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Eutanásia no cinema

Eutanásia no cinema

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Análise cinematográfica sobre a eutanásia em diferentes países confronta a ficção com a realidade, buscando mostrar como ela é tratada socioculturalmente.

Resumo: O presente trabalho tem como objetivo abordar a eutanásia como um fenômeno jurídico sob o ponto de vista cinematográfico por intermédio da análise de filmes, séries e documentários originários dos seguintes países: Estados Unidos, Espanha, França, Itália, Bélgica, Suíça e Brasil, e confrontar o desenvolvimento destes na ficção com a realidade, com o estudo da legislação de cada país, buscando mostrar como a eutanásia é tratada em diferentes contextos socioculturais.

Palavras-chave: Eutanásia. Biodireito. Direito Penal. Direito Civil.

Sumário: 1. Conceitos e histórico da eutanásia. 1.1. A Morte na Bioética. a. Distanásia. b. Mistanásia. c. Ortotanásia. 1.2. Eutanásia no cinema. 2. Menina de Ouro (Million Dollar Baby, 2004, Estados Unidos) 2.1. Eutanásia nos Estados Unidos da América. 2.2. A Conduta praticada no filme. 3. Mar Adentro (The Sea Inside, 2004, Espanha). 3.1. Eutanásia e suicídio assistido no Código Penal Espanhol 3.2. Ley de Muerte Digna (Lei de Morte Digna) nas comunidades espanholas. 3.3. Lei Nacional da Morte Digna (Ley Nacional de la Muerte Digna) 3.4. Conduta de Rosa (Ramona Maneiro). 4. Amor (Amour, 2003, França) 4.1. A Legislação Francesa sobre eutanásia. 4.2. Conduta praticada no filme Amour: Eutanásia ou homicídio? 5. A Bela Que Dorme (La Bella Addormentata, 2012, Itália). 5.1. Eutanásia no Código Penal Italiano. 5.2. Caso Eluana Englaro e Jurisprudência. 5.3. Caso Fabiano Antoniani (DJ Fabo). 5.4. Lei 219/2017 (Disposição Antecipada de Tratamento). 5.5. Decisão do Tribunal Constitucional. 5.6. Condutas retratadas no filme. 6. Mate-me, por favor (Kill me, Please, 2010, Bélgica). 6.1. Eutanásia na Bélgica. 6.2. Lei de 28 de maio de 2002. 6.3. Conduta retratada no filme. 7. O Turista Suicida (The suicide tourist, 2007, Suíça). 7.1. Eutanásia no Código Penal Suíço. 7.2. Organizações de Assistência ao Suicídio. 7.3. Dados sobre o suicídio assistido na Suíça. 7.4. Conduta retratada no documentário. 8. Minissérie Justiça (Episódio 04, 2016, Brasil). 8.1 Eutanásia no Código Penal Brasileiro. 8.2. Resoluções do Conselho Federal de Medicina. 8.3. Eutanásia no Projeto de Lei nº 236/2012. 8.4. Conduta retratada na minissérie Justiça. 9. Conclusões.


INTRODUÇÃO

A eutanásia é um tema bastante controverso, mas que merece atenção, por meio da eutanásia ou “boa morte”, pessoas com doenças terminais ou que sofrem com outras doenças que retiram a sua dignidade, tem a chance de realizar seu último ato de vontade suprema, optar pela morte digna. A presente dissertação tem como objetivo lançar um novo olhar sobre o tema analisando como ocorre sua abordagem na indústria cinematográfica.

Essa análise é necessária, pois o tema já foi abordado sob o ponto de vista ficcional em vários filmes, séries e documentários, retratando personagens reais ou fictícios que discutem o direito de morrer, a autonomia da vontade e o direito à vida, temas relevantes que são regidos pelas legislações dos diversos países citados ao longo desta dissertação, essas normas serão o parâmetro de averiguação das condutas apresentadas no filme com a realidade, o que nos permitirá entender o contexto em que a eutanásia se insere em cada país. Os países escolhidos para essa abordagem foram: Estados Unidos da América, Espanha, França, Itália, Bélgica, Suíça e Brasil. Cada país tem seus próprios princípios e valores éticos e morais, o que permite conhecer o tema sob pontos de vistas diversos, pois as discussões sobre eutanásia no âmbito interno da jurisdição refletem o processo histórico, social e cultural em que cada uma dessas sociedades se encontram, onde a lei é o resultado desse processo e o elemento fundamental para a sua compreensão no contexto interno dos países analisados.

No cinema a eutanásia é geralmente apresentada em forma de filmes dramáticos e/ou românticos que tem como protagonista alguém debilitado que sofre profundamente em razão de uma doença ou condição física incurável, e ela aparece como a solução mais viável para o fim daquele sofrimento insuportável. Essa visão por vezes romantizada, não comporta a importância do tema com a realidade, pois a prática exige uma grande imersão em discussões nos poderes legislativo e judiciário a respeito do direito à vida e a sua irrenunciabilidade e o direito de morrer e a autonomia privada, onde essas discussões resultam em legislações sobre o tema que seguem um dos dois direcionamentos.

O cinema como expressão artístico-cultural exerce grande influência sobre a população, os filmes Menina de Ouro, Amor e Mar Adentro, tiveram grande aceitação do público e ganharam vários prêmios, trazendo à tona o debate sobre a eutanásia, isso demonstra que o cinema é uma ferramenta importante nessa discussão, pois aproxima o público do fenômeno jurídico apresentado e permite que tomem parte no diálogo sobre o tema junto aos poderes.

Assim, teremos a análise da eutanásia sob dois pontos de vistas e uma comparação entre eles, que imergirá a partir das condutas apresentadas em cada um dos filmes, onde também será analisado o tipo de eutanásia envolvido.

Partiremos do estudo do filme com as cenas fundamentais na discussão do tema, em seguida será feita a análise das legislações sobre o tema no país do qual se origina e dos casos relevantes, caso existam, ocorridos naquele país. Então, haverá a aplicação do nexo causal.

A arguição do nexo causal será fundamental nesta análise, constituindo o liame entre a lei e a conduta evidenciada no filme, o nexo causal ou nexo de causalidade, é um conceito de direito penal, que ocorre quando a conduta praticada pelo agente é prevista no ordenamento jurídico, ou seja, é penalmente relevante, essa conduta pode ser ativa, omissiva ou comissiva, e todas são relevantes na aplicação do direito e nesta análise.

Por fim, haverá a conclusão a respeito da imputabilidade ou inimputabilidade da conduta analisada sob o prisma da respectiva legislação e o artigo ao qual se sobrepõe, bem como, jurisprudências, se houverem, que aumentem, diminuam ou extingam a pena do agente.

Assim, este trabalho permitirá conhecer a eutanásia sob o ponto de vista teórico e prático, desde o seu conceito e história até as legislações recentes que serão utilizadas como fundamento da análise das obras cinematográficas.


“Para uma mente bem estruturada, a morte é apenas a aventura seguinte.”

J. K. Rowling


1. CONCEITOS E HISTÓRICO DA EUTANÁSIA

O termo eutanásia vem da junção das palavras gregas ‘’eu’’ e ‘’thanatos’’, que podem ser traduzidas como “boa morte”. Este termo foi criado por Francis Bacon, no século XVII, que o abordou em sua obra Historia vitae et mortis. Segundo o filósofo, a eutanásia seria a forma mais adequada de tratamento para os doentes incuráveis, uma forma humanitária de aliviar o seu sofrimento diante da morte inevitável.

Segundo Lameira Bittencourt (1939, apud SILVA, Sônia Maria Teixeira da, 2000), a eutanásia é tão-somente a morte boa, piedosa e humanitária, que, por pena e compaixão, se proporciona a quem, doente e incurável, prefere mil vezes morrer, e logo, a viver garroteado pelo sofrimento, pela incerteza e pelo desespero.

Para Genival Veloso de França (2014), eutanásia quer dizer morte piedosa, morte benéfica, fácil, doce, sem sofrimento e dor, boa morte, crime caritativo, ou, simplesmente, direito de morrer.

1.1.A Morte na Bioética

A eutanásia é definida na bioética como sendo a morte piedosa do paciente em estado terminal e grave, com o seu consentimento:

Nos dias atuais a nomenclatura eutanásia vem sendo utilizada como a ação médica que tem por finalidade abreviar a vida de pessoas. É a morte de pessoa- que se encontra em grave sofrimento decorrente da doença, sem perspectiva de melhora produzida por médico, com consentimento daquela. (SÁ; NAVES, 2018, p.38).

Embora a eutanásia seja a forma mais amplamente discutida nas reflexões sobre a morte, existem ainda as modalidades denominadas como: distanásia, mistanásia e ortotanásia. Cada uma destas será discutida nas subseções seguintes

a) Distanásia

A palavra ‘’distanásia’’ tem origem grega, e deriva das palavras ‘’dis’’ e ‘’thanatos’’ que significam, respectivamente, afastamento e morte. É definida pelo Aurélio, como uma morte lenta, ansiosa e com muito sofrimento. A distanásia, é, portanto, a antítese da eutanásia, a tentativa de afastar a morte por meio de um tratamento que prolongue a vida do paciente terminal, ainda que em grande sofrimento, pelo maior tempo possível.

Nas palavras de Leocir Pessini (2004), é também sinônimo de tratamento fútil e inútil, que tem como consequência uma morte medicamente lenta e prolongada, frequentemente acompanhada de sofrimento.

b) Mistanásia

A mistanásia, também conhecida como eutanásia social, advém da junção de dois termos gregos, “mis” (infeliz) e “Thanatos” (morte), significando, portanto, uma morte infeliz. Decorre da exclusão social, ausência de dignidade humana, omissão de socorro e negligência estatais.

Segundo Cecília Lopes (2011), é a morte miserável, fora e antes da hora que se refere, principalmente, à grande massa de doentes e deficientes que não chegam à condição de pacientes, pois não conseguem ingressar efetivamente no sistema de saúde. Etimologicamente significa a “morte do rato”.

No Brasil, temos como exemplo de mistanásia, o Hospital psiquiátrico de Barbacena em Minas Gerais, cujo caso ficou conhecido como ‘’Holocausto Brasileiro’’, no qual, cerca de 60 mil pessoas foram submetidas a tratamentos degradantes e morreram em conseqüência destes. Também, podemos citar a seca no Nordeste que teve como consequência a morte milhares de pessoas ao longo das décadas em decorrência da fome e sede, sem que houvesse uma interferência Estatal para melhorar esse cenário degradante.

c) Ortotanásia

Por fim, a ortotanásia seria a “morte ideal”, do grego, “morte correta”, “orto” certo, “thánatos” morte. Temos nesse contexto, a morte como um curso natural da vida e a total assistência ao paciente terminal, com o apoio médico, de familiares e amigos. Segundo Cecília Lopes (2011), consiste em garantir ao paciente terminal uma qualidade de vida, de bem-estar global, que o permita sentir a dignidade no seu viver e no seu morrer.

O curta-metragem Extremis (2016) mostra a realidade de pacientes terminais em uma UTI, onde é colocada para eles, ou quando impossibilitados, as suas famílias, a difícil decisão de optar entre a distanásia e prolongar a vida artificialmente, presos a tubos mecânicos que controlarão seus órgãos vitais ou a ortotanásia, em que os aparelhos serão desligados e a vida seguirá o seu curso.

Ainda nessa área, o documentário A Partida Final (2018), mostra a ambiguidade entre a ortotanásia e a distanásia, em um Hospital de San Francisco nos EUA, onde os pacientes que optam pela ortotanásia recebem toda a orientação e cuidados paliativos necessários para lidar com a morte iminente, podendo escolher entre voltar para suas casas ou continuar no Hospital, e os pacientes que não podem ou que os familiares não permitem que saibam de sua condição, vivem os seus últimos dias atrelados a equipamentos médicos.

A difícil decisão de manter pessoas vivas de forma artificial ou permitir que estas vivam, ainda que de forma limitada, de maneira natural e em suas próprias casas é tratada em ambas as séries com a complexidade necessária, mas, também de forma prática pelos médicos, onde demonstram que decisões racionais a respeito do tema são praticamente impossíveis, ainda que a medicina seja matéria de certezas.

d) Histórico da Eutanásia

A eutanásia era uma prática comum entre os povos antigos que sacrificavam os velhos e doentes em nome da sobrevivência1 . Neste caso, a eutanásia tinha um significado diferente, simplesmente eugênico, em que a morte dos fracos se justificava não por dignidade ou compaixão, mas sim pelo bem da sociedade.

Na Grécia antiga, a eutanásia e o suicídio eram aceitos em determinadas condições, a eutanásia era considerada um método de higienização social por meio do qual eram retirados da sociedade todos os indivíduos considerados inúteis, como deficientes, doentes incuráveis e idosos. Em Marselha, um depósito de cicuta ficava à disposição de quem desejasse pôr fim à própria vida. E na Ilha de Cós, os mais velhos eram levados a uma festa, onde lhes era ofertado veneno.

Em Esparta, cidade iminentemente militar, no século 9 a.C, Licurgo tornou lei a eutanásia, os nascidos com alguma deficiência e os idosos eram atirados de um monte por serem considerados inúteis para se tornarem guerreiros. Já em Atenas, o Senado decidia sobre a eliminação dos idosos e doentes incuráveis. Filósofos como Platão e Sócrates, defendiam a eutanásia, pois consideravam que uma enfermidade dolorosa era uma boa razão para optar pelo suicídio. Já para Aristóteles, a morte para fugir das fraquezas humanas não se justificava. Assim como Hipócrates que se posicionou veemente contra a prática sob o seguinte juramento: “eu não darei qualquer droga fatal a uma pessoa, se me for solicitado, nem sugerirei o uso de qualquer uma deste tipo”.

No Egito, no período entre 69 e 30 a.C, Cleópatra e Marco Antônio criaram uma academia com o propósito de estudar as formas menos dolorosas de se alcançar a morte.

Em Roma, a eutanásia ocorria quando os Césares romanos ao apontarem um dos polegares para baixo, determinavam a morte dos gladiadores feridos em combate nas arenas. Em 80 a.C, a lei Cornelia, promulgada pelo imperador Lucio Cornelio Costa, concedeu tratamento especial ao médico que matava o enfermo em virtude de compaixão, considerando tal ato como um homicídio benigno ou tolerável que merecia um tratamento mais brando.

A eutanásia é citada também na Bíblia, no livro de Samuel, ao relatar a morte do rei Saul, que ferido em combate, ordenou ao seu escudeiro que o matasse, e quanto este relutou, o rei lançou-se sobre sua própria espada e não morrendo imediatamente, o escudeiro, se jogando sobre ele, pôs fim ao seu sofrimento.

No novo testamento, a morte piedosa é citada na crucificação de Jesus Cristo, quando o oferecem vinagre embebido em fel, cujo objetivo era acelerar a morte dos crucificados.

Os celtas, por sua vez, tinham o hábito de matar os mais velhos e doentes, por entenderem que estes eram inúteis para a coletividade. Também, sob a concessão da Lei das Doze Tábuas, após a deliberação de cinco vizinhos, o pai poderia tirar a vida do filho que nascesse com algum tipo de deformidade.

Na Índia, os enfermos incuráveis eram conduzidos pela sua família até as margens do rio Ganges, e lá tinham a boca e as narinas tampadas com o barro do rio, onde eram jogados em seguida.

Os brahamanes, abandonavam as crianças de até dois meses na selva, quando acreditavam que apresentava comportamento de má-índole.

Na Birmânia, os velhos e doentes incuráveis eram enterrados vivos ou enforcados, quando assim o desejassem.

Os escandinavos, eslavos, sardos e selvagens das Ilhas Fiji, adotavam a mesma prática, quando os anciãos, débeis e doentes incuráveis os sobrecarregavam.

Os esquimós anciãos, doentes e enfermos, podiam manifestar a família o desejo de morrer, e esta cumpria seu desejo, ora abandonando-os na natureza, ora os matando ou ainda os trancafiando em Iglus fechados.

Na América do Sul, os índios brasileiros, conforme asseverado por Frei Vicente de Salvador, ao se depararem com uma doença incurável, interrompiam o tratamento ao doente, abandonando-o a própria sorte.

Na Bolívia, os índios aimarás, dirigiam-se a casa do doente terminal para acompanhá-lo até o momento da morte, e quando esta demorava a chegar, os familiares, quando solicitada ajuda para morrer, o privavam de água e alimentos até que morresse.

Na Idade Média, os soldados feridos gravemente eram mortos por seus companheiros com um punhal intitulado “misericórdia”.

Na Idade Moderna, assim como na Idade Média, existem poucos relatos a respeito da prática de eutanásia ou até mesmo sobre discussões. No entanto, nessa época, Napoleão consultou um cirurgião sobre a possibilidade de oferecer ópio aos soldados acometidos de peste e sem possibilidades de cura, tendo este se recusado. O objetivo de Napoleão era evitar que os soldados fossem capturados pelos turcos.

A eutanásia sempre foi muito discutida pela humanidade, tendo sido objeto de questionamento de alguns pensadores importantes, como: Martinho Lutero, Thomas Morus (Utopia), David Hume (On suicide), Karl Marx (Medical Euthanasia) e Schopenhauer.

Na Prússia, em 1895, na proposição do plano nacional de saúde, houve a proposta de inclusão de meios para facilitar a eutanásia aqueles que não pudessem solicitá-la, de modo que o Estado atuasse disponibilizando os meios necessários a sua realização.

Mais tarde, na Alemanha, com a instituição do regime nazista, foi difundida a pseudoeutanásia ou eutanásia eugênica que tinha como objetivo exterminar do Estado todos os deficientes, negros, homossexuais, entre outros, baseada na ideia de “higienização social’’ e aprimoramento da raça ariana, essa prática foi considerada como um dos maiores crimes contra a humanidade e teve como resultado a morte de milhões de judeus.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial e queda da Alemanha em 1945, o uso do termo eutanásia passou a ser usado apenas para designar a morte motivada pela compaixão para o doente incurável e em forte sofrimento físico.

Em 1931, o Dr. Millard, na Inglaterra, colocou em pauta, um projeto de lei que legalizava a eutanásia voluntária no país, a proposta foi debatida e em meio a essa discussão, o médico real, Lord Dawson, admitiu ter colaborado na morte do rei George V por meio de morfina e cocaína, o projeto de lei foi rejeitado em 1936, posteriormente, esse posicionamento serviria de base para o modelo holandês.

Em 1934, o Uruguai incluiu a eutanásia em seu ordenamento jurídico com o status de homicídio piedoso no Código penal, Lei 9.414/1934, o art.37 dispões que “os juízes têm o poder de exonerar o sujeito de origem honrosa, autor de um homicídio, causado por motivos de misericórdia, através de repetidos apelos da vítima.”

Em 1954, Joseph Fletcher, teólogo episcopal, escreveu o livro “Morals and Medicine”, com um capítulo dedicado a eutanásia, denominado “Euthanasia: our rigth to die”, posteriormente, em 1956, a Igreja Católica condenou a eutanásia, considerando-a contra a “lei de Deus”. No entanto, em 1957, o Papa Pio XII, admitiu a possibilidade de se encurtar a vida por meio de remédios que tenham o intuito de diminuir as dores dos pacientes. Não se deve entender esse posicionamento como a utilização de remédios sendo usados diretamente para provocar a morte, mas sim, como a morte sendo causada de forma secundária pelo efeito dos remédios (duplo efeito).

Em 1968, a Associação Mundial de Medicina se posicionou contra a Eutanásia por meio de uma resolução.

Em 1973, ocorreu na Holanda, o julgamento da médica Geertruida Postma, que praticou eutanásia usando uma dose letal de morfina após reiteradas súplicas de sua mãe, a médica foi condenada por homicídio, ficou presa (suspensa) por uma semana e obteve liberdade condicional por um ano. Neste julgamento, estabeleceram-se os critérios para atuação do médico.

Em 1980, o Vaticano se posicionou pela proposta de duplo efeito por meio de uma declaração em que admitia a descontinuação do tratamento considerado fútil.

Em 1981, a Corte de Rotterdam, revisou e instituiu os métodos para o auxílio à morte. Posteriormente, em 1990, a Real Sociedade Médica dos Países Baixos e o Ministério da Justiça, instituíram um meio de notificação para os casos de eutanásia, esse procedimento não tornava a eutanásia uma prática legal, mas permitia a isenção dos profissionais em procedimentos criminais.

Em 1991, na Califórnia, houve uma tentativa de inserção da eutanásia no Código Civil, que não surtiu efeito. No mesmo ano, a Igreja Católica por meio de uma Carta enviada aos Bispos pelo Papa João Paulo II, reiterou seu posicionamento contrário a eutanásia e o aborto, alertando para a vigilância nos hospitais católicos.

Em 1996, nos Territórios do Norte da Austrália, foi aprovada uma lei que possibilitava a eutanásia, porém, essa lei foi revogada alguns meses depois.

Neste mesmo ano, no Brasil, foi proposto no Senado Federal, o projeto de lei 125/96, que legalizava a prática da eutanásia no país, no entanto, após avaliação por comissões especializadas, acabou sendo rejeitado.

Em maio de 1997, a Corte Constitucional da Colômbia, instituiu que “ninguém pode ser responsabilizado criminalmente por tirar a vida de um paciente terminal que tenha dado seu claro consentimento.” A Colômbia possuía um Movimento de Direito à Morte desde 1979, sendo o primeiro de um país sul-americano.

Em outubro do mesmo ano, o Estado do Oregon, nos Estados Unidos, tornou legal a prática do suicídio assistido, que acabou sendo interpretado de forma errônea, como se tivesse sido legalizada a prática da eutanásia, o que de fato, não ocorreu.

Em novembro de 2000, a Câmara de Representantes dos Países Baixos, aprovou uma legislação tratando da morte assistida, segundo esta lei, a eutanásia pode ser solicitada inclusive por menores de idade. No entanto, faltava ainda a aprovação do Senado, finalmente, em 2002, os Países Baixos, tornaram a prática da eutanásia legal no país, tornando-se o primeiro país no mundo a autorizar que os médicos auxiliassem pessoas a morrer. Para se candidatar a prática é necessário que a pessoa esteja sofrendo de forma intolerável e sem perspectiva de alívio, não sendo necessário que essa condição seja fatal.

A eutanásia não é prevista no ordenamento jurídico brasileiro, mas o código penal, no art.121 §1°, trata do homicídio por relevante valor moral ou social, que neste caso seria a piedade do agente com o sofrimento do paciente terminal que padece de grande sofrimento físico, há ainda a previsão do artigo 122 do mesmo diploma legal, que proíbe a indução ou a prestação de auxílio ao suicídio, no Brasil, portanto, a eutanásia é considerada crime de homicídio.

Em alguns países como Holanda, Suíça, Bélgica e Estados Unidos, a eutanásia é permitida, a Suíça é um dos países mais avançados do Mundo na adoção desta prática, o chamado ‘’turismo da morte’’, permite que pacientes do Mundo inteiro possam se inscrever para morrer, auxiliados por instituições especializadas como Dignitas e Exit. A autonomia privada prevalece nestes casos, sendo suprema a vontade do doente de pôr fim a sua vida.

Um dos países mais conhecidos na prática do suicídio assistido é a Suíça, país onde não há legislação específica sobre a eutanásia, no entanto o Código penal prevê em seu artigo 115°/1 a punição de 03 (três) anos para o agente que por motivos atendíveis, designadamente compaixão pela vítima, provoque a morte de outra pessoa, a seu pedido genuíno e insistente, o país também permite a prática da eutanásia passiva provocada pelo próprio paciente ou com a interrupção dos tratamentos.

1.2. Eutanásia no Cinema

A eutanásia é um tópico amplamente discutido na mídia e na arte por ser um tema sensível que atrai muito público e com isso acaba repercutindo entre a sociedade. Neste capítulo analisaremos o tratamento dado a este assunto especificamente nas mídias visuais. Para isso, foram analisados sete filmes, produzidos no período de 2004 a 2016, sendo observadas as seguintes atitudes: a forma como a eutanásia acontece, a conduta de quem a praticou e a motivação, que foram comparadas com a legislação vigente nos países de origem do filme.


2. Menina de Ouro (Estados Unidos)

O filme Menina de Ouro (Million Dollar Baby, 2004, Estados Unidos) retrata a vida da garçonete Maggie Fitzgerald, cujo sonho era se tornar uma grande boxeadora profissional, nascida em uma família desestruturada, a protagonista perde o pai ainda na infância e a sua mãe sobrevive de golpes aplicados na previdência, sem perspectivas de um futuro melhor, ela deixa sua cidade natal para ir em busca do seu objetivo.

Ao chegar em Los Angeles, Maggie procura insistentemente o treinador Frankie Dunn que se recusa a treiná-la por ser mulher e a manda desistir por já estar com a idade avançada para lutar profissionalmente. No entanto, Eddie, funcionário da academia e melhor amigo de Frank, enxerga seu potencial e a incentiva a continuar.

Por fim, Frank aceita treiná-la, e em pouco tempo, ela se torna uma boxeadora famosa, Maggie e Frank se tornam próximos criando um vínculo de pai e filha. No entanto, em uma luta com uma lutadora desleal, sofre uma lesão medular que a deixa tetraplégica e segundo os médicos a lesão é incurável.

Ciente de sua nova condição, de que nunca mais voltaria a lutar, a obstinação de Maggie em se tornar uma grande lutadora dá lugar a uma luta obstinada pela morte. Em uma conversa com Frank, ela desabafa: “eu lutei para vir a esse mundo e agora eu quero lutar para sair dele”, então pede que ele a mate, assim como o seu pai fez com o seu cachorro na infância, Maggie viu naquele gesto do pai um ato de amor e deseja que o mesmo aconteça com ela. Mas Frank reluta em atender ao pedido e começa a questionar seus valores morais, éticos e religiosos. O padre o aconselha a não atender ao desejo da lutadora, por ser um pecado imperdoável. Enquanto isso, no hospital, ela tenta de diversas formas pôr fim à própria vida.

Então, Frank toma a decisão de atender ao desejo de Maggie, e planeja sua morte em duas etapas, desligar o respirador e em seguida aplicar uma injeção letal em dosagem bem maior que o suficiente para que ela não sofresse.

2.1. Eutanásia nos Estados Unidos da América

A eutanásia é proibida nos EUA2, conforme prevê a Emenda nº 5 da Constituição, que dá a vida o status de direito fundamental, do qual ninguém poderá ser privado sem que ocorra o devido processo legal:

Ninguém será detido para responder por crime capital, ou outro crime infamante, salvo por denúncia ou acusação perante um Grande Júri, exceto em se tratando de casos que, em tempo de guerra ou de perigo público, ocorram nas forças de terra ou mar, ou na milícia, durante serviço ativo; ninguém poderá pelo mesmo crime ser duas vezes ameaçado em sua vida ou saúde; nem ser obrigado em qualquer processo criminal a servir de testemunha contra si mesmo; nem ser privado da vida, liberdade, ou bens, sem processo legal; nem a propriedade privada poderá ser expropriada para uso público, sem justa indenização (CONSTITUTION OF THE UNITED STATES, 1787).

No entanto, os Estados Unidos da América, são um estado federal, em que os estados que o compõem, tem competência legislativa para aprovar as leis que serão aplicáveis em seus territórios, mas ainda se sujeitando às leis federais, que possuem valor hierárquico superior, e em razão disso, as leis variam de um Estado para outro, a prática do suicídio assistido é permitida em cinco estados, são eles: Oregon, Washington, Montana, Vermont e Califórnia.

O Oregon aprovou a prática em 1997, através da lei Death With Dignity Act; aprovada por referendo popular.

Sendo o paciente responsável por ingerir o medicamento que será prescrito por seu médico, também é exigido que esteja apto psicologicamente e tenha seu quadro clínico avaliado por dois médicos, a vontade de praticar o procedimento deve partir do enfermo. (DRUM, 2016 apud DINIZ, 2018).

Washington, aprovou o suicídio assistido em 2008, após consulta popular realizada por meio de referendo.

Montana, aprovou por via jurisprudencial em caso concreto firmado pela mais alta instância judicial do Estado, sendo possível solicitar o procedimento por meio de um processo judicial.

Vermont, aprovou através da lei End of Life Choices Act em 2013 e foi o primeiro Estado a aprovar a prática por meio de um processo legislativo e não por referendo.

A Califórnia, local onde o suicídio assistido é retratado no filme, aprovou a prática em 2015 através do projeto legislativo ABX2 15, que autoriza aos doentes terminais receberem ajuda médica parar morrer. Ao sancionar a nova lei, o governador Brown disse:

O cerne da questão é saber se o Estado da Califórnia deve continuar a considerar crime a vontade de uma pessoa que está morrendo de acabar com sua vida, não importa quão grande a sua dor e seu sofrimento. Não sei o que faria no caso de uma prolongada e dolorosa agonia. Mas estou certo de que seria um conforto poder considerar a opção contemplada neste texto. Não negaria esse direito a outros (BROWN, 2015).

O movimento a favor da morte assistida ganhou maior impulso na Califórnia em 2014, após o caso de Britany Maynard.

Maynard era uma enfermeira de 29 anos, que após ser diagnosticada com um câncer cerebral já em estágio terminal, precisou se mudar da Califórnia para o Oregon, para ter reconhecido o seu direito ao suicídio assistido, bem como, o atendimento necessário para realizá-lo.

2.1.2. A Conduta praticada no filme

A conduta de Frank sob a ótica da Legislação norte-americana sobre suicídio assistido e eutanásia gera controvérsias em razão de não haver uma legislação unificada, mas conforme se desprende da análise das legislações em vigor, o local da prática da conduta é o que definirá se esta é criminosa ou não.

Assim, a conduta de Frank constitui fato criminoso, pois a Califórnia permite a prática de eutanásia apenas para doentes em estado terminal, portanto, ainda que a doente houvesse manifestado de forma inequívoca a vontade de morrer, a ausência do requisito imposto pela lei, qual seja, o da terminalidade da vida, torna o fato típico e punível, nos termos da legislação da Califórnia.


3. Mar Adentro (Espanha)

O filme Mar Adentro (The Sea Inside, 2004, Espanha) foi baseado na história real do marinheiro espanhol Ramón Sampedro, um jovem apaixonado por aventuras que viajou o mundo aos 20 anos, e ficou tetraplégico aos 26 depois de um mergulho raso no mar, costumava dizer, “o mar me deu a vida, e o mar a tirou.”

Após 26 anos atrelado a uma cama quase sem nenhum contato com o mundo exterior, senão pela vidraça da janela de seu quarto, por onde se imagina viajando novamente pelos lugares que conheceu. Ramón decide que é hora de lutar pelo direito de morrer.

Ramón mora com o irmão José, com a cunhada, Manuela, o sobrinho, Javi e com o seu pai, em uma casa no interior da Galícia. Apesar da situação em que se encontra, usa o humor ácido para lidar com as frustrações, escreve poesias manejando um pincel com a boca, e com a ajuda do sobrinho cria invenções para facilitarem sua vida.

No decorrer do filme, aparece Gené, uma ativista que lidera o movimento espanhol chamado morrer com dignidade, que está ajudando Ramón na coordenação da ação que pretende intentar perante a justiça espanhola para conseguir o direito à morte digna. Gené, apresenta a ele a advogada Júlia, que se solidariza com a sua luta, pois sofre de uma doença degenerativa chamada cadasil, com a amizade entre Ramón e Júlia, surgem diálogos que permitem conhecê-lo melhor, através das narrativas das suas viagens, medos, amores e frustrações.

Após uma reportagem sobre Ramón, exibida na TV local, Rosa, uma moça simples, operária de uma fábrica, decide ir até sua casa para conhecê-lo, no entanto, a primeira visita não termina como o esperado, ao questionar Ramón sobre sua vontade de morrer e tentar convencê-lo a mudar de ideia, ele o chama de frustrada, e ela vai embora aos prantos.

No entanto, após ouvir a música que Rosa o dedicara na rádio em que trabalhava como locutora, Ramón decide dar uma nova chance a ela, e ali surge uma amizade cheia de ternura, amor e cumplicidade.

Ramón também recebe a visita de um padre tetraplégico que tem a intenção de persuadi-lo a desistir de buscar o direito ao suicídio assistido, porém, a cadeira de rodas do religioso não consegue ser movida pelas escadas que levam até o quarto dele e os dois travam uma discussão intermediada pelo ajudante do padre, que é encerrada com as seguintes frases: uma liberdade que elimina a vida não é liberdade, diz o religioso. Uma vida que elimina a liberdade não é vida, finda Ramón.

O pedido de Ramón é negado pelas Cortes de Barcelona, que se declararam incompetentes, o caso deveria ser julgado pela Justiça da Galícia por ser o lugar em que Ramón residia.

Na nova fase do processo, Júlia está afastada do caso em razão do avanço da sua doença, o novo advogado propõe que ele vá pessoalmente ao Tribunal para depor. Júlia escreve para Ramón contando que a sua doença havia piorado e que também desejava morrer, os dois decidem que morrerão juntos logo após a publicação do seu livro “Cartas do Inferno”, o livro também serviria como embasamento para o seu pedido de suicídio.

Ramón decide atender ao pedido do advogado e ir pessoalmente a Corte, para realização do feito, elabora o projeto de uma cadeira especial que é feita com a ajuda do seu sobrinho Javi, ele viaja e aprecia o trajeto da viagem com alegria.

Na audiência, perante o tribunal de La Coruña, o advogado de Ramón Sampedro, alega que a vida é um direito, e como tal, deve ser assegurado aquele que a detém dispor de sua própria vida. Tendo em vista, que não haveria ataque a terceiros, mas apenas a si próprio, pois aquele que tenta se suicidar e sobrevive não é processado, mas Ramón não pode fazer o mesmo porque precisa de ajuda. O juiz não permite que o requerente deponha e, também, indefere o seu pleito.

Ciente de que não conseguiria a autorização de que necessitava, Ramón decide pedir ajuda a sua amiga Rosa, pois segundo ele, apenas a pessoa que o amasse verdadeiramente realizaria o seu desejo. Então os dois começam a planejar a forma como o suicídio seria executado.

Sob protestos do irmão e muitas lágrimas do sobrinho e da cunhada, Ramón viaja para a cidade de Boiro, onde Rosa o esperava para ajudá-lo, durante a viagem, ele novamente contempla a paisagem com alegria.

Para a execução do suicídio, foi necessária a contribuição de várias pessoas em pequenos atos que por si só não configuram crime, desde a compra do cianeto até a sua dissolução no copo. Enquanto era filmado para que ficasse claro as autoridades que ingeria o conteúdo do copo sozinho com o auxílio de um canudo, Ramón profere as seguintes palavras:

Caros juízes, autoridades políticas e religiosas, o que é para vocês a dignidade? Seja qual for a resposta de vossas consciências saibam que para mim, isto não é viver dignamente, eu queria, ao menos, morrer dignamente. Hoje, cansado da preguiça institucional, vejo-me obrigado a fazê-lo, as escondidas, como um criminoso. Saibam, que o processo que levará a minha morte, foi cuidadosamente dividido em pequenas ações, que não constituem um delito em si mesmas e que foram executadas por diferentes mãos amigas. Apesar disso, se o Estado insistir em punir os meus ajudantes, eu aconselho que lhes sejam cortadas as mãos porque foi essa a sua única contribuição. A cabeça, quer dizer, a consciência foi proveniente de mim. Como podem ver, ao meu lado tenho um copo de água que contém uma dose de cianeto de potássio. Quando o beber, deixarei de existir, renunciando ao meu bem mais precioso; o meu corpo. Considero que viver é um direito e não uma obrigação, como foi no meu caso. Forçado a suportar esta penosa situação por 28 anos, 4 meses e alguns dias. Passado este tempo, faço um balanço do caminho percorrido e não me dei conta de ter havido felicidade, só o tempo que passou contra a minha vontade, durante a maior parte da minha vida, será a partir de agora meu aliado, só o tempo e a evolução das consciências, decidirão algum dia, se meu pedido era razoável ou não (MAR ADENTRO, 2004).

Assim, Ramón morre, realizando finalmente o seu maior desejo após o acidente. Sua luta e morte se tornaram objeto de discussão na mídia espanhola e no Poder Judiciário.

3.1. Eutanásia e suicídio assistido no Código Penal Espanhol

A Espanha foi um dos primeiros países do mundo a discutir a regulamentação da Eutanásia. Em 1920, o penalista espanhol Dr. Jiménez Asúa propôs a possibilidade de dar a eutanásia o status de homicídio piedoso, a proposta não buscava descaracterizar o delito, mas impedir a punição do agente, desde que tivesse bons antecedentes e que fosse motivado por piedade diante da súplica reiterada da vítima. O modelo nunca foi implementado, mas serviu de base para as legislações do Uruguai e Países Baixos sobre o tema

A eutanásia é considerada crime na Espanha, tratada como induzimento ou auxílio ao suicídio, conforme estabelece o artigo 143 Código Penal espanhol3, no entanto a pena pode ser reduzida nos casos em que há pedido reiterado do paciente em estado terminal:

1.O que induz ao suicídio de outro será castigado com a pena de prisão de quatro a oito anos.

2. Será imposto a pena de prisão de dois a cinco anos para quem/a quem coopera com atos necessários ao suicídio de uma pessoa

3.Será castigado com a pena de prisão de seis a dez anos se a cooperação chegar ao ponto de executar a morte

4.A quem causar ou cooperar ativamente com os atos necessários e diretos a morte de outro, pela petição expressa, seria e inequívoca deste, em caso de que a vítima sofra uma enfermidade/doença grave que conduzirá necessariamente a sua morte, o que produze/possa produzir graves sofrimentos permanentes e difíceis de suportar, será castigado com a pena inferior em um ou dois graus como indicado nos números 2 e 3 desse artigo. (CÓDIGO PENAL ESPANHOL, 1995)

No auxílio ao suicídio, a vítima já possui a ideia pré-estabelecida de morrer e o agente apenas a assegura os meios necessários para a execução.

Na indução, a vítima não pensa em tirar a própria vida, mas é induzida pelo agente que incute nela tal ideia.

Nos casos de auxílio a pessoa em estado terminal, é necessário que haja a clara e inequívoca vontade dela de tirar a própria vida.

3.2. Ley de Muerte Digna (Lei de Morte Digna) nas comunidades espanholas

Várias comunidades autônomas espanholas possuem leis próprias tratando sobre a morte digna, porém algumas não as aplicam, é o caso de Cantabria e Castilla, que aguardam a aprovação de uma lei nacional sobre o assunto.

Em 2010, Andalucía foi a primeira comunidade a aprovar uma lei que tratasse sobre a morte digna, esta lei busca garantir aos cidadãos o acesso a tratamento para dor, bem como proíbe a obstinação terapêutica, dando liberdade aos pacientes de paralisar qualquer tratamento, mesmo quando essa interrupção colocar a sua vida em risco.

Asturias, aprovou em 2018 a Lei sobre Direitos e Garantias no Processo Final da Vida (Ley sobre Derechos y Garantías en el processo final de la vida), que ampliou os direitos dos cidadãos que se encontram nesse estado e outorgou segurança jurídica a equipe médica que os atendem.

Aragón, aprovou em 2011, a Lei de Direitos e Garantias da Pessoa em Processo de Morrer (Ley de Derechos y Garantías de la Persona en el Proceso de Morir).

Nas Ilhas Baleares, o governo deu luz verde a esse mesmo regulamento em 2015, no entanto, exigiu que o executivo central regulasse a eutanásia a nível estadual, para que os casos pudessem ser especificados, e assim, o processo de auxílio à morte para aqueles que a solicitassem se tornasse mais fácil.

Nas Ilhas Canárias, desde 2015, também existe uma lei de direitos e garantias da dignidade da pessoa no processo final de sua vida.

A Cantábria não possui lei própria tratando sobre o assunto e aguarda a aprovação de uma lei nacional que trate a eutanásia, no entanto possui um programa de cuidados paliativos abrangentes.

Em Castilla y León, a morte digna não é regulamentada, mas existem propostas não legais em relação à vontade de viver, cuidados paliativos e direito a morte digna. Existe também, um projeto de lei tratando sobre cuidados paliativos. Em Castilla – La Mancha, não há regulação sobre morte digna.

A Catalunha também não tem legislação sobre morte digna, mas por meio de um projeto de lei de 2017, pediu ao Congresso a descriminalização da Eutanásia.

Na Comunidade Valenciana, em 2019 os tribunais aprovaram uma lei que garante a dignidade da pessoa e estabelece que todos os pacientes têm o direito de receber nas instituições públicas ou privadas, os cuidados paliativos necessários à sua situação. Essa lei também introduziu medidas como o Planejamento Avançado de Decisões.

Na Extremadura, não existe lei de morte digna, mas um registro de expressão antecipada de testamentos, criado em janeiro de 2008.

A Galícia, aprovou em junho de 2015, uma lei direcionada ao desenvolvimento dos momentos finais dos pacientes que possuem uma expectativa de vida limitada.

Em Madri, foi aprovada em 2017, a lei para as pessoas no processo final da vida, que busca regular os cuidados paliativos feitos em casa ou onde o paciente preferir.

Na Murcia, não existe uma regra específica que regulamente a morte digna, mas existe um decreto de 2005 que institui um registro de pessoas e práticas anteriores. Este ano, a Assembleia Regional aprovou uma reforma do Estatuto da autonomia que, entre outros, instituiu o direito a morte digna.

Navarra, possui desde 2003 um registro de testamento vital, no qual estão incluídos os cuidados que a pessoa deseja receber para evitar sofrimento ou prolongar o tratamento agoniante ao qual está submetida. Em 2015, o Parlamento Foral incitou o governo espanhol a modificar o Código Penal e descriminalizar a eutanásia e o suicídio assistido.

Em País Vasco, o Parlamento aprovou em julho de 2018, uma lei que regula a limitação do esforço terapêutico e da sedação, bem como, estabeleceu ao paciente a autonomia de decidir livremente entre as opções clínicas disponíveis, devendo a sua vontade ser respeitada pelos médicos.

Em La Rioja, não existe lei regulamentando a morte digna, mas essa questão é tratada em um documento de última vontade ou testamento vital, esse documento foi lançado pelo governo regional em 2013, e até janeiro deste ano já se encontravam inscritas 2.961 pessoas.

3.3. Lei Nacional da Morte Digna (Ley Nacional de la Muerte Digna)

Em dezembro de 2018, o Parlamento espanhol aprovou a Lei Nacional da Morte Digna ou Lei de direitos e garantias da dignidade da pessoa antes do processo do fim de sua vida, que tem como objetivo garantir cuidados paliativos de qualidade em todas as comunidades.

A lei foi aprovada depois de uma ampla discussão, que contou com a participação de uma Comissão de saúde. Na votação, foi reconhecido o direito da pessoa em processo de morte iminente a ter um tratamento que vise priorizar o seu conforto e amenizar o seu sofrimento acima das tentativas inúteis de prolongamento da vida.

Assim, a nova legislação tem como escopo distinguir o esforço terapêutico razoável que busca prolongar a vida em condições dignas daquele em que o prolongamento do tratamento resulta apenas em um sofrimento desnecessário.

Também busca garantir as pessoas que se encontram nesse processo tanto em instituições públicas como privadas, o apoio de pessoal, seguradoras de saúde e tomadores de decisão.

3.4.Conduta de Rosa (Ramona Maneiro)

A personagem Rosa foi inspirada em Ramona Maneiro, uma amiga real de Ramón Sampedro, Ramona foi presa após a morte de Sampedro, acusada de auxílio ao suicídio, mas foi libertada por falta de provas. No entanto, sete anos após o fato, em janeiro de 2005, momento em que havia ocorrido a prescrição do delito, ela confessou sua participação no crime de auxílio ao suicídio, através de um depoimento para a TV espanhola:

Ele dizia [aos amigos] que ia de viagem (...). Esmaguei uma aspirina e coloquei o pó num dos pratos da balança, no outro pus igual quantidade de cianeto, deitei a quantidade de água que ele me dizia num copo [invólucro de iogurte] e deixei uma palhinha. (...) Ele disse-me uma coisa importante - depois de beber não me beijes os lábios. Não sei quem lhe aconselhou o cianeto, pensei que ao fechar os olhos adormeceria como sempre. Creio que ele sofreu no momento da morte. Tive que me escapar, a única coisa que lhe dizia era "até logo, querido"." que o fim não foi Creio que ele sofreu no momento da morte. (RAMONA MANEIRO, 2005).

A notícia da participação de Ramona, foi recebida sem surpresa pela família de Ramón, que segundo a sua cunhada, Manuela, sempre soube que ela tinha sido a responsável.

Após a morte de Sampedro, Ramona engajou-se na luta pela morte digna na Espanha. Depois do seu depoimento, o caso foi desarquivado, mas foi arquivado novamente por já ter ocorrido a prescrição.


4. Amor (França)

O filme Amor (Amour, 2003, França) se passa na França, e se inicia com os bombeiros invadindo uma casa vazia e se deparando com um corpo rodeado por flores já em estado de decomposição.

A cena seguinte é um concerto de música, onde após o encerramento do espetáculo, o músico é cumprimentado por um casal de idosos, que são os protagonistas do filme.

O primeiro diálogo deles ocorre ao chegar em casa e trata de uma possível invasão no prédio e como ambos reagiriam. O casal vive sozinho e recluso, ao longo das cenas, é possível perceber que já não gostam de interações sociais e não reagem bem as visitas, preferindo o isolamento.

A rotina aparentemente simples começa a passar por mudanças, a começar por uma perda de consciência repentina da mulher, Anne, durante um café da manhã, ao perceber que a mulher estava distante, Georges a chama e não percebe qualquer reação, a molha com uma toalha, mas ainda assim ela permanece inerte. Então, ele sai da mesa e ao retornar, Anne age normalmente, porém não consegue lembrar do ocorrido e pensa tratar-se de alguma brincadeira, deixando o marido irritado, percebendo que a algo de errado com a esposa, Georges decide ligar para o médico, no entanto ela diz não ser necessário.

A filha deles, Eva, os visita e avisa que irá viajar, durante o seu diálogo com Georges, descobrimos que Anne fez uma cirurgia que acabou falhando e o seu problema está pior.

Anne, volta para casa após a cirurgia e está com o lado direito do corpo paralisado, então passa a depender do marido para realizar quase todas as tarefas, ela demonstra desconforto com a situação e pede que o marido a sente na poltrona da sala, ao ficar de frente com Georges, pede que a prometa que nunca mais a levará para o Hospital, ele fica confuso com o pedido e ela diz não ser nada. Ao irem dormir, ela diz que pode dar conta de tudo e que não é necessário que o companheiro abra mão das suas tarefas.

Um amigo deles morre, e ao retornar do enterro, Georges encontra a esposa no chão, ao levantá-la, Anne pergunta do enterro e recebe uma narrativa detalhada de todos os acontecimentos, então, ela diz não saber até onde a sua doença irá os afligir, o marido pergunta se não havia previsto que aquilo também poderia ter acontecido com ele, ao que ela responde “minha imaginação está muito distante da minha realidade.”, também diz que está cheia e precisa deitar.

Eles recebem a visita do músico do concerto, um ex-aluno deles, e Anne pede que ele toque a música bagatela, que foi a primeira que lhe ensinou.

A filha avisa que está voltando e Anne diz que não quer ouvir diálogos sobre seu estado e nem receber olhares.

O músico os manda o seu CD novo e um cartão no qual diz que o dia da visita foi alegre e triste, Anne reage mal a frase e decide não ouvir o disco.

A degradação de Anne, vai acontecendo de forma rápida e a certeza de que a degradação será constante a faz ficar ansiosa e triste, o momento em que recebe a cadeira de rodas elétrica é o único que a faz sorrir, ao acordar molhada pela urina, ela chora, Georges a ajuda a sentar na cadeira e ela sai chorando desesperadamente.

Na cena seguinte, podemos ver o quanto o estado de Anne piorou, já não consegue mais levantar da cama e tem dificuldades para formular frases em uma tentativa de diálogo com a filha, pois seu raciocínio está bastante comprometido. Georges explica a filha que sua mulher teve um segundo AVC e que não há mais soluções médicas possíveis para seu estado, ao passo que o médico o aconselhou a mantê-la em casa, pois as clínicas não oferecem tratamento adequado, a doente passa a ser cuidada por uma enfermeira e demonstra estar profundamente triste.

Seu estado piora ainda mais, e já não há quase nenhum liame entre a sua consciência e a realidade, ela começa ter crises repentinas de choros, alegrias e gritos, a nova enfermeira a penteia e a tenta fazer se olhar no espelho, mas ela rejeita.

Ao perceber que a nova enfermeira estava tratando mal a paciente, Georges a demite e ela o chama de “velho cruel”.

Anne começa a rejeitar alimentos e água, e em uma das tentativas de saciá-la, ela cospe a água, e Georges lhe dá um tapa no rosto, do qual se arrepende imediatamente.

A filha faz uma nova visita, e ele a proíbe de ver Anne, dizendo que a situação dos dois era triste e humilhante, que sua esposa odiaria ser vista no estado em que se encontrava e que sua rotina se resumia a cuidar da esposa, e não havia mérito algum nisso, Eva vai ver a mãe e pergunta se pode fazer algo, mas não recebe qualquer reação devido ao estado avançado da doença, ela sai do quarto e chora, Georges diz que não há mais nada a ser feito, que o estado de Anne só irá piorar até o dia em que acabar.

Um dia Georges é surpreendido pelos gemidos da mulher e decide consolá-la com uma história sobre a sua infância, ao terminar, Anne já estava calma e descansando, nesse momento, ele olha para ela, pega um travesseiro e a sufoca até a morte, em seguida compra flores.

Na penúltima cena, ele escreve uma carta, da qual não é possível saber o conteúdo exceto pela parte em que fala do pombo que pegou na cena anterior. Na cena seguinte, vemos Georges se levantar da cama e encontrar Anne na cozinha lavando a louça, ambos saem de casa. Na última cena, Eva entra na casa e a encontra vazia.

4.1. A Legislação Francesa sobre eutanásia

A eutanásia é expressamente proibida na França, e embora não constitua crime específico, o artigo R4127-38 do Código de Saúde Pública, proíbe que se provoque deliberadamente a morte de alguém:

O médico deve acompanhar a pessoa que está morrendo até seus últimos momentos, para garantir os cuidados adequados e medir a qualidade da vida que termina, salvaguardar a dignidade do paciente e confortar seus acompanhantes. Ele não tem o direito de causar deliberadamente a sua morte4 (CODE DE LA SANTÉ PUBLIQUE, 2016).

Quem pratica a conduta descrita está sujeito as penas previstas nos artigos 221-1 e 221-5, do Código Penal francês de 1994, que trata do homicídio e envenenamento:

Artigo 221-1 - Causar voluntariamente a morte a outros é assassinato. Punido com trinta anos de prisão criminal.221-5 Atacar a vida de outras pessoas pelo uso ou administração de substâncias que podem resultar em morte constitui envenenamento.

O envenenamento é punível com trinta anos de prisão criminal.

Ele é punido com prisão perpétua se for cometido em uma das circunstâncias estabelecidas nas seções 221-2, 221-3 e 221-4.

Os dois primeiros parágrafos da seção 132-23, relativos ao período de segurança, são aplicáveis ​​à infração prevista nesta seção5 (CODE PÉNAL, 1994).

A eutanásia passiva é prevista no artigo 223-6 do Código Penal Francês, como omissão de socorro:

Art.223-6: Qualquer pessoa que possa impedir por sua ação imediata, sem risco para ele ou para terceiros, um crime ou um crime contra a integridade corporal da pessoa e que se abstém voluntariamente de fazê-lo, é punida com cinco anos de prisão e 75.000 euros de multa.

Serão punidas nas mesmas penalidades que qualquer pessoa que voluntariamente se abstenha de levar a uma pessoa em perigo a assistência que, sem risco para ela ou para terceiros, possa lhe prestar por sua ação pessoal ou lhe causar um alívio.6 (CODE PÉNAL, 1994).

Conforme prevê o artigo anterior, o médico também pode ser punido se intencionalmente der fim à vida do seu paciente para evitar o prolongamento de um tratamento tido como “inútil” ou se o fizer para atender um pedido deste ou de sua família, pois a lei francesa pune mesmo quando há o consentimento do paciente. No entanto, ao longo do tempo a legislação francesa concedeu maior autonomia aos pacientes em estado terminal.

4.1.1. Evolução legislativa da Eutanásia no direito francês

A Circular Larouque, foi o primeiro documento a tratar sobre direito à morte digna na França, em 1986, definiu os cuidados paliativos e oficializou a criação de unidades preparadas para isso.

Em 2000, o Comité Consultatif National d’Etique se manifestou a favor da autonomia do paciente no avis nº63, chamando-a de “une exception d´ euthanasie”, que deveria ser aplicada em alguns casos de modo a evitar a clandestinidade da prática.

Em 2002 foi promulgada a lei Kouchner que incluiu um capítulo sobre a dignidade da pessoa humana no Código Quatro ao médico, desobrigando-o a continuar tratamentos desproporcionais.

Por fim, em 2016, a lei 2016-87 foi aprovada e trouxe a possibilidade de sedação profunda aos pacientes terminais, seguida pela cessação de tratamentos, nutrição e hidratação.

4.1.2. Lei Kouchner

Aprovada em 2002, a lei nº 2002-303, conhecida como Lei Kouchner, alterou o Código de Saúde Pública e incluiu um capítulo sobre direitos humanos, a referida lei visava tratar sobre os direitos do paciente e sobre a qualidade do sistema de saúde francês.

Com o advento desta lei, foram incluídos no Código de Saúde Pública, direitos como: o acesso ao sistema de saúde, garantindo-se que a pessoa recebesse os cuidados devidos de acordo com o seu estado de saúde; direito ao paciente de não ter informações sobre o seu estado divulgadas e previsão do direito de optar por não ser submetido a tratamentos degradantes e desproporcionais em relação aos resultados esperados.

Um dos principais direitos assegurados pela Lei Kouchner foi o de dar autonomia ao paciente através do direito à informação sobre seu estado de saúde, podendo este optar por saber ou não sobre seu estado, bem como, escolher qual a melhor forma de continuar o seu tratamento.

O art.11 da Lei Kouchner, também alterou a redação do art. L.1111-4 do Código de Saúde Pública e introduziu o direito ao consentimento, não sendo mais permitido ao médico fazer qualquer intervenção clínica no paciente sem a manifestação livre e inequívoca deste, devendo sua vontade ser respeitada, ainda que a ausência ou continuidade do tratamento coloque a sua vida em risco.

Para os casos em que o paciente não puder exprimir a vontade, a Lei Kouchner trouxe a possibilidade de pessoas maiores transferirem a tarefa de decidir sobre seu estado de saúde a algum parente ou pessoa de confiança.

4.1.3. Caso Vincent Lambert

O caso Vincent Lambert7 foi o primeiro de grande repercussão no âmbito do direito francês. Lambert era um jovem bombeiro voluntário, que sofreu um acidente de moto em 24 de setembro de 2000 e ficou em coma por 9 meses.

Ao acordar do coma, Vincent estava tetraplégico, surdo e mudo, e só conseguia movimentar o polegar direito, quando aprendeu a se comunicar ele passou a solicitar a morte digna através da eutanásia.

Em uma carta enviada ao Presidente Francês Jacques Chirac, Lambert pediu que fosse concedida a quem lhe praticasse a eutanásia, a isenção da culpa, já que só o presidente poderia conceder indulto a prática do crime. No entanto, o presidente negou seu pedido, afirmando que embora lhe comovesse a situação do requerente, não poderia atender seu pedido apenas por ser presidente.

Com a negativa do presidente, Vincent passou a recorrer a sua equipe médica e a sua mãe, implorando-lhes que lhe concedesse a morte digna e assim o tirassem daquele sofrimento.

No livro “Peço o Direito de Morrer”, escrito com a ajuda de uma jornalista, Vincent explica a decisão de pôr fim à própria vida, o livro foi lançado um dia antes da sua pretensa morte, em 24 de setembro de 2003, a responsável por realizar o pedido foi a sua mãe Marie Lambert, através da aplicação de pentoarbital sódico em sua sonda gástrica. No entanto, Vincent não morreu, e três horas após o acontecido, o Dr. Frederic Chaussoy foi chamado para socorrê-lo, após isso, ele ficou em coma por três dias, ao verificar o estado clínico do paciente, e também, considerando seu incontestável desejo de morrer, em 27 de setembro de 2003, o Dr. Chaussoy desligou o seu aparelho respiratório e em seguida aplicou uma dose letal de cloreto de potássio, fazendo com que Vincent morresse rapidamente.

Marie e Frederic foram processados e acusados pelo crime de administração de substância tóxica previsto no artigo 222-15 do Código Penal, porém, o Tribunal julgou o caso improcedente considerando que ambos agiram sob “coação moral”.

4.1.4. Lei Leonetti

A repercussão do caso Vincent Lambert fez insurgir a opinião pública, que reclamava a criação de uma lei que evitasse situações como a ocorrida com ele.

Nesse contexto, em 2004, Jean Leonetti8 apresentou o projeto de Lei nº 1882 que tratava sobre o direito dos doentes e o fim da vida. O relatório da comissão especial encarregada de analisar o projeto, concluiu que não havia como descriminalizar a eutanásia, mas também que não havia como continuar com a legislação vigente à época.

Assim, em abril de 2005, se tornou vigente a lei nº 2005-370, também conhecida como Lei Leonetti, que acrescentou ao artigo 1110-5 do Código de saúde pública, a autonomia do médico para deixar de realizar ou continuar tratamentos desproporcionais que visem unicamente o prolongamento artificial da vida, retirando assim, a distanásia do rol de condutas criminosas.

O artigo 2º acrescentado ao artigo 1110-5, introduziu a eutanásia passiva no direito francês, trazendo a possibilidade do paciente em estado terminal, optar por não realizar tratamentos que encurtassem a sua vida.

A expressão “um tratamento” prevista na Lei Kouchner foi alterada para “qualquer tratamento” (art.3º da Lei Leonetti), possibilitando a suspensão da continuação ou início de um tratamento, além da possibilidade de supressão de alimentos, que também pode ser considerada um tratamento, no entanto, a hidratação deveria ser mantida em razão do sofrimento que a sua ausência causaria ao paciente.

A Lei Leonetti, manteve o direito do paciente portador de doença incurável em estado grave ou terminal, após saber o seu estado de saúde, se negar a fazer um tratamento, bem como, acrescentou a possibilidade do médico que concedeu o diagnóstico consultar um segundo médico e após a retificação por ele, quando houver reiterado pedido do paciente, garantir a qualidade do fim de sua vida através de cuidados paliativos, registrando o desejo do paciente em seu prontuário, conforme previsto no art.4º da referida lei.

Aos pacientes terminais, foi mantido o direito de não ser submetido a tratamento, devendo os médicos respeitarem sua vontade, mas alertá-los das consequências advindas da escolha, assim como, garantir o acesso deles aos cuidados paliativos necessários ao fim digno de suas vidas, previsão do art.6º da Lei Leonetti.

Para as pessoas incapazes de expressar a vontade, a lei Leonetti, previu em seu artigo 5º, a possibilidade de interrupção ou inexecução do tratamento, mas somente após a análise do caso por um colegiado de médicos ou pessoas de confiança ou da família do paciente, podendo em tais casos ser consideradas as diretivas antecipadas da vontade, previstas no art.7º da mesma lei, que são válidas quando tiverem sido redigidas em até três anos antes do estado de inconsciência.

Nos casos em que a pessoa portadora de uma doença grave e incurável em estado terminal estiver incapacitada, o médico pode consultar as pessoas citadas no art. 5º e interromper o tratamento inútil ou desproporcional que se limita a prolongar a vida do paciente, devendo recorrer as diretrizes antecipadas da vontade, e fazer com que esta prevaleça, exceto em casos de urgência ou impossibilidade, conforme prevê o art.8º da lei.

4.1.5. Caso Chantal Sebiré

Um outro caso reacendeu o debate sobre a legalização da eutanásia na França, o de Chantal Sebiré9 , uma professora de 52 anos que sofria de um tipo raro de câncer chamado estesioneuroblastoma, que lhe causou uma deformidade extrema no rosto, perda do paladar, olfato e parte da visão, além de dores constantes e insuportáveis.

Ao se dar conta de que a doença a mataria lenta e dolorosamente, Chantal decidiu acionar o poder judiciário e reivindicar a morte digna por meio da eutanásia ativa.

O pedido foi negado pelo Tribunal de Grande Instância de Dijon sob o fundamento da Lei Leonetti apenas permitir a realização da eutanásia passiva. Chantal se suicidou dois dias após a decisão por ingestão de barbitúricos.

A eutanásia é apoiada pela grande maioria da população francesa e os casos de Vincent e Chantal despertaram a opinião pública a cobrar uma nova legislação sobre o tema.

Para atender aos anseios populares, o primeiro Ministro François Fillon, ordenou a criação de uma comissão, presidida por Jean Leonetti para analisar a lei Leonetti e apontar as mudanças cabíveis. A comissão concluiu que a lei carecia de melhor interpretação e conhecimento, quanto a legalização da eutanásia ativa, concluiu que ainda não era possível.

4.1.6. Lei nº 2016-87 (Lei Clayes-Leonetti) e Caso Bonnemaison

Em 2012, houve mais um debate sobre a legalização da eutanásia, depois que o médico Nicolas Bonnemaison foi processado pelo crime de envenenamento a sete idosos em estado terminal, no Hospital em que trabalhava, o médico foi absolvido em primeira instância e a decisão foi comemorada por quem assistia10 .

No entanto, o Ministério Público impetrou recurso, e em 2015 o médico foi submetido a um novo julgamento, onde foi condenado a dois anos de prisão, com direito a sursis, pela Corte de Apelações Angers, por ter causado a morte de uma paciente de 89 anos, a Corte o absolveu da acusação de outras seis mortes.

Em processo administrativo na Ordem dos médicos, o médico foi condenado a exclusão da Ordem dos Médicos pela infração prevista no art.38 do Código de Ética Médica, sendo-lhe aberta a possibilidade de retornar ao quadro de inscritos após três anos da exclusão.

Embora o médico tenha descumprido a lei Leonetti e o Código de Ética Médica, ele recebeu tratamento diferenciado da promotoria e do júri, que não o consideravam criminoso, entendendo que o delito praticado não continha dolo, elemento exigido pelo art.221-5 do Código Penal francês.

Como o caso causou grande repercussão e a população francesa ansiava por uma lei que legalizasse a eutanásia, em 21 de Janeiro de 2015, Alain Clayes e Jean Leonetti, apresentaram um novo projeto de lei à Assembleia Nacional Francesa, o projeto foi aprovado e se tornou a lei nº 2016-87, também conhecida como lei Clayes-Leonetti, que trouxe uma nova reforma para o Código de Saúde Pública no tocante à terminalidade da vida.

A lei foi promulgada em 02 de fevereiro de 2016, e decepcionou a população francesa, pois não legalizou a eutanásia e nem o suicídio assistido.

A nova lei previu no art. L.1110-5 e seguintes do Código de Saúde Pública, a sedação profunda de forma continuada para pacientes terminais, seguida da interrupção de todos os tratamentos, inclusive nutrição e hidratação, vedando o médico de se opor a esse pedido. Além dessas mudanças, a lei Clayes-Leonetti, também previu maior efetividade às Diretrizes Antecipadas de Vontade, conforme o art. 1111-11 do Código de Saúde Pública.

4.2. Conduta praticada no filme Amour: Eutanásia ou homicídio?

Em um primeiro momento não é possível determinar se a conduta de Georges poderia ser considerada eutanásia ativa ou homicídio. Alguns elementos para considerar que houve eutanásia estão presentes, quais sejam: a morte iminente, a doença incurável e o sofrimento físico e psíquico, porém não existe a inequívoca manifestação de vontade da doente, exceto alguns gestos como recusar água e comida, quando ainda tinha algum domínio da própria vontade.

No entanto, seriam esses elementos suficientes para determinar que houve uma eutanásia e não um homicídio? Para determinar isso é preciso analisar detalhadamente a forma como Georges agiu desde o início da doença de Anne, acompanhando sua decadência e recusa a permanecer naquela situação, ele demonstrava piedade pela esposa, vê-la definhar a cada dia o trouxe um sentimento de tristeza profunda, sentimento esse dividido por ambos, ao longo das cenas de Anne, é possível perceber que ela não está confortável com a sua nova realidade através das constantes crises de angústia que tem.

Georges sente piedade, mas também é racional, sabe que não será possível cuidar da esposa por muito tempo em razão da sua idade avançada, o que causaria ainda mais sofrimento para ambos, sua atitude é criminosa, mas motivada pelo sentimento de caridade e misericórdia diante da dor e sofrimento da esposa acometida de uma doença que a matava pouco a pouco.

Assim, é possível concluir que Georges seria responsabilizado penalmente por homicídio nos termos do art. 221-1 do Código Penal, mas considerando que os tribunais franceses têm adotado decisões clementes e compreensivas em relação a essa matéria, possivelmente o pedido seria improcedente, como ocorreu no caso Vincent Lambert, em que o Tribunal considerou que o médico que provocou a morte agiu sob “coação moral”, de forma analógica, o entendimento poderia se aplicar ao caso em questão, tendo em vista, que Anne através de pequenos gestos deixou clara a insatisfação com a sua situação e que Georges agiu movido pelo sentimento de piedade para acabar com o sofrimento da esposa.


5. A Bela Que Dorme (Itália)

O filme A Bela Que Dorme (La Bella Addormentata, 2012, Itália) retrata algumas histórias fictícias que se desenrolam na Itália em meio a discussão da possível morte de Eluana Englaro, que está em coma há 17 anos.

São retratados três núcleos familiares, no primeiro nos deparamos com o Senador Uliano Beffardi e sua filha Maria, cuja relação está passando por uma crise desde a morte da sua esposa. A jovem marcada pela dor da morte da mãe, se torna defensora do movimento pró-vida e faz parte dos protestos contra a decisão de dar fim à vida de Eluana.

Beffardi, é chamado a Roma pelo partido, para votar a favor de uma lei estadual que tem como objetivo impedir os médicos de concretizarem a Decisão da Suprema Corte, mas acaba decidindo sair do partido por acreditar que nesses casos deve prevalecer a vontade do paciente. Em outra cena, nos é mostrado que ele foi o responsável pela antecipação da morte da esposa, ao entender que ela nunca iria se curar da doença fatal, ele atendeu ao pedido dela e desligou a máquina que a mantinha viva, mantendo a realização do gesto em segredo.

Enquanto Beffardi treina o discurso no qual confessaria a morte da esposa e diria ser a favor da decisão do pai de Eluana por não acreditar em preceitos religiosos, o parlamento noticia a morte de Eluana e ele acaba sendo dispensado da votação.

Ao reencontrar a filha Maria, ela diz que nunca o havia perdoado por achar que ele tinha sufocado a mãe, mas que finalmente podia compreender que tinha sido apenas um abraço, ele diz que renunciou ao cargo e ela pede para ler o discurso que o pai faria.

No segundo núcleo, encontramos a família de Divina Madre, uma atriz de cinema famosa que abandonou a carreira pra cuidar da filha Rossa, que se encontra em estado vegetativo, a família passa por muitos conflitos familiares, principalmente por causa do filho Federico que não aceita o fato da mãe ter abandonado a carreira por causa da irmã, em um rompante de raiva, ele acaba retirando a válvula que mantém a irmã respirando, mas o pai entra no quarto a tempo de impedir o ato, e pede que ele a coloque de volta.

No terceiro núcleo, temos uma mulher viciada em drogas que vive nas ruas e tenta se matar, mas é socorrida por um médico que decide ajudá-la, após a tentativa de suicídio, ela fica vários dias desacordada e ao acordar tenta se jogar da janela do Hospital, mas é novamente impedida pelo médico, ela diz que não deseja mais viver e pergunta se não tem liberdade para tirar a sua vida, ele responde que assim como ela tem liberdade para tirar a própria vida, ele tem liberdade para tentar evitar que isso ocorra.

5.1. Eutanásia no Código Penal Italiano

O Código Penal Italiano não prevê um delito específico para a prática da eutanásia, mas há a previsão do homicídio piedoso nos artigos 62, n.1 e 62, para os casos em que a pessoa comete o delito motivado por relevante valor moral e social:

62. Circunstâncias atenuantes comuns.

Quando não existam elementos constitutivos ou circunstâncias atenuantes especiais, os seguintes elementos atenuam a infração:

agir por razões de especial valor moral ou social;11 (CODICE PENALE, 1930).

No entanto, a eutanásia também pode ser considerada homicídio qualificado quando o método utilizado for o uso de substâncias tóxicas ou quando houver premeditação, conforme especificado no art.576, parágrafo 1º e 577, parágrafo 1º, nº 3 do CP:

576. Circunstâncias agravantes:

A pena de prisão perpétua é aplicada se o ato previsto no artigo anterior for praticado:

1. com a adesão de qualquer das circunstâncias indicadas no nº 2 do artigo 61;

577. Outras circunstâncias agravantes:

A pena de prisão perpétua é aplicável se for praticado o ato previsto no artigo 575:

3. com premeditação;12 (CODICE PENALE, 1930).

Para tentar compensar a omissão legislativa em relação ao tema, o legislador inseriu no artigo 579, o consentimento de assassinato, que embora seja tido como um crime menos grave de assassinato, é punido com multa e até 15 anos de prisão, para a aplicação deste artigo, é necessário que estejam preenchidas algumas circunstâncias, o agente deve ser maior de idade, plenamente capaz mentalmente e o consentimento não pode ter sido obtido por meio de violência:

579. Assassinato da pessoa que consentiu:

Quem causar a morte de uma pessoa, com o seu consentimento, será punido com pena de prisão de seis a quinze anos.

As circunstâncias agravantes referidas no artigo 61 não são aplicáveis.

As disposições relativas ao homicídio são aplicáveis se o ato for cometido:

1. contra uma pessoa com idade inferior a dezoito anos;

2. contra uma pessoa que esteja mentalmente doente ou em estado de deficiência mental, por conta de outra pessoa, doença ou abuso de álcool ou drogas;

3. contra uma pessoa cujo consentimento tenha sido obtido pelo perpetrador através de violência, ameaça ou sugestão, ou seja, por engano, roubado.13 (CODICE PENALE, 1930).

Mais adiante, o artigo 580 pune o agente que contribui no suicídio de outrem por meio da instigação ou do auxílio. Nesse caso, deve haver a intenção, não apenas o desejo de realizar o ato, mas também o desejo de obter os efeitos nocivos resultantes deste. Assim, apenas se aplica nos casos em que o suicídio realmente ocorre ou quando da tentativa resulta lesões graves. Nos casos em que a vítima sofre de alguma doença mental, a pena aplicada será a mesma do homicídio.

580. Instigação ou auxílio ao suicídio.

Qualquer pessoa que determine que outros cometam suicídio ou que reforce a intenção de outros de cometer suicídio, ou que o facilite de alguma forma

A execução, é punida, se o suicídio se concretizar, com pena de prisão de cinco a doze anos. Se o suicídio não ocorre, é punido com pena de prisão de um a cinco anos, desde que a tentativa de cometer suicídio resulte em uma lesão corporal grave ou muito grave.

As penalidades são aumentadas se a pessoa instigada ou motivada ou ajudada estiver em uma das seguintes condições nos números 1 e 2 do artigo anterior. No entanto, se a pessoa em questão tiver menos de 14 anos de idade ou, em qualquer caso, seja privado da capacidade de intenção ou vontade, são aplicáveis as disposições relativas ao homicídio.14 (CODICE PENALE, 1930).

A facilitação do suicídio também pode se dar por meio da omissão, prevista no art.40, que ocorre quando alguém que tem a obrigação legal de impedir o ato, não o faz, nesses casos o agente é punido como se o tivesse provocado.

A eutanásia passiva é permitida nos termos do art.32, parágrafo 2º da Constituição Italiana que prevê a possibilidade de o paciente rejeitar o tratamento médico e deixar a doença seguir o seu curso natural até levá-lo a morte:

Art. 32 A República tutela a saúde como direito fundamental do indivíduo e interesse da coletividade, e garante tratamentos gratuitos aos indigentes.

Ninguém pode ser obrigado a um determinado tratamento sanitário, salvo disposição de lei. A lei não pode, em hipótese alguma, violar os limites impostos pelo respeito à pessoa humana.15 (COSTITUZIONE, 1947).

5.2.Caso Eluana Englaro e Jurisprudência

Eluana Englaro foi uma jovem italiana que entrou em estado vegetativo em 18 de janeiro de 1992, por causa de um trauma irreversível ocorrido após um acidente de carro.

Em janeiro de 1994, foi comprovado pelos médicos que não havia possibilidade de recuperação da sua cognição, seu estado exigia total dependência em todas as funções corporais, devendo ser assistida por médicos e paramédicos, além de estar sempre ligada a um tubo nasogástrico para alimentação, o prognóstico negativo para a recuperação foi o que levou o seu pai Beppino Englaro a entrar com o processo de interdição para se tornar seu tutor.

Sob o argumento de que uma ano antes do acidente, Eluana havia manifestado o desejo de não ser reanimada em caso de acidente grave, em 18 de janeiro de 1999, Beppino Englaro, entrou nos termos do art. 732 do Código de Processo Civil16, com um pedido de permissão para interromper a alimentação e administração de todos os medicamentos que garantiam a vida “biológica” da filha, perante o Tribunal de Lecco, que rejeitou o pedido em 02 de março de 1999, nos termos do art. 579 do Código Penal, que dispõe sobre a indisponibilidade do direito à vida.

Inconformado com a decisão, Beppino apresentou recurso ao Tribunal de Apelação de Milão, argumentando que como tutor da filha tinha o direito de decidir sobre a continuidade ou não do tratamento médico ao qual estava submetida, conforme disposições dos artigos 357 e 424 do Código Civil Italiano:

Art. 357. O tutor cuida da pessoa da criança, representa-a em todos os atos civis e administra os seus bens.

Art.424 Proteção dos interditos e cuidados a prestar aos deficientes.

As disposições relativas à proteção dos menores e aos cuidados a prestar aos menores emancipados aplicam-se, respectivamente, à proteção das pessoas incapacitadas e aos cuidados a prestar às pessoas com deficiência.

As mesmas disposições são igualmente aplicáveis, respectivamente, nos casos de nomeação do tutor temporário do interdito e do tutor temporário da pessoa incapacitada nos termos do artigo 419. (CODICE CIVILE, 1942).

No entanto, em dezembro de 1999, o Tribunal rejeitou o Recurso sob o fundamento de que a autodeterminação e as diretivas antecipadas de vontade são fundamentais em casos como esse, e não havia meio inequívoco e rigoroso o suficiente para comprovar a existência destas no caso de Eluana.

Em abril de 2005, o recurso também foi negado pela Corte de Cassação Italiana, que fundamentou a negativa na prevalência do direito à vida sobre a autonomia da vontade presente no artigo 32 da Constituição, argumentando que não existe um “direito de morrer”, e que não havia como comprovar a clara e inequívoca vontade da paciente.

Em 2007, a Corte de Cassação Italiana autorizou um novo julgamento do pedido pela Corte de Apelação de Milão.

No novo julgamento, em 09 de julho de 2008, a Corte autorizou a suspensão da alimentação e hidratação artificiais nos termos do artigo 32 da Constituição Italiana, afirmando que tal ato não poderia ser considerado homicídio, mas apenas uma permissão para a doença seguir o seu curso natural.

Em novembro de 2008, a Corte de Cassação Italiana, julgou improcedente o recurso interposto pelo Ministério Público, por considerá-lo parte ilegítima, após isso, ocorreu o trânsito em julgado da decisão que autorizou a suspensão da alimentação e hidratação artificiais.

Eluana morreu em 09 de fevereiro de 2009, três dias após a suspensão total de sua alimentação, enquanto o Senado debatia um projeto de lei para proibir a eutanásia em casos como o dela.

5.3. Caso Fabiano Antoniani (DJ Fabo)

Fabo foi um DJ italiano17 que ficou tetraplégico e cego após um acidente em 2014, depois do ocorrido, ele passou a pedir que os deputados aprovassem a lei do fim da vida, que já tramitava há mais de um ano no Congresso, o apelo repercutiu entre a população italiana.

No entanto, o pedido de Fabo não foi atendido a tempo e o DJ resolveu pedir o suicídio assistido na Suíça onde a prática é legalizada, para isso recebeu a ajuda do amigo e deputado, Marco Capatto, grande defensor da descriminalização da eutanásia na Itália.

No seu testamento, Fabo demonstrou indignação com o seu país e agradeceu a ajuda do amigo, também reforçou que os seus dias eram cheios de sofrimento e desespero e que não via mais sentido na vida.

Fabo foi submetido a duas entrevistas particulares com um médico em Zurique, seguindo o procedimento prescrito pela lei suíça, com o objetivo de verificar a eficácia, atualidade e liberdade da escolha do suicídio, e apenas com o resultado positivo dessa avaliação, o médico prescreveu a dose letal do medicamento, que foi colocado em uma seringa, cujo êmbolo foi conduzido por Fabo, pressionando um botão com a boca conectada a um equipamento especial. Esse procedimento, tornado mais complexo pelas condições de quase total imobilidade do paciente é feito para garantir que o suicídio não se transforme em uma forma de eutanásia ativa voluntária, ato proibido na lei Suíça, sua morte ocorreu em 27 de fevereiro de 2017.

5.4. Lei 219/2017 (Disposição Antecipada de Tratamento)

Com a repercussão da morte de Fabo, o Congresso Italiano aprovou em 14 de dezembro de 2017, a lei da Disposição Antecipada de Tratamento, que tem como escopo garantir que a autonomia do paciente prevaleça no fim da sua vida. A nova lei trouxe no artigo 2°, parágrafo 2º, a proibição de obstinação irracional nos cuidados e dignidade na fase final da vida, que consiste em permitir que o paciente desista de um tratamento considerado desnecessário ou desproporcional e o artigo 3° traz a possibilidade de recusa a sedação:

2. Nos casos de pacientes com mau prognóstico a curto prazo ou iminência de morte, o médico deve abster-se de qualquer obstinação irracional na administração dos cuidados e pelo recurso a tratamentos desnecessários ou desproporcionais.

Na presença de sofrimento refratário a tratamentos de saúde, o médico pode usar a sedação profunda paliativa contínua em associação com terapia de dor, com o consentimento do paciente.

3. O uso de sedação paliativa profunda contínua ou a recusa do mesmo são motivadas e são anotadas na pasta de registros clínicos e eletrônicos de saúde. (LEGGE 219/2017, 2017).

Para fazer a Disposição Antecipada de Tratamento, é necessário que o paciente seja civilmente capaz e esteja em pleno gozo de sua capacidade psíquica, esse documento permite que ele preveja as decisões que poderão ser tomadas no caso de futura incapacidade física e psíquica, nomeando um representante que poderá agir em seu nome, tanto o representante quanto o médico responsável pelo tratamento deverão respeitar a vontade do paciente, fazendo com que ela prevaleça.

5.5. Decisão do Tribunal Constitucional

O Deputado Marco Capatto que ajudou o DJ Fabo a viajar para a Suíça, se auto denunciou em Milão, por auxílio ao suicídio nos termos do artigo 580 do Código Penal, crime punível com até 12 anos de prisão.

Em maio de 2017, o Ministério Público pediu que a denúncia contra Cappato fosse rejeitada, porque de acordo com a declaração dos promotores, Cappato "ajudou o Dj Fabo a exercer seu direito à dignidade humana". Mas em abril o juiz responsável pelas investigações preliminares rejeitou o pedido.

As audiências que ocorreram a partir de 8 de novembro de 2017, testemunhas, como a mãe e a namorada de Fabiano foram ouvidas e Marco foi interrogado.

Em janeiro, o promotor público siciliano, pedindo a absolvição de Cappato, mostra na sala de aula os vídeos de Dj Fabo e diz: "Nós reconstruímos a dramática história de Fabiano. Conseguimos tocar a vida de Fabo a partir do momento do acidente da mesma maneira, com a mesma ausência de esperança e as mesmas deficiências físicas.” Em 14 de fevereiro de 2018, o Tribunal de Milão decidiu que os documentos do julgamento deveriam ser encaminhados ao Tribunal Constitucional para que pudesse proferir um julgamento da constitucionalidade da lei. Não houve absolvição ou condenação.

Em 26 de setembro deste ano, o Tribunal Constitucional Italiano julgou o caso e descriminalizou a eutanásia em casos específicos, quando o paciente sofra de uma doença incurável, esteja sendo mantido vivo por meio de tratamentos de suporte à vida, esteja passando por intenso sofrimento físico e psicológico e seja totalmente capaz de tomar decisões livres e conscientes.

A Corte determinou ainda que o Congresso crie uma lei sobre o tema abrindo portas para uma possível legislação própria para a prática no país.

5.6. Condutas retratadas no filme

No filme há três condutas que precisam ser analisadas do ponto de vista legal. A conduta de Federico ao retirar o aparelho utilizado para manter a irmã Rossa respirando, a conduta de Beffardi ao desligar as máquinas que mantinha a esposa viva e a conduta do médico que impede o suicídio da mulher que encontra.

A conduta de Federico, tentativa de eutanásia passiva ou ortotanásia, não é prevista no Código Penal, que só pune a eutanásia quando resulta a morte do paciente, não é possível falar em tentativa de homicídio, pois a atuação do agente não trouxe consequências para a vítima, pois a retirada do equipamento apenas teria como consequência a ortotanásia, que implica em deixar a doença seguir o seu curso natural, caso semelhante ao de Eluana Englaro.

A conduta de Beffardi, é prevista no art.579 do Código Penal italiano, que dispõe sobre o consentimento de assassinato, que ocorre quando a vítima pede ao sujeito que a mate, este crime é tratado como espécie menos grave de homicídio, punido com pena de prisão de seis a quinze anos.

Por fim, temos a conduta do médico que salvou uma mulher de duas tentativas de suicídio, caso não agisse para socorrê-la e impedir a morte, o médico poderia ser responsabilizado por omissão de socorro, crime previsto no art.593 do Código Penal, punido com até um ano de prisão e multa de 2.500 euros.


6. Mate-me, por favor (Bélgica)

Em Mate-me, por favor (Kill me, Please, 2010, Bélgica), a ação ocorre dentro e ao redor de um castelo nas profundezas da floresta, onde o doutor Krueger montou uma clínica financiada pelo estado para prestar um serviço de suicídio assistido. Entre seus pacientes estão um ator cômico deprimido; um homem que prometeu sua esposa em um jogo de poker e perdeu; um vendedor ambulante canadense com um tumor cerebral; Madame Rachel, uma cantora de cabaré cuja voz falhou e diversos outros excêntricos e párias. Ele ajuda as pessoas a cometerem suicídio apenas quando demonstram estar realmente necessitadas. Os clientes em potencial são selecionados cuidadosamente e devem enviar vídeos de "audição" nos quais explicam porque querem morrer e pedem a ajuda de Krueger.

A instalação em si se assemelha a um spa confortável. Os clientes são convidados a ficar lá por vários dias antes do evento, criando um ambiente sereno de resort. Krueger incentiva sua equipe de enfermeiras e auxiliares a não se apegar aos pacientes. “Sim, compaixão. Amizade não”, diz ele.

Aos pacientes, Kruger oferece aconselhamento, simpatia e os meios de autodestruição necessários após a concessão de um último desejo. Madame Rachel, por exemplo, deseja morrer após dar uma empolgante versão da Marselha aos clientes e funcionários reunidos na clínica.

Também deve ser mencionada, Juliette Evrard, uma inspetora do governo que vem à clínica para investigar. Sua preocupação não é o que o Dr. Krueger está fazendo, mas saber se ele está lucrando ilegalmente com isso, talvez fazendo com que seus clientes que estão prestes a morrer alterem suas vontades para incluí-lo.

Apesar da maneira tranquilizadora e das justificativas humanísticas do Dr. Krueger (para quem "um dia o suicídio será um direito humano"), as coisas começam a desmoronar em meio à briga entre os pacientes. Após um ataque em larga escala realizado por moradores locais, poucos personagens conseguem sobreviver até o final.

6.1. Eutanásia na Bélgica

A Bélgica permitiu a eutanásia por meio da lei 28 de maio de 2002, desde então, os pedidos para sua concessão têm aumentado cada vez mais.

Segundo declaração oficial emitida pela Comissão Federal de Controle, divulgada em 27 de fevereiro de 2019, 2.357 relatórios de eutanásia foram recebidos em 2018, um aumento de 2% em relação a 2017 quando o número já tinha aumentado em 14%. Desde a aprovação da lei em 2002 o número de eutanásia tem aumentado a cada ano. Das eutanásias realizadas em 2018, 52,8% foram de mulheres; 76% dos pedidos provêm da parte holandesa, 2/3 das pessoas tinham mais de 70 anos, mas mais de 100 tinham menos de 50 anos; 46,8% das eutanásias ocorreram em casa; em quase 15% dos casos, a morte não era esperada a curto prazo, o que significa que as pessoas não estavam no fim da vida; a maioria sofria de câncer (61,4% dos casos) ou polipatologias (18,6%). A primeira eutanásia de menores foi realizada em 2017 em crianças de 9, 11 e 17 anos. Não houve nenhum em 2018.18

Como nos anos anteriores a Comissão Federal de Controle declarou que não há problemas com a aplicação da lei, pois nenhum caso foi relatado ao Ministério Público.

A Lei da Bélgica tem despertado inúmeras críticas dentro e fora do país, por ser eminentemente liberal na autorização da eutanásia, onde é considerada principalmente a vontade do indivíduo que esteja em sofrimento insuportável, sendo este o principal requisito para aprovação do pedido.

6.2. Lei de 28 de maio de 2002

A Lei de 28 de maio de 2002, trouxe as condições necessárias para pedir a eutanásia: o paciente deve ser adulto ou menor emancipado, se for apenas menor deve ter discernimento e estar ciente no momento da aplicação; o pedido deve ser feito voluntariamente após muita reflexão e sem nenhuma influência externa; o paciente deve estar em uma situação médica sem resultados, em sofrimento físico ou mental, constante e insuportável, que não pode ser curado, resulte morte a curto prazo e seja resultado de uma lesão grave ou de uma condição patológica incurável.

Além das condições impostas ao paciente, o médico responsável também deve cumprir alguns requisitos, quais sejam: deve informar o paciente sobre seu estado de saúde e expectativa de vida; deve consultar o paciente cuidadosamente sobre o pedido de eutanásia e discutir todas as possibilidades de cuidados paliativos e consequências; acompanhar o paciente regularmente para observar a evolução de sua condição, a fim de comprovar a persistência de seu sofrimento físico ou mental e de seu desejo de realizar o procedimento; consultar outro médico sobre a natureza grave e incurável da doença e explicar a razão da consulta. Esse segundo médico deve analisar cuidadosamente o paciente e confirmar ou não, o caráter constante do sofrimento físico ou psicológico, escrevendo suas conclusões em um relatório, o segundo médico deve ser independente em relação ao médico antecedente e ao paciente, também deve ser da área da patologia do paciente, que após essa análise deverá ser informado sobre o resultado da consulta; o médico também deve garantir que o paciente teve a oportunidade de discutir o pedido com todas as pessoas que desejava.

6.2.1. Diretrizes Antecipadas da Vontade

O art.4 da lei traz a previsão da declaração antecipada, um documento feito pela pessoa para ser usado no caso de uma futura doença incapacitante.

A declaração pode ser feita tanto por adulto, quanto por menor emancipado, mediante registro escrito, no qual comunicará a sua vontade futura de que o médico realize a eutanásia no caso de estar incapacitado de exprimir vontade, para que o procedimento ocorra, o médico deverá estar convencido de que a pessoa está sofrendo de uma condição grave e incurável, acidental ou patológica, está inconsciente e que o seu estado é irreversível de acordo com o estado atual da ciência.

A declaração pode designar uma ou mais pessoas de confiança, em ordem de preferência, para comunicarem o médico da vontade do paciente. Cada representante substitui o anterior na representação, em caso de recusa, incapacidade, invalidez ou morte. Se o paciente for médico assistente, não poderá designar médico ou membro da equipe de saúde como pessoas de confiança.

A declaração pode ser feita a qualquer momento, deve ser escrita, elaborada na presença de duas testemunhas (onde pelo menos uma não tenha interesse material na morte do declarante), depois deve ser datada e assinada pelo declarante, pelas testemunhas, e quando apropriado, pela pessoa de confiança.

Se a pessoa que deseja fazer declaração for portadora de uma deficiência física permanente que a impeça de redigir e assinar, sua declaração pode ser gravada por escrito por uma pessoa de sua escolha que também não tenha interesse material na sua morte, as demais exigências são as mesmas das pessoas sem deficiência. A declaração deverá especificar que o declarante não pode escrever e assinar, bem como as razões pelas quais se encontra incapacitado, ser datada e assinada pela pessoa oficialmente designada, pelas testemunhas, e quando apropriado, pela pessoa de confiança. Um atestado médico deve ser anexado a declaração para fins de comprovar a deficiência.

A declaração só pode ser considerada quando feita com até cinco anos de antecedência ao início da incapacidade para expressar a vontade e pode ser retirada ou modificada a qualquer momento.

O médico que irá realizar a eutanásia, após uma declaração de vontade, deve cumprir todos os requisitos estabelecidos pela lei, como: conversar com o representante estabelecido na declaração sobre os desejos do paciente e discutir o seu conteúdo com os parentes do paciente e com o representante. A declaração antecipada e todos os relatórios do médico consultado são registrados no prontuário do paciente.

6.2.2. Lei de 28 de fevereiro de 2014

A lei de 28 de fevereiro de 2014 alterou a lei de 2002, para estender a possibilidade de eutanásia para os menores de idade.

O procedimento nos casos de menores não-emancipados é o mesmo dos demais pacientes, mas nesses casos deve se consultar um psiquiatra infantil ou psicólogo que deve ser informado das razões da consulta, o especialista também deve garantir que o menor é plenamente capaz de discernir sobre a escolha, além informar sobre o resultado da consulta aos seus representantes legais, que devem concordar com o pedido.

Nos últimos dois anos, três menores se submeteram a eutanásia na Rússia, os casos ocorreram em 2016 e 2017 e só agora foram divulgados por meio de um relatório da Comissão Reguladora da eutanásia no país, os pacientes eram crianças de 9 e 11 anos, os casos mais jovens conhecidos em todo o mundo, a criança de 9 anos tinha um tumor cerebral, a de 11 anos sofria de fibrose cística, e o jovem de 17 anos sofria de distrofia muscular.19 (OBSERVADOR, 2018)

6.2.3. Comissão Federal de Monitoramento e Avaliação

A Comissão Federal de Monitoramento e Avaliação prevista nos arts.6 a 13, da referida lei, é composta por 16 membros nomeados de acordo com seus conhecimentos e experiências, dos quais 8 são médicos, onde 4 deles devem ser professores ou professores eméritos, 4 devem ser professores de Direito ou procuradores e 4 devem ser membros da comunidade responsável pelos problemas do paciente incurável.

O cargo de membro da Comissão é incompatível com mandatos legislativos ou executivos. A lei estabelece também, que na Comissão deve haver paridade linguística e de gênero, e em cada grupo de idiomas deve ter pelo menos três candidatos de cada sexo20.

Os presidentes são eleitos pelo seu grupo linguístico, assim a Comissão tem três presidentes, um de língua holandesa, um de língua francesa e um de língua alemã. A Comissão só pode deliberar quando presentes, pelo menos, dois terços de seus membros.

A Comissão também é responsável por analisar os relatórios sobre as eutanásias ocorridas no país, os dados são confidenciais e só podem ser acessados depois de uma decisão da Comissão.

No relatório, os médicos devem informar se todos os procedimentos para a realização da eutanásia foram feitos de acordo com as condições e procedimentos exigidos pela lei. Se na análise do relatório, surgirem dúvidas quanto a isso, a Comissão pode decidir por maioria simples, abrir os registros sobre eutanásia do médico responsável, e após isso, se dois terços dos membros concluírem que houve descumprimento das condições previstas, o arquivo é enviado ao Ministério Público.

A cada dois anos, a Comissão deve divulgar um relatório estatístico com base em informações coletadas na segunda parte do documento de registro que os enviam; um relatório com uma descrição e avaliação da aplicação da lei; e se necessário, recomendações suscetíveis de conduzir a uma iniciativa legislativa e/ou outras medidas relativas à aplicação da lei.

6.3. Conduta retratada no filme

A Conduta do Dr. Krueger encontra resguardo nas leis Bélgicas, onde a eutanásia não é considerada crime.

O médico cumpre todos os requisitos estabelecidos pela lei, como: certificar-se de que o paciente está passando por um sofrimento insuportável, ter um vínculo com os pacientes, que é um requisito estabelecido pela lei, e realizar a eutanásia apenas após se certificar de que o paciente fez o pedido de forma reiterada e de que está convicto da decisão.


7. O Turista Suicida (Suíça)

O Turista Suicida (The suicide tourist, 2007, Suíça) é um documentário que retrata os últimos quatro dias de vida de Craig Ewert, um professor de 59 anos da Inglaterra que sofria de uma doença degenerativa neural, a esclerose lateral amiotrófica, conhecida popularmente como ELA, com o avanço dos sintomas da doença, Craig buscou o suicídio assistido na Suíça.

Ele relatou que começou a pensar no suicídio assistido quando caiu em casa e chegou a conclusão de que a doença já havia o deteriorado o suficiente e que ali era o momento certo de encerrar o seu avanço.

Craig escolheu a data rapidamente devido a evolução da doença, seu medo era perder a capacidade de engolir que o impediria de cometer o suicídio assistido ou de parar de se comunicar que o impediria de relatar o seu sofrimento.

Assim, após se despedir dos filhos, amigos e familiares, ele e a esposa, que viviam um casamento de 37 anos, entraram em contato com a organização Dignitas e marcaram a data, em seguida viajaram para Zurique, na Suíça, local que permite a eutanásia de estrangeiros, ele explica a decisão de escolher a eutanásia da seguinte forma:

Tenho duas opções: morte ou sofrimento e morte, a religião diz ser contra o suicídio, pois não cabe a mim decidir quando pôr fim a minha vida, mas somente a Deus. Mas sem esse aparelho, eu já estaria morto, o fato de saber quando vou morrer, simplesmente torna definido o que era indefinido. Foi uma boa vida... vou fazer uma coisa que não seria minha escolha caso tivesse outras opções, mas por outro lado, terei a aventura de morrer, e se houver algo depois disso, terei aventura (THE SUICIDE TOURIST, 2007).

O médico faz uma última reunião com o paciente, para certificar-se de que realmente está decidido, em seguida comunica que já está com a receita do remédio que provocará a sua morte, e pergunta se Craig tem consciência do que acontecerá quando tomá-lo, ele responde que ninguém sabe, mas saberá na hora.

O dia da eutanásia chega, 26 de setembro de 2006, o responsável prepara o local que receberá o paciente para tomar a medicação letal, e em seguida fala sobre seu trabalho e se emociona ao relatar o caso de um jovem de Liverpool que pediu para tocar Beatles no momento de sua morte, mas por não ter, ambos cantaram juntos e “aquele foi o último momento daquele homem”, ele finaliza emocionado.

Craig chega ao local às 9:40 e o funcionário explica como ocorrerá o procedimento, primeiro ele dá um remédio para preparar o estômago, depois disso eles tem meia hora, mas o paciente é quem decide o momento certo, ele também explica que precisa gravar o procedimento para que as autoridades suíças se certifiquem que o paciente tomou sozinho, e pergunta se Craig tem algum problema em ser gravado, ele responde que não.

Logo em seguida, Craig pede o remédio para o estômago e pouco tempo depois pede o remédio letal, beija a esposa, se declara, em seguida toma o remédio, agradece ao responsável por lhe dar a substância e morre alguns minutos depois ao som de Beethoven.

Após o suicídio, o responsável liga para a polícia e informa o ocorrido, a Polícia vai até o local e faz uma rápida investigação de 90 minutos, analisa o vídeo e interroga a todos que estão na clínica para garantir que a morte realmente se trata de um suicídio, o corpo é cremado na própria organização e as cinzas entregues para a esposa, todo o procedimento custou 4,5 mil dólares.

7.1. Eutanásia no Código Penal Suíço

O Código Penal suíço proíbe a eutanásia ativa, mas o art.114, prevê uma pena mais leve, que não pode ultrapassar três anos e multa, para aquele que mata alguém por motivo nobre e após pedido da vítima quando motivado por compaixão.

Art.114. Assassinato a pedido da vítima

Quem por um motivo honroso, especialmente à compaixão, tiver dado morte a uma pessoa a seu pedido genuíno e insistente, será punido com pena de privação de liberdade não superior a três anos ou pena pecuniária21 (CODE PÉNAL SUISSE, 1937).

Também é admitida a prática da eutanásia passiva, através da interrupção dos tratamentos e da eutanásia indireta em que a morte não é realizada diretamente, mas é resultado indireto da administração de morfina.

Entre 1893 e 1918, os legisladores suíços debateram sobre o reconhecimento do direito ao suicídio assistido, o qual consideravam como um ato de liberdade pessoal, mas com a punição a assistência por motivos egoístas.

O Conselho Federal, ao desenvolver o Código Penal em 1918, já mencionou o artigo 115 do Código Penal, que entrou em vigência em janeiro de 1941 e permanece inalterado até hoje. Em 2008, uma grande consulta foi encomendada por dois departamentos federais (Justiça e Polícia) e enviada aos cantões22 e a várias instituições de saúde suíças, com a intenção de consultar o público sobre a necessidade de elaborar novas disposições legislativas sobre a assistência ao suicídio. No entanto, em razão da ampla variedade de respostas não foi possível estabelecer um consenso, e em 2011, o Conselho Federal desistiu de aprovar novas disposições criminais, dando ênfase a promoção de cuidados paliativos. O artigo 115 do Código Penal permaneceu o seguinte:

Art.115. Incitação e Assistência ao suicídio

"Quem, motivado por um motivo egoísta, incitou uma pessoa a cometer suicídio ou o ajudou na prática de suicídio, será punido com pena de prisão de cinco anos ao mesmo tempo, se o suicídio tiver sido consumado ou tentado. Mais ou uma penalidade pecuniária. "23 (CODE PÉNAL SUISSE, 1937).

Este artigo permitiu uma interpretação analógica sobre a eutanásia, que passou a ser vista como descriminalizada, já que o artigo prevê crime apenas nos casos em que o auxílio ocorra por razões egoístas. Assim, é possível concluir que o art.115, abrange todos os aspectos criminais e requisitos legais do auxílio ao suicídio na Suíça, pois a partir da sua interpretação, é possível dizer: que sem motivo egoísta, não há punição; que foi colocado um espaço de liberdade pessoal, sem restrições; que não há delimitação de um formulário médico ou não para o suicídio assistido e que não há limitações relacionadas à residência ou nacionalidade.

Para evitar abusos ocorridos em razão da interpretação extensiva da regra legal, a Comissão Nacional de Ética em Medicina Humana (NKE-CNE), em 2005, estabeleceu alguns critérios mínimos que devem ser observados para a sua aplicação: a capacidade de discernir sobre o término da vida com a ajuda de terceiros é válida; o desejo de se suicidar deve decorrer de um sofrimento grave advindo de uma doença; o auxílio ao suicídio não deve ser fornecido a pessoas que sofram alguma doença mental que tenham tendência ao suicídio como resultado dela; o desejo de morrer deve ser regular e constante, não pode decorrer de um impulso ou crise temporária; o desejo de realizar o suicídio não pode sofrer qualquer pressão externa; o potencial suicida deve ter acesso a todos os outros recursos, que devem ser explorados conforme a sua vontade; devem haver exaustivos contatos pessoais e entrevistas detalhadas com a pessoa que deseja obter o suicídio, pois uma única avaliação baseada em uma única reunião não é válida; deve haver uma segunda opinião independente que chegue a mesma conclusão.

A Academia Suíça de Ciências Médicas (SAMS) adotou em 2012, os mesmos critérios a serem cumpridos para o auxílio ao suicídio, fazendo constar que o dever dos médicos que cuidam dos pacientes em estado terminal é aliviar o seu sofrimento e acompanhá-lo. E que não é dever dos médicos oferecer assistência ao suicídio.

Essas disposições fazem parte do código de ética da Federação dos Médicos Suíços e são os vinculam. Em relação às doenças psíquicas, o Tribunal Federal Suíço não as exclui do rol de disposições ao auxílio ao suicídio, mas nesse caso há uma grande restrição.

7.2. Organizações de Assistência ao Suicídio

Existem cinco associações de assistência ao suicídio na Suíça: Exit S.All, Exit-ADMD, Dignitas, Life Circle e Exit Internacional.

Dignitas, Life Circle e Exit International, são as únicas que aceitam pacientes de outros países em uma prática que ficou conhecida como “turismo da morte”, cada organização tem as suas próprias regras sobre a realização do procedimento, mas em geral, elas têm um prontuário médico para o suicídio que deve ser acompanhado de uma declaração do paciente, contendo todos motivos para o seu pedido, que deve ser assinada por ele ou por um notário.

Elas avaliam a relevância do pedido segundo os seus próprios critérios, depois disso a pessoa que deseja obter o auxílio ao suicídio passa por uma entrevista com um representante da organização, onde ela poderá confirmar sua decisão, se confirmada a decisão, ela poderá marcar a data.

Durante o procedimento, um ou dois acompanhantes (não necessariamente médicos), preparam a solução que provocará a morte, se a solução for intravenosa cabe a própria pessoa abrir a válvula de infusão. O médico que prescreve a receita pode ser independente, mas comumente pertence a própria associação.

Normalmente, todos os casos de auxílio/assistência ao suicídio são declarados por meio do atestado de óbito, que é entregue à polícia e enviado ao promotor com a descrição de "morte não natural", que costuma classificar o caso após uma investigação forense.

7.3. Dados sobre o suicídio assistido na Suíça

Em 2000, apenas 86 pessoas haviam se submetido ao suicídio assistido, já em 2015, 965 usaram o medicamento letal, um aumento de 25% em relação ao ano anterior (742 em 2014), dos quais 822 tinham mais de 65 anos. As mulheres são as que mais buscam o suicídio assistido, sendo um total de 539 mulheres e 426 homens, segundo dados do Escritório Federal de Estatística da Suíça. Os números correspondem a 3% das mortes na Suíça e não incluem os estrangeiros que buscam o suicídio assistido no país. Segundo a Exit, a idade média dos idosos que recorrem ao suicídio assistido, é de 77,5 anos.

Ao mesmo tempo, a Suíça também tem altas taxas de suicídio: Conforme dados do Serviço Federal de Estatística, houve 1073 suicídios em 2015, divididos entre 280 mulheres e 793 homens. Segundo o Observatório Suíço de Saúde, a morte por suicídio é um problema de saúde pública da Suíça, que em comparação a outros países da Europa possui uma taxa de suicídios acima da média.

7.4. Conduta retratada no documentário

Após a análise da legislação suíça, é possível concluir que a eutanásia de Craig foi realizada seguindo todos os procedimentos e condições exigidos pela lei, pois, era portador de uma enfermidade incurável e terminal, e estava em grande sofrimento físico, além de ter feito o pedido de forma consciente, livre e reiterada, requisitos estabelecidos pelo Conselho Nacional de Ética em Medicina Humana para evitar os abusos que possam advir da possibilidade de interpretação extensiva da legislação.

O responsável que o auxiliou na eutanásia agiu protegido pelo art.115 do Código Penal que apenas pune o auxílio ao suicídio quando motivado por egoísmo. Assim, tendo em vista que Craig tomou o conteúdo letal sozinho, a conduta está adequada ao que a lei exige para estar dentro dos limites legais.


8. Minissérie Justiça (Brasil)

O 4º episódio da minissérie Justiça (TV Globo, 2016, Brasil) retrata o acidente e eutanásia da bailarina Beatriz, que ficou tetraplégica após ser atropelada por um carro e ter a medula espinhal lesionada.

Beatriz era uma bailarina que estava estreando um espetáculo no teatro, e em um dia, na saída do espetáculo acaba sendo atropelada por um carro que não a socorre, o marido Maurício vê toda a cena e se desespera.

Ao acordar no Hospital, ela relata que não sente mais o corpo, Maurício diz que é por causa da cirurgia porque tem medo da sua reação ao descobrir que está tetraplégica. Ele vai até o médico e pergunta se a situação é definitiva, o médico responde que a lesão na medula espinhal é irreversível e que Beatriz ficará tetraplégica para o resto da vida.

Maurício conta a esposa que ela está tetraplégica, ela diz que só existe um jeito e que se não pode mais dançar, acabou, em seguida, pergunta se o marido entendeu, ele responde que sim, mas que não concorda, ela diz que não conseguirá viver sem o corpo, ambos choram.

Maurício resolve acolher o pedido da esposa e pega os remédios que serão utilizados com um amigo, em seguida vai até o Hospital para realizar o procedimento. Ao chegar, diz a Beatriz que jamais faria aquilo se fosse uma escolha dele, ela diz que entende e que sabe que a motivação dele é para atender o pedido dela, em seguida pede que ele comece a gravar seu depoimento com o intuito de inocentá-lo.

Meu nome é Beatriz Vieira, hoje é dia 28 de junho de 2009, eu pedi para o meu marido me matar, Maurício não é um assassino, a escolha foi minha. Eu admiro muito as pessoas que conseguem passar por isso e seguir em frente, mas eu já estou morta e não foi o acidente que me deixou assim, o acidente foi eu não ter morrido, não julguem meu marido. Ele está me salvando. (JUSTIÇA, 2016).

Ao final do depoimento, Maurício diz a ela que ainda dá tempo de desistir, mas ela responde que não há motivo para isso, em seguida, ele aplica a injeção letal e Beatriz agradece, Maurício diz que vai amá-la para sempre. Ao perceber que a esposa estava morta, Maurício sai correndo pelo Hospital enquanto chora e é amparado pelos seguranças.

Maurício é preso por homicídio, nos termos do art.121 do CP, os jornais noticiam a morte de Beatriz como eutanásia, narrando que o procedimento foi feito a pedido dela, ele é libertado da prisão em 2016.

8.1. Eutanásia no Código Penal Brasileiro

O legislador brasileiro optou por não classificar a eutanásia, então não há uma definição clara sobre a regulação ou não do tema no país, que até então é entendida como homicídio, que pode ser simples ou privilegiado de acordo com as circunstâncias do caso, ambos são previstos no art.121 e art.121, §1º do Código Penal:

Art. 121. Matar alguém:

Pena - reclusão, de seis a vinte anos.

Caso de diminuição de pena

§ 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. (CÓDIGO PENAL, 1940).

Por não haver uma definição clara, não é possível afirmar que a eutanásia seja apenas espécie de homicídio privilegiado, no entanto, a previsão do art.121,§1º parece ser a mais adequada para definimos como eutanásia, pois trata do homicídio por relevante valor moral ou social, que neste caso seria a piedade do agente com o sofrimento do paciente terminal que padece de grande sofrimento físico.

No mesmo diploma legal, temos a previsão do artigo 122 que proíbe a indução ou a prestação de auxílio ao suicídio:

Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave. (CÓDIGO PENAL, 1940).

A eutanásia passiva também pode ser entendida como crime pela previsão do art.135, também do Código penal, que pune a omissão de socorro:

Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte. (CÓDIGO PENAL, 1940).

A eutanásia no Brasil, ainda é objeto de grande discussão e está sujeita a várias interpretações onde a escolha da espécie normativa adequada só poderá ser feita de acordo com o caso concreto.

Aqueles que são contra a regulamentação da Eutanásia no Brasil, afirmam que a vida é um direito garantido pelo art.5º da CF/88 que tem aplicação erga omnes, atingindo a todos, e tornando ilícita qualquer conduta que tenda a aboli-la, além de ser o pré-requisito para se adquirir todos os demais direitos, sendo, portanto, um direito inviolável e irrenunciável.

Para os que defendem a prática, a eutanásia é um último ato de vontade do doente que não lhe pode ser negado, pois é verdadeira manifestação dos direitos individuais a autonomia, a liberdade de convicção e consciência, que também são previstos na Constituição.

8.2. Resoluções do Conselho Federal de Medicina

O Código de Ética Médica brasileiro aprovado pelo Conselho Federal de Medicina por meio da Resolução CFM n° 2.217, de 27 de setembro de 2018 e modificado pelas Resoluções CFM nº 2.222/2018 e 2.226/2019, aprovou a ortotanásia no capítulo I (princípios fundamentais), inciso XXII, e também, no parágrafo único do art.41, que possibilitam a descontinuidade dos tratamentos desnecessários para os casos de pacientes irreversíveis e terminais:

XXII - Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados.

Art. 41. (...) Parágrafo único. Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal. (CFM, 2018).

Por meio da Resolução nº 1995/2012, o Conselho Federal de Medicina estabeleceu as diretrizes antecipadas da vontade, que tem como objetivo respeitar a vontade pré-estabelecida do paciente que está impossibilitado, as diretrizes antecipadas são definidas no art. 1º como o “conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar livre e autonomamente sua vontade.” (CFM, 2012).

A resolução estabelece que a vontade do paciente ou do seu representante deve prevalecer sobre qualquer parecer não-médico e sobre a vontade de seus familiares, além disso, o médico deve anotar no prontuário qualquer diretriz antecipada que lhe tenha sido comunicada pessoalmente pelo paciente.

8.3. Eutanásia no Projeto de Lei nº 236/2012

O projeto de lei n° 236/2012 em tramitação no Congresso Nacional, tem como objetivo instituir um novo Código Penal, e propõe uma tipificação própria para a eutanásia no art.122, onde passa a ser considerada como espécie de crime menos grave, punindo com pena de prisão de dois a quatro anos, a morte motivada por piedade ou compaixão, após pedido da vítima em estado terminal, desde que esta seja plenamente capaz.

Art. 122. Matar, por piedade ou compaixão, paciente em estado terminal, imputável e maior, a seu pedido, para abreviar-lhe sofrimento físico insuportável em razão de doença grave:

Pena – prisão, de dois a quatro anos (PL n° 236/2012, 2012).

O projeto também propõe no §1º do art.122 o perdão judicial para o agente que praticar a eutanásia em alguém com quem tenha relação de parentesco ou relação íntima de afeto “o juiz deixará de aplicar a pena avaliando as circunstâncias do caso, bem como a relação de parentesco ou estreitos laços de afeição do agente com a vítima.”

A eutanásia passiva ou ortotanásia passa a ser válida e legal conforme disposição do §2º do art.122, de modo que, não há crime quando o paciente tiver o uso de tratamentos por meios artificiais interrompido em razão da irreversibilidade da doença, se a condição for atestada por dois médicos e houver concordância dos familiares ou cônjuge:

Parágrafo 2º - Não há crime quando o agente deixa de fazer uso de meios artificiais para manter a vida do paciente em caso de doença grave irreversível, e desde que essa circunstância esteja previamente atestada por dois médicos e haja consentimento do paciente, ou, na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão. (PL n° 236/2012, 2012).

O projeto de lei ainda está em fase de deliberação nas Comissões do Senado e não há previsão sobre uma possível discussão do tema no Plenário.

8.4. Conduta retratada na minissérie Justiça

A conduta de Maurício foi descrita como homicídio conforme disposição do art.121 do Código Penal, isso é o que se abstrai da cena que retrata a sua prisão. No entanto, sua conduta também poderia ser a do art.121, §1º que traz as hipóteses de homicídio privilegiado, sendo uma delas, o relevante valor moral e social.

Maurício matou a esposa movido pelo sentimento de amor e compaixão a ela, e demonstrou desde o início que não estava confortável com o crime, é nítido que o pedido de Beatriz teve grande influência na concretização de sua morte, pois, partiu dela a autoria psicológica do delito, e coube ao marido apenas a execução.

Assim, embora não seja hipótese de suicídio, porque a vítima não participou da execução direta do crime, a conduta do agente foi motivada por ela, logo, caberia a hipótese de homicídio privilegiado, já que a conduta foi realizada por relevante valor moral, a compaixão pela vítima.


Conclusões

O presente trabalho se propôs a analisar a eutanásia presente em obras cinematográficas dos EUA, Espanha, França, Itália, Bélgica, Suíça e Brasil, a partir das legislações de cada um desses países, permitindo a imersão em seus valores éticos, morais e culturais, de modo a entender o lugar que a eutanásia ocupa em cada um deles e como é vista pela sua sociedade.

Podemos concluir que é possível dividir os países apresentados em três blocos, o dos países que permitem a Eutanásia composto por Bélgica e Suíça; os que a consideram homicídio privilegiado composto por Brasil e Itália e os que a tratam como tipo penal próprio composto por França e Espanha. Nos EUA, a eutanásia ocupa o status de homicídio simples, mas a prática é permitida em alguns Estados, por isso não é possível encaixá-lo nos blocos.

Os países que tratam a prática como homicídio privilegiado possui, pelo menos, uma característica em comum, a forte influência da religião cristã na sociedade e nos espaços de poder.

No Brasil a eutanásia é pouco discutida e ainda desconhecida pela maioria da população, parte dessa falta de informação deve-se a influência da religião que enfatiza a ideia de que apenas Deus pode tirar a vida, em razão disso quase não existem casos sobre o tema no direito brasileiro, o código penal italiano e brasileiro também são muito parecidos nesse quesito.

A Itália que sofre forte influência da própria sede da Igreja Católica, o Vaticano, também tem certa aversão ao tema, que só foi decidido em caso concreto 26 anos após o pai de Eluana Englaro ter ingressado no poder judiciário requerendo a ortotanásia para a filha e sofreu grande oposição a sua decisão principalmente por parte da Igreja Católica.

Aqui no Brasil, considerando o atual cenário é difícil vislumbrar uma discussão sobre o tema em alguma das casas do Congresso Nacional, pois grande parte dos políticos adotam o conservadorismo advindo das religiões católicas e evangélicas, que é uma vertente crescente no país, principalmente entre a população que se declara cristã.

Apesar disso, pode ser possível uma discussão sobre a ortotanásia e as diretrizes antecipadas da vontade, já que são práticas reguladas pelo Conselho Federal de Medicina, que precisam de uma legislação própria para que possam ser cumpridas efetivamente sem riscos de responsabilização penal para o médico e para a família.

A França e na Espanha, países que adotam um tipo penal próprio para a eutanásia são fronteiriços. Ambos tiveram casos de grande repercussão que fizeram com que o poder legislativo mudasse o tratamento dado ao tema, como a influência do caso Sampedro na criação da ley de muerte digna na Espanha e a influência do caso Chantal Sebiré e Vincent Lambert na França.

A aproximação da população com os casos de eutanásia nesses países, fizeram com que apoiassem a luta pela morte digna ainda que apenas nesses casos específicos, na França, as pessoas apoiavam a luta dos requerentes e desejavam que conseguissem a morte digna, isso demonstra a importância de conhecer os casos e o tema, pois só quando a sociedade conhece a eutanásia é capaz de opinar sobre ela.

Na Suíça e Bélgica, a eutanásia é legalizada. A Suíça deu a eutanásia o status de crime próprio e permite a prática apenas em casos de pacientes terminais que sofram de doenças incuráveis, essa restrição é importante pois respeita a autonomia do paciente terminal que pode optar por antecipar a morte dada como certa. O país traçou um modelo aceitável de eutanásia pautada efetivamente na dignidade da pessoa humana frente à doença incurável, no qual a vida mantém o seu valor como bem jurídico fundamental, sendo permitida a sua renúncia apenas para os casos em que não se é mais possível viver com dignidade.

No caso da Bélgica, a eutanásia é uma política pública destinada a toda a população desde que o requerente afirme estar passando por um sofrimento profundo. Este é um critério subjetivo amplo que pode acabar sendo utilizado por pessoas atraídas pela proposta de dar um fim ao seu sofrimento de forma digna. No entanto, não há critério para analisar a dimensão desse sofrimento, pois só a própria pessoa é capaz de determiná-lo.

Assim, tendo em vista que o todo processo ocorre de forma sigilosa, não é possível saber as reais motivações de alguém sem qualquer doença física incurável pedir a eutanásia. Pois, aos problemas físicos a ciência pode determinar um limite suportável, mas aos problemas psicológicos não.

Portanto, dar a eutanásia o status de política pública é potencialmente lesivo, ainda mais quando se estabelece um único critério para a sua escolha, uma política permissiva nesse sentido acaba por deixar em segundo plano o próprio direito à vida, valor fundamental do ser humano pelo qual exerce todos os demais direitos.

Parece precipitado fazer prevalecer a autonomia da vontade frente o direito à vida de forma tão ampla, quando a ansiedade e depressão, doenças que podem ser amenizadas por meio de tratamentos e acompanhamentos psiquiátricos e psicológicos estão em constante crescimento.

Por óbvio, não se pode atribuir as doenças psicológicas status de menos graves que as doenças físicas, mas a pessoa que se encontra sob esse espectro não é portadora de uma doença terminal e incurável, casos que justificam o pedido de eutanásia, em razão da morte próxima. Assim, a eutanásia não deveria ser permitida a pacientes com doenças psicológicas, pois pelo próprio estado de comprometimento da sua mente, não é capaz de opinar conscientemente e livremente sobre a sua escolha, a estas deve ser oferecido tratamento e não a morte. Pois, a eutanásia deve estar restrita apenas a casos muito específicos, como os de pacientes incuráveis e terminais em grande sofrimento físico.

No entanto, a discussão sobre a eutanásia é bastante ampla, e em razão de sua complexidade exige muitos debates, principalmente por ainda ser relativamente nova no mundo jurídico, já que as legislações sobre o tema são bem recentes.


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Notas

1 GOLDIM, José Roberto (2000), Breve histórico da Eutanásia. Disponível em: <https://www.ufrgs.br/bioetica/euthist.htm> Acesso em 29 Abr. 2019.

2 EUTANÁSIA E SUICÍDIO ASSISTIDO: legislação comparada. Lisboa: Assembleia da República, abr. 2016.

3 Artículo 143 1. El que induzca al suicidio de otro será castigado con la pena de prisión de cuatro a ocho años. 2. Se impondrá la pena de prisión de dos a cinco años al que coopere con actos necesarios al suicidio de una persona. 3. Será castigado con la pena de prisión de seis a 10 años si la cooperación llegara hasta el punto de ejecutar la muerte. 4. El que causare o cooperare activamente con actos necesarios y directos a la muerte de otro, por la petición expresa, seria e inequívoca de éste, en el caso de que la víctima sufriera una enfermedad grave que conduciría necesariamente a su muerte, o que produjera graves padecimientos permanentes y difíciles de soportar, será castigado con la pena inferior en uno o dos grados a las señaladas en los números 2 y 3 de este artículo.

4 Article R4127-38

Le médecin doit accompagner le mourant jusqu'à ses derniers moments, assurer par des soins et mesures appropriés la qualité d'une vie qui prend fin, sauvegarder la dignité du malade et réconforter son entourage.

Il n'a pas le droit de provoquer délibérément la mort.

5 Les deux premiers alinéas de l'article 132-23 relatif à la période de sûreté sont applicables à l'infraction prévue par le présent article.

6 Artículo 223-6 Quien, pudiendo impedir por su acción inmediata, sin riesgo propio o de terceros, un crimen o un delito contra la integridad corporal de la persona, se abstenga voluntariamente de hacerlo será castigado con siete años de prisión y multa de 75.000 euros. Será castigado con las mismas penas quien se abstenga voluntariamente de prestar a una persona en peligro la asistencia que, sin riesgo propio o de terceros, pudiera prestarle bien por su acción personal, bien demandando auxilio.

7 ZANETTI, Pollyanna Thays. DIREITO À MORTE DIGNA: UMA ANÁLISE DA EVOLUÇÃO LEGISLATIVA FRANCESA A PARTIR DOS CASOS VINCENT HUMBERT, CHANTAL SÉBIRE E NICOLAS BONNEMAISON. In: XXVII CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI PORTO ALEGRE – RS BIODIREITO E DIREITOS DOS ANIMAIS, 27., 2018, Porto Alegre. Artigo. Florianópolis: Conpedi, 2018. p. 209 - 226. Disponível em: <https://conpedi.danilolr.info/publicacoes/34q12098/ryzk920n/5BNK0cFDQXhDzn33.pdf>. Acesso em: 05 out. 2019.

8 ZANETTI, Pollyanna Thays. DIREITO À MORTE DIGNA: UMA ANÁLISE DA EVOLUÇÃO LEGISLATIVA FRANCESA A PARTIR DOS CASOS VINCENT HUMBERT, CHANTAL SÉBIRE E NICOLAS BONNEMAISON. In: XXVII CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI PORTO ALEGRE – RS BIODIREITO E DIREITOS DOS ANIMAIS, 27., 2018, Porto Alegre. Artigo. Florianópolis: Conpedi, 2018. p. 209 - 226. Disponível em: <https://conpedi.danilolr.info/publicacoes/34q12098/ryzk920n/5BNK0cFDQXhDzn33.pdf>. Acesso em: 05 out. 2019.

9 ZANETTI, Pollyanna Thays. DIREITO À MORTE DIGNA: UMA ANÁLISE DA EVOLUÇÃO LEGISLATIVA FRANCESA A PARTIR DOS CASOS VINCENT HUMBERT, CHANTAL SÉBIRE E NICOLAS BONNEMAISON. In: XXVII CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI PORTO ALEGRE – RS BIODIREITO E DIREITOS DOS ANIMAIS, 27., 2018, Porto Alegre. Artigo. Florianópolis: Conpedi, 2018. p. 209 - 226. Disponível em: <https://conpedi.danilolr.info/publicacoes/34q12098/ryzk920n/5BNK0cFDQXhDzn33.pdf>. Acesso em: 05 out. 2019.

10 FRANÇA. Code de La Santé Publique, 1902. Disponível em: <https://www.legifrance.gouv.fr/affichCodeArticle.do?cidTexte=LEGITEXT000006072665&idArticle=LEGIARTI000006912901&dateTexte=&categorieLien=cid>. Acesso em: 29 set. 2019.

11 62. Circostanze attenuanti comuni.

Attenuano il reato, quando non ne sono elementi costitutivi o circostanze attenuanti speciali, le circostanze:

1. l'avere agito per motivi di particolare valore morale o sociale;

12 576. Circostanze aggravanti.

Si applica la pena dell'ergastolo se il fatto preveduto dall'articolo precedente è commesso

1. col concorso di taluna delle circostanze indicate nel n. 2 dell'articolo 61;

577. Altre circostanze aggravanti.

Si applica la pena dell'ergastolo se il fatto preveduto dall'articolo 575 è commesso:

3. con premeditazione;

13 579. Omicidio del consenziente.

Chiunque cagiona la morte di un uomo, col consenso di lui, è punito con la reclusione da sei a quindici anni.

Non si applicano le aggravanti indicate nell'articolo 61.

Si applicano le disposizioni relative all'omicidio se il fatto è commesso:

1. contro una persona minore degli anni diciotto;

2. contro una persona inferma di mente, o che si trova in condizioni di deficienza psichica, per un'altra infermità o per l'abuso di sostanze alcooliche o stupefacenti;

3. contro una persona il cui consenso sia stato dal colpevole estorto con violenza, minaccia o suggestione, ovvero carpito con inganno.

14 580. Istigazione o aiuto al suicidio.

Chiunque determina altri al suicidio o rafforza l'altrui proposito di suicidio, ovvero ne agevola in qualsiasi modo l'esecuzione, è punito, se il suicidio avviene, con la reclusione da cinque a dodici anni. Se il suicidio non avviene, è punito con la reclusione da uno a cinque anni, sempre che dal tentativo di suicidio derivi una lesione personale grave o gravissima.

Le pene sono aumentate se la persona istigata o eccitata o aiutata si trova in una delle condizioni indicate nei numeri 1 e 2 dell'articolo precedente. Nondimeno, se la persona suddetta è minore degli anni quattordici o comunque è priva della capacità d'intendere o di volere, si applicano le disposizioni relative all'omicidio.

15 Art. 32. La Repubblica tutela la salute come fondamentale diritto dell’individuo e interesse della collettivita`, e garantisce cure gratuite agli indigenti. Nessuno puo` essere obbligato a un determinato trattamento sanitario se non per disposizione di legge. La legge non puo` in nessun caso violare i limiti imposti dal rispetto della persona umana.

16 Art. 732 Codice di procedura civile

(Provvedimenti su parere del giudice tutelare)

I provvedimenti relativi ai minori, agli interdetti e agli inabilitati sono pronunciati dal tribunale in camera di consiglio, salvo che la legge disponga altrimenti.

Quando il tribunale deve pronunciare un provvedimento nell'interesse di minori, interdetti o inabilitati sentito il parere del giudice tutelare, il parere stesso deve essere prodotto dal ricorrente insieme col ricorso.

Qualora non sia prodotto, il presidente provvede a richiederlo d'ufficio.

17 ANSA (Itália). DJ italiano morre após conseguir aprovação de eutanásia na Suíça. 2017. Disponível em: <https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/ansa/2017/02/27/dj-italiano-morre-na-suica-apos-procedimento-de-eutanasia.htm>. Acesso em: 19 out. 2019.

18 ALIANCE VITA (Bélgica). Euthanasie en Belgique: bilan de 15 ans de pratique. 2017. Disponível em: <https://www.alliancevita.org/2017/06/euthanasie-en-belgique-bilan-de-15-ans-de-pratique/>. Acesso em: 19 out. 2019.

19 BÉLGICA CONCEDEU EUTANÁSIA A MENORES COM 9, 11 E 17 ANOS. Lisboa, 08 ago. 2018. Disponível em: <https://observador.pt/2018/08/08/belgica-concedeu-eutanasia-a-menores-com-9-11-e-17-anos>. Acesso em: 21 out. 2019.

20 A Bélgica possui três idiomas oficiais: holandês ou neerlandês, francês e alemão.

21 Art. 114. 1. Homicide / Meurtre sur la demande de la victime Meurtre sur la demande de la victime Celui qui, cédant à un mobile honorable, notamment à la pitié, aura donné la mort à une personne sur la demande sérieuse et instante de celle-ci sera puni d'une peine privative de liberté de trois ans au plus ou d'une peine pécuniaire.

22 Cantões: unidade político-territorial de alguns países europeus.

23 Art. 115. Incitation et assistance au suicide Celui qui, poussé par un mobile égoïste, aura incité une personne au suicide, ou lui aura prêté assistance en vue du suicide, sera, si le suicide a été consommé ou tenté, puni d'une peine privative de liberté de cinq ans au plus ou d'une peine pécuniaire.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Maria Thamyres de Souza. Eutanásia no cinema. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6348, 17 nov. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/86404. Acesso em: 25 abr. 2024.