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Entrevista: Salomão Viana fala sobre o Novo CPC

16/03/2016 às 16:39

Resumo:


  • O Novo Código de Processo Civil entrou em vigor em março de 2016, impactando a rotina dos profissionais do Direito.

  • O novo CPC aumenta a efetividade do processo judicial ao introduzir instrumentos para cumprimento de obrigações pecuniárias, como o protesto da decisão judicial e a hipoteca judiciária.

  • O código fortalece a força normativa da jurisprudência, estabelecendo um sistema de precedentes obrigatórios para evitar a repetição de demandas semelhantes e garantir mais segurança jurídica.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Salomão Viana esclarece dúvidas sobre o novo CPC que está entrando em vigor, transformando a rotina dos profissionais do Direito.

Após um ano de sua publicação, o Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) finalmente entra em vigor no dia 18 de março de 2016, transformando a rotina dos profissionais do Direito.

Para esclarecer algumas dúvidas, o Jus Navigandi entrevistou o Professor e Juiz Federal Salomão Viana, que vem estudando com afinco o novo CPC.

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Jus O novo CPC aumenta o rigor com a fundamentação das decisões judiciais e a preocupação em não surpreender as partes com uma decisão inesperada. Em que medida essas mudanças favorecem ou prejudicam a agilidade e a efetividade processual?

Salomão Viana - Um dos equívocos mais comuns que percebo nas impressões que os operadores do Direito de um modo geral têm tido a respeito do novo CPC é o consistente no exame de aspectos isolados do código, como se se tratasse de um conjunto de textos normativos cuja interpretação pudesse ser feita sem levar em consideração o postulado da unidade. É preciso perceber que o novo CPC, que adota um modelo cooperativo de processo, estrutura um robusto sistema de precedentes judiciais obrigatórios e, ao mesmo tempo, é estruturado sobre esse mesmo sistema. Num sistema de precedentes judiciais obrigatórios, instalado num ambiente processual cooperativo, é impossível não dar atenção à fundamentação das decisões judiciais, uma vez que são exatamente os fundamentos determinantes da decisão que têm potencial para a universalização, para utilização em tantos casos similares quantos surjam. Ao lado disso, se os fundamentos determinantes das decisões judiciais têm esse potencial para a universalização, é preciso que eles sejam extraídos após um adequado debate, um debate responsável, e isso se dá por meio da abertura para que o princípio do contraditório incida na sua inteireza.  Note-se que os órgãos julgadores continuarão podendo tomar conhecimento de ofício a respeito de diversas matérias.  Mas não se pode confundir a possibilidade de se tomar conhecimento de ofício com a permissão para se decidir sem que o fundamento, de fato ou de direito, tenha sido previamente submetido ao contraditório. À vista disso, num primeiro momento, é inevitável que os processos, individualmente considerados, tenham a sua duração estendida, já que mais passos serão necessariamente dados antes que a decisão seja proferida. Todavia, na medida em que forem fixados precedentes obrigatórios em número significativo, a tendência natural – e esperada – é a de que ocorra uma redução no número de processos, já que o Poder Judiciário estará autorizado pelo sistema jurídico a rechaçar liminarmente as demandas que contrariarem precedentes obrigatórios. Com isso, num segundo momento após a entrada em vigor do novo código, com a diminuição do número de processos, serão colhidos os frutos da duração razoável e da efetividade processuais, com muito mais previsibilidade das decisões judiciais e, consequentemente, mais segurança jurídica.


Jus Quais novos instrumentos o credor pode utilizar para aumentar a efetividade do processo judicial para o recebimento dos valores a que tem direito?

Salomão Viana - O novo CPC aumenta consideravelmente os instrumentos a serviço da efetividade processual.  Para começar, o poder geral de efetivação das decisões judiciais passa a abranger o quanto necessário for para que sejam adequadamente cumpridas as obrigações de natureza pecuniária.  No CPC-1973, esse poder geral de efetivação, que abrange a possibilidade de adoção medidas coercitivas atípicas – aquelas que não estão especificamente previstas na lei –, somente abrangia as obrigações de fazer, de não fazer e de entregar coisa distinta de dinheiro. O CPC-2015 o estende para as obrigações pecuniárias. Trata-se de uma expansão sem precedentes no sistema processual civil pátrio. Ao lado disso, a decisão judicial transitada em julgado e que não houver sido cumprida poderá ser levada a protesto, da mesma forma como se protesta um título de crédito, o que deixará em situação difícil o devedor resistente.  Não bastasse, houve um significativo reforço do instituto da hipoteca judiciária, de modo que, se o débito for em dinheiro, poderá ser hipotecado bem imóvel do devedor, mesmo que a decisão ainda esteja submetida a recurso com efeito suspensivo.  A hipoteca judiciária, portanto, passou a ser um efeito automático da sentença que impõe a obrigação de pagar dinheiro. Em acréscimo, as obrigações alimentícias vencidas e não pagas poderão ser descontadas, concomitantemente com as obrigações que forem se vencendo, diretamente dos rendimentos ou rendas do executado, de forma parcelada, contanto que a soma das duas parcelas (a parte vencida e a atual) não ultrapasse cinquenta por cento de ganhos líquidos do devedor.  São muitas as inovações.  Se bem utilizadas pela parte credora, será sensível o aumento da efetividade processual nesse campo.


Jus O juízo de admissibilidade de recursos pelos tribunais superiores foi objeto de modificações antes mesmo da entrada em vigor do novo CPC. O que mudou?

Salomão Viana - Na verdade a mudança foi para não haver mudança.  Explico.  É que o novo CPC, na sua versão original, quando foi publicado, suprimiu, generalizadamente, o juízo de admissibilidade recursal pelo órgão prolator da decisão recorrida.  Essa linha foi adotada também quanto aos recursos especial e extraordinário, que passaram a não se submeter ao crivo de admissibilidade do tribunal prolator do acórdão recorrido.  Esse quadro passou a preocupar sobremaneira os tribunais superiores, que, efetivamente, seriam repentinamente inundados por milhares de processos tão logo o código entrasse em vigor.  Porém, antes da entrada em vigor, sobreveio a Lei n. 13.256, de 4 de fevereiro de 2016, que, dentre outras coisas, reformou o código de modo a ficar prevista a realização do juízo de admissibilidade para tais recursos.  Assim, quanto a esse assunto, fica, na essência, mantido o sistema do CPC-1973: os recursos especial e extraordinário serão submetidos a duplo juízo de admissibilidade, tanto pelo tribunal prolator do acórdão recorrido, como pelo tribunal superior respectivo.

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Jus - O novo CPC aumenta a força normativa da jurisprudência como fonte do Direito, de forma a evitar a repetição de demandas semelhantes? De que forma?

Salomão Viana - Como realcei na resposta à primeira pergunta,  o novo CPC estrutura um robusto sistema de precedentes judiciais obrigatórios e, ao mesmo tempo, é estruturado sobre esse mesmo sistema.  No elenco de precedentes judiciais obrigatórios estão os julgamentos de casos repetitivos, que engloba os recursos especial e extraordinários repetitivos e o incidente de resolução de demandas repetitivas. Fixada, por meio de tais instrumentos, a tese jurídica a ser empregada, o tribunal que fixou a tese, bem como todos os órgãos julgadores a ele vinculados, passa a dispor de um arsenal voltado para inibir o prosseguimento de processos em que o pleito seja contrário aos precedentes fixados.  Com isso, o conjunto das decisões judiciais passa a ser dotado de uma desejada estabilidade e a população gozará de mais segurança jurídica.  Um efeito colateral positivo disso, será a redução no número de processos, o que, de sua vez, possibilitará que os órgão julgadores possam atuar com mais qualidade.  É que poderá haver maior dedicação ao julgamento de casos que, de fato, merecem atenção, já que os processos nascidos a partir da propositura de demandas inviáveis tenderão a ser resolvidos liminarmente, no seu início, sem que sequer seja citada a parte ré.


Jus O processo eletrônico é uma realidade em implantação, que é o futuro do Direito. Contudo, em muitos aspectos, o CPC ainda permanece fazendo referências ao processo físico. O CPC avançou o suficiente nesse assunto?

Salomão Viana - Neste aspecto, a opção legislativa feita por ocasião da redação do novo CPC foi muito clara: os textos normativos foram produzidos de modo a resistir à constante ebulição do mundo informatizado.  O regramento específico deverá se dar por meio de leis especiais e/ou atos administrativos, a depender da situação.  Uma observação cuidadosa dos textos do novo código revelará que o regramento dos diversos assuntos se dá de modo a que a solução dos problemas possa ser encontrada tanto no âmbito de autos eletrônicos, como de autos físicos e, quanto à prática eletrônica de atos processuais, foram postas as coordenadas a serem seguidas pelos diversos órgãos integrantes do Poder Judiciário.  É nessa linha que há dispositivo expresso no sentido de que os sistemas de automação processual respeitarão a publicidade dos atos, o acesso e a participação das partes e de seus procuradores, inclusive nas audiências e sessões de julgamento, competindo ao Conselho Nacional de Justiça e, supletivamente, aos tribunais, regulamentar a prática e a comunicação oficial de atos processuais por meio eletrônico e velar pela compatibilidade dos sistemas, disciplinando a incorporação progressiva de novos avanços tecnológicos e editando, para esse fim, os atos que forem necessários, respeitadas as normas fundamentais do código.  Com isso, o código fica menos sujeito às oscilações resultantes da evolução da informática.  De outro lado, não é desprezada a realidade resultante das dimensões continentais do país, que torna inevitável que ainda leve algum tempo para que todos os processos tramitem em autos eletrônicos.


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Sobre o autor
Salomão Viana

Graduado em Medicina, em 1985, pela Universidade Federal da Bahia. Graduado em Direito, em 1987, pela Universidade Católica do Salvador. Especialista em Direito Processual Civil pela Fundação Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia. Advogado, de 1987 a 1991. Juiz de Direito do Estado da Bahia, de 1991 a 1994. Juiz Federal Substituto na Seção Judiciária da Bahia, de 1994 a 1998. Juiz Federal na Seção Judiciária da Bahia, de 1998 até a presente data. Juiz do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia de outubro/2009 a outubro/2011. Professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia desde o ano de 1995 e Professor do Brasil Jurídico Ensino de Alta Performance. Palestrante e autor de vários artigos na área.

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