O TCE/RS e o regime celetista dos consórcios públicos

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O artigo examina o entendimento equivocado que o TCE/RS está realizando acerca da modulação de efeitos da liminar concedida pelo STF na MC ADI 2135-4/DF, obrigando os consórcios públicos a migrarem imediatamente para o regime estatutário.

Desenvolve-se no Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE/RS) uma verdadeira batalha processual na luta do direito dos consórcios públicos continuarem utilizando o regime celetista previsto na Lei Federal n.º 11.107/05, cujos art.  4º e 6º impõem-lhes  a utilização do referido regime na contratação de seus colaboradores, denominados por essa razão, de empregados públicos.  

Ocorre que o TCE/RS vem determinando aos consórcios públicos gaúchos que providenciem a imediata transposição para o regime estatutário, sob pena de responsabilização do gestor, baseando-se em uma decisão liminar concedida na MC ADI 2135-4/DF, publicada em 7/03/2008, que examina a inconstitucionalidade da EC 19/98, que dentre outras alterações constitucionais, introduziu a possibilidade de a Administração Pública utilizar-se do regime celetista como forma mais moderna e eficaz de se relacionar com seus colaboradores.

Com o devido respeito aos eminentes Conselheiros,  a posição do  TCE/RS sobre o assunto constitui infeliz desserviço à sociedade gaúcha e, em particular, aos consórcios públicos, porque suas decisões, nesse tocante, carregam insuperável equívoco hermenêutico ao desconsiderar a modulação de efeitos da decisão do STF disciplinada na própria liminar, que expressamente assegurou a subsistência da legislação editada sob a vigência da emenda declarada suspensa!

Como a Lei dos Consórcios Públicos, Lei Federal n.º 11.107/05, foi publicada em 07/04/2005 e seu Decreto Regulamentar, de n.º 6.017, em 18/01/2007, portanto, anteriores à publicação da aludida liminar (7/3/2008), verifica-se que ambas as normas foram editadas no curso da vigência da EC n.º 19/1998, razão pela qual, por força do conteúdo decisório da referida liminar, subsistem nos seus exatos termos, não havendo falar em “nova interpretação da Lei dos Consórcios Públicos”, agora sob a luz do ora revigorado antigo art. 39 da Constituição Federal, como vem se pronunciando o TCE/RS.

Assim, conforme bem salientou o Exmo. Ministro Carlos Britto, à fl 219 daquele decisório do STF, a liminar deferida “não opera desde sempre, mas, sim, doravante, de modo a preservar a dualidade eventual de regimes”.

Desse modo, até o julgamento definitivo da ADI 2.135, resta assegurada a vigência das Leis 11.107/05 e Decreto 6.017/07, que determinam a utilização do regime de emprego público aos consórcios públicos. Se vigentes as referidas leis, vigentes também os atos constitutivos de todos os consórcios públicos que, em tais normas, buscaram o fundamento de validade de sua constituição.

Dessa forma, não há falar, pelo menos até o julgamento definitivo da ADI 2.135, de extinção do quadro celetista dos consórcios públicos com imediata migração para o regime estatutário como foi determinado, exemplificativamente, nos processos 1418-02.00/14, em desfavor do Consórcio Intermunicipal do Vale do Jacuí (CI/JACUÍ), e 9048-0200/13-6, contra o Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento da Serra Gaúcha (CISGA).

Dito isso, respeitosamente afirma-se que as decisões do TCE que determinam aos consórcios públicos gaúchos  a imediata transposição para o regime estatutário, fundamentadas no aludido decisório interlocutório do STF, ostentam inconstitucionalidade por violação à própria decisão liminar da MC ADI 2135-4/DF e ilegalidade consubstanciada na violação dos artigos  4º, IX, 6º, §2º, da Lei Federal n.º 11.107/05 a desafiar um Pedido de Revisão naquela Corte de Contas, bem como um mandado de segurança por violação à Lei dos Consórcios Públicos no caso de insucesso da via administrativa.

Na última terça- feira, 04/08/15, o Senado Federal aprovou o PLS 302/2015, de autoria do Senador Fernando Bezerra Coelho (PSB/PE), que altera o art. 6º da Lei Federal n.º 11.107/05, incluindo expressamente a obrigação de os consórcios públicos de direito público e utilizarem o regime celetista na contratação de seus colaboradores.  Na justificativa do referido projeto, o autor refere que o projeto “visa adequar e melhorar a redação dada pela Lei que instituiu os Consórcios Públicos. Isso ocorre porque houve no decorrer do período de vigência da Lei interpretações equivocadas, de alguns Tribunais de Contas como do Estado do Rio Grande do Sul, de que os consórcios de natureza pública teriam de ter a necessidade de contratar em seu quadro de pessoal por meio do regime estatutário. Já por outro lado, os outros Tribunais de Contas permitem contratação pelo regime Celetista, ocorrendo dúvidas sobre o tem em questão”.

A despeito da louvável tentativa de impedir os efeitos negativos do entendimento de alguns TCE sobre o assunto, trata-se de manobra legislativa que somente servirá para reforçar a tese equivocada dos TCEs em desfavor dos consórcios públicos. É que existe uma  liminar concedida pelo STF na MC ADIN 2.135/4-DF, que suspendeu a vigência da EC 19/98, que expressamente advertiu “que a decisão – como é próprio das medidas cautelares – terá efeito ex nunc, subsistindo a legislação editada nos termos da emenda declarada suspensa. Significa dizer que a Lei 11.107/05, que já prevê a utilização do regime celetista pelos consórcios públicos, sendo anterior a publicação da referida liminar, não foi atingida pelo efeito suspensivo da EC 19/98 concedido naquela liminar. Assim, os consórcios prejudicados pelas decisões dos TCES de migração para o regime estatutário, sob o fundamento da suspensão dos efeitos da EC n.º 18/98 pela aludida decisão interlocutória do STF, apenas precisam invocar seu direito a permanecerem no regime celetista até a decisão final da ADI, com base na própria decisão liminar em comento.

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 Mas, se o referido projeto de lei, que segue agora para votação na Câmara dos Deputados, for aprovado, a alteração do art. 6º da Lei 11.107/05 será posterior à decisão do STF e, portanto, não estará protegida pelo efeito modulador da liminar. Dessa forma, o único efeito prático da alteração a ser realizada pelo PSL  302/2015 , que adianto, será nocivo aos interesses dos consórcios  públicos, será municiar os TCEs (desta vez com argumento válido) para questionarem judicialmente a impossibilidade de utilização do regime celetista pelos consórcios públicos de direito público, diante da vigência do novo art. 6º  da Lei dos Consórcios afrontar a decisão liminar da MC ADI 2135-4/DF que somente garantiu a subsistência da legislação editada antes da suspensão da EC n. 19/98. Em razão disso, orientamos fortemente aos interessados que se movimentem junto ao Congresso Nacional para o arquivamento do referido projeto de lei. Típica situação em que a emenda será pior que o soneto...

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Sobre o autor
Cleber Demetrio Oliveira da Silva

Sócio da Cleber Demetrio Advogados Associados, da RZO Consultoria e Diretor Executivo do Instituto de Desenvolvimento Regional Integrado Consorciado (IDRICON21), Especialista em Direito Empresarial pela PUCRS, Especialista em Gestão de Operações Societárias e Planejamento Tributário pelo INEJE, Mestre em Direito do Estado pela PUCRS, Professor de Ciência Política no curso de graduação da Faculdade de Direito IDC, de Direito Administrativo em curso de pós-graduação do IDC e Professor de Direito Administrativo e Direito Tributário em cursos de pós-graduação do UNIRITTER da rede Laureate International Universities.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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