992, que dedicou capítulo VI para o parquet especial.

Em relação à investidura, passaremos a analisar a evolução histórica do órgão. 6

Na primeira República, o promotor era demissível ad nutum, porém, os Decretos 3.421, de 12 de dezembro de 1917, e 13.247, de 23 de outubro de 1918, garantiam-lhe estabilidade após dez anos. Novamente, agora através do Decreto 15.770, de 01° de novembro de 1922, restaura-se a investidura precária.

Com o advento da Carta de 1934 a incerteza prosseguiu até a lei 830, de 23 de setembro de 1949, que previu a investidura de caráter efetivo, que durou por quase vinte e cinco anos.

Já o Decreto-lei n° 1.313, de 28 de fevereiro de 1974, em seu artigo 7°, caput, assim dispôs: "O cargo de Procurador-Geral junto ao Tribunal de Contas da União é de provimento em comissão."

Os Procuradores tiveram o mesmo tratamento – Decreto-lei n° 1.660, de 24 de janeiro de 1979, artigo 3°, § 1°, que assim dispunha:

Artigo 3º - Os cargos de Procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União ficam transformados em cargos de Subprocurador-Geral, com o vencimento e a representação mensal fixados no Anexo I deste Decreto-lei.

§ 1º - Respeitada a situação de seus atuais ocupantes, os cargos transformados nos termos deste artigo serão providos em comissão quando vagarem.

Sob a égide da Carta de 1967, Emenda Constitucional n° 01 de 1969 e as leis orgânicas dos Tribunais de Contas dos diversos Estados, observamos a atuação do Ministério Público especial nas Cortes de Contas. Citamos alguns exemplos.

Em São Paulo, assim como na maioria dos Estados, os interesses da Administração no Tribunal de Contas eram defendidos pela Procuradoria-Geral do Estado, em conformidade com a Constituição Estadual.

Já o Tribunal de Contas do Distrito Federal, desde sua instituição, em 13 de abril de 1960, lei n° 3.751, atuou de acordo com o verdadeiro órgão do Ministério Público especial e sua real posição institucional. O cargo de Procurador-Geral é de provimento efetivo, bem como o dos Procuradores, que são submetidos a concurso, público, de provas e títulos.

A ampliação da atividade do Ministério Público ordinário, do Tribunal de Contas, e, conseqüentemente, do Ministério Público especial foi trazida pela Carta de 88, e isso fez com que aumentassem as discussões em torno do tema deste trabalho. É o que veremos no capítulo próprio.


2. DIREITO COMPARADO

Neste capítulo, passaremos pelos modelos clássicos do Tribunal de Contas – francês, belga e italiano, tendo como fonte norteadora a tese do Professor Gualazzi. 7

2.1. FRANÇA

A Cour des Comptes é a principal jurisdição administrativa daquele país. Suas decisões finais têm função jurisdicional e são passíveis de revisão pelo Conselho de Estado, assim como as dos Tribunais Administrativos. Tem como anexos, porém não como subordinados, a Corte de Disciplina Orçamentária e Financeira, o Comitê Central de Inquérito sobre o Custo e Rendimento dos Serviços Públicos e, por fim, os Conselhos de Impostos.

O sistema é peculiar devido à estrutura administrativa de execução orçamentária. São autoridades de execuções orçamentárias, que integram o Poder Executivo: os ordenadores (ou autorizadores de despesas públicas – ordonnateurs), que não respondem por pagamentos indevidos, e sim decidem quais serão efetuados; e os contadores, os quais os efetuam. Eduardo Lobo Gualazzi, em sua obra, ensina que tal dicotomia "é essencial para assegurar-se a legitimidade, a conveniência, a oportunidade e a eficiência da gestão orçamentária" 8.

A competência da Corte Francesa abrange as contas do Estado, das coletividades locais, da seguridade social, das empresas públicas e dos organismos privados de utilidade pública. Exerce o controle da regularidade da contabilidade, a qualidade e o rendimento de sua gestão.

Podemos citar, ainda, como característica, a composição por órgão colegiado, cujo Primeiro Presidente é de livre nomeação pelo governo.

O Ministério Público na corte francesa é específico, tem com chefe o Procurador-Geral – também por livre nomeação. Algumas de suas funções consistem na supervisão dos trabalhos na Corte e na intermediação entre ela e a Administração.

Os membros do parquet especial não gozam de inamovibilidade, podem ser livremente escolhidos e substituídos a qualquer tempo.

Outra peculiaridade é referente ao momento de suas intervenções nas decisões, que normalmente ocorrem após desta, mas pode acontecer de se manifestarem em ocasião diversa.

Segundo Gualazzi, o Ministério Público exerce um papel "relevante, difícil e complexo, pois deve combinar a posição de representante da vontade governamental com a de "guardião do Direito", posições às vezes divergentes, como sabem todos aqueles que militam na área, em França, como no Brasil." 9.

Jean Raynaud, em sua obra "La Cour des Comptes", ensina que o maior avanço da Corte francesa está:

na possibilidade conferida à Corte de responsabilizar um administrador perante a Corte de Disciplina Orçamentária e Financeira. Até então, somente o contador podia ser sancionado verdadeiramente sobre seus bens, enquanto o ordenador podia ser, no máximo, admoestado. Desde então, este último pode ser acusado perante a Corte de Disciplina por violação de normas relativas à vinculação e ordenação de despesas públicas." (1980 apud GUALAZZI, 1992, p. 67).

Somente para elucidar, a Corte de Disciplina Orçamentária e Financeira é uma Corte autônoma e anexa à Corte de Contas, como dito anteriormente. Pode ser provocada através de seu parquet e possui competência para conhecer e julgar infrações: às normas de contabilidade pública; à realização de despesa sem crédito; à outorga a terceiros de vantagens pecuniárias injustificadas, em prejuízo ao Erário ou da coletividade.

Assim, o Tribunal assiste ao Parlamento e ao governo no controle da execução das leis de finanças, o qual se dá pelo exame a posteriori – após a realização da despesa, porém, em algumas situações, pode atuar a priori.

2.2. ITÁLIA

Instituída em 1862, a Corte de Contas da Itália compõe-se de magistrados e de pessoal administrativo. É um órgão colegiado e complexo.

Na magistratura residem o Presidente, o Procurador-Geral, os Presidentes das Seções, os Conselheiros, Vice-Procuradores-Gerais, Primeiro Referendário, Referendários e outros. O concurso e a nomeação pelo governo, esta atendendo a requisitos prévios, são as formas de ingresso.

A estrutura da Corte tem como órgãos: a)Presidência; b)Secretaria-Geral; c)Conselho de Presidência; d)Conselho de Administração; e)Comissão de Disciplina; f)Seções Reunidas, que se pronunciam acerca da prestação de contas do governo; g)Seções Regionais Reunidas para a Sicília e para a Sardenha; h)Sete Seções de Controle; i)Onze Seções Jurisdicionais; j)Ofícios de Controle, Centrais e Periféricos; l)Quinze Delegações de Controle Regionais, uma para cada região; m)Procuradoria-Geral.

A última é formada pelo Procurador-Geral, o qual preside a Seção, Vice-Procuradores-Gerais, que atuam como Conselheiros, e Procuradores-Gerais substitutos, que são Primeiro Referendário ou Referendário.

A Procuradoria abrange, ainda, um ofício de Assuntos Gerais e vários Serviços relativos aos Juízos, a fim de cumprir as funções características de parquet. É de competência do Procurador-Geral, perante a Corte de Contas italiana, iniciar as ações de responsabilidade, mesmo sendo contrária à vontade da Administração. A ele cabe o "poder-dever" de velar sobre as condutas das gestões, bem como sobre a proteção do Erário.

Segundo o Professor Gualazzi, dentro da doutrina italiana há divergências quanto ao enquadramento da Corte de Contas no ordenamento jurídico daquele país.

Vejamos as posições existentes: órgão administrativo; órgão neutro, misto (com funções auxiliares do Parlamento); órgão jurisdicional, pois as decisões são irrecorríveis, e no procedimento há o contraditório; e a posição constitucional autônoma – como um quarto poder; um longa manus do Parlamento, onde o controle financeiro é exercido pela Corte e o político pela Casa Legislativa, que aprova, ou não, o orçamento.

Na Itália, encontramos quatro espécies de controle: a) o constitucional; b) o parlamentar; d) o judicial comum; e) o judicial administrativo. Sendo o último a justiça administrativa italiana, na qual inclui-se o Conselho de Estado, a Corte de Contas, os Tribunais Regionais, dentre outros.

O controle judicial administrativo engloba todos os atos do Poder Executivo.

Em análise ao artigo 100 da Constituição da Itália, com forma de governo parlamentarista, Gualazzi ensina:

a) a Corte de contas na Itália é órgão auxiliar do Poder Executivo (Conselho de Ministros), sob aspecto subjetivo, formal, orgânico, mas suas deliberações dirigem-se exclusivamente ao Poder Legislativo (Senado da República e Câmara dos Deputados), sob o ângulo material, substancial, objetivo; b) a Corte de Constas da Itália dispõe de absoluta autonomia, constitucional e legal, em relação aos Poderes Executivo e Legislativo; c) a Corte de Contas da Itália exerce controle preventivo e sucessivo de legalidade em relação ao governo e à totalidade da Administração Direta e Indireta da Itália; d) a Corte de Contas da Itália exerce "jurisdição" em matérias de contabilidade pública e outras, expressamente previstas em lei.

E mais:

(...) a Corte de Contas da Itália não exerce jurisdição em sentido estrito, não é poder jurisdicional, não é Poder Judiciário, sequer sob aspecto material, objetivo, porque suas decisões finais podem ser objeto de revisão no âmbito do Poder Judiciário italiano, nos casos em que o ordenamento jurídico daquele Estado soberano admite acesso ao Poder Judiciário." 10 (grifo nosso)

Assim, a Corte exerce controle jurisdicional e administrativo.

A atuação jurisdicional reside em algumas matérias (assim como no caso brasileiro): contencioso contábil; pensões; emprego público (pessoal da própria Corte) e responsabilidade civil dos funcionários do Estado por prejuízos causados à Administração.

Quanto às administrativas, abarcam o controle sobre a maioria dos atos administrativos do Poder Executivo e dos com força de lei; o controle sobre os bens ou valores do Estado ou de entes públicos; controle sobre as pessoas que manuseiam dinheiro, bens ou valores públicos, e, ainda, funções consultivas e administrativas internas.

O objetivo do controle é garantir a observância da lei orçamentária, e tem como conseqüências, de uma maneira abrangente, a aplicação de penalidades, ordens de pagamento, anulação de decisões/provimentos irregulares, encaminhamento do procedimento para a esfera penal (justiça comum), caso seja praticada alguma ilicitude penal.

O controle da legalidade dos atos é exercido a priori ou a posteriori, dependendo do caso concreto. No geral, se dá com o primeiro e com a aplicação de "visto" nos procedimentos legítimos, que é condição de eficácia dos atos.

O controle posterior ocorre com os atos concessórios de aposentadoria de todos os empregados do setor privado, que, pelo seu grande número, se dá por meio de amostragem (o que não ocorre no sistema brasileiro), e também com as gestões extra-orçamentárias.

Podemos citar, ainda, as figuras do veto absoluto, o qual impede o prosseguimento do ato vetado, e do veto limitado, onde apenas se suspende o ato submetido ao controle.

2.3. BÉLGICA

A corte belga tem consagrada sua Corte de Contas no âmbito constitucional desde 1883, e aproxima-se muito do modelo italiano.

É órgão colegial, composto por Presidentes, Conselheiros e Secretários.

O Conselheiro mais novo atribui-se, periodicamente, a função de parquet, de modo a efetivar a prestação de contas de Contadores retardatários do Estado.

O encaminhamento das contas gerais e anuais do Estado belga à Corte de Contas é efetuada pelo Ministro das Finanças. Após a apreciação, é transmitida às câmaras com as advertências da própria Corte. Nessa mesma ocasião, são apresentados o projeto de lei de aprovação do resumo da prestação geral de contas, assim como o projeto de orçamento relativo ao ano sucessivo.

O Tribunal de Contas belga possui atividades administrativas e jurisdicionais, estas apenas revisáveis diante da Corte de Cassação e somente em casos extremos.

O controle exercido é o preventivo, com previsão de "visto com reserva", mediante procedimento análogo ao da Corte italiana, não ocorrendo a previsão de casos de recusa absoluta de registro.


3. TRIBUNAL DE CONTAS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

No presente capítulo, procuraremos expor os aspectos mais relevantes acerca do Tribunal de Contas na Constituição de 1988, instituição onde o Ministério Público especial reside.

Hoje, temos no Brasil: o Tribunal de Contas da União, no âmbito federal; Tribunais de Contas dos Estados (e dos Municípios do Estado 11) e dois Tribunais de Contas Municipais, São Paulo e Rio de Janeiro.

3.1. INOVAÇÕES

A Sexta Carta Republicana trouxe inovações importantes no âmbito dos Tribunais de Contas.

Nos artigos 33, § 2°, 70 a 75, 96, 161, § único, e 235, encontramos as referências ao instituto.

O órgão em análise auxilia o Congresso Nacional no exercício do controle externo da atividade administrativa dos três Poderes, inclusive do próprio Poder Legislativo. Com ele não se confunde, não há subordinação, nem tampouco ocupa patamar inferior em suposta escala hierárquica, não há superioridade de um em relação ao outro. É órgão autônomo por manifesta vontade constitucional.

Leciona Odete Medauar:

(...) a Constituição Federal, em artigo algum utiliza a expressão ‘órgão auxiliar’; dispõe que o Controle Externo do Congresso Nacional será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas; a sua função, portanto, é de exercer o controle financeiro e orçamentário da Administração em auxílio ao poder responsável, em última instância, por essa fiscalização.

(...)

Se a função é de atuar em auxílio ao legislativo, sua natureza, em razão das próprias normas da Constituição é a de órgão independente, desvinculado da estrutura de qualquer dos três poderes. A nosso ver, por conseguinte, o Tribunal de Contas configura instituição estatal independente. (1990, apud FERNANDES, 2003, p. 134 et seq.)

A Carta de 88 ampliou consideravelmente o controle exercido pelos Tribunais de Contas ao transcender os limites da legalidade formal com a inclusão do controle operacional.

Hoje, o Tribunal de Contas se faz presente com suma importância na sociedade brasileira. Sua competência abarca não só a análise da mera legalidade formal, o que ocorria anteriormente, mas também verifica os atos dos administradores, gestores e órgãos, em consonância com todos os vetores constitucionais, em especial a moralidade administrativa, eficiência (artigo 37 da Carta), legitimidade, economicidade, e ainda os vetores do ordenamento jurídico e do planejamento da administração direta ou indireta.

O controle agora exercido é também um controle de mérito, entendido não como a última decisão política do administrador; aqui o conceito está ligado à legitimidade (racionalidade nas despesas e nas prioridades da coletividade) e economicidade (binômio entre custos e benefícios). 12

Nada ficou fora do controle; vide artigo 74 da Constituição, em especial ao destacar a integração dos controles interno (no interior de cada Poder) e externo (a cargo do Poder Legislativo e do Tribunal de Contas), e, ainda, a expressa autorização para qualquer cidadão denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União.

Vejamos a lição da Profª Lúcia Valle Figueiredo em Conferência realizada no XV Congresso dos Tribunais de Contas do Brasil:

O Tribunal de Contas realmente nesta constituição reassume a sua postura institucional de um verdadeiro Tribunal Controlador e tem muito, muito o que fazer, exatamente para que o princípio da moralidade administrativa, em boa hora incorporado a esse Texto Constitucional, possa ser efetivamente respeitado" (1991, p. 169).

A função de preservação da legalidade da atuação administrativa, inerente aos Tribunais de Contas, assume maior relevância (além das atribuições específicas) no momento em que inexiste lesão a direito subjetivo individual, que, em tese, impossibilitaria o controle jurisdicional.

Nestes termos: "...é graças ao controle exercido pelos Tribunais de Contas, que se pode assegurar o enclausuramento do Estado na órbita do Direito, mesmo nas hipóteses em que sua atuação injurídica não lesa direito individual" 13.

Outros acréscimos consistem na atribuição ao Tribunal – artigo 70, § único –, do julgamento das demonstrações contábeis das empresas de cujo capital a União participe, mesmo em caráter minoritário ou igualitário. Anteriormente, restringia-se a fiscalização aos casos em que a União fosse a detentora da maioria das ações com direito a voto.

Ao Tribunal de Contas da União foi estendida a fiscalização das contas nacionais das empresas supranacionais, desobrigadas no regime anterior, ante à disposição do artigo 71, inciso V, da Constituição, bem como a competência no sentido do registro das concessões de aposentadoria e pensões da Administração Indireta (autarquias) e dos atos de admissão de pessoal em ambas as Administrações (Direta e Indireta), inclusive fundações.

Inovadora também é a fiscalização de renúncia de receitas e, conseqüentemente, o cuidado sobre a utilização dos incentivos fiscais, artigo 70, caput, da Carta.

Os incisos IX, X e XI e parágrafos, do artigo 71, contém normas inexistentes na Carta passada e possuem cunho moralizador. Anteriormente não havia o prazo de 90 dias (§ 2° do referido artigo) para apreciação do Congresso em relação ao ato sustado pelo Tribunal. O silêncio convalidava o ato. Hoje, com a ausência de manifestação, a Corte decide.

3.2. O MODELO FEDERAL

É em respeito ao princípio da simetria e ao artigo 75 da Constituição, a forçosa observância, pelos Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios, na aplicação das diretrizes adotadas pelo constituinte originário em relação ao modelo federal de fiscalização orçamentária e financeira, na qual se incluem as normas sobre estrutura, organização, funcionamento, prerrogativas e competência do Tribunal de Contas da União.

As unidades da federação, e no caso específico da cidade de São Paulo e Rio de Janeiro com suas Cortes Municipais, devem seguir necessariamente o paradigma Federal, seja pela composição 14, investidura, procedimentos.

Ressaltamos as palavras do Procurador-Geral do Ministério Público especial do Estado do Pará, José Octávio Mescouto, acerca da adoção do modelo do Tribunal de Contas da União:

(...) não significa seguir, ou copiar, palavra por palavra o que está naqueles dois diplomas legais. Nem significa fazer inserir em nossas leis estaduais, todas as determinações contidas naqueles diplomas, mesmo porque ambas, tanto a Lei Orgânica do TCE, como seu Regimento Interno, este principalmente, por este ato administrativo interno, estão sob a tutela da Constituição Federal de 1988. (apud GOULART; GUIMARÃES, 1995)

A Constituição Federal, em seu artigo 31, § 4°, veda a criação de novos tribunais, conselhos ou órgãos de contas municipais. Tal disposição nos fornece subsídio para a interpretação do § 1° do mesmo artigo. Assim, os Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios (órgãos municipais), existentes antes da promulgação da Constituição de 1988, permanecem no sistema. 15

Diferente é com relação à criação de Tribunais de Contas dos Municípios pelas Constituições Estaduais (órgãos de âmbito estadual), o que é permitido pelo ordenamento. 16

3.3. ESTRUTURA DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO

É composto atualmente por nove Ministros que possuem as mesmas garantias, prerrogativas, impedimentos, vencimentos e vantagens dos Ministros do Superior Tribunal de Justiça, conforme artigo 73 da Carta, ou seja, vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios.

Os requisitos de investidura para ocupação do cargo são: ter mais de 35 e menos de 65 anos de idade; idoneidade moral e reputação ilibada, notórios conhecimentos jurídicos ou contábeis, econômicos ou financeiros ou de administração pública e contar com mais de 10 anos de exercício de função ou efetiva atividade profissional exigente da espécie de conhecimentos referidos, conforme artigo 73 e § 1° da Constituição Federal.

A escolha e investidura ocorrem por indicação do Presidente da República, que escolherá um terço (três) mediante aprovação do Senado Federal; dois alternadamente entre auditores e membros do Ministério Público especial, os quais são indicados em lista tríplice pelo próprio Tribunal, seguindo critério de antiguidade e merecimento; e um por escolha livre.

O Congresso Nacional escolherá os outros dois terços (seis), de acordo com o artigo 72, § 2°, da Constituição.

Essa estrutura viabiliza um sistema misto de composição do Tribunal, no qual ficou dividido o exercício do controle das contas públicas, não só composto de nomes fornecidos pelo Congresso Nacional, mas também por outros segmentos. Tal representação homogênea deve ter atuação simultânea, de modo que a pluralidade não se resuma apenas em ficção sazonal, mas sim efetiva, estável, permanente, imutável, para que se resguarde a presença de todas as categorias que compõe a Corte de Contas. 17

Para o cargo de auditor do Tribunal de Contas da União é necessário o concurso de provas ou provas e títulos. 18

Integram a estrutura do Tribunal de Contas da União quatro órgãos: Deliberativo (plenário e câmaras); Ministério Público especial; órgãos técnicos; órgãos de apoio administrativo e uma unidade de treinamento (Instituto Serzedello Corrêa) 19.

O Tribunal de Contas da União exerce, atendendo suas peculiaridades, as disposições do artigo 96 da Constituição, disposições essas referentes ao Poder Judiciário.

Porém, carece de personalidade jurídica própria. O Tribunal de Contas da União é órgão da pessoa jurídica União, sem pertencer aos demais três Poderes Federais 20. Assim, sua representação judicial é exercida pela Advocacia Geral da União "artigo 131, caput, da Constituição". Observando que as Procuradorias dos Estados e do Distrito Federal são competentes para representar as respectivas unidades federadas (artigo 132, caput, in fine da Carta), bem como as Procuradorias dos Municípios de São Paulo e Rio de Janeiro. 21

3.4. PARECER PRÉVIO E JULGAMENTO NO TRIBUNAL DE CONTAS

A competência para a apreciação das contas do Presidente da República, Chefe do Poder Executivo, é exclusiva do Poder Legislativo. Nessa situação, o Tribunal de Contas exerce papel opinativo – auxiliar do Legislativo –, não o vinculando. O Tribunal aprecia as contas e o Congresso Nacional as julga (artigos 31, 71, I, 75 e 49, IX). 22

Cabe aqui ressaltar, apoiado na lição do mestre Celso Antônio Bandeira de Mello, a escassez do prazo de 60 dias para apreciação das contas do Presidente:

"Contas do Presidente" são, além dos documentos relativos à gestão anual que este é obrigado a exibir (balanços, demonstrativos e anexos previstos no art. 101 da Lei 4.320, de 17.3.64) para análise meramente dos aspectos formais, as que concernem aos atos ou indevidas omissões próprios e específicos do Chefe do Poder Executivo, de responsabilidade pessoal dele, vale dizer, que lhe sejam direta e pessoalmente imputáveis e que, estas sim, terão de passar por um crivo substancial. Por isso, é curto o prazo de que dispõe o Tribunal de Contas para apreciá-las. 23

Os julgamentos dos Tribunais de Contas são de caráter objetivo, com parâmetros de ordem técnica-jurídica, ou seja, subsunção de fatos às normas. Já o Poder Legislativo julga com critérios políticos de conveniência e oportunidade, de caráter subjetivo.

Os processos das Cortes são processos de contas, e não judiciais, parlamentares ou ainda administrativos (aqueles que julgam somente sua própria atividade). Lembramos que nos processos judiciais há função jurisdicional, que é exclusiva do Poder Judiciário, e tem como característica o impulso externo (non ex-offcicio), participação de advogados e litigantes. Já na Corte, os advogados não participam necessariamente, não está ela situada no rol do artigo 92 da Constituição, nem tampouco é órgão essencial à função jurisdicional. Porém, algumas características da jurisdição imperam nos Tribunais de Contas, como o critério objetivo já tratado no parágrafo anterior, a força ou a irretratabilidade das decisões (como as judiciais com trânsito em julgado).

Acerca da rescisão das decisões da Corte pelo controle judicial, vejamos um trecho da decisão do STJ:

É logicamente impossível desconstituir ato administrativo aprovado pelo Tribunal de Contas, sem rescindir a decisão do colegiado que o aprovou; e para rescindi-la é necessário que nela se constatem irregularidades formais ou ilegalidades manifestas" (1ª Turma, Recurso Especial 8970/SP – Rela. Min. Humberto Gomes de Barros, Diário da Justiça, 09.03.93, p. 2533, apud Moraes, 2003, p. 1183)

E mais:

Ação declaratória de nulidade dos efeitos de acórdão do Tribunal de Contas - extinção do processo sem julgamento do mérito. Irresignação - análise questão meritória impossibilidade - desprovimento.

As decisões dos Tribunais de Contas só poderão ser impugnadas judicialmente quando despontar manifesta ilegalidade ou irregularidade formal grave no procedimento administrativo que resultou na formação do título, não podendo o Poder Judiciário se adentrar na questão meritória, inteligência do art. 71, § 3º, da CF. (Tribunal de Justiça da Paraíba, AP 99005452-6. Relator: Desembargador Antônio de Pádua Lima Montenegro. Boletim Informativo do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado da Paraíba, João Pessoa, PB, maio de 2000, a. 04, n. 18 apud. FERNANDES, 2003, p. 146)

Importante ressaltar que nos Tribunais de Contas não há recurso para instância superior. Não há falar em recurso para o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo ante à decisão da Corte de Contas do Município paulistano, por exemplo. São instâncias máximas em cada esfera de atuação.

3.5. EXECUÇÃO DAS DECISÕES DOS TRIBUNAIS DE CONTAS

O artigo 71, § 3º, da Constituição Federal não outorga legitimação ao Tribunal de Contas para executar suas decisões. Da mesma forma que, no âmbito dos Estados, a legislação não pode ir além do paradigma federal, ante o princípio da simetria - artigo 75 da Carta.

Quem constitui o crédito das decisões da Corte são as pessoas jurídicas de direito público. Cabe a elas a propositura da ação de execução. Inviável ao Tribunal de Contas executar crédito de outrem em nome próprio.

Poder-se-ia cogitar da possibilidade do parquet especialvir a propor as execuções. Porém, como será visto, ele é diverso do Ministério Público ordinário.

Imperiosa a lição de José Afonso da Silva, que nos ensina que diante de eventual imputação de débito ou multa com eficácia de título executivo "artigo 71, § 3º da Carta", caberá à Corte providenciar a cobrança, determinando à Advocacia-Geral da União, ou à Procuradoria-Geral do Estado (ou ainda do Município) o ajuizamento da execução, sob pena de responsabilidade. (apud. CORRÊA, 2003, p. 10).

Por fim, as decisões da Corte, que possuem eficácia de título executivo, prescindem de inscrição, como dívida ativa, e sua execução, far-se-á nos termos da Lei de Execução Fiscal.


4. MINISTÉRIO PÚBLICO ESPECIAL

A Constituição Federal de 1988 não previu estruturalmente o Ministério Público especial. Suas disposições vêm da lei orgânica n° 8.443/92 e do Regimento Interno do Tribunal de Contas da União. Porém, o órgão é dotado de reconhecimento constitucional – artigo 130.

A lei orgânica do Tribunal de Contas da União, em seus artigos 80 e 81, conceitua o parquet especial como encarregado da missão de guarda da lei e fiscal de sua execução, ao qual aplicam-se os princípios institucionais da unidade, da indivisibilidade e da independência funcional.

O Ministério Público especial não possui todas as funções institucionais do artigo 129, referente ao Ministério Público ordinário. Atua exclusivamente na competência das Cortes de Contas, de acordo com o artigo 71 da Lei Magna. São essas competências o limitador dos dois órgãos.

Sua denominação de "Ministério Público especial" surgiu para diferenciar do órgão "Ministério Público comum". Usaram essa diferenciação Jorge U. J. Fernandes, Carlos Britto, Celestino Goulart, entre outros. Outra expressão usada foi "parquet sui generis" - Recurso Especial nº 120.970-4/RO. 24

Sua importância reside na natureza jurídica, conforme expõe Élvia L. C. Branco (1981, p. 20 et seq.):

(...) a de fiscal da lei e promotor de sua fiel execução na defesa dos interesses da Administração, da Fazenda Pública, e de certos direitos individuais que se poderiam classificar entre os indisponíveis especialmente tutelados pelo Estado: o justo provento da inatividade e o justo valor das pensões devidas aos órfãos e às viúvas. Não atuam nunca como advogado do Governo e não raro lhes cabe impugnar contas e atos dos administradores quando lesivos à Fazenda ou infringentes de lei.

A tarefa do Ministério Público especial limita-se a um campo restrito do direito, mas nem por isso, todavia, menos profundo. O grau de especialização de seus membros é altíssimo, como não poderia deixar de ser, tendo em vista as dificuldades existentes na atividade de fiscalização e a importância de atuar como custos legis.

4.1. ESTRUTURA

Atualmente, o parquet especial no Tribunal de Contas da União possui um Procurador-Geral, três Subprocuradores-Gerais e quatro Procuradores, nos termos do caput do artigo 80 da lei orgânica do Tribunal de Contas da União.

Tem capítulo próprio (VI) na referida lei orgânica – artigos 80 a 84 –, bem como no regimento interno (XII) – artigos 58 a 64.

Art. 80. O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, ao qual se aplicam os princípios institucionais da unidade, da indivisibilidade e da independência funcional, compõe-se de um procurador-geral, três subprocuradores-gerais e quatro procuradores, nomeados pelo Presidente da República, dentre brasileiros, bacharéis em direito.

(...)

Art. 81. Competem ao procurador-geral junto ao Tribunal de Contas da União, em sua missão de guarda da lei e fiscal de sua execução, além de outras estabelecidas no regimento interno, as seguintes atribuições:

I - promover a defesa da ordem jurídica, requerendo, perante o Tribunal de Contas da União as medidas de interesse da justiça, da administração e do erário;

(...)

Art. 84. Aos membros do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União aplicam-se, subsidiariamente, no que couber, as disposições da lei orgânica do Ministério Público da União, pertinentes a direitos, garantias, prerrogativas, vedações, regime disciplinar e forma de investidura no cargo inicial da carreira.

Art. 58 (...)

§ 2º Em caso de vacância do cargo de procurador-geral, o Presidente do Tribunal encaminhará ao Presidente da República lista contendo o nome de todos os integrantes da carreira do Ministério Público, por ordem de antigüidade e com a indicação dos seus respectivos cargos.

(...)

§ 5º A promoção ao cargo de subprocurador-geral far-se-á, alternadamente, por antigüidade e merecimento.

(...)

Art. 60. Em caso de vacância e em suas ausências e impedimentos por motivo de licença, férias ou outro afastamento legal, o Procurador-Geral será substituído pelos subprocuradores-gerais e, na ausência destes, pelos procuradores (...)

Art. 62. Compete ao Procurador-Geral e, por delegação prevista no art. 82 da Lei nº 8.443, de 1992, aos subprocuradores-gerais e procuradores:

(...)

III – dizer de direito, oralmente ou por escrito, em todos os assuntos sujeitos à decisão do Tribunal, sendo obrigatória sua audiência nos processos de tomada ou prestação de contas, nos concernentes aos atos de admissão de pessoal e de concessão de aposentadoria, reforma e pensão, bem como nos incidentes de uniformização de jurisprudência e nos recursos, exceto embargos de declaração e pedido de reexame em processo de fiscalização de atos e contratos;

(...)

Art. 63(...)

§ 2º O Procurador-Geral remeterá à Presidência do Tribunal, no mês de dezembro de cada ano, cópia da escala de férias anual e, quando ocorrerem, as suas alterações, para as devidas anotações nos respectivos assentamentos individuais. (grifo nosso)

4.2. PRINCÍPIOS, GARANTIAS E VEDAÇÕES

Sendo Ministério Público especial um órgão constitucionalmente assegurado, podemos dizer que

é a partir do perfil institucional; da similitude de funções, deveres, direitos e garantias com as instituições afins (em especial o Ministério Público Ordinário); e da dignidade constitucional outorgada pela Carta Constitucional, que se extrai toda a principiologia informadora do elenco de direitos, prerrogativas, garantias e deveres do Ministério Público Especial e de seus membros. (GOULART; GUIMARÃES, 1995).

Para se chegar a esses princípios, devemos buscar a análise comparativa com o parquet comum; evolução histórica do parquet especial; suas competências constitucionais; natureza e objetivos do artigo 130 da Carta; modelo federativo e o sistema republicano. Sem olvidar, é claro, que tudo isso deve estar em consonância com as funções e dignidade da Corte de Contas.

Diga-se, en passant, que a Carta adotou um paralelo pelo qual os membros dos Tribunais de Contas se equiparam à magistratura, já o regime jurídico dos membros do Ministério Público especial aos do parquet comum.

Vejamos os princípios do Ministério Público comum, que aplicáveis, no que couber, ao instituto em estudo.

Pelo princípio da unidade, o Procurador-Geral dirige um só órgão que é integrado pelos promotores. Acresça-se o da indivisibilidade, onde temos:

O Ministério Público é uno porque seus membros não se vinculam aos processos nos quais atuam, podendo ser substituídos uns pelos outros de acordo com as normas legais. Importante ressaltar que a indivisibilidade resulta em verdadeiro corolário do princípio da unidade, pois o Ministério Público não se pode subdividir em vários outros Ministérios Públicos autônomos e desvinculados uns dos outros. (DECOMAIN, apud. MORAES, 2001, p. 488)

Já o princípio da independência funcional revela-se de importância ímpar à desenvoltura de suas funções. O órgão do Ministério Público é independente, não fica sujeito a ordens de ninguém, somente deve prestar contas de seus atos às leis e à sua consciência. 25

As ordens dadas pelos Procuradores-Gerais não têm o condão de impor-lhes um facere; são apenas orientações sobre suas funções, jamais com um caráter normativo. Aqui, a hierarquia, chefia única do Procurador-Geral, difere de subordinação funcional, sendo apenas de caráter administrativo.

Entendemos cabível o princípio do promotor natural. Tal princípio é a garantia constitucional de livre atuação do promotor de acordo com as atribuições legais predeterminadas do órgão de execução em que é titular. O Supremo Tribunal Federal já o reconheceu no sentido de vedar designações específicas pelo Procurador-Geral, evitando assim, o promotor de exceção. Fazemos constar o posicionamento contrário da Ministra Ellen Gracie, segundo a qual o princípio do promotor natural é incompatível com o da indivisibilidade, pelo qual todos os membros do Ministério Público são reciprocamente substituíveis, tornando o órgão uma totalidade homogênea. 26

Dentro desse contexto, e atentando-se para a peculiaridade do Ministério Público especial, entendemos também possível a aplicação das funções do artigo 129, inciso II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia, e ainda do inciso VI – requisitar informações e documentos para instruir os procedimentos administrativos.

Dentre as garantias existentes para assegurar o pleno exercício de suas funções, encontramos as referentes à instituição e aos membros. Quanto à instituição, as veremos no subitem "7".

As garantias dos membros, por sua vez, apresentam-se nas modalidades de liberdade e de imparcialidade ou vedações. 27

A primeira garantia de liberdade apontada pela doutrina é a vitaliciedade, que é adquirida após dois anos de efetivo exercício da carreira. Significa que um membro do Ministério Público somente poderá perder seu cargo por decisão judicial com trânsito em julgado.

Pela inamovibilidade, segunda garantia de liberdade, uma vez titular do respectivo cargo, o membro do Ministério Público somente poderá ser promovido ou removido por iniciativa própria, salvo por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público, por voto de dois terços de seus membros, assegurada ampla defesa, ex vi do disposto no artigo 128, §5º, I, b da Constituição Federal.

Por fim, temos a irredutibilidade de subsídios, que objetiva evitar pressões ao membro no exercício de suas atribuições.

Quanto aos membros do Ministério Público especial do Tribunal de Contas da União, no que tange à remuneração, a Constituição Federal nada dispôs, restando às Constituições Estaduais ou à legislação infraconstitucional decidirem a respeito 28. Ressaltamos o dispositivo do artigo 58, § 3º, do respectivo regimento interno:

Art. 58. O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, (...) compõe-se de um procurador-geral, três subprocuradores-gerais e quatro procuradores (...)

§ 3º A carreira do Ministério Público junto ao Tribunal é constituída pelos cargos de subprocurador-geral e procurador, este inicial e aquele representando o último nível da carreira, não excedendo a dez por cento a diferença de subsídio de uma classe para outra, respeitada igual diferença entre os cargos de subprocurador-geral e procurador-geral. (grifo nosso)

Os deveres do Ministério Público especial consistem na dedicação à função de agente de controle, respondendo aos anseios da sociedade, na lealdade para com a instituição e zelo no trato das informações. Os demais deveres podem ser encontrados na legislação do Ministério Público comum, em códigos de ética específicos do tribunal.

Em análise ao artigo 128, §5º, II da Constituição Federal, empreendemos as vedações aos membros do Ministério Público.

Assim, é vedado receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentuais ou custas processuais; participar de sociedade comercial, na forma da lei; exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério; exercer atividade político-partidária, salvo exceções previstas em lei; exercer a advocacia.

Especificamente quanto à proibição de exercício da advocacia, ressaltamos que ela não se aplica aos promotores que tomaram posse antes da promulgação da Carta de 05 de outubro de 1988.

4.3. ACESSO AOS CARGOS NO PARQUET ESPECIAL

A investidura se dá por concurso público de provas e títulos 29, assegurada a participação da Ordem dos Advogados do Brasil, e a nomeação pelo Presidente da República, observada a ordem de classificação (artigo 80, § 3° da lei orgânica do Tribunal de Contas da União).

O Procurador-Geral deve ser escolhido dentre integrantes da própria carreira, de seu corpo funcional, através de lista tríplice, tal como ocorre com o parquet comum. A escolha não pode ficar nas mãos do Poder Executivo, pela livre nomeação, a fim de impossibilitar a defesa do interesse público 30.

Observe-se que a lista tríplice é elaborada pelo próprio órgão

(...) aliás, em se tratando de investidura no cargo de Procurador-Geral, no Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado, ela há de observar, também, o disposto no § 3º do art. 128 c/c art. 130, competindo à própria instituição a formação de lista tríplice para sua escolha, depois, por nomeação pelo Chefe do Poder Executivo, para mandato de dois anos, permitida uma recondução. 31

Impõe o artigo 130 da Constituição Federal a adoção da mesma solução dada ao Ministério Público ordinário – artigo 128, inciso II, §§ 1° e 3° – seja para procurador, seja para Procurador-Geral, Procurador-Chefe. Soma-se, ainda, a reafirmação do artigo 80 da lei orgânica do Tribunal de Contas da União e regimento interno da Corte (resolução n° 155/02).

Nesse sentido, ressaltamos que:

a Constituição fala em mandato dos Procuradores-Gerais, mas o regime dessa investidura não é de mandato. Não se trata de representação, nem mesmo em relação aos Procuradores-Gerais dos Estados, Distrito Federal e Territórios, provenientes de eleição dos integrantes da carreira. Não representam estes eleitores. A eleição aí é mero elemento de ato complexo de investidura. Esse tipo de "mandato" é, na realidade, mera investidura a tempo certo(...) (SILVA, 1997, p. 55)

4.4. FORO ESPECIAL

Outra questão refere-se à competência para julgamento dos membros do Ministério Público especial, o que não vem definido expressamente no artigo 105, inciso I, a, da Constituição Federal, que trata da competência do Superior Tribunal de Justiça:

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

I - processar e julgar, originariamente:

a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais;

Há julgado no sentido de atribuir foro especial aos membros do Ministério Público dos Tribunais de Contas dos Estados:

EMENTA: RHC - CONSTITUCIONAL - PROCESSUAL PENAL - MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO - JUÍZO NATURAL - NULIDADE - A Constituição da República estatui ser da competência do STJ processar e julgar os membros do Ministério Público da União que oficiem perante Tribunais (art. 105, I, a). Aos membros do Ministério Público, junto aos Tribunais de Contas, aplicam-se as disposições da referida seção (art. 130). Em conseqüência, o Procurador que atua no Tribunal de Contas do Estado tem, como juízo natural, o Tribunal de Justiça do Estado. 32 (grifo nosso)

Assim, os membros do Ministério Público especial não podem ser julgados pelo Superior Tribunal de Justiça, vedado a interpretação analógica do artigo, cujo rol é taxativo. Por outro lado, querer retirá-los dos Tribunais de Justiça dos Estados seria ferir a Magna Carta, a razoabilidade e o bom senso.

4.5. MINISTÉRIO PÚBLICO ESPECIAL DIVERSO DO PARQUET COMUM

Durante algum tempo, principalmente logo após a promulgação da Constituição Federal de 1988, revelou-se um debate na comunidade jurídica, em especial no âmbito dos Tribunais de Contas e do Ministério Público ordinário, acerca da posição institucional do parquet atuante nas cortes de contas.

Tal discussão, se o Ministério Público especial é diverso, ou não, do parquet comum, já se encontra superada, tendo em vista o julgamento da ADIN 789-1/DF pelo Supremo Tribunal Federal 33, a qual se ocupou de dispositivos da lei orgânica do Tribunal de Contas da União, bem como pelas vastas argumentações da doutrina. Assim, passaremos a expor a referida divergência, mostrando seus principais pontos.

Na mesma linha, seguem diversas outras decisões da Corte, como aquelas exaradas nas ADINs n° 892-7/RS; 1545-1/SE; 1957-1/AP; 2596-1/PA e 2068-4/MG.

Apontaremos algumas razões que diferenciam os institutos.

Como verificamos anteriormente, o Ministério Público no Tribunal de Contas já pré-existia no ordenamento. A atual Carta não inovou nesse sentido, tão-somente o manteve.

No seu surgimento, em 1892, a instituição já era independente do parquet comum, como pudemos verificar no capítulo I, subitem "3", deste trabalho.

Ambos institutos possuem área de atuação distinta, um no Poder Judiciário, com função essencial à prática da justiça, outro no bojo dos Tribunais de Contas, cuja instituição é administrativa, não contenciosa. Cabe aqui o ensinamento do Prof. Carlos Britto:

(...) é que podemos compreender por que a Magna Lei enuncia que o Ministério Público comum atua junto ao Judiciário ("Juízes e Tribunais"), como órgão externo a esse poder, cumprindo uma função que não é materialmente judicante, ao contrário do Ministério Público especial, que não oficia ao lado do Tribunal de Contas, mas dentro dele, compondo-lhe a intimidade estrutural porque o ofício que lhe incumbe é tão materialmente fiscalizatório, ou de controle, quanto a global atribuição do Colégio de Contas. (apud FERNANDES, 1993, p. 238)

A existência dessa diferenciação, que possibilitou a menção do Ministério Público especial no capítulo IV da Carta, serviu para estender direitos, vedações e forma de investidura, em similaridade com o parquet comum. Obviamente, não o incluiu no rol do artigo 128, ante sua atuação no Tribunal de Contas, cujo tratamento situa-se na seção IX, no capítulo do Poder Legislativo.

Deve-se interpretar os artigos em estudo (73, §2°, I, in fine, 127 a 130) de forma sistemática, e não literal. A exegese correta a ser adotada é aquela que leva à harmonia das disposições constitucionais com os princípios consagrados, com as instituições históricas e a ordem lógica do direito. As práticas dos órgãos são diversas, mas não quebram a unidade teleológica, ambos atuam como custos legis, a ação fiscalizadora da legalidade.

O Ministério Público ordinário tem todos seus atos de implicações financeiras e administrativas subordinadas à Corte de Contas, o que inviabiliza a idéia do Ministério Público ter no corpo do próprio Tribunal um representante seu. Não é minimamente razoável que um subordinado aprecie as contas de seu superior hierárquico.

Não haveria necessidade do artigo 130 da Constituição caso os Ministérios Públicos fossem os mesmos, pois as garantias e vedações aos seus membros já estariam asseguradas, bem como não há palavras inúteis na Carta.

A necessidade de especialização de um parquet é evidente, entretanto o órgão deve ter competência para desempenhá-la, sob pena de ferir o equilíbrio constitucional dos Poderes.

Por outro lado, surgiram posições contrárias 34, e como já dito, superadas: unidade ministerial e a não inclusão no rol do artigo 128; inexistência de autonomia do Ministério Público especial por não possuir legislação própria, suas regulações funcionais são emanadas pelo Tribunal de Contas; necessidade de especialização dos membros do parquet para atividades contábeis, de fiscalização, orçamentárias do patrimônio público; o Ministério Público especial seria uma promotoria como é a da cidadania, de fundações, de urbanismo; caso a Constituição tivesse criado um novo Ministério Público, diverso do da União e dos Estados, para atuar perante as Cortes de Contas, teria cuidado do processo legislativo para sua organização, atribuições, escolha de Procurador-Geral.

Assim, com o acirramento da discussão, decidiu o Supremo Tribunal Federal na ADIN 789 do Distrito Federal:

ADIN - LEI N. 8.443/92 - MINISTÉRIO PÚBLICO JUNTO AO TCU - INSTITUIÇÃO QUE NÃO INTEGRA O MINISTÉRIO PUBLICO DA UNIÃO - TAXATIVIDADE DO ROL INSCRITO NO ART. 128, I, DA CONSTITUIÇÃO - VINCULAÇÃO ADMINISTRATIVA A CORTE DE CONTAS - COMPETÊNCIA DO TCU PARA FAZER INSTAURAR O PROCESSO LEGISLATIVO CONCERNENTE A ESTRUTURAÇÃO ORGÂNICA DO MINISTÉRIO PUBLICO QUE PERANTE ELE ATUA (CF, ART. 73, CAPUT, IN FINE) - MATÉRIA SUJEITA AO DOMÍNIO NORMATIVO DA LEGISLAÇÃO ORDINÁRIA - ENUMERAÇÃO EXAUSTIVA DAS HIPÓTESES CONSTITUCIONAIS DE REGRAMENTO MEDIANTE LEI COMPLEMENTAR - INTELIGÊNCIA DA NORMA INSCRITA NO ART. 130 DA CONSTITUIÇÃO - AÇÃO DIRETA IMPROCEDENTE. - O Ministério Público que atua perante o TCU qualifica-se como órgão de extração constitucional, eis que a sua existência jurídica resulta de expressa previsão normativa constante da Carta Política (art. 73, par. 2., I, e art. 130), sendo indiferente, para efeito de sua configuração jurídico-institucional, a circunstancia de não constar do rol taxativo inscrito no art. 128, I, da Constituição, que define a estrutura orgânica do Ministério Público da União. - O Ministério Público junto ao TCU não dispõe de fisionomia institucional própria e, não obstante as expressivas garantias de ordem subjetiva concedidas aos seus Procuradores pela própria Constituição (art. 130), encontra-se consolidado na "intimidade estrutural" dessa Corte de Contas, que se acha investida - até mesmo em função do poder de autogoverno que lhe confere a Carta Política (art. 73, caput, in fine) - da prerrogativa de fazer instaurar o processo legislativo concernente a sua organização, a sua estruturação interna, a definição do seu quadro de pessoal e a criação dos cargos respectivos. - Só cabe lei complementar, no sistema de direito positivo brasileiro, quando formalmente reclamada a sua edição por norma constitucional explicita. A especificidade do Ministério Público que atua perante o TCU, e cuja existência se projeta num domínio institucional absolutamente diverso daquele em que se insere o Ministério Público da União, faz com que a regulação de sua organização, a discriminação de suas atribuições e a definição de seu estatuto sejam passíveis de veiculação mediante simples lei ordinária, eis que a edição de lei complementar é reclamada, no que concerne ao Parquet, tão-somente para a disciplinação normativa do Ministério Público comum (CF, art. 128, par. 5.). - A cláusula de garantia inscrita no art. 130 da Constituição não se reveste de conteúdo orgânico-institucional. Acha-se vocacionada, no âmbito de sua destinação tutelar, a proteger os membros do Ministério Público especial no relevante desempenho de suas funções perante os Tribunais de Contas. Esse preceito da Lei Fundamental da Republica submete os integrantes do MP junto aos Tribunais de Contas ao mesmo estatuto jurídico que rege, no que concerne a direitos, vedações e forma de investidura no cargo, os membros do Ministério Público comum. 35 (grifo nosso)

Então, é pacífico que o Ministério Público presente na Corte de Contas é diverso do parquet ordinário.

Seguindo o estudo desse julgamento, podemos retirar dois relevantes aspectos:

O primeiro consiste na assertiva de que o Ministério Público junto ao TCU não dispõe de fisionomia institucional própria, tal entendimento deve ser acolhido em termos, porque diz respeito à ausência de definição pela Constituição Federal. Não que seja instituição sem fisionomia, sem caracteres definidores da sua atuação. No regime federativo, pode e deve cada Constituição Estadual definir essa instituição, ou mesmo lei ordinária, desde que ao faze-lo não invada competência constitucional do ministério público ordinário ou do tribunal de contas;

O segundo, é que a iniciativa de lei, caso a Constituição Estadual, ou Federal não a permitia ao próprio ministério público especial, deve caber aos respectivos tribunais de contas. (FERNANDES, 2003, p. 620)

A questão da inexistência de iniciativa de lei pelos Ministérios Públicos especiais, bem como da autonomia funcional, será tratada com maior profundidade no subitem "7" deste capítulo.

4.6. MINISTÉRIO PÚBLICO ESPECIAL E A PROCURADORIA

A proteção da Fazenda Pública pelo Ministério Público especial é imperiosa. Entretanto devemos entender "Fazenda Pública" por erário público, gastos em conformidade com a lei e em benefício da coletividade. É relevante o afastamento por completo de suposta confusão.

A necessidade dos Estados adotarem o paradigma federal, e mais, a caracterização do órgão-jurídico atuante nas Cortes como legítimo Ministério Público, nos propicia afirmar que o parquet especial não se confunde com os Procuradores do Estado – defensores dos interesses do Executivo.

Construtivo é o direcionamento dado por Élvia L. C. Branco:

Ainda que relegado o aspecto constitucional da matéria, a atribuição da defesa dos interesses da Administração e da Fazenda Pública junto aos Tribunais de Contas aos Procuradores da Fazenda ou das Procuradorias Gerais do Estado é de todo inapropriada. Estão eles diretamente subordinados ao Executivo, cujos atos têm o dever de fiscalizar e não raro impugnar, o que torna extremamente delicada e juridicamente contraditória a posição desses altos agentes administrativos. (1981, p. 25) (grifo nosso)

O Ministério Público especial não atua nas Cortes na defesa dos interesses do Poder Executivo, "mas na defesa dos interesses da Administração e da Fazenda Pública, como fiscal da lei e promotor de sua execução. Tampouco serve aos Tribunais ou os representa" (Ibid., p. 27). Já os Procuradores atuam perante os Tribunais de Contas, não junto a eles.

Do mesmo modo "a nomeação de Procuradores em comissão enfraquece as Cortes de Contas porque representa ingerência do Executivo, na sua organização e nas suas atividades-fim" (Ibid., p. 29).

Soma-se a isso o modo de investidura dos membros, que é diverso, assim como as competências constitucionais que lhes foram atribuídas.

4.7. INSTITUCIONALIZAÇÃO DO PARQUET ESPECIAL

Antes de adentrar a questão, transcrevemos a recente publicação da decisão proferida na ADIN n° 2378 do Estado de Goiás.

Decisão: Após os votos dos Senhores Ministros Relator, Joaquim Barbosa e Cezar Peluso, julgando procedente a ação e declarando a inconstitucionalidade da expressão. a que se aplicam as disposições sobre o Ministério Público, relativas a autonomia administrativa e financeira, a escolha, nomeação e destituição do seu titular e a iniciativa de sua lei de organização, constante do. 7. do artigo 28 da Constituição do Estado de Goiás, introduzida pela Emenda Constitucional n. 23, de 09 de dezembro de 1998, e do voto do Senhor Ministro Marco Aurélio, julgando-a improcedente, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Carlos Britto. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Senhor Ministro Celso de Mello. Presidência do Senhor Ministro Mauricio Correa. Plenário, 17.03.2004. Decisão: O Tribunal, por maioria, vencidos os Senhores Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto, julgou procedente a ação e declarou a inconstitucionalidade da expressão. a que se aplicam as disposições sobre o Ministério Público, relativas a autonomia administrativa e financeira, a escolha, nomeação e destituição do seu titular e a iniciativa de sua lei de organização, constante do. 7. do artigo 28 da Constituição do Estado de Goiás, introduzida pela Emenda Constitucional n. 23, de 09 de dezembro de 1998. Votou o Presidente. Ausentes, justificadamente, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa e, neste julgamento, o Senhor Ministro Carlos Velloso. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Nelson Jobim, Vice- Presidente no exercício da Presidência. Plenário, 19.05.2004. 36 (grifo nosso)

Disposição da Constituição do Estado de Goiás atribuiu autonomia administrativa e financeira, à escolha, nomeação e destituição do titular do Ministério Público especial, bem como a iniciativa de lei de sua organização.

Foi proposta ação declaratória de inconstitucionalidade que, após discussão, foi julgada procedente para afastar a referida previsão.

Os Ministros entenderam que a Constituição Federal apenas estendeu aos membros do Ministério Público especial as disposições pertinentes aos direitos, vedações e forma de investidura do Ministério Público ordinário. Consideraram uma ofensa ao artigo 73 da Carta Magna, pois o parquet especial é parte da Corte de Contas. Desse modo, esta última é competente para a iniciativa das leis referentes à estrutura e composição do órgão do Ministério Público que nela atua.

Porém, os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto votaram de forma contrária aos demais, no sentido de que a disposição atacada encontra-se correta, ante ao fim buscado pela norma constitucional. Segundo eles, a autonomia conferida buscou atribuir uma atuação independente do Ministério Público especial, corroborado pela constituição (artigos 25, 130 e 127 da Constituição Federal) 37.

Assim, são duas as posições. Uma, defendo a institucionalização do parquet especial atuante nas Cortes de Contas, mediante interpretação extensiva do artigo 130.

Segundo essa posição, há a necessidade de se institucionalizar, normatizar e instrumentalizar os Ministérios Públicos especiais. A Constituição Federal não vedou tal possibilidade, apenas não mencionou. Porém, devemos ter em mente que o fim que o legislador originário quis dar ao Ministério Público especial foi de uma instituição independente, forte, livre de interferências externas, assim como o Ministério Público comum.

D’outro lado encontra-se o posicionamento adotado no julgamento da ADIN 789-1/DF, já mencionada anteriormente, que dispôs que o Ministério Público especial está consolidado na intimidade estrutural da Corte de Contas. A similitude institucional de natureza orgânica, objetiva, em relação ao Ministério Público comum, não reside no artigo 130 da Constituição Federal; em tal norma há somente a extensão de direitos e prerrogativas institucionais, de caráter subjetivo.

Analisemos agora as autonomias relativas ao Ministério Público comum e Tribunal de Contas.

A autonomia funcional, já devidamente tratada em subitem próprio, significa que os membros do Ministério Público submetem-se apenas aos limites impostos pela Constituição Federal, pelas leis e pela sua própria consciência.

A autonomia administrativa é garantida ao parquet comum. Consiste em propostas de leis ao Poder Legislativo, criação e extinção de cargos e serviços auxiliares, realização de concursos públicos, bem como dispor acerca de remuneração e planos de carreira.

A autonomia administrativa, em relação a esse parquet, permite a prática de atos próprios da gestão. Podemos citar alguns, como: elaborar seu regimento interno; organizar secretarias e serviços auxiliares; propor ao Poder Legislativo a criação e extinção de seus cargos e dos relativos aos seus serviços auxiliares, bem como fixação e reajuste de vencimentos; editar atos de aposentadoria, exoneração, entre outros; elaborar folhas de pagamento; adquirir bens e contratar serviços.

Essa autonomia administrativa traduz-se, no plano financeiro, pela prerrogativa do Ministério Público comum elaborar sua proposta orçamentária – a Constituição Federal lhe deu novo atributo, ou seja, o parquet comum é ordenador de despesas (artigo 127, § 3º da Carta).

O constituinte não repetiu a expressão "autonomia financeira" expressa com relação ao Judiciário, pois a idéia já está contida na referida disposição do parquet. O Ministério Público não dispõe de recursos próprios, porém elabora proposta orçamentária que revela os valores necessários às suas despesas. 38

Segundo o saudoso administrativista Hely Lopes Meirelles,

autonomia financeira é a capacidade de elaboração da proposta orçamentária e de gestão e aplicação dos recursos destinados a prover as atividades e serviços do órgão titular da dotação. Essa autonomia pressupõe a existência de dotações que possam ser livremente administradas, aplicadas e remanejadas pela unidade orçamentária a que foram destinadas. Tal autonomia é inerente aos órgãos funcionalmente independentes, como são o Ministério Público e o Tribunal de Contas, os quais não poderiam realizar plenamente as suas funções se ficassem na dependência de outro órgão controlador de suas dotações orçamentárias. (grifo nosso) 39

Quanto aos Tribunais de Contas já restou claro que estes também possuem autonomias funcional, administrativa e financeira.

A independência funcional é uma característica básica do Tribunal de Contas, tanto da União, quanto dos Tribunais estaduais, pois os estaduais devem seguir o modelo do Tribunal da União, em suas linhas básicas, ex vi legis do artigo 75 da Constituição da República, como já visto. Como conseqüência dessa independência, o Supremo Tribunal Federal já reconheceu aos Tribunais de Contas estaduais o poder de iniciativa do processo legislativo.

Conforme preleciona Antonio Roque Citadini, a autonomia não consiste somente em ter uma normatividade própria, mas em produzir suas normas. Implica na produção legislativa própria. Essa autonomia, que não pode faltar ao Estado, exige que ele tenha iniciativa para desencadear o processo legislativo de sua Lei Orgânica.

Segue o autor dizendo que, no Brasil, as Cortes gozam da mesma autonomia administrativa assegurada ao Judiciário, podendo encaminhar projetos de lei sobre pessoal, administrando seus recursos e serviços, bem como provendo os cargos de seus servidores, em conformidade com o artigo 73 da Magna Carta. Ademais, também competiria aos Tribunais fixar seus roteiros de fiscalização, sua abrangência e os meios pelos quais promoverá o controle. 40

Fixadas essas premissas, que dão tanto aos Tribunais de Contas, quanto ao Ministério Público ordinário, autonomias administrativa e financeira, vejamos o caso do Ministério Público especial.

Ao parquet especial está assegurada tão-somente a autonomia funcional, o que constitui fator de independência, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal na ADIN 789/DF, através do voto do Ministro Néri da Silveira, no sentido de que o órgão do Ministério Público especial não está hierarquicamente subordinado ao Presidente da Corte, pois há de ter faixa de autonomia funcional, em conformidade com a natureza do ofício ministerial em referência, e que, além disso, decorre da sua própria essência como parquet.

Porém, a ausência de autonomia financeira pode vir a comprometer a própria autonomia funcional e administrativa, o que foi observado pelo legislador goiano ao atribuí-las ao parquet especial.

O artigo 130 da Constituição é considerado como norma de princípio institutivo ou de princípio orgânico ou organizativo, segundo José Afonso da Silva:

O legislador constituinte reconhece a conveniência de disciplinar certa matéria, relativamente à organização de instituições constitucionais, mas, ao mesmo tempo, por razões várias e até de pressão, limita-se a traçar esquemas gerais (princípios) sobre o assunto, incumbindo ao legislador ordinário a complementação do que foi iniciado, segundo a forma, os critérios, os requisitos, as condições e as circunstâncias, previstos na norma mesma. Conforme já observamos, essas normas deixam menor ou maior campo a atuação discricionária do legislador ordinário, mas sempre há um mínimo que um poder mais elevado – o constituinte – quer ver atendido; quando mais não seja, abre-se, ao menos, uma possibilidade para o órgão legislativo atuar de certa forma. 41

E acrescenta que as "normas, desde que entram em vigor, são aplicáveis até onde possam, devendo notar-se que muitas delas são quase de eficácia plena, interferindo o legislador ordinário tão-só para aperfeiçoamento de sua aplicabilidade." 42

Interessante foi o reconhecimento do princípio do "promotor natural" ao parquet comum sem a necessidade de lei integrativa, o que poderíamos lançar como um paralelo. Dentre as interpretações imagináveis deve prevalecer a que empregue ao dispositivo legal alguma eficácia, e não a que o torne inócuo, potencializando-se, com isso, o princípio fundamental nele inserido e que está voltado à segurança jurídica. 43

A atribuição das autonomias administrativa e financeira, tal qual como lançada ao parquet comum – artigo 127, § 2°, e a regulamentação da instituição, depende de simples lei ordinária, pois a Carta não reclama lei complementar (artigo 130).

Na regulamentação, entendemos que a iniciativa dessa lei é do Procurador-Geral do Ministério Público especial, caso opte o legislador local pela total independência, concedidas num primeiro momento.

No caso da ADIN do Estado de Goiás, a Assembléia Legislativa atribuiu as autonomias, o que abriria caminho para a regulação do parquet especial naquela unidade da Federação.

O parquet especial, instituição com grande responsabilidade e objetivos, não pode desenvolver suas funções caso esteja sendo dificultado por ingerências, interferências e obstáculos funcionais e administrativos impostos pelos Poderes, ou ainda pela própria Corte de Contas, que compartilha a mesma intimidade de jurisdição. A intenção da Constituição "artigo 130" foi atribuir-lhes garantias, instrumentos e impedimentos a fim de que desempenhassem suas funções com independência.

Hoje, a tomar por base o Ministério Público especial do Tribunal de Contas da União, a Corte de Contas gerencia em alguns pontos o cotidiano dos promotores. Temos como exemplos: a concessão de licença, férias e outros afastamentos; propor ao Congresso Nacional a fixação dos subsídios; a competência do Presidente do Tribunal de dar posse aos membros do parquet, de expedir atos concernentes às relações jurídico-funcionais.

Assim, a norma do artigo 130 é de eficácia jurídica de um mínimo de aplicabilidade imediata, independe de norma infraconstitucional. Ao legislador é defeso editar normas no sentido oposto do que restou assegurado pela constituição, antes até da possível norma integradora, que atribuirá aplicabilidade plena ao instituto.


CONCLUSÃO

É com entusiasmo que chegamos ao final desse estudo, que teve como objetivo, ainda que de forma singela, o parquet especial atuante nas Cortes de Constas.

Desse modo, podemos extrair algumas conclusões;

O parquet especial teve sua origem em 1.892 e de forma independente, sem vínculo com o Ministério Público comum.

A Constituição Federal de 1988 alargou, de forma significativa, a competência dos Tribunais de Contas e do Ministério Público.

Os Estados e os Municípios (São Paulo e Rio de Janeiro) devem seguir, obrigatoriamente, o modelo Federal dos Tribunais de Contas, ex vi do artigo 75 da Constituição Federal.

O Tribunal de Contas é órgão autônomo, não se confundindo com o Poder Legislativo. Atuam de forma conjunta e sem subordinação.

Os órgãos competentes para executarem as decisões dos Tribunais de Contas – artigo 71, § 3°, da Constituição são as Procuradorias (Estado e Município) e a Advocacia Geral da União. Vedado ao órgão do Ministério Público atuante nas Cortes.

O Ministério Público especial é órgão de extração constitucional – artigo 130 da Carta.

É imperiosa a participação do parquet especial nas Cortes brasileiras, a fim de exercer a função de custos legis, defendendo os interesses do erário e os direitos individuais indisponíveis.

A interpretação extensiva do artigo 130 da Constituição Federal fornece princípios, direitos e garantias ao parquet especial, sem necessidade de lei integradora, baseada principalmente na instituição do parquet comum.

O cargo de Procurador-Geral do Ministério Público especial deve ser ocupado por representantes da própria carreira, mediante concurso público de provas e títulos.

Compete aos Tribunais de Justiça dos Estados julgarem os membros dos Ministérios Públicos especiais atuante nos Tribunais de Contas dos Estados.

É vedada a designação do Ministério Público comum, ou de qualquer outro órgão, para atuar junto aos Tribunais de Contas. Este é o posicionamento do Colendo Supremo Tribunal Federal – ADIN 789-1/DF. Tal função cabe somente ao parquet especial.

O Supremo Tribunal Federal entende que o órgão do Ministério Público especial encontra-se na intimidade estrutural das Cortes de Contas.

O Ministério Público especial não é defensor dos interesses do Poder Executivo, como as Procuradorias-Gerais dos Estados, e com estas não se confunde.

É possível a atuação da Procuradoria-Geral do Estado na Corte de Contas, desde que como defensora dos interesses do Poder Executivo, advogada do Estado, o que não afasta a atuação do parquet especial.

Possuem autonomias funcional, administrativa e financeira: o Ministério Público ordinário e os Tribunais de Contas.

O Ministério Público especial possui autonomia funcional. Entretanto, é possível, e recomendável, a atribuição pelo legislador de independência administrativa e financeira através de lei ordinária regulamentadora (posicionamento contrário ao do Supremo Tribunal Federal – ADIN 2.378/GO).

O Ministério Público especial é a única instituição capaz de contribuir para a concretização do princípio da legalidade, dos interesses da coletividade e do completo resguardo da ordem jurídica no âmbito das Cortes de Contas.

Por fim, os Tribunais de Contas devem agir no sentido adaptar seus regimentos internos à realidade do parquet especial, sem olvidar da atuação dos legisladores pátrios.

Cabe ao Ministério Público especial atuar em harmonia com os outros órgãos de fiscalização, e principalmente com o Ministério Público comum, visando sempre a evitar o mau gerenciamento, desperdícios e principalmente os ilícitos dos administradores e gestores do dinheiro público.

Um Ministério Público especial independente e corretamente estruturado constitui fator de fortalecimento próprio e também das Cortes de Contas. E é com essas instituições bem estruturadas, independentes, que atingiremos os ideais de uma sociedade mais justa e democrática.


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Notas

1 Caminha (2000).

2 MORAES, 2003, p. 1180. Ao repassar lição de Salomão Ribas Júnior, na obra "Uma viagem a Hessen".

3 Histórico do Tribunal de Contas da União.

4 Apud. Ibid.

5 MARANHÃO. 1992, p. 330.

6 BRANCO, 1981.

7 Gualazzi, Eduardo Lobo Botelho. Regime Jurídico dos Tribunais de Contas. São Paulo. RT. 1992.

8 Op. cit., p. 60.

9 Op. cit., p. 64.

10 Op. cit., p. 88 et seq.

11 Bahia, Ceará, Goiás e Pará (FERNANDES, 2003, p. 578 et. seq.).

12 FIGUEIREDO, 1991.

13 MELLO, CELSO A. B., apud. GOULART; GUIMARÃES, 1995.

14 O número de Conselheiros nos Tribunais de Contas dos Estados é fornecido pelo artigo 75, § único. Sete. É vedada a adoção de um número maior ou menor a esse. Observando a ressalva do artigo 235 da Constituição para os Estado criados a menos de dez anos.

15 Questão inversa merece menção. Os Conselhos ou Tribunais de Contas Municipais podem vir a ser extintos? Como esses órgãos são providos de proteção constitucional, nesse atual sistema seria inviável a referida extinção até mesmo por Emenda Constitucional – que seria inconstitucional. Essa é a nossa posição.

16 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Adin 596/RJ. Relator: Ministro Moreira Alves. Requerente: Procurador-Geral da República, requerido: Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro. Brasília, 05 de março de 1993. Diário da Justiça, Brasília, DF, 07 de maio de 1993, seção 1, p. 08326.

17 _______. Adin 2.209/PI. Relator: Ministro Maurício Corrêa. Brasília, 19 de março de 2003. Diário da Justiça, Brasília, DF, 26 de março de 2003. Requerente: Partido dos Trabalhadores, requerente: Assembléia Legislativa do Piauí.

18 O último concurso realizado para o cargo de Auditor foi o de n° 22, no ano de 1996, conforme pesquisa realizada no site da instituição.

19 Os Tribunais de Contas das demais esferas encontram-se em similaridade com o modelo federal, exceto no caso dos órgãos técnicos que se limitam à respectiva área de jurisdição.

20 BRITTO, 2001.

21 Ressalto que no caso de mandado de segurança a pessoa física (Conselheiros ou Ministros) figura na ação sem a representação necessária da AGU/Procuradorias, ante a peculiaridade do procedimento mandamental.

22 MORAES, 2003.

23 2002, p. 800.

24 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Relator: Ministro Moreira Alves. Requerente: Ministério Público Estadual, requerido: Kazunari Nakashima. Publicado no Diário da Justiça de 08 de março de 1991.

25 LAVIÉ, apud. MORAES, 2001, loc. cit.

26 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 387974/DF. Informativo 328 de 03 de novembro de 2003. Requerente: Carlos Mário da Silva Velloso, requerido: Francisco Vicente Badenes Júnior. Relatora: Ministra Ellen Gracie.

27 MORAES, 2001, p. 499.

28 FERNANDES. 2003, p.634.

29 O último concurso realizado, de n° 28, ocorreu em 2003. Pesquisa no sítio do TCU.

30 Celso A. B. de Mello, amparado por Renato Alessi, nos ensina que "a distinção corrente da doutrina italiana entre interesses públicos ou interesses públicos primários – que são os interesses da coletividade como um todo – e interesses secundários, que o Estado (pelo só fato de ser sujeito de direitos) poderia ter como qualquer outra pessoa, isto é, independentemente de sua qualidade de servidor de interesses de terceiros: os da coletividade" (2002, p. 44).

31 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. ADIN-Liminar 1791/PE. Relator: Ministro Sidney Sanches. Requerente: Procuradoria-Geral da República, requerido: Assembléia Legislativa do Estado de Pernambuco e outro. Informativo n° 122, de 07 de setembro de 1998. Decisão publicada no Diário de Justiça de 07 de maio de 1998, Brasília, DF.

32 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurs7o em Habeas Corpus nº 2226-0/PB. Recorrente: Fernando José Alves de Souza. Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba. Relator: Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro. Brasília, 02 de fevereiro de 1993. Publicado em 19 de abril de 1993.

33 BRASIL. Supremo Tribunal Federal, ADIN 789-1/DF, Procurador-Geral da República em face do Presidente da República e Congresso Nacional. Rel. Ministro Celso de Mello. Brasília, 26 de maio de 1994, Diário da Justiça, Brasília, DF, 19 de dezembro de 1994.

34 "as funções do Ministério Público junto aos Tribunais e Conselhos de Contas serão exercidas por órgãos que integrem um quadro próprio da carreira do Ministério Público da União ou dos Estados, vedado o exercício de funções ministeriais por órgãos ou pessoas que não integrem as respectivas carreiras" (MAZZILLI, 1989, p. 114).

35 Dados do julgado, vide nota de rodapé n° 33.

36 BRASIL. Supremo Tribunal Federal, ADIN 2.378/GO, Procurador-Geral da República em face da Assembléia Legislativa do Estado de Goiás. Rel. Ministro Maurício Corrêa. Brasília, 19 de maio de 2004, Diário Oficial da União, Brasília, DF, 02 de junho de 2004, p. 02.

37 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. ADIN 2378/GO, Informativos n° 221, de 22 de março de 2001, 340 de 17 de março de 2004 e 348 de 19 de maio de 2004. Brasília, DF.

38 Moraes, 2001, p. 495 et. seq.

39 Apud MORAES, ibid.

40 CITADINI, 1997, p. 29.

41 Apud GOULART; GUIMARÃES, 1995.

42 Id.

43 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. HC 67759/RJ. Voto do Ministro Marco Aurélio. Ministro Relator: Celso de Melo. Impetrante: Carla Esteves de Azevedo Guedes. Coator: Superior Tribunal de Justiça. 06 de agosto de 1992. Brasília, DF. Publicado no Diário da Justiça de 13 de agosto de 1992.


Resumen: El presente trabajo discurre sobre el Ministerio Público actuante en las Cortes de Cuentas brasileñas. El Ministerio Público especial, como es llamado por la doctrina, fue introducido en el ordenamiento patrio hace muchos años, y hoy es reconocido como órgano de extracción constitucional, ante el artículo 130 de la Constitución Federal. Firmado está que es órgano diverso del parquet común, así como de la Procuraduría General del Estado. Su actuación se restringe al tribunal de cuentas, mas, junto con eso corte, ostenta posición fundamental de guardián del erario y de los intereses de la colectividad por medio del ejercicio del control externo de la administración pública. Abordamos el posicionamiento del Supremo Tribunal Federal en el sentido de alejar del referido órgano las autonomías financiera y administrativa, aunque las reconozca para el propio Tribunal de Cuentas y el Ministerio Público ordinario. Concluimos a pesar de eso, que sería indispensable la plena independencia del parquet especial, principalmente para dar mayor libertad al miembro de la institución cuando ejercita sus atribuciones constitucionales. El presente trabajo constituye una modesta contribución para la difusión de los debates y estudios acerca del tema, en busca del fortalecimiento de las instituciones.


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SOUZA, André Santana de. O Ministério Público no Tribunal de Contas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 956, 12 fev. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7955. Acesso em: 19 abr. 2024.