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Da natureza jurídica da prisão decorrente da sentença penal condenatória conforme interpretação jurisprudencial do princípio da presunção de inocência

Apologia da execução provisória da pena

Da natureza jurídica da prisão decorrente da sentença penal condenatória conforme interpretação jurisprudencial do princípio da presunção de inocência. Apologia da execução provisória da pena

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1. Introdução: Breve Análise sobre os Contornos da Prisão Cautelar no Processo Penal Brasileiro.

            A prisão, conceituada como qualquer forma de tolhimento do direito de ir e vir através do recolhimento de qualquer pessoa ao cárcere, é medida associada ao direito penal e ao processo penal com características diferentes em cada um desses ramos do direito.

            No direito material trata-se de conseqüência jurídica da prática de um crime, como sanção dotada do fundamento punitivo utilizado pelo Estado, visando proteger bens jurídicos básicos a seus cidadãos. Refere-se ao resultado de uma condenação pela prática de um crime após sentença penal transitada em julgado.

            O direito processual penal, por sua vez, conta com instituto da prisão, que em muitos casos se faz necessário sob o argumento da cautela. Uma vez considerada como instrumento de cautela, destina-se a assegurar o resultado útil da jurisdição penal, constituindo verdadeiro instrumento do processo.

            A prisão processual tem características as quais, no ordenamento jurídico brasileiro, devem ser necessariamente verificadas para sua caracterização. [01]

            Uma primeira característica é a jurisdicionalidade dessa medida, quer dizer, o controle judicial amplo sobre a qual esta é erigida. De regra, a prisão cautelar deverá ser determinada pelo Judiciário. Apenas nos casos em que isso não é possível pela premência da situação esse controle será exercido a posteriori.

            É necessariamente medida acessória ao processo principal, dependendo diretamente deste, apesar de ser passível de lhe preceder em diversas situações. É por essa característica que a prisão cautelar deve guardar íntima relação com o crime em discussão no processo, sendo impossível que seja mais onerosa ao réu do que seria a conseqüência definitiva.

            Decorre dessa característica sua homogeneidade em relação ao restante do processo, devendo ser proporcional ao resultado final pretendido. Daí porque muitos entendem que crimes cuja pena não é grave, considerados de médio potencial ofensivo, em que se admite a suspensão condicional do processo, não se aplica a prisão cautelar.

            A doutrina também relaciona como característica da prisão processual a "instrumentalidade hipotética", servindo como meio para atingir a medida principal.

            Imperativo destacar sua provisoriedade, já que dura enquanto não proferida a medida principal e na constância dos requisitos que a autorizam.

            Além das características, relaciona-se às prisões cautelares pressupostos estipulados pela legislação penal, a saber, fumus boni iuris e periculum in mora. Esses são pressupostos a qualquer medida provisória ou de urgência a ser tomada no processo e que somente podem se dar enquanto esses permanecerem.

            O periculum in mora, noção bem trabalhada no direito processual brasileiro, traduz a urgência e necessidade que premeria o processo no sentido de que a delonga na prestação jurisdicional causaria sua ineficácia. Assim também a noção de fumus boni juris, que significa a situação de meridiana clareza do direito evocado à aplicação no caso concreto.

            Mais consoante os propósitos do processo penal seria a adequação desses requisitos, oriundos de uma teoria geral do processo, ao direito material tutelado e as situações a ele inerentes. Nessa lógica, óbvia seria a adaptação dos pressupostos à nomenclatura fumus comissi delicti e periculum libertatis, as quais, longe dos preciosismos terminológicos, denotam grande adaptação dos pressupostos das medidas cautelares ao processo penal. [02]

            O chamado periculum libertatis seria caracterizado pelo real perigo que consiste a liberdade do réu para a sociedade, no simples fato deste não estar sob custódia. Diferentemente da noção do periculum in mora, não seria a demora na prestação jurisdicional a ensejar a prisão, mas o efetivo e verificável perigo que o réu representa para a sociedade. Da mesma forma, o chamado fumus comissi delicti somente é verificado quando o cometimento do delito for suficientemente aferido nos autos, havendo alta probabilidade quanto à autoria, noção afastada da simples aplicação do bom direito.

            Segundo a legislação processual penal são seis as espécies de prisão cautelar, conforme relação a seguir: a) prisão temporária; b) prisão em flagrante; c) prisão preventiva; d) prisão em decorrência de pronúncia; e) condução coercitiva do réu, vítima, testemunha ou outrem que se recuse injustificadamente a comparecer em juízo ou polícia; f) prisão em decorrência de sentença condenatória recorrível. [03]

            Questão controvertida se direciona justamente a esse último tipo relacionado: a prisão decorrente de sentença condenatória recorrível. Diverge-se quanto a sua natureza, sendo questão importante para a determinação de diversos institutos processuais e principalmente porque se trata do instrumento mais radical ao dispor do Estado em desfavor do cidadão, em sua forma menos cuidadosa porque mais urgente.

            O tema desse trabalho é justamente a análise desse instituto jurídico no sentido de adequá-lo ao sistema de garantias constitucionais do processo penal, bem como às disposições do ordenamento em que se insere.


2. A Prisão como Efeito da Sentença Condenatória Recorrível: Impossibilidade de Caracterização como Medida Cautelar.

            A doutrina tradicional expõe que a prisão decorrente de sentença condenatória recorrível é instrumento de preservação dos desígnios da jurisdição penal e, portanto, de natureza cautelar. Trata-se do resultado da exegese dos dispositivos pertinentes da matéria no Código de Processo Penal.

            O art. 393 enumera os efeitos da sentença penal condenatória, nestes termos:

            Art. 393. São efeitos da sentença condenatória recorrível:

            I – ser o réu preso ou conservado na prisão, assim nas infrações inafiançáveis, como nas afiançáveis enquanto não prestar fiança;

            II – ser o nome do réu lançado no rol dos culpados.

            O referido inciso I atesta que advindo sentença condenatória, o réu será recolhido a prisão ou mantido nela em virtude desse provimento jurisdicional como atribuição inerente à condenação.

            Nos termos do dispositivo mencionado, a prisão é efeito direto da sentença condenatória. Contudo, nos casos em que a apelação do réu tem efeito suspensivo, a ordem judicial não terá aplicação imediata e o condenado aguardará o julgamento de seu recurso em liberdade. [04]

            Para entendimento sistemático da hipótese em que a sentença não terá eficácia imediata no caso do réu que permaneceu solto no curso do processo (art. 393, I, 1ª parte), faz-se necessária a análise conjunta deste dispositivo com o art. 594 do mesmo diploma, que traz a seguinte redação:

            Art. 594. O réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se livre solto.

            Convém esclarecer que apesar do artigo falar em recolhimento à prisão para recorrer, esta conduta não é um pressuposto de admissibilidade recursal, isto é, o recurso não pode deixar de ser recebido e processado pela fuga do condenado. Tal assertiva decorre do fato de que o recurso advém do princípio da ampla defesa, direito fundamental garantido ao cidadão pela Constituição.

            O fato de o réu ter impedido seu recolhimento à prisão impõe ao Estado o dever de captura, não a inadmissibilidade de seu recurso. [05]

            Necessário, portanto, situar o art. 594 do CPP como dispositivo em que estão apresentados os requisitos para o efeito suspensivo da apelação, isto é, os casos em que o réu não será recolhido à prisão porque os efeitos da sentença condenatória estariam obstados.

            Assim, se o réu for primário e tiver bons antecedentes, independentemente do crime ser afiançável, ou condenado por crime de que se livre solto, recorrerá em liberdade, não havendo prisão como efeito da sentença penal condenatória.

            Caso o réu seja primário, porém com maus antecedentes, sua situação vai depender da natureza do crime: sendo afiançável, terá que prestar fiança para recorrer em liberdade; se for inafiançável o crime, será recolhido à prisão.

            Por fim, no caso de réu reincidente, ele sempre será recolhido à prisão. Neste caso, a sentença condenatória é eficaz desde logo, produzindo seus efeitos imediatos, pois o recurso interposto não tem o condão de sustar sua eficácia.

            Percebe-se, então, que os requisitos do art. 594 do CPP para recorrer em liberdade (efeito suspensivo da apelação), referem-se apenas ao réu que estava solto, eis que o dispositivo menciona "recolher-se à prisão", ou seja, a hipótese é combinada apenas com a primeira parte do art. 393, I (ser o réu preso).

            O entendimento de que o mencionado dispositivo aplica-se somente ao réu que esteve solto durante o curso do processo é amplamente majoritário na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. O réu que já estava preso não tem direito a recorrer em liberdade, ou seja, a hipótese do art. 393, I, segunda parte (conservado na prisão) tem aplicação imediata, sem o efeito suspensivo da apelação concedido pelo art. 594 do CPP. Em tal situação, a prisão passa a ser um efeito automático da sentença condenatória. [06]

            Assim, o réu que sofreu prisão cautelar durante o curso do processo, permanecerá preso após a condenação, sem direito à aplicação do art. 594 do CPP. Contudo, o título da sua prisão não será mais cautelar (prisão preventiva, por flagrante, etc.), e sim, a própria sentença condenatória recorrível, já que não decorre de qualquer motivo específico que garanta o resultado útil do processo. Parte, simplesmente de uma presunção não absoluta, de que o réu deve ser preso quando pesa sobre ele um juízo de condenação fundado em cognição processual exaustiva.

            Não se fala mais em manutenção de prisão cautelar originária, que cessa com a decisão, surgindo, então, uma nova modalidade de prisão, baseada num título diverso, qual seja, a sentença condenatória recorrível, eis que a prisão torna-se um de seus efeitos automáticos.

            Diversos são os motivos para que se entenda dessa maneira.

            Tal custódia não segue as características básicas referentes à prisão cautelar, isso porque esse instituto não se relaciona de qualquer forma com o resultado pretendido na ação penal condenatória. Ao contrário, é em si a própria pretensão punitiva, a pena decorrente do processo judicial.

            De outro lado, tão pouco se relaciona com o fundamento de prevenir ulteriores agressões ao ordenamento jurídico e à paz social, não sendo dotado de preocupação com o perigo da demora. Prova disso, é que os requisitos firmados pelo art. 594 somente são verificados quando da prolação da sentença e da interposição do recurso, não sendo direcionáveis à verificação contínua da cautelaridade.

            Ademais, os requisitos dessa ordem de prisão não se destinam a garantir o resultado útil do processo, representando acolhimento da pretensão punitiva, ou seja, medida de cunho essencialmente satisfativo.

            Não se pode afirmar, tampouco, que seja medida provisória. A sentença de mérito é julgamento baseado em cognição exauriente que não comporta alterações de cunho probatório, não constituindo um meio de garantia e efetividade do processo, característica marcante da cautelaridade.

            Em síntese, um instituto que baseia sua existência exclusivamente na sentença e na produção de seus efeitos, obstável pela interposição de recurso em determinadas condições, não pode ter o rótulo de cautelar nem produzir efeitos como tal.

            Dessa forma, reconhecida a ausência das características fundamentais das prisões cautelares, impossível entender a prisão decorrente de sentença condenatória recorrível como uma medida essencialmente acautelatória do processo, pois representa a imposição da pretensão punitiva estatal reconhecida na decisão de mérito.


3. A Prisão como Efeito da Sentença Condenatória Recorrível: Execução Provisória da Pena.

            Desprovida das características da cautelaridade, é imperativo que o instituto da pena proveniente de sentença condenatória recorrível seja caracterizado como verdadeira execução provisória da pena.

            A interpretação que daria ensejo a esse entendimento provém diretamente do sistema processual penal positivo brasileiro, conforme se verifica nos art. 393, I e 594 da codificação. Através desses dispositivos, resta claro que tal modalidade de prisão é efeito da sentença, tanto que essa é obstável pela interposição de recurso e considerando o perfil do condenado, jamais se reportando aos pressupostos ou características da medida de urgência.

            O cárcere nesses termos não pode ter caráter cautelar porque a medida instrumental não pode prevalecer sobre a pena em si e as regras da execução. Melhor dizendo: na constância de sentença penal condenatória e atribuindo o ordenamento prisão dela decorrente como efeito direto, não é possível que subsista o fundamento da cautela, porque já é em si a própria pena que deve ser obedecida como conseqüência da prestação jurisdicional.

            Afastando do instituto sua interpretação cautelar, qual seria, então, conforme o sistema jurídico vigente, a natureza jurídica dessa prisão decorrente de sentença condenatória?

            A opção pela execução provisória da pena se impõe diante da análise do sistema legislativo penal vigente, especialmente os comandos configurados nos art. 393, I e 594, do Código de Processo Penal.

            Não é apenas interpretando os artigos referentes ao efeito da sentença e dos recursos que se vislumbra a possibilidade de execução provisória. A análise do sistema como um todo permite, e mesmo direciona, a consideração da execução provisória no direito processual brasileiro. Afrânio Silva Jardim relaciona diversos argumentos baseados no sistema legal para afirmar a natureza de execução provisória da prisão decorrente de sentença condenatória. [07]

            Com relação à sentença, dispõe o art. 669 que esta somente é executável após seu trânsito em julgado, comportando exceções. Dentre as exceções, o inciso I destaca a hipótese de a sentença condenatória sujeitar o réu à prisão, mesmo nos casos de crimes afiançáveis, enquanto não for prestada a fiança. Tal situação significa que o ordenamento já previa a possibilidade dessa execução provisória que se tenta visualizar.

            Necessário se faz ressaltar que esse artigo não foi revogado pela lei de execuções penais, mais especificamente pelo art. 107, em que se condiciona a prisão à expedição de carta de guia, procedimento somente identificado nas execuções definitivas de sentença. O CPP sempre contou com dispositivo semelhante verificado na disposição do art. 674, o qual nunca foi confrontado com o 669, existindo espaço para a execução provisória numa compreensão sistemática da totalidade do ordenamento jurídico.

            Além disso, a execução provisória em matéria penal é identificada no ordenamento jurídico, conforme se verifica principalmente em relação ao art. 637 do CPP. Neste, a lei não confere ao recurso extraordinário efeito de suspender os efeitos dos provimentos jurisdicionais já exarados. Mesmo inexistindo o trânsito em julgado de sentença penal, permite-se a execução provisória da pena nesse particular.

            Uma vez que não há óbice quanto à existência da execução provisória em sede de recurso extraordinário, dispositivo algum veda a aplicação analógica também na fase de apelação. Ambos os recursos impedem o trânsito em julgado da sentença, mas possibilitam a prisão do condenado. O ordenamento continua a tratar a questão como relacionada ao efeito do recurso.

            Certamente não se está a simplificar a questão ou mesmo negar a diferença entre a instância de cassação e a instância especial. O que se pretende com esse argumento é provar que a idéia de execução provisória não é estranha ao ordenamento jurídico brasileiro infraconstitucional. E ainda como, em certa medida, está a beneficiar os cidadãos.

            Não fosse isso, a execução provisória seria depreendida também indiretamente por institutos do direito processual penal descritos na legislação como passíveis de conferir ao recurso de apelação efeito suspensivo.

            O art. 597 designa as hipóteses em que a apelação terá efeito suspensivo, verificando como uma delas a suspensão condicional da pena. Como tal instituto somente é verificável na execução da sentença condenatória, ou seja, durante a imposição da pena, é de se reconhecer mais essa evidência da admissão da execução provisória como solução do sistema para a prisão decorrente de sentença condenatória recorrível.

            Questão que poderia ser apresentada pelos opositores dessa tese seria referente à fiança como forma de atribuir o efeito suspensivo ao recurso, sendo caracterizada como espécie do gênero contracautela. Se fosse atribuída tal natureza jurídica à fiança, estaria caracterizada a condição cautelar da prisão decorrente da sentença condenatória recorrível. Esse engano não deve ser levado adiante.

            Uma vez que a prisão não é cautelar, conforme demonstrado, impossível que o instituto decorrente tenha natureza de contracautela. Melhor seria entender como possibilidade do réu em adiar a execução penal prevista em crimes certos e determinados, já que é esse seu principal efeito.

            Jamais poderia ser considerada como caução, pois o bem jurídico que seria admitido como tal não seria equivalente àquele objeto da pena. A caução seria inidônea para garantir o bem jurídico, inútil para afirmação de seus propósitos.

            Indubitável, dessa maneira, a inexistência da natureza de contracautela para a fiança, nem de cautela para a prisão decorrente de sentença condenatória.

            Todas essas verificações tornam muito difícil que seja afastada a natureza jurídica da execução provisória para a referida prisão. Afastado o rótulo da cautela, e associando-a aos efeitos da sentença e dos recursos, parece que o sistema legal aponta a execução provisória única alternativa viável para o tipo de prisão em questão.


4. Repercussão da Execução Provisória no Processo Penal.

            4.1 Benefícios aos Condenados.

            Quando os condenados não dispuserem em suas apelações de efeito suspensivo, expondo-os, segundo a exegese apresentada neste ensaio, à execução provisória da pena, estará o condenado apto a gozar das benesses concedidas pela lei àqueles que se encontram sob execução da pena, o que não poderia ocorrer se a prisão fosse tida como cautelar.

            Diversos são os exemplos em que isso ocorreria, dentre os quais alguns são destacados na seqüência quanto aos casos de livramento condicional, progressão de regime, dentre outros.

            O livramento condicional, por exemplo, é instituto característico da execução penal, o qual não pode ser aplicado em relação ao preso por medida cautelar, diante de seu fundamento de urgência e razoável evidência do direito a ser aplicado na espécie. Trata-se de incidente da execução não aplicável ao procedimento cautelar.

            Dessa forma, o condenado estaria na absurda situação em que teria mais vantagem em não recorrer e sair da prisão do que lutar por sua inocência e se arriscar a uma demora longa para o julgamento do recurso na esperança de que seja absolvido, pela reforma da sentença.

            Não é conveniente que assim seja, tanto para o réu quanto para o Estado. O réu poderia ser penalizado além do que a lei autoriza sem que lhe fosse garantido um processo penal destinado à proteção de suas garantias. Isso é uma perversão do sistema que pode ser afastada pela execução provisória sob pena de macular as garantias de liberdade constitucionais do cidadão bem como a face material do princípio do devido processo legal.

            Haveria, em tese, com a admissão de execução provisória, um mínimo de coerência do sistema quanto à aplicação da pena, possibilitando ao réu recorrer de forma mais consentânea com o estado do processo, atentando para os benefícios decorrentes da execução da pena.

            Imagine-se, por outro lado, uma condenação em que a pena seja o regime aberto. Identificada a prisão decorrente da sentença condenatória como cautelar, não seria possível a estada no albergue referente ao regime da condenação em razão exclusivamente da prisão ser considerada cautelar.

            Novamente aqui o sistema afirma ao réu condenado em primeira instância que é melhor que não recorra, que não lute pela inocência que acredita ter, porque as conseqüências disso serão menos vantajosas, encarando cárcere mais grave do que deveria somente no intuito de ver suas razões julgadas pela segunda instância, o que pode levar anos para ocorrer.

            Evidencia-se uma vez mais que, verificada a execução provisória da pena, suas conseqüências para os condenados seriam muito mais vantajosas do que admiti-la como prisão cautelar.

            Também seria verificada essa situação de vantagem quando se coloca em perspectiva os benefícios de mudança de regime de cumprimento de pena, remissão da pena pelo trabalho, saídas temporárias disciplinadas, postulação aos direitos referidos no art. 41 da lei de execuções penais, etc. Todos esses benefícios também seriam negados em caso de caracterização dessa prisão como medida cautelar.

            Essas razões evidenciam que longe de ser algo que prejudique o réu, a execução provisória da pena é naturalmente emanada do sistema do processo penal nacional somente tem a tornar mais adequadas com o ordenamento a prisão decorrente da sentença.

            Em última análise, trata-se tão somente de ter uma visão sistêmica e adequada do ordenamento processual penal, impedindo que o réu tenha seus direitos com relação ao cárcere desrespeitados.

            4.2 A Prisão Cautelar posterior à Sentença no Sistema de Execução Provisória da Pena.

            Não obstante a caracterização da prisão decorrente de sentença condenatória recorrível como execução provisória, é de se destacar que essa não impede de qualquer forma o cárcere cautelar, quando forem evidenciados seus os requisitos.

            Mesmo nos casos em que o ordenamento permite ao condenado recorrer em liberdade, preenchidos os requisitos do art. 594 do CPP, nada impede que ele seja submetido a uma prisão de natureza cautelar, caso exista algum dos motivos autorizadores da custódia preventiva. Este fenômeno merece análise cuidadosa, pois não é bem compreendido pelos aplicadores do processo penal.

            Se a apelação do réu não tiver efeito suspensivo, inicia-se imediatamente a execução provisória da pena, sendo o único fundamento da prisão a própria sentença condenatória, eis que representa um de seus efeitos automáticos. Até então nenhuma novidade: neste caso, se o condenado estava solto, será recolhido à prisão; se já estava preso, será conservado no cárcere, nos termos do art. 393, I, do CPP.

            Caso o recurso de apelação do condenado tenha "efeito suspensivo", preenchida uma das condições do art. 594 do CPP, não pode ser iniciada a execução provisória da pena, ou seja, em regra, o réu aguardará o julgamento de seu apelo em liberdade. Entretanto, excepcionalmente, a prisão preventiva pode vir a ser decretada, se o réu se enquadrar nas hipóteses do art. 312 do CPP.

            Desse modo, presente um dos motivos autorizadores da prisão preventiva, o réu, mesmo tendo o direito de apelar em liberdade, em função do efeito suspensivo da apelação, pode ser recolhido à prisão, não sob o título de efeito da sentença penal condenatória, e sim com base na decisão judicial que decretou sua custódia cautelar.

            O mesmo raciocínio deve ser utilizado para o réu que se encontrava preso durante o processo. Apesar de ter direito de apelar em liberdade, como conseqüência do efeito suspensivo do recurso, sua permanência na prisão dependerá da continuidade dos motivos que o levaram a sofrer prisão cautelar.

            Se os fundamentos da prisão preventiva persistirem, o réu continuará preso, não com base na sentença condenatória, mas pelo título da decisão anterior que reconheceu a necessidade de prisão provisória, isto é, a sua custódia não será efeito natural da condenação (art. 393, I, do CPP), como execução provisoriamente da pena.

            Ao contrário da jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça já citada, a custódia de réu que esteve preso no decorrer de todo processo não se dá automaticamente em razão da sentença condenatória, mesmo existentes os requisitos do art. 594 do CPP para recorrer em liberdade. Nesta situação, a ordem de prisão deverá ser fundamentada num dos motivos previstos para custódia preventiva.

            Assim como o motivo que determinou a prisão cautelar durante o processo pode subsistir, também pode cessar no momento da sentença; dessa forma, neste último caso, se a apelação do réu tiver efeito suspensivo, recorrerá em liberdade, mesmo que tenha ficado preso por todo processo. Enfim, a prisão só será efeito automático da sentença, com natureza de execução provisória da pena, se o réu não se enquadrar no preceito do art. 594 do CPP.

            Repita-se, o entendimento de que o réu que esteve preso durante a instrução processual não tem direito a apelar em liberdade não é correto, pois, como visto, a manutenção dessa prisão, que tem natureza cautelar, só terá legitimidade se persistirem os motivos que determinaram a custódia cautelar.

            Parte da doutrina já reconhece a posição defendida neste trabalho. Também nesse particular, o magistério de Afrânio Silva Jardim:

            "(...) se o condenado está preso em flagrante e não mais estão presentes os motivos que autorizariam a sua prisão preventiva solto estivesse, deve ele gozar da liberdade provisória do parágrafo único do art. 310 do Código de Processo Penal.

            Da mesma forma, não se iniciando a execução provisória da pena, se o réu condenado estava preso preventivamente somente deverá permanecer preso enquanto persistirem os motivos desta prisão. A contrario sensu, desaparecendo os motivos que determinaram a prisão preventiva, deve a custódia cautelar ser revogada, em obediência ao disposto no art. 316 do Código de Processo Penal. (...)" [08]

            Antônio Scarance Fernandes também corrobora com esse entendimento:

            "Se o acusado já se encontrava preso antes da sentença condenatória, não poderá apelar em liberdade, ainda que primário e com bons antecedentes, caso persistam os motivos ensejadores de sua custódia cautelar. Essa orientação, aceita pela doutrina e pela jurisprudência, não afronta a Constituição Federal, pois, se o acusado esteve preso até a sentença em face de necessidade cautelar, não haveria razão para que, justamente depois de condenado, viesse a ser libertado. Não, contudo, quando no momento da sentença desaparece o motivo que, antes, sustentava a prisão. Assim, se o acusado estava preso para garantia da instrução criminal em virtude de ter ameaçado determinada testemunha, só por esse motivo não teria fundamento a manutenção da custódia na sentença, pois a prova já foi colhida e houve inquirição da testemunha ameaçada" [09] [grifos apostos]

            A prisão cautelar do réu que não satisfaz os requisitos do art. 594 do CPP, então, deve ser fundamentada num dos motivos que autorizam a custódia preventiva, seja por persistirem os motivos que o levaram à prisão durante o processo, seja pela superveniência de outro fato que imponha a medida cautelar para preservação da efetividade da futura execução penal.

            Dessa forma, é possível a decretação da custódia cautelar, no sistema de prisão e liberdade provisória, nos casos em que não é possível a execução provisória da pena pelo efeito suspensivo da apelação, independente de o réu estar solto ou preso no momento da prolação da sentença condenatória recorrível, desde que seja fundamentada a prisão provisória, pois, incidindo a hipótese do art. 594 do CPP, a regra é sempre pela possibilidade de se recorrer em liberdade.


5. Conclusão.

            A análise do sistema processual penal na forma disposta na legislação conduz à conclusão de que a prisão decorrente de sentença condenatória é verdadeira execução provisória da pena, diante dos dispositivos acima analisados e sua íntima relação com os efeitos da sentença e dos recursos.

            A questão mais grave a ser oposta a esse entendimento não é verificada no âmbito legal, mas constitucional: o princípio da presunção de inocência. Já que a prisão decorrente de sentença penal condenatória é anterior ao seu trânsito em julgado, como admitir uma execução provisória, instituto que pela lógica seria incompatível com esse postulado central?

            Apesar da oposição desse princípio ser questão séria, a jurisprudência já estratificou seu entendimento tanto no Supremo Tribunal Federal, quanto no Superior Tribunal de Justiça. Neste último, inclusive é objeto da Súmula 09, em que se afasta a incidência da presunção de inocência como impedimento à prisão decorrente de sentença condenatória, autorizando a prisão provisória com base nos maus antecedentes. [10]

            O mesmo argumento é capaz de ensejar a execução provisória da pena, ainda que não se concorde com tal intelecção. A execução também tem o caráter provisório mantendo a intelecção referente à presunção de inocência, acentuando, por outro lado, todos os outros direitos que o ordenamento confere aos réus, motivo pelo qual esse entendimento privilegia muito mais as garantias do cidadão pela possibilidade de verificação dos benefícios do que se fosse entendida como medida cautelar.

            Daí porque dentro do panorama da jurisprudência brasileira, em que a presunção de inocência não impede uma prisão decorrente da sentença, a alternativa mais consentânea com a interpretação do conjunto das garantias constitucionais do cidadão é o reconhecimento da execução provisória da pena.

            Afastado o argumento constitucionalista por uma questão de realidade jurisprudencial e sendo certo de que a interpretação proposta é respaldada pelo sistema, não há como negar validade a intelecção proposta.

            Apesar da assente maioria dos julgados das instâncias superiores não entenderem dessa forma, há posicionamentos que já aceitam a tese, ainda que não em termos integrais. Isso é que se vislumbra no julgado o Superior Tribunal de Justiça abaixo relacionado, no qual resta admitida a prisão como execução provisória decorrente de decisão impugnada na instância oficial:

            HABEAS CORPUS. ESTELIONATO. ARGÜIÇÃO DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL ANTE A NÃO-CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DO APELO EM LIBERDADE. NÃO-OCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. QUESTÃO SUPERADA.

            1. A alegação de constrangimento ilegal, com base na negativa do benefício do apelo em liberdade, não se sustenta diante da admissibilidade da execução provisória da pena, já que os recursos especial e extraordinário, mesmo quando admitidos, o que não é o caso, não possuem efeito suspensivo capaz de impedir o regular curso da execução da decisão condenatória.

            2. A custódia do sentenciado em cárcere, decorrente de sua condenação na instância ordinária, em sede de recurso de apelação, é providência compatível com o sistema processual vigente.

            3. Ademais, tal assertiva encontra-se superada diante do trânsito em julgado superveniente da decisão respectiva.

            4. Ordem denegada.

            (HC 23.770/MG, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 03.02.2005, DJ 07.03.2005 p. 287)

            No Supremo Tribunal Federal, o Ministro Sepúlveda Pertence há muito reconhece que nos casos de prisão decorrente de sentença penal condenatória há verdadeira execução provisória [11], e que tal instituto seria inconstitucional quando confrontado com o princípio da presunção de inocência. Demonstrando isso, vai de encontro inclusive a Súmulas e posicionamentos assentes dos tribunais superiores, apesar de ser coerente e correto o raciocínio apresentado.

            A discussão, entretanto, ainda aguarda por julgamento que reaprecie o posicionamento da corte, devendo ser retomada no plenário daquele tribunal, de forma a unificar a jurisprudência e estabelecer a orientação sobre a matéria (HC 85.591/SP) [12].

            De qualquer maneira, afastando-se o entendimento da violação do princípio da presunção de inocência (por razões de realidade jurisprudencial) e aceitando-se a tese como viável, passa-se às conclusões conseqüentes, como imposição do sistema de garantias constitucionais e institutos do processo penal verificados no aparato legislativo infraconstitucional:

            a) A prisão decorrente de sentença condenatória recorrível no momento em que tem como fundamento sua existência exclusivamente na sentença e na produção de seus efeitos, obstável pela interposição de recurso em determinadas condições, não pode ter o rótulo de cautelar nem ser produzir efeitos como tal.

            b) Caracteriza-se, diante da inexistência dos requisitos cautelares, como execução provisória da pena respaldada na análise sistêmica dos dispositivos legais que a sustentam.

            c) Possibilita respeito às garantias constitucionais do cidadão principalmente relacionadas ao processo e à execução das penas, conferindo coerência ao ordenamento jurídico processual penal, tendo como conseqüência benefícios ao réu condenado pela execução da pena.

            d) Harmoniza-se facilmente com o instituto da prisão cautelar sem se confundir com essa. Atua em situação diferente, afastados dos requisitos cautelares, e não impede a superposição entre uma e outra no caso de presença dos requisitos.


6. Bibliografia.

            FERNANDES, Antônio Scarance. Processo Penal Constitucional. 4a. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

            JARDIM, Afrânio Silva. A prisão em decorrência de sentença condenatória recorrível in Direito processual penal. 11a. edição. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

            LOPES JR. Aury. Sistema de investigação preliminar no processo penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001.

            NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo e execução penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

            RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 7a. ed. Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2003.

            MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. Atualização Victor Hugo Machado da Silveira. Campinas: Bookseller, 1997.


Notas

            01 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2003. 7 ed. p. 581.

            02 LOPES JR. Aury. Sistema de investigação preliminar no processo penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001.

            03 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo e execução penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

            04 Em realidade, a sistemática processual moderna, ensina que não se trata de efeito suspensivo da apelação, mas sim, de prolongamento de estado de ineficácia da sentença. A idéia de efeito suspensivo é errônea, pois pressupõe que a decisão produza seus efeitos normalmente até que a interposição do recurso lhe suspenda a eficácia.

            A sentença, ao contrário, nem chega a ter eficácia, ou seja, o recurso, na verdade, gera o efeito obstativo da sentença, a qual permanece sem aptidão para produção dos seus efeitos naturais até o trânsito em julgado.

            Dessa forma, sob uma visão técnica, não é correto falar em efeito suspensivo da apelação. Entretanto, apenas para fins didáticos, continuaremos a utilizar esse termo para indicar a hipótese em que a sentença não gera efeitos imediatos em função da interposição de recurso, até porque, a grande maioria da doutrina continua referindo-se ao efeito suspensivo.

            05 "Não se deve deixar de receber o recurso do réu com a argüição de que ele não quer recolher-se à prisão. Não, pois deixar de receber o recurso, que é um direito inerente ao princípio da ampla defesa, é providência, sim, que entendemos inconstitucional. O juiz expede a ordem de prisão e determina a captura do réu condenado, porém, deve receber seu recurso e processá-lo normalmente. A prisão é um dever do Estado-juiz, o recurso é um direito do réu condenado." RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2003. 7 ed. p. 631.

            06 PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. APELO EM LIBERDADE. RÉU QUE PERMANECEU PRESO DURANTE TODA A INSTRUÇÃO CRIMINAL. MAUS ANTECEDENTES. IMPOSSIBLIDADE. ORDEM DENEGADA.

            1. Não se reconhece direito de apelar em liberdade a réu que permaneceu preso durante toda a instrução criminal, mormente no caso de ter praticado outro delito, ainda mais grave.

            2. Ordem denegada.

            (HC 37528/SP, Rel. Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, SEXTA TURMA, julgado em 03.02.2005, DJ 28.02.2005 p. 372).

            HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL E PENAL. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. EXASPERAÇÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. APELO EM LIBERDADE. RÉ QUE PERMANECEU PRESA DURANTE TODA A INSTRUÇÃO CRIMINAL. IMPOSSIBLIDADE. PERDIMENTO DE BENS. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. AUSÊNCIA DE AMEAÇA AO DIREITO DE LOCOMOÇÃO.

            1. Suposta ausência de fundamentação da pena-base acima do mínimo legal. Constrangimento ilegal não configurado. Magistrado que declinou com motivação concreta a presença de circunstâncias desfavoráveis. O pedido da impetração requer uma profunda análise no conjunto probatório, pois a decisão resta fundamentada. Não há constrangimento perceptível primus ictus oculis, que justificariam a via Augusta do habeas corpus.

            2. Não se reconhece direito de apelar em liberdade a ré que permaneceu presa durante toda a instrução criminal.

            3. Incabível a sede eleita para análise da perda de bens imposta em sentença condenatória, pois não há constrangimento à liberdade de locomoção da paciente.

            4. Ordem parcialmente conhecida, e nesse ponto, denegada. (HC nº 38825, Min. Rel. Hélio Quaglia Barbosa, T-6, Sexta Turma, Publicado no DJ de 19.12.2005).

            07 JARDIM, Afrânio Silva. A prisão em decorrência de sentença condenatória recorrível in Direito processual penal. 11a. edição. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

            08 JARDIM, Afrânio Silva. A prisão em decorrência de sentença condenatória recorrível in Direito processual penal. 11a. edição. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 276.

            09 FERNANDES, Antônio Scarance. Processo Penal Constitucional. 4a. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 329.

            10 Súmula 09 do Superior Tribunal de Justiça: A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência.

            11 EMENTA: I. Habeas corpus: competência do STF: não e substitutivo de recurso ordinário de habeas corpus, de modo a deslocar-se para a competência do STJ, a impetração cujo objeto, embora anteriormente ventilado em habeas corpus perante o Tribunal de Origem, foi depois reiterado, sem exito, em recurso por ele desprovido (precedente: HC 71.431, 28.6.94, Moreira Alves). II. A prisão decorrente de decisão condenatória recorrivel - quando admitida, conforme o entendimento majoritario no STF (e não obstante a presunção constitucional de não culpabilidade), independentemente da demonstração de sua necessidade cautelar -, constitui verdadeira execução provisoria da pena que não se deve efetivar em regime mais severo que o da eventual condenação definitiva. III. Conseguinte admissibilidade da progressão de regime de cumprimento da pena ou de aplicação imediata do regime menos severo determinado na sentença, tanto mais quanto sujeita apenas a recurso de defesa (cf. HC 68.572, Neri da Silveira, Lex 159/263) ou, como ocorre no caso, a apelação de assistente do Ministério Público, que não tem efeito suspensivo (C.Pr.Pen., art. 598).

            (HC 72162/MG; Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE; Julgamento: 07/03/1995; Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA; Publicação: DJ 05-05-1995 PP-11905 EMENT VOL-01785-02 PP-00349)

            12 Notícia extraída do Informativo do STF, n. 389, de 23 a 27 de maio de 2005: Execução Provisória de Pena e Princípio da Presunção da Não-Culpabilidade. O Tribunal iniciou julgamento de habeas corpus, afetado ao Pleno pela 1ª Turma, impetrado contra decisão do STJ, que denegara igual medida, em que se pretendia a suspensão do recolhimento imediato do paciente à prisão e o reconhecimento do seu direito de aguardar o julgamento de recursos futuros em liberdade. Na espécie, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por maioria, negara provimento à apelação do paciente, mantendo a sentença, com expedição de mandado de prisão, que o condenara, pela prática de uma série de crimes, às penas de reclusão, em regime fechado, e de detenção, em regime semi-aberto, tendo a divergência de votos se restringido à quantificação da pena imposta a um dos crimes e ao regime de cumprimento de outro. O Min. Sepúlveda Pertence, relator, concedeu a ordem, por entender que a prisão fundada em decisão condenatória recorrível, quando não motivada em razões de ordem cautelar, substantiva execução provisória de pena não definitivamente aplicada, em ofensa ao princípio da presunção de não-culpabilidade (CF, art. 5º, LVII). Após, pediu vista dos autos a Min. Ellen Gracie. O Tribunal, por unanimidade, deliberou conceder a liberdade provisória ao paciente até a decisão final do writ. HC 85591/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 25.5.2005. (HC-85591)


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SILVEIRA, Daniel Coutinho da; RODRIGUES, Leandro Nascimento. Da natureza jurídica da prisão decorrente da sentença penal condenatória conforme interpretação jurisprudencial do princípio da presunção de inocência. Apologia da execução provisória da pena. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 995, 23 mar. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8142. Acesso em: 30 abr. 2024.